Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 345/2019-T
Data da decisão: 2020-03-17  IRC  
Valor do pedido: € 101.835,22
Tema: IRC – Variações de justo valor.
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DECISÃO ARBITRAL (consultar versão completa no PDF)

Os árbitros José Poças Falcão (árbitro-presidente), Sérgio Pontes e Jónatas Machado (árbitros vogais), designa¬dos pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD) para formarem o Tribunal Arbitral, acordam no seguinte:

 

I. Relatório

1. A..., S.A. (A...), titular do número de identificação fiscal ..., matriculada na Conservatória do Registo Comercial de Lisboa sob o mesmo número, com sede social na Rua ..., n.º..., Lisboa (doravante designada por "Requerente”), vem solicitar a constituição de Tribunal Arbitral, nos termos e para os efeitos do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º e no artigo 10.º do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária ("RJAT"), apresentando pedido de pronúncia arbitral que tem por objeto a liquidação adicional de IRC n.º 2018..., relativa a IRC alegadamente devido por referência ao período de tributação de 2013, bem como a respetiva liquidação de juros compensatórios n.º 2018... e liquidação de juros de mora n.º 2018... e a consequente demonstração de acerto de contas n.º 2018..., atento o disposto na alínea a) do n.º 3 do artigo 5.º do RJAT.

2. O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD na data de 17.05.2019 e automaticamente notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira (doravante designada por AT ou Requerida).

3. A Requerente não procedeu à nomeação de árbitro, pelo que, nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, o Senhor Presidente do Conselho Deontológico do CAAD designou os signatários como árbitros do tribunal arbitral coletivo, que comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável.

 

4. As partes foram devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a designação dos árbitros, nos termos conjugados do artigo 11.º, n.º 1, alíneas a) e b), do RJAT, e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.

 

5. Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, o Tribunal Arbitral ficou constituído em 29.07.2019.

 

6. Tendo havido renúncia ao mandato em de 04.02.2020, prosseguiu o processo com novo mandatário em 28.02.2020.  

 

7. Serviram de base à presente lide os seguintes trâmites procedimentais:

a)            No âmbito da ordem de serviço n.º OI2016..., com despacho de 19.10.2017, respeitante à Requerente A..., S.A, a AT procedeu a uma ação de inspeção externa, com referência ao período de tributação de 2013;

b)           A Requerente foi notificada do projeto de relatório, através do ofício ... de 23.02.2018, nos termos do art.º 60.º da LGT e do art.º 60.º do RCPITA, para, no prazo de 15 dias, querendo, exercer o direito de audição sobre as correções propostas, tendo a mesma, 14.03.2018, por email, efetivado o seu direito de audição;

c)            Nos termos do projeto de relatório da inspeção tributária, os técnicos da AT propuseram um conjunto de correções à matéria coletável do IRC apurada pela Requerente no exercício de 2013, no montante total de € 10.558.739,90, abaixo detalhados, passando a Requerente a ter lucro tributável ao invés de prejuízo fiscal, com implicações em sede de tributação autónoma:

 

 

 

d)           A Requerente foi notificada do RIT, através do Ofício ... de 02.04.2018, com registo CTT...PT, e, a 16.04.2018, da liquidação adicional de IRC n.º 2018..., referente ao exercício de 2013, juntamente com a liquidação de juros compensatórios n.º 2018..., a liquidação de juros de mora n.º 2018... e a demonstração de acerto de contas n.º 2018...;

e)           A Requerente impugnou administrativamente o ato tributário da liquidação adicional, por via da reclamação graciosa, a 17.09.2018, não tendo exercido o direito de audição para que foi notificada, tendo a mesma sido indeferida por despacho de 11.02.2019, que confirmou, na integra, as correções efetuadas aquando da inspeção externa, sem alterar a sua fundamentação, optando a Requerente por impugnar diretamente a liquidação adicional de IRC n.º 2018... perante um tribunal arbitral.

8. A fundamentar o presente pedido, a Requerente vem aos autos afirmar, em síntese, o seguinte: 

Tempestividade

a)            A Requerente foi avisada, no dia 12.02.2019, através de Via CTT, da disponibilização do documento que dava conta do indeferimento do processo de Reclamação Graciosa, sendo que, nos termos do disposto no n.º 10 do artigo 39.º do CPPT, e tendo em consideração que a notificação foi efetuada para o domicílio fiscal eletrónico da Requerente, a mesma considera-se notificada no quinto dia posterior ao da disponibilização da notificação, ou seja, a 17.02.2019;

b)           Nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 10.º do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária e do n.º1 do artigo 102.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, a Requerente dispõe de 90 dias para pedir a constituição do Tribunal Arbitral, sendo por isso este pedido tempestivo;

 

Contestação da correção ao lucro tributável

c)            A Requerente é um sujeito passivo de IRC, encontrando-se sujeita ao regime geral de tributação em sede deste imposto, tendo como objeto social o "comércio de comissões e consignações, podendo também participar em negócios de outras empresas singulares ou coletivas, ou associar-se com elas, subscrevendo ou adquirindo ações, quotas ou partes sociais", tendo, a partir do ano de 2009, adotado estrategicamente o estatuto de holding de investimentos e iniciado a centralização da sua atividade na área financeira;

d)           A Requerente procedeu, por transmissão eletrónica de dados, à submissão da declaração periódica de rendimentos Modelo 22 do IRC, referente ao período de tributação de 2013 no dia 28.05.2014 - conforme declaração Modelo 22 de IRC de 2013 apurando um prejuízo fiscal de € 6.931,273,80. (Documento n.° 5);

e)           A Requerente contesta a correção ao lucro tributável do exercício de 2013, relativa aos ajustamentos decorrentes da aplicação do justo valor, na importância de € 5.226.529,69, promovida pelos SIT por desconsideração do montante a deduzir, inscrito no Campo 759 do Quadro 07 da Declaração de Rendimentos Modelo 22 – Ajustamentos não tributados decorrentes da aplicação do justo valor, pugnando pela ilegalidade da mesma e peticionado a sua anulação;

f)            A reserva de justo valor foi criada em 2006 e mantida por imposição dos auditores externos, tendo os atuais auditores discordado da manutenção da reserva registada no capital próprio, sendo em sequência os valores da mesma transferidos para uma conta de rendimentos/ganhos em alienação de investimentos financeiros, ou seja, trata-se de lançamentos corretivos aos registos que terão sido efetuados nos exercícios em que se realizaram as alienações;

g)            De acordo com as notas às demonstrações financeiras, presentes nos diversos Relatórios e Contas do Requerente, nomeadamente as relativas ao "Reconhecimento dos Investimentos ao justo valor", a evolução do justo valor da participação da sociedade B... e o respetivo reflexo contabilístico foi a seguinte, tal como se observa no mapa infra, a que há ainda de acrescentar duas diminuições de justo valor, em 2010 e 2011, respetivamente de 42 000€ de  50 000€:

 

h)           A participação na sociedade B..., S.A., a que corresponde a variação de justo valor de €4.888.685,51, foi alienada em duas tranches, consistindo a primeira numa alienação, em 21.09.2011, à C..., S.A., de 270.000 ações representativas de 60% do capital daquela sociedade, por 3 milhões de euros, e a segunda das restantes 180.000 ações, representativas de 40% do capital, que foram entregues à C..., pelo valor de  2 milhões de euros, a título de entrada em espécie para a realização do aumento de capital, aprovado a 14.10.2011, tendo como contrapartida ações da C...; (Documento 23)

i)             Relativamente à 1.ª tranche, entende a Requerente que eventuais mais-valias ou menos-valias não concorreriam para o lucro tributável, ao abrigo do n.º 1 do art.º 18.º-A, do Decreto-Lei n.º 442-B/88, que afasta os ganhos e perdas realizados com a transmissão onerosa de partes sociais cuja aquisição tenha ocorrido antes da entrada em vigor do CIRC, adiantando que se tornou titular das ações da B..., na data da sua constituição, em 23.06.2003, com o capital social de €450.000,00, tendo realizado o capital subscrito mediante a entrega das quotas que detinha em duas sociedades, uma (D..., Lda)  constituída em 1980 e a outra (E...) constituída em 1995, sendo que, no final, 68,5% do capital B... correspondia à parte do capital proveniente da D..., com data de 28.10.1980,  31,35% correspondia à parte do capital social proveniente da E..., com data de 17.02.1995, e 0,15% a entradas em dinheiro, com data de 26.06.2003, datas relevantes, desde logo, para a aplicação do critério de valorimetria FIFO (First in, First out”; (Documentos 20, 21 e 22)

j)             A alienação da 2.ª tranche, compreendida por 180.000 ações da B..., entregues em espécie à C... para a realização do aumento do capital desta sociedade, consistiu numa operação de “permuta de partes sociais”, à luz da definição do n.º 5 do art.º 73.º do CIRC, estando, por isso, abrangida pelo regime especial de diferimento previsto no art.º 71.º (atual 77.º ) do CIRC, pelo que a mais-valia não foi tributada;

k)            A F... teve origem na cisão da B... concentrando em si todos os ativos e passivos desta, situação relevante em termos fiscais nos termos do artigo 74.º, n.3, do CIRC; (Documento 17) 

l)             Segundo o Relatório e Contas de 2011 da Requerente, a F..., em sede de reavaliação, aumentou o seu justo valor no montante de € 351.296,92, entre outros aumentos elativos a "Correções de Capitais Próprios" e "Aumentos de participação", o que corresponde ao valor contabilizado na conta #552257 como regularização reservas IAS 39, comprovando que o aumento da participação da sociedade correspondeu, apenas e só, a um aumento do justo valor; (Documento 18)

