Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 69/2013-T
Data da decisão: 2013-10-22  IRC  
Valor do pedido: € 3.735.709,67
Tema: Correcções ao lucro tributário de Realizações de Utilidade Social e Transmissão de Prestações Suplementares
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Decisão Arbitral

 

 

                Os árbitros Dr. Jorge Manuel Lopes de Sousa (árbitro-presidente), Dr.ª Maria Manuela do Nascimento Roseiro e Prof. Doutor Elísio Brandão (árbitros vogais), designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa para formarem o Tribunal Arbitral, constituído em 6-6-2013, acordam no seguinte:

               

                1. Relatório

 

                A..., S.A., NIPC..., apresentou, em 4-4-2013, um pedido de constituição do tribunal arbitral colectivo, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 2.º e 10.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, doravante apenas designado por RJAT), em que é Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira, com vista à:

(i) Declaração da ilegalidade parcial da liquidação de IRC e derrama municipal consequente e, bem assim, dos correspondentes juros compensatórios, n.º 2009..., relativa ao exercício de 2005 do Grupo Fiscal A..., no montante de € 3.694.807,16, com a sua consequente anulação nessa parte, por violação de lei e do princípio da legalidade, com todas as consequências legais;

(ii) Reembolso à Requerente do montante de € 1.259.261,19;

(iii) Pagamento de juros indemnizatórios sobre o montante de € 1.259.261,19, desde 27-12-2008 até ao seu integral reembolso; e

(iv) Indemnização pelos prejuízos decorrentes de prestação de garantia indevida, calculada com base nos custos incorridos com a prestação da mesma, acrescidos de juros à taxa legal calculados sobre esses custos e contados desde as datas em que foram incorridos até à data em que a Requerente seja ressarcida dos mesmos.

 

O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Exmo. Presidente do CAAD e notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira em 5-4-2013.

Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, na redacção introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, o Conselho Deontológico designou como árbitros do tribunal arbitral colectivo o Conselheiro Jorge Lopes de Sousa, a Dr.ª Maria Manuela do Nascimento Roseiro e o Prof. Doutor Elísio Brandão, que comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável.

A Autoridade Tributária e Aduaneira apresentou resposta, defendendo que o pedido de pronúncia arbitral deve ser julgado improcedente.

Em 22-5-2013 foram as partes devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a designação dos árbitros, nos termos conjugados do artigo 11.º n.º 1, alíneas a) e b) do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.

Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, na redacção introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, o tribunal arbitral colectivo foi constituído em 6-6-2013.

No dia 19-9-2013, realizou-se a reunião prevista no artigo 18.º do RJAT, em que foi designado o dia 8-10-2013, para efeitos de realização de inquirição de testemunhas, à qual se seguiria a produção de alegações orais. Foi designado o dia 29-10-2013 como limite para o efeito de prolação da decisão arbitral.

As partes apresentaram alegações,

O tribunal arbitral foi regularmente constituído e é materialmente competente, à face do preceituado nos arts. 2.º, n.º 1, alínea a), e 30.º, n.º 1, do DL n.º 10/2011, de 20 de Janeiro.

As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias e são legítimas (arts. 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e art. 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março).

O processo não enferma de nulidades e não foram invocadas excepções.

Assim, não há qualquer obstáculo à apreciação do mérito da causa.

 

                2. Matéria de facto

 

2.1. Factos provados

 

Com base nos elementos que constam do processo e do processo administrativo junto aos autos, consideram-se provados os seguintes factos:

 

  1. A Requerente é a sociedade dominante de um grupo de sociedades;
  2.  Na sequência de uma acção de inspecção externa, realizada em 2009, foram efectuadas correcções técnicas ao lucro tributável declarado, entre as quais as seguintes:

1º) Realizações de Utilidade Social, no montante de € 467.800,69, a que corresponde o imposto e juros compensatórios nos valores de € 127.721,28 e de € 11.693,08;

2º) Transmissão de Prestações Suplementares, no montante de € 11.923.318,97, a que corresponde o imposto e juros compensatórios de € 3.255.364,16 e € 300.028.63, respectivamente;

  1. A correcção relativa a “Realizações de utilidade social” foi baseada nas seguintes considerações que constam do Relatório da Inspecção (documento n.º 6, junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido)

 O sujeito passivo contabilizou na conta ... — Seguro de doença grupo o valor de €560.088.78 relativo ao valor líquido (prémio bruto deduzido da comparticipação dos trabalhadores) despendido com o prémio de seguro de saúde, relativo a funcionários, reformados e viúvas.

Desse valor, não acresceu ao lucro tributável, nomeadamente ao campo 206 do quadro 07 da declaração de rendimentos Modelo 22, a importância de €467.800,69, relativa à parte do prémio de seguro de saúde pago pela empresa para os cônjuges, filhos e ascendentes dos trabalhadores e dos reformados, bem como das viúvas e dos seus filhos e ascendentes.

De acordo com o nº 4 do artigo 23º do CIRC, excepto quando estejam abrangidos pelo disposto no artigo 40º, não são aceites como custo os prémios de seguros de doença e de acidentes pessoais, bem como as importâncias despendidas com seguros e operações do ramo "vida", contribuições para fundos de pensões e para quaisquer outros regimes complementares de segurança social que não sejam considerados rendimentos de trabalho dependente, nos termos da primeira parte do nº 3 da alínea b) do nº 3 do artigo 2º do CIRS.

Atendendo à natureza dos custos em análise, não podem os mesmos ser enquadrados no disposto no n.º 1 do artigo 40.º do CIRC por não se tratarem de encargos com a manutenção facultativa de creches, lactários, jardins-de-infância, cantinas, bibliotecas e escolas, bem como de outras realizações de utilidade social, como tal reconhecidas pela Direcção-Geral dos Impostos.

Por outro lado, de acordo com o nº 2 do artigo 40.º do CIRC, podem ser considerados como custo do exercício até ao limite de 15% das despesas com o pessoal escrituradas a título de remunerações, ordenados ou salários, os encargos suportados com contratos de seguros de doença e de acidentes pessoais, bem como contratos de seguros de vida, contribuições para fundos de pensões e equiparáveis ou para quaisquer regimes complementares de segurança social, que garantam, exclusivamente, o benefício de reforma, pré-reforma, complemento de reforma, benefícios de saúde pós-emprego, invalidez ou sobrevivência a favor dos trabalhadores da empresa.

Assim, face à natureza dos seguros em causa e aos beneficiários dos mesmos, não é enquadrável como custo nos termos do artigo 40º do CIRC o valor despendido pela empresa com seguros de saúde a favor de não trabalhadores da mesma.

Passemos agora a verificar o enquadramento dos mesmos custos enquanto rendimentos sujeitos a IRS nos termos da primeira parte do nº 3 da alínea b) do nº 3 do artigo 2º do CIRS, começando por referir que a empresa não os considerou como tal visto que não os ter incluído na declaração modelo 10.

Consideram-se rendimentos de trabalho dependente, nos termos da norma atrás citada, as importâncias despendidas, obrigatória ou facultativamente, pela entidade patronal com seguros e operações do ramo "vida", contribuições para fundos de pensões, fundos de poupança-reforma ou quaisquer regimes complementares de segurança social, desde que constituam direitos adquiridos ou individualizados dos respectivos beneficiários.

Não existindo entre os beneficiários e a empresa qualquer relação laboral ao abrigo do qual exista o direito destes aos benefícios em causas não se pode entender a empresa como sua entidade patronal pelo que fica impossibilitado de se verificar o principal requisito a que estes benefícios constituam rendimento de trabalho dependente.

Assim, não podem estes custos ser enquadrados como rendimentos de trabalho dependente nos termos da primeira parte do nº 3 da alínea b) do n.º 3 do artigo 2º do CIRS.

Em conclusão, tendo-se demonstrado que os custos com seguros de saúde para os cônjuges, filhos e ascendentes dos trabalhadores e dos reformados, bem como das viúvas e dos seus filhos e ascendentes não se enquadram no disposto no artigo 40.º do CIRC e simultaneamente, que não são considerados como rendimento de trabalho dependente nos termos da primeira parte do nº3 da alínea a) do nº 3 do artigo 2º do CIRS, será de corrigir à matéria tributável, nos termos da legislação acima indicada o montante de € 467.800,69 (quatrocentos e sessenta e sete mil oitocentos euros e sessenta e nove cêntimos) de acordo com o nº 4 do artigo 23.º do CIRC.

 

  1. A correcção relativa a “Transmissão de Prestações Suplementares” foi baseada nas seguintes considerações que constam do Relatório da Inspecção (documento n.º 6, junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido):

Em 28 de Setembro de 2001 a sociedade A… constituiu duas empresas — a B…, SA e a C…, SA ambas com sede na Av. …, … andar e com o capital social de €50.000,00 integralmente subscrito e realizado pela citada sociedade.

Nos termos do artigo 5º dos Documentos Complementares dos Contratos de Constituição das Sociedades B... e C..., existe para os sócios a obrigação acessória de efectuar, por uma ou mais vezes, Prestações Suplementares até ao montante global de € 250.000.000,00.

Até ao final de 2005 a A... efectuou Prestações acessórias sob a forma de Prestações Suplementares em ambas as sociedades, sendo a última decidida em Assembleia Geral de 28 de Novembro de 2005 (cfr. da acta nº 8 da AG), no valor de € 5.979.195,00 na sociedade C..., para cobertura da insuficiência dos capitais próprios.

Em 30 de Dezembro de 2005, através da escritura de aumento de capital da sociedade D..., Limitada, é efectuada a realização de uma nova quota de valor nominal de € 1.553.297,00, integralmente subscrita pela A..., através da entrada em espécie, transferindo a totalidade das acções representativas do capital das sociedades B... e C.... Com as acções entregues como entrada em espécie são transmitidas as Prestações Acessórias correspondentes à participação no Capital Social, no montante de € 4.961.466,00 e de € 8.500.000,00 para a B... e C..., respectivamente.

Até à realização desta operação a A... detinha uma participação de 50% na sociedade D..., passando com o aumento de Capital a deter 99,84% da mesma.

Para apuramento do valor contabilístico das acções das sociedades supra mencionadas bem como das correspondentes prestações acessórias recorreu à avaliação efectuada em 29 de Dezembro de 2005, pela sociedade "E... — Sociedade de Revisores Oficiais de Contas" inscrita sob o nº …, representada por F..., ROC nº ….

Transcreve-se abaixo o quadro constante do ponto 2 da avaliação efectuada pela E...:

Registe-se que o sujeito passivo tratou de forma diferente, a transmissão de acções e a transmissão de prestações acessórias:

– no que se refere à transmissão de acções registou a perda numa conta ... Alienação de investimentos Financeiros, pela diferença entre o custo de aquisição e o de avaliação – 0 montante global de € 84.849,76, foi acrescido no C 215 do quadro 07 da Declaração Modelo 22, expurgando assim, para efeitos fiscais, a perda;

– enquanto que em relação à transmissão das prestações acessórias sob a forma de prestações suplementares de capital, contabilizou numa conta ... –  Outros Custos e Perdas Financeiras, não tendo procedido ao acréscimo, no montante global de € 11.923.318,97 (€ 3.566.909,29 da B... e € 8.416.409,68 da C...), à declaração de rendimentos Modelo 22.

Da análise ao mapa 31 de mais e menos valias fiscais, retira-se que não foi apurada qualquer mais ou menos valia contabilística e fiscal com esta operação.

Assim importa aferir o enquadramento fiscal da transmissão das partes de capital:

De acordo com a alínea i) do n.º 1 do artigo 23º do CIRC são elegíveis como custo fiscal as menos valias realizadas que não estejam excluídas, total ou parcialmente, por norma específica constante do Código do IRC.

