Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 238/2013-T
Data da decisão: 2014-04-04  IVA  
Valor do pedido: € 3.504.732,36
Tema: Direito à dedução. Conexão entre os encargos suportados e a atividade económica
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Acórdão Arbitral

 

 

            Os árbitros Dr. Jorge Manuel Lopes de Sousa (árbitro-presidente), Dr. Paulo Lourenço e Dr. José Pedro Carvalho (árbitros vogais), designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa para formarem o Tribunal Arbitral, constituído em 15-7-2013, acordam no seguinte:

           

            1. Relatório

 

            A…, titular do número único de pessoa colectiva …, com sede na …, apresentou um pedido de constituição do tribunal arbitral colectivo, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 2.° e 10.° do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, doravante apenas designado por RJAT), em que é Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira, com vista à declaração de ilegalidade dos actos de  Liquidação adicional de IVA n.ºs …, …, …, …, …, …, …, …, …, …, …, …, …, …, …, …, …, …, …, …, …, no montante total de € 577.918,65, e juros compensatórios n.ºs …, …, …, …, …, …, …, …, …, …, …, …, …, …, …, …, …, …, …, …, … (cuja cópia se junta como Doc. n.º 2) no montante de €63.542,15 e, bem assim, da demonstração de liquidação do IVA n.º …. de que resultou reembolso inferior ao solicitado em €3.477.608,78, perfazendo o valor global de €4.055.527,43, na sequência de indeferimento tácito de reclamação graciosa.

O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD e automaticamente notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira em 28-10-2013.

Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.° 1 do artigo 11.º do RJAT, na redacção introduzida pelo artigo 228.° da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, o Conselho Deontológico designou como árbitros do tribunal arbitral colectivo o Exmo. Conselheiro Jorge Lopes de Sousa, o Dr. Paulo Lourenço e o Dr. José Pedro Carvalho, que comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável.

Em 10-12-2013 foram as partes devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a designação dos árbitros, nos termos conjugados do artigo 11.º n.º 1 alíneas a) e b) do RJAT e dos artigos 6.° e 7.º do Código Deontológico.

Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redacção introduzida pelo artigo 228.° da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, o tribunal arbitral colectivo foi constituído em 26-12-2013.

A Autoridade Tributária e Aduaneira respondeu, defendendo que o pedido deve ser julgado improcedente.

Na reunião prevista no artigo 18.º do RJAT, as partes acordaram em que os factos a cuja prova era destinada a prova testemunhal eram públicos e notórios ou estavam já documentalmente demonstrados, pelo que foi dispensada a produção da prova testemunhal, tendo sido determinado que se realizassem alegações, de forma sucessiva.

As Partes apresentaram alegações.

O tribunal arbitral foi regularmente constituído e é materialmente competente, à face do preceituado nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), e 30.º, n.º 1, do DL n.º 10/2011, de 20 de Janeiro.

As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão representadas (arts. 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e art. 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março).

O processo não enferma de nulidades e não foram invocadas excepções.

Assim, não há qualquer obstáculo à apreciação do mérito da causa.

 

2. Matéria de facto

 

 

2.1. Factos provados

 

Com base nos elementos que constam do processo e do processo administrativo junto aos autos, consideram-se provados os seguintes factos:

 

  1. A Requerente é um sujeito passivo de IVA, encontrando-se enquadrada no regime normal de periodicidade mensal.
  2. No decurso da sua actividade, a Requerente veio a apurar um crédito de IVA desde Outubro de 1998 até Dezembro 2011, no montante de €81.876.090,54, tendo optado por solicitar o respectivo reembolso na declaração periódica relativa àquele último período, e submetida a 10 de Fevereiro de 2012.
  3. Na sequência deste pedido de reembolso, a AT decidiu efectuar uma inspecção para aferir da legitimidade do reembolso.
  4. Tendo em consideração que estava em causa um crédito de IVA acumulado por mais de 13 anos, a AT decidiu emitir 4 ordens de serviço.
  5. Assim emitiu 3 ordens de serviço (…, … e …) para, respectivamente, os anos de 2008, 2009 e 2010, ao abrigo das quais elaborou os Relatórios de Inspecção Tributária juntos aos autos, e que deram lugar às liquidações impugnadas, no montante total de € 577.918,65, relativamente a IVA, e no montante total de € 63.542,15, relativamente a juros compensatórios, que foram todas pagas em 30-11-2012.
  6. Foi também emitida uma outra ordem de serviço (…) para o períodos de imposto compreendidos entre 1998 e 2007, e para o ano de 2011, que deu lugar ao Relatório de Inspecção Tributária, também junto aos autos, que por sua vez resultou na demonstração de liquidação de IVA n.º ..., datada de 20-02-2013, na qual se apurou um valor a reembolsar de €78.398.481,74 - em vez dos €81.876.090,54 solicitados, e que continha o seguinte texto:

 

  1. As correcções preconizadas para os períodos de imposto compreendidos nos anos 2008, 2009, 2010 e 2011 radicam, em síntese, nas seguintes tipologias de situações, melhor identificadas no quadro infra:

  1. Os fundamentos apresentados pela AT com vista a suportar as correcções efectuadas encontram-se melhor explanados nos Pontos III dos respectivos Relatórios de Inspecção Tributária, juntos aos autos.
  2. A Requerente, por não concordar com a legalidade de parte das correcções efectuadas, apresentou reclamação graciosa das liquidações ora impugnadas, no dia 28 de Março de 2013, na qual contestou as seguintes correcções:
    1. “IVA deduzido indevidamente (serviços de consultoria referentes a operações fora do campo do imposto)” - com referência à totalidade das correcções efectuadas, no valor global de € 2.723.703,85;
    2. “Encargos sem conexão com a actividade exercida pela A...” – com referência ao imposto incorrido com a aquisição de trabalhos de conservação e reparação do …(em 2003 e 2004), e trabalhos de conservação e reparação em campos de férias, num montante global de € 637.074,87;
    3. “IVA deduzido indevidamente relativo à organização de eventos”, no valor global de € 28.458,42 (correspondente a 50% do montante de imposto corrigido com respeito às despesas que a Requerente entende serem qualificáveis no âmbito de serviços de publicidade);
    4. “Fornecedor com NIF sem registo de actividade” - com referência à totalidade das correcções efectuadas, pelo montante de €150.090,10;
    5. “IVA regularizado indevidamente” - com respeito ao valor global de € 40.884,71;
    6. “Despesas com viagens e refeições” - no que concerne ao valor global de € 37.866,54
  3. Para além dos valores corrigidos no âmbito das situações acima referidas, a Requerente contestou ainda o montante total das correcções relativas a juros compensatórios liquidados pela AT, entendendo que, com referência aos períodos em apreço e mesmo após as correcções efectuadas, permaneceu em situação credora de IVA perante o Estado, inexistindo, por conseguinte, qualquer prestação tributária em atraso ou em falta.
  4. As restantes correcções que não foram objecto de contestação foram aceites pela Requerente, estando já devidamente regularizadas.
  5. A Requerente encabeça um grupo empresarial que opera no sector …, abarcando a produção, a distribuição e a comercialização de ….
  6. A Requerente é a sociedade mãe do grupo, exercendo uma funções na definição da estratégia do grupo, e nos vários serviços que presta às suas subsidiárias, actividade para a qual conta com cerca de 452 trabalhadores.
  7. A actividade da Requerente consiste, designadamente, na compra e venda de … e na compra e venda de …, compreendendo ainda a prestação de serviços às empresas do Grupo que encabeça
  8. No artigo 3.º dos estatutos, consta o seguinte:

 

“1. A A... tem por objecto a promoção, dinamização e gestão, por forma directa ou indirecta, de empreendimentos e actividades na área do sector …, tanto a nível nacional como internacional, com vista ao incremento e aperfeiçoamento do desempenho do conjunto das sociedades do seu grupo.

2. A A..., no desenvolvimento do seu objecto social deverá, relativamente às sociedades do seu grupo:

a) proceder à definição da estratégia global conjunta daquelas sociedades;

b) coordenar a actuação das mesmas, em ordem a garantir o cumprimento das atribuições que em cada momento lhes estejam cometidas;

c) assegurar a representação conjunta dos interesses comuns a todas elas;

d) assegurar, globalmente, as funções comuns a todas elas, nomeadamente na área financeira, com vista à obtenção de sinergias de grupo.

3. A sociedade pode igualmente adquirir participações como sócio de responsabilidade limitada em sociedades com objecto social diferente do seu, mesmo que reguladas por leis especiais, ou participar em agrupamentos complementares de empresas, agrupamentos europeus de interesse económico, consórcios ou outros quaisquer tipos de associação, temporária ou permanente.

4. A sociedade pode prestar serviços e conceder suprimentos e outras formas de empréstimo às sociedades suas participadas, nos termos previstos na lei.”

