Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 299/2023-T
Data da decisão: 2023-11-30  IVA  
Valor do pedido: € 8.678.659,00
Tema: IVA- Direito à dedução por holdings mistas.
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SUMÁRIO:

 

1. As despesas gerais relativas a prestações de serviços de consultoria e assessoria jurídica, contabilística e financeira, de administração e gestão, entre outras, incorridas por sociedades holding mistas são abrangidas pelo exercício do direito à dedução desde que relacionadas com o exercício da sua atividade.

 

2. As sociedade holding mistas podem aplicar o método do prorata, devendo determinadas atividades que não conferem direito à dedução, ser excluídas do denominador da fração que serve de base ao cálculo, nomeadamente o recebimento de dividendos distribuídos pelas filiais e também os juros cobrados relativamente a empréstimos a participadas, neste caso, quando sejam considerados operações acessórias.

 

 

 

DECISÃO ARBITRAL

 

 

Os Árbitros Professor Doutor Rui Duarte Morais (Árbitro-Presidente), Professora Doutora Clotilde Celorico Palma (Árbitra Vogal Relatora) e Dr. José Joaquim Monteiro Sampaio e Nora (Árbitro Vogal), designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa para formarem o Tribunal Arbitral, acordam no seguinte:

 

I. Relatório


1. A... Holding, S.A., (de ora em diante A... ou Requerente) Pessoa Coletiva n.º..., com sede na Rua ... N.º..., ...... Porto vem, nos termos do disposto nos termos do disposto nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a) e 15.º e seguintes do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (doravante RJAT), artigo 99.º e seguintes do Código de Procedimento e de Processo Tributário (doravante CPPT), apresentar pedido de constituição de Tribunal Arbitral, solicitando, relativamente aos atos tributários de autoliquidação de Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA) referentes aos períodos respeitantes ao último trimestre de 2021 e segundo trimestre de 2022, a anulação parcial dos mesmos, no montante total de € 86 786.59 (oitenta e seis mil, setecentos e oitenta e seis euros e cinquenta e nove cêntimos). Solicitam ainda o pagamento dos correspondentes juros indemnizatórios vencidos a partir do indeferimento do procedimento de reclamação graciosa.

 

2. Fundamentando estes pedidos a Requerente alegou, em resumo, que não restam dúvidas de que incorreu nos períodos em apreço em despesas gerais que devem ser dedutíveis em IVA.

 

3. Nestes termos, vem estribar o seu pedido, em linhas gerais, nos seguintes factos e entendimentos:

a) A Requerente é uma sociedade privada de direito português, que, para além de ter uma função de detenção e gestão de participações sociais, desempenha uma atividade de prestação de diversos serviços técnicos e especializados às suas participadas, tais como serviços de apoio à administração e gestão (cfr. Doc. n.º 5).

b) A Requerente configura-se como uma holding mista ou ativa, no sentido em que não se limita à atividade de gestão das participações e a fruir passivamente dos lucros que advenham dessa gestão, prestando também diversos serviços de apoio às subsidiárias que são sujeitos a IVA,

c) A Requerente encontra-se enquadrada, para efeitos do IVA, no regime normal de periodicidade trimestral, configurando-se como um sujeito passivo misto, pois realiza, simultaneamente, atividades que são tributadas em sede de IVA – prestação de serviços a participadas – e outras que não são tributadas ou que se encontram fora do escopo do imposto – gestão de participações sociais.

c) Deduziu Reclamação Graciosa contra atos de Autoliquidação de Imposto sobre o Valor Acrescentado (“IVA”) (cfr. Docs. n.º 1 e 2) apurado por respeito ao período de tributação do último trimestre de 2021 e segundo trimestre de 2022, (cfr. Docs. n.º 3 e 4), e, não tendo sido notificada de decisão desse procedimento dentro do prazo legal previsto no artigo 57.º n.º 1 da Lei Geral Tributária, vem, contra as aludidas liquidações e decisão de indeferimento tácito, deduzir o presente pedido.

d) Estes serviços são prestados tendo por base contratos celebrados entre a Requerente e as suas participadas - em concreto os contratos que sustentam o seguinte:

I - Prestação de serviços de apoio à administração e gestão entre a A... e a B..., S.A.

No âmbito deste contrato, a A... obriga-se a prestar os seguintes serviços: a. Representação institucional da globalidade do grupo; b. Orientação estratégica do negócio; c. Apoio à administração e gestão. Este contrato foi celebrado em 2013 e ainda se encontra em vigor com os devidos aditamentos formalizados a 1 de janeiro de 2022 – vide Doc. n.º 6;

II - Prestação de serviços de apoio à administração e gestão entre a A... e a C..., S.A.

No âmbito deste contrato, a A... obriga-se a prestar os seguintes serviços: a. Representação institucional da globalidade do grupo; b. Orientação estratégica do negócio; c. Apoio à administração e gestão. Este contrato foi celebrado a 1 de janeiro de 2017 e ainda se encontra em vigor com os devidos aditamentos formalizados a 1 de janeiro de 2022 – vide Doc. n.º 7;

III - Prestação de serviços de gestão operacional e comercialização de instalações entre a A... e a C..., S.A.

No âmbito deste contrato, a A... obriga-se a prestar os seguintes serviços: a. Gestão das instalações i. Relacionamento diário com lojistas ii. Garantia de operacionalidade sem interrupções iii. Coordenação e gestão de prestadores de serviços iv. Coordenação dos planos de manutenção preventiva v. Coordenação e gestão das auditorias de qualidade operativa vi. Planos de contingência vii. Monitorização do cumprimento dos requisitos legais viii. Gestão de reclamações (lojistas e convidados) ix. Suporte técnico a lojistas x. Gestão do plano de marketing e comunicação (incluindo redes sociais) xi. Gestão do orçamento de despesas comuns xii. Gestão contratual (lojistas, prestadores de serviços, etc.) xiii. Gestão de obras/Capex xiv. Coordenação do licenciamento de lojas e obras xv. Outros a acordar previamente b. Comercialização i. Captação de novos lojistas ii. Angariação de insígnias inovadoras iii. Recomercialização/ renovação de contratos com plano estratégico. Este contrato, celebrado a 1 de fevereiro de 2022, prevê que a A... assegure a gestão operacional e comercialização do C... desde tal data – vide Doc. n.º 8.

e) A Requerente deduz o IVA dos inputs em que incorre para a sua atividade tributada, tendo em 2021 e 2022 incorrido em vários custos que configuram como despesas gerais, como serviços de consultoria, de apoio legal e fiscal e de corporate finance, cujo IVA não deduziu, mas que poderia ter deduzido (ainda que parcialmente), dado tais despesas se configurarem como gerais (ou seja, serem utilizadas para a sua atividade como um todo) e dado o enquadramento da Requerente como sujeito passivo misto.

f) Com efeito, em 2021 e 2022, no âmbito do projeto de reestruturação, através do qual a Requerente alienou as participações sociais que detinha nas sociedades D..., S.A (“D...”) e E..., Lda. (“E...”), à sociedade F..., SL., (“F...”), pertencente a um grupo económico francês, incorreu em despesas com serviços de consultoria, de apoio legal e fiscal e de corporate finance e seu contexto que configuram serviços de consultoria, de apoio legal e fiscal e de corporate finance, (conforme Docs. n.º 9 a 14, cuja cópias se juntam), e totalizam um valor de IVA de € 86 786.59 que não foi até ao momento deduzido, (nem na sua totalidade nem parcialmente), em sede de declarações periódicas de IVA.

g) No âmbito da mencionada transação, e como condição essencial para a realização da mesma, foi ainda celebrado um outro contrato de prestação de serviços a 30 de junho de 2021 (que se encontra em vigor até 30 de junho de 2023 e pode ser, consequentemente, renovado por iguais períodos), designado por Transational Services Agreement, (conforme Doc. n.º 15) que contempla serviços essenciais e necessários à prossecução do objeto da entidade, sujeitos a IVA, ficando claro que a Requerente continuará a prestar serviços de consultoria à E... (entidade do grupo, à qual fatura) e indiretamente à D... (uma vez que é a E... quem fatura esta última).

h) No âmbito deste contrato, a Requerente presta à E... serviços de suporte estratégico, tal como serviços administrativos e financeiros, o que inclui tarefas como coordenação operacional da equipa E..., participação e validação do budget e acompanhamento dos resultados, gestão da relação com as instituições bancárias, assegurar as reuniões mensais e gestão dos fornecedores e parceiros, apoio com a gestão de recursos humanos e processamento salarial, monitorizar a contabilidade e questões legais, entre outros serviços, devidamente listados no ponto 3. de tal contrato - vide Docs. n.º 15.

i) As despesas em apreço assumem uma importância crucial para o desenvolvimento da atividade da Requerente, havendo uma conexão inequívoca com a sua atividade tributada, incluindo com os serviços a prestar no âmbito do Transational Services Agreement.

j) Perante o exposto, a Requerente considera que o IVA dos inputs acima descritos, (cfr Docs. n.º 9 a 14), é passível de dedução, pelo que a autoliquidação de imposto efetuada pela Requerente respeitante ao último trimestre de 2021 e segundo trimestre de 2022 carece de correção.

k) A Requerente apresentou reclamação graciosa dos actos de autoliquidação em 4 de outubro de 2022) (conforme Docs n.ºs 1 e 2).

l) Nestes termos, vem salientar que o direito à dedução do IVA é um elemento fundamental do regime do IVA, sendo apenas suscetível de limitações nos casos expressamente previstos pela Diretiva do IVA, invocando para o efeito doutrina, diversa jurisprudência do TJUE, decisões judicias e decisões arbitrais que corroboram, essencialmente, o seguinte sentido “48.…tendo em consideração o caso em concreto da Requerente, que configura como uma holding, cumpre destacar, neste contexto, o acórdão Floridienne17 do TJUE, que vem definir que as holdings podem legitimamente realizar transações sujeitas a IVA, que conferem o direito à dedução - como, por exemplo, consultoria e assessoria jurídica, contabilística e financeira, serviços de administração e gestão, entre outras, sendo estas abrangidas pelo direito à dedução.

