Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 253/2020-T
Data da decisão: 2021-01-15  IRS  
Valor do pedido: € 5.286,07
Tema: IRS – Dedutibilidade de despesas realizadas com obras imóveis arrendados.
Versão em PDF

SUMÁRIO

As despesas elegíveis efectuadas nos imóveis arrendados devem estar comprovadas documentalmente para efeitos de dedução nos rendimentos prediais, em sede de IRS, por força do estabelecido no art. 41º do CIRS, maxime do seu nº 8.

 

DECISÃO ARBITRAL

 

I – RELATÓRIO

 

A. – PARTES

A..., a seguir designado por Requerente, com o NIF ..., e domicílio fiscal na Rua ..., nº ... -..., esq., ...-... ..., veio requerer em 7  de Maio de 2020 a constituição do tribunal arbitral singular em matéria tributária, ao abrigo do prescrito no art. 2º, nº 1, alínea a) do Decreto – Lei nº 10/2011, de 20 de Janeiro (Regime Jurídico de Arbitragem Tributária - RJAT) e nos arts. 1º, alínea a) e 2º da Portaria nº 112 – A/2011, de 22 de Março, com a finalidade de ser dirimido o litígio que a opõe à Autoridade Tributária e Aduaneira, que doravante será designada por Requerida.

 

B. – CONSTITUIÇÃO DO TRIBUNAL

1. O pedido de constituição do Tribunal Arbitral foi aceite pelo Presidente do CAAD e automaticamente notificado à Requerente e à Requerida Autoridade Tributária e Aduaneira em 07/05/2020, Requerida esta que designou juristas para a representar por despacho de 01/06/2020, comunicado em 03/06/2020, tendo o Presidente do Conselho Deontológico do CAAD designado o signatário como árbitro do Tribunal Arbitral Singular, ao abrigo do disposto no art. 6º, nº 1, do RJAT, em 07/07/2020,  encargo este que foi aceite, nos termos legalmente estabelecidos.

2. Em 07/07/2020, as Partes foram notificadas dessa designação, nos termos das disposições combinadas do art. 11º, nº 1, alínea b) do RJAT e dos artigos 6º e 7º do Código Deontológico, não tendo manifestado vontade de recusar a designação do árbitro.

3. Nestas circunstâncias, o Tribunal foi constituído em 06/08/2020, nos termos do preceituado na alínea c), do nº 1, do art. 11º do Decreto – Lei nº 10/2011, o que foi notificado às Partes nessa data.

                                          

C. – PRETENSÃO

     A Requerente pretende que o Tribunal Arbitral proceda à anulação da liquidação de IRS nº 2019..., no valor de 5.286,07 euros, nos termos descritos no Pedido de Pronúncia Arbitral, e, em consequência

     Determine a restituição do imposto que foi pago pela Requerente, acrescido de juros indemnizatórios, com as consequências legais.

D. – TRAMITAÇÃO DO PROCESSO

     Após a comunicação da data da constituição do Tribunal Arbitral, em 06/08/2020, seguiram-se os posteriores termos processuais, na forma seguinte:

- Em 06/08/2020 – Foi notificada a Requerida para nos termos dos nºs 1 e 2 do art. 17º do RJAT, apresentar Resposta no prazo de 30 dias e, querendo, solicitar produção de prova adicional e juntar o processo administrativo.

- Em 29/09/2020– A Requerida apresentou Resposta ao Pedido de Pronúncia Arbitral e inseriu na “Plataforma” on line do CAAD o processo administrativo, tendo sido, de tudo, notificada a Requerente.

- Em 06/10/2020 – O Tribunal exarou um despacho arbitral, que foi notificado às Partes, visando:

    - Dispensar a realização da reunião prevista no art. 18º do RJAT, em aplicação dos princípios da autonomia do tribunal arbitral na condução do processo, da celeridade e da simplificação e das informalidades processuais (arts. 19, nº 2 e 29, nº 2 do RJAT), tendo em conta que a matéria de facto relevante para a decisão poderá ser fixada com base na prova documental.

    - Determinar o prosseguimento do processo, mediante a notificação das Partes, para apresentarem alegações escritas, facultativas, no prazo sucessivo de quinze dias;

    - Solicitar, ao abrigo do princípio da colaboração, a remessa das peças processuais em formato word.

    - Fixar como data previsível para a prolação da decisão arbitral o dia 21 de Dezembro de 2020.

    - Em 21/10/2020, a Requerente requereu a audição de testemunhas antes da prolação da decisão final.

    - Em 29/10/2020, a Requerida, ouvida em sede de contraditório, pronunciou-se pela desnecessidade de audição de testemunhas.

    - Em 11/11/2020, o Tribunal indeferiu o requerimento apresentado pela Requerente em 21/10/2020.

    - As Partes não apresentaram alegações escritas.

   - Em 15 /01/2021– Prolação da decisão.

E. – PRETENSÃO DA REQUERENTE E SEUS FUNDAMENTOS

      A fundamentar o Pedido de Pronúncia Arbitral, a Requerente alegou, em síntese, o seguinte:

  - A Requerente, em sede de direito de audição no âmbito de análise de divergências de IRS do período de 2018, apresentou prova documental de despesas com obras em prédios arrendados, nomeadamente recibos de prestações de serviços e facturas de compra de materiais de construção, para efeito de deduções aos rendimentos de categoria F, nos termos do artº 41º do Código do IRS.

- Em resposta, a Autoridade Tributária e Aduaneira - AT não considerou como despesas com prédios arrendados uma parte da documentação apresentada, fundamentando apenas que "os mesmos não reúnem os requisitos para poderem ser consideradas despesas com prédios arrendados, nomeadamente aquisição de material sem associação de qualquer obra com orçamento".

- Embora tenham sido consideradas despesas com elevadores, seguros, ... e recibos de prestação de serviços de obras.

- Sendo que todas estas obras foram realizadas nos prédios da propriedade de B...- Cabeça de casal da herança – NIF..., cujos dois únicos herdeiros são a aqui Requerente e o seu irmão, em duas partes iguais.

