Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 364/2015-T
Data da decisão: 2017-02-16  IVA  
Valor do pedido: € 1.857.192,76
Tema: IVA - reenvio prejudicial, isenção prevista na alínea a) do artigo 14.º do RITI; conformidade com o Direito Europeu; artigos 131.º e 138.°, n.º 1, da Diretiva n.º 2006/112
REENVIO PREJUDICIAL   Versão em PDF

Os Árbitros Conselheiro Jorge Lopes de Sousa (designado pelos outros Árbitros), Dr. Emanuel Augusto Vidal Lima e Prof.ª Doutora Clotilde Celorico Palma e, designados, respectivamente, pela Requerente e pela Requerida, para formarem o Tribunal Arbitral, constituído em 08-09-2015, acordam no seguinte:

 

 

1. Relatório

 

A…, SUCURSAL EM PORTUGAL (doravante designada por “Impugnante” ou “Requerente”), Pessoa Colectiva com o número de identificação fiscal…, e sede no…, Lote … a …, …-… …, Concelho de …, Distrito de ... (adiante abreviadamente designada por “Requerente”), veio requerer, ao abrigo do disposto nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a) e 10.º, n.º 1, alínea a), do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, doravante “RJAT”), a constituição de Tribunal Arbitral Colectivo com vista à declaração de ilegalidade, e consequente anulação, dos actos tributários de liquidação de Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA) e juros compensatórios, relativos aos anos de 2010, 2011 e 2012, com os n.ºs…, …, …, …, …, …, …, …, …, …, …, …, …, …, 2013…, 2013…, 2013…, 2013…, 2013…, 2013…, 2013…, 2013…, 2013…, 2013… e 2013…; e n.ºs…, …, …, …, …, …, …, …, …, …, …, …, …, …, 2013…, 2013…, 2013…, 2013…, 2013…, 2013…, 2013…, 2013…, 2013…, 2013… e 2013…, tudo no valor global de €1.857.192,76.

A Requerente pretende que seja efectuado reenvio prejudicial ao TJUE, nos termos do artigo 267.º do TFUE, com a consequente suspensão da presente Instância, nos termos do artigo 272.º n.º 1 do CPC.

É Requerida a AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA (AT).

A Requerente designou como Árbitro o Dr. Emanuel Augusto Vidal Lima, ao abrigo do disposto no artigo 6.º, n.º 2, alínea b) do RJAT.

O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD e automaticamente notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira em 16-06-2015.

Nos termos do disposto na alínea b) do n.º 2 do artigo 6.º e do n.º 3 do RJAT, e dentro do prazo previsto no n.º 1 do artigo 13.º do RJAT, o dirigente máximo do serviço da Administração Tributária designou como Árbitro a Prof.ª Doutora Clotilde Celorico Palma.

Os Árbitros designados pelas Partes acordaram em designar o Cons. Jorge Lopes de Sousa como árbitro presidente, que aceitou a designação.

Nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 7 do artigo 11.º do RJAT, o Senhor Presidente do CAAD informou as Partes dessa designação em 24-08-2015.

Assim, em conformidade com o preceituado no n.º 7 artigo 11.º do RJAT, decorrido o prazo previsto no n.º 1 do artigo 13.º do RJAT sem que as Partes nada viessem dizer, o Tribunal Arbitral Colectivo ficou constituído em 08-09-2015.

A Autoridade Tributária e Aduaneira apresentou Resposta, em que se opõe ao pedido de reenvio prejudicial e defende a improcedência do pedido.

Em 09-11-2015, realizou-se a reunião prevista no artigo 18.º do RJAT em que foi produzida prova testemunhal e se decidiu que o processo prosseguisse com alegações escritas sucessivas.

As Partes apresentaram alegações.

O tribunal arbitral foi regularmente constituído e é competente e não foram suscitados obstáculos a apreciação do mérito da causa, embora seja necessário apreciar se é necessário efectuar reenvio prejudicial.

As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias e são legítimas (artigos 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março) e estão devidamente representadas.

O processo não enferma de nulidades.

Por acórdão de 30-11-2015, foi decidido efectuar reenvio prejudicial para o TJUE tendo por objecto as seguintes questões:

i)   Os artigos 131.º e 138.°, n.º 1, da Directiva n.º 2006/112 devem ser interpretados no sentido de que se opõem a que a Administração Fiscal de um Estado-Membro recuse conceder uma isenção de IVA numa entrega intracomunitária, a um alienante sedeado nesse Estado-Membro, por o adquirente, sedeado noutro Estado-Membro, não se encontrar registado no VIES nem estar aí abrangido por um regime de tributação das aquisições intracomunitárias de bens, embora disponha, no momento da transacção, de um número de identificação válido, para efeitos de IVA, nesse outro Estado-Membro, número esse que foi utilizado nas facturas das transacções, quando os requisitos materiais de uma entrega intracomunitária estejam cumulativamente verificados, isto é, quando o direito de dispor do bem como proprietário tenha sido transferido para o adquirente e o fornecedor prove que esse bem foi expedido ou transportado para outro Estado-Membro e que, na sequência dessa expedição ou desse transporte, o mesmo saiu fisicamente do território do Estado-Membro de entrega para um adquirente sujeito passivo ou pessoa colectiva agindo como tal num Estado-Membro que não o de partida dos bens?

ii) O princípio da proporcionalidade opõe-se a uma interpretação do artigo 138.º, n.º 1, da Directiva n.º 2006/112/CE no sentido de a isenção ser recusada numa situação em que um alienante sedeado num Estado-Membro, sabia que o adquirente, sedeado noutro Estado-Membro, apesar de ser titular de número identificação válido, para efeitos de IVA, nesse outro Estado-Membro, não se encontrava registado no VIES nem estava aí abrangido por um regime de tributação das aquisições intracomunitárias de bens, mas tinha a expectativa de que o registo como operador intracomunitário lhe viesse a ser concedido, de forma retroactiva?

 

O TJUE pronunciou-se sobre estas questões no acórdão de 09-02-2017, proferido no processo n.º C-21/16, nestes termos:

 

O artigo 131.º e o artigo 138.º, n.º 1, da Diretiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de novembro de 2006, relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado, devem ser interpretados no sentido de que se opõem a que a Administração Fiscal de um EstadoMembro recuse isentar de imposto sobre o valor acrescentado uma entrega intracomunitária pelo simples motivo de, no momento dessa entrega, o adquirente, sedeado no território do EstadoMembro de destino e titular de um número de identificação de imposto sobre o valor acrescentado válido para as operações nesse Estado, não estar inscrito no Sistema de Intercâmbio de Informações sobre o Imposto sobre o Valor Acrescentado nem se encontrar abrangido por um regime de tributação das aquisições intracomunitárias, ainda que não exista nenhum indício sério que sugira a existência de fraude e que esteja demonstrado que os requisitos materiais da isenção estão verificados. Neste caso, o artigo 138.º, n.º 1, desta diretiva, interpretado à luz do princípio da proporcionalidade, opõese igualmente a essa recusa quando o alienante tinha conhecimento das circunstâncias que caracterizavam a situação do adquirente tendo em conta a aplicação do imposto sobre o valor acrescentado e tinha a expectativa de que, posteriormente, o adquirente seria registado, de forma retroativa, como operador intracomunitário.

 

2. Matéria de facto

 

2.1. Factos provados

 

 

a)     A Requerente é uma sucursal em Portugal de uma entidade holandesa, B…;

b)    A Requerente dedica-se à importação, exportação de pneus e comercialização de pneus de diversas marcas para retalhistas em território nacional e em Espanha;

c)    A Requerente, em sede de IVA está enquadrada no regime normal de periodicidade mensal;

d)    As vendas para o mercado espanhol, estas podem ser efectuadas pela Requerente directamente aos seus clientes ou através da "C…, SL", sociedade comercial constituída em Espanha, que funciona como um distribuidor em Espanha para clientes de menor dimensão;

e)    Nas transmissões intracomunitárias de pneus para sujeitos passivos de IVA no mercado espanhol a Impugnante tem vindo a aplicar a isenção de IVA prevista no abrigo do artigo 14.º, alínea a), do Regime do IVA nas Transacções Intracomunitárias (“RITI”).

f)     A Requerente foi objecto de um procedimento inspectivo externo, que decorreu sob a ordem de serviço n.º OI2013…, de âmbito parcial em IVA e que incidiu sobre os anos de 2010, 2011 e 2012;

g)   Nessa inspecção foi elaborado o Relatório da Inspecção Tributária que consta do documento n.º 3 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido, em que se refere, além do mais, o seguinte:

 III.1.1. -IMPOSTO SOBRE O VALOR ACRESCENTADO

III.1.1.1 - NÃO LIQUIDAÇÃO DE IVA

 III.1.1.1.1 -DESCRIÇÃO DOS FACTOS

Da análise efectuada, constatou-se que a sociedade A…- Sucursal Portugal efetuou transmissões intracomunitárias de bens, isentas de IVA ao abrigo da alínea a) do art.º 14 º do RITI, para diversas entidades espanholas, as quais se encontram nas seguintes condições:

i)C.... NIF …- Apenas a partir de 19/03/2013, com efeitos reportados a 01/07/2012. é que se encontra registada para efeitos da realização de operações intracomunitárias (Documento n.º 01);

ii)D…, NIF …- Cessada desde 21/06/2012 (Documento n," 02),

iii)E... NIF: …- Cessado desde 15/12/2010 (Documento n.º03),

iv)F…SL. NIF: …- Cessada desde 14/02/2011 (Documento n.º 04).

v)G... NIF … - Cessado desde 09/08/2012 (Documento n.º 05)

vi)H…, NIF … - Cessado desde 10/07/2012 (Documento n.º 06),

vii)I... NIF …- Cessada desde 31/08/2012 (Documento n.º 07);

viii)J…, NIF … - Cessado desde 05/09/2012 (Documento n.º 08)

 

A situação irregular em que estas entidades se encontram, inviabiliza que as transmissões efetuadas às mesmas pela sociedade portuguesa A…- Sucursal Portugal, sejam efetuadas ao abrigo da isenção prevista na alínea a) do art.º 14.º do RITI, porquanto os adquirentes não cumprem com o disposto naquele preceito legal, uma vez que uma transmissão de bens só poderá beneficiar da isenção aí prevista, quando estiver reunido um conjunto de condições relativas à operação realizada, ao adquirente e ao transporte dos bens transmitidos, que se passam a enunciar:

a) Estar-se perante uma transmissão de bens, na acepção do art º 3 º do CIVA,

b) O transmitente ser um sujeito passivo do imposto em território nacional, nos termos do art º 2 º do CIVA.

c) O adquirente ser uma pessoa singular ou colectiva devidamente registada para efeitos de IVA num outro Estado membro, encontrar-se abrangido por um regime de tributação das aquisições intracomunitárias de bens, e ter utilizado o número de identificação atribuído pelo Estado membro de registo para efectuar a aquisição:

d) Finalmente os bens serem expedidos ou transportados a partir do território nacional, pelo vendedor, pelo adquirente, ou por conta destes, com destino a outro Estado membro.

Não obstante, nas transmissões intracomunitárias que a sociedade portuguesa A…- Sucursal Portugal efetuou para alguns clientes intracomunitários, por sinal uma delas empresa com ligação ao mesmo grupo, a mesma isentou-as ao abrigo do disposto na al. a) do n.º 1 do art º 14,º do RITl, sem que tenha confirmado a validade do número de identificação fiscal e/ou a sua atribuição a estes seus clientes intracomunitários, bem como a sua situação em termos de efetivo registo para o exercício de atividade, designadamente se os mesmos se encontram cessados ou não se encontram registados para a realização de operações intracomunitárias, já que transmitiu bens para clientes cessados ou para clientes não cessados, mas não registados para a realização de operações intracomunitárias, no respetivo país (Documento n.º 09).

Os valores faturadas a clientes que não se encontram registados para a realização de operações intracomunitárias ou que se encontram cessados, conforme extratos de conta corrente (Documento n.º 10), foram os que a seguir se apresentam.

Período económico de 2010

 

Período económico de 2011

 

 

 

Período económico de 2012

 

III.1.1.1.2 -CÁLCULO DO IMPOSTO EM FALTA

Face à legislação e factos mencionados, impõem-se correções respeitantes à falta de liquidação de IVA como se passa a indicar.

Período económico de 2010

 

Período económico de 2011

 

Período económico de 2012

 

111.1.1.1.3-CONCLUSÕES

O imposto em falta, decorrente da não liquidação indevida de imposto nas transmissões intracomunitárias efetuadas pela sociedade portuguesa A…- Sucursal Portugal às entidades espanholas, não registadas ou cessadas para efeitos de realização de operações intracomunitárias, ascende a € 1 881 995.76, conforme se passa a discriminar:

Pelo que, em sede de IVA, o montante das correcções meramente aritméticas a efectuar ao imposto sobre o valor acrescentado (IVA), nos períodos económicos de 2010, 2011 e 2012, ascendem a respetivamente 46,025.79, 826 800.60 e 1,009,176,27, perfazendo um total de 1,881 995.76.

