Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 226/2013-T
Data da decisão: 2014-03-20  IRC IVA  
Valor do pedido: € 146.709,99
Tema: IRC e IVA – ónus da prova da quantificação da matéria tributável; indispensabilidade dos Custos; caducidade; juros de mora
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Processo n.º 226/2013-T

 

Os árbitros Dr. Jorge Manuel Lopes de Sousa (árbitro-presidente), Prof.ª Doutora Clotilde Celorico Palma e Dr. Júlio Tormenta, designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa para formarem o Tribunal Arbitral, constituído em 4-12-2013, acordam no seguinte:

 

A – Relatório

 

A, NIPC ..., apresentou um pedido de constituição do tribunal arbitral colectivo, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 2.º e 10.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, doravante apenas designado por RJAT), em que é Requerida a AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA.

A Requerente pretende pronúncia arbitral sobre a legalidade

– das liquidações adicionais de Imposto sobre o Valor Acrescentado identificadas com os n.ºs ...39, ...41, ...43, ...45, ...47, ...49 e ...51, no valor de € 62.187,83 (sessenta e dois mil, cento e oitenta euros e oitenta e três cêntimos) e as respectivas liquidações de Juros Compensatórios, identificadas com os n.ºs ...38, ...40, ...42, ...44, ...46, ...48 e ...50, no montante total de € 10.868,61 (dez mil, oitocentos e sessenta e oito euros e sessenta e um cêntimos), referentes aos períodos de 200802, 200804, 200805, 200806, 200807 e 200809 e 200810; e

– da liquidação adicional de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas n.º 2012...., no valor de € 65.520,44 (sessenta e cinco mil, quinhentos e vinte euros e quarenta e quatro cêntimos) e respectivas liquidações de Juros Compensatórios e Moratórios, identificadas, respectivamente, com os n.º 2012 ... e 2012...., nos montantes de € 8.111,01 (oito mil, cento e onze euros e um cêntimo) e € 22,10 (vinte e dois euros e dez cêntimos), todas relativas ao ano de exercício de 2008, resultante da Ordem de Serviço n.º ....

 

O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD e automaticamente notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira em 30-09-2013.

Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redacção introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, o Conselho Deontológico designou como árbitros do tribunal arbitral colectivo o Conselheiro Jorge Lopes de Sousa (Presidente), a Prof.ª Doutora Clotilde Celorico Palma e o Dr. Júlio Tormenta, que comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável.

Em 13-11-2013 foram as partes devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a designação dos árbitros, nos termos conjugados do artigo 11.º, n.º 1, alíneas a) e b), do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.

Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT,          na redacção introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 Dezembro, o tribunal arbitral colectivo foi constituído em 04-12-2013.

A Autoridade Tributária e Aduaneira apresentou resposta.

Em 29-1-2014, realizou-se a reunião prevista no artigo 18.º do RJAT e em 20-2-2014 procedeu-a a inquirição das testemunhas, tendo-se acordado haver lugar a alegações escritas no prazo de 10 dias.

As Partes apresentaram alegações.

O tribunal arbitral foi regularmente constituído e é competente.

As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias e são legítimas (arts. 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e art. 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março).

O processo não enferma de nulidades e não foram suscitadas excepções nem se vê qualquer obstáculo à apreciação do mérito da causa.

 

B. Posições das Partes

 

B.1. Posição da Requerente

 

Para fundamentar o seu pedido, a Requerente vem alegar em síntese o seguinte:

 

1. O pedido de pronúncia arbitral tem por finalidade a declaração de ilegalidade dos actos de liquidações adicionais de Imposto sobre o Valor Acrescentado (doravante designado por IVA), identificadas com os n.º ...39, ...41, ...43, ...47,...49 e ...51, no valor de € 62.187,83 (sessenta dois mil, cento e oitenta sete euros e oitenta três cêntimos) e as respectivas liquidações de Juros Compensatórios, identificadas com os n.º ...38, ...40, ...42, ...42, ...46, ...48 e ...50, no montante total de € 10.868,61 (dez mil oitocentos e sessenta oito euros e sessenta um cêntimos) referentes aos períodos 200802, 200804, 200805, 200806, 200807, 200809 e 200810, cfr. Doc. 1 anexo à petição inicial.

2. A Requerente também vem impugnar a legalidade da liquidação adicional de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (doravante designado por IRC) n.º 2012...., no valor de € 65.520,44 (sessenta e cinco mil, quinhentos e vinte euros e quarenta e quatro cêntimos) e respectivas liquidações de Juros Compensatórios e Moratórios, respectivamente, nos montantes de € 8.111,01 (oito mil, cento e onze euros e um cêntimo) e € 22,10 (vinte e dois euros e dez cêntimos) totalizando um valor de € 73.653,55 relativamente ao exercício de 2008, cfr. Doc. 2 anexo à petição inicial.

 3. Em cumprimento da Ordem de Serviço n.º OI... emitida pela Direcção de Finanças de Lisboa, foi dado início a uma acção inspectiva de âmbito geral e externo relativa ao exercício de 2008.

 4. No exercício de 2008, a realidade contabilística da Requerente sofreu diversas vicissitudes que passaram pela mudança do Técnico Oficial de Contas e programa de facturação, conforme referido nos artigos 19 a 30 da petição inicial. Destas vicissitudes, resultou que a Requerente apresentou extractos de conta referentes ao período de Janeiro a Agosto de 2008 e extractos de conta apenas com os movimentos contabilísticos de Setembro a Dezembro de 2008. Os extractos de conta do período de Setembro a Dezembro de 2008, não continham o saldo inicial de abertura reportado a 1 de Setembro correspondente ao saldo final de 31 de Agosto de 2008, cfr. artigos 23 e 24 da petição inicial. Foram estes dois tipos de extracto os utilizados pelos Serviços de Inspecção Tributária (doravante designados por IT).

 5. Da inspecção efectuada resultaram ajustamentos (a favor do Estado) em sede de IVA e IRC, conforme Relatório de Inspecção Tributária anexo à petição inicial como Doc.9, cujo teor se dá por inteiramente reproduzido para todos os efeitos legais. Em sede de IVA, as correcções por parte da AT tiveram como fundamento notas de crédito, notas de débito e despesas com imposto não dedutível, cfr. artigo 36 da petição inicial. Mais especificamente e a título de imposto indevidamente deduzido por força de notas de crédito emitidas em duplicado – devido à mudança de programa de facturação – as correcções ascenderam a € 62.187,83 (sessenta dois mil, cento e oitenta sete euros e oitenta três cêntimos).

 6. As correcções em sede de IRC tiveram como fundamento a omissão de proveitos, infringindo o estatuído no artigo 17.º do CIRC, não cumprimento do artigo 34.º do CIRC (artigo de IRC à data dos factos controvertidos) para efeitos de provisões/ajustamentos de contas a receber, amortizações e reintegrações em excesso para efeitos fiscais e custos não dedutíveis para efeitos fiscais pelo não cumprimento do requisito da indispensabilidade previsto no artigo 23.º do CIRC, cfr. artigos 38, 41, 42 e 43 da petição inicial.

 7. O valor agora impugnado em sede de IRC no montante de € 73.653,55 tem por base correcções ao lucro tributável do exercício de 2008, como acima referido, dando origem ao apuramento de uma matéria colectável corrigida de € 260.540,27, cfr. Doc. 2 anexo à petição inicial. A decomposição da matéria colectável corrigida é a seguinte, cfr. ponto A.2.6. do RIT:

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8. Das correcções efectuadas, a Requerente igualmente alega:

 

Proveitos – € 113.727,70

 

8.1. O valor de € 113.727,70 que constitui correcção à matéria colectável resultará da diferença entre o montante (€ 1.121.160,59) resultante do somatório do saldo da conta 72 (Prestação de Serviços de acordo com o POC) relevado contabilisticamente nos dois conjuntos de extractos de contas contabilísticas existentes nos autos, anexados como Doc. 12 e 13 à petição inicial e no balancete analítico final (€ 1.007.432,89), que serviu de base para o preenchimento da declaração de rendimentos modelo 22 para efeitos de IRC relativo ao exercício de 2008, anexo à petição inicial como Doc. 14, cfr. artigos 68.º e 69.º da petição inicial.

 8.2. A diferença apurada de € 113.727,70 deve-se ao facto de haver notas de crédito emitidas em Agosto de 2008 e outros documentos, que não se encontravam registados nos extractos de conta entregues à AT (Doc. 12 e 13 anexos à petição inicial) mas que foram contabilizados sob a forma de movimento agregador constando do balancete analítico final (Doc. 14 anexo à petição inicial), cfr. artigos 29 e 30 da petição inicial. A decomposição do montante de € 113.727,70 correspondente ao movimento agregador encontra-se no Doc. 15 anexo à petição inicial.

 

Reversão de Provisões – € 46.772,50

 

8.3. O montante de € 46.772,50 diz respeito a uma reversão do saldo de provisões do ano anterior (2007) que contabilisticamente deu origem a movimentos entre contas de balanço. Assim, as contas de balanço utilizadas para efeitos de reversão foram as contas 218 – Clientes de cobrança duvidosa – e a conta 28 – Ajustamento de dívidas a receber (conta de provisão), não relevando os custos na conta 69 e os proveitos na conta 79 decorrente desta reversão de provisões, cfr. artigos 85 da petição inicial. Mais alega, que o efeito em IRC seria nulo devido ao facto de em termos contabilísticos o impacto em resultados ser nulo, uma vez que o montante a ser movimentado nas contas 69 e 79 do POC seria o mesmo, cumprindo-se assim com o estatuído no artigo 34.º do CIRC, como é o caso das empresas B (posteriormente B2), sociedade insolvente, e C relativamente à qual foi concedido um perdão de dívida, cfr. artigos 88 a 91.º da petição inicial.

 

Provisões constituídas sem prova de esforço de cobrança – € 15.599,12

 

8.4. O valor constituído diz respeito a imparidades relacionadas com créditos resultantes da actividade normal e que possam ser considerados de cobrança duvidosa. Essas imparidades são dedutíveis fiscalmente de acordo com o que está previsto nos artigos 35.º e 36.º do CIRC, cfr. artigo 81 da petição inicial.

 8.5. Refere igualmente que esclareceu a AT que mantinha fortes relações comerciais com as empresas devedoras e por isso o esforço de cobrança não era muito agressivo, tendo comprovado através de correio electrónico e avisos de pagamento que foram realizadas essas diligências, cfr. artigo 92 da petição inicial.

 

Créditos provisionados não reconhecidos na contabilidade – € 45.559,16

 

8.6. A Requerente refere que de acordo com o artigo 34.º do CIRC, o contribuinte pode provisionar por inteiro o valor dos créditos devedores quando sobre estes se encontre pendente um processo judicial, já não sendo assim, quando relativamente ao montante total ou parcial do crédito, haja já sido constituída provisão em anos anteriores, cfr. artigos 82 a 84 da petição inicial.

 

Indispensabilidade dos Custos – € 26.590,76

 

8.7. A Requerente alega que foram suscitadas dúvidas pela IT quanto à indispensabilidade de custos incorridos nos termos do artigo 23.º do CIRC.

 

8.8. Citando um Acórdão do Tribunal Central Administrativo do Norte de 12.01.2012 no qual o conceito de indispensabilidade é considerado um conceito indeterminado, que requer uma análise casuística, relativamente a cada custo incorrido e suportado por um contribuinte. Assim, a dedutibilidade fiscal de um custo terá que ser feita em função da actividade societária, isto é, em função do objecto social prosseguido por esse contribuinte. Deste modo, a dedutibilidade fiscal de um custo dependerá da relação causal e justificada com a actividade da empresa, cfr. artigos 94.º e 95.º da petição inicial. Tendo em conta a jurisprudência mencionada, não compreende a posição assumida pela AT relativamente à indispensabilidade de custos suportados com a aquisição de filmes e livros necessários à investigação e crescimento da sua actividade com o objectivo de melhorar a sua competitividade acima referida, atendendo ao seu escopo social, cfr. artigos 96 a 99 da petição inicial.

8.9. Mais refere que não entende porque é que o custo suportado com a oferta de um vídeo a dois clientes com os quais mantém relações comercias assim como de outros bens, possa ser questionado pela AT ao abrigo do artigo 23.º do CIRC. A lei fiscal e contabilística contempla a existência de despesas de representação que nomeadamente têm a ver com encargos suportados pelos contribuintes com oferta a clientes, que não são mais do que uma forma de fidelização e conservação dos mesmos, cfr. artigos 100.º a 106.º da petição inicial.

 

Procedimento de Inspecção Tributária

 

9.1. Refere a Requerente que foi notificada em 26-1-2012 do início da Inspecção Tributária que ocorreu em 22-7-2011, pelo que não foi observado o disposto no artigo 49.º, n.º 1, do RCPIT (Regime Complementar do Procedimento de Inspecção Tributária) que estabelece que «o procedimento externo de inspecção deve ser notificado ao sujeito passivo ou obrigado tributário com uma antecedência mínima de cinco dias relativamente ao seu início» (artigos 107.º a 111.º da petição inicial).

9.2. Por isso, entende a Requerente que a notificação que lhe foi efectuada «padece de vício de formalidade», que «veio inquinar todo o procedimento de inspecção tributária e actos de liquidação subsequentes».

9.3 Defende ainda a Requerente que, ainda que assim não se entenda, estabelece o n.º 2 do artigo 36.º do RCPIT que o procedimento «é contínuo e deve ser concluído no prazo máximo de 6 (seis) meses a contar da notificação do seu início», pelo que quando ocorreu a notificação já o prazo de seis meses tinha decorrido.