- Não foram consideradas as despesas documentadas pelas facturas nºs FT 201800740/000221, FT 201800740/000390, FT 201800740/000670, FT 201800718/019253, FT

201800718/019273 todas da C... S.A. (C...) de aquisição pela Requerente de diversos tipos de materiais e equipamentos de construção, nomeadamente pavimentos, rodapés, chuveiros, torneiras, lava-loiças, entre outros, usados nas obras realizadas nos imóveis sitos na Travessa ... nº ..., ...-... Sacavém e na ..., nº..., ...-... Barcarena.

- E de facto os recibos da prestação de serviços de obras também não constam no campo 2 do Modelo 3 do IRS.

- Que foram entregues ao domicílio, sendo descarregados nos respectivos imóveis onde decorreram as obras, conforme se pode verificar no campo "Local de Descarga" no canto superior esquerdo de cada factura.

- Os mesmos foram adquiridos para prossecução das referidas obras, executadas por D... .

- As obras em causa eram pouco complexas, de execução relativamente simples e curtas tanto no espaço como no tempo, não necessitando sequer de autorização da Câmara Municipal nem de qualquer outra entidade competente.

- A Requerente adquiriu os materiais constantes nas facturas e o Sr. D... efectuou as obras recebendo as instruções do sentido em que iriam ser realizadas.

- A Requerente trabalhou com alguma regularidade com o Sr. D... , conhecendo as capacidades e confiando nos seus métodos de trabalho, não necessitando neste caso concreto de elaborar por escrito qualquer orçamento de obras ou contrato de empreitada.

- Dispõe o nº 1 do artigo 41º do Código do IRS, na actual redacção da Lei nº 42/2016, de 28 de Novembro o seguinte:

"1- Aos rendimentos brutos referidos no artigo 8º deduzem-se, relativamente a cada prédio ou parte de prédio, todos os gastos efectivamente suportados e pagos pelo sujeito passivo para obter ou garantir tais rendimentos, com excepção dos gastos de natureza financeira, dos relativos a depreciações e dos relativos a mobiliário, electrodomésticos e artigos de conforto ou decoração, bem como do adicional ao imposto municipal sobre imóveis."

- No entender da Requerente, esta actual redacção do artigo pretende considerar como regra todos os gastos em que o sujeito passivo incorre para obter ou garantir os rendimentos prediais, e enuncia taxativamente as excepções à regra dos gastos que não devem ser considerados enquanto deduções - gastos de natureza financeira; gastos relativos a depreciações; gastos relativos a mobiliário, electrodomésticos e artigos de conforto ou decoração; gastos do adicional ao imposto municipal sobre imóveis.

- Enquanto na anterior redacção do nº 1 (Lei nº 82-E/2014, de 31 de Dezembro) o legislador referia que eram dedutíveis as "despesas de manutenção e conservação", originando várias dificuldades de interpretação e consequentes pleitos entre contribuintes e a Autoridade Tributária e Aduaneira - AT, tendo a jurisprudência seguido uma interpretação à luz  dos artºs 11º da LGT e 11º do revogado  RAU de forma a concretizar quais os tipos de obras a considerar como deduções (Acórdão do Tribunal Central Administrativo de 15/12/2016 no processo nº 05310/12; Decisão nº 264/2017-T e nº 659/2017-T deste Centro de Arbitragem).

- Na actual redacção o legislador veio clarificar quais os gastos com prédios arrendados que podem ser dedutíveis, de forma a que possam ser deduzidos todos os gastos efectivos que o sujeito passivo incorra de modo a poder realizar os seus rendimentos prediais, concretizando os princípios da capacidade contributiva e da tributação do rendimento líquido.

- Ora, neste caso concreto e perante a factualidade aqui descrita, é por demais evidente que as facturas/recibos já juntos se reportam a "gastos efectivamente suportados e pagos pelo sujeito passivo para obter ou garantir tais rendimentos", tal como previsto na Lei.

- Conclui, dizendo que não existe qualquer fundamento legal para que a Autoridade Tributária e Aduaneira - AT recuse a admissão desses gastos como deduções nos termos do artº 41º, pelo facto de alegadamente "não estarem associadas a qualquer obra com orçamento", nem que o faça depender da apresentação de qualquer orçamento de obra associado.

- Por, em seu entender, não existir base legal para esta recusa e decorrer também da experiência comum, que este tipo de obras possam ser realizadas sem a elaboração prévia de orçamento de obra, sendo suficiente a compra dos materiais pelo senhorio e um acordo com o prestador de serviços que vai realizar a obra.

- Pelo que as facturas e recibos em apreço deverão ser consideradas como deduções a rendimentos prediais nos termos do nº 1 do artº 41 do Código do IRS, tudo o mais com as devidas consequências legais.

- Dado que no campo 2 da declaração de IRS em causa, na parte referente às deduções específicas não constam estes valores.

- A Requerente efectuou tempestivamente o pagamento da referida liquidação de IRS com o nº 2019 ... .

F. – RESPOSTA DA REQUERIDA E SEUS FUNDAMENTOS

     Alegou, em síntese, a Requerida:

- No entender da Requerida, não assiste qualquer razão, ao pedido formulado pela Requerente.

- Consta dos documentos do PA, o seguinte conjunto de factos relevantes nos presentes autos:

- A liquidação adicional do IRS de 2018, no valor de € 5.286,07, sobre que incide o pedido de pronúncia teve origem na declaração oficiosa com a identificação ..., em conclusão do processo de divergências n.º....;

 

- O processo GI n.º ... foi instaurado com o código de análise 064 - "despesas de prédios arrendados" e 076 - "dedução do AIMI".

 

- Face aos elementos apresentados, pelo sujeito passivo, para comprovação dos valores referentes às análises em causa, constantes dos autos do referido processo, foi a contribuinte notificada, em sede de audição prévia, através da notificação Gl- ..., de 14/10/2019, registada sob o n.º RH...PT, de que existiam despesas dos prédios arrendados que não poderiam ser aceites fiscalmente, nomeadamente, que comprovasse relativamente, aos prédios arrendados, despesas de condomínio e manutenção e conservação e por se tratar de herança, já foi a mesma situação verificada no processo de divergências do contribuinte B..., NIF... . Além do mais existe uma fatura de 18/02/2019 no montante de € 18.550,00.  Assim, o valor de despesas do quadro 5A seria corrigido de € 21.491,95 para € 7.463,68.