m)          No ano seguinte ao da constituição da F..., a Requerente alienou as ações da F... à sociedade G..., S.A., em duas tranches: uma, em 23.01.2012, de 25.000 ações, representativas de 50% do capital, por um milhão de euros, e outra, no dia 27.01.2012, mediante a entrega das restantes 25.000 ações, representativas de 50% do capital, avaliadas num milhão de euros, para realização da entrada em espécie relativa ao aumento de capital da sociedade G..., tendo como contrapartida ações da mesma, dado relevante para a aplicação do regime de neutralidade fiscal do artigo 77.º do CIRC; 

n)           As datas de aquisição das 50.000 ações da F... reportam às datas de aquisição das ações da sociedade cindida – a B...- em resultado do disposto no n.º 3 do art.º 18.º-A do Decreto-Lei n.º 442-B/88 e do n.º 3 do art.º 47.º do CIRC, ou seja, 68,5% das ações têm como data de aquisição o ano de 1980, 31,35% o ano de 1995 e 0,15%, o ano de 2003, aplicando-se à alienação do primeiro lote de 25 000 ações, em 23.01.2012, de acordo com o critério FIFO, a referida exclusão por se reportar a uma aquisição de 1980;

o)           A participação na sociedade H..., Lda (H...) não deixou de integrar a lista de investimentos financeiros mensurados pelo justo valor, nos anos de 2007 (em que já constam valores) a 2010, só tendo sido alienada em 2011, como resulta de ata da assembleia geral que aprovou a deliberação de venda, verificando-se, na conta # 552245, que a variação do justo valor desta participação era negativa, de (-) €13.452,74, pelo que se, no exercício da alienação da participação, tivesse sido apurada e registada na contabilidade uma menos-valia, uma vez que o justo valor era negativo, o respetivo valor deveria ser acrescido ao lucro tributável, por força do n.º 5 do art.º 23.º do CIRC, na redação em vigor à data dos factos, pelo que o resultado tributável não seria influenciado pela menos-valia;

p)           Desde a diminuição do justo valor da sociedade H..., no montante de - € 13.453,00, não se verificaram outras variações, o que coincide com o valor de regularização de reservas da IAS 39 registado na conta #552245 - conforme Extrato oficial da conta #552245; (Documento n.° 19)

q)           Como o saldo da conta #78621 reflete o valor agregado das variações de justo valor positivas e negativas (€4.888.685,51 + €351.296,92 - €13.452,74), a Requerente expurgou esse valor do lucro tributável de 2013, para que não ficasse influenciado nem pelos valores positivos nem pelo negativo;

r)            De acordo com os princípios contabilísticos, em especial desde a introdução das normas internacionais de contabilidade em 2006, o justo valor das três participações financeiras supra referidas foi sendo reconhecido em subcontas da classe #5522 - Outras reservas (Reservas IAS), conforme extratos das três subcontas; (Documento n.° 11, 18 e 19)

s)            A AT reconheceu que entre 2006 e 2013 a Requerente nunca relevou contabilisticamente em resultados as variações de justo valor das participações em causa, tendo movimentado para o efeito contas de capital próprio, reconhecendo assim que os montantes aqui em causa dizem respeito a variações do justo valor das participadas da Requerente e concluindo que esse justo valor foi contabilizado em reservas e não no resultado líquido, conforme tratamento contabilístico preconizado pelo IAS 39 e adotado pela Requerente; (Documento 10)

t)            Uma vez que, na situação concreta, as partes de capital não estavam reconhecidas pelo justo valor através de resultados, os ajustamentos de justo valor não foram relevantes do ponto de vista fiscal no momento do seu reconhecimento contabilístico, apenas "sendo imputados como rendimentos ou gastos no período de tributação em que os elementos ou direitos que lhes deram origem sejam alienados, exercidos, extintos ou liquidados", (sublinhado da Requerente) conforme n.º 9 do art.º 18º do CIRC; 

u)           No momento da alienação das participações da B..., F... e H... não houve lugar a tributação, isto é, essas alienações não foram relevantes do ponto de vista fiscal, por aplicação de uma série de exclusões tributárias, nomeadamente relacionadas com o disposto no Decreto-Lei n.º 442-B/88 de 30 de novembro e com o regime da neutralidade fiscal previsto no atual artigo 77.º do CIRC.

v)            Acresce que alienação onerosa das três participações financeiras ocorreu em exercício anterior a 2013 (mais propriamente, em 2011, no caso da B..., em 2012, no que respeita à F..., e em 2011, no que respeita à H...), não havendo fundamento legal para a tributação de eventuais mais valias - que se encontravam excluídas de tributação - num ano diferente do da respetiva transmissão onerosa, em violação do princípio da especialização dos exercícios;

w)          O valor tributado pelos Serviços de Inspeção no montante de € 351.296,92 refere-se se refere a variações de justo valor da participada F..., a qual, sendo fiscalmente relevante no exercício de 2012, a transmissão realizada a tornou efetiva, nos termos do disposto na alínea b) do n.º 1 do no art.º 46º do CIRC, em 2012, não foi tributada em resultado de um conjunto de exclusões fiscais mencionadas, não podendo sê-lo no exercício de 2013, como resulta da A situação em dissídio nada tem a ver com a Informação Vinculativa Ficha Doutrinária referente ao Processo n.º 451/2011 (Despacho de 11-03-2011 do Diretor-Geral; PIV n.º 1787).

x)            O justo valor associado à participação da B..., no montante de € 4.888.685,51, e o de € 351.296,92 da participada F... permaneceram nas demonstrações financeiras da Requerente após a transmissão onerosa das ações, em 2011 e 2012 apenas sendo desreconhecidos em 2013, pelo facto de os auditores externos consideraram que, uma vez que a alienação onerosa tinha sido efetuada a uma empresa já participada pela Requerente, não deveria esta reconhecer contabilisticamente o ganho a ela associado, alegadamente de acordo com a Norma Internacional de Relato Financeiro 11 – "Acordos Conjuntos, posição que que foi alterada pela subsequente mudança de auditores externos;

y)            A transmissão onerosa da totalidade das ações da H... detidas pela Requerente, ocorreu em 2011, sendo a sociedade compradora a I..., e gerando uma menos valia fiscal, uma vez que justo valor regularizado era negativo, pelo que o resultado tributável de 2011 não incluiu qualquer gasto relacionado com o reconhecimento do justo valor realizado, não tendo a Requerente não acresceu qualquer montante no Quadro 07 desse ano. Por indicação dos auditores externos à data, e pelas mesmas razões, essa transmissão também não foi reconhecida contabilisticamente em 2011, posição que viria a ser alterada, com os novos auditores, em 2013;

z)            Considerando que o valor deduzido pelos Serviços de Inspeção no montante de € 13.452,74 se refere a variações de justo valor da participada H..., fiscalmente relevante em 2006, ano em que correu a transmissão onerosa do capital desta sociedade, a mesma nunca poderia adquirir relevância fiscal em 2013.

9. Em face do exposto, a Requerente vem pedir que o presente tribunal conclua pela anulação da correção promovida em sede de inspeção tributária por considerar que o valor que a AT acresceu a título de ajustamentos não tributáveis decorrentes da aplicação do justo valor, não deveriam de facto, e pela argumentação utilizada, ser tributados, e também da demonstração de liquidação de IRC e respetivas demonstrações de liquidação de juros e de acerto de contas supra identificadas, por entender que padecem de erro sobre os pressupostos de facto e de direito. Pede ainda a condenação da AT no pagamento de juros indemnizatórios sustentando que o erro na liquidação do IRC se deve integralmente a um erro imputável aos serviços, em harmonia com o disposto no n.º 1 do art. 43º da LGT e no n.º 5 do art. 24° do RJAT.

10. A Requerida respondeu por exceção e impugnação, sustentando que o presente pedido deve ser julgado improcedente, com os seguintes fundamentos:

Exceção: intempestividade da impugnação

a)            O art.º 10º do RJAT estabelece, quanto a atos de liquidação, que o prazo para apresentar o pedido de pronúncia arbitral é de 90 (noventa) dias, remetendo, quanto ao momento do início de contagem, para aquilo que se mostra preceituado nos n.ºs 1 e 2 art.º 102.º, do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT);

b)           A Requerente, no intróito do ppa, refere que vem deduzir impugnação contra o ato tributário liquidação adicional de IRC n.º 2018...;

c)            A liquidação adicional impugnada foi notificada à Requerente a 16.04.2018 (cf. Doc. 1 que ora se junta e aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais), termos em que teria como termo inicial o dia 16.05.2018, pelo que deveria ter sido impugnada até 14.08.2019, o que não sucedeu;

d)           A Requerente impugnou administrativamente o ato tributário da liquidação adicional, por via da reclamação graciosa, tendo-o feito a 17.09.2018;

e)           A AT indeferiu/negou a reclamação do ato na dimensão que lhe havia sido solicitada, por despacho de 11.02.2019;

f)            A Requerente não formulou/concretizou ao Tribunal qualquer pedido tendente à anulação do que nessa sede foi decidido ou estivesse por decidir, nem sequer fez qualquer referência a tal procedimento, o qual, aliás, se reportava à primeira liquidação, e não ao ato tributário que veio aqui impugnar.

g)            O pedido tendente à constituição do tribunal arbitral foi apresentado a 16.05. 2019, muito depois de ultrapassados os 90 dias para apresentação do pedido arbitral.

h)           O prazo legalmente definido para deduzir impugnação contra o ato tributário de liquidação adicional de IRC n.º 2018... foi ultrapassado;

Impugnação

i)             O direito de audição foi exercido pela Requerente, a 14.03.2018, por comunicação enviada por email;

j)             A AT cumpriu escrupulosamente com o princípio do inquisitório quando, mesmo após o exercício do direito de audição em sede inspetiva, solicitou telefonicamente, esclarecimentos sobre a composição do montante em causa € 5.226.529,69;

