Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 606/2017-T
Data da decisão: 2018-05-25  IMT Selo  
Valor do pedido: € 289.998,56
Tema: IMT/IS - Isenção – Instalação de Empreendimento Turístico – Locação Financeira.
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Os árbitros Dr. Juiz José Poças Falcão, Dr. Sérgio Santos Pereira e Dr. A. Sérgio de Matos, designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa para formarem o Tribunal Arbitral, constituído em 06-02-2018, acordam no seguinte:

 

 

1. Relatório

 

A…, NIPC…, com sede na …, n.º…, freguesia …, …-… Porto, adiante designada por "Requerente/Demandante", veio, nos termos dos arts. 1.º, 2.º/1/a) e 10.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária - RJAT), e do art. 99.º do CPPT aplicável ex vi artigo 10.º/2/c) do mencionado diploma, apresentar um pedido de constituição do tribunal arbitral, em que é Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira. A Requerente pretende que sejam declaradas nulas ou anuladas as liquidações adicionais de IMT e IS, notificadas pelos ofícios n.ºs … e …, ambos de 19-07-2017, do Serviço de Finanças de Lisboa…, no montante total de € 289.998,56, relativas à aquisição, 21-12-2016, dos seguintes prédios urbanos:

  1. prédio inscrito sob o artigo matricial nº … da freguesia das …, concelho de Lisboa, sito na Avenida …, n.º…, em Lisboa;
  2. prédio inscrito sob o artigo matricial nº … da freguesia das …, concelho de Lisboa, sito na Avenida …, n.º … e …, em Lisboa.

Consequentemente, pretende obter o reembolso das quantias indevidamente pagas relativamente às referidas liquidações, acrescidas dos juros indemnizatórios devidos e formula ainda o pedido de extinção de quaisquer processos contraordenacionais subjacentes aos actos de liquidação anulados, tudo com as legais consequências.

O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD e notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira em 22-11-2017.

Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, o Conselho Deontológico designou como árbitros do tribunal arbitral colectivo os signatários, que comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável.

Em 16-01-2018 foram as partes devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a designação dos árbitros, nos termos conjugados do artigo 11.º n.º 1, alíneas a) e b) do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.

Em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, o tribunal arbitral colectivo foi constituído em 06-02-2018.

A Autoridade Tributária e Aduaneira respondeu, defendendo a improcedência do pedido de pronúncia arbitral.

Por despacho de 19-03-2018 dispensou-se a reunião prevista no artigo 18.º do RJAT e decidiu-se que o processo prosseguisse com alegações escritas simultâneas.

As partes apresentaram alegações de facto e de direito, mantendo e desenvolvendo as posições jurídicas já anteriormente adoptadas.

As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão devidamente representadas (arts. 4.º e 10.º, n.º 2, do RJAT e art. 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março).

O processo não enferma de nulidades e não se suscita qualquer obstáculo à apreciação do mérito da causa.

Não são suscitadas excepções nem há qualquer obstáculo à apreciação do mérito da causa.

 

Matéria de facto

 

2.1. Factos provados

 

Consideram-se provados os seguintes factos:

 

1. Em 21 de Dezembro de 2016, o Demandante adquiriu à sociedade B…, S. A., por contrato de compra e venda, os seguintes imóveis:

            a) prédio inscrito sob o artigo matricial nº … da freguesia …, concelho de Lisboa, sito na Avenida …, n.º …, em Lisboa;

            b) prédio inscrito sob o artigo matricial nº … da freguesia …, concelho de Lisboa, sito na Avenida …, n.º … e … em Lisboa (art. 8.º do pedido de pronúncia arbitral e Doc. 3, junto com o mesmo, cujo teor se dá como reproduzido, e art. 5.º da Resposta);

2. A referida aquisição foi efectuada no âmbito da celebração de um Contrato de Locação Financeira Imobiliária assinado em 23 de Dezembro de 2016 entre o Demandante como Locador, e a sociedade B… S.A., NIF…, na qualidade de locatária (art. 9.º do pedido de pronúncia arbitral e Doc. 4, junto com o mesmo, cujo teor se dá como reproduzido, e art. 5.º, b), da Resposta);

3. O mencionado contrato de locação financeira imobiliária tem como objecto os seguintes imóveis:

            a) O prédio urbano sito na …, n.ºs … e…, freguesia de …, concelho de Lisboa, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa, sob o número … da dita freguesia e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo … da freguesia de …, ao qual foi atribuído o valor de 1.551.185,32 Euros;

            b) O prédio urbano sito na …, n.ºs …, … e …, freguesia de …, concelho de Lisboa, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa, sob o número … da dita freguesia e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo … da freguesia de …, ao qual foi atribuído o valor de 2.816.263,00 Euros (art. 10.º do pedido de pronúncia arbitral e cit. Doc. 4);