 

- No âmbito de audição prévia, o sujeito passivo veio exercer o seu direito de participação, acompanhado de vários documentos, sendo que um deles é o recibo n.º 25/A no valor de € 18.550,00 emitido à herança de que o sujeito passivo com o NIF ... é o cabeça de casal, e que comprova o pagamento da fatura n.º 2/A, pagamento que ocorreu já em 18/02/2019, e como tal não pode ser considerado em 2018;

 

- Do verificado em sede de audição, porque os documentos e fundamentos apresentados não trouxeram nada de novo ao projeto de correção, não tendo conseguido comprovar os elementos declarados, a contribuinte foi notificada em 05/12/2019, através do oficio n.º GI-..., datado de 02/12/2019, e por despacho do Chefe de SF de 02/12/2019, registado com A/R nº RH...PT com a indicação das faturas não aceites e quais as despesas suportadas que foram consideradas, e que se iria proceder às seguintes correções: ANEXO – F  QUADRO A  CAMPO – DESPESAS  VALOR declarado – 21.491,95  VALOR DA CORREÇÃO A EFETUAR – 14.028,27   VALOR FINAL - € 7.463,68.

 

- A contribuinte não logrou apresentar a declaração de substituição, tendo sido elaborado o documento de correção com as retificações propostas (Anexo DC). Da decisão definitiva de correção foi o sujeito passivo notificado em 05/12/2019, com o envio do ofício nº GI-..., datado de 02/12/2019, registado sob o n.º RH...PT, com AR;

 

- A liquidação oficiosa que ora impugna foi paga em 26/01/2020.

 

- No âmbito do processo administrativo, de fls. 17 a 26, refere-se ao sujeito passivo B..., NIF..., que foi igualmente alvo de um processo de divergências ao IRS de 2018, uma vez que é irmão da ora Requerente, sendo herdeiros dos imóveis arrendados que foram alvo de obras nos mesmos prédios arrendados e é cabeça de casal. (processo de divergências nº...).

 

-  Aliás, B... apresentou um Pedido de pronuncia arbitral, que corre no CAAD sob o nº 91/2020-T, tendo por fundamentos as mesmas questões deduzidas no presente processo.

- Tal como demonstrado através dos factos e correspondente Processo de Divergências, não assiste razão à Requerente, como se encontra demonstrado na informação que fundamentou as correções propostas, para onde se remete e que desde já se dá por integralmente reproduzida para todos os efeitos legais.

- Antes de mais, importa frisar que o cerne da argumentação da Requerente, assenta na desconsideração das despesas fiscalmente dedutíveis, relativas aos imóveis arrendados.

 

-  No caso concreto a Requerente requer a aceitação dos montantes suportados com a aquisição de material de construção e prestação de serviços de construção que foram realizados em dois dos imóveis dos quais aufere rendimentos da Categoria F, dedutíveis nos termos admitidos pelo artigo 41º CIRS, contrariamente ao que foi considerado pela Administração Tributária no âmbito do procedimento de análise de divergências uma vez que não estariam essas obras e gastos titulados pelos documentos apresentados, associados a qualquer orçamentação, mais especificamente a aquisição do material não estava associado a qualquer obra sustentada em um orçamento.

 

- Argumenta a requerente que os gastos foram efetivamente suportados com vista à obtenção ou garantia dos rendimentos declarados no anexo F, verificando-se a sua entrega na morada dos imóveis intervencionados, sitos em Sacavém e em Barcarena e apenas não tendo na sua base um orçamento ou contrato de empreitada porque foram obras relativamente simples e realizadas por um prestador cuja qualidade de trabalho é do pleno conhecimento da requerente.

 

-  Acresce ainda que não resulta da redação do normativo do CIRS que enquadra esta matéria, a exigência de que as obras necessárias para assegurar a obtenção dos rendimentos tenham que ser suportadas por uma orçamentação prévia, tal como resulta da experiência comum que assim não seja necessário quando se trate de intervenções de natureza simples, bastando um simples acordo com o prestador dos serviços de construção e manutenção.

 

- Na situação concreta a Requerente contesta ainda a não aceitação pela Administração Tributária de algum dos gastos que inscreveu na primeira declaração apresentada posteriormente objeto de análise em procedimento de divergências, nomeadamente após a apresentação dos documentos titulativos porquanto foi entendido que estes não permitiam associar os materiais e serviços prestados a uma qualquer obra que tivesse sido realizada no(s) imóveis arrendados, inexistindo uma obra orçamentada que permite essa identificação e conciliação entre materiais, serviços e a intervenção considerada necessária para assegurar a perceção do rendimento.

 

- Dos documentos identificados pela Requerente verifica-se terem sido adquiridos diversos materiais de construção, como pavimento laminado ou torneiras, do mesmo modo que foi prestado serviço essencialmente de pintura e reparação de canalização, pelo que, mesmo não se discutindo a clara identificação do local de entrega e prestação dos serviços documentados, dificilmente se pode percecionar que tipo de intervenção foi realizada nos imóveis que a Requerente identifica como sitos em Sacavém e Barcarena, uma vez que não se encontra nos autos qualquer descrição das obras e dos materiais para a sua concretização, só assim se podendo avaliar se as mesmas e os gastos inerentes suportados permitiam assegurar a obtenção dos rendimentos da categoria  F advenientes de cada um dos imóveis em concreto.

 

- Ora, após a entrada em vigor do Código do IRS, os rendimentos individuais passaram a ser tributados todos unitariamente, ao contrário do que sucedia até então, ainda que subdivididos por diferentes categorias de acordo com os distintos tipos de rendimentos.

 

- Cada uma dessas categorias de rendimentos tem a sua dedução específica, directamente relacionada com o rendimento acréscimo obtido, seja em termos de tipo de despesa seja em termos de quantum da mesma.

 

- Assim, no que ora é relevante, aos rendimentos prediais auferidos são dedutíveis as despesas documentadas, necessárias e directamente ligadas à obtenção desses mesmos rendimentos, desde que suportadas pelo próprio sujeito passivo.