Correções ao lucro tributável

k)            A Requerente deduziu no apuramento do lucro tributável o saldo da conta #78621- Rendimentos e ganhos nos restantes ativos financeiros - alienações, no montante de € 5.226.529,69, justificados no Relatório & Contas de 2013 como respeitando a um acerto efetuado na sequência de alienações ocorridas em exercícios anteriores de um conjunto de participações financeiras a uma sociedade do grupo, a saber, a J..., em 2012;

l)             Solicitados esclarecimentos sobre a natureza e origem daqueles rendimentos, as explicações obtidas e os elementos fornecidos, no âmbito do exercício do direito de audição, não lograram fazer luz sobre a questão de fundo, de saber por que motivo os valores transferidos de uma conta de reservas de justo valor para a conta 78621 estavam associados a participações sociais alienadas em exercícios anteriores, sem qualquer respaldo contabilístico ou nas obrigações declarativas da Requerente;

m)          A declaração de que a reserva de justo valor havia sido criada em 2006 e mantida por imposição dos auditores externos não encontra suporte em qualquer documento que a atestasse, o mesmo sucedendo com a asserção, em 2013, de que os atuais auditores discordaram da manutenção da reserva registada no capital próprio estando aí a justificação para a transferência desses valores para uma conta de rendimentos/ganhos em alienação de investimentos financeiros, tratando-se, assim, de lançamentos corretivos aos registos que terão sido efetuados nos exercícios em que se realizaram as alienações;

n)           O conjunto mais vasto de documentos junto ao processo administrativo – que não tinham sido juntos quer ao procedimento inspetivo, quer à reclamação gracios – além de ainda não suprir todas as lacunas de informação, peca, em alguns aspetos, por falta de rigor; 

o)           A falta de rigor manifesta-se, por exemplo, no facto de o Documento 9 permitir a identificação das participações sociais e as correspondentes variações de justo valor acumuladas e o Documento 18 revelar os movimentos das variações de justo valor atinentes à participação na sociedade G..., cujo saldo final é de €351.296,92, verificando-se, quer na descrição dos factos, quer na argumentação desenvolvida para defender a tese da ilegalidade da correção, que a participação nesta sociedade, criada em 2010, é substituída pela F..., S.A., cuja constituição resultou de uma operação de cisão simples da B... S.A, realizada em 2011, sendo que, muito embora a participação da Requerente na F... tenha sido alienada à sociedade G...., S.A., em 2012, não se encontra explicação para a troca na identificação das participações; 

p)           Um outro exemplo de falta de rigor observa-se no facto de que a participação na sociedade H... ter deixado de figurar nas listas dos Investimentos Financeiros, incluídas nos Relatórios & Contas da Requerente, a partir de 2008 (V., Docs. 14, 15 e 16) – no R&Contas de 2007 (Doc. 13) ainda aparece a H... mas sem qualquer valor no saldo inicial e final – embora o Documento 32 reproduza a ata da Assembleia Geral dos sócios desta sociedade, datada de 30.03.2011, em que foi aprovada a deliberação de alienar as participações à I... (99% do capital) e a K... (1%), verificando-se no extrato da conta # 552245 que a variação do justo valor desta participação era negativa, de €13.452,74;

q)           A Requerente não deu cumprimento integral ao determinado pelas normas dos parágrafos 26 e 55.b) da IAS 39-Instrumentos Financeiros: Reconhecimento e Mensuração – porquanto, no momento do desreconhecimento contabilístico das participações sociais, os valores inscritos naquela conta do capital próprio # 5522 – Outras reservas – reservas de justo valor, não foram transferidos para contas de resultados, sendo que, nos termos do Apêndice C – Data de Eficácia, C1, esta Norma era aplicável aos períodos anuais com início em ou após 1 de janeiro de 2013 e a responsabilidade que por esse incumprimento pudesse ser assacada aos auditores externos não é oponível à AT;

r)            Como a Requerente não conformou a sua atuação com as regras do parágrafos 26 e 55.b da IAS 39 nem com o normativo do n.º 9 do art.º 18.º do CIRC daí resultou que o cálculo das mais-valias ou menos-valias fiscais originadas na alienação das participações sociais,  a que estavam associadas as variações de justo valor, não foi efetuado de acordo com o disposto no n.º 2 do art.º 46.º do CIRC, nos termos do qual «As mais-valias e as menos valias são dadas pela diferença entre o valor de realização, líquido dos encargos que lhe sejam inerentes, e o valor de aquisição”;

s)            As variações do justo valor eram fiscalmente relevantes nos exercícios em que as mesmas se tornaram efetivas, por venda das participações sociais, em consonância com a regra geral enunciada no corpo do n.º 9 do art.º 18.º do CIRC;

t)            A situação em dissídio nada tem a ver com a Ficha Doutrinária referente ao Processo n.º 451/2011 (Despacho de 11-03-2011 do Diretor-Geral; PIV n.º 1787) –porque não se coloca qualquer dúvida quanto às modalidades de pagamento da contraprestação obtida na venda das participações sociais, centrando-se a questão essencial, tão só, na relevância fiscal das variações de justo valor associadas às participações sociais alienadas;

u)           Relativamente à 1ª tranche da alienação da participação na sociedade B...– que consistiu na alienação, em 21.09.2011, à C..., de 270.000 ações representativas de 60% do capital daquela sociedade, por 3 milhões de euros, e na entrega à C... das restantes 180.000 ações, representativas de 40% do capital, pelo valor de  2 milhões de euros, a título de entrada em espécie para a realização do aumento de capital, aprovado a 14-10-2011, com valor nominal de 50 mil euros – a que corresponde a variação de justo valor de €4.888.685,51, não são fornecidos elementos que permitam validar a verificação das condições de que dependia, ao tempo, a aplicação do regime da neutralidade fiscal à referida permuta de partes sociais, resultando, porém, do contrato de constituição da sociedade D... (Doc. 21) que o capital social, cujo valor nominal era de €75.000,00 (15.000 contos) estava dividido em duas quotas, uma subscrita pela Requerente, de €74.875,00 (14.975 contos) e outra, por uma pessoa singular, de €125,00 (25 contos);

v)            Se, à data da constituição da B..., a Requerente era titular de duas quotas da D..., uma, com o valor nominal de €125,00 e, outra, com o valor nominal de €349.795,00, avaliadas conjuntamente em €415.795,00, significa que adquiriu a quota de menor valor mas fica por explicar como é que o valor da outra quota passou do valor nominal de €74.875,00, em 1980, para €349.795,00, em 2003, não sendo por isso possível validar a aplicação do regime transitório do art.º 18.º-A do Decreto-Lei n.º 442-B/88 às mais-valias e menos-valias associadas à venda da participação na sociedade B..., nos termos apresentados no ppa;

w)          No respeitante à alienação da 2.ª tranche compreendida por 180.000 ações da B..., entregues à C... para a realização do aumento do capital desta sociedade, que a Requerente qualifica como uma operação de “permuta de partes sociais”, à luz da definição do n.º 5 do art.º 73.º do CIRC e, como tal, abrangida pelo regime do art.º 77.º também do CIRC, nada se adianta sobre o cumprimento das condições de que depende a aplicação deste regime nem sequer da obrigação de comunicação prevista no n.º 1 do art.º 78.º do CIRC e as demais obrigações  específicas a que se refere o n.º 6 do mesmo artigo.;

x)            As omissões praticadas, no plano contabilístico e fiscal, nos exercícios em que ocorreram as alienações das participações sociais revelam um manifesto desconhecimento da existência das variações do justo valor inscritas nas contas de reservas e da sua relevância para o apuramento dos ganhos e perdas resultantes da alienação das participações sociais a que se encontravam associadas;

y)            Com os elementos disponíveis, é possível concluir que esta operação não cabe na definição do n.º 5 do art.º 73.º do CIRC, já que a permuta de 40% do capital da B... (sociedade adquirida) por ações da sociedade adquirente foi precedida de outra operação realizada no mês anterior, de venda de 60% do capital da sociedade, que conferiu o domínio à sociedade adquirente, mas que não foi realizada ao abrigo do regime especial;

z)            A atual definição de «permuta de partes sociais» resulta da Diretiva 2005/19/CE do Conselho de 17 de Fevereiro que alterou a Diretiva 90/434/CEE relativa ao regime fiscal comum aplicável às fusões, cisões, entradas de ativos e permutas de ações entre sociedades de Estados-Membros, que visou abranger, para além da aquisição de uma participação (da sociedade adquirida) que tivesse por efeito a conferir à sociedade adquirente a maioria dos direitos de voto, também as aquisições subsequentes realizadas pela sociedade adquirente, sendo que a atual definição do n.º 5 do art.º 77.º do CIRC abrange as aquisições subsequentes à aquisição que conferiu a maioria dos direitos de voto à sociedade adquirente, no pressuposto de que esta aquisição beneficiou do regime especial;

aa)         Não assiste razão à Requerente no que se refere à possibilidade de aplicação do regime fiscal de neutralidade à operação de alienação de 40% do capital da sociedade B... à sociedade C...;

bb)         No que concerne à participação na sociedade F..., SGPS, S.A., lembra-se que na conta de reservas de justo valor (IAS 39)# 552257, as variações de justo valor, de €351.296,92, são imputadas à sociedade G... e não à F..., verificando-se que esta sociedade foi criada na sequência de uma operação de cisão simples da B..., realizada em 2011, tendo as ações representativas do capital da nova sociedade sido atribuídas à acionista da sociedade cindida – i.e. a Requerente;

cc)          Nos termos do contrato de cisão (doc. 17), a operação foi enquadrada no regime especial, tendo sido dada aplicação ao disposto no n.º 3 do art.º 74.º do CIRC, dele não resultando que a sociedade cindida tenha reduzido o capital, o que significa que não houve troca de ações da B... por ações da F... .