 

h)   Na sequência da inspecção foram emitidas as seguintes liquidações de IVA e de mora:

De IVA

– n.º … no montante de € 2.953,74, relativa ao período 1009;

– n.º …, no montante de € 5.755,05, relativa ao período 1010;

– n.º…, no montante de € 14.499,36, relativa ao período 1011;

– n.º…, no montante de € 22.817,64, relativa ao período 1012;

– n.º…, no montante de € 94.390,53, relativa ao período 1110;

– n.º …, no montante de € 84.591,17, relativa ao período 1109;

– n.º…, no montante de € 63.061,83, relativa ao período 1108;

– n.º…, no montante de € 57.693,09, relativa ao período 1107;

– n.º…, no montante de € 49.656,63, relativa ao período 1106;

– n.º…, no montante de € 47.596,85, relativa ao período 1105;

– n.º…, no montante de € 40.894,69, relativa ao período 1104;

– n.º …, no montante de € 45.221,25, relativa ao período 1103;

– n.º…, no montante de € 35.588,32, relativa ao período 1102;

– n.º…, no montante de € 33.023,81, relativa ao período 1101;

– n.º 2013…, no montante de € 5.548,00, relativa ao período 1111, referida na demonstração de acerto de contas n.º 2013…;

– n.º 2013…, no montante de € 42,266,17, relativa ao período 1112, referida na demonstração de acerto de contas n.º 2013…;

– n.º 2013 … no montante de € 35.798,89, relativa ao período 1201, referida na demonstração de acerto de contas n.º 2013…;

– n.º 2013…, no montante de € 259.535,42, relativa ao período 1205, referida na demonstração de acerto de contas n.º 2013…;

– n.º 2013…, no montante de € 193.119.46, relativa ao período 1206, referida na demonstração de acerto de contas n.º 2013…;

– n.º 2013…, no montante de € 193.119.46, relativa ao período 1207, referida na demonstração de acerto de contas n.º 2013…;

– n.º 2013…, no montante de € 150.400,96, relativa ao período 1208, referida na demonstração de acerto de contas n.º 2013…;

– n.º 2013…, no montante de € 122.103,21, relativa ao período 1209, referida na demonstração de acerto de contas n.º 2013…,

– n.º 2013…, no montante de € 184.009,99, relativa ao período 1210, referida na demonstração de acerto de contas n.º 2013…;

– n.º 2013…, no montante de € 60.029,62, relativa ao período 1211, referida na demonstração de acerto de contas n.º 2013…;

– n.º 2013…, no montante de € 102.895,39, relativa ao período 1212, referida na demonstração de acerto de contas n.º 2013…;

 

De juros compensatórios

– n.º…, no montante de € 308,16, relativa ao período 1009;

– n.º …, no montante de € 581,50, relativa ao período 1010;

– n.º…, no montante de € 1.415,77, relativa ao período 1011;

– n.º…, no montante de € 2.150,48, relativa ao período 1012;

– n.º…, no montante de € 3.014,67, relativa ao período 1101;

– n.º…, no montante de € 3.123,97, relativa ao período 1102;

– n.º…, no montante de € 3.825,84, relativa ao período 1103;

– n.º…, no montante de € 3.307,43, relativa ao período 1104;

– n.º…, no montante de € 3.703,43, relativa ao período 1105;

– n.º…, no montante de € 3.700,44, relativa ao período 1106;

– n.º …, no montante de € 4.090,68, relativa ao período 1107;

– n.º…, no montante de € 4.277,84, relativa ao período 1108;

– n.º…, no montante de € 5.450,92, relativa ao período 1109;

– n.º…, no montante de € 5.751,36, relativa ao período 1110;

– n.º 2013…, no montante de € 320,41, relativa ao período 1111, referida na demonstração de acerto de contas n.º 2013…;

– n.º 2013…, no montante de € 2.297,42, relativa ao período 1112, referida na demonstração de acerto de contas n.º 2013…;

– n.º 2013…, no montante de € 1.824,27, relativa ao período 1201, referida na demonstração de acerto de contas n.º 2013…;

– n.º 2013…, no montante de € 9.812,57, relativa ao período 1205, referida na demonstração de acerto de contas n.º 2013…;

– n.º 2013…, no montante de € 6.645,42, relativa ao período 1206, referida na demonstração de acerto de contas n.º 2013…;

– n.º 2013…, no montante de € 4.169,91, relativa ao período 1207, referida na demonstração de acerto de contas n.º 2013…;

– n.º 2013…, no montante de € 4.170,02, relativa ao período 1208, referida na demonstração de acerto de contas n.º 2013…;

– n.º 2013…, no montante de € 2.943,85, relativa ao período 1209, referida na demonstração de acerto de contas n.º 2013…;

– n.º 2013…, no montante de € 3.871,77, relativa ao período 12100, referida na demonstração de acerto de contas n.º 2013…;

– n.º 2013…, no montante de € 1.059,15, relativa ao período 12-11, referida na demonstração de acerto de contas n.º 2013…;

– n.º 2013…, no montante de € 1.371,08, relativa ao período 1212, referida na demonstração de acerto de contas n.º 2013… .

i)      A Requerente regularizou voluntariamente a sua situação tributária relativamente às correcções propostas, com referência aos clientes espanhóis que haviam cessado a sua actividade (designadamente, D…, S.L., E…, F..., G…, H…, I... e J…), pagando a quantia de € 107.844,91 (documento n.º 5 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);

j)      Em 27-01-2014, a Requerente deduziu reclamação graciosa das liquidações, que teve o n.º …2014… na Direcção de Finanças de … e veio a ser indeferida por despacho de 20-05-2014;

k)   Em 26-6-2014, a Requerente interpôs recurso hierárquico da decisão de indeferimento da reclamação graciosa, que veio a ser indeferido por despacho de 26-02-2015, que consta do documento n.º 1 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido, em que se refere, além do mais, o seguinte:

 2 - Apreciação do Recurso Hierárquico

34. A questão controvertida resume-se a saber se, para efeitos da isenção de imposto prevista na al. a) do art.º 14.º do RITI, é exigível que o adquirente dos bens com sede noutro Estado membro esteja registado no VIES.

35. A Recorrente entende que não, bastando que o adquirente seja um sujeito passivo de IVA e possua um número de identificação válido, para efeitos do imposto, através do qual proceda à aquisição dos bens, conforme entende ser o regime instituído pela Diretiva IVA.

36. Ou, ainda que não seja sujeito passivo do imposto, esteja o adquirente "abrangido por um regime de tributação das aquisições intracomunitárias de bens", devendo ser esse o sentido da al. a) do art.º 14.º do RITI.

37. Da análise da al. a) do art.º 14.º do RITI resulta que, no que concerne à qualidade do adquirente, a transmissão intracomunitária de bens só está isenta se se tratar de uma pessoa singular ou coletiva: (i) registada para efeitos do imposto sobre o valor acrescentado em outro Estado membro; (ii) tenha utilizado o respetivo número de identificação fiscal para efetuar a aquisição; e (iii) aí se encontre abrangido por um regime de tributação das aquisições intracomunitárias de bens.

38. No caso em apreço, a adquirente C…, apesar de se encontrar registada em Espanha para efeitos do imposto, não se encontrava, nesse país, abrangida por um regime de tributação das aquisições intracomunitárias de bens, não estando registada no VIES. O registo no VIES só foi efetivado em 2013-03-19, com efeitos reportados a 2012-07-01.

39. A Recorrente começa por invocar que este último requisito da lei portuguesa, da inclusão num regime de tributação das aquisições intracomunitárias de bens, constitui uma transposição abusiva da Diretiva IVA, defendendo uma interpretação segundo a qual só seria aplicável em situações excecionais em que o adquirente não é um sujeito passivo.

40. No entanto, a lei portuguesa é absolutamente clara no sentido da isenção depender da circunstância do sujeito passivo se encontrar "abrangido por um regime de tributação das aquisições intracomunitárias de bens", não se afigurando qualquer possibilidade, atentos os seus termos literais, da norma ser interpretada nos termos preconizados na petição de recurso.

41. Muito menos essa interpretação ou a desnecessidade do apontado registo resultam do preâmbulo do Decreto-Lei n.º 290/92, de 28 de dezembro, o qual procede à aprovação do RITI. Aliás, como é sabido, as considerações preambulares não têm caráter normativo, podendo eventualmente servir para efeitos clarificativos de normas contidas no articulado do diploma legislativo.

42. Por outro lado, como decorre do n.º 2 do art.º 265.º da Constituição da República Portuguesa, "os órgãos e agentes administrativos estão subordinados à Constituição e à lei", estando vinculados ao princípio da legalidade, no qual se funda o Estado português, de acordo com o n.º 2 do art.º 3.º da lei fundamental.

43. Significa isto que não compete aos agentes administrativos, no exercício dessas funções, aferir se as leis estão em conformidade com a Constituição ou com diplomas a que tais leis se devem subordinar, como é o caso da Diretiva IVA. Pelo contrário, numa situação em que o sentido da lei não oferece qualquer dúvida, como é aquela em apreço, a Administração Pública está vinculada à aplicação da lei.

44. Assim sendo, não seria no âmbito deste recurso hierárquico, ou de qualquer outro procedimento administrativo, que a Recorrente obteria acolhimento à sua perspetiva de que a transposição da Diretiva não foi corretamente efetuada, em seu desfavor.

45. De facto, apenas em caso de dúvidas interpretativas a interpretação da norma nacional pode ser efetuada em conformidade com a Diretiva IVA. Porém, como exposto, tal não se verifica no caso em apreço, atenta a clarividência da al. a) do art.º 14.º do RITI.

46. Por outro lado, deve referir-se que o n.º 1 do art.º 138.º da Diretiva parece limitar-se a enunciar o princípio da isenção de imposto na transmissão intracomunitária de bens, sem cuidar de especificar as condições em que essa isenção é aplicada.

47. Como resulta do despacho recorrido, de acordo com o art.º 131.º da Diretiva, tais condições são "fixadas pelos Estados-Membros a fim de assegurar a aplicação correcta e simples das referidas isenções e de evitar qualquer possível fraude, evasão ou abuso".

48. Na realidade, o TJUE tem afirmado recorrentemente que o Direito Comunitário não impõe obrigações específicas quanto aos requisitos aplicáveis à isenção e, mais do que isso, remete para as instâncias judiciais dos Estados membros a aferição do cumprimento pelos sujeitos passivos das obrigações em matéria de prova prevista na sua legislação interna.

49. Nesse sentido, por exemplo, o acórdão de 2012-09-06, proc. n.º C-273-11, no qual se declarou, na conclusão, que "o artigo 138.º, n.º 1, da Diretiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de novembro de 2006, relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado, conforme alterada pela Diretiva 2010/88/UE do Conselho, de 7 de dezembro de 2010, deve ser interpretado no sentido de que não se opõe a que, em circunstâncias como as que estão em causa no processo principal, o direito à isenção de uma entrega intracomunitária seja recusado ao vendedor, caso se conclua, à luz de elementos objetivos, que este não cumpriu as obrigações que lhe incumbem em matéria de prova (...).

50. Ora, é através da inclusão no VIES que um sujeito passivo de outro Estado membro se declara destinatário de aquisições intracomunitárias, sendo tais operações tributadas no destino e não na origem, por via da aplicação da isenção na transmissão intracomunitária.

51. Assim sendo, a necessidade de inclusão no VIES para efeitos da isenção da transmissão intracomunitária afigura-se como um mecanismo imprescindível com vista à prevenção e combate à fraude e evasão fiscais, assegurando-se, juntamente com os demais requisitos plasmados na al. a) do art.º 14.º do RITI, que a isenção só tem aplicação em situações em que está garantida a tributação no destino.

52. O que significa que a obrigatoriedade de inclusão do adquirente no VIES, tal como consta na al. a) do art.º 14.º do RITI, como condição para a isenção da transmissão intracomunitária, parece encontrar plena legitimidade no âmbito da margem de livre atuação dos Estados membros prevista no art.º 131.º da Diretiva, a qual se encontra direcionada aos objetivos da aplicação correia e simples das isenções e da prevenção de fraude, evasão e abusos.

53. De facto, o registo no VIES não configura qualquer entrave a simplicidade do regime de isenção, sendo, porém, fundamental para os objetivos de prevenção e fiscalização da fraude e evasão fiscais. Sendo de conhecimento generalizado que a isenção das transmissões intracomunitárias é, no regime comunitário do imposto, das soluções mais propensas à fuga e criminalidade fiscais.

54. Desta forma, circunscrevendo-se os requisitos previstos na al. a) do art.0 14.º do RITI aos objetivos previstos no art.º 131.º da Diretiva, condição exigida pela jurisprudência a este respeito emanada do TJUE, parece não existir qualquer problema de conformidade com o Direito Comunitário, encontrando-se acautelados, designadamente, os princípios da proporcionalidade e da segurança jurídica.

55. Não estão aqui em causa exigências formais acessórias ou instrumentais para a aplicação da isenção, mas, pelo contrário, um requisito fundamental para o regular funcionamento do regime de tributação das transmissões intracomunitárias de bens.

