Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 317/2023-T
Data da decisão: 2024-02-19  IRS  
Valor do pedido: € 184.556,66
Tema: IRS - Residência fiscal; CDT entre Portugal e Itália.
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SUMÁRIO

  1. Critérios para determinar a residência fiscal;
  2. Aplicação da CDT celebrada entre Portugal e Itália;
  3. (Im)possibilidade de criação de regra ad hoc para tributar residente fiscal em Itália por rendimentos recebidos de Portugal às taxas gerais de IRS.

 

DECISÃO ARBITRAL

          Os árbitros Juiz José Poças Falcão (árbitro presidente), Dr. Francisco Melo e Dra. Ana Teixeira de Sousa (árbitros vogais), designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa para formarem o Tribunal Arbitral, constituído em 10-07-2023, acordam no seguinte:

 

I - RELATÓRIO

A - Identificação das Partes

  1.  Requerente: A..., titular do número de identificação fiscal ..., residente em ... ..., ..., ..., na Alemanha, (doravante designado por “Requerente”).
  2. Requerida: Autoridade Tributaria e Aduaneira (doravante designada por “Requerida” ou “AT”).

 

B – Constituição do Tribunal Arbitral e Saneador

  1. Em 02-05-2023, o Requerente requereu a constituição de Tribunal Arbitral Tributário e apresentou pedido de pronúncia arbitral (“PPA”), ao abrigo do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, que aprova o Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (“RJAT”), contra o acto de liquidação de Imposto Sobre o Rendimento das Pessoas Singulares sob o n.º 2022..., a respetiva demonstração de acerto de contas identificada sob o n.º 2022..., bem como a demonstração de liquidação de juros identificada sob o n.º 2023..., relativas ao período de tributação entre 1.01.2018 e 31.12.2018.
  2.  O PPA é tempestivo porque apresentado no prazo de 90 dias referido no artigo 10.º, n.º 1, alínea a), do RJAT, a contar da data limite de pagamento do IRS constante da notificação da nota de cobrança supramencionada.
  3. O pedido de constituição do Tribunal Arbitral foi aceite em 04-05-2023 pelo Exmo. Senhor Presidente do CAAD, e, em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, subsequentemente notificado à AT.
  4. O Requerente não procedeu à nomeação de árbitro, pelo que, ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 6.º e na alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, o Conselho Deontológico designou os ora signatários como árbitros do Tribunal Arbitral Coletivo, que comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável.
  5. Em 21-06-2023, as partes foram devidamente notificadas dessa designação, e não manifestaram vontade de a recusar, nos termos do artigo 11.º n.º 1, alínea a) e b), do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.
  6. O Tribunal Arbitral Coletivo foi regularmente constituído em 10-07-2023, à face do preceituado nos artigos 2.º, n.º 1, alíneas a), e 10.º, n.º 1, do RJAT, para apreciar e decidir o objeto do presente litígio.
  7. As partes estão devidamente representadas, gozam de personalidade e capacidade judiciárias, e são legítimas (cfr. artigos 4.º e 10.º, n.º 2, do RJAT e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março).
  8. Em 27-09-2023, a Requerida apresentou resposta, bem como juntou o processo administrativo.
  9. Por Despacho Arbitral de 06-10-2023, foi dispensada a reunião prevista no artigo 18.º do RJAT e atribuído prazo para as partes apresentarem alegações finais escritas, e ainda indicada a data prevista para a prolação da decisão arbitral.
  10. As partes apresentaram alegações em 30 e 31 de Outubro, respectivamente, o Requerente e a Requerida.
  11. Em 08-01-2024, o Tribunal Arbitral prorrogou o prazo para prolação da Decisão Arbitral por dois meses, nos termos do artigo 21.º, n.º 2, do RJAT.
  12. O processo não enferma de nulidades.

 

C – Pedido    

  1. O Requerente pretende obter:
    1. a declaração de ilegalidade e anulação do acto de liquidação IRS n.º 2022..., correspondente à nota de cobrança de IRS n.º 2022..., e demonstração de liquidação de juros n.º 2023..., emitidas em nome do Requerente, no valor total de € 184.556,66 (cento e oitenta e quatro mil, quinhentos e cinquenta e seis euros e sessenta e seis cêntimos);
    2. o reembolso pela Autoridade Tributária e Aduaneira, do IRS no valor de € 184.556,66 (cento e oitenta e quatro mil, quinhentos e cinquenta e seis euros e sessenta e seis cêntimos);
    3. o pagamento dos juros indemnizatórios que se mostrem devidos nos termos dos artigos 43.º da LGT, 61.º do CPPT e 24.º, n.º 5 do RJAT.

 

D – Causa de pedir

  1. A fundamentar o PPA, o Requerente alegou o seguinte:
  1. Em 2018, o Requerente qualificou como não residente, para efeitos fiscais, em Portugal, durante todo o ano, conforme atesta o registo cadastral do Portal das Finanças do Requerente;
  2. O Requerente, conforme é facto público e notório, desempenha a atividade de futebolista profissional;

 

  1. O Requerente esteve contratualmente vinculado ao Futebol B..., até ao dia 11 de junho de 2017;
  2. No dia 12 de junho de 2017, o Futebol B... comunicou oficialmente à Comissão de Mercado de Valores Mobiliários, a cedência a título definitivo dos direitos de inscrição desportiva do Requerente para o clube C..., sediado em Itália, onde se manteve até ao final da época de futebol 2017/2018;
  3. Este facto é demonstrado pelo Certificado de Residência emitido pelas Autoridades Italianas que refere que o Requerente é residente em Itália desde 05 de dezembro de 2017;
  4. Por sua vez, em agosto de 2018, o Requerente foi cedido ao F... onde se instalou até 31 de dezembro de 2018;
  5. Para comprovar a sua residência, desde 17 de agosto de 2018, o Requerente apresenta o Certificado de Registro de Ciudadano de la Union, emitido pelas Autoridades Espanholas;
  6.  Ora, considerando a atividade profissional do Requerente, é, desde logo, inequívoco que o exercício da sua atividade exige a sua presença física no seu local de trabalho, à data relevante, em Itália e em Espanha, respetivamente, no exercício de 2018 – não permitindo, de forma alguma, que a mesma seja desempenhada à distância ou remotamente;
  7. Desde o dia 17 de julho de 2017, não mais o Requerente qualificou como residente fiscal em Portugal, em virtude de ter exercido a sua atividade profissional no estrangeiro encontrando-se corretamente registado neste mesmo sentido junto da AT em Portugal;
  8. Sendo, nesta medida, considerado não residente fiscal em Portugal durante o exercício de 2018 (não residência esta que é, desde logo, aceite e confirmada pelas Autoridades Fiscais, conforme atesta o cadastro fiscal);
  9. Assim, em cumprimento das suas obrigações fiscais, e considerando o estatuto de residência fiscal do Requerente em 2018, o mesmo entregou uma declaração de rendimentos em 2018, como não residente fiscal, relativamente aos rendimentos de fonte portuguesa apesar de já terem sido sujeitos a tributação a taxas liberatórias, nos seguintes termos:

- Reportando o rendimento do trabalho dependente, de fonte portuguesa, pago pela E..., com o número de pessoa coletiva ..., no montante de € 141.300,00 (cento e quarenta e um mil e trezentos euros) e respetivas retenções na fonte no montante de € 35.325,00 (trinta e cinco mil, trezentos e vinte e cinco euros), e pelo Futebol B..., com o número de pessoa coletiva..., no montante de € 1.013.157,88 (um milhão, treze mil, cento e cinquenta e sete euros e oitenta e oito cêntimos) e respetivas retenções na fonte no montante de € 253.289,47 (duzentos e cinquenta e três mil, duzentos e oitenta e nove euros e quarenta e sete cêntimos);

- Encontrando-se, até 31 de maio de 2018, registado pelo exercício de uma atividade empresarial ou profissional, procedeu, igualmente, à entrega do Anexo B, referente a rendimentos empresariais e profissionais, mesmo não tendo auferido qualquer rendimento a este título;

  • Da declaração de rendimentos resultou a emissão da demonstração de liquidação de IRS com o n.º 2019..., com o valor a reembolsar de € 5.022,00;
  • A Autoridade Tributária efetuou uma notificação datada de 6 de dezembro de 2022 – Ofício Nº 2022..., a informar o Requerente, através do seu representante fiscal, D..., para “[…] no prazo de 15 (quinze) dias, exercer o direito de audição, preferencialmente por escrito, sobre o projeto de decisão, que se anexa”;
  • A notificação foi efetuada, no âmbito de uma obrigação declarativa do Requerente de entregar uma declaração de substituição de rendimentos de 2018, como residente fiscal em Portugal – no entendimento da Autoridade Tributária;
  • A argumentação da AT assenta no pressuposto de que, no ano de 2018, o Requerente, ainda que qualifique como não residente fiscal em Portugal, tem a obrigação de pagamento de imposto como se de um residente se tratasse, relativamente aos rendimentos recebidos por parte do Futebol B..., com o número de pessoa coletiva ...;
  • O entendimento acima mencionado está claramente vertido no ponto 32. do Ofício (cfr. Documento n.º 8), “ […] Isto só se torna possível, no entanto, porque, nos termos da CDT Portugal – Itália, o Estado Português, e os serviços competentes da Autoridade Tributária Portuguesa, podem sustentar, de forma fundamentada, a residência em território português do Contribuinte […]” (sublinhado nosso);
  • É, ainda, de realçar, que o ponto acima transcrito continua da seguinte forma, “[…] ainda que, unicamente ao abrigo do disposto no Número 1, do Artigo 4º (Residente) da Convenção, pois, como é já sabido, nos termos do disposto no Número 2, o Contribuinte acaba por ser havido, por Residente Fiscal da Itália” (sublinhado e negrito nossos);
  • Aliás, o próprio parecer do Diretor de Serviços da Direção de Serviços Relações Internacionais, que mereceu a concordância de todos, refere que, “Considero estarem reunidas as condições objetivas para que os rendimentos, obtidos pelo contribuinte de fonte Portuguesa, sejam sujeitos a tributação em Portugal à taxa geral prevista para os residentes. A conclusão supra referida resulta, conforme fundamentação em anexo, por inobservância dos princípios subjacentes à aplicação da CDT Portugal/Itália, por opção pela tributação a taxa reduzida, efetuada pelo sujeito passivo, dos referidos rendimentos em Itália” (sublinhado nosso);
  • Foi, por isso, o Requerente notificado, através de correio registado, da Demonstração de Acerto de Contas e baseado no pressuposto da obrigação de pagamento de imposto como se de um residente fiscal em Portugal se tratasse entre 01-01-2018 e 31-12-2018 relativamente aos rendimentos recebidos por parte do Futebol B..., com o número de pessoa coletiva ..., sendo apurado um saldo a liquidar de € 184.556,66 (cento e oitenta e quatro mil, quinhentos e cinquenta e seis euros e sessenta e seis cêntimos);

:

  1. O Requerente no ano de 2018 continuou o seu vínculo laboral que tinha desde o final de 2017 com o C..., mantendo-se como residente fiscal em Itália, tendo só alterado a sua residência em agosto de 2018 para Espanha, quando foi cedido ao clube de .F..;
  2. O Requerente, no exercício da sua atividade, tem efetivamente que estar presente nos países dos clubes que representa;
  3. Pelo exposto, é de facto notório, sem qualquer margem para dúvida, que o Requerente é não residente fiscal em 2018 em Portugal;
  4. A Autoridade Tributária assenta a sua argumentação de considerar o Requerente como residente fiscal em Portugal no ano de 2018, “ainda que unicamente ao abrigo”, do n.º 1 do artigo 4.º da Convenção entre a República Portuguesa e a República Italiana para Evitar a Dupla Tributação e Prevenir a Evasão Fiscal em Matéria de Impostos Sobre o Rendimento (doravante, igualmente, por “CDT”);
  5. O Requerente realça os comentários constantes da Convenção Modelo da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico ao artigo da CDT suprarreferido – mais concretamente o comentário 8 – que clarifica que o artigo é aplicado para apurar a residência em situação de possível conflito entre duas jurisdições:

            “O paragrafo 1 dá uma definição da expressão “Residente de um Estado Contratante” para efeitos da convenção. A definição remete para o conceito de residência adotado nas leis domésticas (tradução e sublinhado nossos);

  1. Quer pela legislação interna portuguesa, quer pela legislação interna italiana, não há qualquer conflito de residências que tenha que ser resolvido pela aplicação do CDT
  2. Segundo o entendimento da Autoridade Tributária demonstrado no ponto 33 da Informação 2640/2022 com despacho concordante de 30/11/2022 no processo ...2022... para a residência do Requerente ser considerada em território português “(…) contribui, a Casa de Morada de Família, situada no concelho de ..., distrito do Porto e o Domicilio Profissional atinente aos Rendimentos do Trabalho Dependente pagos pelo Futebol B...[…] tomando-se aqui por referência, o disposto no artigo 16.º, número 1, alínea b), do Código do IRS.”;
  3. A AT não apresentando qualquer prova desta residência do Requerente para além de referir a mera titularidade do imóvel;
  4. Prova do facto que o Requerente é apenas proprietário da casa de ... e que tal imóvel é apenas uma habitação secundária do Requerente, para usufruir de umas férias no seu país de origem, e que não existe qualquer intenção de a manter e ocupar como residência habitual, é quando a AT pretende notificar o Requerente da demonstração de liquidação de IRS, objeto de análise, mediante notificação com hora certa, e ninguém se encontrava no imóvel para a rececionar;
  5. Quanto à segunda parte da argumentação utilizada pela AT, relativamente ao domicílio profissional atinente aos rendimentos do trabalho dependente pagos pelo Futebol B..., é importante referir que os rendimentos provenientes desta entidade são rendimentos devidos ao Requerente desde a cessação das atividades pessoais como jogador profissional ao serviço da equipa principal do Futebol B..., em 2017, pelo que é um rendimento que não está dependente do trabalho e da presença física do Requerente em território português, para este o receber;
  6. Conclui-se, por isso, com toda a segurança, que não se verifica, sob qualquer critério estabelecido pela lei interna, pela aplicação da CDT entre Portugal e Itália ou entre Portugal e Espanha, o enquadramento do Requerente enquanto residente fiscal em Portugal no ano de 2018, como a Autoridade Tributária pretende enquadrar o mesmo;
  7. Acresce que, no que diz respeito aos rendimentos auferidos pelo Futebol B..., a AT refere que esses rendimentos foram tributados, por escolha do Requerente, segundo as regras de um regime especial de tributação em Itália, conforme ponto 21 do citado Oficio (cfr. Documento n.º 8), por Opção do Contribuinte, nos termos da legislação fiscal italiana, a um regime especial de tributação, muito atenuado, sempre que se trate de rendimentos elevados, como na situação em apreço, vulgarmente designado, ao nível internacional, por «fortait fiscal», na doutrina italiana, por «imposta forfettaria», conforme, menção expressa por parte da Autoridade Fiscal da Itália”;
  8. De referir, que a opção pela tributação por este regime, designado por “Imposto forfettaria”, resultou no pagamento de um montante de imposto de € 100.000,00 (cem mil euros) pago pelo Requerente sobre os rendimentos de fonte estrangeira, nomeadamente, os colocados à disposição pelo Futebol B..., nesse ano, que ascenderam a € 1.013.157,89 (um milhão, treze mil e cento e cinquenta e sete euros, e oitenta e nove cêntimos);
  9. Esta opção, no entendimento da Autoridade Tributária, resulta numa situação ”objetivamente abusiva” por parte do sujeito passivo, que pretendeu que lhe fosse atribuído “benefícios convencionais, desde logo o da isenção ou redução indevida do imposto português”, uma vez que o seu rendimento objeto de análise foi tributado a uma taxa efetiva de 8,66%, ao invés de observar-se o princípio constitucionalmente consagrado da tributação progressiva, nos termos do artigo 104.º, n.º 1 da Constituição da República Portuguesa;
  10. Invoca, assim, nesta medida, a AT a aplicação no presente caso da cláusula geral de anti-abuso constante da CDT Itália – Portugal, “passando a tributar-se o elemento do Rendimento do Trabalho Dependente da titularidade do Contribuinte, pago em 2018 pelo Futebol B... […] segundo as taxas gerais previstas no Código do IRS, com direito porém à imputação integral do imposto italiano correspondente a Euro 100.000,00, para a eliminação da dupla tributação jurídica internacional, em conformidade com o disposto sobre essa matéria na Convenção.”;
  11. Pois, segundo a AT existe nos termos do disposto no artigo 15.º da CDT Portugal – Itália, tributação cumulativa dos Rendimentos de Trabalho Dependente, acrescentando que “como resulta de forma necessária do Direito adquirido, por Portugal, de aceder primeiro, à tributação do elemento dos Rendimentos devidos e pagos, pelo Futebol B... […], em conexão direta com o vínculo, pré-existente do Contribuinte ao Clube português e por causa dele.”;
  12. A CDT Portugal – Itália só deverá ser aplicada no caso de existir conflito de jurisdições de ambos os Estados em determinada matéria;
  13. Se o Requerente é considerado residente fiscal em Itália e não residente fiscal em Portugal, não existe qualquer razão aparente para a AT invocar a cláusula de anti-abuso e a tributação cumulativa de rendimentos de trabalho dependente;
  14. Por outro lado, atendendo ao expressamente previsto no artigo 63.º do CPPT, mais concretamente no seu n.º 3, não existe fundamentação nos termos legalmente exigíveis que sustentem a aplicação da cláusula anti-abuso, atendendo a que na decisão por parte da AT não consta:

a) “A descrição da construção ou série de construções que foram realizadas com abuso das formas jurídicas ou que não foram realizadas por razões económicas válidas que reflitam a substância económica;

 b) A demonstração de que a construção ou série de construções foi realizada com a finalidade principal ou uma das finalidades principais de obter uma vantagem fiscal não conforme com o objeto ou a finalidade do direito fiscal aplicável;

c) A identificação dos negócios ou actos que correspondam à substância ou realidade económica, bem como a indicação das normas de incidência que se lhes aplicam; e

d) A demonstração de que o sujeito passivo sobre o qual recairia a obrigação de efetuar a retenção na fonte, ou de reter um montante de imposto superior, tinha ou deveria ter conhecimento da construção ou série de construções, quando aplicável.”;

  1. A AT, na notificação enviada limita-se a uma mera indicação de situação de abuso, sem qualquer exposição ou desenvolvimento da sua suposta verificação em concreto – o que parece apenas reforçar a inexistência da mesma por um lado e, por outro lado, dificulta a defesa do Requerente;
  2. Conforme estabelecido na alínea a) do n.º 6 do artigo 72.º do Código do IRS, aos rendimentos de trabalho dependente auferidos por não residente fiscal em território português é aplicada a taxa liberatória de 25%;
  3. Significa isto que, factualmente, estes rendimentos, foram tributados a uma taxa efetiva de 33,66% e não 8,66%
  • 8,66% em Itália, em virtude da aplicação do regime “Imposta Forfettaria”; acrescido de
  • 25% em Portugal, em conformidade com a alínea a) do n.º 6 do artigo 72.º do Código do IRS;
  1. Nesta medida, não se verificam razões para estar a ser aplicado ao Requerente uma cláusula geral de anti-abuso, já que o mesmo sempre se pautou por um comportamento exemplar e de boa-fé junto da Administração Fiscal;
  2. No seguimento da aplicação da cláusula geral anti-abuso, constante da CDT Portugal – Itália, a AT pretende “criar a norma Ad hoc”, de modo a tributar os rendimentos de trabalho dependente de fonte portuguesa, de um não residente fiscal, como o aqui Requerente, em sede de IRS, como se de um residente fiscal se tratasse, isto é, às taxas progressivas conforme artigo 68.º da do Código do IRS, sugerido na notificação enviada ao Requerente;
  3. Este entendimento é completamente contraditório aos princípios que a Autoridade Tributária está sujeita, designadamente, ao princípio da legalidade identificado no artigo 8.º da LGT;
  4. Existem exceções à aplicação das taxas progressivas no ordenamento português – como o caso dos Residentes Não Habituais - pelo que a AT tem de considerar as mesmas, sob pena de violação das normas jurídicas, devendo aplicar-se a mesma ponderação quando estão em causa regimes especiais de tributação em outras jurisdições, como é o caso da análise agora em apreço;
  5. Assim, entende o Requerente que a criação desta norma ad hoc, com o objetivo de tributar o Requerente a taxas progressivas, põe em causa a segurança jurídica e o princípio da legalidade pelo qual a AT deve pautar-se;
  6. Em suma, o Requerente conclui nos seguintes termos:
  • Que há uma violação clara das exigências do artigo 63.º do CPPT;
  • Que dessa violação resulta que o Requerente não consegue descortinar qual os contornos da sua suposta situação de abuso;
  • Que não é possível discernir o que, na opinião da Autoridade Tributária, leva a concluir que o Requerente se encontra numa situação de abuso objetivo.

 

E - Resposta da Requerida

  1. Em resposta, a Requerida defendeu-se por impugnação reproduzindo integralmente a Informação que assenta fundamentalmente no seguinte:

 “1. O contribuinte A... (NIF ...) apresentou um pedido de constituição de tribunal arbitral, no Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD), ao qual foi atribuído o número de processo 228/2022-T, tendo a Direção de Serviços de Consultadoria Jurídica e do Contencioso (DSCJC), solicitado a pronúncia expressa, por parte da Subdiretora-Geral da Área dos Impostos sobre o Rendimento e de Relações Internacionais, a que se refere o Despacho de Revogação do Acto contestado, que veio a ser proferido pela Senhora Subdiretora-Geral, em 2022-06-27, exarado na Informação n.º 1300/2022 (Processo «GPS» N.º ...2022...), da Direção de Serviços de Relações Internacionais (DSRI).

2. Nos pontos 12 e 13 da Informação sancionada, com o número 1300/2022, fez-se menção expressa à Obrigação, por parte do Futebol B... (NIF PT...), decorrente de contracto pré-existente, de pagar uma parte dos Rendimentos considerados, ao Desportista, ou seja, ao Contribuinte, factos geradores de imposto verificados, não apenas em 2017, a que se refere o Despacho de Pronúncia, mas também nos anos seguintes, havendo ainda registo de pagamentos efetuados, no ano de 2021. S.A.D. (NIF PT...), para com o Contribuinte, terá com certeza por fonte o Contracto ou Contractos, celebrados entre as duas Partes.

3……………………………….

4. Nesta conformidade, e com relevo para o IRS de 2018 do Contribuinte, considerado como Residente Fiscal da Itália, em conformidade com o disposto sobre a matéria, na Convenção sobre Dupla Tributação celebrada entre Portugal e a Itália, doravante, CDT Portugal – Itália, passa-se à análise, contendo, a final, um parecer, também para os anos subsequentes, do modo que segue.

5. Consultados os registos informáticos atinentes ao IRS, verifica-se que o Contribuinte

entregou a Declaração Anual de Rendimentos para efeito do IRS de 2018 como residente fiscal da Itália, na qual inscreveu os Rendimentos do Trabalho Dependente pagos, (1) pelo Futebol B... (NIF PT...), e (2) pela E... (NIF...).