  1. A requerente é sujeito passivo de IVA, com actividade económica sujeita a imposto.
  2. A actividade desenvolvida pela Requerente é tributada em IVA ou, não sendo tributada, por beneficiar de uma não sujeição (cf. artigo 6.º, n.º 5 e n.º 6, alínea a) do Código do IV A), confere o direito à dedução deste imposto.
  3. Das principais tipologias de operações realizadas pela Requerente no decurso dos últimos três anos, foi liquidado IVA cujo valor atingiu perto de novecentos milhões de euros.
  4. No âmbito da actividade operacional prosseguida, a Requerente, ao encabeçar um grupo económico multinacional que opera transversalmente no sector …, realiza avultados investimentos com o propósito de expandir o seu negócio e conquistar quota de mercado relevante em novas geografias.
  5. Tendo em vista a afirmação do grupo A... em novos mercados e a consolidação da posição assumida como player mundial de referência no sector …, foi feita uma aposta numa estratégia de investimento em mercados internacionais.
  6. Actualmente a Requerente está presente em treze jurisdições, compreendidas em três continentes, marcando presença entre os grandes operadores europeus do sector … e assumindo-se como um dos maiores operadores … da Península Ibérica.
  7. A actividade da Requerente de investimento em novas áreas geográficas tem vindo a ser concretizada pela Requerente, mediante a aquisição de participações sociais.
  8. Em momento prévio à concretização do investimento, a Requerente suporta despesas de investimento reportadas à identificação de novas oportunidades de negócio, designadamente, no contexto da prospecção de mercados.
  9. A tomada de participações accionistas em empresas preexistentes tem em vista a gradual afirmação do grupo A... na geografia-alvo, pela marcação de presença através da aquisição de empresas já com actividade operacional e detentoras de quota de mercado relevante na respectiva área geográfica de influência.
  10. O facto da actividade … ser intensamente regulamentada em praticamente todas as geografias, determina que a expansão do negócio na sua vertente internacional seja feita prioritariamente mediante a aquisição de veículos societários locais já dotados das respectivas licenças de exploração pelas entidades competentes.
  11. A expansão do investimento da Requerente para o Brasil começou por ter lugar no sector …, com a aquisição de uma participação minoritária numa sociedade …, em 1996, e na aquisição de 25% na …, em 1997.
  12.  A Requerente, por via da sua subsidiária B… veio a investir na aquisição de participações na C… - empresa que, operando no sector … no estado de …, era considerada como uma das maiores distribuidoras ….
  13. Em 1998, a referida subsidiária (B...) adquiriu a C... em parceria com a D… ("D…").
  14. Em 1999, a Requerente adquiriu ainda uma participação directa e indirecta na sociedade E…, veículo controlador da F… e da G… empresas a operar no sector ….
  15. Em 2000, a Requerente veio a constituir a A...Brasil para agrupar todas as participações que foi adquirindo em sociedades brasileiras.
  16. Em 2001, a venda, pela D..., da sua participação na C..., possibilitou à B... adquirir integralmente as participações detidas pela D... na C....
  17. A tomada de participações na C... pela B... assumiu-se como uma operação preparatória e dirigida a permitir o ulterior controlo da empresa por parte da ora Requerente (na proporção das participações detidas naquela empresa - i.e. 81,20%).
  18. Em 2012 e tal como reflectido no respectivo Relatório e Contas, a A... apresentou “um aumento do EBITDA de 8%/ ano desde 2005, assente nas duas grandes plataformas de crescimento do Grupo: … e Brasil. Estas duas plataformas, que em 2005 pesavam 23% do EBITDA, representam agora em 2012 praticamente 41% das suas operações.”
  19. No que respeita à H… (actualmente sob a designação de H…), trata-se de uma empresa norte-americana adquirida pela Requerente (em 2007) dedicada à actividade de …, assumindo-se como … player … no segmento da produção ….
  20. Este investimento realizado pela Requerente foi decisivo para permitir a conquista de uma quota de mercado relevante no sector …. na América do Norte.
  21. Os Estados Unidos da América representam actualmente o principal mercado da Requerente ao nível …, sendo a H… uma das maiores produtoras ….
  22. No contexto destas operações de investimento - que ocorreram através da aquisição de participações sociais em sociedades existentes – a requerente adquiriu serviços de assessoria e trabalhos especializados diversos, como apoio na coordenação e execução da reorganização dos activos, assistência nas negociações e consultoria jurídica para a redacção de contratos.
  23. Este investimento da Requerente determinou o envolvimento de diversos departamentos técnicos da A..., incluindo departamentos de assessoria jurídica, análise de negócio, relação com investidores, planeamento …, e a prestação de serviços especializados às diferentes empresas do grupo (detidas e a deter pela A...).
  24. A actividade da Requerente após a realização do investimento compreendeu a prestação de serviços em actividades e processos que são transversais às participadas, tendo em vista a obtenção de economias de escala, em resultado de uma afectação racional de recursos.
  25. A aquisição de participações é uma operação por via da qual a Requerente vem a exercer, por forma directa ou indirecta, influência na condução geral da actividade desenvolvida pelas empresas por si participadas (sempre do sector … e nos domínios da produção, distribuição e/ou comercialização), o que é assegurado através da intervenção de colaboradores seus na prestação de serviços especializados tais como a prestação de apoio jurídico, serviços de auditoria nas áreas de Auditoria Interna, serviços de consultoria nas áreas da Fiscalidade, Sustentabilidade, Planeamento …, Regulação e Concorrência, Gestão do Risco, Contabilidade e Consolidação.
  26. A par das operações de investimento em novos mercados que referidas supra, e com vista a reunir fundos para o financiamento global das actividades do grupo e proceder à sua estruturação de forma a potenciar sinergias, a Requerente vendeu 60% da participação detida na I…, 50% da participação detida na J… e 29% da participação detida na ...
  27. No que se refere à I..., na medida em que a actividade prosseguida por esta entidade, que incluía prestações de serviços no domínio dos sistemas e tecnologias de informação, se assumia como acessória à actividade do grupo A..., a Requerente optou por externalizar a contratação dos referidos serviços.
  28. A Requerente procedeu à alienação integral das participações sociais (60% em 2005 e os restantes 40% em 2008) à ….
  29. Os serviços de apoio informático prestados até então pela I... à Requerente continuaram a sê-lo, a partir daí pela referida….
  30. Relativamente à J… - empresa que tem por objecto a promoção, desenvolvimento e gestão, de forma directa ou indireta, de … e outras instalações de produção e venda de … em Portugal, através de … e a realização de estudos e execução de projectos no mesmo âmbito, bem como a prestação de quaisquer outras actividades e serviços conexos no âmbito da definição do modelo de negócio - a Requerente optou por proceder à venda de 50% das participações detidas naquela entidade à … com vista à instituição de uma parceria económica para a produção de….
  31. A Requerente continuou a exercer a sua actividade através da J….
  32. Com respeito à alienação da participação na … - empresa constituída pela A... juntamente com a … e o grupo …, cuja actividade consistia na exploração da concessão de distribuição de na região de … - a decisão de venda se inscreveu num contexto de desinvestimento da A... no mercado marroquino mediante verificação de que o investimento realizado não teve o retorno esperado.
  33. Esta operação teve ainda subjacente um maior enfoque das actividades internacionais do Grupo A... no Brasil, possibilitando a canalização de investimento para essa geografia.
  34. Numa fase preparatória dos desinvestimentos acima referidos, e com o intuito de análise das implicações e condicionantes associadas, foram adquiridos trabalhos especializados, como a avaliação de títulos, assistência nas negociações e consultoria jurídica para a redacção de contratos.
  35. A Requerente deduziu, nos anos de 2003, 2004, e 2005, respectivamente, IVA nos valores de €77.364,05, €477.536,90 e €9.712,50, liquidado em serviços facturados à Requerente, relativos a “trabalhos de construção e reparação efectuados no …”, pelas empresas de construção …, … e …, nos anos de 2003 e 2004, e à montagem de sistemas de alarme, em 2005, no mesmo Edifício, pela empresa ….
  36. Esses valores não foram aceites pela AT e foram deduzidos ao montante do reembolso solicitado, por “compensação”.
  37. O Edifício da …, foi outrora uma estrutura pioneira no domínio ….
  38. Nos anos de 2009 e 2010, a Requerente procedeu à dedução de IVA incorrido com a aquisição de serviços relativos à organização eventos, no valor de €56.916,84, liquidado à Requerente pelas sociedades K… e L… em 4 facturas, as duas primeiras de Maio de 2009 relativas ao evento … - com IVA liquidado nos valores de €9.582,00 e €20.614,20 - e as 2 restantes de Julho de 2010, relativas ao evento …. - com IVA liquidado nos valores de € 15.000,00 e € 11.720,63.
  39. O Concerto na … foi objecto de transmissão televisiva e de ampla cobertura mediática.
  40. No ano de 2005, a Requerente deduziu IVA no montante total de €17.430,00, correspondente a 2 facturas emitidas pela sociedade M…, com o NIPC …, que constava no sistema informático da Administração Tributária como não tendo registo de início de actividade para efeitos fiscais, com a indicação “n.º fiscal sem registo de actividade”.
  41. No ano de 2006, a Requerente deduziu IVA no montante total de €18.585,00, correspondente a 3 facturas emitidas pela sociedade “M…”, com o NIPC …, que constava no sistema informático da Administração Tributária como não tendo registo de início de actividade para efeitos fiscais, com a indicação “n.º fiscal sem registo de actividade”.
  42. No ano de 2007, a Requerente deduziu IVA no montante total de €18.291,00, correspondente a 2 facturas emitidas pela sociedade “M…”, com o NIPC …, que constava no sistema informático da Administração Tributária como não tendo registo de início de actividade para efeitos fiscais, com a indicação “n.º fiscal sem registo de actividade”.
  43. A entidade em causa (“M…”), nunca procedeu à entrega de qualquer declaração para efeitos fiscais, incluindo início/cessação de actividade, ou IRC/IVA/IES.
  44. No ano de 2006, a Requerente deduziu IVA no montante total de €35.758,80, correspondente a 3 facturas emitidas pela sociedade “N…”, com o NIPC …, que constava no sistema informático da Administração Tributária como não tendo registo de início de actividade para efeitos fiscais, com a indicação “n.º fiscal sem registo de actividade”.
  45. No ano de 2008, a Requerente deduziu IVA no montante total de €36.997,30, correspondente a 11 facturas emitidas pela referida sociedade “N…”, com o NIPC …, que constava no sistema informático da Administração Tributária como não tendo registo de início de actividade para efeitos fiscais, com a indicação “n.º fiscal sem registo de actividade”.
  46. No ano de 2009, a Requerente deduziu IVA no montante total de €19.008,00, correspondente a 6 facturas emitidas pela sociedade “N…”, com o NIPC …, que constava no sistema informático da Administração Tributária como não tendo registo de início de actividade para efeitos fiscais, com a indicação “n.º fiscal sem registo de actividade”.
  47. A entidade em causa (“N…”), nunca procedeu à entrega de qualquer declaração para efeitos fiscais, incluindo início/cessação de atividade, ou IRC/IVA/IES.
  48. Nesse mesmo ano de 2009, a Requerente deduziu IVA no montante total de €4.020,00, correspondente a 1 factura emitida pela sociedade “O…”, com o NIPC …, que constava no sistema informático da Administração Tributária como tendo cessado a sua actividade em 31-12-2008.
  49. Em pesquisa realizada em data concretamente não apurada, efectuada no Portal das Finanças, mas anterior à apresentação do reclamação graciosa, a Requerente constatou que o número de identificação fiscal (NIF) do fornecedor “M...” referia, nos dados de actividade, "número fiscal sem registo de actividade".
  50. O portal das finanças contempla uma mensagem específica para as situações de NIF inválido, a saber: “O n.º de contribuinte indicado é inválido.”
  51. O Portal das Finanças, da Autoridade Tributária e Aduaneira, permite verificar se as empresas têm registo de actividade; 
  52. Nos anos de 2004 e 2005, a Requerente procedeu à dedução do IVA contido em despesas de alojamento, refeições e deslocações debitadas pela P… no contexto de prestações de serviços efectuadas à Requerente e relativamente às quais procedeu a Requerente à autoliquidação e dedução do imposto, no valor global de € 37.866,54 (€ 17.251,48 em 2004 e € 20.615,06 em 2005);
  53. Os serviços que a Requerente pretendeu adquirir à P… não foram serviços de alojamento, refeições ou estadias.

 

 

2.2. Factos não provados

 

  1. As facturas relativas ao …, correspondem a inputs da actividade da …, com o NIF ….
  2. Os serviços a que as despesas de alojamento, refeições e deslocações debitadas pela P… respeitam consistiram na realização de uma avaliação dos activos da A... no Brasil, nomeadamente no apoio na coordenação e execução da reorganização e avaliação dos activos detidos naquele território.
  3. A Requerente contratou à P… uma prestação de serviços global que, para ser realizada, incorporou uma série de despesas acessórias.
  4. No caso concreto, a inclusão do descritivo dessas despesas serviu apenas a finalidade de permitir à Requerente verificar a sua adequação/carácter necessário para a realização do serviço contratado.
  5. Quais as despesas relativas a eventos que constituíram encargos com despesas de deslocação e alimentação de gestores de eventos, hospedeiras, despesas com promotoras incluindo transporte, alimentação e estadia;

 

2.3. Fundamentação da fixação da matéria de fato

 

Os factos provados baseiam-se nos documentos constantes dos autos, em especial no Relatório de Inspecção Tributária e nos documentos juntos pela Requerente, na petição inicial.

Foi igualmente tido em conta o acordo das Partes consignado na acta da reunião a que alude o artigo 18.º do RJAT, em que foram consensualmente aceites os factos alegados nos artigos 22.º a 79.º da petição inicial, inclusive.

Do teor daqueles artigos foi expurgada a matéria de direito e meramente conclusiva, razão pela qual, entre outras partes, e ao contrário do que pretende a Requerente nas suas alegações escritas (ponto 42), não se deu como provado (ou não provado) que os juízos da Administração Tributária tenham sido conclusivos, formulados em abstracto e sem qualquer fundamento referido ao caso concreto, uma vez que a concordância manifestada em acta por aquela está limitada a matéria fáctica, e não a matéria conclusiva, como é, flagrantemente, o caso!

O facto a que se refere o ponto ppp) é considerado público e notório, uma vez que a entidade aí em causa – P… – não se dedica, consabidamente, à prestação de serviços de alojamento, refeições e estadias.

Os factos dados como não provados, resultam da ausência ou insuficiência de prova a seu respeito.

 

 

3. Matéria de direito

 

3.1. Questão da incompetência para apreciação do indeferimento parcial do pedido de reembolso

 

Como questão prévia ao conhecimento do mérito nos presentes autos, a Autoridade Tributária e Aduaneira suscita a incompetência parcial do presente tribunal arbitral, em razão da matéria.

Alega, em suma aquela Autoridade que relativamente “à compensação efectuada no montante de € 2 926 813,71, trata-se de um indeferimento parcial do pedido de reembolso efectuado pela Requerente em Fevereiro de 2012, não havendo, pois, nenhuma dúvida de que o que vem impugnado nesta parte não traduz um acto tributário liquidação, mas um acto de indeferimento parcial de um reembolso”, que não se encontra abrangido pela competência dos tribunais arbitrais a funcionar no CAAD, tal como resulta da conjugação do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, com a Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março.

Cumpre assim, antes de mais, determinar se a matéria em causa tem cabimento, ou não, no âmbito de competência da jurisdição arbitral tributária ( [1] ).

O artigo 124.º da Lei n.º 3-B/2010, de 28 de Abril, autorizou o Governo a legislar “no sentido de instituir a arbitragem como forma alternativa de resolução jurisdicional de conflitos em matéria tributária”, de modo a que o processo arbitral tributário constituísse um meio processual alternativo ao processo de impugnação judicial e à acção para o reconhecimento de um direito ou interesse legítimo em matéria tributária.

O Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (RJAT), concretizou a mencionada autorização legislativa com um âmbito mais restrito do que o inicialmente previsto, não contemplando designadamente uma competência alternativa à da acção para o reconhecimento de um direito ou interesse legítimo em matéria tributária, e “instituiu a arbitragem tributária limitada a determinadas matérias, arroladas no seu art.º 2.º” fazendo depender a vinculação da administração tributária de “portaria dos membros do Governo responsáveis pelas áreas das finanças e da justiça, que estabelece, designadamente o tipo e o valor máximo dos litígios abrangidos” ( [2] ).

O âmbito da jurisdição arbitral tributária está, assim, delimitado, em primeira linha, pelo disposto no artigo 2.º do RJAT que enuncia, no seu n.º 1, os critérios de repartição material da competência, abrangendo a apreciação de pretensões que se dirijam à declaração de ilegalidade de actos de liquidação de tributos ( [3] ).

            Dado o carácter voluntário da sujeição à jurisdição arbitral, numa segunda linha “a competência dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD é também limitada pelos termos em que a Administração Tributária se vinculou àquela jurisdição, concretizados na Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março, pois o art. 4.º, n.º 1 do RJAT estabelece que “a vinculação da administração tributária à jurisdição dos tribunais constituídos nos termos da presente lei depende de portaria dos membros do Governo responsáveis pelas áreas das finanças e da justiça”  ( [4] ).

            Dispõe a citada Portaria, no seu artigo 2.º, que “Os serviços e organismos referidos no artigo anterior vinculam-se à jurisdição dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD que tenham por objecto a apreciação das pretensões relativas a impostos cuja administração lhes esteja cometida referidas no n.º 1 do artigo 2.º do Decreto -Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, com excepção das seguintes:...”, indicadas nas alíneas subsequentes do mesmo artigo.

 

*

Como se viu já, alega a Autoridade Tributária e Aduaneira que os actos de o indeferimento parcial do reembolso efectuado mediante compensação, não se encontram abrangidos pela competência dos tribunais arbitrais em matéria tributária, a funcionar no CAAD.

Neste aspecto, e atento o quadro legal acima traçado, tem de se concluir que não se prevê expressamente a competência dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD para apreciação da legalidade de actos de indeferimento de pedidos de reembolso de quantias pagas, em cumprimento de anteriores actos de liquidação.

Porém, no caso em apreço, como se vê pelo documento reproduzido na alínea f) da matéria de facto fixada, foi a própria Autoridade Tributária e Aduaneira que efectuou uma operação de contabilização de IVA a reembolsar que denominou «DEMONSTRAÇÃO DE LIQUIDAÇÃO IVA», a que atribuiu um «NÚMERO LIQUIDAÇÃO» e uma «DATA LIQUIDAÇÃO», e indicou, na parte final, que a Requerente «fica (...) notificado(a) da liquidação de IVA relativa ao período a que respeitam as operações, em resultado da qual se verifica haver lugar a reembolso no montante apurado, conforme nota demonstrativa supra» e «Da liquidação efectuada, poderá V. Exa. apresentar, no Serviço de Finanças competente, reclamação graciosa ou impugnação judicial nos termos dos art°s 70° e 102° do CPPT».

Ou seja: face aos elementos documentais disponíveis, dever-se-á concluir que, em concreto, bem ou mal, foi praticado um acto de liquidação. Tal acto, corporizado no documento notificado à Requerente integrante da demonstração de liquidação de IVA n.º ..., datada de 20-02-2013, será, para além das restantes liquidações mais, o objecto dos presentes autos, reconduzível à previsão da alínea a) do artigo 2.º do RJAT.

A legalidade de tal acto – bem ou mal praticado – é susceptível de ser apreciada e enquadra-se, directamente, no âmbito das competências do tribunais arbitrais a funcionar no CAAD, pelo que a invocada excepção de incompetência absoluta, haveria de improceder.

Mesmo que assim não se entendesse, desde há muito que se vem adoptando o entendimento de que os administrados não devem ser prejudicados no exercício de direitos processuais quando forem induzidos em erro por actos de entidades públicas competentes, regra que tem afloramentos explícitos, para os tribunais, no artigo 157.º, n.º 6, e no artigo 191.º, n.º 3, do CPC de 2013 (anteriores artigos 161.º, n.º 1, 198.º, n.º 3) e ( [5] ) e para os actos da administração, no artigo 7.º do CPA e no artigo 60.º, n.º 4, do CPTA ( [6] ) ( [7] ).

Ou seja, tem-se entendido, em suma, que quando um administrado seja induzido à utilização de um determinado meio processual por uma determinada conduta da Administração, não poderá esta pretender obstar ao conhecimento do mérito do pedido, escudando-se na inadequação do meio processual cuja utilização ela própria, objectivamente, induziu.

No caso, verifica-se inclusive que há doutrina, (JOSÉ XAVIER DE BASTO e GONÇALO AVELÃS NUNES), a defender que, «um reembolso contestado pela administração fiscal em tudo equivale a uma liquidação de imposto e os meios de reagir contra esse acto da administração, que nega ou revoga um reembolso, são idênticos aos que a lei põe à disposição dos contribuintes para anular, no todo ou em parte a liquidação do imposto» ( [8] ), tese esta que está em sintonia com a aplicação, determinada pelo artigo 22.º, n.ºs 11 e 13 do CIVA, aos actos de indeferimento de pedidos de reembolso dos meios de impugnação administrativa e contenciosa dos actos de liquidação de IVA, previstos no artigo 93.º do mesmo Código. ( [9] )

Neste contexto, sendo a própria Administração Tributária que na notificação identificou o acto notificado como sendo de liquidação de IVA, induzindo a Requerente à utilização de um meio processual adequado à respectiva impugnação, e não sendo seguro que tal qualificação seja errada (como não pode deixar de se entender quando se constata que a adequação de tal qualificação é afirmada por dois reputados professores universitários de direito tributário) sempre, também por esta via, seria de julgar improcedente a excepção suscitada pela Autoridade Tributária e Aduaneira.

 

3.2. Regime essencial do direito à dedução de IVA

 

De harmonia com o art. 2.º da Directiva n.º 2006/112/CE, do Conselho, de 28-11-2006, estão sujeitas ao IVA, para além de outras, as operações de entregas de bens efectuadas a título oneroso no território de um Estado-Membro por um sujeito passivo agindo nessa qualidade, as aquisições intracomunitárias de bens efectuadas a título oneroso no território de um Estado-Membro, as prestações de serviços efectuadas a título oneroso no território de um Estado-Membro por um sujeito passivo agindo nessa qualidade e as importações de bens.

Na mesma linha o Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado (CIVA) estabelece, no seu art. 1.º, que estão sujeitas a este imposto as transmissões de bens e as prestações de serviços efectuadas no território nacional, a título oneroso, por um sujeito passivo agindo como tal, as importações de bens e as operações intracomunitárias efectuadas no território nacional, tal como são definidas e reguladas no Regime do IVA nas Transacções Intracomunitárias.

Nos termos do art. 9.º da Directiva «entende-se por "sujeito passivo" qualquer pessoa que exerça, de modo independente e em qualquer lugar, uma actividade económica, seja qual for o fim ou o resultado dessa actividade» e «entende-se por "actividade económica" qualquer actividade de produção, de comercialização ou de prestação de serviços, incluindo as actividades extractivas, agrícolas e as das profissões liberais ou equiparadas. É em especial considerada actividade económica a exploração de um bem corpóreo ou incorpóreo com o fim de auferir receitas com carácter de permanência».

O CIVA estabelece que são sujeitos passivos, além de outras, «as pessoas singulares ou colectivas que, de um modo independente e com carácter de habitualidade, exerçam actividades de produção, comércio ou prestação de serviços, incluindo as actividades extractivas, agrícolas e as das profissões livres, e, bem assim, as que, do mesmo modo independente, pratiquem uma só operação tributável, desde que essa operação seja conexa com o exercício das referidas actividades, onde quer que este ocorra, ou quando, independentemente dessa conexão, tal operação preencha os pressupostos de incidência real do imposto sobre o rendimento das pessoas singulares (IRS) ou do imposto sobre o rendimento das pessoas colectivas (IRC)».

O direito à dedução surge no momento em que o imposto se torna exigível (art. 167º da Directiva n.º 2006/112/CE e art. 22.º n.º 1, do CIVA) e, em regra, só pode deduzir-se o imposto que tenha incidido sobre bens ou serviços adquiridos, importados ou utilizados pelo sujeito passivo para a realização de operações tributadas (arts. 168.º da Directiva n.º 2006/112/CE e art. 20.º, n.º 1, do CIVA).

No que diz respeito aos bens e aos serviços utilizados por um sujeito passivo para efectuar tanto operações com direito à dedução, como operações sem direito à dedução, a dedução só é admitida relativamente à parte do IVA proporcional ao montante respeitante à primeira categoria de operações (arts. 173.º da Directiva n.º 2006/112/CE e 23.º n.ºs 1 e 2, do CIVA).

O pro rata de dedução é determinado para o conjunto das operações efectuadas pelo sujeito passivo e resulta de uma fracção que inclui os seguintes montantes:

a) No numerador, o montante total do volume de negócios anual, líquido de IVA, relativo às operações que confiram direito à dedução;

b) No denominador, o montante total do volume de negócios anual, líquido de IVA, relativo às operações incluídas no numerador e às operações que não confiram direito à dedução (arts. 174.º da Directiva n.º 2006/112/CE e 23.º n.º 4, do CIVA).

 

O pro rata de dedução é determinado anualmente, fixado em percentagem e arredondado para a unidade imediatamente superior (arts. 177.º da Directiva n.º 2006/112/CE e 23.º n.º 4, do CIVA).

O regime vigente antes da Directiva n.º 2006/112/CE, que constava da Sexta Directiva (n.º 77/388/CEE, de 17-5-1977) e é aplicável aos factos anteriores a 1-1-2007, era idêntico, designadamente sendo as mesmas as normas do CIVA aplicáveis.

 

3.2.1. Questão do direito ao reembolso do IVA pago relativamente a serviços de consultadoria relacionados com a internacionalização da Requerente

 

Como resulta da matéria de facto fixada, a Requerente solicitou o reembolso da quantia de €81.876.090,54, relativo IVA suportado no anos de 1998 a 2007, tendo a Autoridade Tributária e Aduaneira, através da liquidação n.º ..., datada de 20-02-2013, entendido que o valor a reembolsar é de €78.398.481,74, sendo a diferença de €3.477.608,80.

Desta diferença, a quantia de € 2.723.703,85 reporta-se, no entender da Autoridade Tributária e Aduaneira, a IVA deduzido indevidamente relativo a serviços de consultadoria referentes a operações fora do campo do imposto [quadro que consta da alínea g) da matéria de facto fixada].

 

3.2.1.1. Reembolso relativo ao ano de 2002

 

A recusa parcial do reembolso pedido pela Requerente baseou-se, no que concerne à quantia de €1.915.446,66, no entendimento de que se reporta a IVA suportado com serviços de assessoria relativa a transacções de participações financeiras operações que a Autoridade Tributária e Aduaneira considerou «fora do campo do imposto» (relatório que consta do documento n.º 6 junto com a petição inicial, cujo teor se dá como reproduzido).

Refere-se aquela quanto ao IVA pago pela Requerente relativamente às facturas registadas na contabilidade relativas ao ano de 2002 com os n.°s … e … emitidas pelas sociedades … e …, respectivamente, relativas a serviços de assessoria na transacção de participações financeiras.

A primeira factura respeita à aquisição de 60% da sociedade C... e 40% da sociedade D..., em que foi liquidado IVA no montante de €1.429.893,12, nos termos da alínea c) do n.° 8 do artigo 6.° do CIVA, e simultaneamente à dedução do mesmo valor.

A segunda factura foi registada em 2002-12-31 e refere-se à prestação de serviços associada à transacção da participação na sociedade …, tendo a Requerente procedido à dedução de IVA no montante de €485.553,54.

 

3.2.1.2. Reembolso relativo ao ano de 2005

 

A Autoridade Tributária e Aduaneira entendeu que a Requerente deduziu indevidamente IVA, no montante de €266.000,00 correspondente ao imposto suportado na aquisição de serviços de consultadoria referente a operações fora do campo do imposto (transacções de partes de capital), não dedutível por não verificar os requisitos que lhe conferem o direito à dedução de imposto, nos termos do n.° 1 do artigo 20.° do CIVA.

Está em causa, quanto ao ano de 2005, a factura registada na contabilidade da Requerente, em 2005-06-17, com o n.º …, com a descrição "Projecto …", relativa a honorários pelos serviços prestados na coordenação da venda de 60% do capital da sociedade I..., emitida pela sociedade …, tendo procedido à dedução de IVA no montante de €266.000,00.