56. Posto isto, aplicando a al. a) do art.º 14.º do RITI à situação em apreço, nada há a apontar â atuação da Inspeção Tributária, sendo jurisprudência do STA que só serão isentas de IVA as transmissões de bens efetuadas por um sujeito passivo para outro Estado membro, desde que, cumulativamente:

1 - a transmissão de bens seja efectuada por um sujeito passivo dos referidos na alínea a) do nº 2 do artº 2º isto é que se encontre abrangido no país de origem por um regime de tributação das aquisições intracomunitárias de bens;

2 - o adquirente seja uma pessoa singular ou colectiva registada para efeitos do IVA noutro Estado membro;

3 - o adquirente utilize o respectivo número de identificação para efectuar a aquisição;

4 - e se encontre abrangido por um regime de tributação das aquisições intracomunitárias de bens nesse outro Estado membro.

57. Como decorre dos acórdãos do Tribunal Central Administrativo Sul (TCAS), de 2006-02-14, processo n.º 01000/06 e de 2006-02-21, processo n.º 00902/05, "se o sujeito activo da operação só se preocupa com a existência de um número (qualquer que seja) e não averigua se o adquirente se encontra abrangido por um regime de tributação das aquisições intracomunitárias de bens (Art.º 14/a, RITI, parte final) só cumpre metade da regra, sujeitando-se a tomar por isenta uma operação que o não é".

58. Sendo que, como reconhecido no articulado, a Recorrente tinha conhecimento que a adquirente não se encontrava abrangida por um regime de tributação das aquisições intracomunitárias de bens em Espanha, alegando uma expectativa que lhe fosse outorgado um registo com efeitos a momento anterior ao da realização das transmissões em causa.

59. De referir ainda que a apreciação do cumprimento dos requisitos citados tem caráter estritamente objetivo. Isto é, a isenção é aplicada se estiverem verificados, independentemente do que seja o entendimento dos intervenientes acerca da sua verificação e dos termos apostos nos documentos comerciais que titulem essas operações.

60. Essa objetividade dos requisitos da al. a) do art.º 14.º do RITI tem sido confirmada pela jurisprudência nacional, podendo indicar-se as seguintes ilações dela decorrente:

• "A boa fé da impugnante parece inquestionável, e a Fazenda Pública nem sequer a põe em causa. Mas falar-se de boa fé é, neste caso, deslocar o problema, porque a questão está em saber sé a operação é ou não isenta, ou dito de outro modo, se reúne ou não os requisitos previstos no artigo 14 RITI. E não reúne, como se viu".

• "Ainda que se admita que a impugnante tenha atuado de boa fé, decorrente da aparência que revestiram os factos tendo em conta a garantia prestada pela "…" ao negócio e n. º que lhe foi fornecido pela adquirente espanhola, a questão está apenas em saber se a operação é ou não isenta, ou dito de outro modo, se reúne ou não os requisitos previstos no artigo 14 RITI".

61. Aliás, repete-se, a Recorrente tinha conhecimento que a adquirente não estava registada no VIES e, como tal, não podia desconhecer que não se encontravam reunidos todos os requisitos da al. a) do art.º 14.º do RITI.

62. Ainda assim, aplicou a isenção aí prevista, na expectativa de que o registo no VIES fosse admitido com efeitos anteriores à data da realização das transmissões intracomunitárias, o que não se verificou.

63. Não pode, atentos estes factos, ser considerada de boa fé, uma vez que só está de boa fé quem, com base em factos objetivamente considerados, age na convicção de que os requisitos da isenção estão cumpridos quando, na realidade, não estão. Pelo contrário, a Recorrente sabia que à data da realização das transmissões não tinha condições para aplicar a isenção plasmada no RITI, mas tinha expetativas que essa situação viesse a ser retificada com efeitos retroativos.

64. E, na verdade, a isenção seria aplicada se o Estado espanhol tivesse admitido o registo no VIES com efeitos anteriores à realização das transmissões intracomunitárias. Essa decisão contrária aos interesses da Recorrente não é da responsabilidade do Estado português, não cabendo à AT pronunciar-se sobre a sua legalidade ou imiscuir-se nas razões que a determinaram.

65. No entanto, não pode a AT deixar de extrair as devidas conclusões dessa decisão das autoridades espanholas, o que passa por concluir que, efetivamente, à data da realização das transmissões intracomunitárias que originaram as correções de imposto a Recorrente não se encontrava abrangida por um regime de tributação das aquisições intracomunitárias de bens em Espanha.

66. Assim, a eventual ilegalidade da decisão das autoridades espanholas em desfavor da Recorrente encontra-se pendente de apreciação nos tribunais espanhóis, não podendo ser imputada à atuação da Administração Fiscal portuguesa. Aliás, a exigência de registo no VIÉS está longe de ser uma especificidade do ordenamento jurídico português.

67. A confirmar-se a pretensão da Recorrente no sentido do registo dever ser considerado com efeitos reportados a momento anterior ao da realização das transmissões intracomunitárias, a exigida liquidação de imposto no Estado de origem dos bens constituirá um dano decorrente da prática desse ato administrativo praticado pelo Estado espanhol, eventualmente ressarcível em sede de responsabilidade civil extracontratual, o que é reforçado pela circunstância da AT, apesar da argumentação contrária, ter recusado a isenção de imposto nessas circunstâncias.

V - DIREITO DE AUDIÇÃO

68. Como resulta das instruções administrativas constantes da Circular n.º 13/99, de 1999-07-08, da Direção de Serviços de Justiça Tributária, al. a) do n.º 3, o direito de audição pode ser dispensado "quando, a administração tributária, apenas, aprecie os factos que lhe foram dados pelo contribuinte, limitando-se na sua decisão a fazer a interpretação das normas legais aplicáveis ao caso; Encontram-se nesta situação todas as decisões sobre petições, requerimentos, reclamações e recursos em que a administração se limita a concluir, face aos factos e argumentos invocados pelo contribuinte e a lei aplicável, pela improcedência da sua pretensão".

69. Na situação em apreço não há lugar ao direito de participação da Recorrente, por força do determinado nesta al. a) do n.º 3 da Circular n.º 13/99, porque a apreciação limitou-se aos factos conhecidos, aplicando as normas legais ao caso. No fundo, não existiu propriamente uma fase de instrução do processo e é a instrução do processo que dá origem ao direito de audição, como decorre do n.º 1 do art.º 100.º do Código do Procedimento Administrativo, o qual tem sido considerado aplicável ao procedimento tributário por via da al. c) do art.º 2.º da LGT.

VI - CONCLUSÃO

70. Em conclusão, sem que haja lugar a audição prévia da Recorrente, propõe-se o indeferimento do recurso hierárquico interposto do despacho do Diretor de Finanças de …, de 2014-05-20, que indeferiu a reclamação graciosa …2014…, relativa a liquidações de IVA, demonstrações de acerto de contas e juros compensatórios referentes aos períodos de 2010-09 a 2012-12, nos valores de € 1.881.995,7630 e € 83.041,91, respetivamente.

 

l)    Os pneus que no Relatório da Inspecção Tributária se refere terem sido objecto de operações realizadas com a C…, SL, foram expedidos para o território espanhol;

m)  A C… SL, encontrava-se registada em Espanha para efeitos de IVA, com o n.º…, desde Junho de 2010 (artigo 9.2. das alegações da Autoridade Tributária e Aduaneira);

n)    Em todas as vendas efectuadas pela Requerente à C… SL, o número … foi indicado nas respectivas facturas;

o)   C… SL não se encontrava, em Espanha, abrangida um regime de tributação das aquisições intracomunitárias de bens, só passando a estar registada no VIES em 19-03-2013, com efeitos reportados a 01-07-2012;

p)     No momento das vendas efectuadas, a Requerente sabia que a C… SL ainda não se encontrava registada como operador intracomunitário, mas tinha conhecimento de que esta empresa tinha a qualidade de sujeito passivo de imposto e tinha a expectativa de que o registo como operador intracomunitário lhe viesse a ser concedido, de forma retroactiva, por parte das autoridades fiscais espanholas (artigo 210.º do pedido de pronúncia arbitral);

q)   A C… SL apresentou declarações recapitulativas de operações intracomunitárias com a Requerente no 3.º trimestre de 2010 e no 2.º trimestre de 2012 (documento n.º 11 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);

r)    A Requerente incluiu o número fiscal da C… SL nas declarações recapitulativas relativas aos períodos 2010/09, 2012/04, 2012/05 e 2012/06 (documento n.º 11 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);

s)     A Autoridade Tributária e Aduaneira entendeu que não está em causa nos autos uma qualquer situação de fraude ou evasão fiscal da Requerente (artigo 26.º das alegações da Autoridade Tributária e Aduaneira);

t)    Em 05-06-2015, a Requerente apresentou o pedido de pronúncia arbitral que deu origem ao presente processo.

 

 

2.2. Factos não provados

 

2.3. Fundamentação da decisão da matéria de facto

 

Os factos dados como provados com base nos documentos juntos com o pedido de pronúncia arbitral e no processo administrativo e na prova testemunhal.

A testemunha inquirida aparentou depor com isenção e com conhecimento dos factos que referiu.

 

3. Matéria de direito

 

A Requerente aceitou as correcções efectuadas pela Autoridade Tributária e Aduaneira relativamente a adquirentes de pneus que tinham cessado a sua actividade, discutindo no presente processo apenas as correcções efectuadas relativamente às operações realizadas com a C…, SL.

Esta empresa encontrava-se registada em Espanha para efeitos do imposto, mas não se encontrava, nesse país, abrangida um regime de tributação das aquisições intracomunitárias de bens, não estando registada no VIES, só sendo o registo no VIES efectivado em 19-03-2013, com efeitos reportados a 01-07-2012.

A Autoridade Tributária e Aduaneira entendeu não se verificar em relação à C…, SL, o último requisito previsto na alínea a) do artigo 14.º do Regime do IVA nas Transacções Intracomunitárias (RITI), de o adquirente se encontrar «abrangido por um regime de tributação das aquisições intracomunitárias de bens», nas datas em que se realizaram as operações subjacentes às correcções efectuadas, pelo que entendeu que a Requerente não podia beneficiar da isenção prevista nesta norma.

O artigo 14.º alínea a), do Regime do IVA nas Transacções Intracomunitárias (RITI), estabelece o seguinte:

 

Artigo 14.º

Isenções nas transmissões

Estão isentas do imposto:

a) As transmissões de bens efectuadas por um sujeito passivo dos referidos na alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º, expedidos ou transportados pelo vendedor, pelo adquirente ou por conta destes, a partir do território nacional para outro Estado membro com destino ao adquirente, quando este seja uma pessoa singular ou colectiva registada para efeitos do imposto sobre o valor acrescentado em outro Estado membro, que tenha utilizado o respectivo número de identificação para efectuar a aquisição e aí se encontre abrangido por um regime de tributação das aquisições intracomunitárias de bens;

 

A Requerente entende, em suma, que este artigo 14.º alínea a), do RITI consubstancia uma transposição incorrecta da Directiva n.º 2006/112/CE do Conselho, de 28-11-2006, designadamente do seu artigo 138.º, n.º 1.

Defende a Requerente que o primeiro requisito imposto pelo artigo 14.º, alínea a), do RITI, que é a utilização do respectivo número de identificação para efectuar a aquisição, apesar de não estar referido no artigo 138.º da Directiva n.º 2006/112/CE, tem suporte no seu artigo 226.º, n.º 4), ao estabelecer como uma das menções obrigatórias nas facturas, para efeitos do IVA, «o número de identificação para efeitos do IVA do adquirente ou destinatário, referido no artigo 214.º, ao abrigo do qual foi efectuada uma entrega de bens ou uma prestação de serviços pela qual aquele seja devedor do imposto ou uma entrega de bens referida no artigo 138.º».

Mas, segundo a Requerente, o segundo requisito imposto pelo RITI (o enquadramento do adquirente, no Estado-membro de aquisição, num regime de tributação das aquisições intracomunitárias de bens) verifica-se que não encontra paralelo na Directiva do IVA, e constitui uma imposição de natureza formal fixada, de forma inovadora, pelo Estado Português.

Assim, a Requerente entende que, para que se aplique a isenção do IVA, consagrada no artigo 138.º da Directiva IVA, basta a comprovação de que o adquirente é um sujeito passivo do IVA que utiliza o seu número de identificação fiscal para realizar a operação e que a verificação dos números de identificação no VIES não é necessária para justificar a isenção em causa, pelo que não é exigível, à face do princípio da proporcionalidade.

Os artigos 131.º e 138.º, n.º 2, alínea a), da Directiva n.º 2006/112/CE do Conselho, de 28-11-2006, estabelecem o seguinte:

 

Artigo 131.º

As isenções previstas nos Capítulos 2 a 9 aplicam-se sem prejuízo de outras disposições comunitárias e nas condições fixadas pelos Estados–Membros a fim de assegurar a aplicação correcta e simples das referidas isenções e de evitar qualquer possível fraude, evasão ou abuso.

 

Artigo 138.º

 

1. Os Estados–Membros isentam as entregas de bens expedidos ou transportados, para fora do respectivo território mas na Comunidade, pelo vendedor, pelo adquirente ou por conta destes, efectuadas a outro sujeito passivo ou a uma pessoa colectiva que não seja sujeito passivo agindo como tal num Estado-Membro diferente do Estado de partida da expedição ou do transporte dos bens.