dd)         Não sendo passível validar a afirmação de que as datas de aquisição das 50.000 ações da F... se reportam às datas de aquisição das ações da sociedade cindida , a saber, a B..., em resultado do disposto no n.º 3 do art.º 18.º-A do Decreto-Lei n.º 442-B/88 e do n.º 3 do art.º 47.º do CIRC  – ou seja, que 68,5% das ações tem como data de aquisição o ano de 1980, 31,35% o ano de 1995 e 0,15%, o ano de 2003    o que foi dito sobre a aplicação do regime transitório das mais-valias e menos-valias previsto no art.º 18.º-A do Decreto-Lei n.º 442-B/88 à operação de venda das 270.000 ações da B... aplica-se, mutatis mutandi, à venda das 25.000 F... à G... .

ee)         A Requerente não revela os valores pelos quais foram alienadas as duas quotas da H... e a ata da assembleia geral apenas indica os valores nominais, ficando-se sem saber qual seria a mais-valia ou menos-valia resultante da alienação e a influência que nesses ganhos ou perdas poderia ter a variação negativa do justo valor reconhecida na conta # 552245;   

ff)           Sobre a qualificação, à luz da definição do n.º 5 do art.º 73.º  do CIRC, como «permuta de partes sociais» da realização da entrada em espécie do aumento do capital da G..., mediante a entrega das restantes 25.000 ações detidas pela Requerente no capital da F... e  a concomitante aplicação do regime do art.º 77.º, do CIRC, não se demonstra que estariam verificadas as condições de que depende  a aplicação do regime especial, bem como se estaria cumprida a obrigação de comunicação prevista no n.º 1 do art.º 78.º do CIRC e as demais obrigações  específicas a que se refere o n.º 6 do mesmo artigo;

gg)         A estratégia argumentativa da Requerente saiu gorada, desde logo, pelas fundadas dúvidas suscitadas em torno da verificação dos pressupostos em que assentam as exclusões tributárias que alegadamente se aplicariam às mais-valias e menos-valias fiscais, seja com base no regime transitório previsto no art.º 18.º-A do Decreto-Lei n.º 442-B/88, seja do regime especial de neutralidade aplicável às permutas de partes sociais.

hh)         Os rendimentos e ganhos reconhecidos, a 31.12.2013, na conta #78621, por transferência das contas de reservas que acolhiam as variações do justo valor associadas às participações alienadas em exercícios anteriores,  devem ser imputados ao lucro tributável do exercício de 2013, por subsunção na parte final do n.º 2 do art.º 18.º do CIRC, dado que o motivo invocado para a omissão praticada naqueles exercícios, além de não provado não exonera do cumprimento das determinações legais e, consequentemente, só pode ser explicada por negligência e manifesto desconhecimento da sua relevância fiscal

ii)            Os valores transferidos, em 31.12.2013, das reservas de justo valor para a conta de rendimentos e ganhos #78621, devem concorrer para o lucro tributável deste período de tributação, por serem subsumíveis na parte final do n.º 2 do art.º 18.º do CIRC.

jj)           A correção ao lucro tributável do exercício de 2013, relativa aos ajustamentos decorrentes da aplicação do justo valor, na importância de € 5.226.529,69, promovida pelos SIT por desconsideração do montante a deduzir, inscrito no Campo 759 do Quadro 07 da Declaração de Rendimentos Modelo 22 – Ajustamentos não tributados decorrentes da aplicação do justo valor, foi realizada no âmbito de ação inspetiva externa, tendo sido confirmada por decisão proferida na apreciação da reclamação graciosa;

kk)         Os dois mapas internos “supostamente” com lançamentos contabilísticos ocorridos de 2005 a 2011 e mapas com ajustamentos de participações não demonstraram a composição do valor, nem explicando o motivo pelo qual o mesmo foi desconsiderado para efeitos fiscais através do preenchimento do campo 759 da declaração Modelo 22 do IRC.

 

11. Em face do acima exposto, a Requerida conclui dever este tribunal abster-se de conhecer e se pronunciar sobre as pretensões da Requerente e absolver a AT do pedido, porquanto deve julgar procedente a exceção peremptória de intempestividade supra invocada, ou, caso assim não se entenda, deve ser julgado improcedente o presente pedido de pronuncia arbitral, por não provado, mantendo-se na ordem jurídica os atos tributários impugnados e absolvendo-se, em conformidade, a entidade Requerida do pedido.

II. Saneamento

12. O tribunal arbitral é materialmente competente e foi regularmente constituído, como se dispõe nos artigos 2.º, n.º 1, al. a), e 4.º, ambos do RJAT.

13. As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão representadas (vd. artigos 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo diploma, e artigos 1.º a 3.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março).

14. O processo não enferma de nulidades e não há qualquer obstáculo à apreciação do mérito da causa sendo que, como se fundamentará infra, a exceção de intempestividade do pedido suscitada pela Requerida não procede.

III. Do Mérito

III.1. Factos provados

15. Consideram-se provados os seguintes factos:

a)            A sociedade B... foi objeto de uma cisão dando origem à sociedade F..., que concentrou determinados ativos e passivos da sociedade cindida, em 2010 (Documento 17)

b)           A participação na sociedade B...– alienada em 2011, a que corresponde a variação de justo valor de €4.888.685,51, foi alienada em duas tranches, sendo que a primeira consistiu numa alienação, em 21.09.2011, à C..., de 270.000 ações representativas de 60% do capital daquela sociedade, por 3 milhões de euros, e as restantes 180.000 ações, representativas de 40% do capital foram entregues à C..., pelo valor de  2 milhões de euros, a título de entrada em espécie para a realização do aumento de capital, aprovado a 14-10-2011, com valor nominal de 50 mil euros;

c)            No ano seguinte ao da constituição da F..., a Requerente alienou as ações da F... à sociedade G..., em duas tranches: uma, em 23.01.2012, mediante a alienação de 25.000 ações, representativas de 50% do capital, por um milhão de euros, e outra, no dia 27-01-2012, mediante a entrega das restantes 25.000 ações, representativas de 50% do capital, avaliadas num milhão de euros, para realização da entrada em espécie relativa ao aumento de capital da sociedade G...,  pelo valor nominal de €50.000,00.

d)           A Requerente deduziu no apuramento do lucro tributável o saldo da conta #78621- Rendimentos e ganhos nos restantes ativos financeiros - alienações, no montante de € 5.226.529,69, justificados no Relatório & Contas de 2013 como respeitando a um acerto efetuado na sequência de alienações ocorridas em exercícios anteriores de um conjunto de participações financeiras a uma sociedade do grupo – a J..., em 2012.

e)           Na evolução dos investimentos financeiros da Requerente em 2011, de um saldo inicial a 31.12.2010 da B... de € 6.413.000, finaliza-se o ano de 2011 com um saldo de zero (Documento 25)

f)            Do Relatório e Contas da C..., de 2011, no mapa que descreve a evolução dos investimentos financeiros da companhia, de um saldo inicial de zero, a 31.12.2010 da B..., atinge-se, a 31.12.2011, o valor de € 5.111.020 (Documento 26) 

g)            Segundo o Relatório e Contas de 2011 da Requerente, a F..., em sede de reavaliação, aumentou o seu justo valor no montante de € 351.296,92, entre outros aumentos elativos a "Correções de Capitais Próprios" e "Aumentos de participação", o que corresponde ao valor contabilizado na conta #552257 como regularização reservas IAS 39 (Documento 18)

h)           De acordo com o "Contrato de Compra e Venda de Ações celebrado entre a Requerente e a G...- e à "Ata Número Cinco" da referida sociedade, a transmissão onerosa da totalidade das ações da F... por parte da Requerente ocorreu em 2012 (Documento 28)

i)             Relatório e Contas da Requerente do exercício de 2012, onde, na evolução dos investimentos financeiros da Requerente em 2012 permite observar que, de um saldo inicial a 31.12.2011 da F... de € 2.033.000 se finaliza o ano de 2012 com um saldo de zero (Documento 30)

j)             Do Relatório & Contas da G..., de 2012, resulta que na evolução dos investimentos financeiros da companhia, de um saldo inicial de zero da F..., a 31.12.2011, se atinge, a 31/12/2012, o valor de € 988.456 (Documento 31)

k)            No caso da H..., a alienação onerosa das respetivas ações ocorreu em 2011 (Documento 32)

l)             O extrato oficial da conta #552251, que corresponde à conta onde são registados os ajustamentos ao justo valor da sociedade "B..., S.A.", apresentava, em 2013, um saldo de conta de € 4.888.685,51 (Documento 11)

m)          A liquidação adicional sob impugnação foi objeto de reclamação graciosa...

n)           ... que foi indeferida por despacho de 12-2-2019, notificado à reclamante em 17-2-2019;

o)           A reclamante apresentou o presente pedido de pronúncia arbitral relativo à liquidação mencionada em m), em 16-5-2019.

 

III.2. Factos não provados

 

16. Não há factos relevantes para a apreciação da causa que não se tenham provado.

 

III.3. Fundamentação da fixação da matéria de facto

 

17. O Tribunal não tem que se pronunciar sobre todos os detalhes da matéria de facto que foi alegada pelas partes, cabendo-lhe o dever de selecionar os factos que interessam à decisão e discriminar a matéria que julga provada e declarar a que considera não provada (cfr. artigo 123.º, n.º 2, do CPPT, e artigo 607.º, n.º 3, do CPC, aplicáveis ex vi artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e e), do RJAT).