 

3.2.1.3. Reembolso relativo ao ano de 2006

 

A Requerente registou na sua contabilidade, em 2006-02-02 a fatura n.° … relativa a honorários pelos serviços prestados no processo de venda de 50% do capital da sociedade J, emitida pela sociedade …, tendo procedido à dedução de IVA no montante de €26.917,95.

 

 3.2.1.4. Reembolso relativo ao ano de 2007

 

A Requerente registou na sua contabilidade, em 2007-08-20 a factura n.° …, relativa a honorários pelos serviços prestados na coordenação da aquisição de 100% do capital da sociedade H…, emitida pela sociedade …, tendo procedido à liquidação de IVA no montante de €491.235,80 nos termos da alínea c) do n.° 8 do artigo 6.° do CIVA, e simultaneamente à dedução do mesmo valor.

 

3.2.1.5. Reembolso relativo ao ano de 2009

 

A Requerente registou na sua contabilidade, em 2009-03-31 a factura n.° …, relativa a honorários pelos serviços prestados na coordenação da aquisição de 100% do capital da sociedade H…, emitida pela sociedade …, tendo procedido à liquidação de IVA no montante de €24.103,44 nos termos da alínea c) do n.° 8 do artigo 6.° do CIVA, e simultaneamente à dedução do mesmo valor (Relatório relativo ao ano de 2009, incluído no documento n.º 5 junto com a petição inicial, cujo teor se dá como reproduzido) .

 

3.2.1.6. Fundamentação da recusa de reembolso quanto ao IVA suportado com despesas de consultadoria

 

A recusa do reembolso quanto ao IVA suportado com despesas de consultadoria foi baseada pela Autoridade Tributária e Aduaneira nas considerações que seguem ( [10] ):

 

Contudo, as deduções efetuadas mostram-se indevidas nos termos dos art.°s 19.° e 20.° do CIVA, atendendo que para ser dedutível o IVA suportado nas aquisições de bens e serviços estas devem ter uma relação direta com as operações a jusante que conferem esse direito.

A transação de participações sociais não constitui, em sede de IVA, uma atividade sujeita a imposto, ao não enquadrar-se na incidência expressa do n.° 1 do art.° 1.º do CIVA, pelo que se trata de operações fora do campo de imposto.

Deste modo e, estabelecendo a lei, na al. a) do n.° 1 do art.° 20.° do CIVA o direito à dedução do imposto de inputs a utilizar na realização de operações sujeitas, fá-lo pela positiva, o mesmo será dizer que o IVA suportado nas aquisições de bens e serviços a utilizar em operações ativas não sujeitas ou fora do campo de imposto não conferem o direito à dedução do mesmo, sendo tal conclusão corroborada pela Sexta Directiva e pela jurisprudência do TJCE.

Efetivamente, o sujeito passivo adquiriu serviços de assessoria jurídica, aquisições estas que se encontram dentro do âmbito de aplicação do imposto e sujeitas a IVA no território nacional. Todavia, tais serviços de assessoria associados à aquisição/alienação de partes de capital que confere o eventual direito a dividendos e que na alienação poderão gerar mais e menos valias, caem no âmbito de uma atividade que se encontra fora do campo de aplicação do imposto, não conferindo direito à dedução.

O n.° 2 do art.° 4.° da Sexta Diretiva define como atividades económicas "todas as actividades de produção, de comercialização ou de prestação de serviços", bem como "a exploração de um bem corpóreo ou incorpóreo com o fim de auferir receitas com carácter de permanência".

De acordo com a jurisprudência comunitária, estão fora do conceito de atividade económica, os dividendos de participações, mais valias de ações e de outros títulos negociáveis, juros de obrigações, rendimentos de aplicações em fundos de investimento, juros pela concessão ocasional de crédito pelas holding com recurso a dividendos distribuídos pelas participadas, entrada para o capital de uma sociedade civil e emissão de ações representativas do capital de uma sociedade comercial.

Conclui-se assim que o imposto suportado com a aquisição de serviços exclusivamente afetos a operações fora do conceito de atividade económica não confere direito à dedução.

Para que o IVA seja neutro para os operadores económicos, é permitida aos sujeitos passivos a dedução do imposto suportado a montante, mas apenas nas aquisições de bens e serviços obtidos para a realização de operações tributáveis.

Assim se compreende que as operações não abrangidas pelo âmbito de aplicação da Sexta Diretiva sejam excluídas do direito à dedução previsto no n.° 2 do art.° 17º da referida Diretiva.

É o caso da simples compra e venda de ações, que, por estar fora do campo do imposto, é estranha ao mecanismo da dedução do imposto suportado a montante.

Concluindo e referenciando Xavier de Basto e Odete Oliveira, "só existe direito a deduzir o imposto que tenha sido suportado para a realização de operações sujeitas a IVA. Se (os serviços) respeitam a operações não sujeitas — por não estarem abrangidas pelas normas de incidência, por se tratar (...) de operações fora de campo da aplicação do tributo — não há direito à dedução".'

Deste modo, o IVA suportado a montante, ou seja o IVA faturado pelos fornecedores, e anterior à mecânica de dedução prevista no CIVA, é devido. Contudo, esse IVA não é dedutível, por não ter sido suportado no âmbito da aquisição de serviços utilizados, a jusante, para a transmissão de bens ou prestação de serviços sujeitas a imposto e dele não isentas.

Tendo em conta os condicionalismos do direito à dedução previstos no art.° 20.° do CIVA, só poderá deduzir-se o imposto que tenha incidido sobre bens ou serviços adquiridos, importados ou utilizados pelo sujeito passivo para a realização das operações sujeitas a imposto e dele não isentas.

Face ao exposto não se aceita a dedução do IVA, no montante de €1.915.446,66, nos termos e com os fundamentos relatados (ver Anexo III).

 

 

            3.2.1.7. Decisão da questão da recusa de reembolso quanto ao IVA suportado com despesas de consultadoria

           

Resulta da matéria de facto fixada [alíneas v) a ww)] essencialmente

– que a actividade da Requerente de investimento em novas áreas geográficas tem vindo a ser concretizada pela Requerente, mediante a aquisição de participações sociais,

– que em momento prévio à concretização do investimento, a Requente suporta despesas de investimento reportadas à identificação de novas oportunidades de negócio, designadamente, no contexto da prospecção de mercados,

– que a tomada de participações accionistas em empresas preexistentes tem em vista a gradual afirmação do grupo A... na geografia-alvo, pela marcação de presença através da aquisição de empresas já com actividade operacional e detentoras de quota de mercado relevante na respectiva área geográfica de influência;

– que o facto da actividade de produção e distribuição de… ser intensamente regulamentada em praticamente todas as geografias, determina que a expansão do negócio na sua vertente internacional seja feita prioritariamente mediante a aquisição de veículos societários locais já dotados das respectivas licenças de exploração pelas entidades competentes;

– que no contexto destas operações de investimento - que ocorreram através da aquisição de participações sociais em sociedades existentes – a requerente adquiriu serviços de assessoria e trabalhos especializados diversos, como apoio na coordenação e execução da reorganização dos activos, assistência nas negociações e consultoria jurídica para a redacção de contratos;

–  que este investimento da Requerente determinou o envolvimento de diversos departamentos técnicos da A..., incluindo departamentos de assessoria jurídica, análise de negócio, relação com investidores, planeamento …, e a prestação de serviços especializados às diferentes empresas do grupo (detidas e a deter pela A...):

– que a actividade da Requerente após a realização do investimento compreendeu a prestação de serviços em actividades e processos que são transversais às participadas, tendo em vista a obtenção de economias de escala, em resultado de uma afectação racional de recursos;

– que a aquisição de participações é uma operação por via da qual a Requerente vem a exercer, por forma directa ou indirecta, influência na condução geral da actividade desenvolvida pelas empresas por si participadas (sempre do sector … e nos domínios da produção, distribuição e/ou comercialização), o que é assegurado através da intervenção de colaboradores seus na prestação de serviços especializados tais como a prestação de apoio jurídico, serviços de auditoria nas áreas de Auditoria Interna, serviços de consultoria nas áreas da Fiscalidade, Sustentabilidade, Planeamento …, Regulação e Concorrência, Gestão do Risco, Contabilidade e Consolidação.

 

            Conclui-se da matéria de facto que a actividade de aquisição de participação sociais, a que se reporta a aquisição os serviços de consultadoria em que a Requerente suportou IVA que a Autoridade Tributária e Aduaneira entende não dever ser reembolsado, constitui concretização dos seus objectivos de internacionalização.

A mais recente jurisprudência do TJUE, designadamente o recente acórdão 6-9-2012 do Tribunal de Justiça da União Europeia proferido no processo n.º C-496/11, não dá suporte à posição adoptada pela Autoridade Tributária e Aduaneira, designadamente, quanto à exclusão do direito ao reembolso do IVA suportado com despesas com a aquisição de participações sociais que constituam despesas gerais dos sujeitos passivos.

Embora aquele acórdão tenha sido emitido aplicando o regime da 6.ª Directiva (n.º 77/388/CEE, de 17-5-1977) que foi revogada pela Directiva n.º 2006/112/CE do Conselho, de 28-11-2006, que entrou em vigor em 1-1-2007, o regime desta é essencialmente semelhante à anterior, no que aqui interessa, pelo que se deve fazer aplicação daquela jurisprudência a situação dos autos, tanto aos factos ocorridos antes como depois desta data. Na verdade, como tem sido pacificamente entendido pela jurisprudência, é corolário da obrigatoriedade de reenvio prejudicial prevista no art. 267.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (que substituiu o art. 234.º do Tratado de Roma, anterior art. 177.º), o seu carácter vinculativo para os Tribunais nacionais quando têm de decidir questões conexas com o direito da União. ( [11] )

Designadamente, no que concerne ao regime das deduções de IVA, manifesta-se nesta Directiva n.º 2006/112/CE a preocupação na harmonização, no ponto 39 do Preâmbulo, em que se refere que «o regime das deduções deverá ser harmonizado, uma vez que influencia os montantes efectivamente cobrados, devendo o cálculo do pro rata de dedução ser efectuado da mesma maneira em todos os Estados-Membros».

Refere-se naquele acórdão ( [12] ): «admite-se igualmente um direito a dedução a favor do sujeito passivo, mesmo na falta de um nexo directo e imediato entre uma determinada operação a montante e uma ou várias operações a jusante com direito a dedução, quando os custos dos serviços em causa fazem parte das suas despesas gerais e são, enquanto tais, elementos constitutivos do preço dos bens que fornece ou dos serviços que presta. Estes custos têm, com efeito, um nexo directo e imediato com o conjunto da actividade económica do sujeito passivo».

A mera aquisição de participações sociais, destinadas a detenção e fruição, não é considerada uma actividade económica para efeitos de IVA ( [13] ) ( [14] ).

Porém, a aquisição de participações sociais tendo em vista a expansão da actividade da empresa em novos mercados faz parte de uma actividade global da empresa, com reflexos potenciais na formação dos preços dos bens que fornece e serviços que presta, pelo que se insere na sua actividade económica de fornecimento de bens. Não se está, neste caso, perante uma mera aquisição de participações sociais, a aquisição destas como um fim em si mesmo, tendo em vista usufruir os benefícios pecuniários directos que da sua mera detenção podem advir (dividendos e mais valias), mas sim perante actos de gestão destinados a desenvolver a actividade económica global da Requerente.

Por isso, a jurisprudência do TJUE que a Autoridade Tributária e Aduaneira cita, relativa a situações de «mera aquisição e detenção de participações sociais» não tem aplicação na situação em apreço, em que se provou que as aquisições de participações sociais se destinam a expansão da actividade em novos possíveis mercados.

Por outro lado, para existir relação com a actividade da Requerente, não é necessário que a aquisição de participações seja «um prolongamento directo, permanente e necessário à prossecução da actividade da Requerente», como defende a Autoridade Tributária e Aduaneira, pois não há qualquer disposição legal que o exija e é a Requerente e não a Autoridade Tributária e Aduaneira quem tem o direito de definir a sua estratégia empresarial, podendo efectuar a sua expansão se quiser, quando quiser e como quiser.

Aliás, mesmo que se perspective a aquisição de participações sociais como actividades preparatórias de actividades económicas a desenvolver nos países onde a Requerente pretende expandir a sua actividade, estar-se-á perante uma actividade económica que pode conferir direito à dedução do IVA suportado para as adquirir, «mesmo que, posteriormente, seja decidido, perante os resultados de um estudo de rentabilidade, não passar à fase operacional e colocar a sociedade em liquidação, de modo que a actividade económica projectada não dê origem a operações tributáveis», como também entendeu o TJUE no acórdão de 3-3-2005, processo n.º C-32/03 ( [15] ).