 

            Impende sobre o legislador, como criador das normas, mas também sobre o intérprete e sobre o julgador, enquanto fiscalizadores da boa aplicação do Direito, a responsabilidade de escrutinar minuciosamente a admissibilidade das normas nacionais, e, entre elas, as fiscais, por forma a que os Estados membros prossigam os objectivos elencados no Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE).

           Como tem sido pacificamente entendido pela jurisprudência e é corolário da obrigatoriedade de reenvio prejudicial prevista no artigo 267.º do TFUE (que substituiu o artigo 234.º do Tratado de Roma, anterior artigo 177.º), a jurisprudência do TJUE tem carácter vinculativo para os Tribunais nacionais, quando tem por objecto questões conexas com o Direito da União Europeia ( [1] ).

            No caso em apreço, foi efectuado o reenvio prejudicial e o TJUE pronunciou-se no acórdão de 09-02-2017, proferido no processo n.º C-21/16, junto aos autos, cujo teor se dá como reproduzido, dizendo, além do mais, o seguinte:

 

23.  Antes de mais, há que recordar que o artigo 138.º, n.º 1, da Diretiva IVA prevê a obrigação de os EstadosMembros isentarem as entregas de bens que satisfaçam as condições aí enumeradas (acórdão de 9 de outubro de 2014, Traum,C492/13, EU:C:2014:2267, n.º 46).

24.   Nos termos desta disposição, os EstadosMembros isentam as entregas de bens expedidos ou transportados, para fora do respetivo território mas na União Europeia, pelo vendedor, pelo adquirente ou por conta destes, efetuadas a outro sujeito passivo ou a uma pessoa coletiva que não seja sujeito passivo agindo como tal num EstadoMembro diferente do Estado de partida da expedição ou do transporte dos bens.

25.  Segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, a isenção da entrega intracomunitária de um bem só é aplicável quando o direito de dispor do bem como proprietário tenha sido transferido para o adquirente e o alienante prove que esse bem foi expedido ou transportado para outro EstadoMembro e que, na sequência dessa expedição ou desse transporte, o mesmo bem saiu fisicamente do território do EstadoMembro de entrega (acórdão de 6 de setembro de 2012, MecsekGabona, C273/11, EU:C:2012:547, n.º 31 e jurisprudência referida).

26.   No caso em apreço, resulta dos elementos que constam da decisão de reenvio que as questões submetidas assentam na premissa de que os requisitos materiais de uma entrega intracomunitária na aceção do artigo 138.º, n.º 1, da Diretiva IVA, como recordados nos n.ºs 24 e 25 do presente acórdão, estavam verificados. A isenção de IVA foi recusada apenas pelo facto de, no momento das vendas em causa no processo principal, o adquirente não estar registado para efeitos da realização de operações intracomunitárias em Espanha nem inscrito no sistema VIES. Nesse EstadoMembro, o adquirente apenas dispunha de um número de identificação IVA válido para a realização de operações no referido Estado e não para a realização de operações intracomunitárias.

27.   A este respeito, há que salientar que, na verdade, no âmbito do regime transitório de tributação do comércio na União, a identificação dos sujeitos passivos de IVA através de números individuais visa facilitar a determinação do EstadoMembro onde ocorre o consumo final dos bens entregues (acórdãos de 6 de setembro de 2012, MecsekGabona, C273/11, n.º 57, e de 14 de março de 2013, Ablessio,C527/11, EU:C:2013:168, n.º 19). Com efeito, o artigo 214.º, n.º 1, alínea b), da Diretiva IVA impõe aos EstadosMembros que tomem todas as medidas necessárias para que sejam identificados através de um número individual, nomeadamente, todos os sujeitos passivos ou pessoas coletivas que não sejam sujeitos passivos que efetuem aquisições intracomunitárias.

28.  O registo dos sujeitos passivos que realizam operações intracomunitárias no sistema VIES apresenta igualmente uma importância incontestável neste contexto. Este sistema visa permitir aos operadores obter a confirmação do número de identificação IVA dos seus parceiros comerciais e às Administrações Fiscais nacionais fiscalizar as operações intracomunitárias e detetar eventuais irregularidades. O referido sistema responde, assim, à exigência, prevista no artigo 27.º do Regulamento n.º 1798/2003 e, a partir de 1 de janeiro de 2012, no artigo 17.º do Regulamento n.º 904/2010, de os EstadosMembros disporem de uma base de dados eletrónica contendo um registo das pessoas a quem atribuíram um número de identificação IVA.

29.   No entanto, nem o artigo 138.º, n.º 1, da Diretiva IVA nem a jurisprudência do Tribunal de Justiça referem, entre os requisitos materiais de uma entrega intracomunitária enumerados exaustivamente, a obrigação de o adquirente dispor de um número de identificação IVA (v., neste sentido, acórdão de 6 de setembro de 2012, MecsekGabona, C273/11, EU:C:2012:547, n.º 59) ou, a fortiori, a obrigação de este estar registado para efeitos da realização de operações intracomunitárias e de estar inscrito no sistema VIES.

30.  Contrariamente ao que os Governos português e polaco alegaram, em substância, perante o Tribunal de Justiça, essas obrigações não podem ser deduzidas do requisito de que o adquirente deve ser um sujeito passivo agindo como tal num EstadoMembro diferente do Estado de partida da expedição ou do transporte dos bens (v., por analogia, acórdão de 27 de setembro de 2012, VSTR,C587/10, EU:C:2012:592, n.º 40).

31.   Com efeito, a definição do sujeito passivo, enunciada no artigo 9.º, n.º 1, da Diretiva IVA, visa apenas uma pessoa que executa, de forma independente e em qualquer lugar, uma atividade económica, seja qual for o fim ou o resultado dessa atividade, sem fazer depender esta qualidade do facto de essa pessoa dispor de um número de identificação IVA (v., neste sentido, acórdão de 27 de setembro de 2012, VSTR,C587/10, EU:C:2012:592, n.º 49 e jurisprudência referida), específico, se for caso disso, para a realização de operações intracomunitárias, ou de a referida pessoa estar registada no sistema VIES. Além disso, resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça que um sujeito passivo age nessa qualidade quando efetua operações no âmbito da sua atividade tributável (v., neste sentido, acórdão de 27 de setembro de 2012, VSTR,C587/10, EU:C:2012:592, n.º 49 e jurisprudência referida).

32.   Por conseguinte, nem a obtenção, pelo adquirente, de um número de identificação IVA válido para a realização de operações intracomunitárias nem o seu registo no sistema VIES constituem requisitos materiais da isenção de IVA de uma entrega intracomunitária. São apenas exigências formais que não podem pôr em causa o direito do alienante à isenção de IVA, na medida em que os requisitos materiais de uma entrega intracomunitária estejam verificados (v., por analogia, acórdãos de 6 de setembro de 2012, MecsekGabona, C273/11, EU:C:2012:547, n.º 60; de 27 de setembro de 2012, VSTR,C587/10, EU:C:2012:592, n.º 51; e de 20 de outubro de 2016, Plöckl,C24/15, EU:C:2016:791, n.º 40).

33.   A este respeito, há que recordar que, na falta de uma disposição concreta na Diretiva IVA quanto às provas que os sujeitos passivos devem fornecer para beneficiarem da isenção de IVA, cabe aos EstadosMembros fixar, em conformidade com o artigo 131.º desta diretiva, os requisitos de isenção das entregas intracomunitárias para garantir a aplicação correta e simples das ditas isenções e prevenir eventuais fraudes, evasões e abusos. Contudo, no exercício dos seus poderes, os EstadosMembros devem respeitar os princípios gerais de direito que fazem parte da ordem jurídica da União (v. acórdãos de 6 de setembro de 2012, MecsekGabona, C273/11, EU:C:2012:547, n.º 36 e jurisprudência referida, e de 9 de outubro de 2014, Traum,C492/13, EU:C:2014:2267, n.º 27).

34.   Segundo jurisprudência do Tribunal de Justiça, uma medida nacional vai além do que é necessário para assegurar a cobrança exata do imposto se fizer depender, no essencial, o direito à isenção de IVA do cumprimento de obrigações formais, sem ter em conta as exigências de fundo e, nomeadamente, sem se interrogar sobre se estas foram respeitadas. Com efeito, as operações devem ser tributadas tomando em consideração as suas características objetivas (acórdão de 20 de outubro de 2016, Plöckl,C24/15, EU:C:2016:791, n.º 37 e jurisprudência referida).

35.  Ora, no que se refere às características objetivas de uma entrega intracomunitária, decorre dos n.ºs 23 a 25 do presente acórdão que se uma entrega de bens cumprir os requisitos previstos no artigo 138.º, n.º 1, da Diretiva IVA, essa entrega está isenta de IVA (v., neste sentido, acórdão de 20 de outubro de 2016, Plöckl,C24/15, EU:C:2016:791, n.º 38 e jurisprudência referida).

36.   Daí decorre que o princípio da neutralidade fiscal exige que a isenção de IVA seja concedida se os requisitos de fundo forem cumpridos, mesmo que os sujeitos passivos tenham negligenciado certas exigências formais (acórdão de 20 de outubro de 2016, Plöckl,C24/15, EU:C:2016:791, n.º 39).

37.  Por conseguinte, a Administração de um EstadoMembro não pode, em princípio, recusar a isenção de IVA de uma entrega intracomunitária pelo simples motivo de o adquirente não estar inscrito no sistema VIES nem se encontrar abrangido por um regime de tributação das aquisições intracomunitárias.

38.  Assim, há que salientar que, segundo jurisprudência do Tribunal de Justiça, apenas existem dois casos em que o desrespeito de uma exigência formal pode implicar a perda do direito à isenção de IVA (v., neste sentido, acórdão de 20 de outubro de 2016, Plöckl,C24/15, EU:C:2016:791, n.º 43).

39.  Por um lado, o princípio da neutralidade fiscal não pode ser invocado, para efeitos da isenção de IVA, por um sujeito passivo que tenha participado intencionalmente numa fraude fiscal que pôs em perigo o funcionamento do sistema comum do IVA (v. acórdão de 20 de outubro de 2016, Plöckl,C24/15, EU:C:2016:791, n.º 44 e jurisprudência referida).

40.  Há que salientar que, segundo a jurisprudência do Tribunal de Justiça, não é contrário ao direito da União exigir que um operador aja de boafé e tome todas as medidas que lhe podem ser razoavelmente exigidas para garantir que a operação que efetua não implica a sua participação numa fraude fiscal (acórdão de 6 de setembro de 2012, MecsekGabona, C273/11, EU:C:2012:547, n.º 48 e jurisprudência referida). Na hipótese de o sujeito passivo em causa saber ou dever saber que a operação que efetuou estava implicada numa fraude cometida pelo adquirente e de não ter tomado todas as medidas razoáveis ao seu alcance para evitar esta fraude, devia serlhe recusado o direito à isenção de IVA (acórdão de 6 de setembro de 2012, MecsekGabona, C273/11, EU:C:2012:547, n.º 54).

41.  No caso vertente, a mera circunstância, invocada pelo órgão jurisdicional de reenvio, de o alienante, por um lado, saber que, no momento das operações, o adquirente não estava registado no sistema VIES nem se encontrava abrangido por um regime de tributação das aquisições intracomunitárias e, por outro, ter a expectativa de que, posteriormente, o adquirente seria registado, de forma retroativa, como operador intracomunitário não pode permitir à autoridade fiscal nacional recusar a isenção de IVA. Com efeito, resulta dos elementos dos autos transmitidos pelo órgão jurisdicional de reenvio e salientados no n.º 20 do presente acórdão que, no caso em apreço, não existia fraude nem evasão fiscal por parte da B… .

42.   Por outro lado, a violação de uma exigência formal pode levar a uma recusa de isenção de IVA se essa violação tiver por efeito impedir a produção da prova incontestável do cumprimento das exigências de fundo (v. acórdão de 20 de outubro de 2016, Plöckl,C24/15, EU:C:2016:791, n.º 46 e jurisprudência referida). 

43.  Neste caso, como resulta, em substância, do n.º 26 do presente acórdão, as questões submetidas assentam na premissa de que os requisitos materiais de uma entrega intracomunitária na aceção do artigo 138.º, n.º 1, da Diretiva IVA estavam preenchidos. Além disso, nenhum elemento dos autos transmitidos ao Tribunal de Justiça indica que a violação da exigência formal em causa no processo principal tenha impedido de concluir que assim era. Todavia, cabe ao órgão jurisdicional de reenvio proceder às verificações necessárias a este respeito.

44.  À luz das considerações precedentes, há que responder às questões submetidas que o artigo 131.º e o artigo 138.º, n.º 1, da Diretiva IVA devem ser interpretados no sentido de que se opõem a que a Administração Fiscal de um Estado-Membro recuse isentar de IVA uma entrega intracomunitária pelo simples motivo de, no momento dessa entrega, o adquirente, sedeado no território do Estado-Membro de destino e titular de um número de identificação IVA válido para as operações nesse Estado, não estar inscrito no sistema VIES nem se encontrar abrangido por um regime de tributação das aquisições intracomunitárias, ainda que não exista nenhum indício sério que sugira a existência de fraude e que esteja demonstrado que os requisitos materiais da isenção estão verificados. Neste caso, o artigo 138.º, n.º 1, da Diretiva IVA, interpretado à luz do princípio da proporcionalidade, opõe-se igualmente a essa recusa quando o alienante tinha conhecimento das circunstâncias que caracterizavam a situação do adquirente tendo em conta a aplicação do IVA e tinha a expectativa de que, posteriormente, o adquirente seria registado, de forma retroativa, como operador intracomunitário.