 

- E são essas as despesas que se entendem como necessárias para produzir os rendimentos prediais e para manter íntegra a respetiva fonte produtora, ou seja, os prédios objeto de arrendamento. 

- Como despesas de manutenção consideram-se, nomeadamente, as suportadas com energia e manutenção de elevadores, escadas rolantes e monta-cargas, porteiros, limpeza, energia para iluminação, aquecimento ou climatização central e prémios de seguro do prédio, enquanto que como despesas de conservação se consideram as realizadas com obras destinadas a manter uma edificação nas condições existentes à data da sua construção, reconstrução, ampliação ou alteração, designadamente as obras de restauro, reparação e limpeza.

- Despesas de conservação, manutenção e IMl pago relativamente a imóveis arrendados - Uma vez que, para efeitos de tributação em sede da Categoria F do Código do IRS, se atende ao rendimento líquido obtido, i.e., às rendas recebidas deduzidas das despesas e encargos suportados para produzir os rendimentos prediais englobados e para manter íntegra a respetiva fonte produtora, ou seja, os prédios objeto de arrendamento, afigura-se deverem tais despesas ser proporcionalmente consideradas tendo por base o período de arrendamento.

- Complementarmente e no caso de fração autónoma de prédio em regime de propriedade horizontal, os encargos de conservação, fruição e outros que, nos termos da lei civil, o condómino deva obrigatoriamente suportar, por ele sejam suportados, e se encontrem documentalmente provados.

- Ora, são despesas de manutenção as já anteriormente referidas.

- Sendo essas as despesas que se entendem como necessárias para produzir os rendimentos prediais objeto de tributação e para manter íntegra a respetiva fonte produtora, ou seja, os prédios objeto de arrendamento.

- Nesse sentido, importa compulsar a norma do artigo 41º, nº 1 do CIRS, subsumível à análise

do caso em apreço.

 

- O âmbito alargado do preceito e, consequentemente, das despesas suscetíveis de concorrerem para a dedução específica em análise, é melhor esclarecido no Anteprojeto da Reforma do IRS, ou seja, no documento que esteve na génese da alteração legislativa, que introduziu o aludido disposto:

 

 "Assim, atendendo aos efeitos pretendidos, a solução encontrada, pese embora implicar alguma complexidade administrativa, passou por admitir a dedução da maioria dos gastos que

sejam efetivamente suportados e pagos pelo sujeito passivo para obter tais rendimentos. Esta ampliação das deduções específicas permitidas levou a que se tenham tomado algumas cautelas capazes de prevenir abusos que, de outro modo, certamente ocorreriam. Em primeiro lugar, mantém-se a necessidade de apresentação de documentos comprovativos das despesas que se pretende deduzir; em segundo lugar, propõe-se o estabelecimento da regra de que as perdas apenas podem ser deduzidas aos ganhos de cada prédio em concreto, mas com a consagração de um generoso prazo de reporte para futuro.”

 

 

- Todavia, e como é notório nas palavras do Anteprojeto, é imperioso compulsar a conexão existente entre os gastos e os rendimentos auferidos pela Requerente.         

 

- Um raciocínio intrinsecamente relacionado com a ligação de cada uma das despesas apresentadas, com os prédios arrendados pela autora.

        

- Com efeito, compulsadas as faturas presentes, não se afigura possível distinguir quais os materiais utilizados em cada uma das frações arrendadas.       

 

- Efetivamente no âmbito da análise de divergências de IRS do exercício de 2018, verificaram os Serviços, que face à documentação apresentada em audição, os mesmos não reúnem os requisitos para poderem ser consideradas despesas com prédios arrendados, nomeadamente, aquisição de material sem associação de qualquer obra com orçamento e recibos de aquisição de bens:

- Faturas 221, 390, 670, 19253 e 19273 da C...;

- Fatura datada de 18/02/2019 no valor de € 18.550,00 €.

 

- Foram, no entanto, aceites as despesas suportadas com elevadores, seguros, faturas da ... e recibos de obras na Travessa ..., em Sacavém.

   

- Ora, para além de figurar na declaração modelo 3 de IRS entregue pela ora Requerente, presença de vários prédios distintos, associados a arrendamentos, cujo titular dos rendimentos é a Requerente, esses ganhos são, para além do mais, repartidos por diferentes frações.

 

- O que significa que, a antedita conexão, ordena ponderar a relação entre as despesas peticionadas, com cada uma das frações supramencionadas.

 

- É uma asserção que granjeia particular relevância no caso em apreço, porquanto, para além dos dois prédios, cujas frações foram objeto de arrendamentos, a Requerente é titular de mais um prédio, também ele constituído em propriedade horizontal.

 

- Ou seja, não é possível conferir, por via dos elementos carreados ao Processo, que os materiais titulados nas faturas presentes nos autos não foram, inclusivamente, utilizados em frações/ou prédio, que não concorreram para os rendimentos da categoria F.

 

- Mais se refira que a denominação do adquirente, titulado nas faturas controvertidas, é “B...CABEÇA CASAL” e “CABEÇA DE CASAL HERANÇA B...–A...”.

 

- É uma particularidade que, naturalmente, força uma análise que, necessariamente, abrange os restantes herdeiros, bem como as frações que pertençam a cada um deles.

  

- O que significa que não é possível dirimir, através dos elementos presentes nos autos, qual a parte dos gastos que foram suportadas diretamente pelo Requerente, porquanto, figurando o cabeça-de-casal como adquirente, não se destrinça a repartição dos custos pelas restantes titulares da herança.

 

- Nem, tão pouco, de que modo foi realizado o emprego dos materiais comprados, em função de cada uma das frações arrendadas.

       

- Diga-se, ainda, que a Requerente refere que, devido à sua relação de confiança com D..., teria sido preterida a elaboração de qualquer orçamento, tendente a parametrizar as obras que seriam realizadas.

 

- Ora, neste ponto, e para os devidos efeitos probatórios, esta afirmação afigura-se, naturalmente, insuficiente, no sentido de demonstrar a conexão dos elementos constantes nas

faturas controvertidas, com as frações constantes da declaração modelo 3 de IRS acima mencionada. 

- Os Serviços da AT limitaram-se a dar cumprimento ao nº 8 do artigo 41º do CIRS: “Os gastos referidos nos números anteriores devem ser documentalmente comprovados.” 