Constituem limitações à elegibilidade como custo com a transmissão de partes de capital as normas constantes dos n.º 5 a 7 do artigo 23º e n.º 3 do artigo 42º, todos do CIRC, assim temos que não são aceites como custos ou perdas do exercício:

i) os suportados com a transmissão onerosa de partes de capital, qualquer que seja o título por que se opere, quando detidas pelo alienante por período inferior a três anos e desde que as partes de capital tenham sido adquiridas a entidades com as quais existam relações especiais, nos termos. do n.º 4 do artigo 58º; a entidade com domicílio em país, território ou região com um regime de tributação claramente mais favorável, constante da lista aprovada por portaria do Ministro das Finanças; residentes em território português sujeitos a um regime especial de tributação (cfr. n.º 5 do artigo 23º CIRC).

ii) os suportados com a transmissão onerosa de partes de capital, qualquer que seja o título por que se opere, a entidades com as quais existam relações especiais, nos termos do n.º 4 do artigo 58º também do CIRC (cfr. n.º 7 do artigo 23º CIRC).

Nestes termos importa sublinhar que o n.º 4 do artigo 58º, na sua alínea a), define que "existem relações especiais entre duas entidades nas situações em que uma tem o poder de exercer, directa ou indirectamente, uma influência significativa nas decisões de gestão da outra, o que se considera verificado, designadamente", entre "uma entidade e os titulares do respectivo capital, (...) que detenham, directa ou indirectamente, uma participação não inferior a 10% do capital ou dos direitos de voto".

iii) a diferença negativa entre as mais valias e as menos valias realizadas mediante a transmissão onerosa de partes de capital concorre para a formação do lucro tributável em apenas metade do seu valor (cfr. n.º 3 do artigo 42.º CIRC).

Por último, consideram-se mais valias ou menos valias realizadas os ganhos obtidos ou as perdas sofridas relativamente a elementos do activo imobilizado mediante transmissão onerosa, qualquer que seja o titulo por que se opere, sendo que o seu valor resulta da diferença entre o valor de realização, líquido dos encargos que lhe sejam inerentes, e o valor de aquisição deduzido das reintegrações ou amortizações praticadas, conforme prevê o artigo 43.º do CIRC.

Procedendo agora à análise das operações, importa aferir a existência de relações especiais entre as entidades intervenientes, por forma a validar a aceitabilidade do custo nos termos do nº 7 do artigo 23º do CIRC.

Assim, no que se refere à existência de relações especiais entre as entidades intervenientes nesta operação, a A..., SA detinha uma participação de 50% na sociedade D..., pelo que se conclui-se que existem relações especiais entre elas, segundo o disposto alínea a) do n.º 4 do art.º 58.º do CIRC.

No que se refere ao tratamento fiscal dado pelo sujeito passivo relativamente à transmissão das acções das sociedades B... e C..., não há nada a contestar, pois acresceu correctamente as perdas contabilísticas apuradas no apuramento do lucro tributável evidenciado na declaração de rendimentos Modelo 22, em virtude da existência de relações especiais.

Relativamente ao custo apurado com a transmissão de prestações acessórias sob a forma de prestações suplementares de capital, importa mencionar que o sujeito passivo considerou como custo o montante apurado com a transmissão de prestações acessórias sob a forma de prestações suplementares de capital na B... e na C..., o total de € 11.923.318,97.

As prestações acessórias transmitidas nestas operações estavam contabilizadas na conta 41110000 — Investimentos Financeiros — Partes de Capital em empresas do grupo (sublinhado nosso). Por outro lado, os balanços das sociedades B... e C... evidenciam as prestações acessórias contabilizadas como parte do seu Capital Próprio, na rúbrica Prestações suplementares.

Importa avaliar se as prestações acessórias sob a forma de prestações suplementares de Capital constituem partes de Capital no sentido previsto na norma do n.º 7 do artigo 23.º do CIRC a qual afasta da aceitação como custo fiscal os encargos suportados com a sua transmissão a entidades relacionadas.

Previamente, refira-se ainda, quanto às prestações acessórias, o seguinte:

– Como resulta da leitura da Acta n.º 8 da Assembleia Geral de 28 de Novembro de 2005 da sociedade C..., atrás referida, bem como do artigo 5º – Prestações acessórias dos documentos complementares dos Contratos de Constituição das Sociedades de ambas as sociedades B... e C... pode ser exigido aos respectivos accionistas a titulo de obrigação acessória, prestações suplementares.

– As prestações acessórias sob a forma de prestações suplementares são um modo de financiamento da sociedade, através de Capitais Próprios e com vantagens para a mesma uma vez que, tal como descrito nos artigos 210.º a 213.º do Código das Sociedades Comerciais (CSC), não vencem juros e necessitam de estar reunidos vários requisitos para poderem ser restituídas aos sócios, mormente o respeito pelo principio da intangibilidade do Capital Social previsto no artigo 32.º do CSC;

– A exigibilidade de prestações suplementares acompanha a quota, ficando a obrigação do seu pagamento sujeita ao mesmo regime da realização desta, uma vez que, de acordo com o disposto no artigo 212.º do CSC só aos sócios podem ser exigidas prestações suplementares.

Igual entendimento tem Raúl Ventura no seu livro Sociedade por Quotas Vol. 1 (pág. 244), onde refere que "Amortizada a quota, extingue-se a obrigação de efectuar prestações suplementares..." e "Cedida a quota, a obrigação de efectuar prestações suplementares transmite-se, visto ser parte integrante da quota.", também Sofia Gouveia Pereira, em As Prestações Suplementares no Direito Societário Português (pág. 248), considera que "a obrigação de prestações suplementares é inerente à quota, transmitindo-se ao cessionário desta, porque deve ter como objectivo permitir uma estabilidade financeira da sociedade";

– A restituição das prestações suplementares depende sempre da deliberação dos sócios — n.º 2 do artigo 213.º do CSC;

A Comissão de Normalização Contabilística (CNC), autoridade nacional em matéria de normalização contabilística, define através do seu ofício n.º 8197 de 29 de Janeiro, que as prestações suplementares se integram nas partes de capital e devem ser contabilizadas pela sociedade participante em subdivisão especifica da subconta POC 411– Partes de Capital.

Nos termos do artigo 11.º da Lei Geral Tributária (LGT), na determinação do sentido das normas fiscais e na qualificação dos factos a que as mesmas se aplicam são observadas as regras e os princípios gerais de interpretação e aplicação das leis sendo que, de acordo com o n.º 2 do mesmo artigo, sempre que as normas fiscais empreguem termos próprios de outros ramos de direito, devem os mesmos ser interpretados no mesmo sentido daquele que aí têm, salvo se outro decorrer directamente da lei. Aplicando as regras de hermenêutica jurídica, e não existindo na legislação fiscal qualquer definição do conceito de partes de Capital, deve adoptar-se aquele que se encontra previsto no Código das Sociedades e que a legislação contabilística também consagra.

Assim, e tendo em conta o atrás exposto constitui a fundamentação da presente correcção o facto de se encontrar demonstrado que as perdas apuradas com a transmissão das prestações acessórias sob a forma de prestações suplementares de capital no Capital da B... Investimentos e Participações, SGPS, SA e C... — Investimentos e Participações, SGPS, SA constituem perdas apuradas com a transmissão de partes de capital entre entidades relacionadas as quais não são dedutíveis para efeitos fiscais nos termos do disposto no n.º 7 do artigo 23.º do CIRC, pelo que não é aceite o custo no montante de € 11.923.318,97.

Definida a fundamentação sobre a qual assenta a correcção em análise, impõe-se, ainda assim demonstrar a improficuidade de eventuais considerações diversas, de forma a reforçar o entendimento aqui defendido.

Nestes termos ainda que, o que apenas por mera hipótese de raciocínio se admite, não se entendesse as prestações acessórias sob a forma de prestações suplementares de Capital como Partes de Capital para efeitos de aplicação do enquadramento atrás apresentado, então importaria aferir em que medida a transmissão das referidas prestações acessórias estaria relacionada com a transmissão das acções da mesma empresa.

Como foi já descrito, as prestações acessórias enquanto sujeitas ao regime das prestações suplementares apresentam uma relação directa com a qualidade de sócio, sendo que apenas a este podem ser exigidas, designadamente na proporção da sua detenção de participação no Capital Social.

Verifica-se que a transmissão da participação inclui não só as acções mas arrasta a transferência de titularidade das prestações acessórias na proporção das acções transmitidas por forma a manter a proporcionalidade que cada accionista tem no Capital da sociedade (tanto no Capital Social como nas prestações suplementares que compõem o seu Capital Próprio), donde resulta que ambas fazem parte da mesma operação, pelo que o sentido e alcance da expressão "custos ou perdas (...) suportados com a transmissão onerosa de partes de capital" contido no n.º 7 do artigo 23.º do CIRC inclui todas as perdas apuradas numa operação de transmissão onerosa das partes de capital, designadamente as que derivam da transferência de prestações suplementares/acessórias.

É nesse sentido que o ROC responsável, ao determinar o valor a atribuir às prestações acessórias as faz equivaler à parte de Capital detida sobre a forma de acções quando distribui o valor patrimonial das sociedades cuja participação é transmitida de forma proporcional.

Em 2008/05/09, em resposta à notificação indica o ROC que, a este respeito poderiam existir outros critérios, considerando ser este o que melhor se adequa,"ou pelo menos mais objectivo" ao referir no ponto 4 da citada resposta que "A opção consistiu em conferirmos uma importância equivalente ao investimento efectuado (i) em acções das sociedades acima identificadas e (ii) aos fundos que nelas foram investidos sob a forma de prestações acessórias."

A admitir-se que pudesse ser de outra forma, tal significaria que o legislador teria deixado na total disponibilidade do contribuinte a repartição da contraprestação obtida na operação (transmissão conjunta de venda), pois sempre poderia optar por imputar as perdas às prestações suplementares/acessórias ou às partes sociais, em ordem a beneficiar do tratamento fiscal que fosse mais favorável. Daí que, para contrariar as práticas de manipulação fiscal dos resultados (propósito expresso do diploma que introduziu aquelas normas, conforme relatório do OE 2003), o legislador tenha utilizado uma expressão mais abrangente que cobre quaisquer custos ou perdas inerentes à transmissão onerosa de partes de capital e não só as menos valias apuradas com a operação.

Assim, a perda apurada com a transmissão das prestações acessórias constituiria um encargo inerente à venda das acções até porque se da distribuição do valor de realização se afectasse o correspondente ao valor nominal às prestações suplementares, seria apurada uma maior menos valia na alienação das acções. Posto isto, e como já referido, se por mera hipótese de raciocínio, não se entendesse as prestações acessórias sob a forma de prestações suplementares de capital como partes de capital para efeitos de aplicação do enquadramento atrás apresentado, as perdas registadas com a transmissão conjunta com as acções não podem ser aceites como custo nos termos do n.º 7 do artigo 23.º do CIRC, dado que representam um encargo associado à transmissão das acções representativas da participação no Capital.

Por último, importa referir que  se se entendesse as prestações acessórias apenas pela sua natureza de créditos, as perdas apuradas com a sua transmissão não seriam igualmente consideradas como custo fiscal. Com efeito, é particularmente difícil justificar, no âmbito da indispensabilidade, a cedência de um crédito por valor inferior ao valor nominal, excepto, eventualmente, na parte em que a diferença de valor se reporte aos riscos e incómodos de cobrança. Tratando-se, neste caso específico, de sociedades pertencentes ao mesmo grupo económico, tais riscos e incómodos não são significativos pelo que são negligenciáveis.