49. No mesmo caso é ainda clarificado que podem as holdings aplicar o método do prorata, devendo determinadas atividades que não conferem direito à dedução, ser excluídas do denominador da fração que serve de base ao cálculo, nomeadamente o recebimento de dividendos distribuídos pelas filiais e também os juros cobrados relativamente a empréstimos a participadas, neste caso, quando sejam consideradas operações acessórias.”

m) Contexto este em que, salientando que as despesas em apreço têm um nexo direto e imediato com o conjunto da atividade económica do sujeito passivo, conclui que “63. Assim, fica claro que a Requerente terá todo o direito a determinar um prorata e aplicar o mesmo na dedução do IVA das despesas gerais, como é o caso dos custos aqui mencionados, dado tratar-se de inputs que qualificam como verdadeiras despesas gerais da entidade.”

 

3. Juntou à petição diversos documentos.

 

4. Cumpridos os necessários e legais trâmites processuais, designadamente os previstos no aludido Decreto-Lei n.º 10/2011 e na Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março, foi constituído Tribunal Arbitral Coletivo em 30 de junho de 2023, em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redacção introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro.

 

5. Notificada em 3 de julho de 2023 nos termos do artigo 17.º, n.º 1, do RJAT, veio a AT apresentar resposta, em 22 de setembro de 2023, alegando, sumariamente, o seguinte:

 

a) Na situação vertente, não está comprovada a relação direta e imediata entre as despesas inerentes aos serviços especializados adquiridos, e uma ou várias operações a jusante com direito a dedução, que acabaram por nunca ser especificadas.

b) Não obstante é, também, admitido um direito à dedução a favor do sujeito passivo, mesmo na falta de uma relação direta e imediata entre uma determinada operação a montante e uma ou várias operações a jusante com direito a dedução, quando os custos dos serviços em causa fazem parte das despesas gerais do sujeito passivo e são, enquanto tais, elementos constitutivos do preço dos bens fornecidos ou dos serviços prestados pelo mesmo.

c) A Requerente alega que as despesas em que incorreu estão diretamente ligadas às operações de reestruturação do grupo, no entanto, a dita e alegada conexão imediata não está comprovada, apenas pelos documentos que foram apresentados, nem dos descritivos das faturas.

d) A qualidade de holding mista da Requerente implica que a dedução do IVA suportado nos bens e serviços de utilização mista não seja integral, mas antes na medida da conexão de cada encargo com a atividade sujeita que confere o direito à dedução, sob pena de se permitir uma desigualdade injustificada no sistema.

e) Para o efeito, é aplicável a estes casos a método de afetação real, permitindo que apenas se deduza o montante IVA efetivamente suportado na atividade tributada, segregada do montante de IVA suportado nas atividades que não permitem o direito a deduzir imposto

f) O TJUE declarou que os custos ligados à aquisição de participações nas suas filiais suportados por uma sociedade holding - que participa na sua gestão e que, a esse título, exerce uma atividade económica - devem ser considerados parte dos seus custos gerais e que o IVA pago sobre estes custos deve, em princípio, ser integralmente deduzido, a menos que algumas operações económicas realizadas a jusante estejam isentas de IVA nos termos da Sexta Diretiva, caso em que o direito a dedução só deve operar segundo as modalidades previstas no art.º 17.°, n.° 5, desta diretiva (acórdão de 16 de julho de 2015, Larentia + Minerva e Marenave Schiffahrt, C 108/14 e C 109/14, n.° 33).

g) No entanto, precisou também que, na hipótese de se confirmar que prestou serviços sujeitos a IVA, característicos da sua atividade económica, apenas a uma parte das suas filiais [verificação que remete para o juiz nacional] o IVA pago sobre os custos gerais só poderá ser deduzido na proporção daqueles que são inerentes à atividade económica, segundo um método que incumbe aos Estados Membros determinar (v., neste sentido, acórdão de 5 de julho de 2018, Marle Participations, C 320/17, n.° 37).

h) A Requerente não demonstra de forma inequívoca que os serviços adquiridos tenham sido redebitados ou considerados no preço dos serviços prestados às participadas, suas clientes, na atividade acessória ou principal, ou seja, que esses inputs integrem os elementos constitutivos do preço dos outputs (assim também a jurisprudência do TJUE, no recente acórdão de 8 de setembro de 2022, Finanzamt R, C-98/21, n.º 52).

6- Não havendo lugar à produção de mais prova, a Requerente apresentou alegações, reafirmando o constante do requerimento inicial. Juntou ainda 3 documentos os quais, substancialmente, nada acrescentam à prova documental antes produzida.

 

II - Saneamento do Processo

 

1. O pedido de pronúncia arbitral é tempestivo, uma vez que foi apresentado no prazo previsto na alínea a) do n.º 1 do artigo 10.º do RJAT.

 

2. O objeto principal do processo reporta-se à admissibilidade de deduções de IVA relativos a despesas incorridas por uma holding mista.  

 

3. As partes têm personalidade e capacidade judiciárias, mostram-se legítimas e encontram-se regularmente representadas (cf. artigos 4.º e 10.º, n.º 2, do RJAT, e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março). 

 

4. O processo não enferma de nulidades e não foram identificadas questões prévias relativas ao pedido principal, pelo que se impõe, agora, conhecer do mérito do pedido.

 

III – Fundamentação

 

1. Questões decidendas

 

As questões cuja pronúncia se impõe ao Tribunal Arbitral consubstanciam-se, no essencial, em apurar se o IVA dos inputs acima descritos é passível de dedução, carecendo de correção a autoliquidação de imposto efetuada pela Requerente respeitante ao último trimestre de 2021 e segundo trimestre de 2022.

 

2. Matéria de facto

 

2.1 Factos provados

 

Em face das posições das partes expressas nos articulados, dos documentos integrantes do processo administrativo anexo, julgam-se como provados os seguintes factos pertinentes para a decisão da causa:

 

a) A Requerente configura-se como uma sociedade gestora de participações sociais (cfr. Doc. n.º 5 anexo à PI).

 

b) Para além da detenção e gestão de participações sociais, a Requerente exerce uma atividade de prestação de diversos serviços técnicos e especializados às suas participadas C..., S.A., B..., S.A., e E..., Lda. 7. 11., tais como serviços de apoio à administração e gestão (cfr. Docs. n.ºs 6, 7 e 8 anexos à PI).

 

c) A Requerente apresentou declaração de início de atividade, em 20 de novembro de 2012, com o código CAE 64202 – “Atividade das sociedades gestoras de participações sociais não financeiras”, ficando enquadrada, para efeitos de IVA, no regime normal, de periodicidade mensal, desde 1 de janeiro de 2013.

 

d) Através da entrega de uma declaração de alteração de atividade, passou a estar registada, entre 1 de agosto de 2016 e 14 de janeiro de 2022, para o exercício de “atividades das sedes sociais” – CAE principal 70100. 3.

 

e) A Requerente enquadra-se, para efeitos de IVA, no regime normal, de periodicidade trimestral, desde 1 de janeiro de 2020, para a prática de operações como sujeito passivo misto, com afetação real de parte dos bens, e percentagem de dedução de 80%, realizando simultaneamente, atividades que são tributadas em sede de IVA – prestação de serviços a participadas – e outras que não são tributadas ou que se encontram fora do escopo do imposto – gestão de participações sociais.

 

f) A Requerente, desde 14 de janeiro de 2022, encontra-se registada para o exercício de “Outras atividades de consultoria para os negócios e a gestão” – CAE principal 70220, e “Outras atividades de consultoria, científicas, técnicas e similares, n.e.” – CAE secundário 074900.

 

g) A Requerente deduz o IVA dos inputs em que incorre para a sua atividade tributada, tendo, em 2021 e 2022, incorrido em vários custos que se configuram como despesas gerais, como serviços de consultoria, de apoio legal e fiscal e de corporate finance, cujo IVA não deduziu.

 

h) Em 2021 e 2022, no âmbito de um projeto de reestruturação, a Requerente alienou as participações sociais que detinha nas sociedades D..., S.A (“D...”) e E..., Lda. (“E...”), à sociedade F..., SL., (“F...”), pertencente a um grupo económico francês, tendo incorrido em despesas com serviços de consultoria, de apoio legal e fiscal e de corporate finance e seu contexto que totalizam um valor de IVA de € 86 786.59 que não foi deduzido (cfr. Docs. n.º 9 a 14 anexos à PI).

 

i) No âmbito da mencionada reestruturação, foi ainda celebrado um outro contrato de prestação de serviços a 30 de junho de 2021 designado por Transational Services Agreement, no contexto do qual a Requerente acorda prestar à E... serviços de suporte estratégico, tal como serviços administrativos e financeiros (cfr. Doc. n.º 15 anexo à PI).

 

j) A Requerente deduziu Reclamação Graciosa contra atos de autoliquidação de Imposto sobre o Valor Acrescentado de autoliquidação em 4 de outubro de 2022 apurado por respeito ao período de tributação do último trimestre de 2021 e segundo trimestre de 2022, não tendo sido notificada de decisão desse procedimento dentro do prazo legal previsto no artigo 57.º n.º 1 da Lei Geral Tributária (cfr. Docs. n.ºs 1, 2, 3 e 4 anexos à PI).

 

k) O IVA suportado nas despesas gerais em apreço tem ligação com a atividade tributada da Requerente (cfr. Docs. n.ºs 6, 7, 8, 9, 10, 11, 12, 13, 14 e 15 anexos à PI).

 

Note-se que relativamente à matéria de facto o Tribunal não tem que se pronunciar sobre tudo o que foi alegado pelas partes, cabendo-lhe, sim, o dever de selecionar os factos que importam para a decisão e discriminar a matéria provada da não provada (cfr. artigo 123.º, n.º 2, do CPPT e artigo 607.º, n.º 3, do CPC, aplicáveis ex vi artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e e), do RJAT). Deste modo, os factos pertinentes para o julgamento da causa são escolhidos e recortados em função da sua relevância jurídica, a qual é estabelecida em atenção às várias soluções plausíveis da(s) questão(ões) de Direito (cfr. anterior artigo 511.º, n.º 1, do CPC, correspondente ao atual artigo 596.º, aplicável ex vi do artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT). Assim, tendo em consideração as posições assumidas pelas partes, à luz do artigo 110.º, n.º7, do CPPT, a prova documental e o PA juntos aos autos, consideraram-se provados, com relevo para a decisão, os factos acima elencados.