- Ora, tendo presente o ónus da prova que se consubstancia no princípio de que quem alega um determinado facto constitutivo de um direito, tem a necessidade de prová-lo. (cf. art.º 342.º do Código Civil – CC e n.º 1 do art.º 74.º da LGT).  

- Ou seja, a Requerente alega factos que servem de fundamento e que substancialmente configuram a alegada posição jurídica de que se arroga, sem que o prove. 

- Um ónus de prova que impende, necessariamente, sobre a Requerente. A propósito, é mister atender à norma do artigo 74º, nº 1 da LGT.

 

- Sobre a densificação do conceito, melhor escreve o Acórdão do TCAS, no processo nº 08843/15, de 10/22/2015:

 

 “Este dever imposto à A. Fiscal de averiguar a verdade material não dispensa os contribuintes da obrigação de colaborarem na produção de provas, como se prevê no artº.59, da L.G.T. Por outro lado, a previsão desta obrigação da Fazenda Pública de averiguar os factos relevantes para a decisão não significa que ela tenha o ónus da prova desses factos, pois apenas a insuficiência probatória de factos constitutivos dos direitos invocados pela A. Fiscal é valorada processualmente contra ela (artº.74, nº.1, da L.G.T.)”.

 

- Um entendimento sufragado pela doutrina, como melhor escreve, ELISABETE LOURO MARTINS, in O Ónus da Prova em Direito Fiscal, Coimbra Editora, 2010, pg. 80:

 

 “O dever de colaboração, bem como o princípio da boa-fé, justifica que a inércia probatória de uma das partes não possa justificar a aplicação da regra do non liquet. Ou seja, a regra de non liquet que justifica que a dúvida seja valorada a favor do Sujeito Passivo só poderá ser aplicada numa situação em que a dúvida fundada não resulta do facto de uma das partes não ter logrado provar os factos que lhe cabia provar por pura inércia, devendo resultar apenas do facto de das provas produzidas resultar uma dúvida insanável que não permita julgar a causa a favor de qualquer uma das partes”.

 

- O art. 41º do Código do IRS, nº1, refere: “Aos rendimentos brutos referidos no artigo 8.º deduzem-se, relativamente a cada prédio ou parte de prédio, todos os gastos efetivamente suportados e pagos pelo sujeito passivo para obter ou garantir tais rendimentos, com exceção dos gastos de natureza financeira, dos relativos a depreciações e dos relativos a mobiliário, eletrodomésticos e artigos de conforto ou decoração, bem como do adicional ao imposto municipal sobre imóveis.” 

- O nº 2 refere o seguinte: “No caso de fração autónoma de prédio em regime de propriedade horizontal, são dedutíveis, relativamente a cada fração ou parte de fração, outros encargos que, nos termos da lei, o condómino deva obrigatoriamente suportar e que sejam efetivamente pagos pelo sujeito passivo.”

Assim,

 

- É certo que não é legalmente exigível que cada uma das obras realizadas nos imóveis arrendados se encontre orçamentada, mas recai na esfera jurídica dos contribuintes que pretendam deduzir os gastos ao rendimento bruto da categoria F nos termos do disposto no artigo 74º da LGT, o cumprimento do ónus probatório, i.é, que os gastos foram efetivamente suportados/pagos com a intervenção, no caso de melhoramento e construção, no imóvel do qual decorre o rendimento e que a mesma visou garantir essa perceção, sendo que no caso não se conhece, sequer, o que foi concretizado.

 

- O facto da norma do CIRS não elencar os gastos admissíveis, exigindo apenas que os mesmos se mostrem comprovados e a dedução clara do fim visado com a sua assunção atende efetivamente, ao princípio da tributação do rendimento real, consolidando o princípio da justiça no sentido em que apenas deve ser sujeito a tributação o rendimento que efetivamente foi usufruído pelo contribuinte, mas tal não pode traduzir-se na aceitação tout court de toda e qualquer despesa que o arrendatário entenda realizar sem se averiguar, no quadro do principio da igualdade, se o fim foi o legalmente expresso, o caso no artigo 41º, se os comprovativos permitem documentar o nexo com a intervenção geradora do gasto, o que no caso não se pode confirmar.

 

- A determinação do rendimento predial efetivo e real, nos termos e pressupostos definidos nas normas que enquadram esta matéria, deve mostrar-se comprovado de forma inquestionável, não apenas no seu montante e especificações a que respeitem, mas também na sua imputação ao imóvel em questão e no objetivo da sua concretização, por forma a evitar atitudes abusivas e de fraude fiscal e se é certo que, como alega a requerente, é da experiência comum que sejam realizadas obras de cariz simples em inúmeras situações sem necessidade de qualquer orçamentação prévia, é igualmente verdade que os pressupostos legais para a dedutibilidade dos gastos suportados têm que ser comprovados de forma a que o cumprimento das diretrizes seja percecionado de forma clara, o que não se verifica nesta situação como supra foi referido.

Acrescente- se que,

- Aos rendimentos das rendas (prediais - categoria F) brutas deduzem-se, relativamente a cada prédio ou parte de prédio, todos os gastos efetivamente suportados e pagos pelo sujeito passivo para obter ou garantir tais rendimentos, com exceção dos gastos de natureza financeira, dos relativos a depreciações e dos relativos a mobiliário, eletrodomésticos e artigos de conforto ou decoração, bem como do adicional ao imposto municipal sobre imóveis (n.º1 do art.º 41 do CIRS).

 

- São dedutíveis, por exemplo, as despesas de manutenção e de conservação, que incumbam ao sujeito passivo, e por ele sejam suportadas e se encontrem documentalmente provadas, bem como o IMI e o imposto de selo que incide sobre o valor dos prédios ou parte dos prédios cujo rendimento seja objeto de tributação no ano fiscal.

 

- No caso de se tratar de uma fração autónoma de um prédio em regime de propriedade horizontal (como apartamentos), são dedutíveis, relativamente a cada fração ou parte de fração, outros encargos que, nos termos da lei, o condómino deva obrigatoriamente suportar e que sejam efetivamente pagos pelo senhorio (exemplo: as quotas do condomínio, seguro de incêndio).