4. É pressuposto expresso do contrato de locação financeira que os referidos imóveis irão dar lugar à construção e instalação de um empreendimento hoteleiro com 120 quartos, parque de estacionamento e zona interior de cargas e descargas ao qual, sob a designação C…–…, foi atribuída a classificação de utilidade turística a título prévio, conforme Despacho n.º 14500/2016 da Secretária de Estado do Turismo, datado de 21-11-2016 e publicado no Diário da República, 2.ª Série, de 30 de novembro de 2016 (art. 11.º do pedido de pronúncia arbitral, cit. Doc. 4 e Doc. 5, junto com o mesmo, cujo teor aqui se dá como reproduzido e art. 5.º, a), da Resposta);

 5. O empreendimento encontra-se ainda em fase de construção pelo que, aquando da aquisição dos imóveis pelo Requerente e da celebração do contrato de locação financeira era claro e inequívoco que a sua instalação não só não se encontrava concluída, como tal aquisição se destinava à instalação do Empreendimento Turístico C… (art. 12.º do pedido de pronúncia arbitral e cit. Doc. 4);

6. A instalação do empreendimento destinado à prestação de serviços de turismo só cessará quando, depois de construído e licenciado o conjunto imobiliário, o mesmo se mostrar apto a funcionar nos termos que lhe permitiram alcançar o estatuto de utilidade turística, isto é, quando se mostrar apto a ser afectado à actividade de exploração turística com a qualidade exigida no Despacho, de 21 de Novembro de 2016, que concedeu a utilidade turística prévia ao C…— … (art. 13.º do pedido de pronúncia arbitral);

7. Não foi emitido o título e abertura ou licença para utilização para fins turísticos do referido empreendimento até à presente data (art. 14.º do pedido de pronúncia arbitral);

8. O Demandante comprou os imóveis em questão pelo preço total de € 4.367.448,32 (art. 15.º do pedido de pronúncia arbitral e cit. Doc. 3);

9. Previamente à referida aquisição, o Demandante apresentou perante o competente Serviço de Finanças as declarações para liquidação do IMT e IS, sendo certo que foram emitidos comprovativos nos quais se certifica que a transmissão em causa se encontrava isenta de IMT e beneficiava de uma redução de 80% de IS, ao abrigo do Decreto-Lei n.º 423/83 de 5 de Dezembro (art. 16.º do pedido de pronúncia arbitral e Processo Administrativo);

10. O Demandante foi notificado pelos ofícios n.ºs … e …, de 29/03/2017, remetidos pelo Serviço de Finanças de Lisboa -…, para se pronunciar, em sede de audição prévia, das decisões de reforma dos actos de liquidação de IMT e IS e consequente pagamento das liquidações adicionais dos impostos pretensamente em falta (art. 17.º do pedido de pronúncia arbitral, Doc. 6, junto com o mesmo, Doc. 7, ulteriormente junto aos autos, cujos teores aqui se dão por integrados, e art. 5.º, f) da Resposta);

11. Na fundamentação que serve de base à decisão e que se encontra plasmada nos ofícios … e …, a Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) considera que a aplicação do benefício fiscal à aquisição dos imóveis por parte do Demandante foi indevida, aduzindo, entre o mais, o seguinte:

            “Da norma do citado artigo 20.º resulta a aplicação do benefício de isenção de IMT/Selo às aquisições de prédios ou de fracções autónomas com destino à instalação de empreendimentos qualificados de utilidade turística, ainda que tal qualificação seja atribuída a título prévio, excluindo, assim, a sua aplicação às transmissões onerosas subsequentes. A hermenêutica teleológica do mesmo normativo permite-nos inferir que o aludido diploma legal, ao atribuir o benefício da isenção de IMT/Selo às transmissões onerosas de imóveis urbanos com destino à instalação de empreendimentos qualificados de utilidade turística visa, tão somente, o fomento e melhoria qualitativa de novos empreendimentos turísticos, tornando os benefícios fiscais extensíveis aos investimentos em empreendimentos que contemplem a remodelação, a beneficiação, o reequipamento e a ampliação da sua capacidade em 50%, conforme artigo 5.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 423/83 de 5 de Dezembro ... o A…, S.A., ao adquirir o imóvel a entidade que beneficiou de isenção de IMT pela utilidade turística, não podia beneficiar da isenção porquanto o aludido diploma não compreende a isenção de utilidade turística na sequente transmissão onerosa.”  (arts. 18.º, 19.º e 21.º do pedido de pronúncia arbitral, cit. Doc. 6 e PA fls. 55 e segs.);

12. O Turismo de Portugal enviou e-mail ao SF de Lisboa …, em 24.02.2017, ao qual anexou a informação de Serviço n.º Int/2017/…/DVO/EMUT/GC, datada de 22.02.2017, dando conta  da substituição da entidade proprietária do imóvel onde se encontra instalado o empreendimento C…–…, resultando da referida comunicação que, em 27 de Dezembro de 2016, a sociedade B… SA (anterior proprietária do imóvel) acordou um processo de locação financeira com o A…, nos termos do qual a instituição bancária adquiriu a totalidade do imóvel e simultaneamente celebrou um contrato de locação financeira com a referida entidade, que manteve a sua obrigação de instalação e exploração do empreendimento (art. 20.º do pedido de pronúncia arbitral, cit. Doc. 6, PA, fls. 20 e segs., e art. 5.º e) da Resposta);