A convicção do Tribunal para dar os presentes factos como provados assentou na análise crítica do teor dos documentos constantes do processo administrativo e dos restantes documentos constantes dos autos, os quais não foram impugnados pelas partes e relativamente aos quais não há indícios que ponham em causa a respetiva genuinidade.

 

2.2 Factos não provados

 

Não há factos relevantes para a decisão que não se tenham provado.

 

3. Das questões de Direito

 

Encontrando-se a aludida matéria de facto dada como provada, importa seguidamente determinar o Direito aplicável aos factos subjacentes, de acordo com as questões supra.

Interessa assim, em especial, decidir quanto às principais questões suscitadas nos presentes autos, a saber, como referimos, se a Requerente, configurando-se como uma holding mista, tem direito a deduzir o IVA suportado nas despesas em causa.

Vejamos.

Iremos aqui, para o efeito, reproduzir as considerações antes feitas pela ora Relatora no invocado Processo n.º 15/2015, de 30 de Outubro de 2015, no qual foi igualmente Relatora, cujos factos são similares aos controvertidos:

1. Da natureza e amplitude do exercício do direito à dedução

 

No que concerne ao exercício do direito à dedução em IVA, justifica-se tecer algumas considerações prévias, quer sobre a respectiva natureza, quer no que tange ao respetivo âmbito de aplicação e exercício pelos sujeitos passivos, pelo que iremos aqui reproduzir as considerações gerais já antes tecidas por este mesmo Tribunal na sua Decisão Arbitral relativa aos Processos n.º 148/2012-T/CAAD e n.º 18/2013 – T/CAAD.

Como é sabido, o IVA é um imposto indireto de matriz comunitária, plurifásico, que atinge tendencialmente todo o ato de consumo (imposto geral sobre o consumo) [1].

O direito à dedução é um elemento essencial do funcionamento do imposto, devendo garantir a sua principal característica – a neutralidade.

Na realidade, o direito à dedução consubstancia-se como o elemento essencial do funcionamento do imposto, a “trave-mestra do sistema do imposto sobre o valor acrescentado”[2], assentando no designado método da dedução do imposto, método do crédito de imposto, método subtrativo indireto ou ainda método das faturas. De acordo com este método, e em conformidade com o disposto no artigo 19.º do CIVA, através de uma operação aritmética de subtração, ao imposto apurado nas vendas e prestações de serviços (outputs) e identificável nas respetivas faturas, deduz-se o imposto suportado nas compras e outros gastos (inputs).Como determina o 2.º parágrafo, do n.º 2, do artigo 1.º, da Diretiva IVA (de ora em diante DIVA)[3], “Em cada operação, o IVA, calculado sobre o preço do bem ou serviço, é exigível, com prévia dedução do montante do imposto que tenha incidido diretamente sobre o custo dos diversos elementos constitutivos do preço.” O mecanismo do exercício do direito à dedução permite ao sujeito passivo expurgar do seu encargo o IVA suportado a montante, não o refletindo assim como custo operacional da sua atividade, retirando, desta forma, o efeito cumulativo ou de cascata, propiciando a neutralidade económica do imposto.

De acordo com o previsto na DIVA, o Código do IVA determina, como regra geral, a dedutibilidade do imposto devido ou pago pelo sujeito passivo nas aquisições de bens e serviços feitas a outros sujeitos passivos.

As situações expressas de exclusão do direito à dedução são excecionais e reportam-se a casos específicos enunciados pelo legislador nacional em termos taxativos, de acordo com o estatuído na DIVA, em função do tipo de despesas em causa[4].

As regras do exercício do direito à dedução do imposto contemplam requisitos objetivos, mais ligados ao tipo de despesas, subjetivos, relativos ao sujeito passivo, e temporais, atinentes ao período em que é possível exercer o direito à dedução do IVA, os quais se devem verificar em simultâneo para se exercer o direito à dedução[5].

Como requisitos objetivos do exercício do direito à dedução do imposto temos, nomeadamente, o facto de o imposto suportado dever constar de fatura passada na forma legal (ou seja, deverá obedecer, nos seus requisitos, aos termos gerais previstos no artigo 36.º, n.º5, do CIVA), de se tratar de IVA português, e de a despesa, por si, conferir o direito à dedução do IVA (isto é, não se deve tratar de uma despesa excluída do direito à dedução, nos termos do disposto no artigo 21.º do CIVA).

Como requisitos subjetivos do exercício do direito à dedução do imposto determina-se, nomeadamente, que os bens e serviços deverão estar diretamente relacionados com o exercício da atividade em causa. Em conformidade com o disposto no artigo 168.º da DIVA, transposto, em parte, pelo artigo 20.º, n.º 1, alínea a), do CIVA, o sujeito passivo pode deduzir o IVA suportado no Estado-membro em que se encontra estabelecido nas transmissões de bens e prestações de serviços, assim como nas operações assimiladas nas aquisições intracomunitárias de bens e nas importações ali localizadas, “Quando os bens e os serviços sejam utilizados para os fins das suas operações tributadas (…) ”.

Este normativo, em conformidade com as regras do Direito da União Europeia, vem assim exigir que exista um nexo de causalidade entre o bem ou serviço adquirido (input) e o output tributado, para que o IVA seja suscetível de ser dedutível.

Isto é, o IVA suportado a montante numa determinada operação só é dedutível na medida em que possa estar relacionada a jusante com uma operação efetivamente tributada, devendo a relação ser aferida em função do reporte e inclusão do custo suportado, no preço da operação tributada.

Neste contexto o TJUE, no Caso BLP[6], concluiu que os bens ou serviços a montante devem apresentar uma relação direta e imediata com uma ou diversas operações sujeita(s) a imposto a jusante, sendo que o direito à dedução do IVA pressupõe que as despesas em causa devam constituir parte integrante dos elementos constitutivos do preço das operações tributadas.

Inevitavelmente, a análise do alcance daquela expressão “ (…) relação direta e imediata (…)”, deverá ser efetuada casuisticamente, competindo aos órgãos jurisdicionais nacionais aplicar o critério aos factos de cada processo que lhes seja presente e tomar em consideração todas as circunstâncias em que se desenrolam as operações em causa[7].

Não obstante, como concluiu o Advogado-geral no Caso Midland Bank, o emprego dos dois adjetivos «direto» e «imediato» não pode deixar de significar uma relação especialmente próxima entre as operações tributáveis efetuadas por um sujeito passivo e os bens ou serviços fornecidos por outro sujeito passivo[8].

Contudo, a densidade dessa relação pode ser diferente consoante a qualidade do sujeito passivo e a natureza das operações efetuadas e estas variáveis podem também ter repercussões sobre o ónus da prova da existência da relação, o qual cabe ao operador interessado na dedução.

Assim, de acordo com a jurisprudência do TJUE, sempre que um sujeito passivo exercer atividades económicas destinadas a realizar exclusivamente operações tributáveis, não é necessário, para que se possa deduzir na totalidade o imposto, estabelecer, quanto a cada operação a montante, a existência de uma relação direta e imediata com a operação específica sujeita a imposto[9].

O que o legislador apenas exige é que os bens e serviços sejam utilizados ou suscetíveis de o ser “para os fins das próprias operações tributáveis”. Não é necessária a existência de uma relação com uma operação específica tributável, sendo suficiente que exista uma relação com a atividade da empresa.

Quanto ao adjetivo “imediata”, este denota uma grande proximidade temporal entre as duas operações. No entanto, isto não significa que o imposto sobre a operação a montante deva tornar-se exigível antes de a operação a jusante ter sido realizada: basta que o período de tempo entre as duas operações não seja demasiado longo, facto que reforça o carácter financeiro da dedução.

Assim, numa primeira fase, deverá aferir-se se a operação a montante sujeita a IVA apresenta uma relação direta e imediata com uma ou várias operações que confiram direito a dedução, pressupondo o reporte do custo daquele no preço das operações.

Caso tal não se verifique, importa então analisar se as despesas realizadas para a aquisição dos bens ou serviços a montante fazem parte das despesas gerais ligadas ao conjunto da atividade económica do sujeito passivo, pressupondo a incorporação do seu custo nos preços dos bens ou serviços fornecidos pelo sujeito passivo no âmbito das suas atividades económicas.

Por último, como requisito do exercício do direito à dedução temos ainda o requisito temporal, nos termos do qual “O direito à dedução nasce no momento em que o imposto dedutível se torna exigível”, permanecendo, no entanto, o requisito cumulativo da posse da fatura, ou do recibo de pagamento do IVA que faz parte das declarações de importação.

Por sua vez, de acordo com as regras do n.º 1 do artigo 19.º do CIVA, estipula-se que confere direito à dedução, designadamente, o imposto devido ou pago pelo sujeito passivo nas aquisições de bens e serviços feitas a outros sujeitos passivos e o imposto pago pela aquisição dos serviços referidos nas alíneas e), h), i), j) e l) do n.º 1 do artigo 2.º do CIVA.

    Em conformidade com o disposto no n.º 1 do artigo 20.º do CIVA, conferem, nomeadamente, direito à dedução do IVA as transmissões de bens e prestações de serviços sujeitas a imposto e dele não isentas e as transmissões de bens e prestações de serviços que consistam em operações efetuadas no estrangeiro que seriam tributáveis se fossem efetuadas em Portugal.

 

É reconhecido de forma unânime pela jurisprudência do TJUE que o mecanismo do direito à dedução é um elemento essencial do funcionamento do IVA tal como foi desenhado nas Diretivas IVA, assumindo um papel fundamental de garantia da neutralidade do imposto e da igualdade de tratamento fiscal[10]. Assim, é jurisprudência constante do TJUE que, sendo o direito à dedução um elemento fundamental do regime de IVA, só é possível limitar este direito nos casos expressamente previstos pela DIVA e, ainda assim, com respeito pelos princípios da proporcionalidade e da igualdade, não se podendo esvaziar o sistema comum do IVA do seu conteúdo.