 

- Podem ainda ser deduzidos gastos suportados e pagos nos 24 meses anteriores ao início do arrendamento relativos a obras de conservação e manutenção do prédio, desde que entretanto o imóvel não tenha sido utilizado para outro fim que não o arrendamento. E ainda outros gastos efetivamente imprescindíveis para obter ou garantir os rendimentos, como é o caso, entre outras, de despesas com mediadores imobiliários, ou com o certificado de desempenho energético. Estas despesas devem ser declaradas no campo 5B do anexo F da declaração de IRS.

 

- A este prepósito refira-se que a Requerente anexou ao pedido arbitral, os documentos nºs. 7,8 e 9, referentes a faturas – recibos emitidos pelo Sr. D... . Nelas pode-se conferir que “Os dados de transmissão de bens ou da prestação de serviços”, ocorreu a 13/12/2017, 19/12/2017 e 22/12/2017.

 

- Ora como já fizemos referência e nos termos da lei (41º/7 do CIRS), é possível deduzir gastos suportados e pagos nos 24 meses anteriores ao início do arrendamento relativos a obras de conservação e manutenção do prédio, desde que, entretanto, o imóvel não tenha sido utilizado para outro fim que não o arrendamento.

 

- Estando em causa o ano fiscal de 2018, e as faturas – recibos terem sido passadas em datas anteriores – Dezembro de 2017 – sempre seria possível a correspondente dedução, desde que a AT tivesse conhecimento de que o imóvel só teve como fim o arrendamento.

 

- A Entidade Requerida não teve conhecimento desse facto, ou seja, se os imóveis aqui em causa tiveram por fim apenas o arrendamento, a fim de deduzir os gastos suportados e pagos nos 24 meses anteriores ao início do arrendamento relativos a obras de conservação e manutenção do prédio.

 

- Por outro lado, todas estas despesas, são dedutíveis, desde que devida e legalmente comprovadas, uma vez que a sua realização mais não corresponde que ao propósito de conservar em perfeitas condições a unidade geradora de rendimentos prediais, o que não se verifica no caso de aquisição.

 

- Não são consideradas despesas dedutíveis, nomeadamente obras de construção que alterem a estrutura do imóvel, compra de mobiliário, instalação de equipamento de ar condicionado e obras de valorização do imóvel (como a instalação de sistema de rega automática num terreno arrendado ou num jardim).

 

- Além do mais, e nos termos do nº 8 do artigo 41º do CIRS: “Os gastos referidos nos números anteriores devem ser documentalmente comprovados.”

- Outra interpretação e aplicação do art.º 41º do Código do IRS, não atende ao facto de, inexistindo um rendimento predial bruto, não é possível determinar um rendimento líquido sujeito a tributação na categoria F do Código de IRS, 

- No caso em apreço, e conforme resulta da decisão vertida no processo de divergências, para a qual se remete e aqui se dá por integralmente reproduzida, não estão em causa apenas natureza das despesas suportadas, mas também a sua quantificação. 

- E a interpretação que a AT sustenta, correctamente, refira-se, é a única, repita-se e reitere-se que invoca os princípios da igualdade e da capacidade contributiva numa óptica de justiça fiscal, inerentes aos princípios basilares que enformam o ordenamento fiscal português, mormente no que concerne aos impostos sobre o rendimento.

- Neste sentido, estabelece-se no artigo 11.º, n.º 1 da LGT que na determinação do sentido das normas fiscais e na qualificação dos factos a que as mesmas se aplicam são observadas as regras e princípios gerais de interpretação e aplicação das leis.

- Determinando-se, para o efeito, no artigo 9.º do Código Civil, que:

«1. A interpretação não deve cingir-se à letra da lei, mas reconstituir a partir dos textos o pensamento legislativo, tendo sobretudo em conta a unidade do sistema jurídico, as circunstâncias em que a lei foi elaborada e as condições específicas do tempo em que é aplicada.

2. Não pode porém, ser considerado pelo intérprete o pensamento legislativo que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso.

3. Na fixação do sentido e alcance da lei, o intérprete presumirá que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados.»

 

- Interpretar uma lei é fixar o seu sentido e o alcance com que ela deve valer, ou seja, determinar os seus sentidos e alcance decisivos.

 

- Se a apreensão literal do texto, é o ponto de partida de toda a interpretação, é no, entanto, incompleta, pois será sempre necessária uma tarefa de interligação e valoração que escapa ao domínio literal.

 

- Nesta tarefa de interligação e valoração que acompanha a apreensão do sentido literal, intervêm elementos lógicos, apontando a doutrina elementos de ordem sistemática, histórica e racional ou teleológica.

 

- Da conjugação de todos estes elementos, parece-nos resultar claro que, de harmonia com o que sucede com as restantes categorias de rendimentos do IRS, as deduções efectuadas são-no na proporção directa dos rendimentos obtidos, estabelecendo-se uma relação causal e directa entre os dois factores.  

- E o modo de assegurar que essa relação existe é através da fixação do elemento temporal pois, de outro modo, seria sempre muito fácil aos sujeitos passivos contornar a situação. 

- Efectivamente, o art.41º do CIRS consagra a expressa dedução do valor de IMI e IS “(…) O imposto municipal sobre imóveis e o imposto do selo, pagos em determinado ano, apenas são dedutíveis quando respeitem a prédio ou parte de prédio cujo rendimento seja objeto de tributação nesse ano fiscal”. estabelecendo a própria norma uma causa directa entre o rendimento e a despesa suportada, na medida em que aquela fonte geradora de rendimento, enquanto o foi, teve a si associado um custo.

 

- As despesas em causa têm de ser necessárias à manutenção e conservação do prédio enquanto fonte produtora de rendimentos e tal tem de ficar indubitavelmente demonstrado. 

-  Em jeito de conclusão, a determinação do rendimento predial efetivo e real, nos termos e pressupostos definidos nas normas que enquadram esta matéria, deve mostrar-se comprovado de forma inquestionável, não apenas no seu montante e especificações a que respeitem, mas também na sua imputação ao imóvel em questão e no objetivo da sua concretização, por forma a evitar atitudes abusivas e de fraude fiscal e se é certo que, como alega a requerente, é da experiência comum que sejam realizadas obras de cariz simples em inúmeras situações sem necessidade de qualquer orçamentação prévia, é igualmente verdade que os pressupostos legais para a dedutibilidade dos gastos suportados têm que ser comprovados de forma a que cumprimento das diretrizes seja percecionado de forma clara, o que não se verifica nesta situação como supra foi referido.  

