Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 441/2023-T
Data da decisão: 2023-11-07  IRS  
Valor do pedido: € 5.959,80
Tema: IRS - Rendimentos da categoria B. Regime simplificado. Coeficientes de determinação do rendimento tributável. Revogação do ato tributário.
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SUMÁRIO:

I – “Só se verifica a inutilidade superveniente da lide quando essa inutilidade for uma inutilidade jurídica. A utilidade da lide correlaciona-se, assim, com a possibilidade da obtenção de efeitos úteis da mesma pelo que a sua extinção só deve ser declarada quando se conclua que o seu prosseguimento não poderá trazer quaisquer consequências vantajosas para o autor/recorrente”.

II – A verificação da eventual possibilidade de obtenção de um efeito útil ao Requerente exige a apreciação do pedido de juros indemnizatórios.

 

DECISÃO ARBITRAL

I.  RELATÓRIO

Em 18 de junho de 2023, A..., com o NIF ... e domicílio fiscal na Rua ..., ..., ...-... Lisboa (doravante designado por Requerente), veio, ao abrigo do disposto nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a) e 10.º, do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro, que aprovou o Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (RJAT), requerer a constituição de Tribunal Arbitral, em que é Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira (adiante AT ou Requerida), informando não pretender utilizar a faculdade de designar árbitro.

 

O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Exm.º Senhor Presidente do CAAD e automaticamente notificado à AT e, nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro, o Conselho Deontológico designou a signatária como árbitro do tribunal arbitral singular, encargo aceite no prazo aplicável, sem oposição das Partes.

 

A. Objeto do pedido:

O Requerente pretende a declaração de ilegalidade e a consequente anulação das liquidações de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS) com os n.ºs 2021..., referente ao ano de 2017, que produziu o reembolso da quantia de € 2 484,95 e 2021..., referente ao ano de 2019, de que resultou o reembolso no montante de € 2 922,49.

 

Atribuindo ao processo o valor económico de € 5 959,80, o Requerente peticiona a restituição das quantias indevidamente pagas ao abrigo de um plano prestacional, acrescidas dos correspondentes juros indemnizatórios, bem como a condenação da Requerida no pagamento das custas processuais.

 

B. Fundamentação do pedido:

O pedido de pronúncia arbitral centra-se, essencialmente, na questão da determinação do rendimento tributável da categoria B, mediante a aplicação dos coeficientes previstos no n.º 1 do artigo 31.º, do Código do IRS, e vem fundamentado nos seguintes termos:

 

  • Nos exercícios de 2017 e de 2019, o Requerente prestou serviços no âmbito da atividade com o CAE 59110 Produção de filmes, de vídeos e de programas de televisão;
  • Por erro, de que entende não ter resultado prejuízo para a receita tributária, nos recibos emitidos em nome da entidade pagadora dos rendimentos foi aposto um CAE que não corresponde à atividade exercida;
  • Os rendimentos provenientes da referida prestação de serviços em cada um dos anos mencionados, foram incluídos nas respetivas declarações modelo 3 de IRS, Anexo B, no quadro 4, campo 404 – Rendimentos de prestações de serviços não previstos nos campos anteriores;
  • Apesar dos esclarecimentos prestados, Autoridade Tributária e Aduaneira promoveu correções de que resultaram as liquidações oficiosas de IRS para os anos de 2017 e de 2019, por considerar que tais rendimentos deveriam ter sido inscritos no Anexo B, no quadro 4, campo 403 – Rendimentos das atividades profissionais especificamente previstas na Tabela do art.º 151.º do CIRS;
  • O Requerente deduziu reclamações graciosas das liquidações de IRS identificadas no pedido de pronúncia arbitral, que foram indeferidas, assim como os subsequentes recursos hierárquicos;
  • O pagamento das liquidações oficiosas de IRS dos anos de 2017 e de 2019 identificadas no pedido de pronúncia arbitral ocorreu no âmbito de planos prestacionais já regularizados, das quantias de € 2 054,60 e de € 3 905,20, respetivamente, a cuja restituição o Requerente julga ter direito, acrescidas de juros indemnizatórios.