6. Estão aqui em causa, de forma direta, os Rendimentos do Trabalho Dependente pagos pelo Futebol B... (NIF PT...), desde logo, no ano de 2018, mas também nos anos seguintes, ao haver registo de pagamentos efetuados em 2019, e 2021.

7. O Contribuinte não procedeu à entrega de qualquer outra Declaração de Rendimentos para efeito do IRS, tendo vindo a ser tributado por retenção na fonte a título definitivo, como não residente em território português.

8. No que se refere aos Rendimentos do Trabalho Dependente pagos pelo Futebol B... (NIF PT...), foram comunicados pelo referido Substituto Tributário, à Autoridade Tributária Portuguesa, unicamente na Declaração do Modelo 30, para os anos de 2018, 2019, e 2021, encontrando-se omissos os relativos, na eventualidade, ao ano de tributação de 2020.

9. Procurou evidenciar-se alhures, na aludida Proposta (Informação n.º 1300/2022) para o ano de tributação de 2017, a Obrigação, através da qual o Futebol B... (NIF PT...) ficou adstrito, para com o Contribuinte, à realização de Prestações, em termos de Direito Fiscal, ao pagamento de Rendimentos do Trabalho Dependente, mesmo após a cessação das atividades pessoais como jogador profissional de futebol ao serviço direto da Equipa principal do Futebol B... (B...)

10. À Obrigação se deve o continuum da Prestação.

11. Recuperam-se aqui, no entanto, alguns dos pontos relevantes para a análise em curso.

12. Estão em causa os Rendimentos obtidos pelo Contribuinte na qualidade de desportista, como jogador profissional de futebol.

13. Existe obrigação, como já se aludiu, por parte do Futebol B... (NIF PT...), decorrente de contracto pré-existente, de pagar uma parte dos Rendimentos do Trabalho Dependente ao Desportista (Contribuinte), factos geradores de imposto verificados, não apenas em 2017, mas também nos anos seguintes, havendo ainda registo de pagamentos efetuados, no ano de 2021.

14. E segundo o Direito das Obrigações, em Portugal, de acordo com o disposto sobre a matéria, no Código Civil, a Obrigação, no caso, por parte do Futebol B... .

E concluiu-se, a este propósito, que segundo o Direito das Obrigações, em Portugal de acordo com o disposto sobre a matéria, no Código Civil, a Obrigação, no caso, por parte do Futebol B..., ...), para com o Contribuinte, terá com certeza por fonte o Contracto ou Contractos, celebrados entre as duas Partes.

15. Nas circunstâncias dadas, o Futebol B... (NIF PT ...) ficou adstrito para com o Contribuinte, à realização das Prestações, em termos de Direito Fiscal, ao pagamento de Rendimentos do Trabalho Dependente, mesmo após a cessação das atividades pessoais como jogador profissional de futebol ao serviço direto da Equipa principal do Futebol B... (B...).

16. Por seu turno, deu-se por comprovado que os Rendimentos do Trabalho Dependente auferidos pelo Contribuinte no ano de 2017, e de 2018, mas pagos pelo C..., S.p.A., na qualidade de empregador, o foram, no âmbito de relação laboral com fonte num Contracto a Prazo, no qual se estipulou o benefício (produto das atividades pessoais desenvolvidas) único do Clube Italiano, portanto, já não, do Futebol B... (NIF PT...).

17. Refira-se, em particular, no aspeto temporal, e segundo a Informação prestada pela

Autoridade Fiscal da Itália, no âmbito da Troca de Informação, que o Contracto a Prazo, em benefício (produto das atividades pessoais desenvolvidas pelo Contribuinte) do C..., S.p.A., se suspendeu ou cessou, a 11 de agosto de 2018, elemento com relevo, ainda que relativo, para a análise em curso.

18. Por fim, convém aduzir que a prossecução da carreira, na qualidade de desportista, em concreto, como jogador profissional de futebol, terá levado o Contribuinte a desenvolver as suas atividades pessoais, depois de na Itália, por período menos prolongado, na Espanha, passando, segundo se afigura, a partir de 2019-11-05, a jogar futebol na Alemanha, ao menos até ao final do ano civil de 2021.

19. Ao abrigo do disposto no Artigo 104, número 1, da Constituição da República Portuguesa (CRP), o imposto sobre o rendimento pessoal será único (trata-se do IRS) e progressivo (submissão a taxas gerais, progressivas), em função dos rendimentos do contribuinte.

20. E de acordo com o disposto no número 3 do Artigo 11 da Lei Geral Tributária (LGT), deve observar-se o princípio da prevalência da substância económica dos factos tributários, para aferição do sentido e alcance das normas de incidência do IRS a aplicar ao caso concreto.

…………………………………….

22. Em concreto, os elementos dos Rendimentos do Trabalho Dependente («Redditi di Lavoro Dipendente») obtidos no ano de 2018 pelo Contribuinte em Portugal, no montante bruto global de Euro 1.154.457,89, e não em Itália («redditi prodotti all’estero»), independentemente do seu montante muito elevado, para efeito do imposto italiano sobre o rendimento («Imposta sul Reddito delle Persone Fisiche»), e em função do regime especial previsto na lei fiscal italiana, por Opção exercida pelo Contribuinte, derrogatório do regime normal com sujeição a taxas gerais, próprio de um Contribuinte que deve ser considerado como Residente Fiscal da Itália, permitiu uma tributação efetiva, de 8,66 por cento, quando o principal dos demais Rendimentos do Trabalho Dependente, obtidos pelo Contribuinte na Itália, do mesmo modo, na qualidade de desportista, como jogador profissional de futebol, e provenientes das suas atividades pessoais exercidas agora, na Itália, em benefício do C..., S.p.A., e já não em benefício do Futebol B... (NIF PT...), no montante bruto de Euro 2.377.126,91, foram tributados, à taxa efetiva estimada de 45,04 por cento, e os do ano anterior (2017), nas mesmas circunstâncias, o haviam sido, à taxa de 45,14 por cento (conexão direta com a Proposta, para o ano de tributação de 2017).

8,66 por cento, quando o principal dos demais Rendimentos do Trabalho Dependente, obtidos pelo Contribuinte na Itália, do mesmo modo, na qualidade de desportista, como jogador profissional de futebol, e provenientes das suas atividades pessoais exercidas agora, na Itália, em benefício do C..., S.p.A., e já não em benefício do Futebol B...,  (NIF PT...), no montante bruto de Euro 2.377.126,91, foram tributados, à taxa efetiva estimada de 45,04 por cento, e os do ano anterior (2017), nas mesmas circunstâncias, o haviam sido, à taxa de 45,14 por cento (conexão direta com a Proposta, para o ano de tributação de 2017).

23. Contudo, os Rendimentos obtidos em Portugal, devidos e pagos pelo Futebol B... (NIF PT...), no montante total de Euro 1.013.157,89, devem-se ao cumprimento da Obrigação, a que se deve o continuum da aludida Prestação, em conexão direta e estreita (indissociabilidade), porém, com as atividades pessoais antes exercidas e por causa delas, muito embora, ao que tudo indica, e por força de Contracto, o produto correspondente, fosse agora em benefício do C..., S.p.A.

24. Por conseguinte, conclui-se por uma unidade (universalidade de direito), no que se refere à substância económica, e não apenas financeira, do Direito à Remuneração, em consequência do desenvolvimento das atividades pessoais do Contribuinte, na qualidade de desportista, como jogador profissional de futebol, pagas em conexão direta com o aspeto económico, pelo exercício do emprego na Itália, em benefício do C..., S.p.A., mas com um elemento da Remuneração Contratada, pago, no aspeto financeiro, pelo Futebol B... (NIF PT...).

25. Esta realidade, substancial, leva a que se tenha de aplicar ao caso a cláusula geral anti - abuso, ínsita na CDT Portugal – Itália, passando a tributar-se o elemento dos Rendimentos do Trabalho Dependente da titularidade do Contribuinte, pago em 2018 pelo Futebol B... (NIF PT...), no montante total de Euro 1.013.157,89, segundo as taxas gerais previstas no Código do IRS, com direito porém à imputação integral do imposto italiano correspondente, no valor de Euro 100.000,00, para eliminação da dupla tributação jurídica internacional, em conformidade com o disposto sobre essa matéria, na Convenção.

26. Convém fundamentar melhor, a necessidade de aplicação ao caso, da Cláusula Geral Anti -Abuso, ínsita na CDT Portugal – Itália.

27. Trata-se dos Rendimentos das Profissões Dependentes, visados, em regra, pelo disposto no Artigo 15 da CDT Portugal – Itália, verificando-se a tributação cumulativa, como resulta, de forma necessária, do Direito adquirido, por Portugal, de aceder primeiro, à tributação do elemento dos Rendimentos devidos e pagos, pelo Futebol B... (NIF PT..), em conexão direta com o vínculo, pré-existente, do Contribuinte ao Clube Português, e por causa dele.

28. Pretendia-se e previu-se, na CDT Portugal – Itália, a tributação ilimitada, dos Rendimentos das Profissões Dependentes, nas situações em que algum dos Estados Contratantes acedesse ao Direito, nos termos convencionais, fosse como Estado da fonte, ou, num segundo momento, como Estado de residência.

29. Por concomitância, o Pressuposto de aceitação mútua, do elemento literal a que se refere o Artigo 15 da CDT Portugal – Itália, é o da observância do Princípio, Constitucional em Portugal, da tributação em função da capacidade revelada, em regra, por submissão a taxas gerais, e, na categoria (segundo a qualificação internacional) dos Rendimentos das Profissões Dependentes, quando haja tributação

cumulativa, o Pressuposto implica que a progressividade do Imposto sobre o Rendimento, atinja o seu pleno efeito, quando o Estado de Residência acede à tributação final, mesmo com a obrigação correlativa de proceder à eliminação da dupla tributação jurídica internacional, nos termos da Convenção, pelo que, tendo os dois Estados Contratantes escolhido o Método de Imputação ordinário (com limite da fração de coleta) para eliminar a Dupla Tributação Jurídica, conforme resulta, do disposto no Artigo 22 da Convenção, então, no caso em apreço, a Itália, deveria assim ter englobado, para efeito da sua tributação, o elemento dos Rendimentos do Trabalho Dependente, com fonte em Portugal, em função unicamente do critério financeiro, devidos e pagos ao Contribuinte, pelo Futebol B... (NIF PT...), com o concomitante efeito de recuperação previsto, com motivo no Valor muito elevado, das Remunerações em causa.

30. Até porque, no terceiro parágrafo do Número 2, do Artigo 22 (Disposições para evitar a dupla tributação) da CDT Portugal – Itália, ficou ressalvada, de forma expressa, a inaplicabilidade do Método de Imputação ordinário, quando a tributação, ao abrigo do disposto na legislação fiscal italiana, não seja por via declarativa, com submissão a taxas gerais, mas, ainda que por Opção do Contribuinte, se verifique a tributação autónoma, por uma taxa especial.

31. No movimento concomitante, em observância do Princípio, geral, em Direito Internacional Fiscal, portanto, nos termos da CDT Portugal – Itália, em particular, da reciprocidade, de direito e de facto, será lícito interpretar que Portugal, que acede, em todo o caso, à tributação primária, em conformidade com o disposto no Artigo 15 da Convenção, deixe de aplicar a taxa de retenção na fonte, a título definitivo, passando a tributar o aludido elemento, e só este, dos Rendimentos do Trabalho Dependente, pelas taxas gerais, a que se refere o disposto no Artigo 68 do Código do IRS.

