Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 50/2012 T
Data da decisão: 2012-07-12  IRC  
Valor do pedido: € 13.381,08
Tema: Meio processual adequado
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PROCESSO N.º 50/2012                      

DECISÃO ARBITRAL

 

RELATÓRIO

  • PARTES

…, constituída em 1992, em …, …, …, atualmente com direção efetiva em …, …, …, com número de contribuinte especial de entidade não residente …, doravante designada de Requerente,

E a

Autoridade Tributária e Aduaneira (que sucedeu à Direcção-Geral dos Impostos) doravante designada por Requerida. À data da verificação dos factos, a entidade competente para a emissão da referida nota de liquidação assumia a designação de “Direção – Geral dos Impostos”.

O Decreto-Lei n.º 118/2011, de 15 de Dezembro, procedeu à aprovação da nova estrutura orgânica da Autoridade Tributária e Aduaneira, entidade que resultou da fusão da DGCI, da Direcção-Geral das Alfândegas e dos Impostos Especiais sobre o Consumo (“DGAIEC”) e da Direcção-Geral e Informática e Apoio aos Serviços Tributários e Aduaneiros (“DGITA”), com efeitos a 1 de Janeiro de 2012.

 

  • PEDIDO:
  1. A ora Requerente, pretende a declaração de ilegalidade do ato tributário de retenção na fonte praticado em 20 de Junho de 2008, com a anulação parcial do ato de retenção na fonte, e a condenação da Requerida no reembolso da quantia de 13.381,08€.
  • CAUSA DE PEDIR
  1. A fundamentar o pedido de pronúncia arbitral o Requerente alegou, em resumo, o seguinte:
  2. A Requerente é uma sociedade comercial, constituída em 1992 no …, …, tendo por objeto social a prossecução da atividade cometida as sociedades de investimento abertas.
  3. A Requerente entende que por força da Convenção celebrada entre a República Portuguesa e os Estados Unidos da América para Evitar a Dupla Tributação e Prevenir a Evasão Fiscal em Matéria de Impostos Sobre o Rendimento e o Património (aprovada para ratificação pela Resolução da Assembleia da Republica n.º 39/95 e retificada pelo Decreto do Presidente da Republica n.º73/95, de 12 de Outubro (doravante designada como Convenção), para efeitos de tributação em sede de IRC, a mesma é uma sociedade de investimento regulamentada, estando sujeita a imposto nos EUA, e não sendo considerada entidade transparente para efeitos fiscais.
  4. No ano de 2008 a Requerente era titular de uma participação no capital social da …, correspondente a 535.243 ações.
  5. A …, à data era um sujeito passivo com sede e direção efetiva em Portugal.
  6. Em Maio de 2008, o …, colocou à disposição da Requerida a título de lucros distribuídos pela …, o montante de 267.621,50€.
  7. Como resultado da operação realizada o …, procedeu a retenção da fonte a título definitivo no valor de 53.524,30€, com a aplicação de uma taxa de 20% conforme o artigo 80º do CIRC, sobre o valor de 267.621,50€,
  8. A Requerente entende que por força da Convenção, a qual se lhe aplicaria, a taxa a aplicar seria de 15%, sobre os dividendos (267.621,50€), conforme o art.º 10º n.º2 da referida Convenção.
  9. Logo, a retenção na fonte deveria ser efetuada através da aplicação de uma taxa de 15%, perfazendo o valor de 40.143,22€, e não o valor efetivamente retido de 53.524,30€, ambos a título definitivo, perfazendo uma diferença de 13.381,08€
  10. A Requerente apresentou posteriormente em 24 de Abril de 2009, ao abrigo do art.º 90º-A n.º7 do Código do Imposto sobre o Rendimentos das Pessoas Coletivas (CIRC), um pedido de reembolso parcial do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas, a título de retenção da fonte sobre os dividendos distribuídos, no montante de 13.381,08€, através do formulário de Modelo Oficial 22-RFI, devidamente certificado pelas Autoridades Fiscais dos EUA.
  11. A Requerente alega que a Administração Tributária não tomou qualquer posição quanto ao pedido de reembolso formulado, pelo que nunca foi notificada de qualquer decisão ou projeto de decisão nessa sede.
  12. A Requerente apresentou posteriormente um pedido de promoção da revisão oficiosa do ato de retenção na fonte, nos termos do art.º 78º, n.º 1 da Lei Geral Tributária (LGT), junto da Direção - Geral dos Impostos, sendo o mesmo recebido no dia … de … de 2011.
  13. A Requerente foi notificada do projeto de despacho de indeferimento do pedido de promoção de revisão oficiosa, no qual nos termos do art.º 60º da LGT, exerceu o seu direito de audição.
  14. Em … de … de 2011, foi emitido Ofício n.º … da Direção de Finanças de …, proferido pelo respetivo Diretor de Serviços, que indeferiu o pedido para promoção da revisão oficiosa do ato de retenção na fonte.
  15. A Requerente alega no seu pedido a ilegalidade do ato de retenção na fonte, com fundamento em erro imputável aos serviços.
  16. A Requerente fundamenta a sua posição, referindo que a Convenção se lhe aplica, uma vez que preenche os requisitos enunciados na Convenção, respectivamente, que a entidade em causa tenha residência fiscalmente relevante no respectivo estado contratante, e que a mesma se qualifique como pessoa aí sujeita a imposto, bem como preenche os conceitos de pessoa e sociedade, cfr. art.º 3 da Convenção.
  17. Resulta na opinião da Requerente que a Circular n.º 6/2009, da Direção de Serviços das Relações Internacionais, sancionada pelo Senhor Diretor-geral dos Impostos, a qual estabelece que para a aplicação da Convenção, e em especial, da taxa de 15%, deve obrigatoriamente ser apresentada uma “declaração emitida pelas autoridades fiscais do Estado com o qual Portugal tenha celebrado CDT que confirme especificamente que o “fundo” cumpre o requisito referido na alínea ii) do ponto anterior”.
  18. A referida Circular, no entender da Requerente, criou uma obrigação condicional de imposto, a qual não possui força vinculativa, fundamentando que as circulares administrativas não são fonte de direito fiscal.
  19. A Requerente não apresentou nenhuma declaração nos termos da circular no momento anterior ao ato de retenção na fonte praticado pelo ….
  20. O Requerente entende que cumpriu os pressupostos de aplicabilidade da convenção, quer em momento anterior ao ato de retenção de fonte, quer em momento posterior através do pedido de reembolso, mediante a entrega do formulário modelo 22-RFI.
  21. A Requerente refere ainda, que só a partir de 2012, as autoridades tributárias de Portugal e EUA, chegaram ao consenso de adotar determinados meio probatórios, para efeito de demonstração do preenchimento dos requisitos da Convenção, através do despacho de … de … de 2012, proferido pelo Senhor Diretor-geral da Autoridade Tributária e Aduaneira, no âmbito do processo n.º …, mediante a “apresentação do formulário português (modelos 21-RFI a 24-RFI), devidamente certificado pelas Autoridades Fiscais Norte Americanas, ao qual devera ser adicionado o formulário americano 6166, como prova de que a RIC ou o fundo de pensões esta sujeito a imposto nos estados Unidos da América.”. Ou por declaração equivalente.