Desta forma, quanto à alienação onerosa dos créditos com prejuízo, é necessário considerar a situação dos créditos alienados para a correcta aplicação do requisito da indispensabilidade dos custos. Relativamente aos créditos da A..., SA sobre a B... e C... não era admitida a constituição de provisão para efeitos fiscais, de acordo com disposto na alínea a) do nº 1 do artigo 34.º e na alínea a) do n.º 3 do artigo 35.º, ambos do CIRC. Por consequência, a aceitação para efeitos fiscais da perda resultante da não cobrança do valor dos créditos em questão depende da satisfação das condições exigidas para a sua qualificação como créditos incobráveis.

O artigo 39.º do CIRC estipula que "os créditos incobráveis podem ser directamente considerados custos ou perdas do exercido na medida em que tal resulte de processo especial de recuperação de empresa e protecção de credores ou de processo de execução, falência ou insolvência, quando relativamente aos mesmos não seja admitida a constituição de provisão ou, sendo-o, esta se mostre insuficiente". O n.º 3 do artigo 268.º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (CIRE) refere ainda que "o valor dos créditos que for objecto de redução ao abrigo do plano de insolvência ou de plano de pagamentos, é considerado como custo ou perda do respectivo exercício, para efeitos de apuramento do lucro tributável dos sujeitos passivos de imposto sobre o rendimento das pessoas singulares e do imposto sobre o rendimento das pessoas colectivas".

Caso não fossem considerados estes preceitos no campo da dedutibilidade das perdas na alienação de créditos com prejuízo, passaria a ser possível antecipar como custos fiscais meras diminuições patrimoniais no valor de créditos, situação expressamente vedada pela lei, nomeadamente quando faltem os requisitos legais da improbabilidade do cumprimento ou da impossibilidade da exigência do crédito. Desta forma, torna-se indispensável para a aceitação fiscal como custo da totalidade das perdas apuradas com a alienação de créditos abaixo do valor nominal, de acordo com o n.º 1 do artigo 23.3 do Código do IRC, que o crédito seja incobrável, ou seja, que decorra relativamente ao devedor, processo especial de recuperação de empresa e protecção de credores ou processo de execução, falência ou insolvência, conforme critério previsto no artigo 39.º do CIRC.

Em conclusão, da transmissão da participação no capital das sociedades B... e C... pela A... à D... sob a forma de acções e prestações acessórias não pode resultar a determinação de qualquer perda para efeitos fiscais por aplicação do n.º 7 do artigo 23.º do CIRC, pelo que o resultado fiscal é acrescido em €11.923.318,97 (onze milhões, novecentos e vinte e três mil, trezentos e dezoito euros e noventa e sete cêntimos) relativo à perda imputada à transmissão das prestações acessórias sob a forma de prestações suplementares de capital.

  1. Na sequência dessas correcções a Requerente foi notificada da liquidação adicional de IRC (e derrama municipal consequente) n.º 2009 ..., relativa ao exercício de 2005, datada de 20-4-2009 e com compensação em 27-4-2009, que originou um valor a pagar, incluindo juros compensatórios, conforme demonstração de acerto de contas, de € 2.435.545,97 (Documento n.º 1, junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
  2. Na liquidação referida, a Administração Tributária liquidou juros compensatórios no montante de € 205.456,55, calculados até 26-12-2008) (documentos n.ºs 7 e 8, junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujos teores se dão como reproduzidos, que não são impugnados); 
  3. Na sequência da inspecção efectuada, também foram efectuadas correcções a favor da Requerente, que, se não fossem as correcções negativas, teriam dado origem a reembolso de imposto no montante de € 1.259.281,19 (documentos n.ºs 7 e 8 e artigos 13.º a 21.º da petição inicial, que não são impugnados);
  4. A Requerente prestou garantia bancária para suspender a execução da quantia referida (Documento n.º 2, junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
  5. As despesas com a prestação da garantia referida na alínea anterior (que já caducou) são no montante de € 40.902,51 (documentos n.ºs 43 e 44, juntos com o pedido de pronúncia arbitral, cujos teores se dão como reproduzidos); 
  6. As correcções referidas têm como consequência, no total, IRC de € 3.383.085,45 e juros compensatórios € 311.721,72 (documentos n.ºs 7 e 8, juntos com o pedido de pronúncia arbitral, cujos teores se dão como reproduzidos);
  7. Em Julho de 2009 a Requerente apresentou, junto do Serviço de Finanças de Setúbal 2, reclamação graciosa contra a referida (Documento n.º 3, junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
  8. Em 15-1-2013 foi a Requerente notificada do indeferimento da referida reclamação graciosa respeitante ao exercício de 2005 (Documento n.º 4, junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido e processo administrativo parte 4;
  9. Na fundamentação da decisão da reclamação graciosa, que consta da parte 3 do processo administrativo, cujo teor se dá como reproduzido, refere-se, além do mais, o seguinte:

«6.8. Assim, compulsados quer os elementos recolhidos durante o procedimento administrativo de inspecção tributária, quer os elementos ora carreados em sede de procedimento administrativo de reclamação graciosa, somos a verificar que, atendendo às características das operações aqui em causa, a natureza das prestações acessórias subjudicio assume a natureza de um reforço de capital e que por força do estatuído no n.º 7 do artigo 23.ºdo CIRC não são dedutíveis os custos ou perdas incorridos com a sua transmissão.

6.9. Com efeito, a norma que consta no n.º 7 do já referido artigo 23.ºdo CIRC estabelece expressamente que "Não são, igualmente, aceites como custos ou perdas do exercício os suportados com a transmissão onerosa de partes de capital, qualquer que seja o titulo por que se opere, a entidades com as quais existam relações especiais, nos termos do n.º 4 do artigo 58.º, (...). ,,

6.10. Pelo que, podemos concluir que a interpretação feita pela Administração Tributária no que se refere à correcção relativa à transmissão de prestações suplementares feita ao abrigo do disposto no n.º 7 do artigo 23.º do CIRC é a que corresponde à melhor interpretação face à letra e "ratio legis" desse mesmo preceito.»

  • Em 4-4-2013, a Requerente apresentou o pedido de constituição do tribunal arbitral que deu origem ao presente processo;
  • A Requerente presta assistência médica aos trabalhadores e seus familiares desde há muito, originariamente através de prestações de médicos contratados pela A... e desde 1990 através de pagamento de seguros de saúde (prova testemunhal e Documento 39, junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido).
  •  Instrumentos colectivos de trabalho outorgados em meados de 2004, com as associações sindicais representativas dos trabalhadores ao seu serviço, contém cláusulas em que a Requerente se obrigava a garantir condições de assistência para os trabalhadores e seus familiares não inferiores às desfrutadas no momento da assinatura dos referidos acordos (Cláusula 51ª, Documento 36, junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido).
  • O Manual de Acolhimento aos Trabalhadores da Requerente (versão de Outubro de 2011) menciona, na página 35, sob a epígrafe Seguro de Saúde: “a A.../… atribui aos seus colaboradores um plano de saúde, extensível ao agregado familiar, apenas no caso dos colaboradores efectivos. Cada colaborador poderá ainda reforçar (upgrades das coberturas de saúde que o Grupo disponibiliza, pagando para isso um valor adicional (…)”. (Documento n.º 40, junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);
  • Até ao ano 2000, a Administração Tributária aceitava que fossem deduzidos ao lucro tributável da Requerente despesas com seguros de doença relativas a familiares de trabalhadores seus, mas, a partir desse ano, começou a levantar obstáculos ao tratamento dos prémios de seguros de saúde como custos da empresa dedutíveis em IRC (prova testemunhal);

 

2.2. Factos não provados

 

Não se provou que as Inspecções tributárias anteriores ao ano 2000 tenham visado apreciar o tipo de despesas com assistência médica.

Não se provou que sem as despesas com seguros de saúde a Requerente não consiga recrutar a mão-de-obra de que necessita.

 Não há outros factos com potencial relevo para a decisão da causa que não se tenham provado.

 

2.3. Fundamentação da decisão sobre a matéria de facto

 

A decisão da matéria de facto baseia-se nos documentos indicados relativamente a cada um dos factos.

Os factos materiais referidos no relatório da inspecção parcialmente transcrito também se dão como provados, já que não há controvérsia sobre o que nele é descrito.

No que concerne à indicação de prova testemunhal, reporta-se aos depoimentos das testemunhas G..., H... e I..., que aparentaram depor com isenção e com conhecimento dos factos sobre que depuseram.

 

                3. Matéria de direito

 

A Administração Tributária efectuou correcções ao lucro tributável da Requerente relativo ao ano de 2005, na sequência do que efectuou as correspondentes liquidações de IRC e derrama consequente, bem como juros compensatórios.

A Requerente discordou de parte das correcções de subsequentes liquidações, designadamente:

a) não aceitação como custo fiscal do montante de € 11.923.318,97, relativo a perdas apuradas na transmissão de crédito por prestações acessórias efectuadas, sujeito ao regime dos créditos por prestações suplementares a que corresponde imposto e juros compensatórios no valor de € 3.255.364,16 e € 300.028,63, respectivamente;

b) não aceitação como custo fiscal de despesas que qualificou como «realizações de utilidade social», no montante de € 467.800,69, relativa à parte do prémio de seguro de saúde pago pela empresa para os cônjuges, filhos e ascendentes dos trabalhadores e dos reformados, bem como das viúvas e dos seus filhos e ascendentes.

 

3.1. Questão das perdas apuradas na transmissão de crédito por prestações acessórias efectuadas, sujeito ao regime dos créditos por prestações suplementares

 

3.1.1. A correcção efectuada pela Administração Tributária

Resulta da matéria de facto fixada que, em 28-9-2001, a Requerente constituiu duas empresas — a B... — Gestão de Investimentos, SGPS, SA e a C... — Investimentos e Participações, SGPS, SA, subscrevendo e realizando integralmente os respectivos capitais sociais.

Até ao final de 2005 a A... efectuou Prestações acessórias sob a forma de Prestações Suplementares em ambas as sociedades, sendo a última decidida em Assembleia Geral de 28-11-2005, no valor de € 5.979.195,00 na sociedade C..., para cobertura da insuficiência dos capitais próprios.

Em 30-12-2005, através da escritura de aumento de capital da sociedade D... — Conservação e Desenvolvimento Industrial, Limitada, é efectuada a realização de uma nova quota de valor nominal de € 1.553.297,00, integralmente subscrita pela Requerente, através da entrada em espécie, transferindo a totalidade das acções representativas do capital das sociedades B... e C.... Com as acções entregues como entrada em espécie são transmitidas as Prestações Acessórias correspondentes à participação no Capital Social, no montante de € 4.961.466,00 e de € 8.500.000,00 para a B... e C..., respectivamente.

Até à realização desta operação a A... detinha uma participação de 50% na sociedade D..., passando com o aumento de Capital a deter 99,84% da mesma. A Administração Tributária entendeu que, tendo a Requerente uma participação de 50% na sociedade D..., existiam relações especiais entre as entidades intervenientes, à face da definição que consta da alínea a) do n.º 4 do art. 58.º do CIRC (na redacção vigente em 2005, a que corresponde o artigo 63.º, na redacção do Decreto-Lei n.º 159/2009, de 13 de Julho), para efeitos de validar a aceitabilidade do custo nos termos do nº 7 do artigo 23.º do CIRC (na redacção dada pela Lei n.º 32-B/2002, de 30 de Dezembro).

Relativamente ao custo apurado com a transmissão de prestações acessórias sob a forma de prestações suplementares de capital, a Requerente considerou como custo o montante apurado com a transmissão de prestações acessórias sob a forma de prestações suplementares de capital na B... e na C..., que foi, no total, de € 11.923.318,97.

A Administração Tributária, entendendo estar a aplicar os critérios interpretativos que estabelecem os n.ºs 1 e 2 do artigo 11.º da Lei Geral Tributária (LGT), concluiu que as prestações acessórias sob a forma de prestações suplementares de capital se incluem no conceito de «partes de capital», à face do «que se encontra previsto no Código das Sociedades e que a legislação contabilística também consagra».