32. Isto só se torna possível, no entanto, porque, nos termos da CDT Portugal – Itália, o Estado Português, e os serviços competentes da Autoridade Tributária Portuguesa, podem sustentar, de forma fundamentada, a residência em território português do Contribuinte, ainda que unicamente ao abrigo do disposto no Número 1, do Artigo 4.º (Residente) da Convenção, pois como é já sabido, nos termos do disposto no Número 2, o Contribuinte acaba por ser havido, por Residente Fiscal da Itália.

33. Para tanto contribui, a Casa de Morada de Família, situada no concelho de ..., distrito do Porto, e o Domicílio Profissional atinente aos Rendimentos do Trabalho Dependente, pagos pelo Futebol B... (NIF PT...), tomando-se aqui por referência, o disposto no Artigo 16, número 1, alínea b), do Código do IRS.

34. Portanto, por via da aplicação ao caso da Cláusula Geral Anti - Abuso, ínsita na CDT

Portugal – Itália, a tributação primária, em Portugal, de forma ilimitada, do elemento considerado dos Rendimentos do Trabalho Dependente da titularidade do Contribuinte, que em todo o caso se verificaria, passa agora a ser ajustada, de Direito, àquela que resultar da submissão desse elemento singular, às taxas gerais.

35. Salienta-se que a aplicação ao caso da Cláusula Geral Anti - Abuso, ínsita na CDT Portugal – Itália, se dá em termos de pura objetividade, ou seja, para além do apuramento de um comportamento de boa ou má fé, pois o que se trata aqui é de alcançar um dos dois fins principais da Convenção, evitando ou corrigindo uma atribuição, objetivamente abusiva, de benefícios convencionais, desde logo o da isenção ou redução indevida do imposto português, em ordem à tributação adequada da universalidade de direito, consubstanciada na Remuneração, a que o Contribuinte tem Direito.

36. Deixa-se intocada a possibilidade de o Estado de Residência do Contribuinte, nos termos das regras especiais contidas, já no Número 2, do Artigo 4.º, da Convenção, ou seja, a Itália, criar e manter um Regime Especial, designado pela doutrina italiana como «imposta forfettaria», sem a limitação, por esse simples facto, dos benefícios antes previstos na CDT Portugal – Itália, mas, nas circunstâncias dadas, existindo universalidade de direito, consubstanciada na Remuneração, a que o Contribuinte tem Direito como fruto do seu Trabalho (Direito à Retribuição, conforme a doutrina portuguesa), os Fins prosseguidos pela CDT Portugal – Itália exigem então, a aplicação uniforme do Direito Fiscal à mesma realidade, substancial, o que por sua vez implica a tributação em IRS segundo o regime regra, pelas taxas gerais, como única forma de se obviar à gravidade de uma tributação em Portugal, totalmente desgarrada do Pressuposto, essencial em IRS, da Capacidade Contributiva (Artigo 4.º, número 1, da LGT), em ordem ao Princípio da progressividade do Imposto, tal como se encontra previsto, no Artigo 104, número 1, da Constituição da República Portuguesa (CRP).

37. Refira-se, aliás, que a aplicação da Cláusula Geral Anti - Abuso, ínsita na CDT Portugal – Itália, tem por norma de receção, o disposto no Artigo 8.º (Direito internacional) da própria Constituição da República Portuguesa (CRP), em especial, o disposto no seu Número 2, pelo que, segundo as regras de interpretação de Tratados, previstas na Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados (CVDT), vigente na Ordem Jurídica Portuguesa, há que atender, no caso da CDT Portugal – Itália, aos Comentários ao Modelo seguido pelos Estados Contratantes, isto é, ao Modelo de Convenção Fiscal da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Económicos (OCDE), com o sentido e alcance acima enunciados.

38. Importando agora criar a norma «Ad hoc», de acordo com o previsto no Artigo 10.º,

número 3, do Código Civil, de aplicação subsidiária, ao abrigo do disposto na alínea d), do Artigo 2.º (Legislação complementar), da LGT, afigura-se, no que toca às formalidades, de assinalar, na Declaração de Rendimentos de Substituição (Oficiosa de Correção), para efeito do IRS de 2018 do Contribuinte, a Residência Fiscal no «Continente», uma vez que a Casa de Morada de Família se situa no concelho de ..., distrito do Porto, e, relativamente aos Rendimentos da titularidade do Contribuinte obtidos em território português, de manter apenas na Declaração Anual, em particular, no Anexo A que a acompanha, o elemento dos rendimentos do Trabalho Dependente pago pelo Futebol B... (NIF PT...), no montante total de Euro 1.013.157,89. Já quanto ao valor correlativo das «Retenções na fonte», no montante de Euro 253.289,47, dever-se-á acrescentar o imposto italiano pago, que lhe corresponde, no valor de Euro 100.000,00, perfazendo assim, Euro 353.289,47.

39. Em conclusão, importa, de forma decisiva, apurar, junto do Estado do Exercício, como efetuado pela Autoridade Tributária Portuguesa junto da Autoridade Fiscal da Itália, para os anos de tributação de 2017 e 2018, a qualidade segundo a qual o Contribuinte haja sido de facto tributado, como residente ou não residente, e no Estado de Residência, quando já não for a Itália, como se retira da Informação do domínio público, sobre a evolução da carreira profissional do Contribuinte, enquanto jogador profissional de futebol e desportista de alto rendimento, e decorre, sobretudo, das alterações do Domicílio Fiscal comunicadas pelo Contribuinte, à Autoridade Tributária Portuguesa, e aos Substitutos Tributários em Portugal, que levaram a que, após validação, fosse enviada Informação, Automática, pela Autoridade Tributária Portuguesa, para além da Autoridade Competente da Itália, designadamente, à Autoridade Fiscal da Alemanha, para assim se virem a determinar, ao certo, os benefícios convencionais, na eventualidade a atribuir.

40. Se, por exemplo, se chegar à conclusão que a partir de dado momento, o Contribuinte, nos termos da Convenção bilateral aplicável, deixou de ser Residente Fiscal da Itália, para passar, de imediato, a ser considerado como Residente Fiscal da Alemanha, e que as atividades pessoais do Contribuinte foram desenvolvidas unicamente em território alemão, de igual modo, na qualidade de desportista de alto rendimento, e enquanto jogador profissional de futebol, mas já em benefício de Clube Alemão, poderá ser então atribuído, em Portugal, o benefício da isenção integral do imposto português (o IRS), ao abrigo do disposto sobre a matéria, no Artigo 15, número 1, primeira parte, e no Artigo 17, número 1, ambos da Convenção sobre Dupla Tributação celebrada entre Portugal e a Alemanha (CDT Portugal – Alemanha), isto, na condição de verificação da tributação, efetiva, da universalidade dos rendimentos, na Alemanha, portanto, incluídos na matéria coletável, os obtidos em Portugal, pagos pelo Futebol B... (NIF PT...), e segundo o regime geral do «Einkommensteuer», o imposto alemão sobre o rendimento.

41. Para tanto, nas circunstâncias dadas, consideram-se desde já esgotados os principais meios internos, pelo que haverá, para o sobredito efeito, que recorrer à Troca de Informação, a Pedido, por iniciativa da Autoridade Tributária Portuguesa, junto dos Estados do Exercício, designadamente, portanto, com as Autoridades Competentes, desde logo, da Itália, mas também da Espanha, dado que o Contribuinte exerceu, de forma temporária, as suas atividades pessoais, em território espanhol, e por fim, da Alemanha, sempre e em todo o caso, em função da Informação ao dispor, dos Serviços da Autoridade Tributária Portuguesa.

42. Para os Processos de Troca de Informação podem invocar-se, singularmente ou conjugadas, as disposições sobre a matéria, das Convenções bilaterais sobre Dupla Tributação celebradas por Portugal, da Convenção Multilateral, da qual Portugal faz parte, por fim e em especial, nos termos do Direito derivado da União Europeia, em concreto, nos termos da Diretiva em vigor, uma vez que todos os Estados considerados, são Estados Membros da União.

43. Não obstante, tal como o fundamentado, já se encontra reunida toda a Informação mínima necessária para que se instaure Procedimento tendente à Liquidação adicional de IRS ao Contribuinte, relativo ao ano de 2018, nos termos, e com as formalidades declarativas, enunciados em 38 supra, dando-se para o efeito conhecimento deste parecer, à Direção de Finanças do Porto, acompanhado da Pronúncia, expressa, para o ano de tributação de 2017.

44. A Informação final para os anos de tributação subsequentes ao de 2018, fica, porém,

pendente dos Processos de Troca de Informação com as Autoridades Competentes referidas em 41 supra.”

 

II. MATÉRIA DE FACTO

F – Factos provados

 

  1. Com relevo para a decisão da causa, consideram-se provados os seguintes factos:

 