D- DA RESPOSTA DA REQUERIDA

  1. A Requerida, devidamente notificada para o efeito, apresentou tempestivamente a sua resposta na qual, em síntese, alegou o seguinte:
  2. Em … de … de 2008, foi praticado um ato de retenção na fonte, que incidiu sobre dividendos colocados à disposição da Requerente pela …. Pelo que a formulada pretensão decorre da consideração de que o ato indicado como objeto não respeita a Convenção, consequentemente é desconforme com a lei.
  3. A Requerida, entende que o referido ato foi corretamente executado, e não enferma de nenhuma ilegalidade, erro ou vício por parte da Administração Fiscal e do Substituto Tributário, e que existindo erro, o mesmo é da parte da Requerente que não juntou nenhum documento, antes do ato, a comprovar o preenchimento dos requisitos da convenção.
  4. Em … de … de 2009, recebeu um pedido de recuperação de parte do imposto retido a título de retenção na fonte sobre o pagamento dos referidos dividendos, apresentado pelo …, em representação do cliente “…”, ao qual foi junto o formulário modelo 22-RFI.
  5. A Requerida refere que decidiu sobre o referido pedido, através do Oficio n.º … de … de … de 2010.
  6. Em … de … de 2011, deu entrada um pedido de revisão oficiosa do ato de retenção na fonte sobre os dividendos distribuídos em … de … de 2008 pela sociedade ….
  7. O pedido de revisão oficiosa foi indeferido por despacho do Diretor dos Serviços das Relações Internacionais de …-…-2011. O fundamento dessa decisão conforme o ofício n.º … de …-…-2011, foi em síntese o seguinte:

A revisão oficiosa a pedido do sujeito passivo apenas pode ser efetuada desde que seja pedido por este no prazo de reclamação administrativa e com fundamento em qualquer ilegalidade (…), o pedido foi formulado para além do prazo de reclamação graciosa e mesmo do procedimento especial previsto no art.º. 98 do Código do IRC, já que este era apenas de 2 anos a contar da data em que foi efetuada a retenção na fonte, conforme o determinado no art.º 132 do CPPT. Idêntico prazo encontra-se previsto para o pedido de reembolso no caso de ter sido aplicada uma taxa superior à revista numa convenção celebrada por Portugal para evitar a dupla tributação, conforme consta do n.º 7 do artigo 98 do Código do IRC.”.

  1. A Requerida invoca que o presente ato no qual resultou a retenção na fonte cuja revisão oficiosa é solicitada pelo Requerente, resultou da normal aplicação das regras de liquidação de tributação de dividendos distribuídos ou postos à disposição da entidade não residente por sociedades residentes em territórios português.
  2. A Requerida entende que não existe nenhuma ilegalidade, erro ou vício no momento em que é praticado o ato de retenção na fonte, sendo que qualquer erro seria imputável ao … como substituto tributário da liquidação do imposto a reter e o cumprimento das obrigações acessórias conexas com a retenção em causa, conforme o art.º 20 da LGT.
  3. A Requerida invoca expressamente que, existiu erro por parte da Requerente no momento do ato da retenção na fonte, por esta não ter apresentado prova devida, designadamente o Modelo 22-RFI.
  4. Pelo que não existindo qualquer erro susceptível de ser imputável à Administração, não estariam preenchidos os pressupostos do art.º 78 n.º 1 da LGT para proceder a revisão oficiosa da liquidação.
  5. A Requerida invoca ainda que no pedido de revisão oficiosa não foi solicitado à administração fiscal que procedesse à revisão oficiosa com fundamento imputável aos serviços, nem foi invocado tal fundamento.
  6. De facto a Requerente apenas juntou no requerimento de revisão oficiosa a documentação que comprova que estavam reunidos os pressupostos previstos no art.º 10º n.º2 da Convenção, sendo que o respetivo comprovativo deveria ter sido apresentado em momento anterior ao ato de retenção na fonte ou até dois anos após o ato a que se reporta.
  7. A Requerida justifica-se, invocando que da apresentação do modelo 22-RFI no requerimento de revisão oficiosa não resulta qualquer clarificação sobre qualquer eventual ilegalidade e erro do ato de retenção na fonte.
  8. A Requerida invoca ainda a incorreta aplicação no presente caso da Circular n.º 6/2009, uma vez que a mesma reporta-se ao ano de 2009, e o ato em causa foi praticado em 2008.
  9. Pelo que o ato de retenção na fonte foi realizado de forma legal, e sem nenhum erro por parte da Administração Fiscal, pelo que a Requerida pede a improcedência do presente pedido de pronúncia arbitral.

 

  • QUESTÕES DECIDENDAS
  1. Cumpre, pois, apreciar e decidir.
  2. Atenta as posições das partes assumidas nos argumentos apresentados, constituem questões centrais dirimendas as seguintes:
  1. A suscitada pela Requerida, dentro do princípio do dispositivo, que alegou a exceção dilatória da incompetência material do Tribunal Arbitral;
  2. A alegada pela Requerente, de ilegalidade do ato de retenção na fonte praticado no dia … de … de 2008, relativo a distribuição de dividendos, pedindo a restituição do tributo indevidamente liquidado e pago, no valor de 13.381,08€.

E- MATÉRIA DE FACTO RELEVANTE PARA APRECIAR AS ECEPÇÕES

  1. Considera-se a seguinte matéria de facto relevante para apreciar as exceções:
    1.  Em … de … de 2008, a …. distribuiu à Requerente dividendos no montante de € 267.621,50;
    2. Na mesma data, o …, na qualidade de substituto tributário, procedeu à retenção na fonte de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (IRC) no valor € 53.524,30, que incidiu sobre os dividendos colocados à disposição da ora Requerente, pela ….;
    3. Em … de … de 2009, a Requerente apresentou um pedido de recuperação parcial do imposto retido sobre o pagamento de dividendos relativamente à Requerente, juntando ao requerimento o formulário Modelo 22-RFI, designado por “pedido de reembolso do imposto português sobre dividendos de ações e juros de valores mobiliários representativos de divida, efetuado ao abrigo de convenção para evitar a dupla tributação entre Portugal e” EUA;
    4. Em … de … de 2011, a Requerente apresentou à administração tributária um pedido de revisão oficiosa do «ato de retenção na fonte sobre os dividendos distribuídos em … de … de 2008 pela sociedade …, com referência às ações detidas à data pelo …, nos termos do n.º 1 do artigo 78º da Lei Geral Tributária (LGT);
    5. Sobre o pedido de revisão oficiosa a requerente foi notificada do projeto de despacho de indeferimento do pedido de promoção da revisão oficiosa, n.º …, e em … de … de 2011, foi emitido Oficio n.º … da Direção de Finanças de …, proferido pelo Diretor de Serviços, que indeferiu o pedido para promoção da revisão oficiosa do ato de retenção na fonte.