 

b. Da resposta Requerida:

Notificada nos termos e para os efeitos previstos no artigo 17.º do RJAT, a AT apresentou requerimento de junção do Despacho da Senhora Subdiretora-Geral da Autoridade Tributária e Aduaneira para a Área de Gestão Tributária – IR, de 9 de outubro de 2023, nos termos do qual se procedeu à revogação dos atos tributários impugnados, em concordância com a Informação prestada pela Direção de Serviços do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares.

 

*

Pelo Despacho Arbitral de 17 de outubro de 2023, foi o Requerente notificado para, no prazo de 10 dias, se pronunciar, querendo, sobre o teor do Despacho da Senhora Subdiretora-Geral da Autoridade Tributária e Aduaneira, datado de 09.10.2023.

 

Mais se notificou o Requerente de que, no mesmo prazo, deveria proceder ao pagamento da taxa arbitral subsequente (artigo 4.º, n.º 3, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária), indicando-se o dia 8 de novembro de 2023 como data previsível de prolação da decisão arbitral.

 

O Requerente não se pronunciou sobre o teor do referido Despacho da Senhora Subdiretora-Geral da Autoridade Tributária e Aduaneira, que revogou as liquidações oficiosas de IRS dos anos de 2017 e de 2019, identificadas o pedido de pronúncia arbitral.

 

 

II. SANEAMENTO

1. O Tribunal Arbitral Singular foi regularmente constituído em 28 de agosto de 2023, em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro, com a redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro;

2. Não tendo o Requerente constituído mandatário judicial, de constituição obrigatória nos termos do n.º 1 do artigo 6.º, do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), na redação que lhe foi dada pela Lei n.º 118/2019, de 17 de setembro, subsidiariamente aplicável ao processo arbitral tributário por força do artigo 29.º, n.º 1, alínea a), do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (RJAT), foi, em 28 de agosto de 2023, emitido despacho de aperfeiçoamento, ao abrigo do disposto no artigo 110.º, n.º 2, do CPPT;

3. Por requerimento com entrada nos autos em 11 de setembro de 2023, veio o Requerente comunicar a constituição de mandatário judicial e juntar a respetiva procuração forense;

4. Sanada a irregularidade do pedido de constituição do tribunal arbitral, verifica-se que as partes têm personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão legalmente representadas, nos termos dos artigos 4.º e 10.º do RJAT e do artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março;

5. O processo não padece de vícios que o invalidem.

6. Não tendo sido requerida a produção de prova adicional e, assegurado o exercício do contraditório, nada obsta a que seja proferida a decisão final.

III.         FUNDAMENTAÇÃO

III.1 MATÉRIA DE FACTO

Na sentença, o juiz discriminará a matéria provada da não provada, fundamentando as suas decisões (artigo 123.º, n.º 2, do CPPT, subsidiariamente aplicável ao processo arbitral tributário, por remissão do artigo 29.º, n.º 1, alínea a), do RJAT).

 

A matéria factual relevante para a compreensão e decisão da causa fixa-se como segue.

 

  1. Factos Provados:
  1. Nos anos de 2017 e de 2019, o Requerente prestou serviços de “Produtor e Assistente de Produção de Filmes e de Televisão”, atividade enquadrada no CAE 59110, tendo por destinatário a sociedade “B..., SA”;
  2.  Nos Anexos B (Rendimentos da Categoria B – Regime Simplificado) às declarações modelo 3 de IRS dos anos de 2017 (declaração n.º 2017-...-...) e de 2019 (declaração n.º 2019-... -...) o Requerente inscreveu os rendimentos obtidos com o exercício da referida atividade no quadro 4A (rendimentos profissionais, comerciais e industriais), campo 404 (Rendimentos de prestações de serviços não previstos nos campos anteriores);
  3. Tendo por base a declaração de rendimentos apresentada pelo Requerente para o ano de 2017, foi emitida a liquidação de IRS n.º 2018..., de que resultou reembolso da quantia de € 4 539,55;
  4. Com base na declaração modelo 3 de IRS do ano de 2019, a AT emitiu ao Requerente a liquidação n.º 2020..., que produziu um reembolso da quantia de € 6 827,69;
  5. Pelo ofício n.º ...do Serviço de Finanças de Lisboa ..., de 05.11.2021, foi o Requerente notificado para, no prazo de 15 dias a contar da data da notificação e nos termos dos artigos 128.º, 65.º e 66.º, do Código do IRS, apresentar documentos comprovativos das funções exercidas na “B..., SA”, designadamente o contrato de trabalho ou de prestação de serviços, com a cominação de que, não o fazendo, seriam “elaboradas declarações oficiosas, eliminando do campo 404 do Quadro 4 A do anexo B os rendimentos nele inseridos e fazendo constar os mesmos rendimentos no campo 403 do mesmo quadro.”;
  6. Através dos ofícios n.ºs ... e ... do Serviço de Finanças de Lisboa ..., ambos datados de 23.11.2021, foi o Requerente notificado da fundamentação para a correção oficiosa das declarações modelo 3 de IRS, dos anos de 2017 e de 2019, nos seguintes termos:

 

(…)

 

(…)

 

(…)”

  1. Das correções efetuadas pela AT às declarações de IRS apresentadas pelo Requerente, para os anos de 2017 e de 2019, resultaram as liquidações impugnadas:
    1. Liquidação n.º 2021 ..., referente ao ano de 2017, que produziu reembolso da quantia de € 2 484,95;
    2. Liquidação n.º 2021..., referente ao ano de 2019, de que resultou o reembolso no montante de € 2 922,49;
  2. As diferenças entre os valores dos reembolsos iniciais e as dos reembolsos apurados nas liquidações oficiosas para os anos de 2017 e de 2019, das quantias de € 2 054,60 e de € 3 905,20, respetivamente, foram pagas pelo Requerente através dos planos prestacionais com os n.ºs 2022.... (referente a 2017, a que correspondeu a nota de cobrança n.º 2021...) e 2022... (referente a 2019, a que correspondeu a nota de cobrança n.º 2021...);
  3. As reclamações graciosas n.º ...2022..., deduzida contra a liquidação oficiosa de IRS do ano 2017 e n.º ...2022..., referente à liquidação oficiosa de IRS do ano 2019, foram indeferidas por despacho da Senhora Chefe do Serviço de Finanças de Lisboa ..., de 02.05.2022;
  4. Os recursos hierárquicos n.º ...2022... e n.º ...2022..., interpostos contra as decisões de indeferimento das reclamações graciosas identificadas no ponto precedente, foram indeferidos por despachos proferidos pelo Diretor de Finanças Adjunto da Direção de Finanças de Lisboa, em 14.04.2023 e em 13.04.2023, respetivamente;
  5. O pedido de constituição do Tribunal Arbitral deu entrada no CAAD em 18.06.2023;
  6. Em 09.10.2023, a Requerida remeteu requerimento de junção do Despacho da Senhora Subdiretora-Geral da Autoridade Tributária e Aduaneira, de 09.10.2023, que revogou as liquidações oficiosas de IRS, em concordância com a Informação prestada pela Direção de Serviços do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares;
  7. Da referida informação da DSIRS, citando o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 12.09.2020, no processo n.º 092/19.9BASLB, consta, designadamente, o seguinte:

«14-Ora, da leitura ao elenco da tabela de atividades do artº 151º do CIRS constante do Anexo I da Portaria n.º 1011/2001, de 21 de agosto, não se encontra qualquer código específico que se refira ou compreenda a atividade profissional efetivamente exercida pelo Requerente com o CAE 59110 – Produção de filmes, de vídeos e de programas de televisão, concretamente, a função de “produtor delegado”.

15-Efetivamente, e contrariamente ao referido e defendido nas decisões de indeferimento proferidas nas reclamações graciosas, bem como dos recursos hierárquicos que reiteram essas decisões, onde é referido que “… a actividade de produtor de cinema enquadra-se na actividade artística de Produção”, a atividade não consta do elenco das atividades previstas na tabela a que se refere o artº 151º do CIRS, pelo que, não pode ser aplicado o coeficiente 0.75 previsto na al. b) do nº 1 do artº 31º do CIRS.

16-Nestes termos, não estando especificamente prevista na tabela a que se refere o artº 151º do CIRS e não sendo possível, por mera interpretação extensiva, integrá-la em qualquer outra profissão nela especificamente prevista, a atividade exercida pelo requerente tem, necessariamente, de considerar-se abrangida pelo código 1519 – Outros prestadores de serviços e, consequentemente, ser-lhe aplicado o coeficiente 0.35 para determinação do rendimento líquido aplicável aos rendimentos auferidos no seu exercício, com a consequente indicação no campo 404 do anexo B das declarações mod.3 relativas aos anos de 2017 e 2018.