Tal como se salienta no Acórdão BP Soupergaz, o chamado método subtrativo indireto, das faturas, do crédito de imposto ou sistema dos pagamentos fracionados, é o mecanismo essencial de funcionamento deste tipo de imposto. Como se refere nas conclusões deste Acórdão, “A este respeito, o direito à dedução previsto nos artigos 17. e seguintes da Sexta Diretiva, que faz parte integrante do mecanismo do imposto sobre o valor acrescentado, não pode, em princípio, ser limitado e exerce-se imediatamente em relação à totalidade dos impostos que incidiram sobre as operações efetuadas a montante, tem incidência no nível do encargo fiscal e deve aplicar-se similarmente em todos os Estados-Membros, de modo que só são permitidas derrogações nos casos expressamente previstos pela diretiva” [11].

E no Acórdão Comissão/França, o TJUE acrescenta que, “As características do imposto sobre o valor acrescentado (…) permitem inferir que o regime das deduções visa libertar inteiramente o empresário do ónus do IVA, devido ou pago, no âmbito de todas as suas atividades económicas. O sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado garante, por conseguinte, a perfeita neutralidade quanto à carga fiscal de todas as atividades económicas, quaisquer que sejam os fins ou os resultados dessas atividades, na condição de as referidas atividades estarem, elas próprias, sujeitas ao IVA” [12].

Note-se ainda que, conforme se salienta no Acórdão Metropol, “59. As disposições que preveem derrogações ao princípio do direito à dedução do IVA, que garante a neutralidade deste imposto, são de interpretação restrita” [13].

A amplitude do direito à dedução em IVA é tão grande, que constitui ato claro na jurisprudência do TJUE que este deve inclusive ser concedido no tocante às chamadas atividades preparatórias, não se exigindo que a atividade tenha já começado para se poder deduzir o IVA, podendo ser deduzido relativamente a este tipo de atividades[14].

Note-se a este propósito que, de acordo com o entendimento do TJUE, posição que já foi, aliás, subscrita pela Administração Tributária[15], o direito à dedução, uma vez adquirido, subsiste mesmo que a atividade económica projetada não dê origem a operações tributáveis ou o sujeito passivo, por motivos alheios à sua vontade, não tenha podido utilizar os bens ou serviços que deram origem à dedução no âmbito de operações tribu­tá­veis[16].

Como o TJUE salienta, é a aquisição do bem pelo sujeito passivo, agindo nessa qualidade, que determina a aplicação do sistema do IVA e, portanto, do mecanismo de dedução[17]. O sujeito passivo atua nessa qualidade quando age para os fins da sua atividade económica, na aceção do artigo 9.°, n.° 1, segundo parágrafo, da DIVA[18]. Acresce que, como se conclui no Caso Intiem, o mecanismo da dedução do IVA regulado pela Sexta Diretiva “deve ser aplicado de tal forma que o seu âmbito de aplicação corresponda, na medida do possível, ao âmbito das atividades profissionais do sujeito passivo”[19].

Isto é, como nota o TJUE, o princípio da neutralidade do IVA, no que se refere à carga fiscal da empresa, exige que as despesas de investimento efetuadas para as necessidades e para os objetivos de uma empresa sejam consideradas atividades económicas conferindo um direito à dedução do IVA imediato[20].

Importa ainda notar que, em conformidade com a jurisprudência do TJUE, o princípio da neutralidade do IVA exige que a dedução do imposto pago a montante seja concedida caso os requisitos substanciais tenham sido cumpridos, mesmo que os sujeitos passivos tenham negligenciado certos requisitos formais. Neste contexto, de acordo com o TJUE, desde que a Administração Fiscal disponha dos dados necessários para determinar que o sujeito passivo, enquanto destinatário das operações, é devedor do IVA, não pode impor, no que diz respeito ao seu direito à dedução, condições adicionais que possam ter por efeito a inviabilização absoluta do exercício desse direito[21].

 

Em resumo, da jurisprudência do TJUE resulta claro que o exercício do direito à dedução do IVA é um direito fundamental, que não pode ser limitado senão nos casos expressamente permitidos pelas normas do Direito da União Europeia ou pelos princípios gerais de direito aceites neste domínio, como o princípio do abuso de direito.

 

2. Do conceito de atividade económica e sua relação com o direito à dedução relativo à aquisição de participações sociais

 

2.1 Jurisprudência do TJUE

 

O TJUE tem vindo a classificar as operações desenvolvidas por um sujeito passivo de IVA em atividades não económicas, que deverão ficar à margem da DIVA, não conferindo direito à dedução, e em atividades económicas. Só as atividades económicas é que estão abrangidas no âmbito da Diretiva, distinguindo-se em atividades não sujeitas, sujeitas e isentas e em atividades sujeitas e não isentas (ou seja, efetivamente tributadas).

Como salienta o Advogado Geral Mengozzi no Caso VNLTO[22], atendendo ao princípio da neutralidade que enforma o sistema comum do IVA, uma pessoa só deve suportar o IVA se este tiver incidido sobre os bens e serviços que utilizou para o consumo privado e não para as suas atividades profissionais tributáveis.

Isto é, não é possível deduzir o IVA suportado a montante caso este respeite à atividade do sujeito passivo que não reveste a natureza de atividade económica na aceção da DIVA.

Tal como referimos supra quanto à amplitude da “relação direta e imediata” entre os inputs que contêm IVA objeto de dedução e as operações tributadas do sujeito passivo, o TJUE tem vindo a acolher uma interpretação cada vez mais abrangente, nomeadamente, para os feitos que ora nos interessam no que se refere à gestão de participações sociais, sendo que o estabelecimento de um nexo causal entre o IVA dedutível e uma determinada operação, individualizada e concretizada, não poderá ser acolhido[23].

Como vimos, de acordo com a jurisprudência do TJUE, “admite‑se igualmente um direito a dedução a favor do sujeito passivo, mesmo na falta de um nexo direto e imediato entre uma determinada operação a montante e uma ou várias operações a jusante com direito a dedução, quando os custos dos serviços em causa fazem parte das suas despesas gerais e são, enquanto tais, elementos constitutivos do preço dos bens que fornece ou dos serviços que presta. Estes custos têm, com efeito, um nexo direto e imediato com o conjunto da atividade económica do sujeito passivo”[24]. Contudo, é imperativo que exista uma relação com a atividade económica do sujeito passivo, subsistindo a necessidade da sua demonstração inequívoca.

Como se notou no Caso Cibo[25], “1) A interferência de uma holding na gestão das sociedades em que tomou participações constitui uma atividade económica na aceção do artigo 4.°, n.° 2, da Sexta Diretiva 77/388/CEE do Conselho, de 17 de Maio de 1977, relativa à harmonização das legislações dos Estados-Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios - Sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado: matéria coletável uniforme, na medida em que implique a realização de transações sujeitas ao imposto sobre o valor acrescentado nos termos do artigo 2.° dessa diretiva, tais como o fornecimento, pela holding às suas filiais, de serviços administrativos, financeiros, comerciais e técnicos.

2) As despesas efetuadas por uma holding com os vários serviços que adquiriu no âmbito de uma tomada de participação numa filial fazem parte das suas despesas gerais, pelo que têm, em princípio, um nexo direto e imediato com o conjunto da sua atividade económica. Portanto, se a holding efetuar tanto operações com direito a dedução como operações sem direito a dedução, decorre do artigo 17.°, n.°5, primeiro parágrafo, da Sexta Diretiva 77/388 que pode unicamente deduzir-se a parte do imposto sobre o valor acrescentado proporcional ao montante respeitante à primeira categoria de operações.” (cfr. §§ 1 a 3 das conclusões)

 

Tal como salienta o TJUE no Caso I/S Fini y Skatteministeriet[26], o conceito de sujeito passivo está sempre vinculado ao de atividade económica, sendo precisamente esta atividade económica a que justifica a qualificação do sujeito passivo com direito a deduzir. Ora, se o exercício, de forma independente, de uma atividade económica é, por si só, condição de incidência subjetiva deste imposto, logo da possibilidade de conferir direito à dedução e se o direito à dedução é, como vimos, o garante da neutralidade do imposto, a delimitação daquele conceito deverá necessariamente ser o mais lata possível.

Como se prevê no artigo 9.º, n.º1, 2.º parágrafo, 2.ª parte, da DIVA, na definição de sujeito passivo de IVA “(…) É em especial considerada atividade económica a exploração de um bem corpóreo ou incorpóreo com o fim de auferir receitas com carácter de permanência (…).”

Ora, é ao nível da gestão das participações sociais que se tem discutido bastante a determinação do alcance deste conceito, sendo especialmente relevantes neste contexto as conclusões do Caso EDM [27].

Como nota o Advogado-geral Philipe Léger nas sua conclusões neste Caso[28], “ (…) constitui jurisprudência constante que o simples exercício do direito de propriedade pelo seu titular não pode, por si só, ser considerado uma atividade económica”.

Já antes no Caso Polystar[29],relativo a uma holding pura, o TJUE tinha concluído que a mera aquisição e detenção de participações sociais, sem intervenção na gestão de outras empresas, não devem ser consideradas uma atividade económica, na aceção da Sexta Diretiva, não conferindo ao seu autor a qualidade de sujeito passivo.

Nas conclusões do Caso EDM[30] refere ainda o TJUE que a simples venda de ações e outros títulos negociáveis, tais como participações em fundos de investimento, assim como os rendimentos inerentes a estes fundos, não constituem uma “atividade económica” na aceção da Sexta Diretiva, pelo que não se encontram abrangidos pelo âmbito da sua aplicação.

Em conformidade com este arresto, a simples tomada de uma participação financeira noutra empresa não constitui uma exploração de um bem com o fim de auferir receitas com carácter de permanência, na medida em que o eventual dividendo, fruto de tal participação, resulta da simples propriedade do bem e não a contrapartida de uma qualquer atividade económica[31]. Já relativamente aos juros recebidos por uma holding relativamente a empréstimos concedidos às suas sociedades participadas não podem, de acordo com as conclusões daquele Acórdão, ser excluídos do âmbito de aplicação de IVA.

Na mesma lógica, a cedência das referidas participações não preenchem igualmente o conceito de atividade económica, conforme se refere no Caso Satam/Sofitam[32]. Não sendo contrapartida de uma atividade económica, no sentido da Sexta Diretiva, a perceção de dividendos não entra no campo da aplicação do IVA, nem pode ser qualificada como uma contraprestação de eventuais serviços prestados pela SGPS à sua filial, que se consumam numa intervenção na sua gestão (vg. serviços de apoio técnico à gestão).