  1. O Requerente não se encontrava inscrito como residente fiscal em Portugal conforme inscrição no cadastro da Autoridade Tributária, encontrando-se registado junto da Autoridade Tributária como residente fiscal em Itália desde o dia 17 de julho de 2017 e sendo residente fiscal em Itália em 2018 (Documento 6 -  pedido de retroação da residência fiscal para Itália a partir dessa data,  certificado de residência fiscal emitido pela Anagrafe Tributária, Divisão da província de Roma e certificado emitido pela Comuna de Milão atestando a residência fiscal datado de Dezembro de 2017 bem como facto reconhecido pela Autoridade Tributária Portuguesa no ponto  32 da Informação da DSRI nº 2640/2022 com despacho concordante de 30/11/2022, na fundamentação das correcções ao abrigo do artigo 77º da LGT junta no PA: “…..Isto só se torna possível, no entanto, porque, nos termos da CDT Portugal – Itália, o Estado Português, e os serviços competentes da Autoridade Tributária Portuguesa, podem sustentar, de forma fundamentada, a residência em território português do Contribuinte, ainda que unicamente ao abrigo do disposto no Número 1, do Artigo 4.º (Residente) da Convenção, pois como é já sabido, nos termos do disposto no Número 2, o Contribuinte acaba por ser havido, por Residente Fiscal da Itália (ponto 32). Depreende-se daqui que não está em causa a residência fiscal em Itália para o ano de 2018, mas sim a residência em Portugal para efeitos de aplicação das taxas gerais prevista no artigo 68.º do CIRS a aplicar aos Rendimentos do Trabalho Dependente, obtidos em Portugal, e pagos pelo Futebol B... (NIF PT...) e na Informação 1300/2022 com Despacho concordante de 27/06/2022:  “ ….15. Ademais, o Contribuinte já apresentara um Certificado de Residência Fiscal na Itália para o ano civil de 2018, muito embora emitido em conformidade com o disposto na Convenção sobre Dupla Tributação celebrada entre a Itália e a Espanha (CDT Itália – Espanha), pelo que parecia para além da dúvida razoável que seria residente para efeitos fiscais, em território italiano, e não espanhol, naquele ano de tributação, circunstância ora dada por comprovada, de forma inequívoca, através da Troca de Informação havida entre a Autoridade Tributária Portuguesa, e a Autoridade Fiscal da Itália. 16. Por conseguinte, tudo indica que o Contribuinte, no ano fiscal de 2017, deve ser considerado como Residente Fiscal de Portugal, até à sua saída, direta, para a Itália, e daí em diante da Itália, até 31 de dezembro de 2017, bem como, ao longo de todo o ano civil de 2018”.
  2. O Requerente desempenha a atividade de futebolista profissional, sendo tal um facto público e notório.
  3. O Requerente esteve contratualmente vinculado ao Futebol B..., até ao dia 11 de junho de 2017 - facto alegado pelo Requerente e não contraditado pela Requerida.
  4. No dia 12 de junho de 2017, o Futebol B... comunicou oficialmente à Comissão de Mercado de Valores Mobiliários, a cedência a título definitivo dos direitos de inscrição desportiva do jogador profissional de futebol A... para o clube C..., sediado em Itália, onde se manteve até ao final da época de futebol 2017/2018 - facto alegado pelo Requerente e não contraditado pela Requerida.
  5. O Requerente foi jogador no C..., clube de futebol italiano, tendo jogado por este clube pelo menos a partir de Julho de 2017, o que constitui igualmente facto público e notário.
  6. Por sua vez, em Agosto de 2018, o Requerente foi cedido ao F... onde se instalou até 31 de Dezembro de 2018 - facto alegado pelo Requerente e não contraditado pela Requerida para além de também ser facto público e notório.
  7. Para comprovar a sua residência, desde 17 de Agosto de 2018, o Requerente apresenta o Certificado de Registro de Ciudadano de la Union, emitido pelas Autoridades Espanholas Documento n.º 8, que aqui se dá por reproduzido para todos os efeitos legais.
  8. A actividade profissional do Requerente – desportista - exige a sua presença física no seu local de trabalho, à data relevante, em Itália e em Espanha, respetivamente, no exercício de 2018 – não podendo a mesma ser desempenhada à distância ou remotamente.
  9. Desde o dia 17 de julho de 2017, não mais o Requerente qualificou como residente fiscal em Portugal, em virtude de ter exercido a sua atividade profissional no estrangeiro encontrando-se corretamente registado neste mesmo sentido junto da AT em Portugal – alegado pelo Requerente e documentado nomeadamente através do Documento 6 anexo com concordância da Requerida expressa nas Informações da DSRI nºs. 1300/2022 e 2640/2022.
  10. Sendo, nesta medida, considerado não residente fiscal em Portugal durante o ano de 2018- não residência aceite e confirmada pelas Autoridades Fiscais, conforme atesta o cadastro fiscal – alegado pelo Requerente e não contraditado pela Requerida.
  11. O Requerente entregou uma declaração de rendimentos em 2018, como não residente fiscal, relativamente aos rendimentos de fonte portuguesa apesar de já terem sido sujeitos a tributação a taxas liberatórias, cujo documento se junta como Documento n.º 9 que aqui se dá por reproduzido para todos os efeitos legais.
  12. O Requerente procedeu à entrega da sua declaração de IRS de 2018 em Portugal, nos seguintes termos:
  13. Reportando o rendimento do trabalho dependente, de fonte portuguesa, pago pela E..., com o número de pessoa coletiva..., no montante de € 141.300,00 (cento e quarenta e um mil e trezentos euros) e respetivas retenções na fonte no montante de € 35.325,00 (trinta e cinco mil, trezentos e vinte e cinco euros), e pelo Futebol B..., com o número de pessoa coletiva ... no montante de € 1.013.157,88 (um milhão, treze mil, cento e cinquenta e sete euros e oitenta e oito cêntimos) e respetivas retenções na fonte no montante de € 253.289,47 (duzentos e cinquenta e três mil, duzentos e oitenta e nove euros e quarenta e sete cêntimos) – cfr. Documento n.º 9.
  14. Encontrando-se, até 31 de Maio de 2018, registado pelo exercício de uma atividade empresarial ou profissional, procedeu, igualmente, à entrega do Anexo B, referente a rendimentos empresariais e profissionais, mesmo não tendo auferido qualquer rendimento a este título - cfr. Documento n.º 9 reproduzido.
  15. Da declaração de rendimentos resultou a emissão da demonstração de liquidação de IRS com o n.º 2019..., com o valor a reembolsar de € 5.022,00 - cfr. Documento n.º 10, que aqui se junta e se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.
  16. A Autoridade Tributária efetuou uma notificação datada de 6 de dezembro de 2022 – Ofício Nº 2022S..., a informar o Requerente, através do seu representante fiscal, D..., para “[…] no prazo de 15 (quinze) dias, exercer o direito de audição, preferencialmente por escrito, sobre o projeto de decisão, que se anexa” - cfr. Documento n.º 11, que aqui se junta e se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.
  17. A notificação foi efetuada, no âmbito de uma obrigação declarativa do Requerente de entregar uma declaração de substituição de rendimentos de 2018, como residente fiscal em Portugal – no entendimento da Autoridade Tributária.
  18. A posição da AT assentou no pressuposto de que, no ano de 2018, o Requerente, ainda que qualifique como não residente fiscal em Portugal, tinha a obrigação de pagamento de imposto como se de um residente se tratasse, relativamente aos rendimentos recebidos por parte do Futebol B..., com o número de pessoa coletiva... .
  19. O Requerente exerceu o seu direito de participação, na modalidade de direito de audição, através da funcionalidade “E-balcão” no Portal das Finanças, conforme Documento n.º 12;
  20. Em resposta aos esclarecimentos apresentados pelo Requerente, a Autoridade Tributária notificou novamente o Requerente, no dia 27 de dezembro de 2022 através do seu Representante, informando-o da, “emissão de documento oficioso, para efeitos da alteração dos rendimentos declarado no(s) ano(s) cima indicados” desconsiderando, por isso, a argumentação apresentada pelo Requerente através do Direito de Audição.
  21. Foi, por isso, o Requerente notificado, através de correio registado, da Demonstração de Acerto de Contas (cfr. Documento nº 4) e baseado no pressuposto da obrigação de pagamento de imposto como se de um residente fiscal em Portugal se tratasse entre 01-01-2018 e 31-12-2018 relativamente aos rendimentos recebidos por parte do Futebol B..., com o número de pessoa coletiva ..., sendo apurado um saldo a liquidar de € 184.556,66 (cento e oitenta e quatro mil, quinhentos e cinquenta e seis euros e sessenta e seis cêntimos).
  22. O Requerente efectuou o pagamento do valor objecto de cobrança por parte da AT no valor global de € 184.556,66 (cento e oitenta e quatro mil, quinhentos e cinquenta e seis euros e sessenta e seis cêntimos) que engloba IRS liquidado no montante de € 156.913,93, juros compensatórios no montante de € 21.942.13, juros compensatórios por recebimento indevido no montante de € 678,58 e estorno da liquidação de 2019 no montante de € 5.022,00 (cfr. Documento nº 5).
  23. Em 2017 a Autoridade Tributária considerou o Requerente residente fiscal no ano todo de 2017, pelo que emitiu uma liquidação oficiosa de IRS n.º 2021... – que, juntamente com o acerto de contas, resultou num montante a liquidar de € 222.334,61 (duzentos e vinte e dois mil, trezentos e trinta e quatro euros e sessenta e um cêntimos).
  24. A AT argumentava que o Requerente qualificava como residente fiscal em Portugal durante a totalidade de 2017.
  25. O Requerente procedeu ao pagamento imediato do montante, de forma a evitar quaisquer actos de execução fiscal por parte da Autoridade Tributária e Aduaneira e decidiu recorrer a este mesmo tribunal para exercer o seu direito de defesa – Processo 228/2022-T.
  26. Atendendo à situação real, de que o Requerente em 2017 teve duas residências fiscais, isto é, (i) do período de 1 de janeiro a 16 de julho de 2017 foi considerado residente fiscal em Portugal e (ii) do período de 17 de julho de 2017 a 31 de dezembro de 2017 foi considerado não residente fiscal em Portugal, a AT, no dia 26 de junho de 2022, revogou o acto de liquidação n.º 2021... .
  27. O Requerente foi, por isso, ressarcido do montante € 222.334,61 (duzentos e vinte e dois mil, trezentos e trinta e quatro euros e sessenta e um cêntimos bem como o montante recebido a título de juros indemnizatórios de € 18.857,59 (dezoito mil, oitocentos e cinquenta e sete euros e cinquenta e nove cêntimos).
  28. Assim consta da conclusão da Informação da DSRI nº 1300/2022 já citada:  Conclusão final 28. Resta, pois, passar a excluir da matéria coletável, para efeito do IRS de 2017 do Contribuinte, os Rendimentos do Trabalho Dependente com fonte em Itália, que constam, à presente data, no Anexo J que acompanha a Declaração de Rendimentos. 29. Nesta exata medida, tal como antes se havia comunicado à Direção de Finanças do Porto (Comunicação N.º ...2021...5, de 2021-11-15, elaborada no âmbito do Processo «GPS» N.º ...2021...), ainda no decurso do Procedimento tendente à liquidação adicional de IRS do ano de 2017 ao Contribuinte, se, em resultado do Processo de Troca de Informação com a Autoridade Fiscal da Itália, iniciado em 2021-05-26 (Processo instaurado pela Divisão de Cooperação Internacional desta Direção de Serviços, com o Número .../2021), as Autoridades Competentes viessem a considerar, de comum Acordo, o Contribuinte, afinal, como Residente Fiscal de Portugal até à saída para a Itália, logo depois deste último Estado, no ano civil de 2017, não deixariam os Serviços da Autoridade Tributária Portuguesa, de proceder à Revisão do IRS de 2017, por erro imputável aos seus Serviços, o que, nas circunstâncias dadas, parece só já poder tomar a forma da Revogação do ato de Liquidação (com o Número 2021...), praticado em 2021-12-06.

 

G - Factos não provados

  1.  Não se consideram não provados quaisquer factos relevantes para o conhecimento da causa.

 

H – Fundamentação da matéria de facto

  1. Cabe ao Tribunal Arbitral selecionar os factos relevantes para a decisão, em função da sua relevância jurídica considerando as várias soluções plausíveis das questões de Direito, bem como discriminar a matéria provada e não provada (cfr. artigo 123.º, n.º 2, do CPPT e artigo 607.º, n.ºs 3 e 4, do CPC, aplicáveis ex vi do artigo 29.º, n.º 1, al. a) e e), do RJAT).
  2. Segundo o princípio da livre apreciação dos factos, o Tribunal baseia a sua decisão, quanto à matéria de facto, na sua íntima e prudente convicção, formada a partir do exame e avaliação dos meios de prova trazidos ao processo, e de acordo com as regras da experiência (cfr. artigo 16.º, alínea e), do RJAT, e artigo 607.º, n.º 4, do CPC, aplicável ex vi do artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT).
  3. Somente relativamente a factos para cuja prova a lei exija formalidade especial, a factos que só possam ser provados por documentos, a factos que estejam plenamente provados por documentos, acordo ou confissão, ou quando a força probatória de certos meios se encontrar pré-estabelecida na lei (e.g., força probatória plena dos documentos autênticos, cfr. artigo 371.º do Código Civil), é que não domina, na apreciação da prova produzida, o referido princípio da livre apreciação (cfr. artigo 607.º, n.º 5, do CPC, aplicável ex vi do artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT).
  4. Consideraram-se provados, com relevo para a decisão, os factos acima elencados como factos provados, tendo por base a análise crítica e conjugada dos documentos juntos aos autos, que não foram impugnados.