- Finaliza dizendo que é evidente a conformidade legal do acto tributário objecto do presente pedido arbitral pelo que, deverá ser julgado improcedente o presente pedido de pronúncia arbitral, mantendo-se na ordem jurídica o acto tributário de liquidação e absolvendo-se, em conformidade, a entidade requerida do pedido.

G. – QUESTÕES A DECIDIR

     Face às posições assumidas pelas Partes conforme os argumentos apresentados, são as seguintes questões que cabe apreciar e decidir:

     1 – Questão Principal – Saber se as despesas tituladas por facturas identificadas nos autos, referentes à aquisição de materiais de construção e prestação de serviços de construção, devem ser, ou não, consideradas como deduções a rendimentos prediais, em sede de IRS.

     2 – Juros indemnizatórios – Existência, ou não, do direito a juros indemnizatórios, ao abrigo do art. 43º da LGT, no caso de ser anulada a liquidação e determinado o reembolso da importância peticionada, que teria sido indevidamente paga, e a partir de que momento.

     3 – Responsabilidade pelo pagamento das custas arbitrais.

 

H. – PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS

     1. O Tribunal Arbitral está regularmente constituído e é material competente, de acordo com o disposto na alínea a), do nº 1, do art. 2º do RJAT (Decreto-Lei nº 10/2011, de 20 de Janeiro).

     2. As Partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e encontram-se regularmente representadas, nos termos dos arts. 4º e 10º, nº 2 do RJAT e art. 1º da Portaria nº 112/2011, de 22 de Março.

    3. O processo não enferma de vícios que afectem a sua validade.

I.                    – MATÉRIA DE FACTO

I. 1 – FACTOS PROVADOS

     Com relevância para a apreciação das questões suscitadas, o Tribunal dá como provados os seguintes factos:

 1 - A liquidação adicional do IRS de 2018, no valor de € 5.286,07, sobre que incide o pedido

de pronúncia teve origem na declaração oficiosa com a identificação...,

em    conclusão    do   processo    de   divergências  n.º ... .

2 - Nesta liquidação não foram consideradas as despesas documentadas pelas facturas nºs FT 201800740/000221, FT 201800740/000390, FT 201800740/000670, FT 201800718/019253, FT 201800718/019273 todas da C... S.A. (C...) de aquisição pela Requerente de diversos tipos de materiais e equipamentos de construção, nomeadamente pavimentos, rodapés, chuveiros, torneiras, lava-loiças, entre outros, usados nas obras realizadas nos imóveis sitos na Travessa ... nº..., ...-... Sacavém e na ..., nº..., ...-... Barcarena.

3- Esses materiais foram entregues ao domicílio, sendo descarregados nos respectivos imóveis onde decorreram as obras.

 

4- Dessas  facturas não  resulta o tipo de intervenção realizada nos imóveis sitos em Sacavém e Barcarena, nem  quais os materiais utilizados em cada uma das fracções arrendadas.       

 

5- A denominação do adquirente, titulado nas facturas controvertidas, é “B... Cabeça Casal” e “Cabeça de Casal Herança B...–A...”.

6 - A aquisição do material de construção e prestação de serviços de construção a que se reportam os documentos apresentados pela Requerente não estavam associadas a qualquer obra sustentada em orçamento.

 

7-  A Requerente  foi notificada , em sede de audição prévia, através  da notificação

 Gl-..., de 14/10/2019, registada sob o n.º RH...PT, de que existiam despesas dos prédios

arrendados que não poderiam ser aceites fiscalmente, nomeadamente, para que comprovasse relativamente, aos prédios arrendados, despesas de condomínio e manutenção e conservação. Além do mais existe uma factura de 18/02/2019, no montante de € 18.550,00. Assim, o valor de despesas do quadro 5A seria corrigido de € 21.491,95 para € 7.463,68

 

8-No âmbito de audição prévia, a Requerente veio exercer o seu direito de

 participação, acompanhado de vários documentos, sendo que um deles é o recibo n.º 25/A no valor de € 18.550,00 emitido à herança de que o sujeito passivo com o NIF...

 é o cabeça de casal, e que comprova o pagamento da fatura n.º 2/A, pagamento que ocorreu já em 18/02/2019.

 

9- No âmbito da análise de divergências de IRS do exercício de 2018, entenderam os Serviços, que face à documentação apresentada em audição, os mesmos não reuniam os requisitos para poderem ser consideradas despesas com prédios arrendados, nomeadamente, aquisição de material sem associação de qualquer obra com orçamento e recibos de aquisição de bens:

- Faturas 221, 390, 670, 19253 e 19273 da C...;

- Fatura datada de 18/02/2019 no valor de € 18.550,00, apresentada em sede de audição prévia.

 

10- Por a Requerida ter entendido que os documentos e fundamentos apresentados não trouxeram nada de novo ao projecto de correcção, não tendo conseguido comprovar os elementos declarados, a Requerente foi notificada em 05/12/2019, através do

ofício n.º GI-..., de 02/12/2019, e por despacho do Chefe de SF de 02/12/2019, registado com A/R nº RH...PT com a indicação das facturas não aceites e quais as despesas suportadas que foram consideradas, e que se iria proceder às seguintes correções: ANEXO – F QUADRO

A CAMPO – DESPESAS VALOR declarado – 21.491,95 VALOR DA CORREÇÃO A EFETUAR – 14.028,27   VALOR FINAL - € 7.463,68.

 

11- A Requerente não apresentou a declaração de substituição, tendo a Requerida elaborado o documento de correcção com as rectificações propostas.

 

12- A Requerente foi notificada da decisão definitiva de correcção em 05/12/2019, com o envio do ofício nº GI-..., datado de 02/12/2019, registado sob o n.º RH...PT, com AR.

 

13- A liquidação oficiosa impugnada foi paga em 26/01/2020.