18. Deste modo, os factos pertinentes para o julgamento da causa são selecionados e conformados em função da sua relevância jurídica, a qual é estabelecida em atenção às várias soluções para o objeto do litígio no direito aplicável (vd. art. 596.º, n.º 1, do CPC, aplicável ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT).

 

19. Assim, tendo em consideração as posições assumidas pelas partes, à luz do disposto no artigo 110.º, n.º 7, do CPPT, as provas documental e testemunhal apresentadas, bem como a declaração de parte que foi prestada, consideram-se provados, com relevo para a decisão, os factos acima elencados.

 

III.4. Matéria de direito

 

III. 4.1. Tempestividade da ação

 

20. Os prazos para apresentação do pedido de pronúncia arbitral são os seguintes:

a)            90 dias contados a partir do termo do prazo para pagamento voluntário das liquidações de tributos, de autoliquidação, de retenção na fonte e pagamento por conta)[actos de primeiro grau] ou contados desde a notificação da decisão ou do termo do prazo legal de decisão do recurso hierárquico [actos de segundo ou terceiro grau] [2º-1/a) e 10º-1/a),do RJAT e 102º-1 e 2, do CPPT;

b)           30 dias contados a partir da notificação dos actos de fixação da matéria tributável quando não dê origem a liquidação de qualquer tributo, de actos de determinação da matéria coletável e de actos de fixação de valores patrimoniais [2º-1/b) e 10º-1/b, do RJAT].

 

21. Os Tribunais Arbitrais não têm competência para conhecer de vícios próprios de actos de segundo ou terceiro graus (atos de indeferimento de reclamações graciosas, recursos hierárquicos ou pedidos de revisão oficiosa cujo fundamento não se prenda com a ilegalidade do acto de “primeiro grau”).

22. Ou seja: o que é sempre e só impugnável é a legalidade do acto de primeiro grau.

23. O indeferimento expresso de um meio gracioso só será arbitrável na medida em que comporte ele próprio a apreciação da legalidade do acto de primeiro grau que o contribuinte pretende efectivamente impugnar.

24. De tal modo que será o acto de primeiro grau o objeto do pedido de pronúncia arbitral, tenha ou não havido actos de indeferimento de meios graciosos para apreciação da legalidade daquele acto(reclamação ou recurso hierárquico.

  25. Os actos de indeferimento da reclamação graciosa ou do recurso hierárquico serão apenas ou fundamentalmente marcos importantes para aferir da tempestividade da apresentação do pedido de pronúncia arbitral na medida em que a contagem do prazo de 90 dias só se iniciará a partir da notificação da decisão da reclamação ou do termo do prazo legal do recurso hierárquico.

                26. Não pode, em nosso entender, confundir-se o âmbito material da arbitragem (artigo 2º, do RJAT) com a data a partir da qual o pedido de pronúncia arbitral pode ser interposto (artigo 10º, do RJAT)

                27. Por outro lado, trata-se aqui igualmente da abordagem da questão da recorribilidade, por intermédio da arbitragem, dos actos de segundo ou de terceiro graus.

28. A problemática dos actos de segundo e terceiro graus na arbitragem tributária prende-se, ao que se julga, com pelo menos duas questões distintas: uma primeira, a de saber se tendo sido intentado um meio gracioso administrativo, o objecto do processo arbitral será a decisão que venha a ser proferida pela Administração Tributária – em sede de reclamação graciosa, de recurso hierárquico ou de pedido de revisão oficiosa – ou, pelo contrário, o ato de liquidação, de autoliquidação, de retenção na fonte ou de pagamento por conta; uma segunda, que interliga questões de competência e questões de prazo, e que é a de saber se o tribunal terá competência – e, se sim, em que medida – para apreciar um acto de primeiro grau quando o pedido seja apresentado na decorrência de um indeferimento de reclamação graciosa, recurso hierárquico ou pedido de revisão oficiosa previamente apresentados.

                29. No que respeita à primeira questão, já no âmbito da impugnação judicial, era discutível se, perante uma decisão expressa de reclamação graciosa, de recurso hierárquico ou de pedido de revisão oficiosa, o contribuinte impugnava directamente o acto de liquidação anteriormente reclamado, recorrido ou revisto (o acto de primeiro grau) ou a própria decisão (de indeferimento) de reclamação, de recurso ou de pedido de revisão oficiosa que, por sua vez, apreciou a (i)legalidade do acto impugnado - o acto de segundo grau.

30. O Supremo Tribunal Administrativo (STA) veio pronunciar-se sobre a questão, designadamente e entre outros, em acórdão datado de 18 de Maio de 2011, proferido no âmbito do processo n.º 0156/11, admitindo que“(…) o objecto real da impugnação é o acto de liquidação e não o acto que decidiu a reclamação, pelo que são os vícios daquela e não deste despacho que estão verdadeiramente em crise(…).”

                “(…) a impugnação não está, por isso, limitada pelos fundamentos invocados na reclamação graciosa, podendo ter como fundamento qualquer ilegalidade do ato tributário.(…)”

                31. Esta é a primeira questão que deve ficar clara: o objecto do processo arbitral é o acto de liquidação.

                32. Questão diferente desta mas interligada, é a de saber se o pedido de pronúncia arbitral foi apresentado dentro do prazo. Aqui parece-me que o legislador arbitral foi, ao que se crê, claro ao compartimentar questões de competência e questões de prazos.

                33. Assim é que quanto à competência ou âmbito material o objeto da arbitragem é, como se concluiu, a apreciação da ilegalidade dos actos de liquidação; quanto ao prazo, o contribuinte pode recorrer à arbitragem logo aquando da notificação dos atos de liquidação de tributos, de autoliquidação, de retenção na fonte e de pagamento por conta ou, tendo recorrido à via administrativa, após a notificação da decisão de indeferimento da reclamação graciosa ou do recurso ou ainda da formação  do indeferimento tácito.

                34. A resposta à sobredita questão resposta encontra-se no citado artigo 10.º, do RJAT.

                35. Desta norma não se pode ou deve nunca retirar a competência para apreciação direta dos actos de segundo grau, pois se trata de norma que respeita única e exclusivamente ao dies a quo do prazo para apresentação do pedido de pronúncia arbitral. É uma norma que respeita portanto ao momento a partir do qual se inicia a contagem do prazo para solicitar o pedido de constituição do tribunal arbitral.

                36. Com efeito, o artigo 2.º, n.º 1, alínea a), do RJAT, determina que os tribunais arbitrais têm competência para apreciar “a declaração de ilegalidade de actos de liquidação de tributos, de autoliquidação, de retenção na fonte e de pagamento por conta”. Não há, pois, qualquer referência aos actos de indeferimento de reclamação graciosa, de recurso hierárquico ou de pedido de revisão oficiosa, i.e., não se menciona a arbitrabilidade de decisões de indeferimento, expresso ou tácito, das vias administrativas prévias utilizadas. Não há nem tinha que haver.

                37. Entende-se a este propósito que os actos de segundo ou terceiro graus poderão sempre, reafirma-se, ser arbitráveis, na medida em que comportem, e só nesta medida, eles próprios, a (i)legalidade dos atos de liquidação em causa. Na base deste entendimento estará uma interpretação teleológica, designadamente por a alínea a) do n.º 1, do artigo 10.º referir expressamente a “decisão de recurso hierárquico”  e o facto de o acto de segundo ou de terceiro grau estar a apreciar o acto de liquidação, autoliquidação, retenção na fonte ou pagamento por conta objeto da arbitragem.

                38. Defende-se aqui, por conseguinte, uma interpretação segundo a qual não são arbitráveis os vícios próprios dos atos de indeferimento de reclamações graciosas, de recursos hierárquicos ou de pedidos de revisão do ato tributário porque escapam ao âmbito material da arbitragem tributária. Por outras palavras, esses actos de indeferimento só poderão ser “trazidos” para a jurisdição arbitral, na estrita condição de terem, eles próprios, apreciado a (i)legalidade do ato tributário que o sujeito passivo, verdadeira e efectivamente, pretende impugnar pela via arbitral.

                39. Neste sentido, veja-se, v. g. e entre outras, a decisão arbitral proferida no âmbito do processo n.º 272/2014-T, de que se transcrevem os seguintes extractos:

                “(…) 65 - O indeferimento de reclamação graciosa corporiza, no quadro da impugnação judicial, o caso previsto no n.º 2 do art.º 102.º do CPPT, colocando-se a questão de saber se, face às competências legalmente cometidas aos tribunais arbitrais, os mesmos serão competentes para, em quaisquer circunstâncias, apreciarem os atos de indeferimento de reclamações graciosas.

                40 - Estando a competência dos tribunais arbitrais, que funcionam junto do CAAD, circunscrita e limitada, como já atrás se referiu, à declaração de ilegalidade dos atos de liquidação de tributos, de autoliquidação, de retenção na fonte e de pagamento por conta, a apreciação dos atos de indeferimento de reclamações graciosas, por parte dos referidos tribunais, há de estar condicionada ao efetivo conhecimento que tais atos tiveram da legalidade dos atos de liquidação com que estão relacionados.

                41 - A decisão de indeferimento da reclamação graciosa, proferida nas atrás mencionadas circunstâncias, reafirma a legalidade do ato de liquidação em causa e volta a confirmá-lo, tal como inicialmente fora configurado.

                42 - O indeferimento da reclamação graciosa, é um acto lesivo susceptível de impugnação por parte do interessado, o qual, na medida em que procede à reafirmação do ato primário de liquidação subjacente e do qual é indissociável, não pode deixar de ter a sua apreciação cometida aos tribunais arbitrais, que, como já se referiu, têm as suas competências fundamentalmente centradas na declaração de ilegalidade de atos de liquidação de tributos (…)”

               

                43. Subsumindo as considerações supra ao caso dos autos:

 

                44. A demandante apresentou o presente pedido de pronúncia arbitral sem impugnar o acto de indeferimento de reclamação graciosa ou sem pedir a anulação deste acto.