Por isso, aquela aquisição de serviços de consultadoria está conexionada com uma actividade económica da Requerente de aquisição de participações sociais para expansão da sua actividade (e não tendo em vista apenas a sua detenção e fruição) e, indirectamente, com a actividade económica global da Requerente de fornecimento de bens e prestação de serviços.

Mas, mesmo que se entendesse que as referidas despesas de consultadoria conexionada com a aquisição de participações sociais não estivessem directamente conexionadas com uma actividade económica, teria cobertura legal a dedução pela Requerente de todo o IVA suportado a aquisição daqueles serviços, uma vez que a organização da Requerente e a sua expansão internacional têm manifesta relação com sua actividade económica geral. Por isso, as despesas com a aquisição daquelas participações sociais poderiam ser consideradas como custos gerais da Requerente, conexionados directa e imediatamente com a globalidade da sua actividade económica e, como tal, elementos constitutivos dos preços dos bens que fornece e serviços que presta.

É, aliás, este entendimento que se compagina com o princípio da neutralidade do IVA e com a sua natureza de imposto sobre o consumo e não de imposto sobre o rendimento das empresas que fornecem ao público bens de consumo.

Sendo assim, à face da referida jurisprudência do TJUE, a Requerente tem direito a deduzir o IVA suportado com as despesas de consultadoria em causa.

Por isso, os actos impugnados enfermam de vício de violação de lei, designadamente do artigo 20.º, n.º 1, alínea a), do CIVA, interpretado em sintonia com a referida jurisprudência do TJUE, o que justifica a respectiva anulação (artigo 135.º do CPA), nas partes respectivas (que totalizam € 2.723.703,85).

 

3.3. Questão dos encargos suportados pela Requerente que a Autoridade Tributária e Aduaneira entendeu não terem conexão com a actividade económica exercida

 

3.3.1. Reembolso relativo aos anos de 2003, 2004 e 2005

 

No relatório da inspecção relativo aos anos de 1999 a 2007, a Autoridade Tributária e Aduaneira entendeu que a Requerente registou na sua contabilidade um conjunto de facturas, emitidas pelas sociedades … e .. e …, relativas a trabalhos de construção e reparação efectuados no …, tendo para o efeito, procedido à dedução de IVA nos montantes de €77.364,05, em 2003, €477.536,90 em 2004, e €9.712,50, em 2005.

Relativamente a estas situações de recusa de reembolso por falta de conexão das despesas com a actividade económica exercida, a fundamentação do acto impugnado relativo aos anos de 1999 a 2007 é a seguinte:

 

«Nos termos do disposto no art.° 19.º do CIVA, para apuramento do imposto devido, os sujeitos passivos deduzirão ao imposto incidente sobre as operações tributáveis que efetuaram, o imposto que tenha incidido sobre os bens ou serviços adquiridos, importados ou utilizados pelo sujeito passivo para a realização das operações referidas no art.° 20.° do mesmo código, sendo pressuposto do direito à dedução que os bens e serviços estejam diretamente relacionados com o exercício da sua atividade.

Resulta assim que, para ser dedutível o imposto suportado nas aquisições de bens e serviços estas devem ter uma relação direta e imediata com as operações a jusante que conferem esse direito, o que manifestamente não é o caso.»

 

A Requerente defende que recai sobre a Autoridade Tributária e Aduaneira o ónus da prova dos factos que alegue, por força do preceituado no artigo 74.º, n.º 1, da LGT.

Nas sua resposta a Autoridade Tributária e Aduaneira limita-se a afirmar, em suma, que «os referidos montantes de imposto não eram dedutíveis porquanto não cumprem o que se dispõe nos artigos 19° e 20° do Código do IVA, ou seja não se reportam a imposto que tenha incidido sobre bens ou serviços adquiridos, importados ou utilizados pela Requerente para praticar operações relacionadas com o exercício da sua actividade» e que «aqueles montantes de imposto não correspondem a inputs da actividade da Requerente, mas de uma outra entidade -…, com o NIF …».

Esta última afirmação não corresponde à realidade, pois, como defende a Requerente, a … foi reconhecida apenas pela Portaria n.º /2005…, publicada no Diário da República, II Série, de n.º …, pelo que apenas a última das três facturas é posterior ao reconhecimento.

De qualquer forma, como bem defende a Requerente nas suas alegações, esta hipotética motivação para a não dedução do IVA relativo a tais facturas é uma fundamentação a posteriori, não contemporânea do acto tributário impugnado, pelo que não é atendível, pois o processo arbitral é de mera legalidade [artigo 2.º, n.ºs 1, alíneas a) e b), e 2, do RJAT], visando-se neles apreciar a legalidade da actuação da Administração Tributária tal como ela ocorreu, não podendo o Tribunal, perante a constatação da invocação de uma fundamentação ilegal como suporte da decisão administrativa, apreciar se a sua actuação poderia basear-se noutros fundamentos, invocados no processo contencioso. ( [16] )

Assim, resta como fundamentação do acto impugnado, nesta parte, a afirmação de que é manifesto que não existe uma relação directa de tais arbitrais despesas com a actividade da Requerente.

Porém, na falta de qualquer alegação e demonstração de qual é a actividade do …, não se pode considerar se poderia considerar provada a afirmação da Autoridade Tributária e Aduaneira.

E, de facto, perante a dúvida sobre tal actividade do … e sua eventual conexão com a actividade global da Requerente, tem de fazer-se apelo a regra do ónus da prova que consta do artigo 74.º, n.º 1, da LGT , que estabelece que «o ónus da prova dos factos constitutivos dos direitos da administração tributária ou dos contribuintes recai sobre quem os invoque».

Por isso, à face desta regra, sendo a Autoridade Tributária e Aduaneira quem alega a falta de relação directa entre a actividade do … e a restante actividade da Requerente, tem de valorar-se a dúvida contra a Autoridade Tributária e Aduaneira, o que se reconduz a considerar não provada a alegada falta de relação directa.

Assim procede o pedido de pronúncia arbitral nesta parte, em que está em causa a quantia de € 564.613,45.

 

3.4. Questão do direito à dedução do IVA relativo a despesas referentes à organização de eventos

 

Nos anos de 2009 e 2010, a Requerente procedeu à dedução de IVA incorrido com a aquisição de serviços relativos à organização eventos, no valor de €56.916,84, liquidado à Requerente pelas sociedades K… e L… em 4 facturas, as duas primeiras de Maio de 2009 relativas ao evento … - com IVA liquidado nos valores de €9.582,00 e €20.614,20 - e as 2 restantes de Julho de 2010, relativas ao evento … - com IVA liquidado nos valores de € 15.000,00 e € 11.720,63.

O Concerto na … foi objecto de transmissão televisiva e de ampla cobertura mediática.

A Autoridade Tributária e Aduaneira entendeu que tais despesas são enquadráveis na alínea d) do n.º 2 do artigo 21.º, pelo que só pode ser deduzido 50% do IVA suportado.

A Requerente defende que é dedutível a totalidade do IVA suportado, a quantia de €56.916,84, pelo que deve ser reembolsada a quantia de € 28.458,42.

O artigo 21.º, n.ºs 1, alínea d). e 2, alínea d), do CIVA estabelecem o seguinte, no que aqui interessa:

 

1 – Exclui-se, todavia, do direito à dedução o imposto contido nas seguintes despesas:

d) Despesas respeitantes a alojamento, alimentação, bebidas e tabacos e despesas de recepção, incluindo as relativas ao acolhimento de pessoas estranhas à empresa e as despesas relativas a imóveis ou parte de imóveis e seu equipamento, destinados principalmente a tais recepções;

 

2 – Não se verifica, contudo, a exclusão do direito à dedução nos seguintes casos:

 

d) Despesas mencionadas nas alíneas c) e d), com excepção de tabacos, ambas do número anterior, efectuadas para as necessidades directas dos participantes, relativas à organização de congressos, feiras, exposições, seminários, conferências e similares, quando resultem de contratos celebrados directamente com o prestador de serviços ou através de entidades legalmente habilitadas para o efeito e comprovadamente contribuam para a realização de operações tributáveis, cujo imposto é dedutível na proporção de 50 %;

 

 

3.4.1. Posições das Partes sobre a questão do direito à dedução do IVA relativo a despesas referentes à organização de eventos

 

Refere-se no Relatório da Inspecção Tributária respeitante ao ano de 2009:

 

«Relativamente ao registo contabilístico n.° …, segundo a empresa "Trata-se da aquisição de serviços preparatórios e de apoio técnico ao concerto … na …, designadamente ao nível da montagem de palco e audiovisual", enquanto que o registo n.° … respeita a "Aquisição  o serviço de organização de evento […] com fins promocionais / publicitários. O Grupo A... retira benefícios diversos do evento em causa nas áreas de marketing e publicidade (evento dirigido a agentes externos ao Grupo A...(..)", pelo que considera que a dedução do imposto constante nas facturas emitidas pelos fornecedores associadas aos registos contabilísticos em causa, é de aceitar fiscalmente na sua totalidade.

Contudo, a dedução integral do imposto contido nas mesmas nunca poderá ser aceite pela Administração Fiscal, pois como a própria empresa reconhece, ambas as faturas são relativas a organização de evento (concerto na …) dirigido a agentes externos ao grupo A..., pelo que trata-se de despesas enquadráveis na al. d) do n.° 1 do art.° 21.° do CIVA, sendo que em virtude de cumprir com os requisitos da al. d) do n.° 2 do mesmo artigo, o imposto é dedutível em 50%, sendo de corrigir os restantes 50% (€15.098,10) que a empresa deduziu indevidamente.

 

No Relatório da Inspecção Tributária relativo ao ano de 2010 refere-se o seguinte:

 

Aquando da análise efetuada aos elementos apresentados pela sociedade A..., na sequência do pedido de reembolso de IVA relativo ao período de 1112, verificou-se que no exercício de 2010, o sujeito passivo deduziu na conta … — IVA Dedutível — OBS — Taxa Normal, a totalidade do IVA que incidiu sobre os serviços prestados pela entidade K…. (adiante designada por K…), NIPC …, fornecedor n.° …, no montante de €460.453,98, de acordo com o mapa em anexo. (Anexo 1)

Assim, solicitou-se ao sujeito passivo que justificasse a dedução de IVA, identificasse a natureza do serviço e apresentasse contrato ou proposta ou documento semelhante celebrado entre si e a entidade anteriormente mencionada.

Analisados os elementos e esclarecimentos apresentados pela A..., constata-se que os mesmos, de uma forma genérica, respeitam à organização de eventos. Com efeito, a K… comprometeu-se a prestar à A..., o serviço de organização e gestão dos eventos descriminados no mapa em anexo, consistindo os mesmos na realização de reuniões gerais, almoços assim como organização de espetáculos.

O âmbito do direito à dedução de imposto encontra-se definido pelos art.°s 19.º e 20.°, ambos do código do IVA, o qual em termos potenciais corresponderá a todo o imposto suportado pelos agentes económicos relativamente aos seus inputs, sendo pressuposto essencial deste direito que tenha sido suportado em aquisições de bens e serviços que sejam utilizados em operações tributadas pela empresa.

Existem, contudo, algumas exceções a esse direito, como é o caso do imposto relativo à aquisição de determinados bens ou serviços cujo carácter não os torna essenciais à atividade produtiva, ou que os mesmos possam ser facilmente utilizáveis para consumos particulares. Esses bens e serviços encontram-se elencados no n.° 1 do art.° 21.° do CIVA.

Efetivamente o art.° 21.° do CIVA descreve as situações relativamente às quais o imposto contido nas faturas e/ou documentos equivalentes não pode ser objeto de dedução por parte do sujeito passivo. Uma dessas situações encontra-se na alínea d) do n.° 1 do mesmo normativo, que refere que se exclui do direito à dedução o imposto contido nas "despesas respeitantes a alojamento, alimentação, bebidas e tabaco e despesas de representação, incluindo as relativas ao acolhimento de pessoas estranhas à empresa e as despesas relativas a imóveis ou parte de imóveis e seu equipamento, destinados principalmente a tais recepções

Por outro lado, o n.° 2 do mesmo normativo enuncia as situações em que não se verifica a exclusão do direito à dedução. De entre essas situações, encontra-se previsto na alínea d) do n.° 2 que se as despesas mencionadas na alínea d) do n.° 1 forem efetuadas para as necessidades diretas dos participantes, relativas à organização de congressos, feiras, exposições, seminários, conferências e similares, diretamente contratadas com o prestador de serviços e comprovadamente contribuam para a realização de operações tributáveis, o imposto será dedutível na proporção de 50%».