Interessa em particular salientar que no Caso Floridienne e Berginvest[33], que tem subjacente uma sociedade holding, o TJUE refere que se deve considerar como atividade económica a intervenção na gestão das filiais, na medida em que implique transações sujeitas a IVA, tais como o fornecimento de serviços administrativos, contabilísticos e informáticos.

Isto é, interessa em especial sublinhar que o TJUE, no tocante à aquisição de participações financeiras, já decidiu que a situação é distinta, inserindo-se no âmbito do exercício de uma atividade económica, no caso de a aquisição de uma participação financeira numa sociedade ser acompanhada pela “ (…) interferência direta ou indireta na gestão das sociedades (…)”[34] em que se verificou a tomada de participação, sem prejuízo dos direitos que o detentor da participação tenha na qualidade de acionista ou de sócio[35], na medida em que tal interferência implique a realização de transações sujeitas ao IVA nos termos da DIVA, tais como o fornecimento de serviços administrativos, contabilísticos e informáticos.

O TJUE distingue, nesta medida, as holdings que interferem, direta ou indiretamente, na gestão das participadas, daquelas que não o façam[36].

Quanto ao tratamento a conceder à gestão (aquisição, detenção e alienação) de participações sociais para além do caso das holdings, no contexto das participações de uma sociedade-mãe em filiais ou associadas, decorre da jurisprudência do TJUE que as operações relativas às ações ou participações em sociedades são abrangidas pelo âmbito de aplicação do IVA quando efetuadas no quadro de uma atividade comercial de negociação de títulos ou quando constituem o prolongamento direto, permanente e necessário da atividade tributável[37].

Sendo a aquisição de participações sociais uma operação passiva, para aferirmos da dedutibilidade do IVA relativa às despesas associadas teremos, necessariamente, de analisar em que medida aquela participação é detida e quais são as operações a jusante que decorreram daquelas despesas – serão ou não tais operações atividades económicas sujeitas e não isentas de IVA?

Como refere Rui Bastos[38], “Assim sendo, a aquisição de participações numa perspetiva pura de investimento, tendo em vista a obtenção de receitas como dividendos, remete a sua detenção para fora do conceito de atividade económica, sendo que a aquisição num contexto de comercialização de títulos remeteria para o exercício de uma atividade sujeita, embora isenta.

O mesmo não deverá suceder num contexto de aquisição de uma participação que represente o prolongamento natural e necessário da atividade comercial ou industrial da sociedade adquirente, num contexto de reestruturação empresarial ou num processo de expansão, optando pela aquisição de uma filial, em detrimento da constituição de um estabelecimento estável, o mesmo não sucedendo num contexto de intervenção na gestão das participadas e, concomitantemente, em atividades tributadas por elas exercidas.”

No Caso SKF, o TJUE, invocando o princípio da igualdade de tratamento e neutralidade fiscal, conclui pela natureza económica das tomadas de participações acompanhadas com a interferência pela sociedade-mãe na gestão das participadas que deve ser estendida às situações de transmissão de participações que põem termo a essa interferência.

No quadro da transmissão de ações, considera o TJUE no Caso SKF que o direito à dedução do IVA pago a montante sobre prestações destinadas a realizar uma transmissão de ações[39] é conferido, por força do artigo 168.° da DIVA, se existir uma relação direta e imediata entre as despesas relacionadas com as prestações a montante e o conjunto das atividades económicas (tributadas) do sujeito passivo, as denominadas “despesas gerais”.

Naquele processo, a transmissão de ações em causa[40], realizada com vista à reestruturação de um grupo de sociedades pela sociedade‑mãe, foi considerada uma operação de obtenção de receitas com carácter permanente de atividades que excedem o quadro da simples venda de ações. Esta operação apresentava um nexo direto com a organização da atividade industrial exercida pelo grupo e constitui assim o prolongamento direto, permanente e necessário da atividade tributável do sujeito passivo, pelo que aquela operação de venda de ações seria abrangida pelo âmbito de aplicação do IVA, suscetível de conferir direito à dedução do IVA dos respetivos inputs.

O TJUE considera que estas prestações têm uma relação direta e imediata com o conjunto da atividade económica do sujeito passivo, permitindo o direito à dedução da totalidade do IVA das referidas prestações.

Debateu-se se os inputs associados à alienação de participações sociais poderão ser suscetíveis de permitir a dedução do IVA, por via da respectiva qualificação como despesas gerais da atividade, no caso de aquela alienação não estar sujeita a IVA, situação mais frequente, como vimos, nas holdings, ou então, estar sujeita mas isenta, como acontece com a sociedade‑mãe que gere um grupo de sociedades.

No caso da não sujeição, o Advogado-geral, apoiando-se nas conclusões do Caso Krettztechnik, n.º 36, considera suscetível este tipo de despesas serem qualificadas como despesas gerais, possuindo portanto uma relação direta e imediata com o conjunto da atividade económica do sujeito passivo, possibilitando a sua dedução.

Pelo contrário, no caso de a alienação de participações sociais se qualificar como isenta de IVA, tal como aconteceu no Caso SKF, o Advogado-geral, apoiando-se nas conclusões do Caso BLP Group, considerou que o IVA pago a montante das prestações adquiridas possuem uma relação direta e imediata com a operação isenta, interrompendo assim a cadeia do IVA.

Ora o TJUE, no Caso SKF, vem pôr o acento tónico no facto de se saber se a sociedade que é sujeito passivo do IVA está ou não envolvida na gestão das sociedades em que tiver ocorrido a tomada de participação, sociedades estas que desenvolvem atividades tributadas.

Neste sentido, considerou o Tribunal que recusar o direito à dedução de IVA pago a montante por despesas de consultoria ligadas a uma transmissão de ações isenta em razão da envolvência na gestão da sociedade cujas ações são cedidas e admitir este direito à dedução para tais despesas ligadas a uma transmissão que se situa fora do âmbito da aplicação do IVA pelo facto de constituírem despesas gerais do sujeito passivo levaria a um tratamento fiscal diferente de operações objetivamente semelhantes, em violação do princípio da neutralidade fiscal[41].

No que toca à dedução do IVA, o TJUE já concluiu no Caso Kretztechnik [42] que numa emissão de ações (apesar de ser, por si só, uma operação que não é abrangida pelo âmbito de aplicação do IVA, dado não se qualificar como transmissão de bens ou prestação de serviços) efetuada num contexto de reforço de capital em proveito da atividade económica geral de uma sociedade, se considera que os custos das prestações adquiridas[43] por uma sociedade fazem parte das suas despesas gerais e são, enquanto tais, elementos constitutivos do preço dos seus produtos.

Como decidiu o TJUE neste Caso, “O direito à dedução do IVA que incidiu sobre a aquisição de bens ou serviços a montante pressupõe que as despesas efetuadas com a sua aquisição tenham feito parte dos elementos constitutivos do preço das operações tributadas a jusante com direito à dedução (…).

Porém, admite-se igualmente o direito à dedução a favor do sujeito passivo, mesmo na falta de uma relação direta e imediata entre uma determinada operação a montante e uma ou várias operações a jusante com direito à dedução, quando os custos dos serviços em causa fazem parte das suas despesas gerais e são, enquanto tais, elementos constitutivos do preço dos bens que fornece ou dos serviços que presta. Estes custos têm, com efeito, uma relação direta e imediata com o conjunto da atividade económica do sujeito passivo.” (cfr. §§ 57 e 58)

 

“Por fim, importa lembrar que o direito à dedução é conferido relativamente ao IVA pago a montante pelas prestações realizadas no quadro de operações financeiras se o capital adquirido com estas últimas operações tiver sido afetado às atividades económicas do interessado. Por outro lado, as despesas relacionadas com as prestações a montante têm uma ligação direta e imediata com as atividades económicas do sujeito passivo nos casos em que são exclusivamente imputáveis a atividades económicas efetuadas a jusante e, portanto, são parte apenas dos elementos constitutivos do preço das operações abrangidas pelas referidas atividades (v. acórdão Securenta, já referido, n.os 28 e 29).

 

Decorre do que antecede que deve responder se à terceira questão que o direito à dedução do IVA pago a montante sobre prestações destinadas a realizar uma transmissão de ações é conferido, por força do artigo 17.°, n.os 1 e 2, da Sexta Diretiva, na redação resultante do seu artigo 28.° F, n.° 1, e do artigo 168.° da Diretiva 2006/112, se existir uma relação direta e imediata entre as despesas relacionadas com as prestações a montante e o conjunto das atividades económicas do sujeito passivo.” (cfr. §§ 71 a 73)

 

Também no que se refere à aquisição e detenção de ações, as despesas incorridas serão dedutíveis como despesas gerais, na medida em que tenham “um nexo direto e imediato com o conjunto da atividade económica [da holding]”, como poderão ser os serviços de apoio à gestão das suas participadas[44].

Como vimos, no âmbito da aquisição e detenção de participações sociais, a existência, pela participante, de uma interferência direta ou indireta na gestão da participada condiciona o enquadramento no âmbito da atividade económica das holding, suscitando o direito à dedução do IVA suportado com as despesas relacionadas a montante.

Nesta medida, sendo a aquisição uma operação, por natureza, passiva, a dedutibilidade do IVA das despesas associadas, no todo ou em parte, à mesma, estaria, em rigor, condicionada à forma como a titularidade da mesma será exercida no futuro, ou seja, de forma meramente passiva, limitando-se ao recebimento dos lucros a ela associados ou, alternativamente, de forma ativa, com interferência direta ou indireta na gestão da mesma, dela resultando um prolongamento de uma atividade tributada.

Como salienta Rui Bastos[45], “Não se deverá ver condicionado o direito à dedução das despesas gerais suscetíveis de ser imputadas à componente tributada da atividade económica do sujeito passivo (serviços de apoio à gestão), como poderá acontecer com assistência jurídica contratada a terceiros, estudos em matéria de internacionalização do grupo, gastos administrativos, etc., desde que se comprove a afetação de recursos, como poderão ser os recursos humanos, à referida atividade tributada, qualificando-se aqueles encargos como gastos gerais da atividade e, como tal, repercutíveis no preço das operações tributadas e, portanto, suscetíveis de conferirem integral dedução do IVA, sendo que não se vislumbra, a este nível, nenhuma razão para um tratamento diferenciado de uma holding mista de uma sociedade operacional”.