                45. Mas alegou e comprovou que apresentou reclamação graciosa relativamente ao ato de liquidação adicional ora impugnado (Doc 3, com a petição inicial) e que tal reclamação foi indeferida por despacho notificado em 17-2-2019 que manteve in totum a liquidação.

                46. Ora sendo o pedido de pronúncia arbitral apresentado em 16-5-2019, logo se vê que nesta data não estavam transcorridos 90 dias após a notificação do acvto de indeferimento da sobredita reclamação graciosa.

                47. O que acarreta a óbvia conclusão de tempestividade na apresentação do pedido de pronúncia arbitral.

                48. Improcederá assim a excepção de intempestividade do pedido de pronúncia arbitral suscitada pela Autoridade Tributária e Aduaneira.

 

III.4.2. Correções ao lucro tributável 

 

49. Como é pacificamente aceite pelas Requerente e Requerida, a questão substantiva que se coloca no feito submetido a este tribunal prende-se com saber qual o tratamento fiscal dar ao lucro tributável do exercício de 2013, haja em vista os ajustamentos decorrentes da aplicação do justo valor em instrumentos financeiros, na importância de € 5.226.529,69, promovida pelos SIT, por desconsideração do montante a deduzir, inscrito no Campo 759 do Quadro 07 da Declaração de Rendimentos Modelo 22 – Ajustamentos não tributados decorrentes da aplicação do justo valor,

50. Do elenco de factos acima dados como provados resulta que entre 2006 e 2010 a Requerente utilizou um modelo do justo valor (fair value) na mensuração das participações financeiras – designadas no Código do IRC de “instrumentos financeiros de capital próprio” – por si detidas em sociedades comerciais cujos títulos representativos dos respetivos capitais sociais não se encontravam admitidos à cotação. No âmbito desse modelo de mensuração, durante esse período de tempo, reconheceu variações de justo valor em capital próprio.

51. Nos anos findos em 31 de dezembro de 2011 e 2012, a Requerente alienou as referidas participações financeiras, não tendo à data, em simultâneo com a alienação, procedido ao desreconhecimento contabilístico (eliminação) do justo valor apresentado em capital próprio, o que só veio a ocorrer em 2013. É nesse período económico de 2013, que ela desreconhece do capital próprio as variações de justo valor, tendo-o efetuado por contrapartida dos resultados desse período, movimento que origina um rendimento contabilístico. O montante assim contabilizado foi, para efeitos da determinação da matéria coletável, deduzido pela Requerente no quadro 07 da declaração modelo 22, ficando, desta forma, a referida matéria expurgada desse efeito.

52. Não está verificada a ocorrência de um rendimento tributável no período económico de 2013 – há obviamente um rendimento contabilístico (porque registado numa classe de rendimentos, classe 7), mas que resulta da correção de um erro, como concluem quer a Requerente quer a AT. Ambas concordam que o montante reconhecido em resultados, deduzido no quadro 07 da declaração modelo 22 de 2013 e objeto da presente lide, não é relativo a 2013, mas antes a períodos anteriores, designadamente, aos períodos nos quais foram alienadas as participações que lhe deram origem. A Requerente admite que o efeito do justo valor associado às participações permaneceu nas suas demonstrações financeiras (em capital próprio) para além dos períodos em que ocorreram as transmissões onerosas das ações – 2011 e 2012 – apenas sendo desreconhecidos em 2013, justificando esta matéria no relatório e contas desse ano como respeitando a um acerto efetuado na sequência de alienações ocorridas em exercícios anteriores.

53. Portanto, os aumentos de justo valor reconhecidos ao longo dos períodos económicos compreendidos entre 2006 e 2010, relativos a participações alienadas em 2011 e 2012, não podem ser considerados obtidos em 2013, período económico em que tão somente a requerente procedeu “a um acerto efetuado na sequência de alienações ocorridas em exercícios anteriores”, movimento que ocorreu porque não foi efetuado em tempo oportuno, “porquanto, no momento do desreconhecimento contabilístico das participações sociais, os valores inscritos naquela conta do capital próprio # 5522 – Outras reservas – reservas de justo valor, não foram transferidos para contas de resultados”.

 54. É inegável que a conduta contabilística adotada pela Requente veio dar o flanco à crítica de “falta de rigor” que legitimamente lhe é dirigida pela AT. Pode falar-se efetivamente, de alguma ‘falta de rigor’ – até porque o montante que a AT pretende tributar é a assumido ser uma correção de um erro. De um ponto de vista contabilístico não devem permanecer em capital próprio itens relativos (associados) a ativos alienados. No entanto, a verdade é que não se identificou qualquer argumentação a rebater a troca de participações referida, ocorrida em 2012.

55. Acresce que a análise do Documento 9 – um extrato que permite a identificação das participações sociais e as correspondentes variações de justo valor acumuladas – e do Documento 18 – e um diário que  revela os movimentos das variações de justo valor atinentes à participação na sociedade G..., cujo saldo final é de €351.296,92 – conduz à conclusão de que a única falta de rigor está no nome do extrato da conta 552257, que refere G... e deveria referir F..., mostrando o diário que o saldo foi regularizado / corrigido em 2013.

56. No entanto, na linha da orientação material subjacente ao princípio da primazia da substância sobre a forma, entende o presente tribunal que a alegada “falta de rigor” não constitui motivação válida para tributar uma correção contabilística de variações de justo valor previamente reconhecidas em capital próprio. Tanto mais quanto se pode mesmo questionar a própria existência de uma ‘falta de rigor’, visto que estas contas não têm, por força da lei, de apresentar detalhe no balancete (e consequentemente não têm de apresentar detalhe no diário e no extrato). A legislação aplicável à data dos factos – Portaria n.º 1011/2009 de 9 de setembro – apenas exige a abertura destas contas a 3 dígitos (552), sendo que a Requerente tem mais detalhe por sua própria opção.

57. A AT também considera que aquele montante deveria ter afetado o resultado do período aquando da alienação, pois a Requerente não deu cumprimento integral ao determinado pelas normas dos parágrafos 26 e 55.b) da IAS 39 – Instrumentos Financeiros: Reconhecimento e Mensuração, porquanto, no momento do desreconhecimento contabilístico das participações sociais, os valores inscritos naquela conta do capital próprio (5522 – Outras reservas – reservas de justo valor), não foram transferidos para contas de resultados, sendo que, nos termos do Apêndice C – Data de Eficácia, C1, esta Norma era aplicável aos períodos anuais com início em ou após 1 de janeiro de 2013 e a responsabilidade que por esse incumprimento pudesse ser assacada aos auditores externos não é oponível à AT.

58. Importa ter presente que o § 26 do referido normativo refere que “26. No desreconhecimento de um ativo financeiro na sua totalidade, a diferença entre: (a) a quantia escriturada; e (b) a soma de (i) a retribuição recebida (incluindo qualquer novo activo obtido menos qualquer novo passivo assumido) e (ii) qualquer ganho ou perda cumulativo que tenha sido reconhecido directamente no capital próprio (ver parágrafo 55(b)) deve ser reconhecida nos resultados”. Por seu lado, o § 55.b) dispõe que “55. Um ganho ou perda proveniente de uma alteração no justo valor de um activo financeiro ou passivo financeiro que não faça parte de um relacionamento de cobertura (ver parágrafos 89-102) deve ser reconhecido como se segue: (a) Um ganho ou perda resultante de um activo financeiro ou passivo financeiro classificado pelo justo valor por via dos resultados deve ser reconhecido nos resultados. (b) Um ganho ou perda resultante de um activo financeiro disponível para venda deve ser reconhecido directamente no capital próprio, através da demonstração de alterações no capital próprio (ver IAS 1 Apresentação de Demonstrações Financeiras), excepto no caso de perdas por imparidade (ver parágrafos 67-70) e de ganhos e perdas cambiais (ver Apêndice A parágrafo AG83), até que o activo financeiro seja desreconhecido, momento em que o ganho ou perda cumulativo anteriormente reconhecido no capital próprio deverá ser reconhecido nos resultados. Contudo, o juro calculado usando o método do juro efectivo (ver parágrafo 9) é reconhecido nos resultados (ver IAS 18 Rédito). Os dividendos resultantes de um instrumento de capital próprio disponível para venda são reconhecidos nos resultados quando o direito da entidade de receber pagamento for estabelecido (ver IAS 18)”.

59. Resulta deste quadro normativo que os aumentos do justo valor dos ativos financeiros, neste caso as participações, são reconhecidos em capital próprio até que essas participações sejam desreconhecidas (eliminadas do Balanço) o que ocorre pela alienação. Portanto, com a alienação das participações este aumento de justo valor previamente contabilizado em capital próprio (nas contas 552 referidas anteriormente) deve ser transferido para as contas de resultados. Conforme consta das peças e demonstra o diário, a entidade apenas procedeu a esta transferência de capital próprio (da conta 552) para resultados (conta 786) em 2013, quando a alienação das participações ocorreu em 2012. Ainda que se possa legitimamente concluir que a norma não foi cumprida, entende este tribunal que esse incumprimento não deve ser tido como fiscalmente relevante, porque aquele acerto prescrito pela norma é um acerto de justo valor, que não é tributado. A existir rendimento tributável, este poderia ser resultante da aplicação do modelo do justo valor ou do modelo da realização (através do regime das mais e menos valias), não admitindo a lei uma terceira via.