F-DAS EXCEÇÕES

  1. Sustenta a Requerida a questão da incompetência material do tribunal arbitral para julgar sobre o pedido de pronúncia arbitral argumentando:
    1. O pedido da Requerente dirige-se única e exclusivamente à declaração de ilegalidade do ato de retenção na fonte, e à sua anulação parcial, todavia é suscitado pela Requerida a legalidade do ato de indeferimento do pedido de revisão oficiosa, e a legalidade do ato de reembolso.
    2. Mais diz a Requerida que a Requerente, de acordo com os documentos por esta juntos e os fundamentos do pedido de pronúncia arbitral, a mesma invoca uma eventual intenção de impugnação do ato de reembolso de IRC e do ato de indeferimento do pedido de revisão oficiosa.
    3. O ato de indeferimento do pedido de revisão oficiosa, no entender da Requerida, trata-se de um ato administrativo em matéria tribuária, que não aprecia a legalidade do ato de liquidação, pelo que apenas é sindicável através de Ação administrativa especial, sendo que o mesmo não está abrangido pela competência dos tribunais arbitrais.
    4. E sendo a decisão, expressa ou tácita, de indeferimento do pedido de reembolso apresentado à administração um ato administrativo em matéria tributária que não comporta a apreciação do ato de liquidação, ela apenas é sindicável através de Ação administrativa especial, pelo que está afastada no âmbito das matérias suscetíveis de apreciação em sede arbitral, à face dos arts.º 97.º, n.º 1, alínea p), e n.º 2, do Código de Procedimento e Processo Tributário (CPPT) e artigo 2º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, na redação introduzida pelo artigo 160º da Lei n.º 64-B/2011, de 30 de Dezembro.
  2. É suscitada a incompetência material do tribunal arbitral para decidir, por parte do Requerido, sendo as questões de determinação da competência dos tribunais de conhecimento prioritário e de conhecimento oficioso, art.º 13º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA) e art.º 495º do Código de Processo Civil (CPC) por aplicação subsidiária do art.º 29º do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (RJAT), importa face ao exposto apreciar a presente exceção dilatória.
  3. Constitui uma exceção dilatória, a incompetência, quer absoluta, quer relativa, do tribunal arbitral quanto a capacidade material de apreciação dos atos objeto da pretensão arbitral, art.º 494.º do CPC e art.º 2.º do RJAT.
  4. A competência dos tribunais arbitrais, é limitada às matérias indicadas no art.º 2.º, n.º1, do RJAT, e pela vinculação da Administração Tributaria à Portaria n.º 112-A/2011, de 22 Março, se dela não estiver abrangida pela vinculação a mesma encontra-se afastada das competências do presente tribunal arbitral e consequentemente não pode ser jurisdicionalmente decido.
  5. Perante a fundamentação exposta pela Requerente e da resposta da Requerida, são suscitados três atos do qual se pretende a apreciação da legalidade quer de forma direta ou indiretamente. Promove-se, assim, oficiosamente a questão de determinar em concreto, se perante os três atos suscitados, o presente Tribunal Arbitral possui competência para apreciar e decidir sobre os mesmos.
  6. O primeiro ato, do qual resulta a causa de pedir supra definida, é o ato de retenção na fonte, praticado em … de … de 2008, que embora esteja abrangido nas competências dos tribunais arbitrais, em especial o art.º 2.º n.º1 al. a) do RJAT, está fora do âmbito da vinculação da Administração Tributária à jurisdição dos tribunais arbitrais, de acordo com a alínea a) do art. 2.º da Portaria n.º 112-A/2011 pretensões relativas à declaração de ilegalidade de atos de autoliquidação, de retenção na fonte e de pagamento por conta que não tenham sido precedidos de recurso à via administrativa nos termos dos artigos 131.º a 133.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário”.
  7. A referência expressa no artigo 2.º alínea a) da Portaria n.º 112-A/2011 ao “recurso à via administrativa nos termos dos artigos 131.º a 133.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário”, deve ser interpretada como reportando-se aos casos em que tal recurso é obrigatório, através da reclamação graciosa.
  8. Contudo, a Portaria n.º 112-A/2011, prevê para o afastamento do recurso via administrativa prévia obrigatória para a impugnação arbitral quando o seu fundamento for exclusivamente matéria de direito e a autoliquidação tiver sido efetuada de acordo com orientações genéricas emitidas pela administração tributária” (art. 131.º, n.º 3, do CPPT, aplicável aos casos de retenção na fonte, por força do disposto no n.º 6 do art. 132.º do mesmo Código).
  9. A conjuntura em apreço não se enquadra nessa situação. Sendo que a Requerente não alega que a Administração Tributária tivesse emitido orientações no sentido de a retenção ter sido efetuada nos termos em que foi, pelo que conclui-se que a impugnação do ato de retenção na fonte estava dependente de prévia reclamação graciosa.