 

III – MATÉRIA DE DIREITO     

I - Questões Decidendas

  1. O PPA tem por objeto imediato a apreciação da legalidade do acto de liquidação de Imposto Sobre o Rendimento das Pessoas Singulares sob o n.º 2022..., a respetiva demonstração de acerto de contas identificada sob o n.º 2022..., bem como a demonstração de liquidação de juros identificada sob o n.º 2023..., relativas ao período de tributação entre 1.01.2018 e 31.12.2018
  2. A liquidação tem por objeto rendimentos recebidos em 2018 e pagos pelo B..., na sequência da desvinculação contratual ocorrida em 2017 mas ligados a atividade que o Requerente terá desempenhado até essa desvinculação devendo ser pagos posteriormente.
  3. As questões a decidir pelo presente tribunal são então as seguintes:
    1. Se o Requerente pode ser considerado residente fiscal em Portugal durante o ano de 2018 ao abrigo da Convenção para evitar a Dupla Tributação (CDT) celebrada entre Portugal e Itália nos termos do nº 1 do artigo 4º da CDT;
    2. Em caso afirmativo e não obstante o artigo 4º nº 2 e seguinte da CDT, se nos termos desta CDT, nomeadamente do seu artigo 15º -  aplicável à repartição de soberania tributária entre o Estado da residência e o Estado da fonte relativamente a rendimentos do trabalho - e do seu artigo 22º nº 2 – eliminação da dupla tributação -  a AT portuguesa pode tributar os rendimentos recebidos pelo Requerente em Portugal e pagos pela sua anterior entidade patronal, no ano de 2018, ao abrigo das taxas gerais de IRS aplicáveis a residentes em Portugal considerando a aplicação de uma cláusula anti-abuso subjacente ao artigo 15º da CDT.

 

J - Da legislação relevante para a causa decidenda

  1. Convocam-se para a resolução das questões a decidir:

O artigo 16º do Código do IRS (CIRS), na redacção vigente na altura e para o que nos interessa dispunha: 1 - São residentes em território português as pessoas que, no ano a que respeitam os rendimentos:

a) Hajam nele permanecido mais de 183 dias, seguidos ou interpolados, em qualquer período de 12 meses com início ou fim no ano em causa;

b) Tendo permanecido por menos tempo, aí disponham, num qualquer dia do período referido na alínea anterior, de habitação em condições que façam supor intenção atual de a manter e ocupar como residência habitual;

  1. A CDT celebrada entre Portugal e Itália aprovada pela Lei n.º 10/82 “Convenção entre a República Portuguesa e a República Italiana para Evitar a Dupla Tributação e Prevenir a Evasão Fiscal em Matéria de Impostos sobre Rendimento” nos seus:

Artigo 3º “Definições gerais” que remete para a legislação interna a definição de conceitos fundamentais para a respectiva aplicação, nos seguintes termos:  2 - Para a aplicação da Convenção por um Estado contratante qualquer expressão não definida de outro modo terá, a não ser que o contexto exija interpretação diferente, o significado que lhe for atribuído pela legislação desse Estado contratante relativa aos impostos que são objecto da Convenção.

Artigo 4º que estabelece o conceito de residente para efeitos de definir âmbito de aplicação da CDT e dirimir conflitos

 ARTIGO 4.º Residente 1 - Para efeitos desta Convenção, a expressão «residente de um Estado contratante» significa qualquer pessoa que, por virtude da legislação desse Estado, está aí sujeita a imposto devido ao seu domicílio, à sua residência, ao local de direcção ou a qualquer outro critério de natureza similar. Todavia, esta expressão não inclui qualquer pessoa que está sujeita a imposto nesse Estado apenas relativamente ao rendimento de fontes situadas nesse Estado. 2 - Quando, por virtude do disposto no n.º 1, uma pessoa singular for residente de ambos os Estados contratantes, a situação será resolvida de acordo com as seguintes regras: a) Será considerada residente do Estado em que tenha uma habitação permanente à sua disposição; se tiver uma habitação permanente à sua disposição em ambos os Estados, será considerada residente do Estado com o qual sejam mais estreitas as suas relações pessoais e económicas (centro de interesses vitais); b) Se o Estado em que tem o centro de interesses vitais não puder ser determinado ou se não tiver uma habitação permanente à sua disposição em nenhum dos Estados, será considerada residente do Estado em que permanece habitualmente; c) Se permanecer habitualmente em ambos os Estados ou se não permanecer habitualmente em nenhum deles, será considerada residente do Estado de que for nacional; d) Se for nacional de ambos os Estados ou não for nacional de nenhum deles, as autoridades competentes dos Estados contratantes resolverão o caso de comum acordo.

 

Artigo 15º Profissões dependentes 1 - Com ressalva do disposto nos artigos 16.º, 18.º, 19.º e 20.º, os salários, ordenados e remunerações similares obtidos de um emprego por um residente de um Estado contratante só podem ser tributado nesse Estado, a não ser que o emprego seja exercido no outro Estado contratante. Se o emprego for aí exercido, as remunerações correspondentes podem ser tributadas nesse outro Estado. 2 - Não obstante o disposto no n.º 1, as remunerações obtidas por um residente de um Estado contratante de um emprego exercido no outro Estado contratante só podem ser tributadas no Estado primeiramente mencionado se: a) O beneficiário permanecer no outro Estado durante um período ou períodos que no ano fiscal em causa não excedam no total 183 dias; e b) As remunerações forem pagas por uma entidade patronal ou em nome de uma entidade patronal que não seja residente do outro Estado; e c) As remunerações não forem suportadas por um estabelecimento estável ou por uma instalação fixa que a entidade patronal tenha no outro Estado. 3 - Não obstante as disposições anteriores deste artigo, as remunerações de um emprego exercido a bordo de um navio ou de uma aeronave explorados no tráfego internacional podem ser tributados no Estado contratante em que estiver situada a direcção efectiva da empresa.

 

Artigo 22º referente à eliminação da dupla tributação: 1 - A dupla tributação será eliminada de acordo com o disposto nos números seguintes deste artigo. 2 - Quando um residente da Itália obtiver rendimentos que possam ser tributados em Portugal, a Itália, ao lançar os seus impostos sobre o rendimento visados no artigo 2.º desta Convenção, pode incluir aqueles rendimentos na matéria colectável desses impostos, salvo se disposições determinadas desta Convenção estabelecerem de outro modo. Neste caso, a Itália deve deduzir dos impostos assim calculados o imposto sobre o rendimento pago em Portugal, mas a importância deduzida não poderá exceder a fracção do imposto italiano imputável a esse rendimento na proporção da sua participação na formação do rendimento global. Nenhuma dedução será, porém, concedida no caso em que o rendimento esteja sujeito em Itália a tributação por retenção na fonte a pedido do beneficiário do rendimento, de acordo com a legislação italiana. 3 - O disposto no n.º 2 aplicar-se-á quando o imposto português sobre o rendimento for isento ou reduzido, como se tal isenção ou redução não fosse concedida. 4 - Quando um residente de Portugal obtiver rendimentos que, de acordo com o disposto nesta Convenção, possam ser tributados em Itália, Portugal deduzirá do imposto sobre os rendimentos desse residente uma importância igual ao imposto sobre o rendimento pago em Itália. A importância deduzida não poderá, contudo, exceder a fracção do imposto sobre o rendimento calculado antes da dedução correspondente aos rendimentos que podem ser tributados em Itália.

 

Artigo 25º aplicável à troca de informações: “1 - As autoridades competentes dos Estados contratantes trocarão entre si as informações necessárias para aplicar esta Convenção e as leis internas dos Estados contratantes relativas aos impostos abrangidos por esta Convenção, na medida em que a tributação nelas prevista for conforme com esta Convenção. Todas as informações deste modo trocadas serão consideradas secretas e só poderão ser comunicadas às pessoas ou autoridades, incluindo tribunais, encarregadas do lançamento ou cobrança dos impostos abrangidos por esta Convenção. 2 ……………..”

 

L - Da fundamentação da decisão

 

Da questão de saber se o Requerente pode ser considerado residente fiscal em Portugal durante o ano de 2018 ao abrigo do nº 1 do artigo 4 da Convenção para evitar a Dupla Tributação (CDT) celebrada entre Portuga e Itália

 

  1. O conceito de residência é um conceito absolutamente determinante para efeitos de determinar a legislação fiscal aplicável. A residência, pressupondo uma ligação forte e estável a um território específico, é o critério mais frequente para determinação da tributação universal dos rendimentos.
  2. Importa interpretar o conceito de residência (fiscal) para efeitos de aplicação da Convenção, conceito que não se confunde necessariamente com o conceito de residência (fiscal) para efeitos de direito interno. O conceito de residência (fiscal) para efeitos de direito interno será plenamente aplicável nas situações que apenas apresentem conexão com a ordem jurídica nacional ou nas situações em que, havendo embora conexão com outra ordem jurídica, não há vinculação por via convencional do Estado Português com o Estado com o qual essa conexão se verifica.
  3. Não é esse o caso da Itália, como se sabe, que celebrou com Portugal uma Convenção contra a Dupla Tributação (CDT). Assim, nas relações entre Portugal e a Itália em matéria de impostos sobre o rendimento e sobre o capital é o conceito convencional de residência que deve prevalecer, por via da supremacia do direito internacional sobre o direito interno ordinário (art. 8.º da Constituição da República Portuguesa; Cfr. JOSÉ CASALTA NABAIS, Direito Fiscal, 5.ª ed., Coimbra, Almedina, 2009, p. 104).
  4. Dispõe a primeira parte do artigo 4.º, n.º 1 da CDT Portugal/Itália, sob a epígrafe “Residente”, que: “Para efeitos desta Convenção, a expressão «residente de um Estado contratante» significa qualquer pessoa que, por virtude da legislação desse Estado, está aí sujeita a imposto devido ao seu domicílio, à sua residência, ao local de direcção ou a qualquer outro critério de natureza similar”.
  5. Embora os conceitos de residência (fiscal) para efeitos convencionais e para efeitos fiscais internos não se confundam, a CDT Portugal/Itália, seguindo o Modelo de Convenção da OCDE (art. 4.º, n.º 1), remete a definição do conceito convencional de residência para a legislação interna dos Estados contratantes.
  6. O n.º 1 do art. 16.º do Código do IRS, na redação em vigor à data dos factos, e com relevância para o caso em apreço, utilizava mais do que um critério de residência, determinando que: “são residentes em território português as pessoas que, no ano a que respeitam os rendimentos: a) hajam nele permanecido mais de 183 dias, seguidos ou interpolados, em qualquer período de 12 meses com início ou fim no ano em causa; b) Tendo permanecido por menos tempo, aí disponham, em 31 de Dezembro desse ano, de habitação em condições que façam supor a intenção de a manter e ocupar como residência habitual
  7. Verifica-se, assim, que o critério previsto na alínea a) se cinge à presença física (corpus), em Portugal, considerando residentes, de forma automática, os indivíduos que permaneçam 183 dias no território nacional no período referido.
  8. Por seu turno, a alínea b), exigindo uma ligação física menos qualificada, impõe uma análise casuística que permita, ainda assim, assegurar que existe uma conexão efetiva com o território. Esta conexão tem-se por verificada através de um elemento subjetivo mediato, a intenção de ser residente (animus), que deve ser analisado de uma perspetiva objetiva, ou seja, através de elementos imediatos que permitam a reconstrução da vontade do indivíduo a partir dos indícios por si revelados.
  9. Assim, a alínea b) do n.º 1 do art. 16.º do Código do IRS serve duas funções essenciais: em primeiro lugar, considerar residente em Portugal um indivíduo que apenas deslocalize a sua residência para o território nacional, no segundo semestre do ano, de forma a que já não seja possível cumprir com o critério dos 183 dias; e, em segundo lugar, considerar residentes os indivíduos que, apesar da sua ligação ao território, verificada através de um local onde residem habitualmente, possam intencionalmente contornar a regra da permanência (Cf. André Salgado de Matos, Código do Imposto do Rendimento das Pessoas Singulares (IRS) Anotado, Lisboa: Instituto Superior de Gestão, 1999, pp. 206-207).
  10. Ora, face aos factos considerados provados, nomeadamente à deslocalização da residência fiscal do Requerente para Itália a partir de 17 de Julho de 2017, ao pedido de alteração da residência com retroactividade a essa data aceite pela AT no Portal da AT, à actividade de profissional de futebol exercida pelo Requerente – facto geralmente sabido por quem conheça minimamente a realidade do futebol profissional (ao ponto de se poder dizer que é mesmo um “facto notório”)  – que tem que ser exercida com presença física obrigatória, – forçoso será concluir que o Requerente, a partir de Julho de 2017 não mais permaneceu em Portugal por nenhum período seguido ou interpolado de 183 dias, pelo que não se mostra preenchido o critério de permanência de mais de 183 dias em território português estabelecido na alínea a) do n.º 1 do artigo 16.º do Código do IRS.
  11. Resta então analisar se o Requerente poderá ser considerado residente ao abrigo da alínea b) do nº 1 do artigo 16º do Código do IRS.
  12. Isto porque a Requerida, no ponto 32. e 33. da Informação da DSRI nº 2640/2022 de 30 vem arguir que a tributação dos rendimentos de fonte portuguesa pagos pelo B... em 2018 deve ser sujeita às taxas gerais de IRS como se de um residente em Portugal se tratasse: 32. Isto só se torna possível, no entanto, porque, nos termos da CDT Portugal – Itália, o Estado Português, e os serviços competentes da Autoridade Tributária Portuguesa, podem sustentar, de forma fundamentada, a residência em território português do Contribuinte, ainda que unicamente ao abrigo do disposto no Número 1, do Artigo 4.º (Residente) da Convenção, pois como é já sabido, nos termos do disposto no Número 2, o Contribuinte acaba por ser havido, por Residente Fiscal da Itália.