60. Os fundamentos da periodização do lucro tributável consagrados no art.º 18º do Código do IRC, estabelecem no seu n.º 1 o princípio da anualidade: ‘os rendimentos (…) são imputáveis ao período de tributação em que sejam obtidos (…), independentemente do seu recebimento (…), de acordo com o regime de periodização económica’. O n.º2 do mesmo artigo refere que ‘as componentes positivas (…) consideradas como respeitando a períodos anteriores só são imputáveis ao período de tributação quando na data de encerramento das contas daquele a que deviam ser imputadas eram imprevisíveis ou manifestamente desconhecidas’

61. As quantias que foram corrigidas em 2013 constavam já das demonstrações financeiras em 2012, portanto, deveriam ter nos termos da norma referida – IAS39 – sido transferidos, imputados, aos resultados de 2012, não parecendo que se possa justificar que eram imprevisíveis ou manifestamente desconhecidas em 2012. Neste sentido, a AT deveria era corrigir o 2012 (se ainda o pudesse fazer e se este rendimento contabilístico, esta correção, fosse suscetível de tributação, o que não é plausível por se tratar de ajustes de justo valor de participadas não admitidas à cotação). Ou seja, os valores transferidos, em 31.12.2013, das reservas de justo valor para a conta de rendimentos e ganhos #78621, não devem concorrer para o lucro tributável deste período de tributação, por não serem subsumíveis na parte final do n.º 2 do art.º 18.º do CIRC.

62. Assim sendo, carece de fundamento legal bastante a correção ao lucro tributável do exercício de 2013, relativa aos ajustamentos decorrentes da aplicação do justo valor, na importância de € 5.226.529,69, promovida pelos SIT por desconsideração do montante a deduzir, inscrito no Campo 759 do Quadro 07 da Declaração de Rendimentos Modelo 22 – Ajustamentos não tributados decorrentes da aplicação do justo valor, realizada no âmbito de ação inspetiva externa e confirmada por decisão proferida na apreciação da reclamação graciosa.

63. Note-se, além do mais, que existe um conjunto de referências que demonstram tratar-se de justo valor, por exemplo: “Segundo o Relatório e Contas de 2011 da Requerente, a F..., em sede de reavaliação, aumentou o seu justo valor no montante de € 351.296,92, entre outros aumentos elativos a "Correções de Capitais Próprios" e "Aumentos de participação", o que corresponde ao valor contabilizado na conta #552257 como regularização reservas IAS 39, comprovando que o aumento da participação da sociedade correspondeu, apenas e só, a um aumento do justo valor (Documento 18)”. Por outro lado, a própria AT, ao alegar o incumprimento da IAS 39, assume que o saldo é composto por variações de justo valor, pois é nesse caso que se regista em capital próprio e depois se transfere para resultados aquando da alienação das participações. O próprio campo 759 da modelo 22 identifica no seu descritivo o respetivo motivo: ‘ajustamentos não tributáveis decorrentes da aplicação do justo valor (art.º 18º n.º 9).

64. O justo valor no caso em apreço não pode ser tributado porque não estão satisfeitas as condições do artigo 18º do CIRC (designadamente não foi determinado em mercado regulamentado e as participações não são inferiores a 5% dos capitais sociais). Automaticamente, se não é aplicável o modelo do justo valor, então deve ser aplicado o modelo da realização, ficando a operação no âmbito do regime das mais e menos valias. Por outras, palavras, a existir rendimento tributável, o mesmo deveria ser enquadrado no regime das mais e menos valias. Essas, as mais ou menos valias, foram incorridas em 2011 e 2012, aquando da alienação das participações, pelo que, se tributáveis, deveriam ser imputadas a esses anos.

65. Caso se admita que o aumento do justo valor aqui em apreciação configura um rendimento tributável deverá o mesmo ser atribuído a um outro período: ao período em que foi gerado (2006 a 2010) ou em que as participações financeiras que o originaram foram alienadas (2011 e 2012).

66. Em 2013 o montante reconhecido em resultados do período constitui uma componente positiva desse resultado, a qual se encontrava reconhecida em capital próprio desde pelo menos 2010, pelo que não parece constituir, no encerramento das contas de 2011 e 2012 (anos da alienação das participações sociais), uma realidade imprevisível ou manifestamente desconhecida nesses períodos. Consequentemente, não poderá considerar-se tributável em 2013, por ser imprevisível ou manifestamente desconhecida em períodos anteriores.

67. Em síntese, em 2013 é reconhecido em resultados um rendimento, que mais não é do que um acerto, um registo, que deveria ter sido efetuado em anos anteriores. Esse acerto consubstancia-se na transferência para resultados do período de um montante previamente reconhecido em capital próprio a título de aumento de justo valor de participações financeiros detidas. A existir rendimento tributável, o mesmo deve ser imputável ao período de tributação em que seja obtido, que claramente não é o ano económico de 2013.

68. Ainda assim, importará compreender se o rendimento, mesmo que obtido em períodos anteriores, é tributável à luz do normativo então vigente. As alterações introduzidas no CIRC como consequência da evolução da normalização contabilística internacional, e consequentemente nacional, com a adoção do Sistema de Normalização Contabilística (SNC) e revogação do Plano Oficial de Contabilidade (POC) , mantiveram o modelo de dependência parcial, procurando acomodar novas realidades do normativo contabilístico e de relato financeiro.

69. A manutenção do modelo de dependência parcial carreia o modelo do justo valor para a legislação fiscal, conforme se reconhece no preâmbulo do Decreto-Lei n.º 159/2009 de 13 de Julho – “é aceite a aplicação do modelo do justo valor em instrumentos financeiros, cuja contrapartida seja reconhecida através de resultados, mas apenas nos casos em que a fiabilidade da determinação do justo valor esteja em princípio assegurada. Assim, excluem-se os instrumentos de capital próprio que não tenham um preço formado num mercado regulamentado. Além disso, manteve -se a aplicação do princípio da realização relativamente aos instrumentos financeiros mensurados ao justo valor cuja contrapartida seja reconhecida em capitais próprios, bem como às partes de capital que correspondam a mais de 5 % do capital social, ainda que reconhecidas pelo justo valor através de resultados”. Em causa estava uma intenção deliberada, por parte do legislador, de mitigar os conhecidos riscos de manipulação abusiva do princípio da realização, por parte do sujeito passivo, para efeitos de elisão fiscal, pondo em causa a base tributável .

70. Com as alterações introduzidas pelo citado Decreto-Lei n.º 159/2009 de 13 de Julho, o n.º9 do artigo 18º do CIRC passa então a incorporar a seguinte regra: “Os ajustamentos decorrentes da aplicação do justo valor não concorrem para a formação do lucro tributável, sendo imputados como rendimentos ou gastos no período de tributação em que os elementos ou direitos que lhes deram origem sejam alienados, exercidos, extintos ou liquidados, excepto quando: a)Respeitem a instrumentos financeiros reconhecidos pelo justo valor através de resultados, desde que, quando se trate de instrumentos de capital próprio, tenham um preço formado num mercado regulamentado e o sujeito passivo não detenha, direta ou indiretamente, uma participação no capital igual ou superior a 5% do respetivo capital social.” Ou seja, “a intenção do legislador aquando do acolhimento do modelo do justo valor, devidamente evidenciada, foi, assumida e expressamente, a de manter a aplicação do princípio da realização relativamente aos instrumentos financeiros mensurados ao justo valor cuja contrapartida seja reconhecida em capitais próprios, bem como as partes de capital que correspondam a mais de 5 % do capital social, ainda que reconhecidas pelo justo valor através de resultados” .

71. Portanto, após as alterações ao Código do IRC promovidas pelo referido Decreto-lei n.º 159/2009 de 13 de Julho passaram a sujeitar-se a tributação as variações de justo valor de instrumentos financeiros de capital próprio, reconhecidos pelo justo valor através de resultados, desde que tenham um preço formado num mercado regulamentado e o sujeito passivo detenha, direta ou indiretamente, uma participação no capital social inferior a 5%. Neste modelo, as variações positivas ou negativas na valorização dos instrumentos financeiros – que se podem designar de mais e menos valias potenciais, porque ainda não realizadas – são tributadas em cada período económico. Por oposição, para todas as outras participações financeiras mantém-se o modelo da realização, de acordo com o qual a tributação ocorre à final, aquando da alienação, confrontando o valor de realização com o respetivo custo de aquisição.

72. No presente caso, as variações de justo valor não foram reconhecidas através de resultados, nem ficou provado que tenham um preço formado em mercado regulamentado, pelo que a tributação destas participações fica sujeita ao modelo da realização – as mais e menos valias potenciais não são relevantes para efeitos do cômputo da matéria coletável, sendo que as mais e menos valias realizadas – se não excluídas de tributação por qualquer outro preceito – devem ser englobadas na matéria coletável. Em síntese, o montante em discussão, constituindo uma variação de justo valor o qual não foi determinado por recurso um preço formado em mercado regulamentado, não pode ser relevante para efeitos de determinação da matéria coletável.

73. Para melhor entendimento do princípio da realização é também relevante o n.º 9 do art.º 18º do Código do IRC o qual refere que “os ajustamentos decorrentes da aplicação do justo valor não concorrem para a formação do lucro tributável, sendo imputados como rendimentos ou gastos no período de tributação em que os elementos ou direitos que lhes deram origem sejam alienados (…)”. Assim, quando não releva o modelo do justo valor, releva o princípio da realização. Neste, os ajustamentos decorrentes da aplicação do justo valor são imputados como rendimentos ou gastos no período de tributação em que as participações que lhes deram origem sejam alienadas, o que significa que a alienação das participações fica sujeita ao regime das mais-valias e menos-valias fiscais.