9.4. Nestas condições, entende a Requerente que ocorreu desrespeito «das liberdades, direitos e garantias do contribuinte» e violação do principio da legalidade que se traduz na «proibição de pagamento de impostos que não tenham sido estabelecidos de harmonia com a Constituição, que se inscreve no quadro das garantias individuais, por isso revestindo as normas atinentes carácter preceptivo (cfr. artigo 18.º da CRP)».

9.5. Entende ainda a Requerente que «de acordo com o princípio da legalidade, só podem ser cobrados os impostos quando se verificam os pressupostos aos quais a lei condiciona a existência de uma obrigação fiscal, observadas as garantias dos contribuintes na lei estabelecidas como modo de reacção, não sendo lícito e legal proceder a derrogações de tais garantias corno direitos adquiridos na vigência de certa lei pois isso quebra a unidade sistemática do direito fiscal» e que «tendo sido expedida a carta-aviso em 26.01.2012, em bom rigor não só já haviam decorridos mais de 6 (seis meses), sobre o início do procedimento de inspecção tributária, com o total desprezo das normas do R.C.P.I.T, como deixou de ser exigível o imposto, por não terem sido observados todos pressupostos, dos quais a lei faz depender a existência de uma obrigação fiscal».

9.6. Defende ainda a Requerente que «ainda que a notificação tenha sido efectuada antes do termo do prazo de caducidade, ou seja, em 26.01.2012, não sendo, portanto originariamente ilegal, a realidade é que, ocorrendo a notificação muito posteriormente ao início do procedimento de inspecção tributária, transformou-se num acto materialmente ineficaz, inquinando, conforme já se afirmou, todo o procedimento» e que, sendo a notificação condição de eficácia do acto, «para que se verifique a caducidade não basta o acto da liquidação, exige-se também que se aprecie a certeza jurídica de que o acto não tenha sido levado ao conhecimento do contribuinte dentro daquele prazo» (artigos 125.º e 126.º da petição inicial).

 

Invalidade do acto administrativo

 

10.1. Entende ainda a Requerente que a carta aviso que lhe comunicou o início da inspecção deveria ser fundamentada, por força do disposto no artigo 77.º da LGT, o que não sucedeu (artigos 127.º a 140.º) e que a fundamentação do RIT, quanto às liquidações de IVA não se revela transparente ao basearem-se num mero quadro indicativo (artigos 141.º a 145.º da petição inicial).

10.2. Defende ainda a Requerente que, «atento o facto que foram precludidas formalidades essenciais, aquando do início do procedimento de inspecção tributária, todos os actos praticados a posteriori, nomeadamente as liquidações adicionais de I.V.A e de I.R.C. não produziram qualquer efeito» e que as liquidações de I.V.A. decorrentes daquela inspecção, e na quantia acima referida, a considerar que foram notificadas à ora Requerente em tempo útil, isto é, dentro do prazo devido «converteram-se num acto inválido, porquanto não se revelaram transparentes ao se basearem num quadro meramente indicativo».

 

            Da caducidade do imposto

 

11.1. A Requerente defende que sendo o IRC um imposto periódico, o prazo de caducidade conta-se «a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário», mas no n.º 2 excepcionam-se os casos de erro evidenciado na declaração o sujeito passivo ou de utilização de métodos indirectos e que a concordar-se com a posição da A.T. quanto às correcções efectuadas, não pode deixar de se ponderar que haja erro evidenciado em matéria de IVA, bem como em matéria de IRC, pois o erro foi detectado pela A.T. através de um mero exame dos elementos que integravam a contabilidade, sem qualquer análise aprofundada ou minuciosa. Por isso, entende a Requerente que será aplicável o prazo de três anos previsto no do n.º 2 do artigo 45.º da LGT.

 

            Os juros compensatórios e o juízo de culpa

 

12.1. A Requerente defende que os juros compensatórios dependem de um juízo de culpa que, no caso, não pode ser formulado, por os erros da escrita não lhe serem imputáveis (artigos 152.º a 161.º da petição inicial).

 

B.2. Posição da Autoridade Tributária e Aduaneira

 

A Requerida apresentou a sua Resposta à petição inicial, na qual contesta especificadamente os argumentos aduzidos, alegando o seguinte, em suma:

 

Em sede de IRC:

 

Proveitos (Ponto A.2.1 do RIT)

 

1.1. A facturação da Requerente foi conferida e confrontada com os registos contabilísticos existentes, tendo-se verificado que existem proveitos num montante de € 113.727,70 que não foram considerados no resultado líquido do exercício apurado com base no balancete que serviu de apoio ao preenchimento da declaração Modelo 22 do exercício de 2008. O valor de € 113.727,70 é explicado pela diferença entre o montante dos saldos da conta 72 dos dois conjuntos de extractos – € 1.121.160,59 – e o montante do saldo da conta 72 do balancete analítico final que serviu de apoio ao preenchimento da declaração modelo 22 – € 1.007.432,89. A diferença apurada de € 113.727,70 constitui uma infracção ao artigo 17.º n.º3 alínea b) do CIRC, cfr. artigos 34 e 35 da Resposta.

 1.2. A Requerente em 17 de Abril de 2012 (fls. 55 a 63 do Anexo 4 ao RIT) enviou um email para os Serviços de Inspecção Tributária justificando a diferença encontrada com a emissão de notas de crédito datadas de 31 de Agosto de 2008 resultantes de acordos de pagamento efectuados no âmbito de um esforço de cobrança de clientes. A Requerente enviou igualmente um quadro intitulado “relação entre NC no sistema e na contabilidade”, cfr. artigo 37.º da Resposta. A IT analisou novamente a informação enviada pela Requerente e constatou que relativamente à relação das notas de crédito enviadas (do n.º1 ao n.º15), para as notas de crédito n.º 6 e 7, não há registos contabilísticos. Adicionalmente, apurou que relativamente às restantes notas de crédito, mais concretamente do n.º4 ao n.º 15, não constam da contabilidade, apresentam coincidência de numeração com os documentos que foram lançados, alguns clientes cessaram a actividades em datas anteriores à da emissão da nota de crédito e não existem créditos constantes do primeiro extracto preparado pelo TOC ... que suportem as notas de crédito, cfr. artigos 36 a 41 da Resposta.

 1.3. É referido igualmente que relativamente à Cl seria a Requerente quem estava em dívida para com aquele e não o contrário, prova disso foi o pagamento de € 30.000 (conforme cheques emitidos) em 2008, cfr. artigo 43.º. Também em relação a outro cliente – B – refere que a Requerente recebeu € 4.975,79 tendo o mesmo emitido notas de crédito no âmbito de acordos com clientes de cobrança duvidosa, mas em rigor, a existirem estes créditos, os mesmos só deveriam ser considerados incobráveis se respeitassem o estatuído no artigo 39.º do CIRC. Conclui que decorrente do procedimento inspectivo levado a cabo, que as notas de crédito apresentadas pela Requerente, não constavam da contabilidade, existiam outras notas de crédito com numeração coincidente, existem notas de crédito que dizem respeito a créditos que não estavam reconhecidos e que a maior parte dos clientes tinham encerrado a sua actividade antes de 2008, cfr. artigos 42 a 47 da Resposta. Conclui que quer em sede graciosa e/ou em sede contencioso arbitral, a Requerente juntou três cópias de notas de crédito assinadas e carimbadas pelos clientes, alegando que são prova da sua existência e que não foram consideradas individualmente mas apenas no balancete analítico final contribuindo dessa forma para o resultado líquido do exercício mas que não faz prova cabal que as mesmas contribuíram para a formação do resultado líquido e do resultado tributável do exercício fiscal de 2008, pelo que o ajustamento positivo é legal e está conforme com os preceitos legais tributários em vigor à data dos factos, cfr. artigo 48.º da Resposta. Mais refere que em sede arbitral, na petição inicial, a Requerente não aduziu qualquer facto, fundamento ou documento inicial, cfr. artigo 49.º da Resposta.

 

Provisões/Ajustamentos de dívidas a receber (ponto A.2.2 do RIT)

 

1.4. Refere que as provisões que tiverem por fim a cobertura de créditos resultantes da actividade normal que possam ser considerados de cobrança duvidosa e sejam evidenciados como tal na contabilidade, podem ser dedutíveis para efeitos fiscais ao abrigo do disposto no artigo 34.º nº1 alínea a) do CIRC, cfr. artigo 50.º da Resposta. De acordo com o Plano Oficial de Contabilidade (POC), as provisões constituídas em cada exercício são registadas a débito numa conta “Provisões do Exercício” (conta 67) por contrapartida da conta “Ajustamentos de dívidas a receber” (conta 28) cujo saldo representará o valor acumulado das provisões por dívidas a receber. Por outro lado, de acordo com o artigo 121º do CIRC conjugado com a Portaria 359/2000 de 20 de Junho, os sujeitos passivos deveriam constituir um dossier fiscal onde constasse o mapa 30 (Mapa das Provisões) o qual demonstraria, a constituição, reforço ou redução das mesmas, não tendo a Requerente tal mapa oficial mas sim um outro mapa de provisões de formato livre no qual consta a constituição de uma provisão de € 137.865,95 que coincide com o valor registado no balancete analítico final na conta 671 referente a “Provisões do Exercício”, cfr. artigos 50.º e 51.º da Resposta.

1.5. Na declaração anual – IES (Informação Empresarial Simplificada) de 2007, transita na conta 28 um saldo de € 46.772,50, cfr. Anexo 6 RIT, fls. 2 e seguintes) embora a mesma conta – conta 28 – no final de 2008, apresenta o valor das provisões constituídas no exercício de 2008 (€ 137.865,95) pelo que denuncia a eliminação do saldo de provisões constituídas em anos anteriores a 2008 no valor de € 46.772,50. Desta anulação no montante de € 46.772,50 deveria ter sido reconhecido um proveito no mesmo valor de acordo com o artigo 34.º n.º2 do CIRC, o que não foi feito e por isso deve ser considerado uma correcção à matéria colectável desse montante, cfr. artigos 52.º a 56.º da Resposta.

 

1.6. Quanto ao montante de € 15.599,12 relativamente aos clientes constantes do quadro referido no artigo 56.º da Resposta, não há evidência de tentativas de cobrança, não reunindo por isso as condições previstas no n.º1 do artigo 35.º do CIRC, pelo que a provisão constituída referente a esses clientes não pode ser aceite fiscalmente, cfr. artigo 57.º da Resposta. Também existe um montante de € 45.459,16 referente a provisões constituídas ao abrigo da alínea a) do n.º1 do artigo 34.º do CIRC que dizem respeito a clientes que não estão identificados quer no balancete analítico final quer nos extractos apresentados à IT, cfr. artigos 57.º a 61.º da Resposta. Relativamente a três clientes: D; E e F, foram prestados esclarecimentos por parte da Requerente mas que em nada vieram alterar as conclusões da IT quantos aos ajustamentos positivos a efectuar em sede de provisões, cfr. artigos 62.º a 64.º da Resposta.

 1.7. Refere a Requerida que a Requerente argúi quer em sede graciosa quer em sede de contencioso arbitral, que o saldo da Provisão para clientes transitado de 2007 no montante de € 46.772,50 diz respeito a duas entidades: C Portugal (€ 15.112,55) e B (€ 31.659,95). No 1º caso – C – a anulação deveu-se a um acordo de perdão de dívida pela forte possibilidade de a dívida que a C tinha para com a Requerente, não ser paga. No 2º caso – B (posteriormente designada por B2, S.A.) – esta sociedade comercial ter sido objecto de um processo de insolvência em 2004 mas que a Requerente só no exercício de 2008 teve conhecimento, cfr. 67.º e 68.º da Resposta. A AT não subscreve esta posição face aos documentos apresentados em sede graciosa pela Requerente, cfr. artigo 71.º da Resposta.

 1.8. Refere a Requerida que a Requerente argúi quer em sede graciosa quer em sede de contencioso arbitral, que o saldo da Provisão para clientes transitado de 2007 no montante de € 46.772,50 foi anulado utilizando exclusivamente contas de balanço e por esse motivo, não haver qualquer impacto a nível da formação do resultado fiscal de 2008, cfr. artigo 69.º da Resposta, posição com a qual não concorda pelas razões explanadas no artigo 70.º da Resposta mantendo assim o ajustamento positivo de € 46.772,50.

 1.9. Relativamente à evidência dos esforços de cobrança de dívidas provisionadas – € 15.599,12 – mantém a posição de o ajustamento positivo se efectuar pelas razões explanadas no artigo 72.º da Resposta.

 

Amortizações /Reintegrações do exercício (Ponto A.2.3)

 

1.10. A Requerida nos artigos 75.º a 80.º da Resposta e em especial no artigo 77.º da mesma, identifica três tipos de situações assinaladas com as letras a) b) e c) que dão origem a ajustamentos positivos na declaração do modelo 22 pelo facto de os custos referentes a reintegrações e amortizações contabilísticas referenciadas com as letras a) b) e c) não serem elegíveis como custo fiscal por violarem respectivamente o n.º2, alínea e) n.º1 e alínea c) n.º 1, todos do artigo 33.º do CIRC assim como no caso da situação assinalada com a letra c), o disposto no Decreto Regulamentar n.º 2/90 de 12 de Janeiro, cfr. artigos 75.º a 80.º da Resposta. A Requerente não contestou quer em sede graciosa quer em sede de contencioso arbitral, o ajustamento positivo, cfr. ponto 81 da Resposta.

 

Custos/gastos não dedutíveis para efeitos fiscais (Ponto A.2.4)

 

1.11. Na inspecção realizada foram detectados documentos relativos a despesas que não constituem custo dedutível fiscalmente tendo sido a Requerente notificado ao abrigo do n.º4 do artigo 59.º da Lei Geral Tributária (LGT) para justificar os mesmos. A Requerente para alguns casos justificou validamente os valores e noutros não foi suficiente tendo igualmente ocorrido uma reunião entre a IT e a Requerente para esclarecimento de algumas questões em aberto, cfr. artigos 82.º a 83.º da Resposta.