Obtida esta conclusão, a Administração Tributária aplicou o regime do n.º 7 do artigo 23.º do CIRC, que estabelece que «não são também aceites como gastos do período de tributação os suportados com a transmissão onerosa de partes de capital, qualquer que seja o título por que se opere, sempre que a entidade alienante tenha resultado de transformação, incluindo a modificação do objecto social, de sociedade à qual fosse aplicável regime fiscal diverso relativamente a estes gastos e tenham decorrido menos de três anos entre a data da verificação desse facto e a data da transmissão».

Com base nesta aplicação, a Administração Tributária entendeu que era de afastar da aceitação como custo fiscal os encargos no valor de € 11.923.318,97, suportados com a transmissão das referidas prestações acessórias sob a forma de prestações suplementares, por estar em causa a transmissão para entidades relacionadas: «constitui a fundamentação da presente correcção o facto de se encontrar demonstrado que as perdas apuradas com a transmissão das prestações acessórias sob a forma de prestações suplementares de capital no Capital da B... Investimentos e Participações, SGPS, SA e C... — Investimentos e Participações, SGPS, SA constituem perdas apuradas com a transmissão de partes de capital entre entidades relacionadas as quais não são dedutíveis para efeitos fiscais nos termos do disposto no n.º 7 do artigo 23.º do CIRC, pelo que não é aceite o custo no montante de € 11.923.318,97».

 No relatório da inspecção acrescenta-se que, «definida a fundamentação sobre a qual assenta a correcção em análise, impõe-se, ainda assim demonstrar a improficuidade de eventuais considerações diversas, de forma a reforçar o entendimento aqui defendido», passando-se a emitir-se opinião sobre outros possíveis fundamentos para não considerar como custos da Requerente o montante referido.

No entanto, é expressa a referência de que a fundamentação em que assenta a correcção é a que acima se referiu, sendo também essa a única a que se faz referência na decisão da reclamação graciosa, onde se termina, relativamente a esta questão, nos seguintes termos:

«A expressão Partes de capital expressa no n.º 7 do artigo 23° do CIRC, entronca no POC na conta 411: Partes de capital.

A alínea a) do n.º 3 do artigo 17.º do CIRC determina: de modo a permitir o apuramento do lucro tributável das pessoas colectivas, a contabilidade deve estar organizada de acordo com a normalização contabilística e outras disposições legais em vigor para o respectivo sector de actividade.

C0ncluimos, face ao exposto acima, que se afigura ser de manter a correspondente liquidação (página 49 do documento “PA5.pdf”, junto à resposta da Autoridade Tributária e Aduaneira, com que manifesta concordância o Senhor Director dos Serviços de Inspecção Tributária, no despacho de 23-11-2009, que consta da página 39 do mesmo documento).

Assim, é esta a única fundamentação da correcção a atender, pois o processo arbitral é de mera legalidade [artigo 2.º, n.ºs 1, alíneas a) e b), e 2, do RJAT, visando-se neles apreciar a legalidade da actuação da Administração Tributária tal como ela ocorreu, não podendo o Tribunal, perante a constatação da invocação de um fundamento ilegal como suporte da decisão administrativa, apreciar se a sua actuação poderia basear-se noutros fundamentos. ( [1] )

 

3.4. Decisão da questão das perdas apuradas na transmissão de crédito por prestações acessórias efectuadas

Para apreciar esta questão é necessário apurar qual o alcance da expressão «partes de capital» que consta do n.º 7 do artigo 23.º do CIRC, designadamente se se reporta apenas às participações sociais e também às prestações acessórias que assumam a forma de prestações suplementares.

O n.º 7 do artigo 23.º do CIRC, na redacção vigente em 2005, quando ocorreram os factos dos autos, estabelecia que «não são, igualmente, aceites como custos ou perdas do exercício os suportados com a transmissão onerosa de partes de capital, qualquer que seja o título por que se opere, a entidades com as quais existam relações especiais, nos termos do n.º 4 do artigo 58.º, ou a entidades com domicílio em país, território ou região com regime de tributação claramente mais favorável, constante de lista aprovada por portaria do Ministro das Finanças, ou entidades residentes em território português sujeitas a um regime especial de tributação» (a esta norma corresponde actualmente o n.º 5 do artigo 23.º do CIRC, mas com redacção diferente).

Como bem referem as Partes o conceito de «partes de capital», utilizado nesta norma, é usado também no Código das Sociedades Comerciais e no Plano Oficial de Contabilidade (aprovado pelo Decreto-Lei n.º 410/89, de 21 de Novembro, em vigor no ano de 2005, em que ocorreram os factos em apreço).

Se as prestações acessórias com natureza de prestações suplementares transmitidas pela Requerente se enquadrarem no conceito de «partes de capital», a situação será abrangida por aquele n.º 7 do artigo 23.º, estando afastada a relevância para a formação do lucro tributável da Requerente os custos ou perdas derivadas dessa transmissão.

As Partes discutem se aquele conceito de «partes de capital» se reporta apenas a participações sociais, não abrangendo as prestações suplementares, defendendo a Requerente que aquele conceito não as abrange, e propugnando a Autoridade Tributária e Aduaneira o contrário.

Como se referiu, o conceito de «partes de capital» é utilizado no Código das Sociedades Comerciais e Plano Oficial de Contabilidade, mas, antes de determinar o conceito a aplicar é necessário ponderar as regras especiais da interpretação das normas fiscais, que são enunciada no artigo 11.º da LGT.

Assim, «na determinação do sentido das normas fiscais e na qualificação dos factos a que as mesmas se aplicam, são observadas as regras e princípios gerais de interpretação e aplicação das leis» (artigo 11.º, n.º 1, da LGT), o que constitui uma remissão para o artigo 9.º do Código Civil.

No n.º 2 do mesmo artigo 11.º estabelece-se que «sempre que, nas normas fiscais, se empreguem termos próprios de outros ramos de direito, devem os mesmos ser interpretados no mesmo sentido daquele que aí têm, salvo se outro decorrer directamente da lei».

Desta norma resulta que, embora a regra seja a de os termos utilizados nas normas fiscais devam ser interpretados com o mesmo alcance que têm noutros ramos do direito, há uma excepção, que é decorrer directamente da lei fiscal que o sentido do termo utilizado na lei fiscal é diferente do que tem noutros ramos do direito.

Aliás, é uma excepção que está em sintonia com outra regra interpretativa geral, que é a de que a lei especial prefere à lei geral no seu específico domínio de aplicação, isto é, se decorre directamente de uma norma fiscal, especial para a situação que regula, o sentido de um determinado termo, nem interessará saber se esse sentido corresponde ou não ao que é utilizado na lei geral, pois esse sentido directamente decorrente da lei para uma específica situação terá de ser forçosamente o que se tem de adoptar e não o sentido com que é utilizado em qualquer norma que não tenha natureza de lei especial para a referida situação.

De qualquer forma, do n.º 2 do artigo 11.º do EBF resulta que, em, boa hermenêutica, a primeira tarefa do intérprete da lei fiscal para apurar o alcance de um termo nela utilizado é apurar se da lei fiscal decorre directamente o sentido desse termo.

Só se não se estiver perante uma situação deste tipo, se poderá fazer apelo ao sentido dos termos utilizados noutros ramos de direito.

Ora, no caso em apreço, para esclarecimento da questão de saber se as prestações suplementares são abrangidas no conceito de «partes de capital» há uma norma da qual decorre directamente que aquelas não se englobam neste conceito, que é o n.º 3 do artigo 42.º do CIRC, na redacção introduzida pela Lei n.º 60-A/2005, de 30 de Dezembro (actual artigo 45.º, n.º 3).

Estabelece-se neste artigo 42.º, n.º 3, o seguinte:

A diferença negativa entre as mais-valias e as menos-valias realizadas mediante a transmissão onerosa de partes de capital, incluindo a sua remição e amortização com redução de capital, bem como outras perdas ou variações patrimoniais negativas relativas a partes de capital ou outras componentes do capital próprio, designadamente prestações suplementares, concorrem para a formação do lucro tributável em apenas metade do seu valor.

 

Utilizam-se nesta norma dois conceitos: o de «partes de capital» e o de «outras componentes do capital próprio».

As «partes de capital» são também «componentes do capital próprio», como se depreende da palavra «outras», mas o alcance de «partes do capital» é necessariamente mais restrito do que o de «capital próprio», que englobará, além das «partes de capital» também «as outras componentes».

Tal como está redigida a norma, as prestações suplementares englobar-se-ão no conceito de «outras componentes do capital próprio» e não nas «partes de capital», pois a referência àquelas aparece a seguir a este último conceito e não ao primeiro.

Na verdade, se se entendesse, para este efeito, que as prestações suplementares se integravam no conceito de «partes de capital», é óbvio que a referência a elas se incluiria a seguir a este conceito e não a seguir ao conceito de «capital próprio»: isto é, dir-se-ia «(...) perdas ou variações patrimoniais negativas relativas a partes de capital, designadamente prestações suplementares, ou outras componentes do capital próprio concorrem para a formação do lucro tributável em apenas metade do seu valor».

Aliás, aquela referência às prestações suplementares não existia antes da redacção daquele artigo 42.º do CIRC introduzida pela Lei n.º 60-A/2005 ( [2] ), pelo que, sendo aquela referência introduzida com evidente alcance esclarecedor, é de presumir reforçadamente que o legislador soube concretizar em termos adequados esse objectivo (artigo 9.º, n.º 3, do Código Civil), e se pretendeu explicitar que as prestações suplementares se enquadram entre as «outras componentes do capital próprio» e não nas «partes de capital».

Esta delimitação do conceito de «partes de capital» que se extrai do referido n.º 3 do artigo 42.º é feita para efeitos de determinação de menos valias derivadas de transmissão onerosas de partes de capital próprio das sociedades, pelo que se está precisamente no âmbito da matéria a que se reporta o artigo 23.º, n.º 7, do CIRC.

Assim, tendo-se de presumir que o legislador exprimiu o seu pensamento em termos adequados (nos termos do referido artigo 9.º, n.º 3, do Código Civil), justifica-se a conclusão de que foi utilizada naquele n.º 7 do artigo 23.º, da natureza especial para as transmissões entre entidades com relações especiais, o mesmo conceito de «partes de capital» que foi utilizado na norma que prevê a relevância tributária regra.

A nova redacção dada pelo Decreto-Lei n.º 159/2009, de 13 de Julho, a este n.º 7 do artigo 23.º do CIRC, ao voltar a fazer apenas referência às «partes de capital», vem confirmar que o seu não abrange as prestações suplementares.

Com efeito, nesta nova redacção veio-se a estabelecer o seguinte:

7 – Não são, igualmente, aceites como gastos do período de tributação os suportados com a transmissão onerosa de partes de capital, qualquer que seja o título por que se opere, a entidades com as quais existam relações especiais, nos termos do n.º 4 do artigo 63.º, ou a entidades residentes em território português sujeitas a um regime especial de tributação, bem como as menos-valias resultantes de mudanças no modelo de valorização relevantes para efeitos fiscais, nos termos do n.º 9 do artigo 18.º, que decorram, designadamente, de reclassificação contabilística ou de alterações nos pressupostos referidos na alínea a) do n.º 9 deste artigo.

 

                Esta nova redacção foi introduzida vários anos depois de o artigo 42.º, n.º 3, do CIRC ter esclarecido que as prestações suplementares se englobam no conceito de «capital próprio», mas não no de «partes de capital», pelo que o facto de no novo n.º 7 do artigo 23.º se voltar a fazer referência apenas às «partes de capital», sem qualquer alusão às «outras componentes do capital próprio» e às «prestações suplementares», não pode deixar de ser interpretado, à luz da presunção de que o legislador soube exprimir o seu pensamento em termos adequados que impõe o citado artigo 9.º, n.º 3, do Código Civil, que se pretendeu excluir a aplicação daquele regime às prestações suplementares.