13. Em 21 de Abril de 2017, o Demandante apresentou pronúncia, em sede de audição prévia (art. 23.º do pedido de pronúncia arbitral e PA, fls. 67 e segs.);

14. Em 24 de Julho de 2017, o Demandante foi notificado pelos ofícios n.ºs … e …, de 19 de Julho de 2017 acima mencionados, remetidos pelo Serviço de Finanças de Lisboa – …, das decisões de reforma dos actos de liquidação de IMT e IS, bem como para proceder ao pagamento das consequentes liquidações adicionais ora impugnadas (arts. 1.º, 2.º e 24.º do pedido de pronúncia arbitral e cits. Docs. 1 e 2);

15. Em 4 de Setembro de 2017, o Demandante procedeu ao pagamento perante a Autoridade Tributária dos referidos impostos no montante total de € 289.998,56 (duzentos e oitenta e nove mil, novecentos e noventa e oito euros e cinquenta e seis cêntimos) (art. 25.º do pedido de pronúncia arbitral e Doc. 8, junto com o mesmo, cujo teor aqui se dá por integrado);

16. Em 23.12.2016, foi celebrado Contrato de Locação Financeira entre o Requerente e a “B…, S.A.” (cit. Doc. 4) onde consta, designadamente, na cláusula “1. Identificação do Imóvel”, a descrição dos mesmos dois prédios acima referidos, a que acresce a seguinte nota:

            “Os prédios descritos nos parágrafos anteriores, adiante designados em conjunto por imóvel, imóvel locado ou imóveis, na presente data adquiridos pelo Locador, irão ser demolidos para dar lugar à construção de um empreendimento hoteleiro com 120 quartos, parque de estacionamento e zona interior de cargas e descargas ao qual, sob a designação C…– …, foi atribuída a classificação de utilidade turística a título prévio, conforme Despacho nº 14500/2016 da Secretaria de Estado de Turismo, publicado no Diário da República, 2ª Série, de 30 de Novembro de 2016.”

     E a cláusula “3. Valor do financiamento” refere:

            “3.6 A aquisição dos imóveis descritos na cláusula primeira das presentes condições particulares beneficiou da isenção de IMT por a mesma se destinar à construção de um empreendimento turístico designado por ‘C…-…’, ao qual foi atribuída utilidade turística, a título prévio.”  (art. 5.º, c), da Resposta);

17. Em 21.11.2016, por Despacho nº 14500/2016, da Secretária de Estado do Turismo, tendo presentes os critérios legais aplicáveis  e o parecer da Vice-Presidente do Conselho Directivo do Turismo de Portugal, I.P., foi atribuída, nos termos do disposto no  nº1 do art. 2º, e nº 2 do art. 7º do DL nº 423/83, de 5 de Dezembro,  utilidade turística prévia  ao C..–…, com a categoria projectada de 3 estrelas, a instalar em Lisboa, atento o pedido da sociedade B…, S.A., pelo prazo de 22 meses, contados da data da publicação do despacho no Diário da República – DR., 2ª S., nº 230, de 30.11.2016 (cit. Doc. 5 e art. 5.º d) da Resposta) ;

18. Em 14.07.2017, foi proferido despacho da Chefe do SF de Lisboa …, em concordância com os fundamentos da Informação de 14.07.2014, que se dá como integralmente reproduzida, do procedimento de reforma dos actos de liquidação de IMT e de I. do selo Verba 1.1, registos nº …/2016, nos termos do nº1 do art. 79º da LGT referente à aquisição dos prédios inscritos sob os artigos … e …º da matriz predial da freguesia … (art 5.º, g) e h), da Resposta e PA, fls. 104 e segs);

19. O imposto foi pago em cobrança voluntária em 04.09.2017 (art. 5.º, i), da Resposta).

 

2.2. Factos não provados

 

Não há factos relevantes para a decisão da causa que não se tenham provado.

 

 2.3. Fundamentação da fixação da matéria de facto

 

Os factos foram dados como provados com base nos documentos juntos com o pedido de pronúncia arbitral e com a resposta da Autoridade Tributária e Aduaneira.

 

 

 

3. Matéria de direito

 

3.1. Posições das Partes

 

A B…, S. A. obteve a atribuição de utilidade turística a título prévio do “C…–…” (conforme Despacho n.º 14500/2016 da Secretária de Estado do Turismo, datado de 21-11-2016), empreendimento que pretendia edificar em prédios seus.