V – Conclusão

Após apreciação do pedido de pronúncia arbitral, afigura-se-nos que deverá ser deferido o pedido, anulando-se os atos de liquidação do IRS nº 2021... e nº 2021..., relativos aos períodos de tributação de 2017 e 2019.

V – Proposta de decisão

Por tudo o exposto, propõe-se a o deferimento do pedido e a anulação dos atos.».

 

B. Factos não provados:

Não existem factos com interesse para a decisão da causa que devam considerar-se como não provados.

 

C. Fundamentação da matéria de facto provada:

Relativamente à matéria de facto, o Tribunal não tem de se pronunciar sobre tudo o que foi alegado pelas partes, cabendo-lhe, sim, o dever de selecionar os factos que importam para a decisão e discriminar a matéria provada da não provada.

 

Deste modo, os factos pertinentes para o julgamento da causa são escolhidos e recortados em função da sua relevância jurídica, a qual é estabelecida em atenção às várias soluções plausíveis da(s) questão(ões) de Direito (cfr. o artigo 596.º do Código de Processo Civil, aplicável ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT).

 

Os factos dados como provados decorreram da análise crítica dos documentos juntos ao PPA, bem como do requerimento junto aos autos pela Requerida.

 

 

III.2 DO DIREITO

  1. A questão decidenda

Tendo em conta a factualidade dada como provada, a questão a decidir consiste em saber:

  • Se, em face da anulação administrativa (revogação anulatória) das liquidações de IRS dos anos de 2017 e de 2019, objeto dos presentes autos, antes da prolação da decisão arbitral, se verifica a inutilidade superveniente da lide, nos termos do artigo 277.º, alínea e), do Código de Processo Civil (CPC), com a consequente extinção da instância ou;
  •  Se, tendo o Requerente peticionado a condenação da Requerida no pagamento de juros indemnizatórios e, não tendo esse aspeto sido explicitamente abordado na decisão de revogação das liquidações mencionadas, deve o Tribunal Arbitral apreciar do mérito deste pedido, não obstante, notificado para o efeito, o Requerente se não ter pronunciado sobre o teor do Despacho da Senhora Subdiretora-Geral da Autoridade Tributária e Aduaneira, de 09.10.2023, que revogou as referidas liquidações de IRS.

 

Quanto à primeira parte da questão, cabe referir que a revogação anulatória do ato tributário impugnado após constituição do Tribunal Arbitral, dando satisfação à pretensão formulada pelo Requerente, constitui causa de extinção da instância, por inutilidade superveniente da lide, nos termos do artigo 277.º, alínea e), do Código de Processo Civil (CPC), subsidiariamente aplicável ao processo arbitral tributário, ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT, e que, de acordo com a doutrina e a jurisprudência, se verifica quando, “por facto ocorrido na pendência da instância, a pretensão do autor não se pode manter, por ter encontrado satisfação fora do esquema da providência pretendida[1] .

 

Porém, no caso vertente, embora a pretensão do Requerente quanto à anulação das liquidações oficiosas de IRS dos aos de 2017 e de 2019 tenha obtido satisfação por meios extrajudiciais, à margem da prolação de qualquer julgado anulatório, a decisão administrativa não apreciou o direito do Requerente a juros indemnizatórios, pedido formulado na petição inicial.

 

Quanto à segunda parte da questão acima identificada, apesar de o Requerente, notificado para se pronunciar sobre o teor do supramencionado Despacho da Senhora Subdiretora-Geral da Autoridade Tributária e Aduaneira, que anulou as liquidações de IRS impugnadas, nada ter dito, não poderá interpretar-se o seu silêncio como renúncia à apreciação do direito a juros indemnizatórios pelo pagamento da prestação tributária indevida, por ausência de norma que comine tal efeito.