 

A Requerente defende, em suma, que os eventos em causa inserem-se em acções de divulgação e promoção da imagem e património da Requerente — especificamente … — intrinsecamente conexionados com a prossecução da sua actividade e que, sendo assim, se tais despesas não se consideram alheias à actividade exercida e, mais ainda, contribuem para a sua prossecução — ao serem subsumíveis, no entender da Requerente, a despesas de publicidade — não se vê por que razão haverá de ser questionado o direito à dedução do IVA.

A norma do artigo 21.º do CIVA exclui o direito à dedução de certas despesas, que, pela sua natureza, permitem presumir que possam ser aproveitadas para satisfação de necessidades particulares.

A Requerente defende que se trata de presunções que são ilidíveis, por força do disposto no artigo 73.º da LGT que estabelece que «As presunções consagradas nas normas de incidência tributária admitem sempre prova em contrário».

     São normas de incidência, em sentido lato, as que «definem o plano de incidência, ou seja, o complexo de pressupostos de cuja conjugação resulta o nascimento da obrigação de imposto, assim como os elementos da mesma obrigação» ( [17] ).

     Neste sentido, são normas de incidência as que determinam os sujeitos activo e passivo da obrigação tributária, as que indicam qual a matéria colectável, a taxa e os benefícios fiscais. ( [18] )

     As normas relativas ao direito a dedução de IVA têm como efeito o afastamento da incidência do imposto, pelo que se reconduzem a normas de delimitação negativa de incidência, devendo aplicar-se o regime do referido artigo 73.º da LGT às presunções nela contidas.

     Como defende a Requerente, subjacentes às situações de afastamento do direito à dedução estarão presunções de que as despesas indicadas nos n.ºs 1 e 2 do artigo 21.º não têm total ou parcialmente relação exclusiva com a actividade produtiva das empresas sujeita a IVA, pois é essa a única justificação aceitável para o afastamento da dedutibilidade deste imposto, que, como imposto sobre o consumo, se pretende que seja neutro para os intermediários no circuito económico.

     No caso em apreço, sendo facto notório que a realização de concertos …, especialmente no caso do concerto que teve cobertura televisiva, têm potencialidade de divulgação e promoção da imagem da Requerente, deve considerar-se ilidida a presunção que justifica o afastamento da dedutibilidade do IVA, tanto mais que não é crível que uma empresa da dimensão da Requerente realize eventos deste género, tendo em vista a satisfação de interesses particulares dos que produzem e dos que assistem aos concertos.

     Por isso, é de considerar ilidida a presunção ínsita na alínea d) do n.º 1 do artigo 21.º do CIVA, pelo que a Requerente tem direito a deduzir a totalidade do IVA relativo às despesas referidas, pelo que o não reconhecimento desse direito em relação à € 28.458,42 é ilegal, por violação daquela norma, conjugada com o artigo 20.º n.º 1, do CIVA e o artigo 73.º da LGT. ( [19] )

     Para além disso, não se provou que despesas relativas a eventos respeitem a deslocação e alimentação de gestores de eventos, hospedeiras, despesas com promotoras incluindo transporte, alimentação e estadia, pelo que nem sequer há suporte factual para determinar quais das despesas relativamente a eventos poderiam ser enquadradas na previsão da alínea d) do n.º 1 e da alínea d) do n.º 2 do artigo 21.º do CIVA.

     Procede, assim o pedido de pronúncia arbitral, nesta parte.

 

3.5. Questão do IVA liquidado por fornecedores com número fiscal sem registo de actividade

 

     Nos anos de 2005, 2006 e 2007, a Requerente deduziu IVA nos montantes totais de €17.430,00, €18.585,00 e €18.291,00, respectivamente correspondentes a facturas emitidas pela sociedade “M...”, com o NIPC …, que constava no sistema informático da Administração Tributária como não tendo registo de início de actividade para efeitos fiscais, com a indicação “n.º fiscal sem registo de actividade”, entidade aquela que nunca procedeu a entrega de qualquer declaração para efeitos fiscais, incluindo de início ou cessação de actividade.

     Nos anos de 2006, 2008 e 2009, a Requerente deduziu IVA nos montantes totais de €35.758,80, €36.997,30 e €19.008,00, respectivamente, correspondentes a facturas emitidas pela sociedade “N…”, com o NIPC …, que constava no sistema informático da Administração Tributária como não tendo registo de início de actividade para efeitos fiscais, com a indicação “n.º fiscal sem registo de actividade” entidade aquela que nunca procedeu à entrega de qualquer declaração para efeitos fiscais, incluindo início/cessação de actividade.

     No ano de 2009, a Requerente deduziu IVA no montante total de €4.020,00, correspondente a 1 fatura emitidas pela sociedade “O…”, com o NIPC …, que constava no sistema informático da Administração Tributária como tendo cessado a sua actividade em 31-12-2008.

     A Autoridade Tributária e Aduaneira, nos relatórios das inspecções tributárias, entendeu que dos artigos 19.º, n.ºs 1, alínea a), 3 e 4, e 22.º, n.º 1, do CIVA resulta que serão objecto de indeferimento os pedidos de reembolso quando se verificarem os seguintes tipos de situações:

a) O sujeito passivo não forneça os elementos que permitam aferir da legitimidade do reembolso;

b) O imposto dedutível ter sido liquidado por um sujeito passivo com número fiscal inexistente ou inválido;

c) Quando o imposto dedutível tiver sido liquidado por um sujeito passivo que tinha suspenso ou cessado a sua actividade no período a que se refere o reembolso.

     Referiu ainda a Autoridade Tributária e Aduaneira, nos relatórios das inspecções, que a alínea d) do artigo 3.° do Despacho Normativo n.° 18-A/2010, de 1 de Julho, que regulamenta os pedidos de reembolsos de IVA, estabelece o seguinte:

 

"A concessão de qualquer reembolso depende da verificação cumulativa dos seguintes requisitos:

(...) d) Não constarem das relações de clientes, fornecedores e regularizações, a que se refere o n.° 1 do artigo 2.°, sujeitos passivos com número de identificação fiscal inexistente ou que tenham a actividade cessada no período a que respeita o imposto."

 

     Refere ainda a Autoridade Tributária e Aduaneira que «a dedução do imposto pago a montante pelo sujeito passivo, previsto no art.° 19.° n.° 1 do CIVA é um direito da entidade que suportou o imposto, pois confere-lhe a possibilidade de recuperar o imposto que suportou na aquisição dos bens e serviços. Assim sendo, se a dedução corresponde a um direito do contribuinte, segundo a própria conformação normativa do imposto, é a este que caberá demonstrar a existência dos factos em que a suporta.

     De modo a garantir o direito à dedução do imposto suportado e o reembolso do mesmo, as empresas deverão averiguar da situação fiscal dos terceiros (fornecedores, clientes) com os quais mantêm relações comerciais, ou seja, verificarem se os mesmos constam como cessados no cadastro fiscal ou se não constam sequer do mesmo».

     Refere-se ainda nos relatórios que as empresas devem estar atentas, não só na confirmação de que o número de identificação fiscal das entidades que lhes prestam serviços ou que transmitem bens está correcto e corresponde às entidades em causa, como salvaguardar se as mesmas possuem uma adequada estrutura empresarial e que a Requerente poderia e deveria ter consultado na Internet (portal das finanças das Autoridade Tributária e Aduaneira) se os fornecedores em questão eram válidos e estavam activos.

     A Requerente defende que não se fez prova de que as transacções referidas sejam simuladas, pelo que não tem aplicação o n.º 3 do artigo 19.º do CIVA, que estabelece que «não pode deduzir-se imposto que resulte de operação simulada ou em que seja simulado o preço constante da factura ou documento equivalente». 

     No que concerne ao n.º 4 do mesmo artigo 19.º, estabelece que «não pode igualmente deduzir-se o imposto que resulte de operações em que o transmitente dos bens ou prestador dos serviços não entregar nos cofres do Estado o imposto liquidado, quando o sujeito passivo tenha ou devesse ter conhecimento de que o transmitente dos bens ou prestador de serviços não dispõe de adequada estrutura empresarial susceptível de exercer a actividade declarada».

     A Requerente invoca a jurisprudência do Tribunal Central Administrativo e do TJUE, defendendo, em suma, que o direito da União se opõe a que se afaste o direito a dedução do IVA pago por um sujeito passivo a outro sujeito passivo, prestador de serviços, quando este não esteja registado para efeitos desse imposto e que a falta de registo não priva os sujeitos passivos do direito a dedução.

     A Autoridade Tributária e Aduaneira defende no presente processo que os Estados Membros da União Europeia podem estabelecer o cumprimento de obrigações para exercício do direito à dedução e cita o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 4-5-2011, processo n.º 033/11, em que se decidiu que «por força do que dispõe o n.º 11 do artigo 22.º do CIVA, os pedidos de reembolso serão indeferidos quando o imposto dedutível for referente a um sujeito passivo que tenha cessado a sua actividade no período a que se refere o reembolso».

 

     3.5.1. Decisão da questão do IVA liquidado por fornecedores com número fiscal sem registo de actividade

 

     Como refere a Requerente, não se demonstrou que as operações em que intervieram fornecedores sem registo de actividade tenham sido simuladas.

     O artigo 22.º, n 1, do CIVA estabelece que «os pedidos de reembolso são indeferidos quando não forem facultados pelo sujeito passivo elementos que permitam aferir da legitimidade do reembolso, bem como quando o imposto dedutível for referente a um sujeito passivo com número de identificação fiscal inexistente ou inválido ou que tenha suspenso ou cessado a sua actividade no período a que se refere o reembolso».

     Porém, como se referiu, a jurisprudência do TJUE tem natureza vinculativa, pelo que há que ponderar o que se refere neste artigo 22.º com a jurisprudência da União Europeia, designadamente com o acórdão de 21-6-2012, proferido nos processos apensos n.ºs C-80/11 e C-142/11, invocado pela Requerente como contrariando a possibilidade de indeferimento de pedidos de reembolso.

     A parte decisória deste acórdão diz o seguinte:

 

1) Os artigos 167.°, 168.°, alínea a), 178.°, alínea a), 220.°, n.° 1, e 226.° da Directiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de Novembro de 2006, relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado, devem ser interpretados no sentido de que se opõem a uma prática nacional em virtude da qual a autoridade tributária recusa a um sujeito passivo o direito de deduzir do montante de imposto sobre o valor acrescentado de que é devedor o imposto devido ou pago pelos serviços que lhe foram fornecidos, pelo facto de o emitente da factura correspondente a esses serviços ou por um dos seus fornecedores ter cometido irregularidades, sem que essa autoridade prove, com base em elementos objectivos, que o sujeito passivo em causa sabia ou devia saber que a operação invocada como fundamento do direito a dedução estava implicado numa fraude cometida pelo emissor da factura ou por outro operador interveniente a montante na cadeia de prestações.

2) Os artigos 167.°, 168.°, alínea a), 178.°, alínea a), e 273.° da Directiva 2006/112, devem ser interpretados no sentido de que se opõem a uma prática nacional em virtude da qual a autoridade tributária recusa o direito a dedução com o fundamento de que o sujeito passivo não se certificou de que o emitente da factura correspondente aos bens em relação aos quais o direito a dedução é requerido tinha a qualidade de sujeito passivo, dispunha dos bens em causa e estava em condições de os fornecer e tinha cumprido as suas obrigações de declaração e pagamento do imposto sobre o valor acrescentado, ou com o fundamento de que o referido sujeito passivo não dispõe, além da referida factura, de outros documentos susceptíveis de demonstrar que essas circunstâncias estão reunidas, apesar de os requisitos materiais e formais previstos na Directiva 2006/112 para o exercício do direito a dedução estarem preenchidos e de o sujeito passivo não dispor de indícios que justifiquem a suspeita da existência de irregularidades ou de fraude por parte do referido emitente.

      Resulta desta jurisprudência não basta para indeferimento de pedidos de reembolso de IVA que se constate que o imposto dedutível é referente a um sujeito passivo com número de identificação fiscal inexistente ou inválido ou que tenha suspenso ou cessado a sua actividade no período a que se refere o reembolso, sendo necessário também «que o sujeito passivo em causa sabia ou devia saber que a operação invocada como fundamento do direito a dedução estava implicado numa fraude cometida pelo emissor da factura ou por outro operador interveniente a montante na cadeia de prestações» (ponto 1 da decisão referida). Designadamente, não basta, para recusar o direito à dedução, constatar «que o sujeito passivo não se certificou de que o emitente da factura correspondente aos bens em relação aos quais o direito a dedução é requerido tinha a qualidade de sujeito passivo» (ponto 2 da decisão referida).