A sociedade requerente (A…, S.A.) adquiriu à B…, S. A. os referidos prédios com o pressuposto, expresso no contrato de locação financeira, de que tais imóveis irão dar lugar à construção e instalação de um empreendimento hoteleiro com 120 quartos, parque de estacionamento e zona interior de cargas e descargas ao qual, sob a designação C…–…, a que foi atribuída a classificação de utilidade turística a título prévio

A Autoridade Tributária e Aduaneira entende que, tendo sido a B…, S. A. quem requereu a atribuição de utilidade turística para o “C…– …” e que promoveu a construção e instalação do empreendimento hoteleiro, não pode a Requerente beneficiar da isenção objectiva contida no artigo 20.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 423/83, de 5 de Dezembro, em que se estabelece o seguinte:

Artigo 20.º

 1 - São isentas de sisa e do Imposto sobre sucessões e doações, sendo o imposto do selo reduzido a um quinto, as aquisições de prédios ou de fracções autónomas com destino à instalação de empreendimentos qualificados de utilidade turística, ainda que tal qualificação seja atribuída a título prévio, desde que esta se mantenha válida e seja observado o prazo fixado para a abertura ao público do empreendimento.

2 - A isenção e a redução estabelecidas no número anterior verificar-se-ão também na transmissão a favor da empresa exploradora, no caso de a proprietária ser uma sociedade de locação financeira e a transmissão se operar ao abrigo e nos termos do contrato de locação financeira que determinou a aquisição do empreendimento pela sociedade transmitente.

 

A Requerente alega, em síntese, o seguinte:

 

–   ao contrário do que a AT parece fazer crer, não é verdade que estejamos perante transmissões dos imóveis que tenham sido subsequentes à instalação do empreendimento, uma vez que este ainda se encontra na sua fase de construção não tendo sido iniciada a sua exploração;

–   a aquisição dos imóveis por parte do Requerente, teve precisamente como objectivo permitir à sociedade exploradora a obtenção dos meios financeiros necessários à conclusão do projecto, pelo que a transacção em análise se revela necessária e essencial para a instalação do empreendimento, estando inequivocamente abrangida pelo regime da utilidade turística;

– Este facto é comprovado através do disposto no próprio contrato de locação financeira celebrado pela Demandante e a empresa B…, o qual estabelece, no seu ponto 12, sob a epígrafe “utilização do imóvel locado”, o seguinte:

            “O imóvel objecto do presente contrato será afectado à actividade hoteleira conforme previsto no despacho n.º 14500/20016, da Secretaria de Estado do Turismo…”;

–   O argumento utilizado pela AT para concluir que, tendo o imóvel já beneficiado de uma isenção na sua aquisição pela B… S.A., a sua compra pelo Requerente não poderia beneficiar da isenção, não tem qualquer fundamento legal e assenta numa mera extrapolação das normas previstas no Decreto-Lei n.º 423/83, de 5 de Dezembro: primeiro, porque o enquadramento jurídico-tributário a conferir à operação de aquisição dos imóveis pelo Requerente deverá ser determinado única e exclusivamente em função dos factos que estão directamente conexos com esta operação e não com nenhuma outra efectuada a montante ou a jusante; segundo, porque efectivamente não há no Decreto-Lei n.º 423/83, de 5 de Dezembro qualquer norma que vede a aplicação do benefício da isenção de IMT e da redução do IS a várias transacções efectuadas sobre o mesmo imóvel;

– A aplicação da isenção acima mencionada tem como única condição que os imóveis transaccionados se destinem à instalação de empreendimentos turísticos devidamente qualificados, ainda que a título prévio, não fazendo qualquer referência à condição em que a entidade adquirente intervém no processo de instalação;

–   Estamos perante uma isenção que tem como objectivo fomentar a criação e instalação de novos empreendimentos turísticos, reconhecendo o legislador a importância estratégica do sector do turismo para o desenvolvimento económico do país, sendo neste contexto que se deve analisar o seu âmbito de aplicação;

–   Não há dúvidas de que a aquisição, no âmbito de uma operação de locação financeira, de um imóvel ao qual tenha sido reconhecida utilidade turística, pode beneficiar da isenção de IMT desde que o empreendimento se encontre ainda em fase de instalação e a operação tenha como objectivo permitir a conclusão do referido processo de instalação;

– A Administração Tributária violou as legítimas expectativas e garantias do Requerente anteriormente constituídas, e o princípio da confiança e segurança jurídica ínsitos ao princípio do Estado de Direito, além de ter violado os princípios da legalidade tributária, da proibição da retroactividade da lei fiscal e da certeza e segurança jurídica previstos, entre outros, nos artigos 12.º da LGT, 12.º do CC e 103.º n.º 3 da CRP.

-    A interpretação da Administração Tributária aplicada a um facto tributário passado constitui uma violação do princípio da protecção da confiança, na vertente da segurança jurídica;

-    Verifica-se claramente um erro de direito por parte da Autoridade Tributária, visto que, por um lado, induziu em erro o Demandante quando concedeu a isenção de pagamento de IMT e IS previamente à aquisição dos imóveis em causa e, por outro lado, procedeu a liquidações adicionais de IMT e IS quando a lei concedia benefícios fiscais à Demandante obrigando indevidamente esta a pagar os referidos montantes;

-    Além do mais, a Autoridade Tributária não sustenta seu projecto de decisão ora em apreço e respectiva decisao final na existência de um entendimento perfilhado em orientação genérica, na doutrina ou jurisprudência, sendo manifesta a falta de fundamentação;

-    Deve a liquidação de IMT em apreço ser anulada por preterição de formalidade legal, violação dos princípios da colaboração e boa fé nos termos supra referidos (vd. art. 59.º da LGT, e art. 99.º/d do CPPT e n.º 2 do art. 266.º da C.R.P).