 

(...)

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Nona Secção) declara:

           

O artigo 131.º e o artigo 138.º, n.º 1, da Diretiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de novembro de 2006, relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado, devem ser interpretados no sentido de que se opõem a que a Administração Fiscal de um EstadoMembro recuse isentar de imposto sobre o valor acrescentado uma entrega intracomunitária pelo simples motivo de, no momento dessa entrega, o adquirente, sedeado no território do EstadoMembro de destino e titular de um número de identificação de imposto sobre o valor acrescentado válido para as operações nesse Estado, não estar inscrito no Sistema de Intercâmbio de Informações sobre o Imposto sobre o Valor Acrescentado nem se encontrar abrangido por um regime de tributação das aquisições intracomunitárias, ainda que não exista nenhum indício sério que sugira a existência de fraude e que esteja demonstrado que os requisitos materiais da isenção estão verificados. Neste caso, o artigo 138.º, n.º 1, desta diretiva, interpretado à luz do princípio da proporcionalidade, opõese igualmente a essa recusa quando o alienante tinha conhecimento das circunstâncias que caracterizavam a situação do adquirente tendo em conta a aplicação do imposto sobre o valor acrescentado e tinha a expectativa de que, posteriormente, o adquirente seria registado, de forma retroativa, como operador intracomunitário.

 

No caso em apreço, é reconhecido pela própria Autoridade Tributária e Aduaneira que «não está em causa nos autos uma qualquer situação de fraude ou evasão fiscal da Requerente» (artigo 26.º da sua alegação).

Por outro lado, a Requerente tinha conhecimento das circunstâncias que caracterizavam a situação do adquirente tendo em conta a aplicação do IVA e tinha a expectativa de que, posteriormente, o adquirente seria registado, de forma retroactiva, como operador intracomunitário, o que veio a acontecer, embora o registo não retroagisse à data em que ocorreram as alienações que estão subjacentes às liquidações impugnadas.

Neste contexto, como se entendeu no acórdão do TJUE, o facto de o adquirente não estar inscrito no VIES (“Sistema de Intercâmbio de Informações sobre o IVA”) nem se encontrar abrangido por um regime de tributação das aquisições intracomunitárias não é fundamento para recusa da isenção.

As liquidações impugnadas tiveram subjacente o entendimento de que apenas constituía obstáculo à aplicação da isenção a falta do último requisito previsto na alínea a) do artigo 14.º do Regime do IVA nas Transacções Intracomunitárias (RITI), de o adquirente se encontrar «abrangido por um regime de tributação das aquisições intracomunitárias de bens», nas datas em que se realizaram as operações subjacentes às correcções efectuadas.

Como se conclui do decidido pelo TJUE, no contexto fáctico referido, este obstáculo à isenção não é compatível com os artigos 131.º e 138.º, n.º 1, da Directiva 2006/112/CE do Conselho, de 28-11-2006.

Assim, em face da supremacia do direito da União Europeia sobre as normas internas nacionais, quando não estejam em causa princípios fundamentais do Estado de direito democrático, conclui-se que as liquidações de IVA impugnadas são ilegais por vício de violação de lei, que justifica a sua anulação, nos termos do artigo 136.º, n.º 1, do Código do Procedimento Administrativo de 1991 (vigente ao tempo em que foram emitidas as liquidações), subsidiariamente aplicável nos termos do artigo 2.º, alínea c), da LGT.

As liquidações de juros compensatórios e as demonstrações de acerto de contas têm como pressuposto as liquidações de IVA, pelo são afectadas pela ilegalidade destas, pelo que também se justifica a sua anulação.

 

 

4. Decisão

 

Termos em que acordam neste Tribunal Arbitral em:

– julgar procedente o pedido de pronúncia arbitral;

–anular as seguintes liquidações de IVA e de juros compensatórios e demonstrações de acerto de contas:

Liquidações de IVA

– n.º…, no montante de € 2.953,74, relativa ao período 1009;

– n.º…, no montante de € 5.755,05, relativa ao período 1010;

– n.º…, no montante de € 14.499,36, relativa ao período 1011;

– n.º…, no montante de € 22.817,64, relativa ao período 1012;

– n.º…, no montante de € 94.390,53, relativa ao período 1110;

– n.º…, no montante de € 84.591,17, relativa ao período 1109;

– n.º…, no montante de € 63.061,83, relativa ao período 1108;

– n.º…, no montante de € 57.693,09, relativa ao período 1107;

– n.º…, no montante de € 49.656,63, relativa ao período 1106;

– n.º…, no montante de € 47.596,85, relativa ao período 1105;

– n.º…, no montante de € 40.894,69, relativa ao período 1104;

– n.º…, no montante de € 45.221,25, relativa ao período 1103;

– n.º…, no montante de € 35.588,32, relativa ao período 1102;

– n.º…, no montante de € 33.023,81, relativa ao período 1101;

– n.º 2013…, no montante de € 5.548,00, relativa ao período 1111, referida na demonstração de acerto de contas n.º 2013…;

– n.º 2013…, no montante de € 42,266,17, relativa ao período 1112, referida na demonstração de acerto de contas n.º 2013…;

– n.º 2013…, no montante de € 35.798,89, relativa ao período 1201, referida na demonstração de acerto de contas n.º 2013…;

– n.º 2013…, no montante de € 259.535,42, relativa ao período 1205, referida na demonstração de acerto de contas n.º 2013…;

– n.º 2013…, no montante de € 193.119.46, relativa ao período 1206, referida na demonstração de acerto de contas n.º 2013…;

– n.º 2013…, no montante de € 193.119.46, relativa ao período 1207, referida na demonstração de acerto de contas n.º 2013…;

– n.º 2013…, no montante de € 150.400,96, relativa ao período 1208, referida na demonstração de acerto de contas n.º 2013…;

– n.º 2013…, no montante de € 122.103,21, relativa ao período 1209, referida na demonstração de acerto de contas n.º 2013…,

– n.º 2013…, no montante de € 184.009,99, relativa ao período 1210, referida na demonstração de acerto de contas n.º 2013…;

– n.º 2013…, no montante de € 60.029,62, relativa ao período 1211, referida na demonstração de acerto de contas n.º 2013…;

– n.º 2013…, no montante de € 102.895,39, relativa ao período 1212, referida na demonstração de acerto de contas n.º 2013…;

 

Liquidações de juros compensatórios

– n.º…, no montante de € 308,16, relativa ao período 1009;

– n.º …, no montante de € 581,50, relativa ao período 1010;

– n.º…, no montante de € 1.415,77, relativa ao período 1011;

– n.º…, no montante de € 2.150,48, relativa ao período 1012;

– n.º…, no montante de € 3.014,67, relativa ao período 1101;

– n.º…, no montante de € 3.123,97, relativa ao período 1102;

– n.º…, no montante de € 3.825,84, relativa ao período 1103;

– n.º…, no montante de € 3.307,43, relativa ao período 1104;

– n.º…, no montante de € 3.703,43, relativa ao período 1105;

– n.º…, no montante de € 3.700,44, relativa ao período 1106;

– n.º…, no montante de € 4.090,68, relativa ao período 1107;

– n.º…, no montante de € 4.277,84, relativa ao período 1108;

– n.º…, no montante de € 5.450,92, relativa ao período 1109;

– n.º…, no montante de € 5.751,36, relativa ao período 1110;

– n.º 2013…, no montante de € 320,41, relativa ao período 1111, referida na demonstração de acerto de contas n.º 2013…;

– n.º 2013…, no montante de € 2.297,42, relativa ao período 1112, referida na demonstração de acerto de contas n.º 2013…;

– n.º 2013…, no montante de € 1.824,27, relativa ao período 1201, referida na demonstração de acerto de contas n.º 2013…;

– n.º 2013…, no montante de € 9.812,57, relativa ao período 1205, referida na demonstração de acerto de contas n.º 2013…;

– n.º 2013…, no montante de € 6.645,42, relativa ao período 1206, referida na demonstração de acerto de contas n.º 2013…;

– n.º 2013…, no montante de € 4.169,91, relativa ao período 1207, referida na demonstração de acerto de contas n.º 2013…;

– n.º 2013…, no montante de € 4.170,02, relativa ao período 1208, referida na demonstração de acerto de contas n.º 2013…;

– n.º 2013…, no montante de € 2.943,85, relativa ao período 1209, referida na demonstração de acerto de contas n.º 2013…;

– n.º 2013…, no montante de € 3.871,77, relativa ao período 12100, referida na demonstração de acerto de contas n.º 2013…;

– n.º 2013…, no montante de € 1.059,15, relativa ao período 12-11, referida na demonstração de acerto de contas n.º 2013…;

– n.º 2013…, no montante de € 1.371,08, relativa ao período 1212, referida na demonstração de acerto de contas n.º 2013… .

 

5. Valor do processo

 

De harmonia com o disposto no art. 306.º, n.º 2, do CPC e 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária fixa-se ao processo o valor de € 1.857.192,76.

 

Lisboa, 16-02-2017

 

Os Árbitros

 

 

(Jorge Manuel Lopes de Sousa)

 

(Emanuel Vidal Lima)

 

 

(Clotilde Celorico Palma)

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

CAAD: Arbitragem Tributária

Processo n.º: 364/2015-T

Tema: IVA – Decisão de Reenvio prejudicial

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Decisão Arbitral

 

 

Os Árbitros Conselheiro Jorge Lopes de Sousa (designado pelos outros Árbitros), Dr. Emanuel Augusto Vidal Lima e Prof.ª Doutora Clotilde Celorico Palma e, designados, respectivamente, pela Requerente e pela Requerida, para formarem o Tribunal Arbitral, constituído em 08-09-2015, acordam no seguinte:

 

 

1. Relatório

 

A..., SUCURSAL EM PORTUGAL (doravante designada por “Impugnante” ou “Requerente”), Pessoa Colectiva com o número de identificação fiscal…, e sede no Núcleo Industrial de…, Lote … a …, … ……, Concelho de…, Distrito de ... (adiante abreviadamente designada por “Requerente”), veio requerer, ao abrigo do disposto nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a) e 10.º, n.º 1, alínea a), do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, doravante “RJAT”), a constituição de Tribunal Arbitral Colectivo com vista à declaração de ilegalidade, e consequente anulação, dos actos tributários de liquidação de Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA) e juros compensatórios, relativos aos anos de 2010, 2011 e 2012, com os n.ºs…, …, …, …, …, …, …, …, …, …, …, …, …, …, …, …, …, …, …, …, …, …, …, … e…; e n.ºs…, …, …, …, …, …, …, …, …, …, …, …, …, …, …, …, …, …, …, …, …, …, …, … e…, tudo no valor global de €1.857.192,76.

A Requerente pretende que seja efectuado reenvio prejudicial ao TJUE, nos termos do artigo 267.º do TFUE, com a consequente suspensão da presente Instância, nos termos do artigo 272.º n.º 1 do CPC.

É Requerida a AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA (AT).

A Requerente designou como Árbitro o Dr. Emanuel Augusto Vidal Lima, ao abrigo do disposto no artigo 6.º, n.º 2, alínea b) do RJAT.

O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD e automaticamente notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira em 16-06-2015.

Nos termos do disposto na alínea b) do n.º 2 do artigo 6.º e do n.º 3 do RJAT, e dentro do prazo previsto no n.º 1 do artigo 13.º do RJAT, o dirigente máximo do serviço da Administração Tributária designou como Árbitro a Prof.ª Doutora Clotilde Celorico Palma.

Os Árbitros designados pelas Partes acordaram em designar o Cons. Jorge Lopes de Sousa como árbitro presidente, que aceitou a designação.

Nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 7 do artigo 11.º do RJAT, o Senhor Presidente do CAAD informou as Partes dessa designação em 24-08-2015.

Assim, em conformidade com o preceituado no n.º 7 artigo 11.º do RJAT, decorrido o prazo previsto no n.º 1 do artigo 13.º do RJAT sem que as Partes nada viessem dizer, o Tribunal Arbitral Colectivo ficou constituído em 08-09-2015.

A Autoridade Tributária e Aduaneira apresentou Resposta, em que se opõe ao pedido de reenvio prejudicial e defende a improcedência do pedido.

Em 09-11-2015, realizou-se a reunião prevista no artigo 18.º do RJAT em que foi produzida prova testemunhal e se decidiu que o processo prosseguisse com alegações escritas sucessivas.

As Partes apresentaram alegações.

O tribunal arbitral foi regularmente constituído e é competente e não foram suscitados obstáculos a apreciação do mérito da causa, embora seja necessário apreciar se é necessário efectuar reenvio prejudicial.

As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias e são legítimas (artigos 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março) e estão devidamente representadas.

O processo não enferma de nulidades.