 1.12. Assim foram detectadas duplicações na contabilização de custos que ascenderam a € 15.172,24, despesas que a Requerente não conseguiu demonstrar a indispensabilidade das mesmas que ascenderam a € 8.289,13, despesas de carácter particular que ascenderam a € 932,19 e talões que não continham a identificação fiscal do fornecedor ou adquirente dos serviços que ascenderam a € 2.197,20 totalizando € 26.590,76, respectivamente, cfr. artigo 85.º,86.º,89.ºe 96.º da Resposta. Em sede graciosa, a Requerente, relativamente ao montante total de € 559,75 relativo a um vídeo no montante de € 480,00 e de filmes e livros oferecidos no montante de 79,75, contestou a não elegibilidade dos mesmos como custo fiscal, tendo a IT mantido o montante de € 559,75 a titulo de ajustamento positivo por falta de prova do nexo causal dos mesmos com a actividade prosseguida pela Requerente, cfr. artigo 99.º da Resposta.

 1.13. Em sede arbitral na petição inicial a Requerente não aduziu qualquer facto, fundamento ou documento adicional, cfr. artigo 100.º da Resposta.

 

Outros (Ponto A.2.5 do RIT)

 

1.14. Foram detectados lançamentos a débito de contas de proveitos mais concretamente na conta 72 – € 3.097,04 – e na conta 7374 – € 1.628,94 para os quais não há justificação suficiente. Também houve um registo a título de custos com seguros de viatura na conta 622235 no montante de € 682,05 sem suporte documental, pelo que há um ajustamento positivo de € 5.408,03. Por outro lado, foi detectada uma correcção a favor da Requerente por lançamento de três facturas em duplicado no montante de € 11.949 e de lançamento indevido de € 1.067,24 totalizando € 13.016,24. O valor de correcção a favor da Requerente de € 7.608,21 resulta da diferença entre o montante do ajustamento positivo (a favor do Estado) de € 5.408,03 e de correcções a favor da Requerente de € 13.016,24 não tendo sido contestado em sede graciosa nem em sede de contencioso arbitral, cfr. artigo 101.º a 106.º da Resposta.

 

Em sede de IVA

 

Notas de Crédito (Ponto A.3.1 do RIT)

 

1.15. Imposto regularizado indevidamente a favor da Requerente por não ter na sua posse evidência que o adquirente tomou conhecimento da rectificação e deste modo infringindo o disposto no artigo 78.º do CIVA. A Requerente não contestou em sede graciosa nem em sede de contencioso arbitral o ajustamento positivo, cfr. artigos 108.º a 110.º da Resposta.

 

Nota de débito 5/2008 (Ponto A.3.2 do RIT)

 

1.16. A nota de débito 5/2008 de 25 de Junho foi emitida sem haver liquidação de IVA por parte da Requerente com o fundamento de que a operação estaria isenta de IVA ao abrigo da alínea c) do n.º 30 do artigo 9.º do IVA. A IT entende que se está perante uma transacção não isenta de IVA com o fundamento explanado no artigo 112.º da Resposta, pelo que haverá lugar à liquidação de IVA no montante de € 630 não sendo contestada em sede graciosa nem em sede de contencioso arbitral, o ajustamento positivo, cfr. artigos 111.º a 114.º da Resposta.

 

Despesas com IVA Imposto não dedutível (Ponto A.3.3 do RIT)

 

1.17. Existe um ajustamento positivo de € 1.556,29 decorrente do ajustamento efectuado em sede de IRC a título de Custos não dedutíveis para efeitos fiscais (Ponto A.2.4 do RIT) pelos mesmos infringirem o disposto nos artigos 19.º a 21.º do CIVA, não sendo contestada em sede graciosa nem em sede de contencioso arbitral, o ajustamento positivo, cfr. artigos 115.º a 117.º da Resposta.

 

 Outros (Ponto A.3.4 do RIT)

 

1.18. Existe uma correcção de IVA a favor do sujeito passivo de 2.509,20 decorrente das correcções para efeitos de IRC mencionadas no ponto A.2.5. – Outros assim como um ajustamento positivo de €104,33 relativo à dedução indevida de IVA no aluguer de uma viatura ligeira infringindo o disposto na alínea b) do n.º1do artigo 21.º do CIVA, não sendo contestada em sede graciosa nem em sede de contencioso arbitral, o ajustamento positivo, cfr. artigos 119.º a 122.º da Resposta.

 

Valores Declarados – Declarações Periódicas (Ponto A.3.5 do RIT)

 

1.19. A IT detectou divergências entre os valores contabilizados e os valores declarados para o exercício de 2008 quer a nível de imposto liquidado quer a nível de imposto dedutível tendo apresentado nas fls. 23 e 24 do RIT um quadro resumo de todas as correcções para efeitos de IVA, incluindo as acima referidas, tendo apurado um imposto devido de € 62.187,53 (€ 62.222,53- € 17,35- €17,35), cfr. artigo 123.º do RIT.

 

Tributação Autónoma (Ponto A.4.1do RIT)

 

1.20. A Requerente apresentou no modelo 22 referente ao exercício fiscal de 2008, tributação autónoma no montante de € 2.986,78, não tendo apresentado qualquer discriminação dos valores que suportam o cálculo efectuado para efeitos de tributação autónoma. A IT tendo em conta as correcções propostas, efectuou um novo cálculo de tributação autónoma, tendo apurado um novo montante de € 6.302,80, dando origem a um ajustamento positivo de € 3.316,02, não sendo contestada em sede graciosa nem em sede de contencioso arbitral, o ajustamento positivo proposto, cfr. artigos 124 º a 128.º da Resposta.

 

Do procedimento inspectivo

 

2.1. É aplicável o prazo de caducidade de 4 anos, previsto no artigo 45.º, n.º 1, da LGT, contado do início do ano civil subsequente àquele em que se verificaram os factos tributários (artigos 18.º a 20.º da Resposta).

2.2. Esse prazo suspende-se com a notificação da ordem de serviço, que ocorreu em 8-12-2008, nos termos do artigo 46.º, n.º 1, da LGT (artigos 21.º e 22.º da Resposta).

2.3. O início da inspecção ocorre com a assinatura da ordem de serviço, nos termos do artigo 51.º do RCPIT e não com a notificação prevista no artigo 49.º do mesmo (artigos 22.º a 26.º da Resposta).

2.4. A conclusão da inspecção ocorre na data de notificação da nota de diligência, que foi assinada em 30-5-2012 (artigos 27.º e 28.º da Resposta).

2.5. Não é aplicável o prazo de caducidade de três anos, por não se estar perante erros evidenciados na declaração (artigos 29.º a 31.º da Resposta).

 

B.3. Alegações

 

1. Em sede de alegações escritas, a Requerente relativamente às correcções propostas pela IT em sede de IRC e IVA, voltou a defender o que já tinha arguido na petição inicial.

2. Nas suas alegações escritas, a Requerida voltou a afirmar o que já tinha arguido na Resposta trazendo à colação uma análise exaustiva do Doc.15 anexo à petição inicial.

3. Da análise ao Doc.15, a Autoridade Tributária e Aduaneira refere que:

 3.1. Trata-se de uma nota de lançamento datada de 31 de Agosto de 2008, à qual foi atribuído o n.º 80.038 não existindo qualquer documento de suporte aos lançamentos e movimentos, contendo apenas nas “designações dos lançamentos” meras referências a algumas notas de crédito.

3.2. O documento nunca foi apresentado durante o procedimento inspectivo.

3.3. A Requerente com o Documento n.º 15 pretende indicar quais os lançamentos que justificam a diferença de €113.727,70 apurada pela IT, resultante da comparação entre a soma dos extractos usados no procedimento inspectivo e os valores declarados para efeitos fiscais que constam do balancete analítico final.

3.4. Os movimentos lançados a débito da conta 72 – “Prestação de Serviços Mercado Nacional” justificam a diferença apurada pela IT, isto é, € 113.727,70.

3.5. Aquando da emissão de notas de crédito em que existe redução da base tributável posterior à emissão da factura, a conta 72 é debitada assim como uma conta de IVA a pagar (significando isso uma redução de IVA a entregar ao Estado) por contrapartida a crédito de uma conta de clientes.

3.6. O montante de € 113.727,70 é decomposto por diversos lançamentos a débito da conta 72 por contrapartida a crédito de uma conta de clientes e a débito da conta de IVA – A Pagar. No artigo 53.º das alegações escritas estão identificados os clientes que foram movimentados contabilisticamente a crédito. Nos artigos 54.º a 60.º das alegações escritas procede-se a uma análise exaustiva relativamente a cada lançamento que foi efectuado na contabilidade movimentando as contas de clientes (a crédito) identificados no artigo 53.º das referidas alegações.

 

Assim:

 

3.6.1. O movimento a débito da conta 7211 no montante de € 25.000 diz respeito à nota de crédito 11 referente a G, cliente que tinha encerrado a sua actividade em 2004 e que não consta no primeiro extracto de contas entregue pelo TOC ..., informação constante no quadro apresentado na fls. 10 do Ponto A.2.1 do RIT;

3.6.2. O movimento a débito da conta 7211 no montante de € 2.731 diz respeito à nota de crédito 8 referente à C mas de acordo com a contabilidade da Requerente o que existia, era uma dívida da Requerente à C no montante de € 2.482,85, informação constante no quadro apresentado na fls. 10 do Ponto A.2.1 do RIT;

 3.6.3. O movimento a débito da conta 7211 no montante de € 75.503,92 diz respeito à nota de crédito 5 referente à H, cliente que não consta no primeiro extracto de contas entregue pelo TOC ..., informação constante no quadro apresentado na fls. 10 do Ponto A.2.1 do RIT;

 3.6.4. O movimento a débito da conta 7211 no montante de € 88,28 diz respeito à nota de crédito 14 referente ao cliente I, cliente que tinha encerrado a sua actividade em 2007 e que não consta no primeiro extracto de contas entregue pelo TOC ..., informação constante no quadro apresentado na fls. 10 do Ponto A.2.1 do RIT;

 3.6.5. O movimento a débito da conta 7211 no montante de € 4.301,91 diz respeito à nota de crédito 13 referente ao cliente J, cliente que não consta no primeiro extracto de contas entregue pelo TOC ..., informação constante no quadro apresentado nas fls. 9 e 10 do Ponto A.2.1 do RIT;

 3.6.6. O movimento a débito da conta 7211 no montante de € 6.101,62 tem como contrapartida movimentos a débito da conta de IVA – A Pagar de € 1.238,28 e movimentos a crédito de contas de clientes. Os clientes movimentados a crédito no total de € 7.339,90 são: K – 5.461,20; L – € 660,51 e M – €1.218,19 em que a única descrição é “regularizações diversas”;

3.7. Existem lançamentos relativamente aos quais não se sabe qual a contrapartida directa, cfr. artigos 61.º a 63.º das alegações escritas.

3.8. Adicionalmente existem lançamentos com a descrição – “regularizações diversas” – em que são creditadas contas de clientes como contrapartida da conta de Sócios e da conta do IVA – a Pagar, o que poderá indiciar que se trata de lançamentos contabilísticos que tenham a ver com limpeza de saldos, cfr. artigo 64.º das alegações escritas.

3.9. Como consequência da análise ao Documento n.º 15, a Requerida refere que a emissão de notas de crédito para conceder perdões de dívida não é fiscalmente/contabilisticamente aceitável, sendo o mais correcto reconhecer clientes de “Cobrança Duvidosa” e relativamente aos mesmos constituir a respectiva provisão, que seria dedutível fiscalmente de acordo com as regras fiscais em vigor, cfr. artigos 65.º e 66.º das alegações escritas.

3.10. Da análise ao Documento n.º 15 ficou por provar que a dívida dos clientes, para os quais se emitiram notas de crédito, estivesse previamente reconhecida na contabilidade questionando que, não havendo dívida, para quê a emissão das notas de crédito. E porquê a emissão de notas de crédito para clientes que já tenham cessado a actividade anteriormente à emissão das mesmas, cfr. artigos 67.º e 68.º das alegações escritas.