 

A Autoridade Tributária e Aduaneira alega, em síntese, o seguinte:

 

– A isenção de Sisa (IMT) e redução a 1/5 do Imposto do Selo prevista no nº1 do art. 20º do DL 423/83, de 5 de Dezembro, constitui um estímulo fiscal visando fomentar a actividade turística, beneficiando o investimento em empreendimentos turísticos a que venha a ser reconhecida utilidade turística, quer sejam novos, quer existentes, mas sejam objectos de remodelação, beneficiação ou reequipamento, ou que aumentem a sua capacidade, de acordo com o art. 5º do mesmo diploma legal;

–   É nesse desiderato que o nº2 do art. 20º refere que a isenção e a redução estabelecidas no número anterior verificar-se-ão também na transmissão a favor da empresa exploradora, no caso de a proprietária ser uma sociedade de locação financeira e a transmissão se operar ao abrigo e nos termos do contrato de locação financeira que determinou a aquisição do empreendimento pela sociedade transmitente;

–   O Contrato de Locação Financeira prevê expressamente que os imóveis adquiridos pelo Requerente serão demolidos para dar lugar à construção de um empreendimento hoteleiro designado por C…, cuja instalação continua a ser da responsabilidade da locatária, a sociedade “B…, S.A”;

– Não parece poder subsistir qualquer dúvida, quer dos Factos provados pelos documentos trazidos aos autos no Processo Administrativo (PA), quer do Despacho do Secretário de Estado de Turismo de 21.11.2016, que a Utilidade Turística prévia foi atribuída ao empreendimento “C…—…”, a requerimento apresentado pela B… S.A., sendo esta a empresa promotora e tem a responsabilidade de instalar o empreendimento turístico;

–   A aquisição subjacente às liquidações de IMT e IS impugnadas nos autos, em 21.12.2016, é uma segunda aquisição efectuada pelo A…, S.A. à B… S.A.;

–  Tanto assim, que a B… já beneficiou da isenção de IMT e de redução do I. Selo prevista no nº1 do art. 20º do DL 423/83, como se refere na Informação que integra o PA;

–   Não se trata de uma transmissão a favor da empresa exploradora, em que a proprietária é uma sociedade de locação financeira e a transmissão opera ao abrigo e nos termos do contrato de locação financeira a que se refere o nº2 do art. 20º do DL 423/83;

– Ressalta nomeadamente dos termos do contrato de locação financeira celebrado entre o Requerente e a B… S.A. (e factos do ponto 5º alínea a) a d) da Resposta), que a aquisição por parte do Requerente se destina apenas a financiar a B… S.A., a qual, como locatária, continua a ter a obrigação de construir/instalar o empreendimento;

-   Quanto ao conceito de Instalação, veja-se o Acórdão do STA nº 3/2013, processo nº 968/12 – 2ª Secção, que uniformiza a jurisprudência nos seguintes termos: “O conceito de ‘instalação’ para efeitos dos benefícios a que se reporta o nº1 do art. 20º do Decreto-Lei nº 423/83, de 5 de Dezembro, reporta-se à aquisição de prédios (ou de fracções autónomas) para construção de empreendimentos turísticos, depois de devidamente licenciadas as respectivas operações urbanísticas, visando beneficiar as empresas que se dedicam à actividade de promoção/criação dos mesmos e não os adquirentes de fracções autónomas em empreendimentos construídos/instalados em regime de propriedade plural, uma vez que esta tem a ver com a ‘exploração’ e não com a ‘instalação’.” ;

-   A instalação emerge como um procedimento que compreende os actos jurídicos e os trâmites tendentes ao licenciamento (em sentido amplo, compreendendo comunicações prévias ou autorizações, conforme o caso) das operações urbanísticas necessárias à construção de um empreendimento turístico, bem como a obtenção dos títulos que o tornem apto a funcionar e a ser explorado para finalidade turística, não podendo estar incluído no conceito de instalação, a simples aquisição de um empreendimento por uma entidade bancária, cujo seu objecto de actividade não é de promover empreendimentos turísticos;

-  A intenção do legislador do DL 423/83, de 5.12, foi atribuir o benefício da isenção de IMT à transmissão onerosa de imóvel urbano que tenha sido adquirido quer para a instalação de empreendimento turístico novo, quer para a realização de obras de remodelação, beneficiação ou de reequipamento totais ou parciais (previamente submetidas à aprovação do Turismo de Portugal, IP), de empreendimento turístico já existente;

-  Só há que reconhecer benefícios fiscais às aquisições onerosas com destino à instalação e abertura ao público de empreendimentos novos e nos casos previstos nas alíneas b) e c) do nº1 art. 5º do DL nº 423/83, pelo titular que figurar no despacho de qualificação de utilidade turística publicado em Diário da República, conforme o disposto no nº2 do art. 7º do DL 423/83;