 

 

 

2. Matéria de facto

 

2.1. Factos provados

 

·          A Requerente é uma sucursal em Portugal de uma entidade holandesa, B…;

·         A Requerente dedica-se à importação, exportação de pneus e comercialização de pneus de diversas marcas para retalhistas em território nacional e em Espanha;

·         A Requerente, em sede de IVA está enquadrada no regime normal de periodicidade mensal;

·         As vendas para o mercado espanhol, estas podem ser efectuadas pela Requerente directamente aos seus clientes ou através da " C…, SL", sociedade comercial constituída em Espanha, que funciona como um distribuidor em Espanha para clientes de menor dimensão;

·         Nas transmissões intracomunitárias de pneus para sujeitos passivos de IVA no mercado espanhol a Impugnante tem vindo a aplicar a isenção de IVA prevista no abrigo do artigo 14.º, alínea a), do Regime do IVA nas Transacções Intracomunitárias (“RITI”).

·         A Requerente foi objecto de um procedimento inspectivo externo, que decorreu sob a ordem de serviço n.º OI2013…, de âmbito parcial em IVA e que incidiu sobre os anos de 2010, 2011 e 2012;

·         Nessa inspecção foi elaborado o Relatório da Inspecção Tributária que consta do documento n.º 3 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido, em que se refere, além do mais, o seguinte:

 III.1.1. -IMPOSTO SOBRE O VALOR ACRESCENTADO

III.1.1.1 - NÃO LIQUIDAÇÃO DE IVA

 III.1.1.1.1 -DESCRIÇÃO DOS FACTOS

Da análise efectuada, constatou-se que a sociedade A…- Sucursal Portugal efetuou transmissões intracomunitárias de bens, isentas de IVA ao abrigo da alínea a) do art.º 14 º do RITI, para diversas entidades espanholas, as quais se encontram nas seguintes condições:

i) C…SL. NIF …- Apenas a partir de 19/03/2013, com efeitos reportados a 01/07/2012. é que se encontra registada para efeitos da realização de operações intracomunitárias (Documento n.º 01);

ii) D…SL, NIF …- Cessada desde 21/06/2012 (Documento n," 02),

iii)E.... NIF: …- Cessado desde 15/12/2010 (Documento n.º03),

iv) F…SL. NIF: …- Cessada desde 14/02/2011 (Documento n.º 04).

v)G…. NIF … - Cessado desde 09/08/2012 (Documento n.º 05)

vi)H…, NIF … - Cessado desde 10/07/2012 (Documento n.º 06),

vii) I…SL. NIF …- Cessada desde 31/08/2012 (Documento n.º 07);

viii)J…, NIF … - Cessado desde 05/09/2012 (Documento n.º 08)

 

A situação irregular em que estas entidades se encontram, inviabiliza que as transmissões efetuadas às mesmas pela sociedade portuguesa A…- Sucursal Portugal, sejam efetuadas ao abrigo da isenção prevista na alínea a) do art.º 14.º do RITI, porquanto os adquirentes não cumprem com o disposto naquele preceito legal, uma vez que uma transmissão de bens só poderá beneficiar da isenção aí prevista, quando estiver reunido um conjunto de condições relativas à operação realizada, ao adquirente e ao transporte dos bens transmitidos, que se passam a enunciar:

a) Estar-se perante uma transmissão de bens, na acepção do art º 3 º do CIVA,

b) O transmitente ser um sujeito passivo do imposto em território nacional, nos termos do art º 2 º do CIVA.

c) O adquirente ser uma pessoa singular ou colectiva devidamente registada para efeitos de IVA num outro Estado membro, encontrar-se abrangido por um regime de tributação das aquisições intracomunitárias de bens, e ter utilizado o número de identificação atribuído pelo Estado membro de registo para efectuar a aquisição:

d) Finalmente os bens serem expedidos ou transportados a partir do território nacional, pelo vendedor, pelo adquirente, ou por conta destes, com destino a outro Estado membro.

Não obstante, nas transmissões intracomunitárias que a sociedade portuguesa A…- Sucursal Portugal efetuou para alguns clientes intracomunitários, por sinal uma delas empresa com ligação ao mesmo grupo, a mesma isentou-as ao abrigo do disposto na al. a) do n.º 1 do art º 14,º do RITl, sem que tenha confirmado a validade do número de identificação fiscal e/ou a sua atribuição a estes seus clientes intracomunitários, bem como a sua situação em termos de efetivo registo para o exercício de atividade, designadamente se os mesmos se encontram cessados ou não se encontram registados para a realização de operações intracomunitárias, já que transmitiu bens para clientes cessados ou para clientes não cessados, mas não registados para a realização de operações intracomunitárias, no respetivo país (Documento n.º 09).

Os valores faturadas a clientes que não se encontram registados para a realização de operações intracomunitárias ou que se encontram cessados, conforme extratos de conta corrente (Documento n.º 10), foram os que a seguir se apresentam.

Período económico de 2010

 

 

Período económico de 2011

 

 

 

Período económico de 2012

 

III.1.1.1.2 -CÁLCULO DO IMPOSTO EM FALTA

Face à legislação e factos mencionados, impõem-se correções respeitantes à falta de liquidação de IVA como se passa a indicar.

Período económico de 2010

 

Período económico de 2011

 

Período económico de 2012

 

111.1.1.1.3-CONCLUSÕES

O imposto em falta, decorrente da não liquidação indevida de imposto nas transmissões intracomunitárias efetuadas pela sociedade portuguesa A…- Sucursal Portugal às entidades espanholas, não registadas ou cessadas para efeitos de realização de operações intracomunitárias, ascende a € 1 881 995.76, conforme se passa a discriminar:

 

 

Pelo que, em sede de IVA, o montante das correcções meramente aritméticas a efectuar ao imposto sobre o valor acrescentado (IVA), nos períodos económicos de 2010, 2011 e 2012, ascendem a respetivamente 46,025.79, 826 800.60 e 1,009,176,27, perfazendo um total de 1,881 995.76.

 

·         Na sequência da inspecção foram emitidas as seguintes liquidações de IVA e de mora:

De IVA

– n.º…, no montante de € 2.953,74, relativa ao período 1009;

– n.º…, no montante de € 5.755,05, relativa ao período 1010;

– n.º…, no montante de € 14.499,36, relativa ao período 1011;

– n.º…, no montante de € 22.817,64, relativa ao período 1012;

– n.º…, no montante de € 94.390,53, relativa ao período 1110;

– n.º…, no montante de € 84.591,17, relativa ao período 1109;

– n.º…, no montante de € 63.061,83, relativa ao período 1108;

– n.º…, no montante de € 57.693,09, relativa ao período 1107;

– n.º…, no montante de € 49.656,63, relativa ao período 1106;

– n.º…, no montante de € 47.596,85, relativa ao período 1105;

– n.º…, no montante de € 40.894,69, relativa ao período 1104;

– n.º…, no montante de € 45.221,25, relativa ao período 1103;

– n.º…, no montante de € 35.588,32, relativa ao período 1102;

– n.º…, no montante de € 33.023,81, relativa ao período 1101;

– n.º…, no montante de € 5.548,00, relativa ao período 1111, referida na demonstração de acerto de contas n.º…;

– n.º…, no montante de € 42,266,17, relativa ao período 1112, referida na demonstração de acerto de contas n.º…;

– n.º…, no montante de € 35.798,89, relativa ao período 1201, referida na demonstração de acerto de contas n.º…;

– n.º…, no montante de € 259.535,42, relativa ao período 1205, referida na demonstração de acerto de contas n.º…;

– n.º…, no montante de € 193.119.46, relativa ao período 1206, referida na demonstração de acerto de contas n.º…;

– n.º…, no montante de € 193.119.46, relativa ao período 1207, referida na demonstração de acerto de contas n.º…;

– n.º…, no montante de € 150.400,96, relativa ao período 1208, referida na demonstração de acerto de contas n.º…;

– n.º…, no montante de € 122.103,21, relativa ao período 1209, referida na demonstração de acerto de contas n.º…,

– n.º…, no montante de € 184.009,99, relativa ao período 1210, referida na demonstração de acerto de contas n.º…;

– n.º…, no montante de € 60.029,62, relativa ao período 1211, referida na demonstração de acerto de contas n.º…;

– n.º…, no montante de € 102.895,39, relativa ao período 1212, referida na demonstração de acerto de contas n.º…;

 

De juros compensatórios

– n.º…, no montante de € 308,16, relativa ao período 1009;

– n.º…, no montante de € 581,50, relativa ao período 1010;

– n.º…, no montante de € 1.415,77, relativa ao período 1011;

– n.º…, no montante de € 2.150,48, relativa ao período 1012;

– n.º…, no montante de € 3.014,67, relativa ao período 1101;

– n.º…, no montante de € 3.123,97, relativa ao período 1102;

– n.º…, no montante de € 3.825,84, relativa ao período 1103;

– n.º…, no montante de € 3.307,43, relativa ao período 1104;

– n.º …, no montante de € 3.703,43, relativa ao período 1105;

– n.º…, no montante de € 3.700,44, relativa ao período 1106;

– n.º…, no montante de € 4.090,68, relativa ao período 1107;

– n.º…, no montante de € 4.277,84, relativa ao período 1108;

– n.º…, no montante de € 5.450,92, relativa ao período 1109;

– n.º…, no montante de € 5.751,36, relativa ao período 1110;

– n.º…, no montante de € 320,41, relativa ao período 1111, referida na demonstração de acerto de contas n.º…;

– n.º…, no montante de € 2.297,42, relativa ao período 1112, referida na demonstração de acerto de contas n.º…;

– n.º…, no montante de € 1.824,27, relativa ao período 1201, referida na demonstração de acerto de contas n.º…;

– n.º…, no montante de € 9.812,57, relativa ao período 1205, referida na demonstração de acerto de contas n.º…;

– n.º…, no montante de € 6.645,42, relativa ao período 1206, referida na demonstração de acerto de contas n.º…;

– n.º…, no montante de € 4.169,91, relativa ao período 1207, referida na demonstração de acerto de contas n.º…;

– n.º…, no montante de € 4.170,02, relativa ao período 1208, referida na demonstração de acerto de contas n.º…;

– n.º…, no montante de € 2.943,85, relativa ao período 1209, referida na demonstração de acerto de contas n.º…;

– n.º…, no montante de € 3.871,77, relativa ao período 12100, referida na demonstração de acerto de contas n.º…;

– n.º…, no montante de € 1.059,15, relativa ao período 12-11, referida na demonstração de acerto de contas n.º…;

– n.º…, no montante de € 1.371,08, relativa ao período 1212, referida na demonstração de acerto de contas n.º….

·         A Requerente regularizou voluntariamente a sua situação tributária relativamente às correcções propostas, com referência aos clientes espanhóis que haviam cessado a sua actividade (designadamente, D…, S.L., E…, F…, S.L., G…, H…, I…S.L. e J…), pagando a quantia de € 107.844,91 (documento n.º 5 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);

·         Em 27-01-2014, a Requerente deduziu reclamação graciosa das liquidações, que teve o n.º … na Direcção de Finanças de …e veio a ser indeferida por despacho de 20-05-2014;

·         Em 26-6-2014, a Requerente interpôs recurso hierárquico da decisão de indeferimento da reclamação graciosa, que veio a ser indeferido por despacho de 26-02-2015, que consta do documento n.º 1 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido, em que se refere, além do mais, o seguinte:

 2 - Apreciação do Recurso Hierárquico

34. A questão controvertida resume-se a saber se, para efeitos da isenção de imposto prevista na al. a) do art.º 14.º do RITI, é exigível que o adquirente dos bens com sede noutro Estado membro esteja registado no VIES.

35. A Recorrente entende que não, bastando que o adquirente seja um sujeito passivo de IVA e possua um número de identificação válido, para efeitos do imposto, através do qual proceda à aquisição dos bens, conforme entende ser o regime instituído pela Diretiva IVA.

36. Ou, ainda que não seja sujeito passivo do imposto, esteja o adquirente "abrangido por um regime de tributação das aquisições intracomunitárias de bens", devendo ser esse o sentido da al. a) do art.º 14.º do RITI.

37. Da análise da al. a) do art.º 14.º do RITI resulta que, no que concerne à qualidade do adquirente, a transmissão intracomunitária de bens só está isenta se se tratar de uma pessoa singular ou coletiva: (i) registada para efeitos do imposto sobre o valor acrescentado em outro Estado membro; (ii) tenha utilizado o respetivo número de identificação fiscal para efetuar a aquisição; e (iii) aí se encontre abrangido por um regime de tributação das aquisições intracomunitárias de bens.

38. No caso em apreço, a adquirente C…SL, apesar de se encontrar registada em Espanha para efeitos do imposto, não se encontrava, nesse país, abrangida por um regime de tributação das aquisições intracomunitárias de bens, não estando registada no VIES. O registo no VIES só foi efetivado em 2013-03-19, com efeitos reportados a 2012-07-01.

39. A Recorrente começa por invocar que este último requisito da lei portuguesa, da inclusão num regime de tributação das aquisições intracomunitárias de bens, constitui uma transposição abusiva da Diretiva IVA, defendendo uma interpretação segundo a qual só seria aplicável em situações excecionais em que o adquirente não é um sujeito passivo.