 

C. Matéria de facto

 

C.1. Factos que se consideram provados

 

a)      A Requerente A (A) tem o  ...:

b)      A Requerente iniciou a sua actividade de "Agencias de Publicidade" – CAE 73110, em 29-12-1995 (Relatório da Inspecção Tributária junto com a petição inicial como documento n.º 9, cujo teor se dá como reproduzido, doravante «RIT»);

c)      Para efeitos de Imposto Sobre o Valor Acrescentado, a empresa é sujeito passivo de imposto enquadrado no regime normal mensal (RIT);

d)     A Requerente está obrigada a possuir contabilidade organizada (RIT);

e)      Em cumprimento da Ordem de Serviço n.º ..., emitida pela Direcção de Finanças de Lisboa, SIT – Serviços de Inspecção Tributária – Divisão VI, aberta em 25-07-2011, foi efectuado um procedimento inspectivo externo à Requerente, de âmbito geral, relativo ao ano de 2008 (RIT);

f)        O procedimento inspectivo externo teve início em 08-02-2012, tendo nesta data sido notificado o sócio gerente da Requerente (RIT e documento com a denominação «Notificações Procedimento Inspectivo» junto com a resposta);

g)      O Técnico Oficial de Contas responsável pela contabilidade          da empresa em 2008 era, segundo as bases de dados da Direcção-Geral de Impostos, N (RIT);

h)      No entanto, no ano de 2008, a contabilidade esteve entregue, até Agosto de 2006, à empresa: O, na pessoa do técnico ... (RIT);

i)        A partir de Setembro de 2008, foi rescindido o contrato com esta empresa e foi contratada a P (doravante “P”) (RIT);

j)        Foi o primeiro TOC quem cumpriu com as obrigações declarativas e que procedeu ao encerramento das contas do exercício de 2008, por a empresa P se ter recusado a encerrá-las, em face de erros e omissões de escrita relativos aos meses anteriores a Setembro de 2008 (RIT);

k)      A organização da contabilidade alterou-se em Setembro, coincidindo com a mudança de empresa de contabilidade (RIT);

l)        Os extractos de Setembro a Dezembro de 2008 apresentam as contas sem saldos iniciais, tendo-se limitado o técnico de contas da P a lançar os documentos referentes a esse período, sem transferir os dados existentes na contabilidade em 31 de Agosto de 2008 (RIT);

m)    A P ignorou o trabalho contabilístico efectuado nos primeiros oito meses do ano, modificou a organização dos diários e adoptou um plano de contas que apresenta algumas diferenças, nomeadamente nas rubricas referentes a terceiros, ou na discriminação das contas de custos e perdas (RIT);

n)      Assim, a Requerente apresentou extractos de conta referentes ao período de Janeiro a Agosto de 2008 e extractos de conta apenas com os movimentos contabilísticos de Setembro a Dezembro de 2008;

o)      Os extractos de conta do período de Setembro a Dezembro de 2008, não continham o saldo inicial de abertura reportado a 1 de Setembro correspondente ao saldo final de 31 de Agosto de 2008 (artigos 23.º e 24.º da petição inicial);

p)      O encerramento das contas do exercício de 2008, foi efectuado pelo TOC ..., que, para esse efeito, agregou os valores constantes nos dois conjuntos de extractos, os elaborados na primeira metade do ano, sob sua supervisão, e os elaborados na segunda metade, pela outra empresa de contabilidade, tendo 0 resultado deste trabalho servido de base ao preenchimento das declarações fiscais enviadas pela empresa (depoimentos das testemunhas … e …);

q)      De acordo com as declarações apresentadas, no ano de 2008 a Requerente empresa apresentou um lucro fiscal de € 8.900,74 (RIT);

r)       No ano de 2008, a Requerente procedeu à entrega das declarações periódicas de IVA, apresentando, em todos os períodos, imposto a entregar ao Estado;

s)       O balancete final resultante deste trabalho, apresenta diferenças em relação à soma dos valores dos extractos (RIT);

t)       A Inspecção Tributária examinou a facturação da empresa e confrontou-a com os registos existentes, tendo verificado que existem € 113.727,70 de proveitos não considerados no valor do resultado líquido do exercício apurado pelo balancete que serviu de base ao preenchimento da declaração modelo 22, porquanto o somatório da conta 72, dos dois conjuntos de extractos existentes, apresenta um total de 1.121.160,59 euros, enquanto que no balancete final este valor fica pelos 1.007.432,89 euros, nestes termos

u)      Em 17 de Abril de 2012, foi enviado à Autoridade Tributária e Aduaneira um e-mail da Requerente com a indicação de que teriam encontrado explicação para haver proveitos não considerados nas declarações entregues, sendo que essa recaía na existência de notas de crédito não consideradas na contabilidade, datadas de 31 de Agosto de 2008 e emitidas em consequência de acordos de pagamento efectuados no âmbito de um esforço de cobrança a clientes;

v)      Em anexo ao e-mail, a Requerente juntou um quadro intitulado "relação entre NC no sistema e na contabilidade", que com o seguinte teor:

X

J

I

B

B2

B

W

C

C

*H

V

V

V

S

Q

R

 

 

U

T

S

R

R

R

*Q

*Q

Q

 

w)    Não há registos contabilísticos referentes às notas de crédito n.ºs 6 e 7 do quadro da alínea anterior;

x)      As notas de crédito n.ºs 4 a 15, além de não constarem da contabilidade, apresentam coincidência de numeração com os documentos que foram lançados;

y)      Alguns dos clientes mencionados nestas notas de crédito referidas cessaram a actividade em datas anteriores à da emissão do documento e a maior parte nem sequer consta no primeiro extracto existente, como se vê no quadro que segue:

z)      Em relação aos clientes para os quais existem registos contabilísticos (nos extractos), constata-se o seguinte:

 

C

B

 

aa)    Em relação à C, os registos e documentos existentes demonstram que a A se encontrava em dívida para com esta empresa e que, inclusivamente, procedeu ao pagamento de 30.000,00 euros em 2008;

bb)   Em relação à B, do saldo inicial, a empresa recebeu 4.975,79 euros do valor em dívida.

cc)   A Requerente referiu que emitiu notas de crédito apresentadas no âmbito de acordos com clientes de cobrança duvidosa;

dd) O mapa de provisões para cobrança duvidosa existente e apresentado não segue o modelo oficial, demonstrando apenas a constituição de 137.865,95 euros de provisões no ano, valor este que coincide com o valor apresentado no balancete final, na conta 671, respeitante a provisões do exercício (RIT);

ee)   Do ano anterior transitaria um saldo (na conta 28) de € 46.772,50 euros, relativo a provisões, como se refere na declaração anual entregue para o exercício de 2007 (RIT e seu anexo 6);

ff)    No ano de 2008, o valor das provisões anteriormente constituídas desaparece, sendo que a conta de registo do total das provisões existentes (28), apresenta apenas o valor das provisões constituídas no ano, não considerando o saldo das provisões constituídas no ano anterior no valor de € 46.772,50 (RIT);

gg)  Não foi lançada como proveito a anulação de provisões anteriormente constituídas (RIT);

hh)  A Autoridade Tributária e Aduaneira entendeu não terem sido encontradas provas de terem sido efectuadas diligências para o recebimento dos valores em dívida, nas seguintes situações de provisões efectuadas pela Requerente como relativas a créditos de cobrança duvidosa, pelo que efectuou uma correcção à matéria tributável da Requerente do montante de € 15.599,12: (RIT)

GG

HH

FF

EE

DD

CC

BB

AA

Z

Y

U

 

ii)      A Autoridade Tributária e Aduaneira entendeu no RIT que não existia na contabilidade da Requerente prova dos seguintes créditos relativamente aos quais foram constituídas provisões: (RIT)

 

JJ

TT

SS

RR

C

QQ

PP

OO

NN

MMM

KK

D

II

 

jj)        Em face dos factos referidos nas alíneas anteriores, quanto a provisões, a Autoridade Tributária e Aduaneira efectuou as seguintes correcções à matéria tributável da Requerente: (RIT)

kk)  A Autoridade Tributária e Aduaneira entendeu que não podiam ser aceites como custo fiscal do ano de 2008 a totalidade das amortizações efectuadas, tendo efectuado correcções nos seguintes termos: (RIT)

Quanto à primeira amortização, a Autoridade Tributária e Aduaneira efectuou a correcção por entender que foi efectuada após o período máximo de vida útil do bem, tal como está definido no artigo 33, n.º 2 do CIRC, em infracção ao disposto no artigo 33.º, n.º 1 alínea d) do Código.

No que concerne à 2.ª e 3.ª amortizações, reportam-se a veículos automóveis de valor superior a 29.927,87 euros, para os quais está prevista no artigo 33, n.º 1 e) do CIRC, uma limitação ao valor do custo amortizáveis.

No que se refere a 4.ª e 5.ª amortizações, a Autoridade Tributária e Aduaneira efectuou as correcções por entender que foram efectuadas com taxas superiores às previstas nas tabelas do decreto regulamentar 2/90 de 12 Janeiro, em infracção ao disposto no artigo 33º, n.º 1 c) do CIRC. (RIT)

ll)      Na contabilidade da Requerente relativa ao ano de 2008 existia duplicação da contabilização de documentos relativos a custos, designadamente os seguintes: (RIT)

mm)                     Na contabilidade da Requerente relativa ao ano de 2008 incluíam-se, como custos, as seguintes despesas: (RIT)

nn)   O último documento da lista que consta da alínea anterior refere-se a uma nota de lançamento que inclui várias facturas/talões, de onde a Autoridade Tributária e Aduaneira questionou a existência de despesas no valor de 204,75 euros, não tendo sido consideradas justificadas as seguintes, referentes a produtos de estética/higiene: (RIT)

oo)  Os documentos mencionados nos dois quadros que constam das alíneas anteriores referem-se a despesas de carácter particular, para fins alheios aos objectivos da empresa, que não contribuíram para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto; (RIT)

pp)    A Autoridade Tributária e Aduaneira entendeu também que eram de carácter particular, as seguintes despesas, para as quais a Requerente apresentou explicações que a Autoridade Tributária e Aduaneira considerou incongruentes: (RIT)

qq)  A Requerente indicou à Autoridade Tributária e Aduaneira que as despesas de supermercado [assinaladas com a letra a) na lista que antecede] se referem a "frutas, leite, café, vegetais, azeite, iogurtes, etc., que na época a empresa tinha disponível para consumo"; as facturas apresentadas além dos gastos mencionados pela Requerente incluem a aquisição de batatas, postas de bacalhau, champô, escovas e pasta de dentes;  (RIT)

A Requerente indicou que os livros e filmes adquiridos na UU, nas facturas também assinaladas com a letra a), são para consumo interno como material de pesquisa, mas a Requerente não indicou qual o projecto (ou o cliente) para o qual foi necessária a pesquisa, pelo que a Autoridade Tributária e Aduaneira entendeu que não podiam ser consideradas com custos fiscais; (RIT)

A Requerente indicou que as despesas assinaladas com um b) no quadro da alínea anterior foram necessárias para a prestação de um serviço a um cliente, para o qual foi emitida a factura 2008…., junto da qual consta o respectivo orçamento (M-DM.2008….), que não discrimina os custos listados, e se reporta à realização de um cocktail de Natal – jantar mistério, não tendo a Autoridade Tributária e Aduaneira aceitado como custos as despesas efectuadas em data ou hora posterior a 23-12-2008, em que o evento se realizou. (RIT)

rr)     Na escrita da Requerente relativa ao ano de 2008 existiam dois lançamentos cujos documentos de suporte são talões sem identificação fiscal do fornecedor e/ou do adquirente dos serviços, o que levou a Autoridade Tributária e Aduaneira a efectuar uma correcção da matéria tributável da Requerente no seguinte montante: (RIT)

ss)    A Autoridade Tributária e Aduaneira efectuou ainda correcções à matéria tributável de IRC relativas a: (RIT)

– um lançamento a débito na conta 72, no valor de € 3.097,04, cujo documento de suporte (documento 50008, diário 32 de 31-5-2008) entendeu não ser suficiente para a sua existência;

– lançamento a débito na conta 7374, no valor de € 1.628,94, suportado por uma nota de lançamento (documento 12001, do diário 1, de 31-12-2008);

– custos registados como seguros de viaturas na conta n.º 622235, no valor de € 682,05, sem suporte documental;

tt)     Na contabilidade da Requerente foram ainda encontrados documentos contabilizados com valores líquidos incorrectos, nomeadamente no que diz respeito à discriminação do custo em relação ao IVA dedutível, pelo que a Autoridade Tributária e Aduaneira efectuou correcções para efeitos de IRC e IVA nos seguintes termos: (RIT)

uu)  A Autoridade Tributária e Aduaneira efectuou correcções favoráveis à Requerente no montante global de € 7.608,21, pelo que as correcções efectuadas, na globalidade, relativas à matéria tributável de IRC, foram as seguintes: (RIT)

vv)   Na contabilidade da Requerente existiam duas notas de crédito que foram emitidas para rectificação para menos do valor tributável (regularização do imposto a favor do sujeito passivo) sem que a Requerente tivesse na sua posse prova de que o adquirente tomou conhecimento da rectificação, designadamente as seguintes, relativamente às quais a Autoridade Tributária e Aduaneira efectuou correcções para efeitos de IVA: (RIT)

ww)                     A Requerente emitiu a nota de débito n.º 5/2008, de 25 de Junho, registada na conta 732 – Proveitos Suplementares, no diário 50, sob o n.º 60024, com o descritivo «Aluguer de sala de Janeiro a Junho de 2008», do montante de € 3.000,00, sem liquidação de IVA, tendo ao Autoridade Tributária e Aduaneira entendido que era devido IVA à taxa de 21%, no montante de € 630,00;  (RIT)

xx)  Relativamente aos documentos referidos nas anteriores alíneas oo) a vv), em que baseou as correcções à matéria tributável de IRC, a Autoridade Tributária e Aduaneira entendeu também que as despesas elencadas não serviram os objectivos da Requerente, por se tratar da aquisição de bens ou serviços que não contribuíram para a realização de operações tributáveis, pelo que não era dedutível o IVA referidos nas facturas e causa, e corrigiu os valores de imposto deduzido nas declarações periódicas, no total de 1.556,29 euros, nos seguintes termos: (RIT)

yy)  Em face da existência de lançamentos duplicados de facturas que justificaram correcção da matéria tributável de IRC a favor da Requerente, a Autoridade Tributária e Aduaneira efectuou também correcção para efeitos de IVA nos seguintes termos: (RIT)

zz)   Autoridade Tributária e Aduaneira efectuou ainda uma correcção para efeitos de IVA no valor de € 104,33, no período …M, relativa ao documento n.º …, registado no diário 21 em 31-7-2008, respeitante à dedução de imposto na obtenção de serviço de uma viatura ligeira, por entender excluído do direito a dedução este tipo de despesa; (RIT)

aaa)                      A Autoridade Tributária e Aduaneira ao verificar as declarações periódicas apresentadas, encontrou diversas divergências entre os valores contabilizados e os declarados – quer a nível do imposto liquidado, como do dedutível, efectuando as correspondestes correcções, nos termos referidos os quadros que seguem: (RIT)

bbb)                     A totalidade das correcções efectuadas para efeitos de IVA foi no valor de € 62.187,83, nos termos do quadro que segue, com exclusão das relativas aos períodos ...M e ...M, em que a correcção a efectuar é inferior a 25 euros: (RIT)

ccc)                      Na declaração modelo 22 relativo ao ano de 2008, a Requerente apresentou como resultado do cálculo da tributação autónoma o valor de € 2.986,78, mas apresentou discriminação dos valores constituintes da operação; (RIT)

ddd)                   Tendo por base os valores contabilizados e as correcções referidas, a Autoridade Tributária e Aduaneira chegou ao seguinte valor para tributação autónoma: (RIT)

eee)                       Em face do valor referido na alínea anterior e o valor declarado, a Autoridade Tributária e Aduaneira efectuou uma correcção relativa a tributação autónoma no valor de € 3.316,02 (€ 6.302,80 – € 2.986,78) (RIT);

fff) A Requerente foi notificada do relatório da Inspecção Tributária em 12-7-2012 (documento junto pela Autoridade Tributária e Aduaneira com a denominação “Notificações Procedimento Inspectivo”);

ggg)                     Relativamente às correcções referidas relativas a IVA foram efectuadas, em 31-7-2012, as seguintes liquidações adicionais deste imposto, no montante global de € 62.185,83: ( [1] ) (documento junto com a petição inicial)