-    A aquisição do Requerente não se enquadra na letra do nº1 do art. 20º do DL 423/83, nem na teleologia da norma, para poder beneficiar da isenção de IMT e de IS;

-    Afigura-se destituída de todo e qualquer fundamento a alegada violação das legitimas expectativas e garantias do requerente e dos princípios da confiança e da boa fé, na medida em que as liquidações impugnadas foram emitidas dentro do prazo de caducidade, têm como base a interpretação da lei aplicável aos factos apurados, não podendo a administração fiscal, adstrita ao princípio da legalidade, deixar de liquidar e cobrar os impostos devidos;

-  Assim, em face de tudo o quanto vem ante dito, não se poderá nunca, salvo melhor opinião, considerar que tenha existido erro imputável aos serviços, na emissão das liquidações em causa, condição indispensável para a condenação no pagamento de juros indemnizatórios, nos termos do art.º 43.º n.º 1 da LGT.

 

3.2. Apreciação da questão

 

No Acórdão proferido no processo arbitral n.º 17/2016 T, em 05-07-2016, num caso em tudo idêntico ao que se discute nos presentes autos, a questão sub judice, que se resume a saber se à data da aquisição pelo Requerente (21.12.2016) dos imóveis alienados pela B… S.A., podia beneficiar, ou não, da isenção prevista no art. 20º do Decreto-Lei nº 423/83, de 05-12, foi apreciada e decidida do modo como se transcreve:

A Requerente defende, em primeiro lugar, que a sua situação se enquadra no teor literal do artigo 20.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 423/83, de 5 de Dezembro, e que não é relevante se o adquirente do prédio é ou não o promotor imobiliário, mas apenas se a aquisição faz ou não parte do processo de instalação do empreendimento turístico.

De facto, o artigo 20.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 423/83, de 5 de Dezembro, atribui a isenção às «aquisições de prédios ou de fracções autónomas com destino à instalação de empreendimentos qualificados de utilidade turística», pelo que se trata de uma isenção de natureza objectiva, que não depende da natureza da entidade adquirente.

A jurisprudência do acórdão uniformizador n.º 3/2013, de 23-01-2013, publicado no Diário da República, I Série, de 04-03-2013, citado pela Autoridade Tributária e Aduaneira, não afasta também a aplicação da isenção.

Na verdade, refere-se aí que o conceito de instalação se reporta «à aquisição de prédios (ou de fracções autónomas) para construção de empreendimentos turísticos, depois de devidamente licenciadas as respectivas operações urbanísticas, visando beneficiar as empresas que se dedicam à actividade de promoção/criação dos mesmos e não os adquirentes de fracções autónomas em empreendimentos construídos/instalados em regime de propriedade plural, uma vez que esta tem a ver com a «exploração» e não com a «instalação».

Na verdade, o B… - … não se enquadra na situação que neste acórdão se refere não ser abrangida pela isenção, pois, não é adquirente de prédio em que existisse empreendimento turístico construído ou já instalado, nem visou proceder à sua exploração, mas sim possibilitar à empresa promotora do empreendimento a disponibilidade de meios financeiros para o concretizar.

Por outro lado, a aquisição ocorreu em 29-11-2007, depois de licenciadas as respectivas operações urbanísticas através do alvará de 14-11-2007, pelo que a situação da Requerente, quanto a este ponto, satisfaz a exigência que naquele acórdão uniformizador se faz de a aquisição se fazer «depois de devidamente licenciadas as respectivas operações urbanísticas».

Assim, não se vê suporte factual para a Autoridade Tributária e Aduaneira entender afastar a isenção com fundamento na jurisprudência do acórdão uniformizador referido, que se pronunciou sobre a não aplicação a quem adquire imóveis com empreendimentos turísticos já instalados, com a finalidade de proceder à sua exploração.

Por outro lado, se é certo que a isenção tem em vista beneficiar as empresas que se dedicam à actividade de promoção e criação dos empreendimentos turísticos, também o é que o B… - …, através da aquisição seguida de locação, participou nessa actividade de promoção e criação, através do financiamento por via da locação, actividade que só terminou posteriormente à aquisição, em 09-03-2009, quando foi emitido o alvará de utilização.

O n.º 2 do artigo 20.º do Decreto-Lei n.º 423/83, ao estabelecer que «a isenção e a redução estabelecidas no número anterior verificar-se-ão também na transmissão a favor da empresa exploradora, no caso de a proprietária ser uma sociedade de locação financeira e a transmissão se operar ao abrigo e nos termos do contrato de locação financeira que determinou a aquisição do empreendimento pela sociedade transmitente», inculca a interpretação de que a sociedade de locação financeira que adquiriu o imóvel destinado ao empreendimento beneficia da isenção referida no n.º 1, sendo essa a explicação para a inclusão da palavra «também» que pressupõe que, na situação descrita, se está perante uma segunda isenção relativa ao mesmo empreendimento turístico.