40. No entanto, a lei portuguesa é absolutamente clara no sentido da isenção depender da circunstância do sujeito passivo se encontrar "abrangido por um regime de tributação das aquisições intracomunitárias de bens", não se afigurando qualquer possibilidade, atentos os seus termos literais, da norma ser interpretada nos termos preconizados na petição de recurso.

41. Muito menos essa interpretação ou a desnecessidade do apontado registo resultam do preâmbulo do Decreto-Lei n.º 290/92, de 28 de dezembro, o qual procede à aprovação do RITI. Aliás, como é sabido, as considerações preambulares não têm caráter normativo, podendo eventualmente servir para efeitos clarificativos de normas contidas no articulado do diploma legislativo.

42. Por outro lado, como decorre do n.º 2 do art.º 265.º da Constituição da República Portuguesa, "os órgãos e agentes administrativos estão subordinados à Constituição e à lei", estando vinculados ao princípio da legalidade, no qual se funda o Estado português, de acordo com o n.º 2 do art.º 3.º da lei fundamental.

43. Significa isto que não compete aos agentes administrativos, no exercício dessas funções, aferir se as leis estão em conformidade com a Constituição ou com diplomas a que tais leis se devem subordinar, como é o caso da Diretiva IVA. Pelo contrário, numa situação em que o sentido da lei não oferece qualquer dúvida, como é aquela em apreço, a Administração Pública está vinculada à aplicação da lei.

44. Assim sendo, não seria no âmbito deste recurso hierárquico, ou de qualquer outro procedimento administrativo, que a Recorrente obteria acolhimento à sua perspetiva de que a transposição da Diretiva não foi corretamente efetuada, em seu desfavor.

45. De facto, apenas em caso de dúvidas interpretativas a interpretação da norma nacional pode ser efetuada em conformidade com a Diretiva IVA. Porém, como exposto, tal não se verifica no caso em apreço, atenta a clarividência da al. a) do art.º 14.º do RITI.

46. Por outro lado, deve referir-se que o n.º 1 do art.º 138.º da Diretiva parece limitar-se a enunciar o princípio da isenção de imposto na transmissão intracomunitária de bens, sem cuidar de especificar as condições em que essa isenção é aplicada.

47. Como resulta do despacho recorrido, de acordo com o art.º 131.º da Diretiva, tais condições são "fixadas pelos Estados-Membros a fim de assegurar a aplicação correcta e simples das referidas isenções e de evitar qualquer possível fraude, evasão ou abuso".

48. Na realidade, o TJUE tem afirmado recorrentemente que o Direito Comunitário não impõe obrigações específicas quanto aos requisitos aplicáveis à isenção e, mais do que isso, remete para as instâncias judiciais dos Estados membros a aferição do cumprimento pelos sujeitos passivos das obrigações em matéria de prova prevista na sua legislação interna.

49. Nesse sentido, por exemplo, o acórdão de 2012-09-06, proc. n.º C-273-11, no qual se declarou, na conclusão, que "o artigo 138.º, n.º 1, da Diretiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de novembro de 2006, relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado, conforme alterada pela Diretiva 2010/88/UE do Conselho, de 7 de dezembro de 2010, deve ser interpretado no sentido de que não se opõe a que, em circunstâncias como as que estão em causa no processo principal, o direito à isenção de uma entrega intracomunitária seja recusado ao vendedor, caso se conclua, à luz de elementos objetivos, que este não cumpriu as obrigações que lhe incumbem em matéria de prova (...).

50. Ora, é através da inclusão no VIES que um sujeito passivo de outro Estado membro se declara destinatário de aquisições intracomunitárias, sendo tais operações tributadas no destino e não na origem, por via da aplicação da isenção na transmissão intracomunitária.

51. Assim sendo, a necessidade de inclusão no VIES para efeitos da isenção da transmissão intracomunitária afigura-se como um mecanismo imprescindível com vista à prevenção e combate à fraude e evasão fiscais, assegurando-se, juntamente com os demais requisitos plasmados na al. a) do art.º 14.º do RITI, que a isenção só tem aplicação em situações em que está garantida a tributação no destino.

52. O que significa que a obrigatoriedade de inclusão do adquirente no VIES, tal como consta na al. a) do art.º 14.º do RITI, como condição para a isenção da transmissão intracomunitária, parece encontrar plena legitimidade no âmbito da margem de livre atuação dos Estados membros prevista no art.º 131.º da Diretiva, a qual se encontra direcionada aos objetivos da aplicação correia e simples das isenções e da prevenção de fraude, evasão e abusos.

53. De facto, o registo no VIES não configura qualquer entrave a simplicidade do regime de isenção, sendo, porém, fundamental para os objetivos de prevenção e fiscalização da fraude e evasão fiscais. Sendo de conhecimento generalizado que a isenção das transmissões intracomunitárias é, no regime comunitário do imposto, das soluções mais propensas à fuga e criminalidade fiscais.

54. Desta forma, circunscrevendo-se os requisitos previstos na al. a) do art.0 14.º do RITI aos objetivos previstos no art.º 131.º da Diretiva, condição exigida pela jurisprudência a este respeito emanada do TJUE, parece não existir qualquer problema de conformidade com o Direito Comunitário, encontrando-se acautelados, designadamente, os princípios da proporcionalidade e da segurança jurídica.

55. Não estão aqui em causa exigências formais acessórias ou instrumentais para a aplicação da isenção, mas, pelo contrário, um requisito fundamental para o regular funcionamento do regime de tributação das transmissões intracomunitárias de bens.

56. Posto isto, aplicando a al. a) do art.º 14.º do RITI à situação em apreço, nada há a apontar â atuação da Inspeção Tributária, sendo jurisprudência do STA que só serão isentas de IVA as transmissões de bens efetuadas por um sujeito passivo para outro Estado membro, desde que, cumulativamente:

1 - a transmissão de bens seja efectuada por um sujeito passivo dos referidos na alínea a) do nº 2 do artº 2º isto é que se encontre abrangido no país de origem por um regime de tributação das aquisições intracomunitárias de bens;

2 - o adquirente seja uma pessoa singular ou colectiva registada para efeitos do IVA noutro Estado membro;

3 - o adquirente utilize o respectivo número de identificação para efectuar a aquisição;

4 - e se encontre abrangido por um regime de tributação das aquisições intracomunitárias de bens nesse outro Estado membro.

57. Como decorre dos acórdãos do Tribunal Central Administrativo Sul (TCAS), de 2006-02-14, processo n.º 01000/06 e de 2006-02-21, processo n.º 00902/05, "se o sujeito activo da operação só se preocupa com a existência de um número (qualquer que seja) e não averigua se o adquirente se encontra abrangido por um regime de tributação das aquisições intracomunitárias de bens (Art.º 14/a, RITI, parte final) só cumpre metade da regra, sujeitando-se a tomar por isenta uma operação que o não é".

58. Sendo que, como reconhecido no articulado, a Recorrente tinha conhecimento que a adquirente não se encontrava abrangida por um regime de tributação das aquisições intracomunitárias de bens em Espanha, alegando uma expectativa que lhe fosse outorgado um registo com efeitos a momento anterior ao da realização das transmissões em causa.

59. De referir ainda que a apreciação do cumprimento dos requisitos citados tem caráter estritamente objetivo. Isto é, a isenção é aplicada se estiverem verificados, independentemente do que seja o entendimento dos intervenientes acerca da sua verificação e dos termos apostos nos documentos comerciais que titulem essas operações.

60. Essa objetividade dos requisitos da al. a) do art.º 14.º do RITI tem sido confirmada pela jurisprudência nacional, podendo indicar-se as seguintes ilações dela decorrente:

• "A boa fé da impugnante parece inquestionável, e a Fazenda Pública nem sequer a põe em causa. Mas falar-se de boa fé é, neste caso, deslocar o problema, porque a questão está em saber sé a operação é ou não isenta, ou dito de outro modo, se reúne ou não os requisitos previstos no artigo 14 RITI. E não reúne, como se viu".

• "Ainda que se admita que a impugnante tenha atuado de boa fé, decorrente da aparência que revestiram os factos tendo em conta a garantia prestada pela "…" ao negócio e n. º que lhe foi fornecido pela adquirente espanhola, a questão está apenas em saber se a operação é ou não isenta, ou dito de outro modo, se reúne ou não os requisitos previstos no artigo 14 RITI".

61. Aliás, repete-se, a Recorrente tinha conhecimento que a adquirente não estava registada no VIES e, como tal, não podia desconhecer que não se encontravam reunidos todos os requisitos da al. a) do art.º 14.º do RITI.

62. Ainda assim, aplicou a isenção aí prevista, na expectativa de que o registo no VIES fosse admitido com efeitos anteriores à data da realização das transmissões intracomunitárias, o que não se verificou.

63. Não pode, atentos estes factos, ser considerada de boa fé, uma vez que só está de boa fé quem, com base em factos objetivamente considerados, age na convicção de que os requisitos da isenção estão cumpridos quando, na realidade, não estão. Pelo contrário, a Recorrente sabia que à data da realização das transmissões não tinha condições para aplicar a isenção plasmada no RITI, mas tinha expetativas que essa situação viesse a ser retificada com efeitos retroativos.

64. E, na verdade, a isenção seria aplicada se o Estado espanhol tivesse admitido o registo no VIES com efeitos anteriores à realização das transmissões intracomunitárias. Essa decisão contrária aos interesses da Recorrente não é da responsabilidade do Estado português, não cabendo à AT pronunciar-se sobre a sua legalidade ou imiscuir-se nas razões que a determinaram.

65. No entanto, não pode a AT deixar de extrair as devidas conclusões dessa decisão das autoridades espanholas, o que passa por concluir que, efetivamente, à data da realização das transmissões intracomunitárias que originaram as correções de imposto a Recorrente não se encontrava abrangida por um regime de tributação das aquisições intracomunitárias de bens em Espanha.

66. Assim, a eventual ilegalidade da decisão das autoridades espanholas em desfavor da Recorrente encontra-se pendente de apreciação nos tribunais espanhóis, não podendo ser imputada à atuação da Administração Fiscal portuguesa. Aliás, a exigência de registo no VIÉS está longe de ser uma especificidade do ordenamento jurídico português.

67. A confirmar-se a pretensão da Recorrente no sentido do registo dever ser considerado com efeitos reportados a momento anterior ao da realização das transmissões intracomunitárias, a exigida liquidação de imposto no Estado de origem dos bens constituirá um dano decorrente da prática desse ato administrativo praticado pelo Estado espanhol, eventualmente ressarcível em sede de responsabilidade civil extracontratual, o que é reforçado pela circunstância da AT, apesar da argumentação contrária, ter recusado a isenção de imposto nessas circunstâncias.

V - DIREITO DE AUDIÇÃO

68. Como resulta das instruções administrativas constantes da Circular n.º 13/99, de 1999-07-08, da Direção de Serviços de Justiça Tributária, al. a) do n.º 3, o direito de audição pode ser dispensado "quando, a administração tributária, apenas, aprecie os factos que lhe foram dados pelo contribuinte, limitando-se na sua decisão a fazer a interpretação das normas legais aplicáveis ao caso; Encontram-se nesta situação todas as decisões sobre petições, requerimentos, reclamações e recursos em que a administração se limita a concluir, face aos factos e argumentos invocados pelo contribuinte e a lei aplicável, pela improcedência da sua pretensão".

69. Na situação em apreço não há lugar ao direito de participação da Recorrente, por força do determinado nesta al. a) do n.º 3 da Circular n.º 13/99, porque a apreciação limitou-se aos factos conhecidos, aplicando as normas legais ao caso. No fundo, não existiu propriamente uma fase de instrução do processo e é a instrução do processo que dá origem ao direito de audição, como decorre do n.º 1 do art.º 100.º do Código do Procedimento Administrativo, o qual tem sido considerado aplicável ao procedimento tributário por via da al. c) do art.º 2.º da LGT.

VI - CONCLUSÃO

70. Em conclusão, sem que haja lugar a audição prévia da Recorrente, propõe-se o indeferimento do recurso hierárquico interposto do despacho do Diretor de Finanças de…, de 2014-05-20, que indeferiu a reclamação graciosa …2014…, relativa a liquidações de IVA, demonstrações de acerto de contas e juros compensatórios referentes aos períodos de 2010-09 a 2012-12, nos valores de € 1.881.995,7630 e € 83.041,91, respetivamente.