Assim, é de concluir que a correcção montante de € 11.923.318,97, efectuada com fundamento em não constituírem perdas para efeitos da determinação do lucro tributável da Requerente a transmissão das prestações acessórias com a natureza de prestações suplementares enferma de vício de violação de lei, por erro de interpretação do artigo 23.º, n.º 7, do CIRC, na redacção introduzida pela Lei n.º 32-B/2002, de 30 de Dezembro.

Esse víci0 repercutiu-se na consequente liquidação de IRC e juros compensatórios, pelo que enferma do mesmo vício.

Por isso, justifica a anulação desta liquidação [artigo 135.º do Código do Procedimento Administrativo, aplicável por força do disposto no artigo 29.º, n.º 1, alínea d) do RJAT e 2.º, alínea c), da LGT].

 

3.2. Questão das despesas com prémio de seguro de saúde pago pela empresa para os cônjuges, filhos e ascendentes dos trabalhadores e dos reformados, bem como das viúvas e dos seus filhos e ascendentes

 

3.2.1. Síntese da posição da Requerente

 

A Requerente defende, em síntese:

– Os encargos que assume com prémios de seguro de saúde de familiares de trabalhadores e trabalhadores reformados têm a mesma causa que os gastos referentes a trabalhadores no activo;

– O custo dos seguros de saúde em benefício de trabalhadores, reformados e familiares de trabalhadores constitui uma componente da retribuição dos trabalhadores da A... e, ainda que realize uma utilidade social, é um gasto indispensável à realização de proveitos (art. 23º, nº 1, do CIRC);

– O custo daqueles seguros de saúde é caracterizável como despesa obrigatória (é obrigação legal decorrente de convenção colectiva, obrigação legal do contrato de trabalho não meramente facultativa face ao art. 249.º do Código de Trabalho) é indispensável à obtenção da mão-de-obra por si recrutada e, portanto, dedutível segundo o art. 23º do CIRC;

– O n.º 4 do art. 23.º (redacção vigente em 2005), exigindo como condição para ser considerado custo a respectiva tributação na esfera dos trabalhadores, só faz sentido em relação aos encargos facultativos já que os obrigatórios sempre se incluiriam no nº 1 do art. 23.º do CIRC;

– Mas mesmo que a A... não estivesse legalmente obrigada a realizar as despesas com seguros de saúde e estas fossem despesas facultativas, seriam dedutíveis segundo o nº 2 do então art. 40.º do CIRC, como já concluíram três decisões arbitrais;

– É que nesse dispositivo há que distinguir: a primeira parte, relativa a despesas facultativas com seguros de saúde, dedutíveis nos limites aí previstos, independentemente de cobrirem os trabalhadores ou os seus familiares, e a segunda parte, referente a benefícios com impacto mais individualizável e quase certo, que seriam, apenas esses, restritos ao universo dos trabalhadores;

– Ou seja, a expressão “bem como” divide duas previsões completamente diferentes: a previsão 1 relativa a “custos suportados com contratos de seguros de doença e acidentes pessoais” e a previsão 2 relativa a “contratos de seguros de vida, contribuições para fundos de pensões e equiparáveis ou para quaisquer regimes complementares de segurança social, que garantam, exclusivamente, o benefício de reforma, complemento de reforma, invalidez ou sobrevivência, a favor dos trabalhadores da empresa”;

– Esta separação é reflexo da previsão do art. 2º, nº 3, alínea c) 3) do CIRS que apenas abrangia o conjunto de realidades da segunda parte do nº 2 do então art. 40º do CIRC e não as da primeira parte da mesma norma;

– A previsão da primeira parte do nº 2 do art. 40º do CIRC abrange também os familiares dos trabalhadores – tal como o nº 1 do mesmo art. 40º (agora art. 43º) do CIRC e tal não é desmentido pelas redacções mais antigas do CIRC, inicialmente art. 38º, sendo que as alterações introduzidas pela Lei nº 39-B/94, de 27/12, confirmam esta interpretação;

– O actual art. 43.º (antes, sucessivamente, 40.º e 38.º) do CIRC não constitui um benefício fiscal, mas uma restrição à despesa fiscal, no caso a dedução de custos reais negociados pela empresa e trabalhadores e suportados por esta para obter o labor daqueles;

– Não é de acolher a interpretação feita pelo TCAS no Acórdão proferido em 25-09-2012, no proc. 05073/1, porque a decisão baseou-se na visão da norma como um benefício, ignorou a distinção entre encargos facultativos e obrigatórios e interpretou erradamente a expressão “exclusivamente” utilizada na parte final do nº 2 do então art. 38º (depois 40º, e actualmente 43º), considerando-a como referindo-se à primeira parte do dispositivo, quando apenas se dirige à segunda previsão e não aos prémios de seguros de saúde.

 

3.2.2. Síntese da posição da Requerida

 

– O facto de a Requerente ter assumido obrigações para com os seus trabalhadores não resolve a questão da necessidade/indispensabilidade dos respectivos custos para a manutenção da fonte produtora;

– Não ficou comprovado que os custos com os seguros de saúde relativos a reformados e familiares dos trabalhadores fossem indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora, conforme exigido pelo artigo 23.º CIRC;

– Os custos com seguros de doença (quer quanto aos trabalhadores, quer quanto aos seus familiares) não são imprescindíveis e assim a sua dedutibilidade está sujeito às regras específicas do artigo 40.º do CIRC (redacção então vigente), especificamente ao disposto nos seus nºs 2 e 4, tal como decidiu o Acórdão do TCAS em 25-09-2012, no proc 05073/11;

– Interpretação correcta foi feita pelo Ac do TCAS, onde se considerou, designadamente, que da articulação do art. 23.º, nº 4, com n.º 2 do art. 38.º (40.º, ao tempo do caso dos autos) ambos do CIRC, deve entender-se que o legislador exclui da regra da dedutibilidade os custos com os prémios de seguros de doença e acidentes pessoais (bem como as importâncias despendidas com seguros e operações do ramo “Vida”, contribuições para fundos de pensões e para quaisquer regimes complementares da segurança social) que não sejam considerados rendimentos do trabalho dependente nos termos da primeira parte do n.º 3), da al. b), do n.º 3, do art. 2, do CIRS”;

– O legislador não incluiu os seguros de saúde no artigo 40.º/1 do CIRC onde expressamente consta que apenas os benefícios aí inseridos (creches, lactários, jardins de infância, cantinas, bibliotecas, etc.) poderiam igualmente ser dedutíveis quando «(…) em benefício do pessoal ou dos reformados da empresa o respectivos familiares (…)»;

– O legislador decidiu colocar a dedutibilidade dos seguros de saúde antes no artigo 40.º, nº 2, do CIRC, numa terceira linha de hierarquia dos custos dedutíveis: depois do artigo 23.º do CIRC e do artigo 40.º, nº 1, do CIRC, e até ao limite de 15% das despesas com o pessoal escrituradas a título de remunerações, ordenados ou salários respeitantes ao exercício, não contendo uma referência a familiares idêntica à do n.º 1;

– A Requerente interpretou erradamente a colocação da expressão «bem como», e desconsiderou a expressão «exclusivamente», que é a chave para a interpretação da norma;

– A aplicação de qualquer do n.º 2 do artigo 40.º tem que ser feita cumulativamente com uma apertada malha de condições cumulativas constantes do n.º 4 do mesmo artigo, havendo que tomar em conta que as alíneas a) e b) do n.º 4 referem expressamente “trabalhadores” e “trabalhadores permanentes” sem mencionar reformados ou familiares ou viúvos;

– Quanto à equiparação traçada em anteriores decisões arbitrais sobre a equiparação da extensão da dedutibilidade de encargos suportados pelas entidades empregadoras, nos termos do art. 40.º, n.º 2, a familiares, seguros de doença privadas, com os regimes sociais previstos tanto para a ADSE como para a ADM, existe uma grande diferença entre as duas situações: o que se discute nos autos é os custos suportados pela entidade empregadora enquanto no regime da ADSE (em que há grandes restrições quanto à sua extensão e aproveitamento em benefício do restante agregado familiar) quem suporta os montantes a pagar é o universo de trabalhadores.

 

3.2.3. Decisão da questão da dedução ao lucro tributável das despesas com seguros de saúde relativos a familiares de trabalhadores

 

3.2.3.1. A irrelevância da prática anterior da Administração Tributária

 

Na abordagem desta questão deve esclarecer-se, antes de mais, que o facto de a Administração Tributária ter aceitado, até ao ano 2000, que a dedução ao lucro tributável da Requerente das despesas com seguros de saúde relativos a familiares dos seus trabalhadores não tem qualquer relevo para a apreciação da questão, pois a Administração Tributária não está obrigada a manter indefinidamente as suas interpretações da lei fiscal.

Na verdade,       o princípio da igualdade, que a Administração Tributária deve observar na globalidade da sua actuação (artigos 266.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa e 55.º da Lei Geral Tributária), apenas lhe impõe trate os contribuintes de forma igualitária, designadamente não os privilegiando, beneficiando, prejudicando, privando de qualquer direito ou isentando de qualquer dever em razão de ascendência, sexo, raça, língua, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução, situação económica ou condição social (art. 5.º, n.º 1, do Código do Procedimento Administrativo).

O princípio da igualdade apenas exige que a Administração Tributária não leve a cabo uma actuação discriminatória, dando tratamentos distintos a contribuintes que estejam em situações idênticas ou não distinguindo entre situações distintas, mas não que mantenha indefinidamente uma primeira interpretação que tenha feito das normas tributárias.

Na verdade, se, depois de aplicar uma determinada interpretação da lei, durante algum tempo a Administração Tributária chegar à conclusão de que é errada a interpretação que vinha adoptando e que outra interpretação a que deve ser feita, o princípio da igualdade não obsta a que passe a adoptar a nova interpretação, reclamando apenas a nova interpretação seja aplicada à generalidade dos contribuintes, a partir da sua adopção.

Um afloramento desta interpretação do princípio da igualdade está ínsita no regime do artigo 68.º-A, n.º 1, da LGT [anterior art. 68.º, n.º 4, alínea b)], que impõe à Administração Tributária a observância das orientações genéricas que estejam em vigor no momento do facto tributário, proibindo a aplicação retroactiva de novas orientações genéricas, o que significa que estas podem ser alteradas.

 

3.2.3.2. Os encargos de saúde de familiares dos trabalhadores como componente da sua retribuição, para efeitos do artigo 23.º, n.º 1, do CIRC

 

O artigo 23.º, n.º 1, do CIRC, na redacção vigente em 2005, estabelece que «consideram-se custos ou perdas os que comprovadamente forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora», indicando, exemplificativamente alguns tipos de despesas que são consideradas custos.

Entre estas despesas, incluem-se, na alínea d) do mesmo número, os «encargos de natureza administrativa, tais como remunerações, ajudas de custo, pensões ou complementos de reforma, material de consumo corrente, transportes e comunicações, rendas, contencioso, seguros, incluindo os de vida e operações do ramo «Vida», contribuições para fundos de poupança-reforma, contribuições para fundos de pensões e para quaisquer regimes complementares da segurança social».

Relativamente às despesas com seguros esclarece-se no n.º 4 do mesmo artigo, que «excepto quando estejam abrangidos pelo disposto no artigo 40.º, não são aceites como custos os prémios de seguros de doença e de acidentes pessoais, bem como as importâncias despendidas com seguros e operações do ramo «Vida», contribuições para fundos de pensões e para quaisquer regimes complementares de segurança social que não sejam considerados rendimentos de trabalho dependente, nos termos da primeira parte do n.º 3) da alínea b) do n.º 3 do artigo 2.º do Código do IRS».