– n.º ...39, no montante de € 27.207,75, relativa ao período 0802;

– n.º ...41, no montante de € 2.602,42, relativa ao período 0804;

– n.º ...43, no montante de € 8.514,39, relativa ao período 0805;

– n.º ...45, no montante de € 14.034,24, relativa ao período 0806;

– n.º ...47, no montante de € 8.447,75, relativa ao período 0807;

– n.º ...49, no montante de € 1.352,01, relativa ao período 0809;

– n.º ...51, no montante de € 27,27, relativa ao período 0810;

hhh)                     Relativamente às correcções referidas relativas a IVA foram efectuadas, em 31-7-2012, as seguintes liquidações de juros compensatórios, no montante global de € 10.868,61: (documento junto com a petição inicial)

– n.º ...38, no montante de € 802,21, relativa ao período 0802;

– n.º ...40, no montante de € 4.609,66, relativa ao período 0802;

– n.º ...42, no montante de € 423,56, relativa ao período 0804;

– n.º ...44, no montante de € 1.357,64, relativa ao período 0805;

– n.º ...46, no montante de € 2.188,57, relativa ao período 0806;

– n.º ...48, no montante de € 1.289,61, relativa ao período 0807;

– n.º ...50, no montante de € 197,36, relativa ao período 0809;

iii)    Em 18-7-2012 foi elaborada a liquidação de IRC n.º 2012 ..., cuja cópia constitui o documento n.º 2, junto com a petição inicial, cujo teor se dá como reproduzido, de que resulta um valor a pagar de € 73.653,55;

jjj)    Em 23-7-2012, foram efectuadas liquidações de juros compensatórios e juros de mora com os números 2012 ... e 2012 ..., nos montantes de € 8.111,01 e € 22,10 respectivamente, relativas à liquidação referida na alínea anterior;

kkk)                     A Requerente apresentou reclamações graciosas, relativas às liquidações de IVA e IRC, em 28-11-2012, que foram indeferidas) (documentos n.ºs 3 e 4 juntos com a petição inicial, cujos teores se dão como reproduzidos);

lll)    Em 29-4-2013, a Requerente interpôs recursos hierárquicos das decisões de indeferimento das reclamações graciosas (documentos n.ºs 5 e 6, juntos com a petição inicial, cujos teores se dão como reproduzidos);

mmm)               Os recursos hierárquicos não foram decididos no prazo de 60 dias;

nnn)                     Em 27-9-2013, a Requerente apresentou o pedido de constituição do tribunal arbitral que deu origem ao presente processo;

ooo)                      Até ao ano de 2008, o técnico oficial de contas N era profissionalmente bem considerado, tendo nesse ano problemas pessoais que alteraram o seu comportamento profissional (depoimento da testemunha …);

ppp)                     Para o encerramento das contas relativas ao ano de 2008, a Requerente teve de utilizar o técnico oficial de contas N por a empresa a P, que foi encarregada da escrita a partir de Setembro de 2008, se ter recusado a fazer o encerramento, alegando impossibilidade derivada das irregularidades que encontrou relativas ao período que decorreu até Agosto desse ano (depoimentos das testemunhas … e …).

 

C.3. Factos não provados e fundamentação da decisão sobre a matéria de facto

 

1. Os factos foram dados como provados com base no Relatório da Inspecção Tributária e no processo administrativo e quanto aos pontos indicados, nos depoimentos das testemunhas (depoimentos das testemunhas ... e ...), que aparentaram depor com isenção e com conhecimento dos factos sobre que depuseram.

 

2. A Requerente, em sede graciosa, afirma que a anulação de saldos de provisões transitadas de anos anteriores referentes a créditos que se encontrem pendentes de processos judiciais, não deve ter efeitos tributários, desde que a anulação desses saldos seja efectuada entre contas de balanço e ao abrigo do artigo 34.º do CIRC, cfr. artigos 93.º a 97.º do Recurso Hierárquico correspondente ao Doc. 6 anexo à petição inicial. Não ficou provado a insolvência da entidade B por nada constar nos autos quanto a esse respeito.

 

3. A IT no Ponto A.2.1 – Proveitos do RIT refere que o montante de € 113.727,70 ( [2] ) não foi considerado no resultado líquido do exercício que serviu de base para o preenchimento da declaração modelo 22 do exercício de 2008, havendo portanto uma omissão do mesmo. O referido valor de € 113.727,70 resulta da diferença do somatório da conta 72 dos dois conjuntos de extractos existentes – € 1.121.160,59 – e o valor que aparece no balancete – € 1.007.432,89 devendo ser essa diferença uma correcção à matéria colectável e a mesma ser considerada infracção ao abrigo da alínea b) do n.º3 do artigo 17º do CIRC. A Requerente nos artigos 68 e 69 da petição inicial, relativamente à diferença apurada de € 113.727,70, identifica os documentos que dão origem a essa diferença – Doc. 12,13 e 14 – justificando a mesma através da não consideração de um movimento agregador – Doc. 15 – que tem registado os lançamentos contabilísticos das diversas notas de crédito que não constavam dos extractos de conta entregues à IT, cfr. artigo 70 da petição inicial.

Os Doc. 12, 13 e 14 apresentados pela Requerente como anexos à petição inicial constam do PA que instrui os presentes autos e correspondem respectivamente às fls. 10/47 a 25/47 Anexo 3 do PA, fls. 26/47 a 47/47 Anexo 3 do PA e fls. 2/47 a 8/47 Anexo 3 do PA. Os documentos anteriormente referidos são os documentos que suportam os montantes de € 1.121.160,59 e de € 1.007.432,89 que estão na origem da diferença apurada de € 113.727,70.

Relativamente ao Documento 15, que segundo a Requerente justificaria a diferença de € 113.727,70, verifica-se que de acordo com o material probatório carreado para os autos, a documentação de suporte aos movimentos a débito da conta 7211 no montante de € 113.727,70, não pode justificar a movimentação a débito da conta 7211, devido ao facto de nuns casos os clientes em questão não constarem da contabilidade da Requerente, uma vez que não constavam dos primeiros extractos entregues pelo TOC ... e noutros casos terem encerrado a sua actividade anteriormente à emissão da nota de crédito, conforme foi provado em sede de procedimento inspectivo e alegado posteriormente pela Requerida, não tendo a Requerente conseguido provar o contrário. Por outro lado, a movimentação da conta 7211 a débito com a descrição de “regularizações diversas” sem qualquer outra justificação e sem qualquer prova documental, não poderá justificar de acordo com as regras fiscais em vigor, a redução per si do lucro tributável da Requerente relativamente ao exercício de 2008. Assim é de manter a correcção de € 113.727,70.

 

4. Os ajustamentos propostos a nível de provisões decompõem-se da seguinte forma:

 

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Relativamente à reversão do saldo da provisão no montante de € 46.772,50 constata-se que na declaração anual da IES de 2007 na demonstração financeira de Balanço na rubrica Amortizações e Ajustamentos, está relevado um valor de € 46.772,50, cfr. fls. 3/8 Anexo 6 do PA. Por outro lado, na declaração anual da IES de 2008, na demonstração financeira de Balanço na rubrica Amortizações e Ajustamentos, está relevado um valor de € 137.865,95, cfr. Anexo 5 do PA, valor esse que “cruza” com o valor registado na conta de “Provisões do Exercício” (conta 67) e na conta “Ajustamentos de dívidas a receber “ (conta 28) do exercício de 2008. Assim, o saldo transitado de 2007 no montante de € 46.772,50 foi anulado através da utilização de contas de balanço, isto é, a conta 218 – Clientes de Cobrança Duvidosa e a conta 28 – Ajustamento de dívidas a receber, sem passar por qualquer conta de resultados, cfr. artigos 53.º ,54.º, 66.º e 67.º da Resposta e artigo 88.º da petição inicial.

Deste modo, o Tribunal entende estar provado que o saldo da Provisão transitada de 2007 registado na conta 28 – “Ajustamentos de dívidas a receber “ foi anulado sem utilizar contas de resultados (contas da classe 6 e contas da classe 7) e assim não houve lugar ao reconhecimento de um proveito. A movimentação de anulação do saldo da provisão transitada de 2007 foi efectuada apenas entre contas de balanço.

 Relativamente ao montante € 45.459,16 respeitante a provisões constituídas em 2008 relevadas contabilisticamente na conta 67 “Provisões do Exercício”, conforme mapa constante no artigo 60.º da Resposta e fls. 13 do Ponto A.2.2. do RIT constante do PA, a Requerente não conseguiu provar que o montante acima referido tivesse subjacente à sua constituição créditos sobre clientes que constassem da sua contabilidade.

 Relativamente ao montante de € 15.599, 12 respeitante a provisões constituídas em 2008 e relevadas contabilisticamente na conta 67 ”Provisões do Exercício”, a Requerente não apresentou qualquer prova de esforço de cobrança relativamente aos créditos que deram origem à constituição da provisão.

 

D. Matéria de direito

 

D.1. Questão da desculpabilidade e o ónus da prova da quantificação da matéria tributável

 

A Requerente defende que, sendo os erros de escrita imputáveis ao técnico oficial de contas que tinha ao seu serviço no ano de 2008, está-se perante situação de «erro desculpável».

A existência de erro da escrita e de declarações não imputáveis à Requerente poderá ser relevante para efeitos de eventual responsabilidade sancionatória (que não está em causa no presente processo) e por juros compensatórios, que pressupõem a culpa do contribuinte, mas não para efeitos de tributação, pois o que está em causa é apurar qual o imposto que a Requerente deveria ter pago relativamente ao ano de 2008, em sede de IVA e IRC.

À face do princípio da legalidade que tem de enformar toda a actividade da Administração Tributária (artigos 266.º, n.º 2, da CRP e 55.º da LGT), e do princípio da igualdade na repartição dos encargos públicos (artigo 13.º da CRP), a determinação da matéria tributável tem de ser efectuada a face das regras legais, não podendo a existência de erro, mesmo que desculpável, justificar desvios às normas sobre esta matéria.

Ora, as regras sobre a repartição do ónus da prova no procedimento tributário estão previstas no artigo 75.º da LGT, em que se estabelece, no que aqui interessa, que «presumem-se verdadeiras e de boa-fé as declarações dos contribuintes apresentadas nos termos previstos na lei, bem como os dados e apuramentos inscritos na sua contabilidade ou escrita, quando estas estiverem organizadas de acordo com a legislação comercial e fiscal, sem prejuízo dos demais requisitos de que depende a dedutibilidade dos gastos», mas a presunção não se verifica quando «as declarações, contabilidade ou escrita revelarem omissões, erros, inexactidões ou indícios fundados de que não reflectem ou impeçam o conhecimento da matéria tributável real do sujeito passivo».

Estas regras são aplicáveis à generalidade dos contribuintes, independentemente de disporem ou não de serviços de técnicos oficiais de contas para cumprimento das suas obrigações fiscais.

Por isso, não há qualquer suporte legal para afastar a sua aplicabilidade, designadamente a alínea a) do seu n.º 2, pois, como resulta da parte final desta norma, o que justifica a inversão da regra do ónus da prova é a possibilidade real de a Autoridade Tributária e Aduaneira poder conhecer ou não com exactidão qual a matéria tributável real.

Assim, mesmo que seja desculpável a deficiência da escrita do contribuinte, se não é possível atingir-se o resultado que se visa com o procedimento tributário de determinação da matéria tributável, que é conhecer com exactidão a situação do contribuinte, terão de valorar-se as dúvidas contra este, que, com culpa ou sem ela, não cumpriu as suas obrigações fiscais, e não contra a administração tributária que, por causa dessa falta de cumprimento, se vê impossibilitada de levar a cabo com rigor a sua actividade.

É com base nestas regras sobre o ónus da prova que há que apreciar os factos dos autos.

           

D.2. Questão dos proveitos (correcção da matéria tributável de IRC no montante de € 113.727,70)

 

A Inspecção Tributária, através do exame da facturação da Requerente e seu confronto com os registos contabilísticos, constatou que existiam proveitos num montante de € 113.727,70 que não foram considerados no resultado líquido do exercício apurado com base no balancete que serviu de apoio ao preenchimento da declaração Modelo 22 do exercício de 2008. A diferença é entre o montante dos saldos da conta 72 dos dois conjuntos de extractos – € 1.121.160,59 – e o montante do saldo da conta 72 do balancete analítico final que serviu de apoio ao preenchimento da declaração modelo 22 – € 1.007.432,89 [alínea t) da matéria de facto fixada].