73. Este é o entendimento do legislador que no já citado preâmbulo do Decreto-Lei n.º 159/2009, de 13 de Julho refere: “no mesmo sentido, identificam -se como activos abrangidos pelo regime das mais-valias e menos-valias fiscais os ativos fixos tangíveis, os activos intangíveis, as propriedades de investimento, os instrumentos financeiros, com excepção daqueles em que os ajustamentos decorrentes da aplicação do justo valor concorrem para a formação do lucro tributável no período de tributação, e ainda os activos biológicos que não sejam consumíveis” . Portanto, é esclarecedor o entendimento do legislador ao sujeitar ao regime das mais e menos valias os instrumentos financeiros – participações financeiras – em que os ajustamentos decorrentes da aplicação do justo valor não concorrem para a formação do lucro tributável, como é o caso.

74. O legislador confirma assim a existência de apenas dois modelos de tributação no que tange a instrumentos financeiros. O modelo do justo valor, no qual, mediante determinadas circunstâncias, relevam fiscalmente os ganhos e perdas potenciais, por oposição ao modelo da realização, no âmbito do qual se aplica, no momento da alienação o regime das mais e menos valias.

75. Portanto, a AT ao desconsiderar a dedução – neutralizando no resultado fiscal – do efeito do justo valor, proveniente de períodos anteriores e ao não enquadrar o mesmo no cálculo das mais ou menos valias resultantes da alienação de participações sociais, está a optar por uma solução que não encontra suporte no Código do IRC. Deveria a AT, nos períodos económicos em que ocorreram as alienações confirmado o cálculo e o enquadramento fiscal das mais e menos valias e procedido às correções ariméticas que então considerasse adequadas. Não existe, por conseguinte, fundamento legal que suporte as correções meramente aritméticas em causa efetuadas pela AT no exercício de 2013.

 

III.4.3. Pedido de restituição da quantia paga e juros indemnizatórios

76. A Requerente formula pedido de restituição das quantias arrecadadas pela AT, bem como de pagamento de juros indemnizatórios. Nos termos disposto na alínea b) do artigo 24.º do RJAT, a decisão arbitral sobre o mérito da pretensão de que não caiba recurso ou impugnação vincula a AT a partir do termo do prazo previsto para o recurso ou impugnação, devendo esta, nos exatos termos da procedência da decisão arbitral a favor do sujeito passivo e até ao termo do prazo previsto para a execução espontânea das sentenças dos tribunais judiciais tributários, “restabelecer a situação que existiria se o ato tributário objeto da decisão arbitral não tivesse sido praticado, adotando os atos e operações necessários para o efeito”, de acordo com o preceituado no artigo 100.º da LGT [aplicável por força do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT] que estabelece, que “a administração tributária está obrigada, em caso de procedência total ou parcial de reclamação, impugnação judicial ou recurso a favor do sujeito passivo, à imediata e plena reconstituição da legalidade do ato ou situação objeto do litígio, compreendendo o pagamento de juros indemnizatórios, se for caso disso, a partir do termo do prazo da execução da decisão”.

77. Não obstante o artigo 2.º, n.º 1, alíneas a) e b), do RJAT utilizar a expressão “declaração de ilegalidade” para definir a competência dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD, não fazendo referência a decisões condenatórias, há muito que se entende que se compreendem nas suas competências os poderes que em processo de impugnação judicial são atribuídos aos tribunais tributários, sendo essa a interpretação que se sintoniza com o sentido da autorização legislativa em que o Governo se baseou para aprovar o RJAT, em que se proclama, como primeira diretriz, que “o processo arbitral tributário deve constituir um meio processual alternativo ao processo de impugnação judicial e à ação para o reconhecimento de um direito ou interesse legítimo em matéria tributária”.

78. Apesar de ser, essencialmente, um processo de anulação de atos tributários, o processo de impugnação admite a condenação da AT no pagamento de juros indemnizatórios, como se depreende do artigo 43.º, n.º 1, da LGT, em que se estabelece que “são devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido” e do artigo 61.º, n.º 4, do CPPT (na redação dada pela Lei n.º 55-A/2010, de 31 de dezembro, a que corresponde o n.º 2 na redação inicial), que «se a decisão que reconheceu o direito a juros indemnizatórios for judicial, o prazo de pagamento conta-se a partir do início do prazo da sua execução espontânea». Nos termos do n.º 5 deste mesmo artigo, “Os juros são contados desde a data do pagamento indevido do imposto até à data do processamento da respetiva nota de crédito, em que são incluídos.”

79. Assim, o n.º 5 do artigo 24.º do RJAT, ao dizer que “é devido o pagamento de juros, independentemente da sua natureza, nos termos previsto na lei geral tributária e no Código de Procedimento e de Processo Tributário”, deve ser entendido como permitindo o reconhecimento do direito a juros indemnizatórios no processo arbitral. Este entendimento decorre do princípio da tutela jurisdicional efetiva e da correspondente ampliação dos poderes conformadores da jurisdição administrativa e tributária. Por isso, o Requerente tem o direito de ser reembolsado do imposto pago e juros indemnizatórios por força dos referidos artigos 24.º, n.º 1, alínea b), do RJAT e 100.º da LGT, pois tal é essencial para “restabelecer a situação que existiria se o ato tributário objeto da decisão arbitral não tivesse sido praticado”.

80. À luz da Jurisprudência uniforme do STA, “em geral, pode afirmar-se que o erro imputável aos serviços que operaram a liquidação, entendidos estes num sentido global, fica demonstrado quando procederem a reclamação graciosa ou impugnação dessa mesma liquidação” (cfr., v. g., Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 31 de Outubro de 2001, Processo n.º 26167).

81. Os juros indemnizatórios são devidos desde a data do pagamento indevido até à data da emissão da respetiva nota de crédito (art. 61.º, n.º 3, do CPPT). Trata-se de situações em que há anulação do ato impugnado, o que é corolário da existência de erro imputável aos serviços. Nestas situações, o contribuinte tem direito a que seja a reconstituída «a legalidade do acto ou situação objecto do litígio» (art. 100.º da LGT), isto é, a que seja plenamente reconstituída a situação que existiria se o ato ilegal não tivesse sido praticado.

82. No caso em apreço, a AT procedeu, sem fundamento legal bastante, à correção ao lucro tributável do exercício de 2013, relativa aos ajustamentos decorrentes da aplicação do justo valor, na importância de € 5.226.529,69, por desconsideração do montante a deduzir, inscrito no Campo 759 do Quadro 07 da Declaração de Rendimentos Modelo 22 – Ajustamentos não tributados decorrentes da aplicação do justo valor, sendo que este, no caso em apreço, não pode ser tributado porque não estão satisfeitas as condições do artigo 18º do CIRC. Não sendo aplicável o modelo do justo valor, deveria ter sido ser aplicado o modelo da realização, ficando a operação no âmbito do regime das mais e menos valias, verificando-se que as mesmas foram incorridas em 2011 e 2012, aquando da alienação das participações, pelo que, se tributáveis, deveriam ser imputadas a esses anos e não a 2013. O erro na liquidação do IRC deve-se, por conseguinte, a um erro imputável aos serviços, em face do disposto no n.º1 do art. 43º  da LGT e no n.º 5 do art. 24° do RJAT.

83. Assim, deverá a Autoridade Tributária e Aduaneira dar execução ao presente acórdão, nos termos do art. 24.º, n.º 1, do RJAT, determinando o montante a restituir aos Requerentes e calcular os respectivos juros indemnizatórios, à taxa legal supletiva das dívidas cíveis, nos termos dos arts. 35.º, n.º 10, e 43.º, n.ºs 1 e 5, da LGT, 61.º, do CPPT, 559.º do Código Civil e Portaria n.º 291/2003, de 8 de Abril (ou diploma ou diplomas que lhe sucederem).

84. Os juros indemnizatórios são devidos desde a ou as  datas dos pagamentos [no caso, havia sido acordado o pagamento em prestações], até à do processamento da nota de crédito, em que são incluídos (art. 61.º, n.º 5, do CPPT).

 

IV. DECISÃO

 

Em face do exposto, decide este tribunal:

a)            Julgar improcedente a excepção de intempestividade do pedido suscitada pela Requerida;

b)           Anular a correção promovida em sede de inspeção tributária da liquidação adicional de IRC n.º 2018..., respeitante ao período de tributação de 2013, bem como a respetiva liquidação de juros compensatórios n.º 2018... e liquidação de juros de mora n.º 2018... e a consequente demonstração de acerto de contas n.º 2018..., com fundamento em erro sobre os pressupostos de facto e de direito.

c)            Condenar a AT no pagamento de juros indemnizatórios desde a ou as datas dos pagamentos fraccionados efetuados pela demandante e sobre os respetivos valores, até à data da emissão da nota de crédito em que sejam incluídos.

 

V. Valor do processo

Fixa-se o valor do processo em € 101.835,22 (oitenta mil e setecentos e cinquenta euros), nos termos do disposto no art. 32.º do CPTA e no art. 97.º-A do CPPT, aplicáveis por força do disposto no artigo 29.º, n.º 1, als. a) e b), do RJAT, e do artigo 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária (RCPAT).

 

VI. Custas

Nos termos da Tabela I anexa ao RCPAT, as custas são no valor de €3 060,00 (três mil e sessenta euros), a pagar pela Requerida, conformemente ao disposto nos artigos 12.º, n.º 2, e 22.º, n.º 4, do RJAT, e artigo 4.º, n.º 5, do RCPAT.

Notifique-se.

Lisboa, 17 de março de 2020.

 

Árbitro Presidente

(José Poças Falcão)

 

Árbitro Vogal

(Sérgio Pontes)

 

Árbitro Vogal

(Jónatas Machado)

 

Texto elaborado em computador, nos termos do disposto no art. 131.º, n.º 5, do CPC, aplicável por remissão do art. 29.º, n.º 1, al. e), do RJAT.

A redacção da presente decisão rege-se pela ortografia anterior ao Acordo Ortográfico de 1990.