Para tanto contribui, a Casa de Morada de Família, situada no concelho de ..., distrito do Porto, e o Domicílio Profissional atinente aos Rendimentos do Trabalho Dependente, pagos pelo B... (NIF PT...), tomando-se aqui por referência, o disposto no Artigo 16, número 1, alínea b), do Código do IRS., alega a Requerida.

  1.  Refere-se usualmente que a referida norma impõe três requisitos, de cuja verificação cumulativa depende a qualificação como residente: (i) a permanência em Portugal; (ii) a disposição de uma habitação; e (iii) a verificação de condições que façam supor que a habitação será mantida e ocupada como residência habitual.
  2. Tendo por base o corpo do n.º 1 do art. 16.º do Código do IRS, a verificação dos referidos requisitos deve ter por referência o “ano a que respeitam os rendimentos”, sendo este o espectro temporal durante o qual deve ser verificada a residência.
  3. No que respeita à permanência em Portugal, não será necessário discorrer sobre a verificação desde requisito, já que tanto o Requerente como a Requerida consideram que aquele permaneceu em Portugal durante menos de 183 dias para o período dos 12 meses de referência.
  4. Relativamente à disposição de uma habitação em Portugal, também se verifica este requisito. Como afirma Manuel Faustino, “(…) não é exigível um título de propriedade da casa, mas tão só um título que legitime a sua utilização, como o arrendamento, o usufruto, o uso e habitação ou o comodato.” (Cf. Manuel Faustino, “Os residentes no Imposto sobre o Rendimento Pessoal (IRS) Português”, Ciência e Técnica Fiscal n.º 424, 99, pp. 124-125).
  5. Ora o Requerente é efectivamente proprietário de uma casa de habitação em Portugal.
  6. Importa, então, analisar a verificação do terceiro requisito relativo à existência de condições que façam supor que a habitação será mantida e ocupada como residência habitual.
  7. A este respeito verifica-se que o legislador não densifica como deve ser aferida a intenção do indivíduo, não fornecendo, igualmente, critérios a partir dos quais o aplicador do direito deva formar a sua convicção quanto ao que se entende por residência habitual.
  8. Na falta de uma definição legal será necessário efetuar uma análise casuística, devendo o elemento volitivo (a intenção de manter e ocupar um determinado local como residência habitual) ser aferido através de manifestações externas de vontade. A intenção de manter e ocupar uma dada habitação enquanto residência habitual deve, desta feita, ser reconstituída a partir de elementos objetivos que façam supor, com clareza, a vontade do indivíduo.
  9. Nas palavras de Alberto Xavier “[a] intenção de manter e ocupar a habitação como residência habitual, não é objecto de prova directa, antes resulta de condições objectivas que a façam supor.” (Cf. Alberto Xavier, Direito Tributário Internacional, 2.ª Edição Actualizada, Coimbra: Almedina, 2007, p. 286).
  10. Uma vez que a intenção a demonstrar se refere à manutenção e ocupação de uma residência habitual, importa determinar, como ponto prévio, o que se entende por residência habitual, para que seja claro que deve resultar da intenção do indivíduo. Ora, o conceito de residência habitual deve ser interpretado no contexto em que se insere, ou seja, o art. 16.º deve ser lido como um todo.
  11. Tal como referido, tanto a alínea a) como a alínea b) do n.º 1 do art. 16.º do Código do IRS impõem uma conexão efetiva com o território Português. Se a qualidade de residente, nos termos da alínea a) resulta, automaticamente, de um critério fáctico, meramente numérico, a presença em Portugal, a alínea b) exige, pela falta de maior presença no território, um elemento adicional de intenção. O referido artigo impõe, assim, a vontade de estar regularmente presente no território nacional, utilizando, para o efeito, uma determinada habitação.
  12. A residência habitual é, assim, igualmente um critério fáctico determinado pela permanência regular (habitual) numa determinada habitação e, onde, como tal se presume ter organizada a sua vida. Como já sustentou o Supremo Tribunal Administrativo, “[é] evidente que, sendo a residência habitual o local onde a pessoa normalmente vive e tem o seu centro de vida, não medeiam grandes diferenças entre o «domicílio fiscal» e a «habitação permanente»: há entre as duas figuras uma relação íntima, que se traduz em ambas pressuporem um lugar com o qual certa pessoa está em ligação, o local onde tem a sua existência organizada e que, como tal, lhe serve de base de vida.” (Cf. Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 11/23/2011, proferido no processo 0590/11), bem como o Tribunal Central Administrativo Sul, referindo que “[o] conceito de residência habitual (o qual coincide com o conceito de domicílio voluntário), deve buscar-se no direito interno, consubstanciando-se como o local onde uma pessoa singular normalmente vive e de onde se ausenta, em regra, por períodos mais ou menos curtos (cfr.artº.82, do C.Civil).” (Cf. Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 12/11/2012, proferido no processo 05810/12).
  13. Para que exista uma residência habitual deverá resultar claro que a habitação mantida em Portugal, pelas suas características, se destina a uma permanência duradoura e não a uma mera passagem de curta duração (Cf. Alberto Xavier, Direito Tributário…op. cit. 286).
  14. Em todo o caso, uma vez que a lei exige, não a existência de uma residência habitual, mas a verificação de condições que façam supor a intenção de a manter e ocupar uma dada habitação enquanto tal, cumpre aferir da existência de elementos que possam fazer presumir que o Requerente tinha intenção de utilizar a habitação que tinha à sua disposição em Portugal, como residência habitual.
  15. O primeiro elemento a considerar neste contexto deverá ser a declaração do sujeito passivo (ou de alguém em sua representação) perante a Autoridade Tributária e Aduaneira (uma entidade oficial), de que pretende ser considerado residente em Portugal. Repare-se que a declaração de que a residência de uma dada pessoa se situa em Portugal não poderá ser efetuada de ânimo leve, já que deste elemento decorre a aplicação de um acervo importante de direitos e obrigações, não apenas de natureza fiscal.
  16. Por outro lado, não se trata aqui de um entendimento formalista que pretende fazer resultar da existência de um documento todo um resultado de substância. Na verdade, nos termos do Decreto-Lei n.º 14/2013, de 28 de janeiro, que instituiu o número de identificação fiscal (“NIF”), bem como as condições da sua atribuição, a inscrição para efeitos de atribuição do NIF deve ser efetuada a pedido do cidadão interessado, seu representante ou gestor de negócios, mediante declaração verbal de todos os elementos identificativos relevantes ao respetivo registo, entre os quais o domicilio fiscal e o estatuto fiscal, de acordo com as regras de conexão de residência previstas no Código do IRS (Cf. al. c) do n.º 1 do art. 9.º).
  17. Ora, uma declaração do contribuinte de que se qualifica como residente para efeitos do Código do IRS, deve considerar-se uma manifestação inequívoca da intenção que subjaz à sua permanência em Portugal. Não haverá, com efeito, qualquer outra forma mais clara ou direta de aferir a intenção de um sujeito passivo do que a vontade manifestada por este (ou em representação deste, por quem tinha poderes bastantes para esta representação).
  18. Nesse contexto, e regressando ao caso em apreço, importa assinalar que o Requerente declarou, com efeitos a 2017, que deixou de ser residente em Portugal para passar a ser residente em Itália. E em 2018 declarou que passou a ser residente em Espanha.
  19. Assim, uma declaração em que se manifesta a não intenção de residência e que, ademais, não foi objeto de retificação, faz indubitavelmente supor a intenção [do Requerente] de não manter em Portugal um determinado local como residência habitual. Ainda que não se seja este o único elemento a valorar, a referida declaração deverá, seguramente, ser tida em devida consideração.
  20. Na verdade, perante os factos provados (o Requerente encontrava-se cadastrado como não residente e a sua anterior entidade patronal realizou a retenção do imposto à taxa aplicável às remunerações de trabalhadores para não residentes), a conclusão apresenta-se clara: o Requerente não era residente fiscal em Portugal, sendo assim sujeito passivo de IRS como não residente fiscal em Portugal e sujeito às retenções na fonte nessa condição.”.
  21. Vários elementos adicionais devem, ainda, ser considerados:
  22. Desde logo a actividade profissional do Requerente que só pode ser exercida com presença física. E não uma qualquer presença física mas sim uma presença permanente, diária ou quase diária, quer se trate de treinos quer de jogos de futebol, muitas vezes mais do que uma vez por semana.
  23. Também a utilização da morada para efeitos de recebimento de correspondência de natureza diversa deverá ser objeto de devida ponderação.
  24. Encontra-se provado (Documento 11) que a notificação da Autoridade Tributária teve que ser efectuada via representante fiscal.  
  25. Adicionalmente, e como foi já decidido em diversos processos no presente Centro de Arbitragem (e.g. processo n.ºs 64/2012-T de 05/30/2013, n.ºs 37/2003-T, de 11/29/2013, 63/2014-T, de 09/15/2014), nos termos do disposto no n.º 1, do art. 74.º da LGT “[o] ónus da prova dos factos constitutivos dos direitos da administração tributária ou dos contribuintes recai sobre quem os invoque.”, determinando o n.º 1 do art. 342.º do Código Civil que “[à]quele que invocar um direito cabe fazer a prova dos factos constitutivos do direito alegado”.
  26. Assim, o ónus de provar a residência fora de Portugal cabia ao Requerente, que fez prova bastante desse facto alterando a sua residência fiscal no cadastro da AT, apresentando certificados de residência em Itália para os anos de 2017 e 2018 e certificado de registo de cidadão da União Europeia em Espanha para o ano de 2018 (Cf. Documentos 6 e 8 juntos ao PPA).
  27. A lógica e o senso comum nos demonstram que alguém que é jogador de um clube de futebol que representa em competições e treinos, que vive em Itália e depois em Espanha não é residente em Portugal.
  28. A Requerida não logrou provar de qualquer forma que o Requerente tinha a casa de morada de família que fosse a sua residência habitual no local onde o tentou notificar ou que cumpria de qualquer forma os critérios de residência fiscal internos ao abrigo do artigo 16º do CIRS.
  29. Desta forma, nem ao abrigo da alínea a) nem ao da alínea b) do nº 1 do artigo 16º do Código do IRS, o Requerente poderia qualificar-se como residente fiscal em Portugal durante o ano de 2018.
  30. Quanto à pretensa aplicação do artigo 4º da CDT celebrada entre Portugal e Itália não mostra a Requerida ter a mesma fundamento.
  31. Sobre esta matéria, veja-se a decisão 332/2016-T do CAAD, "Embora a definição de residente seja feita com recurso aos critérios estabelecidos pela lei interna de cada Estado, como refere Rui Duarte Morais "[a]s convenções internacionais sobre dupla tributação aceitam tal competência (...) limitando-se a estabelecer regras de «desempate» que permitem qualificar um contribuinte como residente em (apenas) um dos Estados contratantes quando ambos (por força das divergências entre as respetivas leis) o considerem como tal." (Cf. Rui Duarte Morais, Sobre o IRS, Coimbra: Almedina, 2016, 3.a Edição, p. 12.).
  32. O artigo 4° da CDT procura, precisamente, resolver situações de dupla residência, em que alguém tem "contactos prolongados com mais de uma ordem jurídica" (Cf. J. L. Saldanha Sanches, Manual de Direito Fiscal, Coimbra, 2007, pp. 339-340), através de diversas regras especiais (de desempate) cuja aplicação determinará a residência em apenas um dos Estados que reclamam a residência fiscal de um determinado sujeito passivo.
  33. Nos termos do n.° 2 do art. 4.° do CDT, "[quando, por virtude do disposto no n° 1, uma pessoa singular for residente de ambos os Estados Contratantes, a situação será resolvida como se segue: "Será considerada residente do Estado Contratante em que tenha uma habitação permanente à sua disposição (...)".
  34. Ora, nos termos do Código do IRS e ao contrário do que alega a Requerida, o Requerente não era residente em Portugal, conforme demostração efectuada pela própria suportada em diversos documentos.
  35. Compulsados os autos, mostra-se claro que, no ano de 2018, o Requerente apenas tinha uma residência habitual fora de Portugal, primeiro em Itália e depois em Espanha. Bem como as relações económicas se mostravam mais estreitas com o Estado Italiano, onde residiu e trabalhou durante uma parte considerável do ano de 2018, onde já residia no ano anterior – 2017 - e do qual saiu para ir viver para Espanha.
  36. Desta forma a aplicação da CDT não tem nos presentes autos qualquer cabimento.
  37. Pelo que o Requerente não podia ser tributado em Portugal durante o ano de 2018 nem pelo nº 1 do artigo 4º da CDT.
  38. Quanto à alegada existência de uma regra ad hoc que permitiria a tributação, no ano de 2018, quanto aos rendimentos pagos pelo B..., na esfera do Requerente, ao abrigo 15º da CDT, como rendimentos sujeitos às taxas gerais aplicáveis aos residentes em Portugal, não vinga também a tese da Requerida.
  39. Desde logo, para poder aplicar esta disposição da CDT nestes termos, a Requerida assume que o Requerente tem uma conexão com o direito português, no sentido de ser admissível a possibilidade do Requerente ser qualificado como residente fiscal em Portugal, ao abrigo do nº 1 do artigo 4º da CDT, possibilidade que está afastada nos termos já expostos.
  40. A Requerida refere que os rendimentos auferidos pelo Futebol B... foram tributados, por escolha do Requerente, segundo as regras de um regime especial de tributação em Itália, conforme ponto 21 do citado Oficio (cfr. Documento n.º 8), “por Opção do Contribuinte, nos termos da legislação fiscal italiana, a um regime especial de tributação, muito atenuado, sempre que se trate de rendimentos elevados, como na situação em apreço, vulgarmente designado, ao nível internacional, por «forfait fiscal», na doutrina italiana, por «imposta forfettaria», conforme, menção expressa por parte da Autoridade Fiscal da Itália.
  41. Ora, segundo o que a própria AT também refere, a opção pela tributação por este regime, designado por “Imposto forfettaria”, resultou no pagamento de um montante de imposto de € 100.000,00 (cem mil euros) pago pelo Requerente sobre os rendimentos de fonte estrangeira, nomeadamente, os colocados à disposição pelo Futebol B..., no ano de 2018, que ascenderam a € 1.013.157,89 (um milhão, treze mil e cento e cinquenta e sete euros, e oitenta e nove cêntimos).
  42. A Autoridade Tributária entende estar perante uma situação ”objetivamente abusiva” por parte do sujeito passivo, que pretendeu que lhe fossem atribuído “benefícios convencionais, desde logo o da isenção ou redução indevida do imposto português”, uma vez que o seu rendimento objeto de análise foi tributado a uma taxa efetiva de 8,66%, ao invés de observar-se o princípio constitucionalmente consagrado da tributação progressiva, nos termos do artigo 104.º, n.º 1 da Constituição da República Portuguesa.
  43. Com base nesta alegação invoca a aplicação de uma cláusula geral de anti-abuso constante da CDT Itália – Portugal, “passando a tributar-se o elemento do Rendimento do Trabalho Dependente da titularidade do Contribuinte, pago em 2018 pelo Futebol B... […] segundo as taxas gerais previstas no Código do IRS, com direito porém à imputação integral do imposto italiano correspondente a Euro 100.000,00, para a eliminação da dupla tributação jurídica internacional, em conformidade com o disposto sobre essa matéria na Convenção.”
  44. A AT, na notificação enviada (cfr. Documento n.º 11) limita-se a uma mera indicação de situação de abuso, sem qualquer exposição ou desenvolvimento da sua suposta verificação em concreto.
  45. Uma mera referência genérica, sem qualquer densificação não pode ter qualquer impacto na esfera do Requerente.
  46. Acresce que a própria Autoridade Tributária não só reconheceu a residência fiscal do Requerente em Itália em 2018 como a reconheceu inclusive em 2017!
  47. Reforça-se que a CDT Portugal – Itália só deverá ser aplicada no caso de existir conflito de jurisdições de ambos os Estados em determinada matéria.
  48. O que não se verifica no caso dos autos em que o Requerente é considerado residente fiscal em Itália e não residente fiscal em Portugal, pelo que não existe qualquer razão aparente para a AT invocar a cláusula de anti-abuso.
  49. Comprovada a residência fiscal em Itália e a não residência em Portugal, atente-se ao n.º 2 do artigo 15.º do Código do IRS, “Tratando-se de não residentes, o IRS incide unicamente sobre os rendimentos obtidos em território português.”
  50. O artigo 18.º do Código do IRS acrescenta o que são considerados rendimentos obtidos em território português, sendo estes os “(…) decorrentes de atividades exercidas, ou quando tais rendimentos sejam devidos por entidades que nele tenham residência, sede, direção efetiva ou estabelecimento estável a que deve imputar-se o pagamento.”
  51. Neste enquadramento, o Requerente, no exercício de 2018, auferiu rendimentos de trabalho dependente do Futebol B... e da E... .
  52. Conforme estabelecido na alínea a) do n.º 6 do artigo 72.º do Código do IRS, aos rendimentos de trabalho dependente auferidos por não residente fiscal em território português é aplicada a taxa liberatória de 25%.
  53. O Requerente declarou na declaração de rendimentos de 2018 os respetivos montantes sujeitos às respetivas taxas liberatórias de 25% já efetivamente liquidadas.
  54. Estes rendimentos, foram assim tributados a uma taxa de 25%, aplicável aos não residentes em Portugal, e em Itália a uma taxa de 8,66%, nos termos do regime específico aplicável a residentes em Itália (num regime de vantagem fiscal que tem semelhanças nos seus objectivos com o regime de vantagem português aplicável aos residentes não habituais).
  55. O Requerente viu os seus rendimentos de fonte portuguesa tributados a uma taxa de 33,55% e não de 8,66% (como refere a AT no ponto 22 do Ofício - cfr. Documento n.º 11 reproduzido).
  56. Resulta dos autos, que o Requerente é tributado em Itália pelos seus rendimentos do trabalho, únicos de que dispõe, não apenas porque em Itália obtém rendimentos do trabalho dependente (competência do Estado da fonte), mas porque aí tem residência habitual (competência do Estado da residência), (...) sendo tributado pelo seu rendimento universal (world-wide income)» (...).
  57. Pode, pois, concluir-se com segurança que as autoridades fiscais italianas tributam o Requerente como residente em território italiano, atendendo à residência “real e efectiva” naquele território, enquanto as autoridades fiscais portuguesas fundam a sua pretensão de o tributar como residente ultrapassando as normas internas e convencionais que definem residência fiscal e pretendendo aplicar uma cláusula anti-abuso sem qualquer justificação ou fundamentação, de forma vaga e genérica e sem base legal.
  58. Deve, pois, concluir-se que, para efeitos de aplicação da CDT Portugal–Itália, o Requerente deve considerar-se residente apenas em Itália, sendo ilegal, por violação do artigo 16º nº 1 do Código do IRS e artigo 4.º, n.º 1 da CDT Portugal–Itália, a sua qualificação como residente (fiscal) em Portugal que a AT lhe atribui, sendo, consequentemente, também ilegal a liquidação de IRS sindicada de que foi objeto.