 

Assim sendo, não se poderão dar por verificados os pressupostos de que depende a extinção da instância por inutilidade superveniente da lide, pois, tal como referido pelo Supremo Tribunal Administrativo no já citado Acórdão, “Só se verifica a inutilidade superveniente da lide quando essa inutilidade for uma inutilidade jurídica. A utilidade da lide correlaciona-se, assim, com a possibilidade da obtenção de efeitos úteis da mesma pelo que a sua extinção só deve ser declarada quando se conclua que o seu prosseguimento não poderá trazer quaisquer consequências vantajosas para o autor/recorrente”.

 

Neste caso, a verificação da eventual possibilidade de obtenção de um efeito útil ao Requerente exige a apreciação do pedido de juros indemnizatórios[2].

O regime dos juros indemnizatórios consta do artigo 43.º, da LGT, dispondo o seu n.º 1 que “São devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido”.

 

O caso concreto dos autos, dá-se como provado o erro dos serviços, quer na emissão das liquidações de IRS que dele são objeto, quer das decisões de indeferimento das subsequentes reclamações graciosas e recursos hierárquicos, erro admitido pela Requerida na Informação da DSIRS que serviu de base ao Despacho de revogação daqueles atos tributários, em que se refere que “15-Efetivamente, e contrariamente ao referido e defendido nas decisões de indeferimento proferidas nas reclamações graciosas, bem como dos recursos hierárquicos que reiteram essas decisões (sublinhado nosso), onde é referido que “… a actividade de produtor de cinema enquadra-se na actividade artística de Produção”, a atividade não consta do elenco das atividades previstas na tabela a que se refere o artº 151º do CIRS, pelo que, não pode ser aplicado o coeficiente 0.75 previsto na al. b) do nº 1 do artº 31º do CIRS.”.

 

Por outro lado, a utilização de um CAE errado na emissão dos recibos à entidade pagadora dos rendimentos da Categoria B, não é relevante para imputação ao Requerente do erro nas liquidações oficiosas, dada a confirmação pela AT, em momento prévio à emissão das referidas liquidações, da atividade exercida.

 

Não sendo o erro imputável ao Requerente, antes decorrendo da errada interpretação e aplicação da norma de determinação do rendimento tributável, é-lhe reconhecido o direito a juros indemnizatórios, sobre o valor e desde a data do pagamento de cada uma das prestações incluídas nos planos de pagamento em prestações n.ºs 2022... e 2022..., até ao processamento das respetivas notas de crédito.

 

 

IV. DECISÃO

Com base nos fundamentos de facto e de direito enunciados supra, decide-se:

  1. Julgar extinta a instância quanto às liquidações de IRS dos anos de 2017 e de 2019, dada a sua anulação administrativa;
  2. Condenar a Autoridade Tributária e Aduaneira no pagamento de juros indemnizatórios ao Requerente, sobre o valor e desde a data do pagamento de cada uma das prestações incluídas nos planos de pagamento em prestações n.ºs 2022... e 2022..., até ao processamento das respetivas notas de crédito.

 

 

VALOR DO PROCESSO: De harmonia com o disposto no artigo 306.º, n.ºs 1 e 2, do CPC, 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se ao processo o valor de € 5 959,80 (cinco mil, novecentos e cinquenta e nove euros e oitenta cêntimos).

 

CUSTAS: Calculadas de acordo com o artigo 4.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária e da Tabela I a ele anexa, no valor de € 612,00 (seiscentos e doze euros), a cargo da Autoridade Tributária e Aduaneira.

 

Notifique-se.

 

Lisboa, 7 de novembro de 2023.

O Árbitro,

 

Mariana Vargas

 

Texto elaborado em computador, nos termos do n.º 5 do artigo 131.º, do CPC, aplicável por remissão da alínea e) do n.º 1 do artigo 29.º, do D.L. n.º 10/2011, de 20 de janeiro.

A redação da presente decisão rege-se pelo acordo ortográfico de 1990.

 



[1] Cfr. o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 08.06.2022, Processo 02321/17.4BEPRT.

[2] Cfr. o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 25.01.2017, processo n.º 01693/15, de acordo com cujo sumário: “I - Ocorre erro de julgamento (…) se a decisão de primeira instância declarou totalmente extinta a instância por inutilidade superveniente da lide quando devia ter considerado o pedido de juros indemnizatórios efetuado na petição de impugnação. II – (…) vindo peticionados juros (…) impõe-se que o tribunal de 1ª instância proceda ao conhecimento desta questão. (…)”.