Como nota o autor, seja numa holding mista, seja numa sociedade-mãe, seja ao nível da aquisição ou detenção, ou no plano da sua alienação, o tratamento em sede de IVA da dedutibilidade dos inputs deverá ser o mesmo. Tratar de forma diferente a dedutibilidade do IVA de inputs consoante a opção estratégia de organização empresarial ou um plano de negócios de expansão de uma atividade económica, seja pela constituição de uma filial ou a criação de uma mera sucursal, gerir diretamente uma atividade tributada ou, por via indireta, mediante a intermediação de uma participação, conduziria a um tratamento discriminatório de situações objetivamente idênticas.

Por sua vez, como o TJUE notou no Caso Abbey[46], “fazem parte das despesas gerais do sujeito passivo e, como tais, são elementos constitutivos do preço dos produtos de uma empresa. Com efeito, mesmo no caso de transferência de uma universalidade de bens, quando o sujeito passivo não realiza mais operações após a utilização dos referidos serviços, os custos destes últimos devem ser considerados inerentes ao conjunto da atividade económica da empresa antes da transmissão.” (cfr. § 35)

(…)

“qualquer outra interpretação (…) seria contrária ao princípio que exige que o sistema do IVA seja de uma perfeita neutralidade quanto à carga fiscal de todas as atividades económicas da empresa, na condição de estas estarem elas próprias sujeitas ao IVA, e poria a cargo do operador económico o custo do IVA no âmbito da sua atividade económica sem lhe dar a possibilidade de o deduzir (ver neste sentido, acórdão Gabalfrisa (…)). Assim, proceder-se-ia a uma distinção arbitrária entre, por um lado as despesas efetuadas para os fins de uma empresa antes da exploração efetiva desta e das efetuadas no decurso da referida exploração e, por outro lado, as despesas efetuadas para pôr termo a esta exploração. Os diversos serviços utilizados (…) para os fins da transferência duma universalidade de bens ou de parte dela mantêm portanto, em princípio, uma relação direta e imediata com o conjunto da atividade económica deste sujeito passivo.” (cfr. §§ 35 e 36)

 

2.2 Jurisprudência do CAAD

 

No Processo n.º 77/2012-T, de 27 de Dezembro de 2012, estava em causa saber se uma sociedade gestora de participações sociais que presta serviços às suas participadas e cujos colaboradores estão principal e quase exclusivamente afetos a essa prestação de serviços pode deduzir todo o IVA suportado a montante com a aquisição de bens e serviços, e inclusivamente o conexionado com atividades como a detenção de participações sociais, o recebimento de dividendos e juros derivados de empréstimos as suas participadas e determinados serviços e pagamentos.

Começou o Tribunal por referir as Conclusões do Caso Portugal Telecom do TJUE, no contexto do qual se deve afastar “o obstáculo conceitual suscitado pela Autoridade Tributária e Aduaneira da inadmissibilidade de dedução integral do IVA suportado por uma SGPS, atenta a sua natureza, quando se trata de uma sociedade deste tipo que presta serviços às suas participadas” [47].

Neste contexto, o Tribunal conclui que a Requerente tem razão ao defender, em primeira linha, que o direito à dedução nasce de uma relação de utilização: se os recursos foram utilizados pela Requerente em atividades que conferem direito a dedução, o IVA será dedutível, independentemente do peso relativo em termos de valor gerado por essa atividade no confronto com a totalidade dos proveitos.

Por outro lado, citando jurisprudência do TJUE, nota-se que «admite-se igualmente um direito a dedução a favor do sujeito passivo, mesmo na falta de um nexo direto e imediato entre uma determinada operação a montante e uma ou várias operações a jusante com direito a dedução, quando os custos dos serviços em causa fazem parte das suas despesas gerais e são, enquanto tais, elementos constitutivos do preço dos bens que fornece ou dos serviços que presta. Estes custos têm, com efeito, um nexo direto e imediato com o conjunto da atividade económica do sujeito passivo».

Neste contexto, o Tribunal conclui que tem cobertura legal a dedução pela Requerente de todo o IVA suportado com serviços e bens adquiridos que tenham nexo direto e imediato com os serviços prestados às suas participadas com direito a dedução ou que, não tendo nexo direto e imediato com determinados serviços, seja IVA suportado com custos que fazem parte das despesas gerais da Requerente que tenham nexo direto e imediato com o conjunto da sua atividade económica.

Igualmente em processo similar ao controvertido (Processo n.º 128/2012-T), já este Tribunal teve ocasião de se pronunciar, em 23 de Abril de 2013, sobre a dedutibilidade de despesas suportadas por uma sociedade operacional, “que tem como atividades principais a fabricação de … e produtos destinados à sua produção e adquire participações noutras sociedades e intervém na sua gestão com o objetivo de potenciar a sua atividade principal, designadamente expandindo internacionalmente a sua área de vendas a novos mercados e assegurando condições para a comercialização dos seus produtos”.

A questão que se colocou foi a de saber se a Requerente poderia deduzir o IVA suportado com a aquisição de bens e serviços necessários à aquisição dessas participações sociais e intervenção noutras empresas.

Neste caso invocou-se igualmente o Acórdão do TJUE de 6 de Setembro de 2012 proferido no Caso Portugal Telecom.

Como se nota, a interferência da Requerente «na gestão das sociedades em que tomou participações constitui uma atividade económica», para efeitos de tributação em IVA, estando a Requerente autorizada a deduzir o IVA pago a montante, na condição de os serviços adquiridos a montante apresentarem um nexo direto e imediato com operações económicas a jusante com direito à dedução.

Para além disso, como se refere no mesmo Acórdão, «admite-se igualmente um direito a dedução a favor do sujeito passivo, mesmo na falta de um nexo direto e imediato entre uma determinada operação a montante e uma ou várias operações a jusante com direito a dedução, quando os custos dos serviços em causa fazem parte das suas despesas gerais e são, enquanto tais, elementos constitutivos do preço dos bens que fornece ou dos serviços que presta. Estes custos têm, com efeito, um nexo direto e imediato com o conjunto da atividade económica do sujeito passivo».

Nestes termos, conclui este Tribunal que “Assim, tem cobertura legal a dedução pela Requerente de todo o IVA suportado com serviços e bens adquiridos que tenham nexo direto e imediato com os serviços prestados às suas participadas com direito a dedução ou que, não tendo nexo direto e imediato com determinados serviços, seja IVA suportado com custos que fazem parte das despesas gerais da Requerente que tenham nexo direto e imediato com o conjunto da sua atividade económica.

No caso em apreço, provou-se a aquisição de participações e os estudos relacionados com elas, bem como a intervenção de colaboradores da Requerente em sociedades participadas, fiscalizando a atividade desenvolvida e a formação de recursos humanos destas, se inserem na sua estratégia global de comercialização dos seus produtos (… e …), tendo em vista obtenção de novos mercados com ligação com empresas locais (Líbano e vários países africanos) e assegurar o transporte desse produtos (terminal portuário de …) em comercialização interna (caso da aquisição da J... –, S.A.)

Assim, apesar de não se ter provado um nexo direto e imediato entre as despesas de consultadoria que foram objeto das correções efetuadas pela Autoridade Tributária e Aduaneira e uma ou várias operações a jusante com direito a dedução, provou-se que a existência de um nexo direto e imediato entre essas despesas e o conjunto da atividade económica da Requerente, pelo que os custos dos serviços em causa fazem parte das suas despesas gerais e são, enquanto tais, elementos constitutivos do preço dos bens que fornece ou dos serviços que presta, tratando-se, portanto, de custos com «um nexo direto e imediato com o conjunto da atividade económica do sujeito passivo», o que, na perspetiva da referida jurisprudência do Tribunal de Justiça da União Europeia basta para conferir o direito à dedução.”

Sucede que, entretanto, tal como invoca a Requerente, o Tribunal Arbitral teve ocasião de se pronunciar por diversas vezes no mesmo sentido referido.

Tal como nota a Requerente, a decisão do Tribunal de Justiça da União Europeia referente ao Caso SKF (já previamente mencionado), onde estava em causa saber, entre outros, se o IVA incorrido nos inputs relacionados com a venda de participações sociais seria dedutível ou não, vem deixar claro que “admite-se igualmente um direito a dedução a favor do sujeito passivo, mesmo na falta de um nexo direto e imediato (sublinhado nosso) entre uma determinada operação a montante e uma ou várias operações a jusante com direito a dedução, quando os custos dos serviços em causa fazem parte das suas despesas gerais e são, enquanto tais, elementos constitutivos do preço dos bens que fornece ou dos serviços que presta. Estes custos têm, com efeito, um nexo direto e imediato com o conjunto da atividade económica do sujeito passivo”. Ademais, no Caso Portugal Telecom o TJUE foi perentório em definir que se deve afastar “o obstáculo conceitual suscitado pela Autoridade Tributária e Aduaneira da inadmissibilidade de dedução integral do IVA suportado por uma SGPS, atenta a sua natureza, quando se trata de uma sociedade deste tipo que presta serviços às suas participadas”, concluindo que o direito à dedução nasce de uma relação de utilização: se os recursos foram utilizados pela Requerente em atividades que conferem direito a dedução, o IVA será dedutível, independentemente do peso relativo em termos de valor gerado por essa atividade no confronto com a totalidade dos proveitos.

Tal ideia é ainda reforçada no ponto 2 das conclusões do Acórdão CIBO que, não obstante estar relacionado com a tomada (e não venda) de participações sociais, permite retirar a ideia principal que expusemos acima quando refere “[a]s despesas efectuadas por uma holding com os vários serviços que adquiriu no âmbito de uma tomada de participação numa filial fazem parte das suas despesas gerais, pelo que têm, em princípio, um nexo directo e imediato com o conjunto da sua actividade económica. Portanto, se a holding efectuar tanto operações com direito a dedução como operações sem direito a dedução, decorre do artigo 17.°, n.° 5, primeiro parágrafo, da Sexta Directiva 77/388 que pode unicamente deduzir-se a parte do imposto sobre o valor acrescentado proporcional ao montante respeitante à primeira categoria de operações.