Desta norma do CIRS conclui-se, no que aqui interessa, que são considerados rendimentos do trabalhos «as importâncias despendidas, obrigatória ou facultativamente, pela entidade patronal com seguros e operações do ramo «Vida», desde que constituam direitos adquiridos e individualizados dos respectivos beneficiários».

Conjugando esta norma com o n.º 4 do artigo 23.º do CIRC, conclui-se que, em regra, não são considerados como custos para efeitos de IRC, os prémios de seguros de doença de que sejam beneficiários os familiares de trabalhadores, pois não são considerados rendimentos do trabalho dependente dos respectivos beneficiários.

Por isso, a eventual consideração como custos dos prémios dos seguros de doença de que são beneficiários familiares de trabalhadores só poderá resultar do artigo 40.º do CIRC vigente em 2005 (anterior artigo 38.º e actual artigo 43.º), ao abrigo da excepção prevista na parte inicial daquele n.º 4 do artigo 23.º.

É de notar, no entanto, que a parte inicial do referido n.º 3) da alínea b) do n.º 3 do artigo 2.º do CIRS, ao fazer referência às importâncias despendidas, obrigatória ou facultativamente, pela entidade patronal com seguros e operações do ramo «Vida», deixa entrever que é indiferente para que estas despesas de prémios de seguros sejam consideradas «rendimentos do trabalho dependente», e consequentemente, custos à face do n.º 4 do artigo 23.º do CIRC, independentemente de se tratar de seguros obrigatórios ou facultativos.

Não há, assim, fundamento para distinguir entre os seguros de doença obrigatórios e os facultativos, a nível da relevância dos respectivos prémios como custos, quando a obrigatoriedade deriva de vinculações de origem contratual e não é imposta por lei.

Aliás, a alínea b) do n.º 4 do artigo 40.º do CIRC, ao definir as condições da dedutibilidade dos custos com seguros de doença, alude aos benefícios estabelecidos «em cumprimento de instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho», o que revela que o regime deste artigo 40.º se reporta também aos benefícios obrigatórios por esta via, que têm base contratual, já que têm esta natureza os impostos por instrumentos de regulamentação colectiva do trabalho (artigos 539.º e seguintes do Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 99/2003, de 27 de Agosto, em vigor em 2005).

Assim, conclui-se que, como resulta daquele n.º 4 do artigo 23.º do CIRC, os prémios de seguros de doença que são rendimentos do trabalho são dedutíveis como custos. Os que não sejam rendimentos do trabalho, apenas poderão ser quando sejam abrangidos pelo artigo 40.º.

Está afastada, por isso, a consideração como custos de prémios de seguros de saúde de que sejam beneficiários familiares de trabalhadores, por via do n.º 1 do artigo 23.º, pois está especialmente regulada da sua relevância para esse efeito, no n.º 4 do mesmo artigo, com remissão para o artigo 40.º do CIRC.

 

3.2.3.3. Os encargos de saúde de familiares dos trabalhadores à face do artigo 40.º do CIRC

 

 Assim, a dedutibilidade como custos das despesas com seguros de saúde de familiares de trabalhadores terá de ser aferida à face do artigo 40.º do CIRC, que, em 2005, estabelecia o seguinte:

 

Artigo 40.º

Realizações de utilidade social

1 – São também considerados custos ou perdas do exercício os gastos suportados com a manutenção facultativa de creches, lactários, jardins-de-infância, cantinas, bibliotecas e escolas, bem como outras realizações de utilidade social, como tal reconhecidas pela Direcção-Geral dos Impostos, feitas em benefício do pessoal ou dos reformados da empresa e respectivos familiares, desde que tenham carácter geral e não revistam a natureza de rendimentos do trabalho dependente ou, revestindo-o, sejam de difícil ou complexa individualização relativamente a cada um dos beneficiários (redacção da Lei n.º 109-B/2001, de 27 de Dezembro)

2 – São igualmente considerados custos ou perdas do exercício, até ao limite de 15% das despesas com o pessoal escrituradas a título de remunerações, ordenados ou salários respeitantes ao exercício, os suportados com contratos de seguros de doença e de acidentes pessoais, bem como com contratos de seguros de vida, contribuições para fundos de pensões e equiparáveis ou para quaisquer regimes complementares de segurança social, que garantam, exclusivamente, o benefício de reforma, pré-reforma, complemento de reforma, invalidez ou sobrevivência a favor dos trabalhadores da empresa.

3 – O limite estabelecido no número anterior é elevado para 25%, se os trabalhadores não tiverem direito a pensões da segurança social.

4 – Aplica-se o disposto nos n.ºs 2 e 3 desde que se verifiquem, cumulativamente, as seguintes condições, à excepção das alíneas d) e e), quando se trate de seguros de doença, de acidentes pessoais ou de seguros de vida que garantam exclusivamente os riscos de morte ou invalidez:

a) Os benefícios devem ser estabelecidos para a generalidade dos trabalhadores permanentes da empresa ou no âmbito de instrumento de regulamentação colectiva de trabalho para as classes profissionais onde os trabalhadores se inserem;

b) Os benefícios devem ser estabelecidos segundo um critério objectivo e idêntico para todos os trabalhadores ainda que não pertencentes à mesma classe profissional, salvo em cumprimento de instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho;

c) Sem prejuízo do disposto no n.º 6, a totalidade dos prémios e contribuições previstos nos n.º s 2 e 3 deste artigo em conjunto com os rendimentos da categoria A isentos nos termos do n.º 1 do artigo 15.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais não devem exceder, anualmente, os limites naqueles estabelecidos ao caso aplicáveis, não sendo o excedente considerado custo do exercício;

d) Sejam efectivamente pagos sob a forma de prestação pecuniária mensal vitalícia pelo menos dois terços dos benefícios em caso de reforma, invalidez ou sobrevivência, sem prejuízo da remição de rendas vitalícias em pagamento que não tenham sido fixadas judicialmente, nos termos e condições estabelecidos em norma regulamentar emitida pela respectiva entidade de supervisão, e desde que seja apresentada prova dos respectivos pressupostos pelo sujeito passivo;

e) As disposições de regime legal da pré-reforma e do regime geral de segurança social sejam acompanhadas, no que se refere à idade e aos titulares do direito às correspondentes prestações, sem prejuízo de regime especial de segurança social, de regime previsto em instrumento de regulamentação colectiva de trabalho ou de outro regime legal especial, ao caso aplicáveis;

 f) A gestão e disposição das importâncias despendidas não pertençam à própria empresa, os contratos de seguros sejam celebrados com empresas de seguros que possuam sede, direcção efectiva ou estabelecimento estável em território português, ou com empresas de seguros que estejam autorizadas a operar neste território em livre prestação de serviços, e os fundos de pensões ou equiparáveis sejam constituídos de acordo com a legislação nacional ou geridos por instituições de realização de planos de pensões profissionais às quais seja aplicável a Directiva n.º 2003/41/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 3 de Junho, que estejam autorizadas a aceitar contribuições para planos de pensões de empresas situadas em território português;

g) Não sejam considerados rendimentos do trabalho dependente, nos termos da primeira parte do n.º 3) da alínea b) do n.º 3 do artigo 2.º do Código do IRS.

5 – Para os efeitos dos limites estabelecidos nos n.º s 2 e 3, não são considerados os valores actuais dos encargos com pensionistas já existentes na empresa à data da celebração do contrato de seguro ou da integração em esquemas complementares de prestações de segurança social previstos na respectiva legislação, devendo esse valor, calculado actuarialmente, ser certificado pelas seguradoras ou outras entidades competentes.

6 – As dotações destinadas à cobertura de responsabilidades com pensões previstas no n.º 2 do pessoal no activo em 31 de Dezembro do ano anterior ao da celebração dos contratos de seguro ou da entrada para fundos de pensões, por tempo de serviço anterior a essa data, são igualmente aceites como custos nos termos e condições estabelecidos nos n.º s 2, 3 e 4, podendo, no caso de aquelas responsabilidades ultrapassarem os limites estabelecidos naqueles dois primeiros números, mas não o dobro dos mesmos, o montante do excesso ser também aceite como custo, anualmente, por uma importância correspondente, no máximo, a um sétimo daquele excesso, sem prejuízo da consideração deste naqueles limites, devendo o valor actual daquelas responsabilidades ser certificado por seguradoras, sociedades gestoras de fundos de pensões ou outras entidades competentes.

7 – As contribuições suplementares destinadas à cobertura de responsabilidades por encargos com pensões, quando efectuadas em consequência de alteração dos pressupostos actuariais em que se basearam os cálculos iniciais daquelas responsabilidades e desde que devidamente certificadas pelas entidades competentes, podem também ser aceites como custos ou perdas nos seguintes termos:

a) No exercício em que sejam efectuadas, num prazo máximo de cinco, contado daquele em que se verificou a alteração dos pressupostos actuariais;

b) Na parte em que não excedam o montante acumulado das diferenças entre os valores dos limites previstos nos n.º s 2 ou 3 relativos ao período constituído pelos 10 exercícios imediatamente anteriores ou, se inferior, ao período contado desde o exercício da transferência das responsabilidades ou da última alteração dos pressupostos actuariais e os valores das contribuições efectuadas e aceites como custos em cada um desses exercícios.

8 – Para efeitos do disposto na alínea b) do número anterior, não são consideradas as contribuições suplementares destinadas à cobertura de responsabilidades com pensionistas, não devendo igualmente ser tidas em conta para o cálculo daquelas diferenças as eventuais contribuições efectuadas para a cobertura de responsabilidades passadas nos termos do n.º 6.

9 – Aos custos referidos no n.º 1, quando se reportem à manutenção de creches, lactários e jardins-de-infância em benefício do pessoal da empresa, seus familiares ou outros, são imputados, para efeitos de determinação do lucro tributável, mais 40% da quantia efectivamente despendida.

10 – No caso de incumprimento das condições estabelecidas nos n.º s 2, 3 e 4, à excepção das referidas nas alíneas c) e g) deste último número, ao valor do IRC liquidado relativamente a esse exercício deve ser adicionado o IRC correspondente aos prémios e contribuições considerados como custo em cada um dos exercícios anteriores, nos termos deste artigo, agravado de uma importância que resulta da aplicação ao IRC correspondente a cada um daqueles exercícios do produto de 10% pelo número de anos decorridos desde a data em que cada um daqueles prémios e contribuições foram considerados como custo, não sendo, em caso de resgate em benefício da entidade patronal, considerado como proveito do exercício a parte do valor do resgate correspondente ao capital aplicado.

11 – No caso de resgate em benefício da entidade patronal, não se aplica o disposto no número anterior se, para a transferência de responsabilidades, forem celebrados contratos de seguro de vida com outros seguradores, que possuam sede, direcção efectiva ou estabelecimento estável em território português, ou com empresas de seguros que estejam autorizadas a operar neste território em livre prestação de serviços, ou se forem efectuadas contribuições para fundos de pensões constituídos de acordo com a legislação nacional, ou geridos por instituições de realização de planos de pensões profissionais às quais seja aplicável a Directiva n.º 2003/41/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 3 de Junho, que estejam autorizadas a aceitar contribuições para planos de pensões de empresas situadas em território português, em que, simultaneamente, seja aplicada a totalidade do valor do resgate e se continuem a observar as condições estabelecidas neste artigo.

12 – No caso de resgate em benefício da entidade patronal, o disposto no n.º 10 pode igualmente não se aplicar, se for demonstrada a existência de excesso de fundos originada por cessação de contratos de trabalho, previamente aceite pela Direcção-Geral dos Impostos.

13 – Não concorrem para os limites estabelecidos nos n.ºs 2 e 3 as contribuições suplementares para fundos de pensões e equiparáveis destinadas à cobertura de responsabilidades com pensões que, em resultado da aplicação das normas internacionais de contabilidade, sejam efectuadas por determinação do Banco de Portugal, durante o período transitório fixado por esta instituição, às entidades sujeitas à sua supervisão.