 

·         Os pneus que no Relatório da Inspecção Tributária se refere terem sido objecto de operações realizadas com a C…, SL, foram expedidos para o território espanhol;

·         A C…SL, encontrava-se registada em Espanha para efeitos de IVA, com o n.º…, desde Junho de 2010 (artigo 9.2. das alegações da Autoridade Tributária e Aduaneira);

·         Em todas as vendas efectuadas pela Requerente à C…SL, o número …foi indicado nas respectivas facturas;

·         C…SL não se encontrava, em Espanha, abrangida um regime de tributação das aquisições intracomunitárias de bens, só passando a estar registada no VIES em 19-03-2013, com efeitos reportados a 01-07-2012;

·         No momento das vendas efectuadas, a Requerente sabia que a C… SL ainda não se encontrava registada como operador intracomunitário, mas tinha conhecimento de que esta empresa tinha a qualidade de sujeito passivo de imposto e tinha a expectativa de que o registo como operador intracomunitário lhe viesse a ser concedido, de forma retroactiva, por parte das autoridades fiscais espanholas (artigo 210.º do pedido de pronúncia arbitral);

·         A C…SL apresentou declarações recapitulativas de operações intracomunitárias com a Requerente no 3.º trimestre de 2010 e no 2.º trimestre de 2012 (documento n.º 11 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);

·         A Requerente incluiu o número fiscal da C… SL nas declarações recapitulativas relativas aos períodos 2010/09, 2012/04, 2012/05 e 2012/06 (documento n.º 11 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);

·         A Autoridade Tributária e Aduaneira entendeu que não está em causa nos autos uma qualquer situação de fraude ou evasão fiscal da Requerente (artigo 26.º das alegações da Autoridade Tributária e Aduaneira);

·         Em 05-06-2015, a Requerente apresentou o pedido de pronúncia arbitral que deu origem ao presente processo.

 

 

2.2. Factos não provados

 

2.3. Fundamentação da decisão da matéria de facto

 

Os factos dados como provados com base nos documentos juntos com o pedido de pronúncia arbitral e no processo administrativo e na prova testemunhal.

A testemunha inquirida aparentou depor com isenção e com conhecimento dos factos que referiu.

 

3. Matéria de direito

 

A Requerente aceitou as correcções efectuadas pela Autoridade Tributária e Aduaneira relativamente a adquirentes de pneus que tinham cessado a sua actividade, discutindo no presente processo apenas as correcções efectuadas relativamente às operações realizadas com a C…SL.

Esta empresa, encontrava-se registada em Espanha para efeitos do imposto, mas não se encontrava, nesse país, abrangida um regime de tributação das aquisições intracomunitárias de bens, não estando registada no VIES, só sendo o registo no VIES efectivado em 19-03-2013, com efeitos reportados a 01-07-2012.

A Autoridade Tributária e Aduaneira entendeu não se verificar em relação à C…, SL, o último requisito previsto na alínea a) do artigo 14.º do Regime do IVA nas Transacções Intracomunitárias (RITI), de o adquirente se encontrar «abrangido por um regime de tributação das aquisições intracomunitárias de bens», nas datas em que se realizaram as operações subjacentes às correcções efectuadas, pelo que entendeu que a Requerente não podia beneficiar da isenção prevista nesta norma.

O artigo 14.º alínea a), do Regime do IVA nas Transacções Intracomunitárias (RITI), estabelece o seguinte:

 

Artigo 14.º

Isenções nas transmissões

Estão isentas do imposto:

a) As transmissões de bens, efectuadas por um sujeito passivo dos referidos na alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º, expedidos ou transportados pelo vendedor, pelo adquirente ou por conta destes, a partir do território nacional para outro Estado membro com destino ao adquirente, quando este seja uma pessoa singular ou colectiva registada para efeitos do imposto sobre o valor acrescentado em outro Estado membro, que tenha utilizado o respectivo número de identificação para efectuar a aquisição e aí se encontre abrangido por um regime de tributação das aquisições intracomunitárias de bens;

 

A Requerente entende, em suma, que este artigo 14.º alínea a), do RITI consubstancia uma transposição incorrecta da Directiva n.º 2006/112/CE do Conselho, de 28-11-2006, designadamente do seu artigo 138.º, n.º 1, que estabelece o seguinte:

Artigo 138.º

 

1. Os Estados–Membros isentam as entregas de bens expedidos ou transportados, para fora do respectivo território mas na Comunidade, pelo vendedor, pelo adquirente ou por conta destes, efectuadas a outro sujeito passivo ou a uma pessoa colectiva que não seja sujeito passivo agindo como tal num Estado-Membro diferente do Estado de partida da expedição ou do transporte dos bens.

 

Defende a Requerente que o primeiro requisito imposto pelo artigo 14.º, alínea a), do RITI, que é a utilização do respectivo número de identificação para efectuar a aquisição, apesar de não estar referido no artigo 138.º da Directiva n.º 2006/112/CE, tem suporte no seu artigo 226.º, n.º 4), ao estabelecer como uma das menções obrigatórias nas facturas, para efeitos do IVA, «o número de identificação para efeitos do IVA do adquirente ou destinatário, referido no artigo 214.º, ao abrigo do qual foi efectuada uma entrega de bens ou uma prestação de serviços pela qual aquele seja devedor do imposto ou uma entrega de bens referida no artigo 138.º».

Mas, segundo a Requerente, o segundo requisito imposto pelo RITI (o enquadramento do adquirente, no Estado-membro de aquisição, num regime de tributação das aquisições intracomunitárias de bens) verifica-se que não encontra paralelo na Directiva do IVA, e constitui uma imposição de natureza formal fixada, de forma inovadora, pelo Estado Português.

Assim, a Requerente entende que, para que se aplique a isenção do IVA, consagrada no artigo 138.º da Directiva IVA, basta a comprovação de que o adquirente é um sujeito passivo do IVA que utiliza o seu número de identificação fiscal para realizar a operação e que a verificação dos números de identificação no VIES não é necessária para justificar a isenção em causa, pelo que não é exigível, à face do princípio da proporcionalidade.

A Requerente defende que, em caso de dúvida se deve efectuar reenvio prejudicial para o TJUE.

 

3.1. Reenvio  prejudicial

 

Os artigos 131.º e 138.º, n.º 2, alínea a), da Directiva n.º 2006/112/CE do Conselho, de 28-11-2006, estabelecem o seguinte:

 

Artigo 131.º

As isenções previstas nos Capítulos 2 a 9 aplicam-se sem prejuízo de outras disposições comunitárias e nas condições fixadas pelos Estados–Membros a fim de assegurar a aplicação correcta e simples das referidas isenções e de evitar qualquer possível fraude, evasão ou abuso.

 

Artigo 138.º

 

1. Os Estados–Membros isentam as entregas de bens expedidos ou transportados, para fora do respectivo território mas na Comunidade, pelo vendedor, pelo adquirente ou por conta destes, efectuadas a outro sujeito passivo ou a uma pessoa colectiva que não seja sujeito passivo agindo como tal num Estado-Membro diferente do Estado de partida da expedição ou do transporte dos bens.

 

O artigo 14.º, alínea a), do Regime do IVA nas Transacções Intracomunitárias (RITI) estabelece o seguinte:

 

Artigo 14.º

Isenções nas transmissões

Estão isentas do imposto:

a) As transmissões de bens, efectuadas por um sujeito passivo dos referidos na alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º, expedidos ou transportados pelo vendedor, pelo adquirente ou por conta destes, a partir do território nacional para outro Estado membro com destino ao adquirente, quando este seja uma pessoa singular ou colectiva registada para efeitos do imposto sobre o valor acrescentado em outro Estado membro, que tenha utilizado o respectivo número de identificação para efectuar a aquisição e aí se encontre abrangido por um regime de tributação das aquisições intracomunitárias de bens;.

 

            Impende sobre o legislador, como criador das normas, mas também sobre o intérprete e sobre o julgador, enquanto fiscalizadores da boa aplicação do Direito, a responsabilidade de escrutinar minuciosamente a admissibilidade das normas nacionais, e, entre elas, as fiscais, por forma a que os Estados membros prossigam os objectivos elencados no Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE).

           Como tem sido pacificamente entendido pela jurisprudência e é corolário da obrigatoriedade de reenvio prejudicial prevista no artigo 267.º do TFUE (que substituiu o artigo 234.º do Tratado de Roma, anterior artigo 177.º), a jurisprudência do TJUE tem carácter vinculativo para os Tribunais nacionais, quando tem por objecto questões conexas com o Direito da União Europeia (neste sentido, podem ver-se os seguintes Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo: de 25-10-2000, processo n.º 25128, publicado em Apêndice ao Diário da República de 31-1-2003, p. 3757; de 7-11-2001, processo n.º 26432, publicado em Apêndice ao Diário da República de 13-10-2003, p. 2602; de 7-11-2001, processo n.º 26404, publicado em Apêndice ao Diário da República de 13-10-2003, p. 2593).

Quando se suscita uma questão de interpretação e aplicação de Direito da União Europeia, os tribunais nacionais devem questionar o TJUE através da figura do reenvio prejudicial.

            Contudo, quando a interpretação do Direito da União Europeia resulta já do chamado acquis jurisprudencial torna-se desnecessário proceder a essa consulta. Assim, no Caso CILFIT, o TJUE concluiu que não há que fazer o reenvio prejudicial quando a questão for impertinente, quando a lei comunitária seja clara e quando já haja um precedente na jurisprudência europeia (Acórdão de 6 de Outubro de 1982, Caso Cilfit, Proc. 283/81, Recueil, p. 3415). Isto é, os tribunais nacionais podem decidir a questão sem reenviar para o TJUE quando decisões anteriores deste Tribunal já tenham tratado do aspecto jurídico em causa, independentemente dos procedimentos que conduziram a tais decisões. Até mesmo quando as questões em apreço não sejam estritamente idênticas (doutrina do acto aclarado) e quando a correcta aplicação do Direito da União Europeia seja tão óbvia que não deixe campo para qualquer dúvida razoável no que toca à forma de resolver a questão de DUE suscitada (doutrina do acto claro) (idem, n.º14).

              Todavia, na situação controvertida está em causa a interpretação de uma norma do Direito da União Europeia sobre a qual existem fundadas dúvidas interpretativas.

Ora, não se conhece jurisprudência do TJUE que decida de forma clara sobre as questões essenciais que são colocadas no presente processo.

O TJUE tem pacificamente admitido reenvio prejudicial em processos arbitrais tributários (como se vê pelo acórdão de 11-06-2015, proferido no processo n.º C-256/14).

Assim, não havendo possibilidade de recurso relativamente às questões colocadas, é de entender que é obrigatório o reenvio prejudicial, à face do preceituado no artigo 267.º do TFUE, que estabelece que «sempre que uma questão desta natureza seja suscitada em processo pendente perante um órgão jurisdicional nacional cujas decisões não sejam susceptíveis de recurso judicial previsto no direito interno, esse órgão é obrigado a submeter a questão ao Tribunal».

Nestes termos, formulam-se as seguintes questões em

 

Reenvio prejudicial

 

i)   Os artigos 131.ºe 138.°, n.º 1, da Directiva n.º 2006/112 devem ser interpretados no sentido de que se opõem a que a Administração Fiscal de um Estado-Membro recuse conceder uma isenção de IVA numa entrega intracomunitária, a um alienante sedeado nesse Estado-Membro, por o adquirente, sedeado noutro Estado-Membro, não se encontrar registado no VIES nem estar aí abrangido por um regime de tributação das aquisições intracomunitárias de bens, embora disponha, no momento da transacção, de um número de identificação válido, para efeitos de IVA, nesse outro Estado-Membro, número esse que foi utilizado nas facturas das transacções, quando os requisitos materiais de uma entrega intracomunitária estejam cumulativamente verificados, isto é, quando o direito de dispor do bem como proprietário tenha sido transferido para o adquirente e o fornecedor prove que esse bem foi expedido ou transportado para outro Estado-Membro e que, na sequência dessa expedição ou desse transporte, o mesmo saiu fisicamente do território do Estado-Membro de entrega para um adquirente sujeito passivo ou pessoa colectiva agindo como tal num Estado-Membro que não o de partida dos bens?

ii) O princípio da proporcionalidade opõe-se a uma interpretação do artigo 138.º, n.º 1, da Directiva n.º 2006/112/CE no sentido de a isenção ser recusada numa situação em que um alienante sedeado num Estado-Membro, sabia que o adquirente, sedeado noutro Estado-Membro, apesar de ser titular de número identificação válido, para efeitos de IVA, nesse outro Estado-Membro, não se encontrava registado no VIES nem estava aí abrangido por um regime de tributação das aquisições intracomunitárias de bens, mas tinha a expectativa de que o registo como operador intracomunitário lhe viesse a ser concedido, de forma retroactiva?

 

Termos em que acordam em suspender a instância até à pronúncia do Tribunal de Justiça da União Europeia sobre as questões referidas, ordenando-se a passagem de carta, a dirigir pela secretaria do CAAD à daquele, com pedido de decisão prejudicial, acompanhado de traslado do processo, incluindo cópias do presente acórdão, do pedido de pronúncia arbitral, da resposta a Autoridade Tributária e Aduaneira e das alegações das Partes, bem como cópia do processo administrativo e dos documentos juntos com as peças processuais.

 

Lisboa, 30-11-2015

 

Os Árbitros

 

 

(Jorge Manuel Lopes de Sousa)

 

 

(Emanuel Vidal Lima)

 

 

 

 

(Clotilde Celorico Palma)

 

 

 

 



[1]              Neste sentido, podem ver-se os seguintes Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo: de 25-10-2000, processo n.º 25128, publicado em Apêndice ao Diário da República de 31-1-2003, p. 3757; de 7-11-2001, processo n.º 26432, publicado em Apêndice ao Diário da República de 13-10-2003, p. 2602; de 7-11-2001, processo n.º 26404, publicado em Apêndice ao Diário da República de 13-10-2003, p. 2593.