     No caso em apreço, não se provou que a Requerente soubesse que as referidas empresas não tinham registo de actividade, podendo aventar-se que se esteja perante uma situação em que a Requerente devia saber que aquelas entidades não tinham registo de actividade, por estar ao seu alcance apurar essa informação através do Portal das Finanças, como se constata pelos prints juntos aos relatórios das inspecções.

     Porém, para além de a obrigação de apurar se todos os fornecedores de bens ou serviços têm registo de actividade não estar explicitamente prevista na lei, é inquestionável que uma eventual informação obtida através do Portal das Finanças no sentido de o detentor de um determinado número de identificação fiscal não ter registo de actividade nunca permitiria concluir com segurança que não pudesse legalmente praticar a operação em causa, uma vez que a lei permite a prática de operações isoladas, com apresentação da declaração respectiva em qualquer serviço de finanças até ao último dia do mês seguinte ao da conclusão da operação (artigo 43.º do CIVA).

     Assim, como se decidiu no acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 20-1-2010, processo n.º 974/09, «se é certo que à luz da alínea a) do n.º 1 do artigo 19.º do CIVA a condição de sujeito passivo do prestador de bens e serviços constitui um requisito essencial do direito à dedução, a verdade é que tal condição não se define um função de um "estatuto" que se adquira com a declaração de início de actividade nos termos do artigo 30.º, n.º 1 do CIVA e se perca como decorrência da declaração de cessação de actividade ao abrigo do sequente artigo 32.º» e «antes a condição de sujeito passivo se pode definir em função de cada acto tributável e daí que o adquirente de serviços sempre tenha direito à dedução do montante do IVA mencionado na respectiva factura».

     Por isso, a recusa do direito à dedução, com este fundamento de falta de registo de actividade do prestador ou fornecedor, terá de limitar-se os casos em que se possa concluir que o adquirente «sabia ou devia saber que a operação invocada como fundamento do direito a dedução estava implicado numa fraude cometida pelo emissor da factura ou por outro operador interveniente a montante na cadeia de prestações», como se entendeu no referido acórdão do TJUE, com elementos que não sejam a mera possibilidade de apuramento do registo de actividade.

     Procede, assim, o pedido de pronúncia arbitral nesta parte, quanto ao indeferimento do reembolso no montante global de € 150.090,10.

 

3.6. Questão do IVA respeitante a despesas com viagens e refeições

 

     Nos anos de 2004 e 2005, a Requerente procedeu à dedução do IVA contido em despesas de alojamento, refeições e deslocações debitadas pela P… no contexto de prestações de serviços efectuadas à Requerente e relativamente às quais procedeu a Requerente à autoliquidação e dedução do imposto, no valor global de € 37.866,54 (€ 17.251,48 em 2004 e € 20.615,06 em 2005).

          Os serviços que a Requerente pretendeu adquirir à P… não foram serviços de alojamento, refeições ou estadias.

          A Autoridade Tributária e Aduaneira fundamentou a recusa de reembolso do IVA deduzido pela Requerente nos seguintes termos, em suma:

 

Ora à luz do disposto na al. c) do n.º 1 do art. 21 ° do CIVA, o imposto conexo com, "despesas de transportes e viagens de negócios do sujeito passivo do imposto e do seu pessoal, incluindo as portagens (...)" encontra-se excluído do direito à dedução.

De igual modo, nos termos da al. d) do n.º 1 do artigo supra citado, o imposto conexo com, "( .. ) despesas de alojamento, alimentação e restauração," exclui-se do direito a dedução.

Desta forma, tratando-se de encargos com viagens e refeições, não poderia o sujeito passivo ter deduzido o imposto (IVA) com eles conexo, nos termos do disposto nas referidas normas de exclusão»

 

     A Requerente defende que as despesas de alojamento, refeições e deslocações debitadas pela P… são despesas acessórias da actividade para que contratou esta empresa, de avaliação de activos da A... no Brasil, que foram tributadas em Portugal, nos termos da al. c) do n.º 8 do art. 6° do CIVA, então vigente.

     Defende ainda a Requerente que o valor tributável de uma operação é o valor da contraprestação a obter do adquirente, incluindo as despesas acessórias debitadas, o que tem suporte legal na alínea b) do n.º 5 do artigo 16.º do CIVA.

     Defende ainda a Requerente que, uma vez que a inspecção tributária não contestou a dedução do IVA incorrido nos serviços de consultoria, não deve, por idênticas razões, contestar o imposto relativo às despesas que são parte integrante de tais serviços de consultoria e que, se assim não se entendesse, a Autoridade Tributária e Aduaneira deveria ter constatado que a autoliquidação efectuada pela Requerente também não seria devida, pelo que não haveria lugar a qualquer correcção ao IVA deduzido, pois, tratando-se de despesas com viagens e refeições realizadas fora de território nacional, as mesmas não são tributáveis neste território, nos termos previstos no n.° 4 do artigo 6.º do Código do IVA e na situação concreta das viagens provenientes ou com destino ao estrangeiro, as mesmas se encontram isentas de IVA ao abrigo do disposto na alínea r) do n.° 1 do artigo 14.° do CIVA.           

     Nesta linha, entende a Requerente que, não se aceitando que as despesas em questão são parte integrante do serviço prestado, seria devida uma correcção a favor da Requerente no valor do IVA autoliquidado incorrectamente quanto a estas despesas, porquanto a sua liquidação deveria ter sido efectuada pelo prestador de serviços ou ser-lhes-ia aplicável uma isenção do IVA.

     Na sua resposta, a Autoridade Tributária e Aduaneira limitou-se a dizer, sobre esta matéria que o IVA suportado com despesas de viagens e refeições está excluído do direito à dedução nos termos das alíneas c) e d) do n.º 1 do artigo 21.º do CIVA.

         

3.6.1. Decisão da questão do IVA respeitante a despesas com viagens e refeições

 

     Como se conclui da matéria de facto e se considerou facto notório, a P... não é uma empresa que se dedique à prestação de serviços de fornecimento de alojamento, refeições e deslocações, pelo que é de aceitar a tese da Requerente de que tais despesas são acessórias da prestação principal de serviços de consultadoria.

     No entanto, o artigo 21.º, n.º 1, do CIVA estabelece o seguinte:

 

1 – Exclui-se, todavia, do direito à dedução o imposto contido nas seguintes despesas:

c) Despesas de transportes e viagens de negócios do sujeito passivo do imposto e do seu pessoal, incluindo as portagens;

 

d) Despesas respeitantes a alojamento, alimentação, bebidas e tabacos e despesas de recepção, incluindo as relativas ao acolhimento de pessoas estranhas à empresa e as despesas relativas a imóveis ou parte de imóveis e seu equipamento, destinados principalmente a tais recepções;

 

     Nesta norma excluem-se do direito à dedução o IVA suportado com tais despesas de alojamento, refeições e deslocações esta exclusão é estabelecida apenas em função da natureza das despesas, não se abrindo excepção para os casos em que são elas são acessórias de outras.

     Por isso, a tese da Autoridade Tributária e Aduaneira de que está legalmente excluída a possibilidade de ser deduzida IVA relativo a despesas dos tipos referidos tem suporte legal naquelas normas.

     Improcede, assim o pedido de pronúncia arbitral, nesta parte, em que está em causa o valor de € 37.866,54.

 

     4. Questão da liquidação de juros compensatórios

 

     A Requerente defende que não são devidos juros compensatórios, por ser sempre credora, mesmo que improcedesse a impugnação dos actos em causa.

     As liquidações de juros compensatórios são actos consequentes dos correspondentes actos de liquidação, que os têm como pressuposto, pelo que só não sendo anulados os actos impugnados na parte relativa IVA respeitante a despesas com viagens e refeições, só nesta parte poderia subsistir liquidação de juros compensatórios.

     No entanto, destinando-se os juros compensatórios a indemnizar o Estado pela privação temporária da quantia liquidada, derivada do retardamento de uma liquidação (artigo 35.º, n.º 1, da LGT), não se pode justificar o seu pagamento quando o mesmo contribuinte é largamente credor do Estado durante o período de retardamento, como se evidencia no caso em apreço, em virtude do enorme atraso da Requerente no exercício do direito a dedução.

     Por isso, reconduzindo o dever de pagamento de juros compensatórios aos limites traçados pela sua razão de ser ( [20] ), tem de se concluir pela ilegalidade da sua liquidação.

     Procede, assim, o pedido de pronúncia arbitral nesta parte.

 

     5 – Juros indemnizatórios

    

     A Requerente pede que a Autoridade Tributária e Aduaneira seja condenada no pagamento de juros indemnizatórios.

     Constata-se que a Requerente, em 30-11-2012, pagou todas as quantias liquidadas relativamente a IVA, no montante total de € 577.918,65, e todas as quantias liquidadas a título de juros compensatórios, no montante global de € 63.542,15.

  

5.1. Admissibilidade do reconhecimento do direito e condenação a pagar juros indemnizatórios nos processos arbitrais

 

De harmonia com o disposto na alínea b) do art. 24.º do RJAT a decisão arbitral sobre o mérito da pretensão de que não caiba recurso ou impugnação vincula a administração tributária a partir do termo do prazo previsto para o recurso ou impugnação, devendo esta, nos exactos termos da procedência da decisão arbitral a favor do sujeito passivo e até ao termo do prazo previsto para a execução espontânea das sentenças dos tribunais judiciais tributários, «restabelecer a situação que existiria se o acto tributário objecto da decisão arbitral não tivesse sido praticado, adoptando os actos e operações necessários para o efeito», o que está em sintonia com o preceituado no art. 100.º da LGT [aplicável por força do disposto na alínea a) do n.º 1 do art. 29.º do RJAT] que estabelece, que «a administração tributária está obrigada, em caso de procedência total ou parcial de reclamação, impugnação judicial ou recurso a favor do sujeito passivo, à imediata e plena reconstituição da legalidade do acto ou situação objecto do litígio, compreendendo o pagamento de juros indemnizatórios, se for caso disso, a partir do termo do prazo da execução da decisão».

Embora o art. 2.º, n.º 1, alíneas a) e b), do RJAT utilize a expressão «declaração de ilegalidade» para definir a competência dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD, não fazendo referência a decisões condenatórias, deverá entender-se que se compreendem nas suas competências os poderes que em processo de impugnação judicial são atribuídos aos tribunais tributários, sendo essa a interpretação que se sintoniza com o sentido da autorização legislativa em que o Governo se baseou para aprovar o RJAT, em que se proclama, como primeira directriz, que «o processo arbitral tributário deve constituir um meio processual alternativo ao processo de impugnação judicial e à acção para o reconhecimento de um direito ou interesse legítimo em matéria tributária».

O processo de impugnação judicial, apesar de ser essencialmente um processo de anulação de actos tributários, admite a condenação da Administração Tributária no pagamento de juros indemnizatórios, como se depreende do art. 43.º, n.º 1, da LGT, em que se estabelece que «são devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido» e do art. 61.º, n.º 4, do CPPT (na redacção dada pela Lei n.º 55-A/2010, de 31 de Dezembro, a que corresponde o n.º 2 na redacção inicial), que «se a decisão que reconheceu o direito a juros indemnizatórios for judicial, o prazo de pagamento conta-se a partir do início do prazo da sua execução espontânea».

Assim, o n.º 5 do art. 24.º do RJAT, ao dizer que «é devido o pagamento de juros, independentemente da sua natureza, nos termos previsto na lei geral tributária e no Código de Procedimento e de Processo Tributário», deve ser entendido como permitindo o reconhecimento do direito a juros indemnizatórios no processo arbitral.

 

5.2. Direito a juros indemnizatórios

 

Cumpre, assim, apreciar o pedido de pagamento de juros indemnizatórios.

No caso em apreço, é manifesto que, a ilegalidade dos actos de liquidação cujas quantias a Requerente pagou bem das respectivas liquidações de juros compensatórios é imputável à Administração Tributária, que, por sua iniciativa, os praticou sem suporte legal. ( [21] )

Consequentemente, a Requerente tem direito a juros indemnizatórios, nos termos do artigo 43.º, n.º 1, da LGT e 61.º do CPPT.