 

Apenas se encontram neste artigo referências aos «seguros de doença» nos n.º 2 e 4.

No que respeita a referência a «familiares» de trabalhadores, apenas se encontram nos n.ºs 1 e 9.

Desta constatação, conclui-se, logo numa primeira análise, que os «familiares» dos trabalhadores não são uma realidade social de que o legislador se tivesse esquecido ao estabelecer o regime das «realizações de utilidade social».

Mas, também se conclui que, entre todas as realizações de utilidade social que se ponderaram incentivar com a dedutibilidade de despesas como custos, se entendeu dar relevo a esse nível apenas algumas delas quando são beneficiários familiares dos trabalhadores.

Na verdade,       «quando, como é de regra, as normas (fórmulas legislativas) comportam mais que um significado, então a função positiva do texto traduz-se em dar mais forte apoio a ou sugerir mais fortemente um dos sentidos possíveis. É que, de entre os sentidos possíveis, uns corresponderão ao significado mais natural e directo das expressões usadas, ao passo que outros só caberão no quadro verbal da norma de uma maneira forçada, contrafeita. Ora, na falta de outros elementos que induzam à eleição do sentido menos imediato do texto, o intérprete deve optar em princípio por aquele sentido que melhor e mais imediatamente corresponde ao significado natural das expressões verbais utilizadas, e designadamente ao seu significado técnico-jurídico, no suposto (nem sempre exacto) de que o legislador soube exprimir com correcção o seu pensamento». ( [3] )

 Assim, no caso em apreço, não há qualquer suporte no texto da lei para concluir que as despesas com seguros de doença que são consideradas custos dedutíveis abranjam as relativas a familiares dos trabalhadores, já que apenas aos trabalhadores se faz referência no n.º 2 e o legislador tinha presente a hipotética extensão do âmbito de aplicação das norma aos familiares dos trabalhadores, expressamente referidos nos n.ºs 1 e 9.

O n.º 4, que se reporta também aos seguros de doença, também apenas faz referência aos trabalhadores e não aos seus familiares.

Por outro lado, mostrando que os familiares dos trabalhadores não foram esquecidos quando se redigiu este artigo, no n.º 9 deste artigo 40.º volta-se a fazer referência a esses familiares, a propósito das realizações de utilidade social referidas no n.º 1, o que reforça a conclusão de que apenas nos casos previstos no n.º 1 se entendeu dever aceitar-se a dedução como custos despesas com eles relacionadas.

Nestas condições, a omissão de referência aos familiares dos trabalhadores nos n.ºs 2 e 4, no contexto de um artigo do CIRC em que eles estavam na mente legislativa, deverá considerar-se como intencional, à face da presunção, imposta pelo artigo 9.º, n.º 3, do Código Civil, de que o legislador soube exprimir o seu pensamento em termos adequados. 

Há, assim insistentes argumentos literais que apontam no sentido da interpretação efectuada pela Administração Tributária, de que os seguros de doença de familiares não são dedutíveis como custos, apenas o sendo os indicados nos n.ºs 2 e 4, relativos aos trabalhadores da empresa [quando não sejam direitos adquiridos e individualizados dos respectivos beneficiários, pois se o forem a dedutibilidade plena é assegurada pelo artigo 23.º, n.º 1, do CIRC, conjugado com o n.º 4 do mesmo artigo e o n.º 3) da alínea b) do n.º 3 do artigo 2.º do CIRS].

Por outro lado, o facto de no n.º 2 do artigo 40.º usar a expressão «são igualmente considerados custos ou perdas do exercício... os suportados com contratos de seguros de doença», revela inequivocamente que estes não estão abrangidos pela conceitos de «outras realizações de utilidade social», utilizado no n.º 1.

Sendo assim, não havendo no n.º 2 qualquer expressão limitativa do alcance subjectivo da norma que não seja a referência aos «trabalhadores da empresa», se não se reduzisse a estes o campo de aplicação da norma, estaria aberta a porta para a dedutibilidade de despesas de saúde de pessoas que nem fossem familiares dos trabalhadores, nem mesmo tivessem qualquer ligação à empresa, o que seria uma solução manifestamente absurda.

O peso destes argumentos literais é particularmente relevante no caso em apreço, por se estar perante um artigo do CIRC que já foi objecto de alteração várias vezes e em que, por isso, se se pretendesse determinar a aplicação do regime do n.º 2 às despesas com seguros de familiares de trabalhadores, é de supor que isso já teria sido feito, até porque, como se vê pelo caso em apreço, há mais de uma década (desde o ano 2000) que a Administração Tributária interpreta aquela norma como não se aplicando às despesas com seguros de doença dos familiares.

As anteriores redacções (a inicial e a da Lei n.º 39-B/94, de 27 de Dezembro) do artigo 38.º do CIRC (correspondente ao artigo 40.º, depois da renumeração efectuada pelo Decreto-Lei n.º 198/2001, de 3 de Julho) em nada divergem significativamente da actual, neste aspecto, pois já então se fazia referência aos familiares dos trabalhadores no seu n.º 1.

Para além dos argumentos literais, é de notar que, sob a perspectiva da relevância dos custos para obtenção dos proveitos, que é a que tem de adoptar nesta matéria, se justifica que sejam tratadas diversamente, a nível do incentivo em que se traduz a dedutibilidade das despesas, aquela que são efectuadas com as infra-estruturas de apoio social referidas no n.º 1 e as que se reportam a seguros de saúde de familiares dos trabalhadores.

Na verdade, as primeiras (creches, lactários, jardins-de-infância, cantinas, bibliotecas e escolas,) estão naturalmente vocacionadas para terem repercussão a nível de benefícios para a empresa, por permitirem aos trabalhadores mais fácil assistência aos seus dependentes, com o corolário de maior disponibilidade para a empresa e o natural reflexo positivo no incremento dos proveitos, enquanto seguros de saúde de familiares dos trabalhadores não têm ou, pelo menos não terão provavelmente, qualquer efeito positivo a nível dos ganhos da empresa.

Para além disso, também é manifesto que se justifica que se distinga, a nível da dedutibilidade de custos e sua relevância para a formação dos proveitos, entre os seguros de doença de que são beneficiários trabalhadores, conexionados directamente com a promoção de uma eficaz laboração no interesse da empresa, e os seguros de que são beneficiários os seus familiares, que não têm qualquer relação directa com aquele interesse.

Por outro lado, é também esta interpretação que decorre do teor literal que se compagina com o princípio constitucional da tributação das pessoas colectivas com incidência fundamentalmente pelo rendimento real, que aponta no sentido de apenas poderem relevar como custos as despesas que tenham sido realizadas com a perspectiva de incrementar os ganhos ou proveitos ou manter a fonte produtora e não as supérfluas, as que não tenham qualquer relação perceptível com a formação do rendimento.

Se a empresa, por sua iniciativa, decide efectuar, com vinculação jurídica de natureza contratual ou sem ela, despesas que não são necessárias para a formação do rendimento nem manutenção da fonte produtora, deverá suportar integralmente essas despesas, não havendo suporte lógico, nem legal, nem constitucional para que seja a generalidade dos contribuintes a suportarem o parte do prejuízo que de tal conduta deriva para o erário público, através da diminuição das receitas fiscais.

Nem se divisa aqui uma violação do princípio da igualdade, pois o tratamento fiscal das despesas conexionadas com a formação do rendimento ou a manutenção da fonte produtora não tem de ser idêntico ao que é dado às despesas que não contribuem para essa formação.

Por outro lado, também não é violado o princípio da capacidade contributiva, pois ele não exige que se dê relevância a diminuições de rendimento desnecessárias.

Também não é afectado o direito constitucional à propriedade privada, pois o dever de pagar impostos é uma das restrições constitucionalmente previstas a esse direito.

Diga-se ainda que, não se justificam, nesta matéria de seguros de doença, comparações com os regimes de assistência na doença aos funcionários públicos e equiparados, pois estes são regimes contributivos, pagos pelos trabalhadores cujos familiares são beneficiários.

Pelo exposto, entende-se que é correcta a tese defendida pela Autoridade Tributária e Aduaneira e que a correcção efectuada e as consequentes liquidações não enfermam de vício de violação de lei, na parte em que aplicaram aquela correcção.

 

4. Reembolso do imposto que deveria ter sido recebido e pagamento de juros indemnizatórios

 

A Requerente defende que, se não fossem as correcções efectuadas, teria sido liquidada a seu favor a quantia de € 1.259.261,19, calculada com base no imposto liquidado, que é de € 2.435.545,97 e o imposto correspondente às correcções impugnadas no presente processo que é de € 3.383.085,45, acrescido de juros compensatórios no montante de € 311.721,72, o que perfaz o total de € 3.694.807,17.

De harmonia com o disposto na alínea b) do art. 24.º do RJAT a decisão arbitral sobre o mérito da pretensão de que não caiba recurso ou impugnação vincula a administração tributária a partir do termo do prazo previsto para o recurso ou impugnação, devendo esta, nos exactos termos da procedência da decisão arbitral a favor do sujeito passivo e até ao termo do prazo previsto para a execução espontânea das sentenças dos tribunais judiciais tributários, «restabelecer a situação que existiria se o acto tributário objecto da decisão arbitral não tivesse sido praticado, adoptando os actos e operações necessários para o efeito», o que está em sintonia com o preceituado no art. 100.º da LGT [aplicável por força do disposto na alínea a) do n.º 1 do art. 29.º do RJAT] que estabelece, que «a administração tributária está obrigada, em caso de procedência total ou parcial de reclamação, impugnação judicial ou recurso a favor do sujeito passivo, à imediata e plena reconstituição da legalidade do acto ou situação objecto do litígio, compreendendo o pagamento de juros indemnizatórios, se for caso disso, a partir do termo do prazo da execução da decisão».

Embora o art. 2.º, n.º 1, alíneas a) e b), do RJAT utilize a expressão «declaração de ilegalidade» para definir a competência dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD, não fazendo referência a decisões condenatórias, deverá entender-se que se compreendem nas suas competências os poderes que em processo de impugnação judicial são atribuídos aos tribunais tributários, sendo essa a interpretação que se sintoniza com o sentido da autorização legislativa em que o Governo se baseou para aprovar o RJAT, em que se proclama, como primeira directriz, que «o processo arbitral tributário deve constituir um meio processual alternativo ao processo de impugnação judicial e à acção para o reconhecimento de um direito ou interesse legítimo em matéria tributária».

O processo de impugnação judicial, apesar de ser essencialmente um processo de anulação de actos tributários, admite a condenação da Administração Tributária no pagamento de juros indemnizatórios, como se depreende do art. 43.º, n.º 1, da LGT, em que se estabelece que «são devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido» e do art. 61.º, n.º 4 do CPPT (na redacção dada pela Lei n.º 55-A/2010, de 31 de Dezembro, a que corresponde o n.º 2 na redacção inicial), que «se a decisão que reconheceu o direito a juros indemnizatórios for judicial, o prazo de pagamento conta-se a partir do início do prazo da sua execução espontânea».

Assim, o n.º 5 do art. 24.º do RJAT, ao dizer que «é devido o pagamento de juros, independentemente da sua natureza, nos termos previsto na lei geral tributária e no Código de Procedimento e de Processo Tributário», deve ser entendido como permitindo o reconhecimento do direito a juros indemnizatórios no processo arbitral.

Cumpre, assim, apreciar o pedido de reembolso do montante indevidamente pago de € 134.836,68, acrescido de juros indemnizatórios.