A Requerente não põe em causa que essa diferença existia, defendendo que ela se deve ao facto de haver notas de crédito emitidas em Agosto de 2008 e outros documentos, que não se encontravam registados nos extractos de conta entregues à Autoridade Tributária e Aduaneira, mas que foram contabilizados sob a forma de movimento agregador constando do balancete analítico final (Doc. 14 anexo à petição inicial) e a decomposição do montante de € 113.727,70 correspondente ao movimento agregador se encontra no Documento n.º 15 anexo à petição inicial.

Porém, o documento n.º 15 anexo à petição inicial não permite concluir que não existiram os proveitos referidos pela Autoridade Tributária e Aduaneira, pois houve lançamentos efectuados a débito da conta 7211 e que constam daquele documento totalizando € 113.727,70 que não têm qualquer suporte documental, como é o caso dos lançamentos com a descrição de “regularizações diversas”. Adicionalmente, também existem débitos na conta 7211 tendo como suporte a indicação da respectiva nota de crédito, tendo sido provado que, nuns casos, não havia créditos da Requerente sobre os clientes que deram origem à nota de crédito e, noutros casos, o cliente já tinha encerrado a sua actividade em exercícios anteriores à emissão da nota de crédito.

De acordo com a alínea b) n.º 3 do artigo 17.º do CIRC (na versão actual e à data dos factos tributários controvertidos)

« (…) a contabilidade deve:

b) Reflectir todas as operações realizadas pelo sujeito passivo e ser organizada de modo que os resultados das operações e variações patrimoniais sujeitas ao regime geral do IRC possam claramente distinguir-se dos das restantes»

 

Por outro lado o artigo 115.º, n.º3 do CIRC (à data dos factos controvertidos e actualmente artigo 123.º, n.º 2, do CIRC) estabelece que:

 

Na execução da contabilidade deve observar-se em especial o seguinte:

a) Todos os lançamentos devem estar apoiados em documentos justificativos, datados e susceptíveis de serem apresentados sempre que necessário; (…)”.

No caso controvertido não foi dado cumprimento a estas regras, pois, os documentos apresentados pela Requerente e constantes do Documento n.º 15, não espelham a realidade empresarial, pelas razões supra referidas.

De acordo com a alínea a) n.º 1 do artigo 15.º do CIRC, a matéria colectável para efeitos de IRC obtém-se pela dedução ao lucro tributável do montante de prejuízos fiscais e benefícios fiscais que sejam dedutíveis ao lucro tributável. O lucro tributável é calculado a partir do resultado líquido do exercício e das variações patrimoniais positivas e negativas do exercício não reflectidas no resultado corrigido de acordo com as regras do CIRC.

Ora no caso presente, perante a constatação, com base na escrita da Requerente, da existência de proveitos que não foram considerados na declaração modelo 22, no montante de € 113.727,70 (diferença entre o montante dos saldos da conta 72 dos dois conjuntos de extractos – € 1.121.160,59 – e o montante do saldo da conta 72 do balancete analítico final que serviu de apoio ao preenchimento da declaração modelo 22 – € 1.007.432,89), não se provou que haja justificação para essa diferença, à face dos documentos apresentados pela Requerente para a explicar.

 Assim, não se pode considerar demonstrado que não haja a diferença de € 113.727,70 relativa a proveitos que não foram considerados no resultado líquido do exercício, pelo que, recaindo sobre a Requerente o ónus da prova sobre estes factos, em face das irregularidades da sua escrita [artigo 75.º, n.º 2, alínea a), da LGT], não pode deixar de improceder o pedido de anulação da liquidação adicional de IRC, nesta parte.

De resto, quanto a este ponto, a questão da negligência do técnico oficial de contas da Requerente não pode desculpabilizá-la, pois a Requerente encontrou documentos com que pretendeu justificar a diferença referida, sucedendo que, pelas razões apontadas, não pode ser-lhes dada relevância para esse efeito e, por isso, se são esses os documentos com potencialidade para explicar a diferença referida, reforça-se a conclusão de que foi correcta a actuação da Autoridade Tributária e Aduaneira, neste ponto.

Por outro lado, também não se coloca a questão de saber se deve haver prevalência da substância sob a forma ou violação do princípio da capacidade contributiva, pois não se demonstrou que a realidade seja diferente da que foi considerada pela Autoridade Tributária e Aduaneira ao efectuar a correcção referida.

Improcede, assim o pedido de pronúncia arbitral, nesta parte.

 

D.3. Questão da correcção relativa à reversão das provisões do ano de 2007 (€ 46.772,50)

 

O montante de € 46.772,50 diz respeito ao saldo de “Ajustamentos de dívidas a receber” (conta 28) do exercício de 2007, que foi anulada em 2008.

O referido montante de € 46.772,50 diz respeito a duas empresas: C – € 15.112,55; e B – € 31.659,95 (artigo 67.º da Resposta e artigo 91.º da petição inicial).

O valor da C foi anulado em resultado de um acordo de perdão de dívida enquanto o do B resultou do conhecimento que a Requerente teve em 2008 que a empresa Duvideo tinha sido declarada insolvente em 2004.

A Requerente anulou o saldo de “Ajustamentos de dívidas a receber” (conta 28) do exercício de 2007 no montante € 46.772,50 por contrapartida doutra conta de balanço, conta 218 – Clientes de Cobrança Duvidosa, sem utilizar contas de resultados, conforme é referido no artigo 66.º da Resposta, utilizando o método directo. De facto, a Requerente utilizou o método directo, isto é, não utilizou o método indirecto que implicava creditar a conta 796 – “Reduções de Provisões” (conta de proveitos) e debitar a conta 28 – “Ajustamentos de dívidas a receber” por € 46.772,50 e ao mesmo tempo debitar a conta 692 – Créditos Incobráveis e creditar a conta 218 – Clientes de Cobrança duvidosa pelos mesmos € 46.772,50. O impacto em termos de resultados contabilísticos é nulo porque quer a conta de custos quer a conta de proveitos, são movimentadas pelo mesmo montante, isto é, € 46.772,560. Mas, a utilização de qualquer um dos métodos para efeitos contabilísticos de anulação de provisões, não poderá ter efeitos fiscais diferentes.

 Caso a Requerente tivesse utilizado o método indirecto, ao anular o saldo transitado de 2007 da conta 28 – “Ajustamentos de dívidas a receber”, teria que registar um proveito contabilístico e isso vinha reflectido no resultado líquido. Esse proveito contabilístico também era proveito fiscal e deste modo o lucro tributável vinha aumentado, partindo-se da hipótese que aquando da constituição da provisão o custo contabilístico relativo à mesma também foi custo fiscal. Uma vez que o proveito contabilístico resultante da anulação da provisão (conta 28) vinha reflectido no resultado líquido, não havia lugar a qualquer ajustamento fiscal no quadro 07 da declaração modelo 22. Quanto ao custo contabilístico (conta 692 – “Dívidas Incobráveis”) resultante do desreconhecimento do activo (conta 218), tem que se analisar qual a razão pela qual se está anular o activo registado na conta 218 – Clientes de Cobrança duvidosa. Se de facto estamos perante uma situação de mera anulação de saldos devido por exemplo a acordos de dívida, então o custo contabilístico não é custo fiscal, porque não pode ser considerado um crédito incobrável para efeitos fiscais ao abrigo do artigo 39.º do CIRC (actual artigo 41.º CIRC) e, sendo assim, embora em termos contabilísticos o impacto seja nulo, em termos fiscais há que fazer um ajustamento positivo (a favor do Estado) que se traduz num valor a acrescer no quadro 07 da modelo 22. Assim, caso se tivesse utilizado o método directo, embora não tivesse havido qualquer impacto em resultados contabilísticos, haveria que fazer o ajustamento positivo no quadro 07 da declaração modelo 22 que se reflectiria por uma verba a acrescer no referido quadro 07. Se o custo contabilístico (conta 692 – “Dívidas Incobráveis”) caísse na previsão do artigo 39.º CIRC (à data dos factos controvertidos e actual artigo 41.º do CIRC), então o custo contabilístico era custo fiscal, não havendo por isso que fazer qualquer ajustamento positivo no quadro 07 da declaração modelo 22.

As anulações das provisões controvertidas terão que ser analisadas ao abrigo do acima referido e do n.º 2 do artigo 34.º do CIRC (à data dos factos controvertidos e actual artigo 39.º, n.º4) e do artigo 39.º do CIRC (à data dos factos controvertidos e actual 41.º do CIRC).

Relativamente ao saldo anulado referente à C, à Requerente não assiste razão, porque utilizando-se o método directo, como foi o caso, de facto não havia impacto em termos de resultado contabilístico, pois utilizaram-se apenas contas de balanço (conta 28 e 218), mas por força do n.º 2 artigo 34.º do CIRC (actual artigo 39.º n.º4), há que fazer um ajustamento positivo a favor do Estado no quadro 07 da declaração modelo 22 do exercício de 2008. Mesmo aplicando-se o método indirecto, movimentava-se uma conta de proveitos (conta 796 – Redução de Provisões) por contrapartida a débito da conta 28 – Ajustamentos de dívidas a receber e uma conta de custos 692 – Créditos Incobráveis por contrapartida a crédito da conta 218 – Clientes de Cobrança duvidosa havendo lugar a um ajustamento positivo a favor do Estado pelo montante registado na conta 692 por não se estar perante um crédito incobrável. Assim, o resultado final, para efeitos fiscais, é o mesmo independentemente do método contabilístico usado. Deste modo, o ajustamento efectuado pela AT no montante de € 15.112,55 é legal por desconformidade com o disposto no n.º2 artigo 34.º do CIRC (actual artigo 39.º n.º4).

 Quanto à provisão relativa à B (posteriormente B2), embora a Requerente tenha em sede graciosa (artigo 97 do Recurso Hierárquico) (Documento n.º 6 anexo à petição inicial) defendido que aquela entidade se tinha tornado insolvente, situação abrangida pelo artigo 39.º do CIRC (à data dos factos controvertidos e actual 41.º do CIRC), não existe qualquer prova nesse sentido. Assim, pelos mesmos fundamentos que foram utilizados para a C o ajustamento efectuado pela Autoridade Tributária e Aduaneira no montante de € 31.659,95 é legal por desconformidade com o disposto no artigo 34.º, n.º 2, do CIRC.

Improcede, assim, o pedido de pronúncia arbitral, nesta parte.

 

D.4. Questão da correcção referente às provisões relativas a créditos de cobrança sem prova de esforço de cobrança (€ 15.599,12)

 

No que concerne a esta correcção, a Requerente afirma que o valor constituído diz respeito a imparidades relacionadas com créditos resultantes da actividade normal e que possam ser considerados de cobrança duvidosa e que essas imparidades são dedutíveis fiscalmente de acordo com o que está previsto nos artigos 35.º e 36.º do CIRC (artigo 81.º da petição inicial).

 Refere ainda a Requerente que esclareceu a AT que mantinha fortes relações comerciais com as empresas devedoras e por isso o esforço de cobrança não era muito agressivo, tendo comprovado através de correio electrónico e avisos de pagamento que foram realizadas essas diligências (artigo 92.º da petição inicial).

O artigo 35.º, n.º 1, do CIRC, na redacção vigente em 2008, estabelecia o seguinte:

 

Para efeitos da constituição da provisão prevista na alínea a) do n.º 1 do artigo anterior, são créditos de cobrança duvidosa aqueles em que o risco de incobrabilidade se considere devidamente justificado, o que se verifica nos seguintes casos:

a) O devedor tenha pendente processo especial de recuperação de empresa e protecção de credores ou processo de execução, falência ou insolvência;

b) Os créditos tenham sido reclamados judicialmente;

c) Os créditos estejam em mora há mais de seis meses desde a data do respectivo vencimento e existam provas de terem sido efectuadas diligências para o seu recebimento.

 

Não se fez prova de que tivessem sido realizadas diligências especificamente visando o recebimento das quantias relativas aos créditos a que se refere esta correcção.

Para além disso, de um dos créditos é devedora a Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária, estando afastada a possibilidade constituição de provisões, por força do disposto no artigo 35.º, n.º 3, alínea a), do CIRC, na redacção vigente em 2008, que exclui tal possibilidade em relação ao Estado. ( [3] )

Assim, não ficou demonstrado que a correcção da matéria tributável da Requerente referente às provisões relativas a créditos de cobrança sem prova de esforço de cobrança enferme de qualquer vício acto de liquidação, pelo que tem de improceder o pedido de pronúncia arbitral, nesta parte.

 

D.5. Questão da correcção referente às provisões constituídas em 2008 de cobrança sem prova de esforço de cobrança (€ 45.459,16)

 

A Autoridade Tributária e Aduaneira entendeu que não existia na contabilidade da Requerente prova da existência dos créditos indicados na alínea jj) da matéria de facto fixada, no valor global de € 45.459,16.

A Requerente defende que, de acordo com o artigo 34.º do CIRC, o contribuinte pode provisionar por inteiro o valor dos créditos devedores quando sobre estes se encontre pendente um processo judicial, já não sendo assim quando relativamente ao montante total ou parcial do crédito haja já sido constituída provisão em anos anteriores (artigos 82 a 84 da petição inicial).

A Autoridade Tributária e Aduaneira defende que o montante referido diz respeito a clientes que não estão identificados quer no balancete analítico final quer nos extractos apresentados à IT, cfr. artigos 57.º a 61.º da Resposta. Relativamente a três clientes: D; E e F, foram prestados esclarecimentos por parte da Requerente, mas que em nada vieram alterar as conclusões da IT quantos aos ajustamentos positivos a efectuar em sede de provisões (artigos 62.º a 64.º da Resposta).