  10. Não tendo existido prévia reclamação graciosa, a pretensão da Requerida de declaração direta da ilegalidade do ato de retenção na fonte está afastada da competência dos Tribunais Arbitrais, e consequentemente do presente tribunal arbitral por força da conjunção legal dos art.º 2.º n.º1 al. a) do RJAT, art. 2.º alínea a) da Portaria n.º 112-A/2011, e artigos 131.º a 133.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, por a Administração Tributária ter expressamente excluído tais pretensões do âmbito da sua vinculação à jurisdição dos tribunais arbitrais.
  11. Nestes termos e nos demais de direito, declara-se procedente a exceção da incompetência no que concerne à pretensão de impugnação direta do ato de retenção na fonte.
  12. O presente tribunal tem de igualmente apreciar a questão da competência quanto ao ato de pedido de reembolso parcial do IRC, realizado em … de … de 2009, ao abrigo do art.º 90.º-A n.º7 do CIRC, a título de retenção da fonte sobre os dividendos distribuídos, no montante de 13.381,08€, através do formulário de Modelo Oficial 22-RFI, devidamente certificado pelas Autoridades Fiscais dos EUA.
  13. O ato de reembolso parcial do IRC a título de retenção na fonte sobre os dividendos distribuídos, pressupõe a existência de um ato prévio de retenção na fonte. Contudo, o ato de reembolso não aprecia a legalidade do ato de retenção na fonte e é sobre o ato retenção na fonte que a Requerente diz existir um erro imputável a Requerida, que o torna ilegal.
  14. Mais se diz que o ato de reembolso suscitado, não se encontra abrangido pelas competências do tribunal Arbitral. O mesmo encontra-se fora do âmbito da vinculação da Administração Tributária à jurisdição dos tribunais arbitrais, de acordo com a alínea a) do art. 2.º da Portaria n.º 112-A/2011 pretensões relativas à declaração de ilegalidade de atos de autoliquidação, de retenção na fonte e de pagamento por conta que não tenham sido precedidos de recurso à via administrativa nos termos dos artigos 131.º a 133.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário”. A referência expressa no art. 2.º alínea a) da Portaria n.º 112-A/2011 ao “recurso à via administrativa nos termos dos artigos 131.º a 133.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário”, deve ser interpretada como reportando-se aos casos em que tal recurso é obrigatório, através da reclamação graciosa.
  15. Assim, o presente Tribunal Arbitral não se pode pronunciar e decidir sobre o referido ato, porque está afastado da competência dos Tribunais Arbitrais, e consequentemente do presente tribunal arbitral por força da conjunção legal dos art.º 2.º n.º1 al. a) do RJAT, art. 2.º alínea a) da Portaria n.º 112-A/2011, e artigos 131.º a 133.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, por a Administração Tributária ter expressamente excluído tais pretensões do âmbito da sua vinculação à jurisdição dos tribunais arbitrais.
  16. Nestes termos e nos demais de direito, declara-se procedente a exceção da incompetência no que concerne à pretensão de impugnação do ato de pedido de reembolso parcial do IRC.
  17. O terceiro ato suscitado pela Requerente, consiste na ilegalidade do indeferimento do pedido para promoção da revisão oficiosa do ato de retenção na fonte, através do Oficio n.º … da Direção de Finanças de …, proferido pelo Diretor de Serviços, em … de … de 2011. Pedido esse efetuado pela Requerente para a promoção da revisão oficiosa do ato de retenção na fonte, termos do art. 78.º, n.º 1 da LGT, junto da Direção - Geral dos Impostos, onde alega a ilegalidade do ato de retenção na fonte, com fundamento em erro imputável aos serviços.
  18. A questão que se coloca para se poder decidir sobre a competência do presente tribunal arbitral, consiste em determinar se a declaração de ilegalidade de atos de retenção na fonte, através da declaração de ilegalidade de atos de indeferimento de pedido de revisão oficiosa, se inclui nas competências do art.º 2 do RJAT, e caso esteja abrangido, se é exigível à reclamação graciosa prévia, nos termos do art.º art. 2.º alínea a) da Portaria n.º 112-A/2011.
  19. O ato de revisão oficiosa consiste num ato administrativo em matéria tributária, que no presente caso teve a iniciativa do sujeito passivo nos termos do art.º 78.º, n.º 1 da LGT. A revisão oficiosa, consiste num reconhecimento do dever da Administração Tributária, de revogar atos ilegais, e de corrigir oficiosamente todos os erros das liquidações que tenham conduzido à arrecadação ilegal de um tributo, conforme estabelecem os princípios da justiça, igualdade e legalidade, art.º 266.º, n.º2 da CRP e art.º 55.º da LGT.
  20. A apreciação de pretensões de declaração de ilegalidade de atos de indeferimento do pedido de revisão oficiosa não está expressamente abrangido nas competências dos tribunais arbitrais, respectivamente art.º 2.º do RJAT, ao contrário do que advém da autorização legislativa que se baseou para aprovar o RJAT, que refere embora de forma generalista os “pedidos de revisão de atos tributários” e “os atos administrativos que comportem a apreciação da legalidade de atos de liquidação”.