 No caso em apreço, é manifesto que, na sequência da ilegalidade do acto de liquidação, há lugar a reembolso do imposto, por força dos referidos arts. 24.º, n.º 1, alínea b), do RJAT e 100.º da LGT, pois tal é essencial para «restabelecer a situação que existiria se o acto tributário objecto da decisão arbitral não tivesse sido praticado».

No que concerne aos juros indemnizatórios, é também claro que a ilegalidade do acto de liquidação de IRC de 2005 é imputável à Administração Tributária, que, por sua iniciativa, os praticou sem suporte legal, quanto correcção relativa às prestações suplementares.

Está-se perante vício de violação de lei substantiva, consubstanciado em erro nos pressupostos de direito, imputável à Administração Tributária

Consequentemente, a Requerente tem direito a reembolso do imposto que deveria ter recebido e juros indemnizatórios, nos termos dos artigos 30.º, n.º 1, alínea c) e e), e 43.º, n.º 1, da LGT e 61.º do CPPT.

As correcções efectuadas foram no montante de € 12.391.119,66 e a procedência da pretensão da Requerente reporta-se a € 11.923.318,97, pelo que a procedência parcial é na percentagem de 96,22%, o que implica que o imposto que deveria ter sido liquidado, acrescido de juros compensatórios, seria de 3.555.143,46, menos € 139.663,71 do que o que foi liquidado.

Assim, em vez de € 1.259.261,19, deveria ter sido liquidada a favor da Requerente a quantia de € 1.119.597,48 (€ 1.259.261,19 - € 139.663,71).

Por isso, é esta quantia de € 1.119.597,48 aquela a que a Requerente tem direito a ser reembolsada, desde 27-12-2008 até integral pagamento.

 

  1. Indemnização por garantia indevida

 

A Requerente formula um pedido de indemnização por garantia indevida.

De harmonia com o disposto na alínea b) do art. 24.º do RJAT a decisão arbitral sobre o mérito da pretensão de que não caiba recurso ou impugnação vincula a administração tributária a partir do termo do prazo previsto para o recurso ou impugnação, devendo esta, nos exactos termos da procedência da decisão arbitral a favor do sujeito passivo e até ao termo do prazo previsto para a execução espontânea das sentenças dos tribunais judiciais tributários, «restabelecer a situação que existiria se o acto tributário objecto da decisão arbitral não tivesse sido praticado, adoptando os actos e operações necessários para o efeito».

Na autorização legislativa em que o Governo se baseou para aprovar o RJAT, concedida pelo art. 124.º da Lei n.º 3-B/2010, de 28 de Abril, proclama-se, como directriz primacial da instituição da arbitragem como forma alternativa de resolução jurisdicional de conflitos em matéria tributária, que «o processo arbitral tributário deve constituir um meio processual alternativo ao processo de impugnação judicial e à acção para o reconhecimento de um direito ou interesse legítimo em matéria tributária».

Embora o art. 2.º, n.º 1, alíneas a) e b), do RJAT utilize a expressão «declaração de ilegalidade» para definir a competência dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD e não faça referência a decisões constitutivas (anulatórias) e condenatórias, deverá entender-se, em sintonia com a referida autorização legislativa, que se compreendem nas suas competências os poderes que em processo de impugnação judicial são atribuídos aos tribunais tributários em relação aos actos cuja apreciação de legalidade se insere nas suas competências.

Apesar de o processo de impugnação judicial ser essencialmente um processo de mera anulação (arts. 99.º e 124.º do CPPT), pode nele ser proferida condenação da administração tributária no pagamento de juros indemnizatórios e de indemnização por garantia indevida.

Na verdade, apesar de não existir qualquer norma expressa nesse sentido, tem-se vindo pacificamente a entender nos tribunais tributários, desde a entrada em vigor dos códigos da reforma fiscal de 1958-1965, que pode ser cumulado em processo de impugnação judicial pedido de condenação no pagamento de juros indemnizatórios com o pedido de anulação ou de declaração de nulidade ou inexistência do acto, por nesses códigos se referir que o direito a juros indemnizatórios surge quando, em reclamação graciosa ou processo judicial, a administração seja convencida de que houve erro de facto imputável aos serviços. Este regime foi, posteriormente, generalizado no Código de Processo Tributário, que estabeleceu no n.º 1 do seu art. 24.º que «haverá direito a juros indemnizatórios a favor do contribuinte quando, em reclamação graciosa ou processo judicial, se determine que houve erro imputável aos serviços», a seguir, na LGT, em cujo art. 43.º, n.º 1, se estabelece que «são devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido» e, finalmente, no CPPT em que se estabeleceu, no n.º 2 do art. 61.º (a que corresponde o n.º 4 na redacção dada pela Lei n.º 55-A/2010, de 31 de Dezembro), que «se a decisão que reconheceu o direito a juros indemnizatórios for judicial, o prazo de pagamento conta-se a partir do início do prazo da sua execução espontânea».

Relativamente ao pedido de condenação no pagamento de indemnização por prestação de garantia indevida, o art. 171.º do CPPT, estabelece que «a indemnização em caso de garantia bancária ou equivalente indevidamente prestada será requerida no processo em que seja controvertida a legalidade da dívida exequenda» e que «a indemnização deve ser solicitada na reclamação, impugnação ou recurso ou em caso de o seu fundamento ser superveniente no prazo de 30 dias após a sua ocorrência».

Assim, é inequívoco que o processo de impugnação judicial abrange a possibilidade de condenação no pagamento de garantia indevida e até é, em princípio, o meio processual adequado para formular tal pedido, o que se justifica por evidentes razões de economia processual, pois o direito a indemnização por garantia indevida depende do que se decidir sobre a legalidade ou ilegalidade do acto de liquidação.

O pedido de constituição do tribunal arbitral tem como corolário passar a ser no processo arbitral que vai ser discutida a «legalidade da dívida exequenda», pelo que, como resulta do teor expresso daquele n.º 1 do referido art. 171.º do CPPT, é também o processo arbitral o adequado para apreciar o pedido de indemnização por garantia indevida.

Aliás, a cumulação de pedidos relativos ao mesmo acto tributário está implicitamente pressuposta no art. 3.º do RJAT, ao falar em «cumulação de pedidos ainda que relativos a diferentes actos», o que deixa perceber que a cumulação de pedidos também é possível relativamente ao mesmo acto tributário e os pedidos de indemnização por juros indemnizatórios e de condenação por garantia indevida são susceptíveis de ser abrangidos por aquela fórmula, pelo que uma interpretação neste sentido tem, pelo menos, o mínimo de correspondência verbal exigido pelo n.º 2 do art. 9.º do Código Civil.

O regime do direito a indemnização por garantia indevida consta do art. 53.º da LGT, que estabelece o seguinte:

Artigo 53.º

Garantia em caso de prestação indevida

            1. O devedor que, para suspender a execução, ofereça garantia bancária ou equivalente será indemnizado total ou parcialmente pelos prejuízos resultantes da sua prestação, caso a tenha mantido por período superior a três anos em proporção do vencimento em recurso administrativo, impugnação ou oposição à execução que tenham como objecto a dívida garantida.

            2. O prazo referido no número anterior não se aplica quando se verifique, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços na liquidação do tributo.

            3. A indemnização referida no número 1 tem como limite máximo o montante resultante da aplicação ao valor garantido da taxa de juros indemnizatórios prevista na presente lei e pode ser requerida no próprio processo de reclamação ou impugnação judicial, ou autonomamente.

            4. A indemnização por prestação de garantia indevida será paga por abate à receita do tributo do ano em que o pagamento se efectuou.

 

No caso em apreço, uma das correcções que estão subjacentes à liquidação de IRC e juros compensatórios enferma de erro que é imputável à Administração Tributária, pois as correcções que efectuou foram da sua iniciativa e a Requerente em nada contribuiu para que o erro da correcção relativa às prestações suplementares fosse praticado.

A Requerente prestou garantia bancária para suspender a execução da quantia liquidada, sendo as despesas no montante de € 40.902,51 (documentos n.ºs 43 e 44, juntos com o pedido de pronúncia arbitral).

As correcções efectuadas foram no montante de € 12.391.119,66 e a procedência da pretensão da Requerente reporta-se a € 11.923.318,97, que corresponde a 96,22%.

Assim, a Requerente tem direito a ser indemnizada pelos prejuízos que advieram da prestação de garantia nesta percentagem, isto é, € 39.356,39.

 

    6. Decisão

 

    De harmonia com o exposto, acordam neste Tribunal Arbitral em:

 

  1. Julgar procedente o pedido de anulação parcial e anular parcialmente a liquidação de IRC n.º 2009..., relativa ao exercício de 2005 do Grupo Fiscal A..., no montante de € 3.694.807,16, na parte correspondente a IRC de € 3.383.085,45 e juros compensatórios € 311.721,72 [alínea i) da matéria de facto fixada];
  2. Julgar parcialmente procedente o pedido de reembolso de imposto, limitado ao montante de € 1.119.597,48;
  3. Julgar parcialmente procedente o pedido de pagamento de juros indemnizatórios, que tem por base a quantia de € 1.119.597,48 e são contados desde, desde 27-12-2008 até integral pagamento, à taxa legal que vigorar desde aquela data até ao pagamento;
  4. Julgar procedente o pedido de reconhecimento do direito da Requerente a indemnização por garantia indevida e condenar a Autoridade Tributária e Aduaneira a pagar à Requerente a indemnização € 39.356,39;
  5. Julgar parcialmente improcedentes os pedidos na parte restante.

 

7. Valor do processo

De harmonia com o disposto no art. 315.º, n.º 2, do CPC e 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária fixa-se ao processo o valor de € 3.735.709,67.

 

8. Custas

 

Nos termos do art. 22.º, n.º 4, do RJAT, fixa-se o montante das custas em € 47.430,00, nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, a cargo da Autoridade Tributária e Aduaneira.

 

Lisboa, 22 de Outubro de 2013

 

Os Árbitros

 

 

 

(Jorge Manuel Lopes de Sousa)

 

 

 

(Maria Manuela do Nascimento Roseiro)

 

 

 

 

(Elísio Brandão)

 

 



( [1] )    Essencialmente neste sentido, podem ver-se os seguintes acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo, a propósito de situação paralela que se coloca nos processos de recurso contencioso:

  • de 10-11-98, do Pleno, proferido no recurso n.º 32702, publicado em Apêndice ao Diário da República de 12-4-2001, página 1207;
  • de 19-6-2002, processo n.º 47787, publicado em Apêndice ao Diário da República de 10-2-2004, página 4289;
  • de 09-10-2002, processo n.º 600/02;
  • de 12-3-2003, processo n.º 1661/02.

 

     Em sentido idêntico, podem ver-se:

  • MARCELLO CAETANO, Manual de Direito Administrativo, volume I, 10.ª edição, página 479 em que refere que é «irrelevante que a Administração venha, já na pendência do recurso contencioso, invocar como motivos determinantes outros motivos, não exarados no acto», e volume II, 9.ª edição, página 1329, em que escreve que «não pode (...) a autoridade recorrida, na resposta ao recurso, justificar a prática do acto recorrido por razões diferentes daquelas que constam da sua motivação expressa»;  
  •  MÁRIO ESTEVES DE OLIVEIRA, Direito Administrativo, Volume I, página 472, onde escreve que «as razões objectivamente existentes mas que não forem expressamente aduzidas, como fundamentos do acto, não podem ser tomadas em conta na aferição da sua legalidade».         

( [2] )     A redacção anterior da norma correspondente, introduzida pela Lei n.º 32-B/2002, de 30 de Dezembro, era a seguinte:

 3 – A diferença negativa entre as mais-valias e as menos-valias realizadas mediante a transmissão onerosa de partes de capital, incluindo a sua remissão e amortização com redução de capital, concorre para a formação do lucro tributável em apenas metade do seu valor.

( [3] )     BAPTISTA MACHADO, Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador, página 182.