 

Questões de conhecimento prejudicado

Sendo de anular a totalidade da liquidação impugnada com base nos fundamentos expostos fica prejudicado, por inútil (artigo 130.º do CPC), o conhecimento dos restantes vícios arguidos.

 

  1. DOS JUROS INDEMNIZATÓRIOS

Para além da anulação das liquidações e da consequente devolução dos respetivos montantes pagos, pede o Requerente juros indemnizatórios vencidos e vincendos até integral devolução.

O fundamento legal para o pedido de juros indemnizatórios encontra-se no artigo 43º, da LGT: são devidos ao contribuinte quando, designadamente, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, ficar demonstrado que, por erro imputável aos Serviços, foi efetuado pagamento de dívida tributária em montante superior ao legalmente devido.

Entende-se que há erro imputável aos Serviços que operaram a liquidação quando procede a respetiva reclamação graciosa ou impugnação.

E é o que sucede no caso sub juditio.

Tem assim o Requerente direito não só ao reembolso do imposto pago e que ora irá ser anulado, como ao pagamento de  juros indemnizatórios, à taxa fixada nos termos do artigo 559º-1, do Cód Civil desde a data em que efetuou o pagamento que ora lhe irá ser reembolsado, até à data do citado reembolso – Cfr artigo 43º- 4 e 5, da LGT.

 

V. DECISÃO

 

Termos em que acorda o presente Tribunal em julgar procedente o pedido arbitral e:

  1. anular o acto tributário de liquidação IRS n.º 2022..., correspondente à nota de cobrança de IRS n.º 2022..., e demonstração de liquidação de juros n.º 2023..., referente ao período de tributação de 2018, no valor total de € 184.556,66;
  2. Condenar a Autoridade Tributária e Aduaneira no reembolso do imposto indevidamente pago, acrescido de juros indemnizatórios desde a data do pagamento indevido do imposto até à data do processamento da respetiva nota de crédito.

 

 

VI. VALOR DO PROCESSO E CUSTAS ARBITRAIS

Fixa-se o valor do processo em € 184.556,66 (cento e oitenta e quatro mil, quinhentos e cinquenta e seis euros e sessenta e seis cêntimos, correspondente ao valor indicado pelo Requerente no PPA e que não foi contestado pela Requerida, e em conformidade fixam-se as custas arbitrais em € 3. 672,00, a cargo da Requerida, de acordo com o disposto no artigo 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT, no n.º 2 do artigo 12.º do RJAT, no artigo 4.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, e da Tabela I anexa a este último.

 

  • Notifique-se.

Lisboa, 19 de Fevereiro de 2024

O Tribunal Arbitral,

 

José Poças Falcão

(Presidente)

 

Francisco Melo

(Vogal)

 

 

Ana Teixeira de Sousa

(Vogal e Relatora)