  21. Para que o tribunal arbitral possa apreciar a questão, é necessário de acordo com a Portaria n.º 112-A/2011, exista recurso prévio pela via administrativa, da impugnação de um ato.
  22. Conforme descreve o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo proferido no processo n.º 402/06, o ato de revisão oficiosa deve ser equiparado a uma reclamação graciosa, nos casos em que é efetuado o pedido de revisão oficiosa no prazo da reclamação administrativa, e o mesmo deve decidir sobre a legalidade do ato de retenção na fonte. Neste mesmo sentido vai o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 12-6-2012, proferido no processo n.º402/2006.
  23. Perante o exposto não é obrigatória que haja uma reclamação graciosa para a apreciação da declaração de ilegalidade de atos de retenção na fonte, quando exista um ato de revisão oficiosa, que aprecie a legalidade do ato de liquidação, que de acordo com a jurisprudência deve ser equiparado.
  24. Todavia, a Requerente alega que o ato de indeferimento da revisão oficiosa não aprecia a legalidade do ato de retenção na fonte, pelo que estaria afastado da competência dos tribunais arbitrais.
  25. O art.º 2.º do RJAT, apenas abrange os atos que apreciem a declaração de ilegalidade de retenção na fonte. Sendo que o art.º 97.º n.º1 alínea d) e p) e n.º2 do CPPT, prevê a regra geral de que a impugnação de atos administrativos em matéria tributária deve ser feita, no processo judicial tributário, através de impugnação judicial ou Ação administrativa, conforme esses atos comportem ou não comportem a apreciação da legalidade de atos administrativos de liquidação.
  26. O processo arbitral apenas abrange atos susceptíveis de impugnação judicial, (abrangidos pelo artigo 2.º nº 1 e nº 2 do RJAT), neste sentido refere o preâmbulo do DL n.º 10/2011, de 20 de Janeiro com as alterações introduzidas pela Lei n.º 64-B/2011, de 30 de Dezembro, “A introdução no ordenamento jurídico português da arbitragem em matéria tributária, como forma alternativa de resolução jurisdicional de conflitos no domínio fiscal”, bem como a autorização legislativa que se baseou para aprovar o RJMAT, concedida pelo art.º124.º da Lei n.º3-B/2010, de 28 de Abril. O RJMAT visa introduzir um método alternativo ao procedimento judicial em matéria fiscal. O art.º 10º do mesmo diploma remete para o art.º 102.º n.º1 e 2 do CPPT, onde se indicam os vários tipos de atos que dão origem ao prazo de impugnação judicial.
  27. Quando o ato de indeferimento do pedido de revisão oficiosa, quando não decide sobre a ilegalidade do ato de retenção na fonte, o meio que o contribuinte possui para se defender é expressamente a Acão administrativa, conforme estabelece o art.º 97.º n.º1 alínea d) e p) e n.º2 do CPPT. Pelo que não poderá recorrer a impugnação judicial, e consequentemente a impugnação arbitral. Apenas se inserem nas competências dos tribunais arbitrários, os pedidos de declaração de ilegalidade de atos de indeferimento de pedidos de revisão oficiosa de atos de retenção na fonte que comportem a apreciação da legalidade dos mesmos.
  28. Nesse sentido, o acórdão do processo n.º 01259/03 do Supremo Tribunal Administrativo de 04-02-2004, que refere que “O meio processual adequado para atacar o ato administrativo que não aprecie o pedido de revisão do ato tributário da liquidação, por entender que o mesmo é intempestivo, é o recurso contencioso e não a impugnação, uma vez que estamos perante ato que não aprecia a legalidade do ato de liquidação”. No mesmo sentido, cfr. o acórdão do Supremo Tribunal de 28/04/2010, processo n.º 01020/09.
  29. Perante o exposto, cabe determinar se o ato de indeferimento do pedido de revisão oficiosa apreciou a legalidade do ato de retenção na fonte.
  30. Alega a Requerida que a fundamentação do indeferimento do pedido de revisão se baseou na inadmissibilidade da revisão oficiosa, por não estarem reunidos os requisitos da primeira e segunda parte do n.º1 e do n.º 4 do art.º 78.º, nomeadamente por a mesma ser intempestiva e não se verificarem os requisitos processuais, respectivamente, de existência de erro imputável aos serviços, não tendo apreciado a legalidade do ato de retenção na fonte, sendo a mesma apenas sindicável através de Acão administrativa especial. Neste sentido os acórdãos do STA, de 20-05-2003, processo 638/03, de 08-10-2003, processo n.º 870/03, de 15-10-2003, processo n.º 1021/03, de 34-03-2004, processo n.º 1588/03, de 6-11-2008, processo n.º 357/08, decidiram que o meio processual adequado para conhecer da legalidade do ato de decisão de revisão oficiosa no qual não foi apreciada a legalidade do ato de liquidação, é a Ação administrativa especial.