Ora, da análise à documentação em apreço constata-se que os inputs aqui em causa, relacionados com serviços de consultoria, de apoio legal e fiscal e de corporate finance, se consubstanciam como despesas gerais relacionadas com a atividade económica da Requerente como um todo, tendo sido incorridos no âmbito de uma reestruturação do grupo, que envolveu a alienação de participações sociais.

No que se refere ao cálculo do pro rata, como invoca a Requerente, não são incluídas as transmissões de bens do ativo imobilizado que tenham sido utilizadas na atividade da empresa nem as operações imobiliárias ou financeiras que tenham um carácter acessório em relação à atividade exercida pelo sujeito passivo, sendo que a mais-valia resultante da venda de participações sociais não faz parte integrante de uma atividade económica, e não deve, como tal, ser incluída no cálculo do pro rata da Requerente. No tocante aos juros recebidos pela A..., consubstanciam operações financeiras acessórias, uma vez que, para a realização de tais operações de financiamento, a Requerente utiliza de forma muito limitada bens ou serviços pelos quais o IVA é devido

Destarte, deve a presente ação arbitral ser julgada procedente, devendo o IVA suportado pela Requerente com as despesas em causa ser considerado como dedutível – tendo em conta a conexão com a globalidade da atividade da holding, onde se inclui a atividade tributada por não provada, termos de acordo com os quais deve a Requerida ser condenada nos pedido e a autoliquidação impugnada anular-se parcialmente.

 

3.3 Pagamento de juros indemnizatórios

 

No que concerne ao pagamento de juros indemnizatórios, preconiza a jurisprudência dos nossos tribunais superiores que deve encontrar-se preenchido o pressuposto do “erro imputável aos serviços” que o artigo 43.º, n.º 1, da LGT, reclama para o nascimento da obrigação de juros indemnizatórios.

Como se refere no Acórdão do STA, no Processo n.º 049/16, de 10 de Maio, que acompanhamos, “Foi esta a solução sustentada pelo citado acórdão de 02-12-2015, do Pleno desta Seção, Proc. 01524. Como se escreveu no acórdão deste STA, de 30-05-2012, proc. 410:b“Diz o n.º 1 do art. 43.º da LGT, ao abrigo da qual foi proferida a condenação ora recorrida: «São devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido».

Ou seja, quando um acto de liquidação de um tributo for declarado em processo de reclamação graciosa ou de impugnação judicial viciado por erro imputável aos serviços e do qual tenha resultado o pagamento de uma dívida tributária em montante superior ao legalmente devido, há direito a juros indemnizatórios, nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 43.º da LGT.

Ora, é inquestionável que, quando se detecta um vício respeitante à relação jurídica tributária, se impõe a atribuição de uma indemnização ao contribuinte, pois a existência desse vício implica a lesão de uma situação jurídica subjectiva, consubstanciada na imposição ao contribuinte da efectivação de uma prestação patrimonial contrária ao direito.

Por isso, se pode justificar que, nestas situações, não havendo dúvidas em que a exigência patrimonial feita ao contribuinte implica para ele um prejuízo não admitido pelas normas fiscais substantivas, se dê como assente a sua existência e se presuma o montante desse prejuízo, fazendo-se a sua avaliação antecipada através da fixação de juros indemnizatórios a favor daquele.”

 

Nos casos de autoliquidação, o erro não pode ser originariamente imputado aos serviços pela razão simples de que estes não tiveram qualquer intervenção na quantificação do imposto a pagar, a qual foi integralmente realizada pelo sujeito passivo.

 

Porém, tal erro deve considerar-se como tendo sido assumido pelos serviços, entre outros casos, a partir do momento em que estes, em procedimento gracioso de reclamação (ou outros) indeferem ilegalmente o pedido dirigido à sua correção ou deixam passar o prazo que a lei fixa para decidirem (a partir do momento em que ocorre o chamado indeferimento tácito), vindo a ilegalidade da liquidação (a constatação do “erro”) a ser declarada posteriormente por um tribunal.

Dai que a Requerente tenha – bem – pedido a condenação da Requerida no pagamento de juros indemnizatórios contados (apenas) desde a data limite para ser expressamente decidida a reclamação graciosa, o que não aconteceu.

Procede assim este pedido.

 

 

IV. Dispositivo

 

Termos em que se decide neste Tribunal Arbitral:

a) Julgar totalmente procedente o pedido de declaração de ilegalidade parcial do ato de autoliquidação de IVA relativos ao último trimestre de 2021 e segundo trimestre de 2022;

b) Anular a decisão administrativa impugnada;

c) Anular parcialmente os atos tributários de autoliquidação de IVA;

d) Condenar a Requerida na restituição do imposto indevidamente pago pela Requerente no montante de € 86 786.59;

e) Julgar procedente o pedido de juros indemnizatórios;

b) Condenar a Requerida nas custas do processo, abaixo fixadas.

 

* * *

De harmonia com o disposto no artigo 306.º n.º 2, do CPC e 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT, e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se ao processo o valor de € no montante total de 86 786.59 (oitenta e seis mil, setecentos e oitenta e seis euros e cinquenta e nove cêntimos).

Nos termos do artigo 22.º, n.º 4, do RJAT, fixa-se o montante das custas em € 2. 754 (dois mil setecentos e cinquenta e quatro euros), nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, a cargo da Requerida[48].

 

Notifique -se

 

  30 de novembro de 2023

 

Texto elaborado em computador, nos termos do artigo 131.º, n.º 5, do Código de Processo Civil (CPC), aplicável por remissão do artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT.

 

 

Os Árbitros

 

Rui Duarte Morais (Árbitro-Presidente)

 

Clotilde Celorico Palma (Árbitra Vogal Relatora)

 

 

José Joaquim Monteiro Sampaio e Nora (Árbitro Vogal)

 

 

 

 



[1] Cfr., XAVIER DE BASTO, A tributação do consumo e a sua coordenação internacional, CCTF n.º 164, Lisboa 1991, p. 39 a 73 e CLOTILDE CELORICO PALMA, Introdução ao Imposto sobre o Valor Acrescentado, Cadernos IDEFF n.º1, Almedina, 6ª edição, Setembro 2015, pp. 19 a 34.

[2] Cfr. XAVIER DE BASTO, A tributação do consumo …,  p. 41.

[3] Diretiva 2006/112/CE, de 28 de Novembro, publicada no JO n.º L 347, de 11 de Dezembro de 2006.

[4] Cfr. MÁRIO ALEXANDRE, “Imposto sobre o Valor Acrescentado, Exclusões e Limitações do Direito à Dedução”, Ciência e Técnica Fiscal, 350, Abril-Junho, de 1998, e CLOTILDE CELORICO PALMA, “IVA – Algumas notas sobre as exclusões do direito à dedução”, Fisco n.ºs 115/116, Setembro 2004.

[5] Sobre estas regras vide, XAVIER DE BASTO e MARIA ODETE OLIVEIRA, “Desfazendo mal-entendidos em matéria de direito à dedução de Imposto sobre o Valor Acrescentado: As recentes alterações do artigo 23.° do Código do IVA”, Revista de Finanças Públicas e Direito Fiscal, Ano 1, RITA LA FERIA, “A Natureza das Atividades e Direito à Dedução das Holdings em Sede de IVA”, Revista de Finanças Públicas e Direito Fiscal, Ano 4, n.º 3, 2012, pp. 171-197, RUI LAIRES, “Acórdão do Tribunal De Justiça das Comunidades Europeias (TJCE), de 13 de Março de 2008 (Processo c-437/06, Caso Securenta) ”, Ciência e Técnica Fiscal, n.º 421, Janeiro-Junho, 2008, pp. 209-264, “Acórdão do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias (TJCE), de 12 de Fevereiro de 2009 (Processo C-515/07, Caso VNLTO)”, Ciência e Técnica Fiscal, n.º 423, Janeiro-Junho, 2009, pp. 253-294,ALEXANDRA MARTINS “As operações relativas a participações sociais e o direito à dedução do IVA. A jurisprudência SKF”, Estudos em memória do Prof. Doutor J. L. Saldanha Sanches, Coimbra Editora, Volume IV, 2011 e EMANUEL VIDAL LIMA, “Dois casos sobre o direito à dedução em IVA”, livro de homenagem à Dra. Teresa Graça Lemos, Cadernos de Ciência e Técnica Fiscal, Junho de 2007, pp. 113 a 122.

[6] Acórdão de 6 de Abril de 1995, Proc. C-4/94, Colect., p. I-983, n.ºs 18 e 19. Estava em causa o alcance da expressão “ (…) utilizados para (…)”, empregue no artigo a que atualmente corresponde o artigo 168.º da DIVA.

[7] Conforme referiu o TJUE no Caso Midland Bank, Acórdão de 8 de Junho de 2000, Proc. C-98/98, Colect., p. I- 4177, n.º 25.

[8] Conclusões do Advogado-geral António Saggio apresentadas em 30 de Setembro de 1999 no Caso Midland Bank, cit., n.º 29.

[9] Cfr. JEAN-PIERRE MAUBLANC, « Déduction de la TVA d´amont : l´exigence d´un lien direct et immédiat est-elle justifiée ? », Revue du Marché commun et de l´Union européenne, n.º 494, 2005.

[10] Sobre o exercício do direito à dedução e a jurisprudência do TJUE, veja-se CLOTILDE CELORICO PALMA, “IVA – Algumas notas sobre os limites das exclusões do direito à dedução, op. cit.

[11] Acórdão de 6 de Julho de 1995, Caso BP Soupergaz, Proc.C-62/93, Colect., p. I-188, n.º 16.

[12] Acórdão de 21 de Setembro de 1988, Proc. 50/87, Colect., p. 4797, n.º15.

[13] Cfr. o n.º 59 do  Acórdão de 8 de Janeiro de 2002, Caso  Metropol, Proc.C-409/99, Colect., p. I-00081.

[14] Veja-se, a este propósito, nomeadamente, o Acórdão de 14 de Fevereiro de 1985, Caso Rompelman, Recueil 1985, p.00655. Nos casos Lennartz (Acórdão de 11 de Julho de 1991, Proc. C-97/90, Colect, p. I-03795), Inzo (Acórdão de 29 de Fevereiro de 1996, Proc. C-110/94, Colect., p. I-857), e Gabalfrisa (Acórdão de 21 de Março de 2000, Proc.s apensos C-110/98 a C-147/98, Colect., p. I-1577), suscitaram-se questões análogas às do Caso Rompelman, designadamente o âmbito de aplicação do conceito de atividade económica e a inclusão dos atos preparatórios neste conceito, tendo o Tribunal confirmado esta jurisprudência. Mais recentemente veja-se, nomeadamente, o Acórdão de 22 de Março de 2011, Caso Klub Ood, Proc. C-153/11, ainda não publicado na Coletânea.