Não se fez qualquer prova que demonstre qualquer erro na posição da Autoridade Tributária e Aduaneira.

Designadamente, no que concerne às empresas referidas pela Autoridade Tributária e Aduaneira, que a Requerente indicou durante a inspecção tributária (página 14 do RIT), os créditos das duas últimas não constam sequer da lista que consta da alínea jj) da matéria de facto fixada.

Por outro lado quanto ao crédito da empresa D, apesar de a Autoridade Tributária e Aduaneira ter aceite no RIT que ele existe, por ter sido dado como provado numa sentença de 20-4-2009, esse crédito não se encontrava evidenciado na contabilidade como sendo de cobrança duvidosa, o que é requisito para poder ser objecto de provisão, como decorre da parte final da alínea a) do n.º 1 do artigo 34.º do CIRC, na redacção vigente em 2008.

Por isso, não merece censura a actuação da Autoridade Tributária e Aduaneira quanto a esta correcção, pelo que improcede o pedido de pronúncia arbitral, nesta parte.

 

D.6. Questão da correcção relativa à indispensabilidade dos custos (€ 26.590,76)

 

A Autoridade Tributária e Aduaneira entendeu que várias despesas que a Requerente considerou como custos não eram indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a IRC, pelo que efectuou correcções.

A Requerente não discorda integralmente da posição assumida pela Autoridade Tributária e Aduaneira, mas defende que o conceito de indispensabilidade, utilizado no artigo 23.º, n.º 1, do CIRC, é um conceito indeterminado, que requer uma análise casuística, relativamente a cada custo incorrido e suportado por um contribuinte e que a dedutibilidade fiscal de um custo terá que ser feita em função da actividade societária, isto é, em função do objecto social prosseguido por esse contribuinte. Deste modo, a dedutibilidade fiscal de um custo dependerá da relação causal e justificada com a actividade da empresa (artigos 94.º e 95.º da petição inicial).

Assim, a Requerente defende que deve considerar-se provada essa indispensabilidade relativamente aos custos suportados com a aquisição de filmes e livros necessários à investigação e crescimento da sua actividade com o objectivo de melhorar a sua competitividade acima referida, atendendo ao seu escopo social, que é desenvolvimento de acções de marketing, que se traduz em criação de valor da actividade desenvolvida por um cliente e a satisfação deste, de que decorre a necessidade de se manter actualizada no que toca à definição de estratégias, criação de produtos e serva (artigos 96.º a 99.º da petição inicial).

Defende ainda a Requerente que deve ser considerado como custo a despesa suportada com a oferta de um vídeo a dois clientes com os quais mantém relações comerciais assim como de outros bens, pois a lei fiscal e contabilística contempla a existência de despesas de representação que nomeadamente têm a ver com encargos suportados pelos contribuintes com oferta a clientes, que não são mais do que uma forma de fidelização e conservação dos mesmos, (artigos 100.º a 106.º da petição inicial).

No RIT entendeu-se que estas despesas que a Requerente refere, no montante de € 559,75, relativos a um vídeo de um casamento, no montante de € 480,00, e de filmes e livros oferecidos, no montante de 79,75, não podem ser aceites como custos.

O artigo 23.º, n.º 1, do CIRC, na redacção vigente em 2008, estabelece que «consideram-se custos ou perdas os que comprovadamente forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora».

Como se depreende da inclusão daquela palavra «comprovadamente», despesas efectuadas não podem ser aceites custos apenas por serem do tipo de despesas que uma empresa possa realizar no âmbito do seu objecto social, sendo necessário que se prove, pelo menos, alguma relação das despesas com a actividade geradora dos proveitos, que permita considerar tais despesas como actos de gestão da empresa.

A apreciação casuística da indispensabilidade de cada custo, que a Requerente defende que se deve fazer, tem como corolário que cada uma das situações controvertidas tenha de ser analisada individualmente.

No caso em apreço, apesar de ter sido questionada justificadamente pela Autoridade Tributária e Aduaneira, na inspecção tributária, a indispensabilidade das despesas referidas para a formação dos proveitos, por poderem ter natureza lúdica sem relação com a actividade comercial da Requerente, esta nem quanto aos filmes e livros em causa nem quanto ao vídeo do casamento fez qualquer prova de que estivessem relacionados com qualquer projecto ou com qualquer cliente, pelo que não se pode dar como comprovada a indispensabilidade de tais despesas para a formação dos proveitos ou para manter a fonte produtora.

Por isso, não merece censura a actuação da Autoridade Tributária e Aduaneira, neste ponto, pelo que improcede o pedido de pronúncia arbitral, na parte respectiva.

 

D.7. Questão da notificação para o início do procedimento de inspecção tributária  

 

Defende a Requerente que o procedimento de inspecção teve início em 22-7-2011, sendo a Requerente notificada em Janeiro de 2012, pelo que não foi observado o disposto no artigo 49.º, n.º 1, do RCPIT (Regime Complementar do Procedimento de Inspecção Tributária) que estabelece que «o procedimento externo de inspecção deve ser notificado ao sujeito passivo ou obrigado tributário com uma antecedência mínima de cinco dias relativamente ao seu início» (artigos 107.º a 111.º da petição inicial).

A Autoridade Tributária e Aduaneira respondeu, dizendo que o início da inspecção ocorre com a assinatura da ordem de serviço e sua entrega ao sujeito passivo, por força do disposto no artigo 51.º, n.ºs 1 e 2, do RCPIT.

O artigo 51.º, n.ºs 1 e 2, do RCPIT estabelece que «da ordem de serviço ou do despacho que determinou o procedimento de inspecção será, no início deste, entregue uma cópia ao sujeito passivo ou obrigado tributário, excepto nas situações previstas no n.º 6 do artigo 46.º» e que «o sujeito passivo ou obrigado tributário ou o seu representante deve assinar a ordem de serviço indicando a data da notificação, a qual, para todos os efeitos, determina o início do procedimento externo de inspecção».

Como resulta deste n.º 2, é a data da assinatura da ordem de serviço relativa a inspecção que «para todos os efeitos, determina o início do procedimento externo de inspecção».

A data em que foi assinada a ordem de serviço pelo sócio gerente da Requerente foi 8-2-2012 (em 25-1-2012 foi expedida a carta junta à petição inicial como documento n.º 16, mas a assinatura da ordem de serviço, que determina o início da inspecção foi em 8-2-2012)), como se comprova pela notificação que consta da página 4 do documento junto com a Resposta da Autoridade Tributária e Aduaneira com a designação «Notificações Procedimento Inspectivo.pdf» – alínea f) da matéria de facto fixada].

Assim, o artigo 49.º do RCPIT não prevê uma notificação do início da inspecção, mas sim uma «notificação prévia», destinada a prevenir o contribuinte de que será iniciada uma inspecção externa, mas que é irrelevante para determinar o início da inspecção, já que, como resulta com clareza do n.º 2 do artigo 51.º do RCPIT, «para todos os efeitos», o início só ocorre com a assinatura da notificação e entrega da ordem de serviço.

Por outro lado, como decorre da própria afirmação da Requerente de que a carta expedida nos termos do artigo 49.º foi por si recebida em Janeiro de 2012, a comunicação de que iria ser efectuada a inspecção ocorreu mais de cinco dias anteriores do seu início, que veio a ocorrer em 8-2-2012.

Assim, não ocorre o alegado vício de ter sido iniciada a inspecção externa antes de ter sido notificada a Requerente ou não ter sido observado o prazo previsto no n.º 1 do artigo 49.º do RCPIT.

 

D.8. Questão da caducidade por existir erro evidenciado na declaração

 

A matéria de facto fixada mostra que ocorreram irregularidades na escrita da Requerente relativa ao ano de 2008, imputáveis ao Técnico Oficial de Contas que então tinha encarregado de tratar da sua escrita.

A Requerente faz referência ao artigo 45.º, n.º 2, da LGT, em que se prevê um prazo de caducidade do direito de liquidação reduzido, para os casos de erros evidenciados na declaração, pelo que é de equacionar a questão da aplicação do prazo de caducidade do direito de liquidação de três anos, previsto nesta norma, por os erros do Técnico Oficial de Contas serem enquadráveis no artigo 45.º, n.º 2, da LGT, que estabelece o seguinte:

 

Nos casos de erro evidenciado na declaração do sujeito passivo ou de utilização de métodos indirectos por motivo da aplicação à situação tributária do sujeito passivo dos indicadores objectivos da actividade previstos na presente lei, o prazo de caducidade referido no número anterior é de três anos.

 

            Como se vê, este prazo é aplicável aos casos em que há erro na declaração apresentada pelo sujeito passivo e esses erros são detectáveis pela própria declaração, sem fazer apelo a quaisquer outros documentos ou diligências, sendo esse o sentido da expressão «evidenciado».

No caso em apreço, não há qualquer razão para crer que os erros que foram encontrados na escrita da Requerente fossem detectáveis apenas com exame das declarações que apresentou relativas ao ano de 2008, quer para efeitos de IVA quer de IRC, demonstrando, antes, a matéria de facto fixada que foram encontrados erros através da análise da escrita da Requerente e, alguns deles, nem mesmo pela própria Requerente foram indicados inicialmente, só tendo sido numa fase posterior ao início da inspecção.

O que justifica o encurtamento do prazo de caducidade é a especial facilidade de detecção dos erros através das declarações, com dispensa da realização de diligências, designadamente sem necessidade de exame à escrita.

No caso presente, é manifesto que só com o exame à escrita foi possível apurar a matéria de facto necessária para as correcções efectuadas e, mesmo após tal exame, há controvérsia entre a Requerente e Autoridade Tributária e Aduaneira sobre a realidade contabilística da Requerente.

Por outro lado, sendo a facilidade ou não da percepção dos erros pela Autoridade Tributária e Aduaneira que justifica o encurtamento do prazo, não há que considerar como erros evidenciados na declaração todos os casos em que a declaração é apresentada por técnico oficial de contas, pois a perceptibilidade dos erros não tem qualquer relação com a qualidade do signatário.

Por isso, não pode deixar de se concluir que em nenhum dos casos em que foram efectuadas correcções se está perante situação de erro evidenciado nas declarações, pelo que não pode ser aplicado o prazo de caducidade previsto no n.º 2 do art. 45.º da LGT.

           

D.9. Questão do decurso do prazo de caducidade

 

Pelo que se refere no ponto anterior, é aplicável ao caso dos autos o prazo de caducidade de quatro anos, previsto no n.º 1 do artigo 45.º da LGT.

O n.º 4 do mesmo artigo estabelece que «o prazo de caducidade conta-se, nos impostos periódicos, a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário e, nos impostos de obrigação única, a partir da data em que o facto tributário ocorreu, excepto no imposto sobre o valor acrescentado e nos impostos sobre o rendimento quando a tributação seja efectuada por retenção na fonte a título definitivo, caso em que aquele prazo se conta a partir do início do ano civil seguinte àquele em que se verificou, respectivamente, a exigibilidade do imposto ou o facto tributário».

Assim, tanto em relação ao IRC como ao IVA o prazo de caducidade conta-se desde 1-1-2009.

As liquidações foram efectuadas em 18-7-2012 e 23-7-2012 [alíneas jjj) e kkk) da matéria de facto fixada], pelo que foram efectuadas dentro do prazo de quatro anos previsto no n.º 1 do artigo 45.º da LGT e foram notificadas antes do fim desse ano, como se infere do facto de em 28-11-2012, a Requerente ter apresentado reclamações graciosas das liquidações [alínea lll) da matéria de facto fixada].

 Assim, mesmo sem considerar a suspensão do prazo de caducidade derivada do início da inspecção, nos termos do artigo 46.º, n.º 1, da LGT, tem de se concluir que não ocorreu a caducidade o do direito de liquidação, pois as liquidações foram notificadas dentro do prazo de quatro anos contado do início do ano civil subsequente àquele em que ocorreram os factos tributários.

 

D.10. Deficiência de fundamentação da notificação do início da inspecção

 

A Requerente defende que ocorreu violação do dever de fundamentação, por a notificação do início da inspecção não estar fundamentada, o que entende violar o artigo 77.º da LGT.

No entanto, nenhuma das normas deste artigo 77.º impõe a fundamentação das notificações do início da inspecção tributária ou de qualquer outro procedimento tributário, mas apenas da «decisão de procedimento», como decorre do teor expresso do seu n.º 1.

Por isso, não há preterição de qualquer formalidade legal derivada de omissão de fundamentação da notificação do início da inspecção.

 

 

D.11. Deficiência de notificação do Relatório da Inspecção Tributária

 

A Requerente imputa vício de deficiência de fundamentação ao RIT, designadamente o que concerne às correcções em matéria de IVA.

O artigo 77.º, n.º 1, da LGT estabelece que «a decisão de procedimento é sempre fundamentada por meio de sucinta exposição das razões de facto e de direito que a motivaram, podendo a fundamentação consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas, incluindo os que integrem o relatório da fiscalização tributária».

O Supremo Tribunal Administrativo tem vindo a entender que a fundamentação do acto administrativo ou tributário é um conceito relativo que varia conforme o tipo de acto e as circunstâncias do caso concreto, mas que a fundamentação é suficiente quando permite a um destinatário normal aperceber-se do itinerário cognoscitivo e valorativo seguido pelo autor do acto para proferir a decisão, isto é, quando aquele possa conhecer as razões por que o autor do acto decidiu como decidiu e não de forma diferente, de forma a poder desencadear dos mecanismos administrativos ou contenciosos de impugnação. ( [4] )

No caso em apreço, o Relatório da Inspecção Tributária tem uma fundamentação extensa, explicando pormenorizadamente cada uma das correcções efectuadas.