Aliás, é esta interpretação – ie., de que tanto a transmissão para a sociedade que adquire o imóvel destinado a um empreendimento turístico no âmbito de um contrato de locação financeira, como a posterior transmissão para quem o promoveu e vai explorar estão isentas de IMT – que se compagina com o objectivo de incentivar a criação de empreendimentos de utilidade turística, que deixaria de existir se alguma dessas transmissões fosse onerada com a tributação. Do mesmo modo diga-se que, nenhum elemento – literal ou sistemático – dos n.os 1 e 2 do artigo 20.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 423/83, de 5 de Dezembro, permite concluir que uma operação como aquela em apreço (sale lease back) – e, de resto, qualquer cessão/transmissão similar àquela sem que o empreendimento ou hotel esteja já instalado na data da cessão/transmissão – não possa beneficiar do benefício respectivo, muito pelo contrário como vimos. Na verdade, não se pode duvidar que, se a empresa de locação financeira que adquire um imóvel para o transmitir para a empresa que promoveu e vai explorar o empreendimento turístico tiver de suportar IMT, esse encargo irá repercutir-se nesta empresa.

Pelo exposto, tanto a letra da lei como a sua razão de ser conduzem à conclusão de que a isenção de IMT se aplica à aquisição efectuada pelo B… - ….

Consequentemente, a liquidação impugnada enferma de vício de violação de lei, por erro sobre os pressupostos de direito, que justifica a sua anulação [artigo 163.º, n.º 1, do Código do Procedimento Administrativo de 2015, subsidiariamente aplicável por força do disposto no artigo 2.º, alínea c), da LGT].”

 

Ora, também no caso em presença o A…, através de uma operação designada na gíria por “sale and lease back” (aquisição seguida de locação/transmissão) proporcionou à Sociedade B… os meios financeiros necessários à aquisição de prédios destinados à instalação de empreendimento previamente qualificado de utilidade turística, in casu designado “C…–…”, ainda antes de o mesmo estar concluído ou instalado, pelo que, por essa via, é incontornável afirmar-se que também o Requerente participou no fomento ou incentivo à actividade de promoção, criação e instalação de empreendimento turístico – escopo das citadas normas do DL n.º 423/83.

Com efeito, é inquestionável que a aquisição pela Requerente daqueles imóveis se coaduna com o disposto no aludido DL, em particular no n.º 1 do artigo 20.º, dado que a aquisição tem por destino a instalação de empreendimentos qualificados de utilidade turística.

De facto, a AT questiona unicamente a possibilidade de usufruto destes benefícios na esfera da Requerente, e não as transmissões ocorridas anteriormente, numa possível lógica de benefício “em cascata”, cujo racional económico e fiscal poderia ser objeto de discussão se não estivéssemos perante uma isenção objetiva.

Enquanto tal, não se vislumbrando razão válida para divergir da argumentação expandida no Acórdão supra aludido e parcialmente transcrito – fundamentação essa que se acolhe e aqui dá por integrada - , resta afirmar que a operação levada a cabo pelo Requerente está perfeitamente compaginada com o disposto nos n.ºs 1 e 2 do artigo 20.º, de 5 de Dezembro, e concluir que as liquidações impugnadas enfermam de vício de violação de lei, por erro sobre os pressupostos de direito, que justifica a sua anulação, nos termos do preceituado no artigo 163.º, n.º 1, do Código do Procedimento Administrativo de 2015, subsidiariamente aplicável por força do disposto no artigo 2.º, alínea c), da LGT.

 

4. Juros indemnizatórios

 

A Requerente pede também que seja determinada a devolução da quantia paga acrescida de juros indemnizatórios calculados desde a data do pagamento do imposto até à data da devolução.

De harmonia com o disposto na alínea b) do art. 24.º do RJAT a decisão arbitral sobre o mérito da pretensão de que não caiba recurso ou impugnação vincula a administração tributária a partir do termo do prazo previsto para o recurso ou impugnação, devendo esta, nos exactos termos da procedência da decisão arbitral a favor do sujeito passivo e até ao termo do prazo previsto para a execução espontânea das sentenças dos tribunais judiciais tributários, «restabelecer a situação que existiria se o acto tributário objecto da decisão arbitral não tivesse sido praticado, adoptando os actos e operações necessários para o efeito», o que está em sintonia com o preceituado no art. 100.º da LGT [aplicável por força do disposto na alínea a) do n.º 1 do art. 29.º do RJAT] que estabelece, que «a administração tributária está obrigada, em caso de procedência total ou parcial de reclamação, impugnação judicial ou recurso a favor do sujeito passivo, à imediata e plena reconstituição da legalidade do acto ou situação objecto do litígio, compreendendo o pagamento de juros indemnizatórios, se for caso disso, a partir do termo do prazo da execução da decisão».