[15] Veja-se no Proc. C503 2002012, disponível no site da AT em Informações fiscais, Informações vin­culativas, IVA.

[16] Veja-se a este propósito, igualmente, o Acórdão de 15 de Janeiro de 1989, Caso Ghent Coal Terminal, Proc. C-37/95, Colect., p.I-1.

[17] V., neste sentido, Casos, já referidos, Lennartz, n.° 15, e Eon Aset, n.° 57.

[18] V., neste sentido, Acórdão de 8 de Março de 2001, Caso Bakcsi, Proc. C‑415/98, Colect., p. I‑1831, n.° 29. A questão de saber se o sujeito passivo agiu nessa qualidade é uma questão de facto que deve ser apreciada tendo em conta todos os dados da situação em causa.

[19] Acórdão de 8 de Março de 1988, Caso Intiem, Proc. 165/86, Colect., p. 1471, n.º 14.

[20] V., neste sentido, Caso Rompelman, já referido, n.° 22, e Acórdão de 23 de Abril de 2009, Caso Puffer, Proc., C‑460/07, Colect., p. I‑3251, n.° 47.

[21] V., Acórdãos de 1 de Dezembro de 1998, Caso Ecotrade, Proc. C-200/97, Colect., p. I.-7907, n.ºs 63 e 64, de 21 de Outubro de 21010, Caso Nidera, Proc. C-385/09, Colect., p. I-0385, n.° 42, de 22 de Dezembro de 2010, Caso Dankowski, C-438/09, Colect., p. I-14009, n.° 35, e Acórdão de 12 de Julho de 2012, Caso SEM, Proc. C-284/11, ainda não publicado na Coletânea, n.º 63).

[22] Conclusões do Advogado-geral Paolo Mengozzi, apresentadas em 22 de Dezembro de 2008 no Proc. C-515/07, tendo por base um reenvio prejudicial efetuado pelo Hoje Raad der Nederlanden (Países Baixos), onde se solicita que o TJUE se pronuncie sobre a questão de saber se o direito de deduzir o IVA pago a montante se aplica não apenas à aquisição de bens de investimento mas pode abranger a aquisição de outros bens e serviços utilizados quer para operações profissionais efetuadas a jusante quer para outros fins, nomeadamente, atividades de natureza não económica.

[23] Sobre este tema do requisito da relação direta e imediata à dedução do IVA vide Jean-Pierre Maublanc, Déduction de la TVA d´amont : l´exigence d´un lien direct et immédiat est-elle justifiée ?, op. cit., pp. 611 e ss.

[24]Acórdão de 29 de Outubro de 2009, Caso SKF, Proc. C-29/08, Colect. p. I-10413, n.° 58 e jurisprudência citada. A SKF, sociedade anónima, é a sociedade‑mãe de um grupo industrial com atividades em vários países. Participa ativamente na gestão das suas filiais e presta‑lhes serviços remunerados, tais como a gestão, a administração e a política comercial. A SKF é sujeito passivo de IVA relativamente a estas prestações faturadas às filiais, tendo procedido, no âmbito de uma estratégia de reorganização do grupo, à alienação da totalidade das participações numa filial e a participação remanescente numa associada (26,5%), anteriormente detida em 100%, conseguindo por via de tal facto libertar meios financeiros que visaram financiar as restantes atividade do grupo. Face à informação prévia favorável à dedução do IVA pago a montante sobre serviços adquiridos no âmbito daquela transmissão (redação de contratos, consultadoria jurídica especializada, serviços de avaliação de títulos e de assistência nas negociações).

[25] Acórdão de 27 de Setembro de 2001, Proc. C-16/00, Colect., p. I‑6663.

 

[26] Acórdão de 3 de Março de 2005, Proc. C-32/03, Colect. p. I-01599, n.º 19. 

[27]Acórdão de 29 de Abril de 2004, Proc C-77/01, Colect. p. I-04295.

[28] Apresentadas em 12 de Setembro de 2002, n.º 39.

[29] Acórdão de 20 de Junho de 1991, Caso Polysar, Proc. C-60/90, Colect., p. I-3111.

[30] O mesmo entendimento já havia sido adoptado pelo TJUE no Acórdão de 20 de Junho de 1996, Caso Wellcome  Trust, Proc. C-155/94, Proc. C‑155/94, Colect. p. I‑3013, em que estava em causa a compra e venda de ações no quadro da gestão de um “trust”.

[31] Sobre estas conclusões veja-se, nomeadamente, os Acórdãos de 20 de Junho de 1991, Caso Polysar, Proc. C-60/90, já cit., de 22 de Junho de 1993, Caso Satam/sofitam, Proc. C-333/91, Colect. p. I-3513, de 14 de Novembro de 2000, Caso Floridienne e Berginvest, Proc. C-142/99, Colect. p. I-9567, e de 27 de Setembro de 2001, Caso Cibo Participations, Proc. C-16/00, já cit..

[32] Acórdão de 22 de Junho de 1993, Caso Satam/sofitam, Proc. C-333/91, já cit.

[33] Acórdão de 14 de Novembro de 2000, Caso Floridienne e Berginvest, Proc. C-142/99, já cit. A Floridienne era uma sociedade holding que encabeçava um grupo de sociedades no domínio da química, dos plásticos e das indústrias agro-alimentares, e a Berginvest, uma sociedade holding intermédia que dominava o subgrupo dos plásticos, sustentando ambas que intervinham direta ou indiretamente na gestão das suas filiais, nomeadamente fornecendo-lhes serviços administrativos, contabilísticos e informáticos, bem como concedendo-lhes empréstimos de financiamento.

[34] Expressão utilizada pela primeira vez por parte do TJUE no Caso Polysar, que viria a ser delimitada no Caso Floridienne.

[35] Vide, nomeadamente, Acórdãos de 20 de Junho de 1991,Caso Polysar, Proc. C‑60/90, já cit., n.° 14, de 14 de Novembro de 2000, Caso Floridienne e Berginvest, Proc. C‑142/99, já cti., n.° 18, despacho de 12 de Julho de 2001, Caso Welthgrove, Proc. C‑102/00, Colect., p. I‑5679, n.° 15, e Acórdão de 27 de Setembro de 2001, Caso Cibo, Proc. C‑16/00, já cit, n.° 20.

[36] A propósito das sociedades holding refere RITA DE LA FERIA, in “A Natureza das Atividades e Direito à Dedução das Holdings em Sede de IVA”, op. cit., p. 189, que se considera que a holding tem uma “interferência direta ou indireta na gestão” das sociedades participadas sempre que se verifiquem as seguintes condições: (a) As atividades não sejam apenas exercidas a título ocasional (Acórdão Floridienne); (b) As atividades não se limitem a gerir os investimentos a exemplo dum investidor privado (Acórdão Floridienne); (c) As atividades sejam efetuadas no âmbito dum objetivo empresarial ou com finalidade comercial (Acórdão Floridienne); (d) pelo menos parte das atividades constituam transações sujeitas a IVA para efeitos do artigo 2.º da Diretiva (Acórdão Welthgrove). Assim, como conclui, sempre que estas condições se verifiquem, uma holding ativa é considerada como tendo efetuado atividades económicas para efeitos do n.º 1 do artigo 9.º da DIVA.

[37] Vide, designadamente, Acórdãos de 20 de Junho de 1996, Caso Wellcome Trust, Proc. C‑155/94, já cit., n.° 35, e Caso Harnas & Helm, já cit., n.° 16 e jurisprudência aí mencionada.

[38] Cfr. RUI BASTOS, O direito à dedução do IVA, O caso particular dos inputs de utilização mista, dissertação de mestrado em Fiscalidade apresentada em 30 de Julho de 2012, na Escola Superior de Gestão do Instituto Politécnico do Cávado e do Ave, p. 69.

[39] Consistiam em serviços de avaliação de títulos, de assistência nas negociações e de consultoria jurídica especializada para a redação de contratos, portanto inequivocamente associadas à alienação das participações em causa.

[40] No referido caso, o TJUE considerou que aquela sociedade anónima, na qualidade de sociedade‑mãe de um grupo industrial, se envolveu na gestão da filial e da sociedade controlada, fornecendo‑lhe, a título oneroso, diversas prestações de serviços de natureza administrativa, contabilística e comercial, em relação às quais estava sujeita a IVA. Nestes temos, por via da venda das ações detidas na filial e na sociedade controlada, a SKF põe termo à sua participação nestas sociedades.

[41] Este princípio seria, com efeito, ignorado se uma sociedade‑mãe que gere um grupo de sociedades pudesse ser tributada pelas despesas efetuadas no quadro da venda de ações que faz parte da sua atividade económica, ao passo que uma sociedade holding que efetua a mesma operação fora do âmbito de aplicação do IVA beneficiaria do direito à dedução do IVA que onerou as mesmas despesas pelo facto de elas fazerem parte das despesas gerais da sua atividade económica global.

[42] Neste sentido veja-se o n.ºs 36 e 37 do Acórdão de 26 de Maio de 2005, Caso Kretztechnik, Proc. C‑465/03, Colect. p. I-4357, e jurisprudência aí mencionada.

[43] No caso, prestações relacionadas com a admissão a Bolsa na sequência de um aumento do capital através da emissão de ações ao portador.

[44] Cfr. Acórdão de 27 de Setembro de 2001, Caso Cibo, Proc. C-16/00, já cit., n.º 35.

[45] Cfr. RUI BASTOS, O direito à dedução do IVA, O caso particular dos inputs de utilização mista, op. cit., pp. 79 e 80.

[46] Acórdão de 22 de Fevereiro de 2001, Proc. C-408/98, Colect., p. I-1361.

[47]  Proc. C-496/11, Caso Portugal Telecom SGPS SA contra Fazenda Pública, publicado na Coletânea geral.

[48] De acordo com o Despacho de Retificação de 12 de dezembro de 2023.