No que concerne às correcções em matéria de IVA, não se explicam as razões específicas de cada uma, por se fazerem remissões para as correcções efectuadas em matéria de IRC, dizendo-se, na página 21 do RIT, o seguinte:

«No ponto A.2.4, foram elencados custos, que em sede de IRC, não podem ser considerados no cálculo do lucro tributável. Em sede de IVA, os artigos 19 a 21 do código estabelecem quais as operações que conferem direito à dedução.

Pelo que, considerando que as despesas elencadas não serviram os objectivos da empresa, por se tratar da aquisição de bens ou serviços que não contribuíram para a realização de operações tributáveis, então o imposto nelas contido não é dedutível».

(...)

À semelhança do que aconteceu em sede de IRC, a existência de lançamentos duplicados de facturas implica uma correcção do imposto liquidado a favor do sujeito passivo. De acordo com o demonstrado no quadro presente no ponto A.2.5, a correcção atinge um total de 2.509,29 euros, sendo por período(...)

(...)

Os documentos contabilizados com valores incorrectos, mencionados no ponto A.2.5, que tal como demonstrado atingem um valor de 1.067,24 euros, apresentam o seguinte valor de correcção por período (...)

 

As remissões são explicitamente admissíveis na fundamentação dos actos tributários, à face do n.º 1 do artigo 77.º da LGT, que até as admite para documentos exteriores ao próprio acto decisório («pareceres, informações ou propostas, incluindo os que integrem o relatório da fiscalização tributária»), pelo que, por evidente maioria de razão, serão admissíveis remissões para partes diferentes do próprio acto que decide o procedimento tributário.

 Ora, através das remissões referidas percebem-se perfeitamente quais as razões que justificaram as correcções em matéria de IVA para que não é invocada uma fundamentação específica, que consistem em os factos indicados nessas remissões que foram considerados relevantes para justificarem correcções da matéria tributável de IRC, a favor da Requerente (facturas e duplicado indicadas no ponto A.2.5 do RIT) e contra a Requerente (custos indicados no ponto A.2.4 do RIT), serem também considerados como relevantes para efeitos de IVA, também a favor e contra a Requerente.

Por isso, não ocorre o invocado vício de falta de fundamentação do Relatório da Inspecção Tributária nem dos subsequentes actos de liquidação.

 

D.12. Questão dos juros compensatórios

 

A Requerente defende que não devem ser-lhe exigidos juros compensatórios por não ter agido com culpa, já que as irregularidades de escrita que estão subjacentes às correcções efectuadas pela Autoridade Tributária e Aduaneira são imputáveis ao técnico oficial de contas que prestou serviço à Requerente até ao final de Agosto de 2008.

O artigo 35.º, n.º 1, da LGT estabelece que «são devidos juros compensatórios quando, por facto imputável ao sujeito passivo, for retardada a liquidação de parte ou da totalidade do imposto devido ou a entrega de imposto a pagar antecipadamente, ou retido ou a reter no âmbito da substituição tributária».

A responsabilidade objectiva é excepcional, só ocorrendo nos casos especificados na lei (art. 483.º, n.º 2, do CC) e, por isso, deverá entender-se que, para efeitos de responsabilidade por juros compensatórios, só se está perante um «facto imputável ao sujeito passivo» quando puder formular-se um juízo de censura em relação à conduta do próprio sujeito passivo.

Por outro lado, se é certo que, relativamente à responsabilidade pelo cumprimento de obrigações vigora no direito civil uma regra de responsabilidade do devedor «pelos actos dos representantes legais ou das pessoas que utilize para o cumprimento da obrigação, como se tais actos fossem praticados pelo próprio devedor» (artigo 800.º, n.º 1, do Código Civil), que será subsidiariamente aplicável em matéria de responsabilidade pelo cumprimento das obrigações tributárias ( [5] ), também o é que, no específico caso da responsabilidade por juros compensatórios, o referido artigo 35.º, n.º 1, da LGT afasta a aplicabilidade daquela regra, ao restringir a responsabilidade aos casos em que o facto é imputável ao sujeito passivo. Isto é, à face deste regime legal, a responsabilidade do sujeito passivo pelas próprias obrigações tributárias não depende de culpa sua, mas já depende desta a responsabilidade por juros compensatórios.

Nesta linha, o Supremo Tribunal Administrativo tem vindo a entender, uniformemente, que a imputabilidade exigida para responsabilização pelo pagamento de juros compensatórios depende da existência de culpa, por parte do contribuinte. ( [6] )

Como actos imputáveis aos contribuintes, para efeitos de responsabilidade por juros compensatórios, devem considerar-se os praticados pelos técnicos oficiais de contas com o seu acordo expresso ou tácito, sendo admissível também a imputabilidade ao contribuinte nos caso de existir culpa in eligendo, justificada pelo facto de que o contribuinte ter uma relativa liberdade para escolher os técnicos oficiais de contas.

No caso em apreço não ficaram demonstrados factos que permitam formular um juízo de censura em relação à actuação da Requerente que viabilize a imputação de responsabilidade por juros compensatórios.

Efectivamente, resulta da matéria de facto fixada que as irregularidades de escrita referidas no RIT detectadas até ao final de Agosto de 2008 são imputáveis a actuação deficiente do técnico oficial de contas N, actuando em nome próprio e através da empresa O [alíneas g), h), e i) da matéria de facto fixada].

A contabilidade constitui uma matéria de natureza extremamente técnica e de grande complexidade, pelo que não era exigível à Requerente que tivesse outro comportamento que não fosse encarregar do tratamento da sua escrita uma das pessoas oficialmente habilitadas a exercer essa tarefa.

Tratando-se de um técnico oficial de contas, habilitado legalmente a exercer a sua actividade, que é controlada por uma entidade reguladora e fiscalizadora, não era de exigir à Requerente que se apercebesse antecipadamente, ou até que suspeitasse, da eventual falta de idoneidade ou competência daquele técnico para o exercício das funções, pelo que não se vislumbra fundamento para lhe imputar culpa in eligendo, relativamente à escolha daquele técnico para assegurar o cumprimento das obrigações contabilísticas no início de 2008. Na verdade, não se fez qualquer prova de que, até ao ano de 2008, a Requerente pudesse ter qualquer razão para suspeitar da idoneidade e competência do referido técnico oficial de contas para exercer as funções que lhe confiou, tendo-se mesmo provado que foram problemas pessoais ocorridos no ano de 2008, que afectaram o seu comportamento profissional [alínea ppp) da matéria de facto fixada].

Por outro lado, se é certo que, já depois de ter constatado as deficiências de escrita que levaram à substituição daquele técnico oficial de contas a partir de Setembro de 2008, a Requerente voltou a utilizar os seus serviços para o encerramento das contas relativas a esse ano, também o é que resultou da prova testemunhal que a Requerente não teve outra alternativa, por a empresa que se encarregou da contabilidade a partir de Setembro daquele ano se ter justificadamente recusado a fazer o encerramento das contas, em face das dúvidas que lhe suscitava a escrita relativa aos oito primeiros meses daquela ano.

Nestas condições não se vislumbra como possa formular-se um juízo de censura à Requerente, por terem sido tardiamente liquidados os impostos referidos nos autos.

Por isso, por falta de culpa da Requerente, não lhe pode ser imposto o pagamento de juros compensatórios.

Assim, procede o pedido de pronúncia arbitral nesta parte, justificando-se a anulação dos actos impugnados na parte relativa à liquidação de juros compensatórios.

 

D.13. Juros de mora

 

O juízo de procedência do pedido de pronúncia arbitral atrás formulado refere-se apenas aos juros compensatórios, não abrangendo os juros de mora liquidados, pois não é imputado qualquer vício à respectiva liquidação.

No entanto, tendo os juros de mora incidido não só sobre as quantias liquidadas a título de IRC, mas também sobre as quantias liquidadas a título dos respectivos juros compensatórios, a procedência do pedido de pronúncia arbitral quanto à liquidação de juros compensatórios implica uma anulação parcial dos juros de mora, na respectiva proporção.

Por isso, justifica-se a anulação parcial da liquidação de juros de mora, na parte em que incidiram sobre a quantia de € 8.111,01, relativa a juros compensatórios de IRC.

 

E. Decisão

 

   De harmonia com o exposto, acordam neste Tribunal Arbitral em:

 

a) Julgar parcialmente improcedente o pedido de pronúncia arbitral, quanto à liquidação de IRC e IVA;

b) Julgar parcialmente procedente o pedido de pronúncia arbitral quanto à liquidação de juros compensatórios;

c) Julgar parcialmente procedente o pedido de pronúncia arbitral quanto aos juros de mora, na parte em que estes incidiram sobre juros compensatórios;

c) Anular a liquidação de juros compensatórios n.º 2012 ..., montante de € 8.111,01 (oito mil, cento e onze euros e um cêntimo);

d) Anular as liquidações de juros compensatórios n.ºs ...38, ...40, ...42, ...44, ...46, ...48 e ...50, no montante total de € 10.868,61 (dez mil, oitocentos e sessenta e oito euros e sessenta e um cêntimos).

e) Anular parcialmente a liquidação de juros de mora n.º 2012...., na percentagem de 19,665%, isto é, quanto à quantia de € 4,35;

f) Absolver a Administração Aduaneira do pedido nas partes em que não é decidida a anulação das liquidações.

 

 

F. Valor do processo

 

De harmonia com o disposto no art. 306.º, n.º 2, do CPC e 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária fixa-se ao processo o valor de € 146.709,99.

 

G. Custas

Nos termos do art. 22.º, n.º 4, do RJAT, fixa-se o montante das custas em € 3.060.00, nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, a cargo da Requerente na percentagem de 87,061% e a cargo da Autoridade Tributária e Aduaneira na percentagem de 12,939%.

 

Lisboa, 20 de Março de 2014

 

Os Árbitros

 

 

 

(Jorge Manuel Lopes de Sousa)

 

 

 

 

 

(Clotilde Celorico Palma)

 

 

 

 

 

 

(Júlio Tormenta)



( [1] )          A Requerente indica € 62.187,83, mas o montante exacto da soma das liquidações de IVA impugnadas é de € 62.185,83.

( [2] )          O cálculo do valor de € 113.727,70 encontra-se descrito nas fls. 8 do RIT pé de página relativo ao Ponto A.2.1.

( [3] )          A Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária é um serviço central da administração directa do Estado, dotado de autonomia administrativa, como estabelece o artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 77/2007, de 29 de Março.

( [4] )       Essencialmente neste sentido, podem ver-se os seguintes acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo:

– de 25-2-1993, proferido no recurso n.º 30682, publicado no Apêndice ao Diário da República de 14-8-96, página 1168;

– de 31-5-1994, proferido no recurso n.º 33899, publicado no Apêndice ao Diário da República de 31-12-96, página 4331;

– de 4-5-1995, proferido no recurso n.º 28872, publicado no Boletim do Ministério da Justiça n.º 447, página 217, e no Apêndice ao Diário da República de 20-1-98, página 3831;

– de 29-6-1995, proferido no recurso n.º 36098, publicado no Apêndice ao Diário da República de 20-1-98, página 5782;

– de 7-12-1995, proferido no recurso n.º 36103, publicado no Apêndice ao Diário da República de 30-4-98, página 9649;

– de 10-10-1996, proferido no recurso n.º 36738, publicado no Apêndice ao Diário da República de 15-4-99, página 6634;

– de 2-12-1997, proferido no recurso n.º 37248, publicado no Apêndice ao Diário da República de 25-9-2001, página 8477

– de 4-11-1998, proferido no recurso n.º 40618;

– de 10-3-1999, proferido no recurso n.º 32796;

– de 6-6-1999, proferido no recurso n.º 42142;

– de 9-2-2000, proferido no recurso n.º 44018;

– de 28-3-2000, proferido no recurso n.º 29197;

– de 16-3-2001, do Pleno, proferido no recurso n.º 40618;

– de 14-11-2001, proferido no recurso n.º 39559;

– de 18-12-2002, proferido no recurso n.º 48366.

( [5] )          Aliás, a responsabilidade do sujeito passivo pelo cumprimento das obrigações tributárias, mesmo nos casos de «violação pelos técnicos oficiais de contas dos deveres de assunção de responsabilidade pela regularização técnica nas áreas contabilística e fiscal ou de assinatura de declarações fiscais, demonstrações financeiras e seus anexos» está ínsita no n.º 3 do art. 24.º da LGT, em que se prevê que, nestes casos, a responsabilidade destes técnicos é meramente subsidiária, não excluindo a responsabilidade originária dos próprios contribuintes.

( [6] )          Neste sentido, podem ver-se os seguintes acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo:

– de 20-3-1996, processo n.º 20042, publicado em Apêndice ao Diário da República de 13-3-1998, página 1067;

– de 2-10-1996, processo n.º 20605, publicado em Apêndice ao Diário da República de 28-12-1998, página 2707;

– de 18-2-1998, processo n.º 22325, publicado em Apêndice ao Diário da República de 8-11-2001, página 553;

– de 3-10-2001, processo n.º 25034, publicado em Acórdãos Doutrinais do Supremo Tribunal Administrativo, n.º 492, página 1615, e publicado em Apêndice ao Diário da República de 13-10-2003, página 2080;

– de 29-1-2003, processo n.º 1647/02, publicado em Apêndice ao Diário da República de 25-3-2004, página 164;

– de 12-3-2003, processo n.º 26800, publicado em Acórdãos Doutrinais do Supremo Tribunal Administrativo, n.º 506, 219 e publicado em Apêndice ao Diário da República de 25-3-2004, página 545;

– de 19-11-2008, processos n.ºs 325/08 e 576/08;

– de 11-3-2009, processo n.º 961/08.