Embora o art. 2.º, n.º 1, alíneas a) e b), do RJAT utilize a expressão «declaração de ilegalidade» para definir a competência dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD, não fazendo referência a decisões condenatórias, deverá entender-se que se compreendem nas suas competências os poderes que em processo de impugnação judicial são atribuídos aos tribunais tributários, sendo essa a interpretação que se sintoniza com o sentido da autorização legislativa em que o Governo se baseou para aprovar o RJAT, em que se proclama, como primeira directriz, que «o processo arbitral tributário deve constituir um meio processual alternativo ao processo de impugnação judicial e à acção para o reconhecimento de um direito ou interesse legítimo em matéria tributária» (artigo 124.º, n.º 2, da Lei 3-B/2010, de 28-04, Orçamento de Estado para 2010) .

O processo de impugnação judicial, apesar de ser essencialmente um processo de anulação de actos tributários, admite a condenação da Administração Tributária no pagamento de juros indemnizatórios, como se depreende do art. 43.º, n.º 1, da LGT, em que se estabelece que «são devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido» e do art. 61.º, n.º 4 do CPPT (na redacção dada pela Lei n.º 55-A/2010, de 31 de Dezembro, a que corresponde o n.º 2 na redacção inicial), que «se a decisão que reconheceu o direito a juros indemnizatórios for judicial, o prazo de pagamento conta-se a partir do início do prazo da sua execução espontânea».

Assim, o n.º 5 do art. 24.º do RJAT ao dizer que «é devido o pagamento de juros, independentemente da sua natureza, nos termos previstos na Lei Geral Tributária e no Código de Procedimento e de Processo Tributário» deve ser entendido como permitindo o reconhecimento do direito a juros indemnizatórios no processo arbitral.

Cumpre, assim, apreciar o pedido da devolução do montante indevidamente pago, acrescido de juros indemnizatórios.

No caso em apreço, é manifesto que, na sequência da ilegalidade dos actos de liquidação, há lugar a devolução do imposto pago, por força dos referidos arts. 24.º, n.º 1, alínea b), do RJAT e 100.º da LGT, pois tal é essencial para «restabelecer a situação que existiria se o acto tributário objecto da decisão arbitral não tivesse sido praticado».

No que concerne aos juros indemnizatórios, é também claro que, na sequência da declaração de ilegalidade da liquidação, há lugar ao pagamento de juros indemnizatórios, pois aquela ilegalidade é imputável à Administração Tributária, que, por sua iniciativa, efectuou a liquidação.

Consequentemente, a Requerente tem direito a juros indemnizatórios, nos termos do artigo 43.º, n.º 1, da LGT e do artigo 61.º do CPPT, calculados sobre a quantia que pagou indevidamente, à taxa dos juros legais prevista no artigo 559.º do Código Civil e, actualmente, na Portaria n.º 291/2003, de 8 de Abril (artigos 43.º, n.º 4, e 35.º, n.º 10, da LGT), desde a data que em que efectuou o pagamento, 19-10-2015, até ao reembolso da quantia paga.

 

5.  Extinção de Processos Contraordenacionais

 

A Requerente pede ainda que se ordene a extinção de quaisquer processos contraordenacionais subjacentes aos actos de liquidação anulados.

Todavia, esse pedido excede, notoriamente, as competências deste tribunal arbitral, à luz do que preceitua o artigo 2.º do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (RJAT), pelo que dele não pode conhecer-se.

 

6. Decisão

 

De harmonia com o exposto, acordam neste Tribunal Arbitral:

 

Nestes termos, acordam neste Tribunal Arbitral em:

  1. Julgar procedente o pedido de pronúncia arbitral;
  2. Anular as liquidações de IMT e IS relativas à aquisição dos prédios urbanos inscritos na matriz predial da freguesia …, concelho de Lisboa, sob os artigos … e …, notificadas pelos ofícios n.ºs … e …, ambos de 19 de Julho de 2017, nos montantes de € 168.975,78 (IMT), € 18.024,08 (IS), € 93.o71,12 (IMT) e 9.927,58 (IS), respectivamente, com fundamento na sua ilegalidade por violação de lei;
  3. Condenar a Autoridade Tributária e Aduaneira a reembolsar à Requerente da quantia de € 289.998,56, acrescida de juros indemnizatórios, à taxa dos juros legais prevista no artigo 559.º do Código Civil e, actualmente, na Portaria n.º 291/2003, de 8 de Abril (artigos 43.º, n.º 4, e 35.º, n.º 10, da LGT), desde 04-09-2017, até ao reembolso da quantia paga.

 

7. Valor do processo

 

De harmonia com o disposto nos arts. 306.º, n.º 2, do CPC,  97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT, 12.º, n.º 2, do RJAT, 3.º, n.º 2, e 4.º, n.º 5, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária fixa-se ao processo o valor de € 289.998,56.

 

8. Custas

 

Nos termos do art. 22.º, n.º 4, do RJAT, fixa-se o montante das custas em € 5.202,00, nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, a cargo da Requerida.

 

Lisboa, 25-05-2018

Os Árbitros

 

 

(José Poças Falcão)

 

 

(Sérgio Santos Pereira)

 

 

(A. Sérgio de Matos)