Os juros indemnizatórios são devidos desde 30-11-2012 até integral pagamento à Requerente das quantias liquidadas, calculados com base na quantia de € 641.460,80, à taxa legal, nos termos dos artigos, art. 43.º, n.ºs 1 e 4, e 35.º, n.º 10, da LGT, 61.º do CPPT e 559.º do Código Civil e Portaria n.º 291/2003, de 8 de Abril (sem prejuízo das eventuais alterações posteriores da taxa legal).

 

          6. Decisão

 

   De harmonia com o exposto, acordam neste Tribunal Arbitral em:

 

a) Julgar improcedente a questão da incompetência suscitada pela Autoridade Tributária e Aduaneira;

b) Julgar procedente o pedido de pronúncia arbitral, quanto às liquidações de IVA n.ºs …, …, …, …, …, …, …, …, …, …, …, …, …, …, .., …, …, …, …, …, …, e liquidações de juros compensatórios n.ºs …, …, …, …, …, …, …, …, …, …, …, …, …, …, …, …, …, …, …, …, …;

 b) Julgar parcialmente procedente o pedido de pronúncia arbitral quanto à demonstração de liquidação de IVA n.º ..., na parte correspondente às quantias de € 2.723.703,85 (relativa à questão dos serviços de consultadoria relacionados com a internacionalização da Requerente), € 564.613,45 (relativa à questão dos encargos suportados pela Requerente que a Autoridade Tributária e Aduaneira entendeu não terem conexão com a actividade económica exercida), € 28.458,42 (relativa à questão do direito à dedução do IVA relativo a despesas referentes à organização de eventos) e €150.090,10 (relativa à questão do IVA liquidado por fornecedores com número fiscal sem registo de actividade) e anular aquela demonstração de liquidação na parte respectiva;

c) Julgar improcedente o pedido de pronúncia arbitral na parte correspondente à questão do IVA respeitante a despesas com viagens e refeições e a respectiva quantia de € 37.866,54, absolvendo a Autoridade Tributária e Aduaneira do pedido na parte respectiva;  

d) Julgar procedente o pedido de juros indemnizatórios e condenar a Autoridade Tributária e Aduaneira a pagar à Requerente juros indemnizatórios desde 30-11-2012 até integral pagamento das quantias ilegalmente liquidadas, calculados com base na quantia de € 641.460,80, à taxa legal, nos termos dos artigos, art. 43.º, n.ºs 1 e 4, e 35.º, n.º 10, da LGT, 61.º do CPPT e 559.º do Código Civil e Portaria n.º 291/2003, de 8 de Abril (sem prejuízo das eventuais alterações posteriores da taxa legal).

 

     7. Valor do processo

 

De harmonia com o disposto no art. 315.º, n.º 2, do CPC e 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária fixa-se ao processo o valor de € 3.504.732,36.

 

8. Custas

 

Nos termos do art. 22.º, n.º 4, do RJAT, fixa-se o montante das custas em € 44.686,00, nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, a cargo da Requerente e da Autoridade Tributária e Aduaneira nas proporções de 1,08% e 98,92%

 

Lisboa, 4 de Abril de 2014

 

 

Os Árbitros

 

 

 

(Jorge Manuel Lopes de Sousa)

 

 

 

 

(José Pedro Carvalho)

 

 

 

 

 

 

(Paulo Lourenço)

 



( [1] ) A questão da incompetência dos tribunais arbitrais tem sido abordada em diversos processos arbitrais julgados no âmbito do CAAD, como sejam, nos processos n.ºs 48/2012, 73/2012 e 76/2012, cujas decisões arbitrais foram proferidas em 06.07.2012, 23.10.2012 e 29.10.2012, ( disponíveis em www.caad.org.pt).

( [2] ) Na redacção dada pela Lei n.º 64.º-B/2011, de 30 de Dezembro. Vide a fundamentação do Acórdão Arbitral no processo n.º 76/2012 já referido.

( [3] )  Neste sentido o Acórdão Arbitral, processo n.º 48/2012.

Determina o artigo 2.º do RJAT competir a estes tribunais a apreciação das seguintes pretensões:

“a)    A declaração de ilegalidade de actos de liquidação de tributos, de autoliquidação, de retenção na fonte e de pagamento por conta;

b)     A declaração de ilegalidade de actos de fixação da matéria tributável quando não dê origem à liquidação de qualquer tributo, de actos de determinação da matéria colectável e de actos de fixação de valores patrimoniais;

c)      revogada (pelo artigo 160.º da Lei n.º 64-B/2011, de 30 de Dezembro, que aprovou o Orçamento do Estado para 2012).

( [4] ) Excerto do Acórdão Arbitral, processo n.º 48/2012.

( [5] )           Neste sentido, podem ver-se os seguintes acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo:

– da Secção do Contencioso Administrativo, de 5-5-1987, processo n.º 23205, publicado no AP-DR de 30-6-93, página 2272, em que se entendeu que, havendo a possibilidade de o recorrente ter sido induzido em erro pelo tribunal, é de aceitar a alegação de que só em virtude desse erro o prazo para a junção de certo documento não foi observado.

– da Secção do Contencioso Administrativo, de 24-10-1996, processo n.º 39578, publicado no AP-DR de 15-4-99, página 7126, em que se entendeu que se deveria considerar como prazo de recurso hierárquico o prazo mais longo que o legal que foi indicado na publicação do acto;

– da Secção do Contencioso Administrativo, de 31-5-2005, processo n.º 46544, em que se admitiu, generalizadamente, que os destinatários dos actos não podem ser prejudicados quando foram induzidos pela Administração;

– da Secção do Contencioso Tributário, de 9-9-2009, processo n.º 461/09, relativo a um caso em que ocorreu um erro na indicação do prazo para interposição de recurso.

 

                Na mesma linha, podem ver-se os seguintes acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça:

– de 11-5-1980, processo n.º 69125, publicado no Boletim do Ministério da Justiça n.º 301, página 364, em que se entendeu que o lapso na indicação de um prazo para contestar não podia prejudicar o citado;

– de 5-5-1988, processo n.º 76482, publicado no Boletim do Ministério da Justiça n.º 379, página 558, relativo a indicação do prazo para pagamento de custas superior ao legal;

– de 2-11-1989, processo n.º 78195, publicado no Boletim do Ministério da Justiça n.º 391, página 502, em que se admitiu a apresentação de alegações no prazo máximo previsto na lei, quando na notificação foi omitida a referência ao prazo que tinha sido fixado pelo juiz, inferior a esse máximo;

– de 7-10-1990, processo n.º 79323, e que se entendeu que o preceituado no n.º 3 do artigo 198.º do CPC, mais não é do que a afloração do principio geral de que ninguém deverá sofrer qualquer sanção ou ser processualmente prejudicado por factos ou irregularidades que lhe não sejam imputáveis.

( [6] )           Essencialmente neste sentido, pode ver-se o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 16-5-2007, processo n.º 740/06, em que se entendeu que não pode ser responsabilizado pelas custas de um incidente de incompetência do tribunal, o autor de acção administrativa especial que dirigiu a respectiva petição ao tribunal que lhe foi indicado pela administração tributária na notificação do acto que naquela acção foi impugnado.

( [7] )           Embora sem referir explicitamente estas normas, no acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 10-2-2010, processo n.º 993/09, entendeu-se, relativamente a notificação errada efectuada pela Administração Tributária em processo de contra-ordenação tributária, em que era indicado um prazo de impugnação judicial superior ao legal, que o destinatário podia utilizar esse prazo errado, por tal ser reclamado pelo direito à tutela judicial efectiva.

( [8] ) Em «O que é a “garantia adequada” para efeitos do reembolso do IVA?», publicado em Estudos em Memória do Prof. Doutor J. L. Saldanha Sanches, volume IV, páginas 276-277.

( [9] ) Os n.ºs 11 e 13 do CIVA, na redacção da Lei n.º 2/2010, de 15 de Março, estabelecem o seguinte:

«11 - Os pedidos de reembolso são indeferidos quando não forem facultados pelo sujeito passivo elementos que permitam aferir da legitimidade do reembolso, bem como quando o imposto dedutível for referente a um sujeito passivo com número de identificação fiscal inexistente ou inválido ou que tenha suspenso ou cessado a sua actividade no período a que se refere o reembolso.

(...)

13 - Da decisão referida no n.º 11 cabe recurso hierárquico, reclamação ou impugnação judicial, nos termos previstos no artigo 93.º»

( [10] )        A fundamentação tem pequenas variações em cada uma dos relatórios das inspecções, mas é essencialmente idêntica em todos eles.

( [11] )          Neste sentido, podem ver-se os seguintes acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo: de 25-10-2000, processo n.º 25128, publicado em Apêndice ao Diário da República de 31-1-2003, página 3757; de 7-11-2001, processo n.º 26432, publicado em Apêndice ao Diário da República de 13-10-2003, página 2602; de 7-11-2001, processo n.º 26404, publicado em Apêndice ao Diário da República de 13-10-2003, página 2593.

( [12] )        Citando jurisprudência anterior do TJCE adoptada nos acórdãos Kretztechnik, n.º 36, (Processo n.º C-465/03), e Investrand n.º 24 (Processo n.º C-435/05), e SKF, n.º 58 (Processo n.º C-29/08).

( [13] )        Neste sentido, JOSÉ XAVIER DE BASTO e MARIA MODETE OLIVEIRA, O direito à dedução do IVA nas sociedades holding, em Fiscalidade n.º 6, página 8:

«... os dividendos, bem como os demais direitos sociais, constituem afinal o conteúdo próprio do direito de propriedade, não envolvendo aquele mínimo de actividade ou de decisão económica que a sujeição ao IVA implica ou supõe». Esses direitos sociais «não são contrapartida de uma actividade económica, resultam da mera propriedade de um bem, a participação social; não são contrapartida nem de actividade tributada nem de actividade isenta, encontrando-se fora do campo de aplicação do IVA».

( [14] ) Acórdão do TJCE Satam, S.A. (acórdão de 22-6-1993, processo n.º C-333/91):

«Não constituindo a contrapartida de qualquer actividade económica, na acepção da Sexta Directiva, a percepção de dividendos não entra no âmbito de aplicação do imposto sobre o valor acrescentado, de forma que os dividendos, que resultam da detenção de participações, são estranhos ao sistema dos direitos à dedução»

( [15] )        Seguindo a jurisprudência dos acórdãos de 14-2-1985, Rompelman, Processo n.º 268/83, e de 29-2-1996, INZO, Processo n.º C-110/94.

( [16] )     Essencialmente neste sentido, podem ver-se os seguintes acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo, a propósito de situação paralela que se coloca nos processos de recurso contencioso:

  • de 10-11-98, do Pleno, proferido no recurso n.º 32702, publicado em Apêndice ao Diário da República de 12-4-2001, página 1207;
  • de 19-6-2002, processo n.º 47787, publicado em Apêndice ao Diário da República de 10-2-2004, página 4289;
  • de 09-10-2002, processo n.º 600/02;
  • de 12-3-2003, processo n.º 1661/02.

 

      Em sentido idêntico, podem ver-se:

  • MARCELLO CAETANO, Manual de Direito Administrativo, volume I, 10.ª edição, página 479 em que refere que é «irrelevante que a Administração venha, já na pendência do recurso contencioso, invocar como motivos determinantes outros motivos, não exarados no acto», e volume II, 9.ª edição, página 1329, em que escreve que «não pode (...) a autoridade recorrida, na resposta ao recurso, justificar a prática do acto recorrido por razões diferentes daquelas que constam da sua motivação expressa»;  
  •  MÁRIO ESTEVES DE OLIVEIRA, Direito Administrativo, Volume I, página 472, onde escreve que «as razões objectivamente existentes mas que não forem expressamente aduzidas, como fundamentos do acto, não podem ser tomadas em conta na aferição da sua legalidade».      

( [17] )          SOARES MARTINEZ, Direito Fiscal, 7.ª edição, página 126.

                Em sentido idêntico, pode ver-se e NUNO SÁ GOMES, Manual de Direito Fiscal, volume II, página 56.

( [18] )          Obra e local citados.

( [19] )        É apenas a esta quantia que a Requerente se refere. Como manifestamente resulta do artigo 222.º da petição inicial. 

( [20] )       «Cessante  ratione legis cessat eius dispositio (lá onde termina a razão de ser da  lei termina o seu alcance)» (BAPTISTA MACHADO, Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador, página 186. 

( [21] )        A questão do IVA respeitante a despesas com viagens e refeições tem a ver com o direito ao reembolso e não com as liquidações pagas.