14- Em 6 de Maio de 2020 a Requerente entregou no CAAD o pedido de pronúncia arbitral.

I. 2 – FUNDAMENTAÇÃO DOS FACTOS PROVADOS

     Os factos dados como provados estão baseados nos documentos indicados relativamente a cada um deles, no processo administrativo e nos elementos factuais carreados para o processo pelas Partes, na medida em que a sua adesão à realidade não foi questionada. 

J. – MATÉRIA DE DIREITO

     Fixada a matéria de facto, procede-se, de seguida, à sua subsunção jurídica e à determinação do Direito a aplicar, tendo em conta as questões a decidir que foram enunciadas.

      As orientações arrogadas pela Requerente e pela Requerida quanto e a sua fundamentação estão expostas, em síntese, ou com parcial transcrição, em E. e F. do Relatório desta Decisão.

A Requerente impugnou a liquidação adicional de IRS relativo ao ano de 2018 a que  se alude no ponto 1 da matéria de facto provada.

 

Alega para o efeito não terem sido consideradas despesas documentadas por facturas de aquisição de diversos tipos de materiais e equipamentos de construção e prestação de serviços de construção, como deduções aos  rendimentos prediais constantes do  IRS do ano de 2018.

 

A Requerida justificou essa desconsideração com base nos seguintes fundamentos:

1.   As facturas  n.ºs 221, 390, 670, 19253 e 19273 da C...,  bem como a factura datada de 18/02/2019, no valor de € 18.550,00, apresentada em sede de audição prévia, não estão reportadas a qualquer obra com orçamento, nem permitem identificar quais os materiais utilizados em cada uma das fracções arrendadas;

 

2. Os três recibos anexados pela Requerente ao pedido de pronúncia arbitral, emitidos pelo Sr. D..., reportados  a facturas onde consta que “os dados de transmissão de bens ou da prestação de serviços”, ocorreram  em 13/12/2017, 19/12/2017 e  22/12/2017;

 

3. A denominação do adquirente, titulado nas facturas controvertidas, é “B... Cabeça Casal” e “Cabeça de Casal Herança B...–A...”, não tendo sido alegado qual o montante a imputar a cada um dos herdeiros.

 

Apreciando:

 

O art. 41º do Código do IRS, nº 1, dispõe que  Aos rendimentos brutos referidos no artigo 8.º deduzem-se, relativamente a cada prédio ou parte de prédio, todos os gastos efetivamente suportados e pagos pelo sujeito passivo para obter ou garantir tais rendimentos, com exceção dos gastos de natureza financeira, dos relativos a depreciações e dos relativos a mobiliário, eletrodomésticos e artigos de conforto ou decoração, bem como do adicional ao imposto municipal sobre imóveis.

 

E estabelece o n.º 2   do mesmo artigo que, No caso de fração autónoma de prédio em regime de propriedade horizontal, são dedutíveis, relativamente a cada fração ou parte de fração, outros encargos que, nos termos da lei, o condómino deva obrigatoriamente suportar e que sejam efetivamente pagos pelo sujeito passivo.

 

Isto significa que, para serem consideradas, aquelas facturas deveriam permitir a identificação das concretas fraccões, produtoras do rendimento, em que foram aplicados os materiais referidos nas facturas, designadamente, através do reporte a um orçamento.  

 

Com efeito, a existência de orçamento não é imperativa; apenas permitiria saber em que fracções autónomas foram aplicados os materiais. 

 

Arrolou a Requerente testemunhas, com a finalidade de fazer essa prova.

 

No entanto, nos termos do  nº 8 do artigo 41º do CIRS, Os gastos referidos nos números anteriores devem ser documentalmente comprovados.

 

Foi, aliás, por essa razão que a audiência a que alude o art. 18º RJAT foi dispensada, bem como a audição de testemunhas.

 

Quanto aos três recibos anexados pela Requerente ao pedido de pronúncia arbitral, emitidos pelo Sr. D..., resulta dos mesmos  que os dados de transmissão de bens ou da prestação de serviços”, ocorreram  em 13/12/2017, 19/12/2017 e  22/12/2017.

 

Trata-se, pois, de despesas pagas no ano anterior àquele a que se reporta  a declaração de IRS que motivou a liquidação adicional.

 

De acordo com o art. 41º, nº 7  do CIRS),  podem ainda ser deduzidos gastos suportados e pagos nos 24 meses anteriores ao início do arrendamento relativos a obras de conservação e manutenção do prédio, desde que entretanto o imóvel não tenha sido utilizado para outro fim que não o arrendamento.

 

Não tendo sequer sido alegado que o imóvel foi unicamente utilizado para a finalidade de arrendamento, este normativo impede a dedução das despesas a que se reportam aquelas facturas.

 

Acresce que, encontrando-se as facturas emitidas em nome de uma herança, não foi alegada qual a quota de cada herdeiro.

 

De acordo com o  n.º 1 do art.º 74.º da LGT, incumbia à Requerente o ónus de provar os factos alegados como fundamento da sua pretensão, o  que não logrou fazer, uma vez que, por  força da lei, apenas é admitida a prova documental.

 

Por essa razão, improcede a impugnação da liquidação oficiosa.

L. – DECISÃO

     Atento o exposto, o presente Tribunal Arbitral decide:

     a) Julgar improcedente o pedido de declaração de ilegalidade da liquidação de IRS nº 2019... respeitante ao ano de 2018, no valor de 5.286,07 euros.

    b) Condenar a Requerente a pagar as custas do presente processo (art. 527º, nºs. 1 e 2 do Código do Processo Civil, ex vi art. 29º, nº 1, alínea e) do RJAT).

     Valor do processo: Em conformidade com o disposto nos artigos 306º, nº 2 do CPC (ex. 315º, nº 2) e 97º - A, nº 1 do CPPT e no artigo 3º, nº 2 do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária fixa-se ao processo o valor de 5,286,07 euros.

     Custas: De harmonia com o nº 4 do art. 22º do RJAT, fixa-se o montante das custas em 612,00 euros, nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária.

 

Notifique-se.

Lisboa, 15 de Janeiro de 2021

 

O Árbitro

José Nunes Barata

 

(Redacção pela ortografia antiga)