  31. A Requerida termina no Parecer n.º…, com a seguinte proposta de decisão: Nestes termos, afigura-se-nos ser de indeferir o presente pedido de revisão oficiosa da liquidação de IRC relativo à retenção na fonte efetuada sobre os dividendos distribuídos em … de … de 2008, pela empresa portuguesa …, por falta de suporte legal conforme as conclusões do presente parecer.”.
  32. Porém, no caso em apreço, o Ofício …, que indeferiu expressamente o pedido de revisão oficiosa, por intempestividade, decidiu ainda complementarmente sobre a legalidade do ato de retenção na fonte, apreciando quanto à existência ou não de erro imputável aos serviços, concluindo que  “não existindo, por isso, qualquer erro que possa ser imputável aos serviços. Se existiu erro no momento em que se processou a retenção na fonte, o mesmo ficou a dever-se à falta de prova apresentada pela Requerente
  33. Estamos, assim, perante um ato administrativo que comporta a apreciação da legalidade de um ato de retenção na fonte, no qual o procedimento judicial tributário adequado é o processo de impugnação judicial e consequentemente conforme já referido, este ato está abrangido pelas competências do tribunal arbitral.
  34. Perante o exposto, conclui-se que o presente Tribunal Arbitral é competente para decidir sobre a legalidade do ato tributário de retenção na fonte, de 20 de Maio de 2008, uma vez que houve recurso prévio à via administrativa, entendo que o pedido de revisão oficiosa produz o mesmo efeito que a reclamação graciosa, estando assim preenchidos os requisitos da Portaria n.º 112-A/2011. Pelo que o presente tribunal arbitral é competente em razão na matéria nos termos do art.º 2.°, n.º 1, alínea a) do RJAT, para decidir sobre a legalidade do ato de indeferimento da revisão oficiosa que apreciou a legalidade do ato de retenção na fonte.
  35. Os pedidos de revisão de atos tributários pela entidade que os praticou pode ser efetuada por iniciativa do sujeito no prazo da reclamação administrativa por fundamento em qualquer ilegalidade, parte inicial do n.º 1 do art. 78.º da LGT, que no caso em apreço, é dois anos a contar da data do ato de retenção na fonte.
  36. No caso em apreço no presente auto, é manifesto que o pedido de revisão oficiosa, apresentado relativamente a um ato de retenção na fonte praticado em … de … de 2008 foi formulado muito para além do prazo da reclamação administrativa, quer se considere que o prazo é o de dois anos, previsto no art. 132.º, n.ºs 3 e 4, do CPPT, quer se entenda aplicável o prazo de 15 dias, previsto no art. 162.º do Código do Procedimento Administrativo.
  37. Todavia existem, no art.º 78 da LGT exceções a esse prazo. O pedido de revisão pode ser apresentado fora do prazo de reclamação administrativa, quando se trate de uma revisão oficiosa de atos de liquidação com fundamento em erro imputável aos serviços.
  38. A Requerida decidiu no referido Oficio que não existe erro imputável aos serviços, pelo que o prazo excecional de quatro anos previsto na 2º parte do n.º 1 LGT, não se aplica.
  39. Nestes termos, incumbe demonstrar a Requerente que existiu um erro imputável à Requerida no ato de retenção na fonte, para que se lhe possa aplicar o prazo de quatros anos supra referido.
  40. Neste sentido a Requerente não provou que tivesse apresentado até a data  de … de … de 2008, data em que efetuou a retenção, qualquer documento comprovativo de que se verificassem os pressupostos de aplicação do regime previsto no art.º 10 da Convenção.
  41. Documento que era imposto à data pelos artigos 88.º, n.º 1, alínea c), e 90.º-A do CIRC, na redação vigente em … de … 2008, designadamente por não se verificar a situação prevista no n.º 2 e sua alínea a) deste último artigo ou qualquer outra situação de dispensa parcial de retenção na fonte.
  42. A dispensa parcial de retenção na fonte dependia, conforme o art. 90.º-A, n.º 2 e alínea a), do CIRC da “prova perante a entidade que se encontra obrigada a efetuar a retenção na fonte, até ao termo do prazo estabelecido para a entrega do imposto que deveria ter sido deduzido nos termos das normas legais aplicáveis” “da verificação dos pressupostos que resultem de convenção destinada a eliminar a dupla tributação ou de um outro acordo de direito internacional ou ainda da legislação interna aplicável, através da apresentação de formulário de modelo a aprovar por despacho do Ministro das Finanças certificado pelas autoridades competentes do respetivo Estado de residência”.
  43. Desta forma, não se demonstrou que, a Requerente apresentou o necessário formulário até à data da retenção na fonte do imposto.
  44. Conclui-se, assim, que não se demonstrou que o ato de retenção na fonte enfermasse de qualquer erro de facto ou de direito imputável aos serviços da Requerida, por isso, não se verifica uma situação em que fosse permitido à Administração Tributária proceder à revisão oficiosa do ato de retenção na fonte, por a iniciativa da promoção da revisão oficiosa por parte do sujeito passivo ter sido intempestiva face ao artigo 78º da LGT. Deve assim manter-se a decisão tomada pela Autoridade Tributária e Aduaneira.

G - PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS

  1. O presente tribunal encontra-se regularmente constituído, nos termos dos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), 5.º n.º 2.ºalínea a), 6.º n.º 1, 10.º n.º 1.ºalínea a) e n.º 2.ºdo RJAT.
  2. As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e encontram-se legalmente representadas (art.º 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e art.º 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março).

H- DECISÃO:

Destarte, atento a todo o exposto, o presente Tribunal Arbitral:

  1. Julga procedente a exceção dilatória de incompetência material quanto à pretensão de impugnação direta do ato de retenção na fonte objeto do pedido e considera prejudicado o conhecimento da questão da intempestividade quanto à impugnação direta desse ato, absolvendo da instância a Autoridade Tributária e Aduaneira quanto a tal pretensão.
  2. Julga improcedentes as restantes exceções suscitadas pela Autoridade Tributária e Aduaneira.
  3. Julga improcedentes os pedidos de declaração de ilegalidade e de anulação parcial do ato de retenção na fonte, por intempestividade do pedido de revisão oficiosa, absolvendo a Autoridade Tributária e Aduaneira do pedido.

Fixa-se o valor do processo em 13.381,08€ (treze mil e trezentos e oitenta e um euros e oito cêntimos).

Custas a cargo da Requerente, fixando-se o respetivo montante em 918,00€. (novecentos e dezoito euros), de acordo com o artigo 12.º, n.º 2 do Regime de Arbitragem Tributária, do artigo 4.ºdo RCPAT e da Tabela I anexa a este último.

Notifique.

Lisboa, 12 de Julho de 2012.

O Árbitro

Paulo Renato Ferreira Alves