Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 29/2014-T
Data da decisão: 2014-09-14  Selo  
Valor do pedido: € 12.167,10
Tema: IS – Verba 28.1 TGIS – Propriedade vertical
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DECISÃO ARBITRAL

CAAD: Arbitragem Tributária

Processo n.º 29/2014-T

 

1.      RELATÓRIO

 

1.1.  A, Lda., contribuinte n.º…, com sede …, vem, nos termos do artigo 10.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (“RJAT”), requerer a constituição de Tribunal Arbitral.

 

A Requerente pede pronúncia com vista à declaração de ilegalidade dos actos tributários de liquidação de Imposto do Selo, emitidos pela Autoridade Tributária e Aduaneira, no valor de€ 12.167,10 (“Actos tributários contestados”).

 

A Requerente peticiona, ainda, a condenação da Autoridade Tributária e Aduaneira no pagamento de indemnização por prestação de garantia indevida, ao abrigo do artigo 53.º da Lei Geral Tributária (“LGT”) e 171.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (“CPPT”).

 

A Requerente considera que os actos tributários de liquidação de Imposto do Selo, subjacentes às notificações mencionadas, devem ser anulados porquanto se encontram inquinados por erro nos pressupostos de direito, porquanto o Valor Patrimonial Tributário (“VPT”) relativo a cada um dos andares ou divisões susceptíveis de utilização independente, com afectação habitacional, que constituem o imóvel inscrito no artigo … (extinto …) da matriz predial urbana da freguesia …, concelho de …, é inferior a € 1.000.000.

 

Neste domínio, a Requerente salienta que as próprias liquidações de Imposto do Selo demonstram que o valor de incidência é o correspondente ao VPT de cada uma das divisões e a liquidação individualizada sobre a parte do prédio correspondente a essa mesma divisão.

 

Ademais, se a legislação impõe a emissão de liquidações individualizadas para as partes autónomas dos prédios em propriedade vertical, nos mesmos moldes em que estabelece para os prédios em propriedade horizontal, haverá que atender a este critério para a definição da regra de incidência do Imposto do Selo.

 

Por conseguinte, a Requerente considera que só haveria incidência de Imposto do Selo se alguma das partes, andares ou divisões de utilização independente apresentasse um VPT superior a € 1.000.000.

 

A Requerente defende que a Autoridade Tributária e Aduaneira não poderia considerar como valor de referência para a incidência de imposto o valor total do prédio, quando o próprio legislador estabeleceu regra diferente em sede de Imposto Municipal sobre Imóveis (“IMI”), sendo este o regime aplicável às matérias não reguladas no que toca à verba 28 da Tabela Geral de Imposto do Selo (TGIS).

 

A Requerente considera que a interpretação efectuada pela Autoridade Tributária e Aduaneira não encontra sustentação legal e é contrária ao critério que resulta aplicável em sede de IMI e, por remissão, em matéria de Imposto do Selo, concluindo pela violação dos princípios da legalidade e da igualdade fiscal, e do princípio da prevalência da verdade material sobre a realidade jurídico-formal.

 

1.2.  A Autoridade Tributária e Aduaneira respondeu, não suscitando qualquer questão prévia e defendendo, quanto ao mérito da pretensão da Requerente, que o pedido formulado não deve proceder.

 

A Autoridade Tributária e Aduaneira contesta a posição da Requerente uma vez que, na sua opinião, embora a liquidação de Imposto do Selo, nas situações previstas na verba 28.1 da TGIS, se processe de acordo com as regras do Código do IMI, a verdade é que o legislador ressalva os aspectos que careçam das devidas adaptações, como é o caso dos prédios em propriedade total, ainda que com andares ou divisões susceptíveis de utilização independente, pois, não obstante o IMI seja liquidado relativamente a cada parte susceptível de utilização independente, para efeitos de Imposto do Selo releva o prédio na sua totalidade, sendo que, à luz do n.º 4 do artigo 2.º do Código do IMI, as divisões susceptíveis de utilização independente não são havidas como prédios, mas apenas as fracções autónomas no regime de propriedade horizontal, conforme o n.º 4 do artigo 2.º do Código do IMI.

 

Por outro lado, a Autoridade Tributária e Aduaneira considera que a previsão da verba 28.1 da TGIS não consubstancia qualquer violação dos princípios constitucionais, mormente do princípio da igualdade, inexistindo qualquer discriminação na tributação de prédios constituídos em propriedade horizontal e prédios em propriedade total com andares ou divisões susceptíveis de utilização independente, ou entre prédios com afectação habitacional e prédios com outras afectações.

 

 

1.3.   Após ouvidas as partes, foi decidido não se realizar a reunião a que alude o artigo 18.º do RJAT, não tendo, igualmente, havido lugar à apresentação de alegações.

 

 

2.      SANEAMENTO

O tribunal foi regularmente constituído e é competente em razão da matéria, em conformidade com o artigo 2.º do RJAT.

As partes têm personalidade e capacidade judiciárias, mostram-se legítimas e encontram-se regularmente representadas (cf. artigos 4.º e 10.º, n.º 2 do RJAT e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março).

Não foram identificadas nulidades no processo.

3.        FUNDAMENTAÇÃO

 

3.1.  Matéria de facto

 

3.1.1.      Factos que se consideram provados

 

a)    A Requerente é proprietária do prédio urbano sito na Rua …, n.º .., …, inscrito no artigo … (extinto …) da matriz predial urbana da freguesia da …, concelho de … (documento n.º 2, junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);

 

b)   Em 2012, o prédio em causa era constituído por treze andares ou divisões susceptíveis de utilização independente e tinha um VPT total de € 1.289.820,00 (documento n.º 3, junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);

 

c)    Dos referidos andares ou divisões susceptíveis de utilização independente, doze áreas ou divisões (in casu, as áreas ou divisões R/C E, R/C D, 1.º D, 1.º E, 2.º D, 2.º E, 3.º D, 3.º E, 4.º D, 4.º E, 5.º D e 5.º E) encontravam-se afectas a habitação e tinham, individualmente, um VPT não superior a € 109.750,00, sendo que o valor total é de 1.216.710,00 (documentos n.º 2 e 3, juntos com o pedido de pronúncia arbitral, e Processo Administrativo, cujo teor se dá como reproduzido);

 

d)   Em 14 de Julho de 2013, a Autoridade Tributária e Aduaneira emitiu, ao abrigo da verba 28.1 da TGIS, as seguintes liquidações de Imposto do Selo relativas a 2012:

 

                                            i.            Liquidação n.º … (…), referente ao andar ou divisão susceptível de utilização independente R/C D, no valor de € 1.040,10;

                                          ii.            Liquidação n.º … (…), referente ao andar ou divisão susceptível de utilização independente R/C E, no valor de € 439;

                                        iii.            Liquidação n.º … (…), referente ao andar ou divisão susceptível de utilização independente 1.º E, no valor de € 1.040,10;

                                        iv.            Liquidação n.º … (…), referente ao andar ou divisão susceptível de utilização independente 1.º D, no valor de € 1.097,50;

                                          v.            Liquidação n.º … (…), referente ao andar ou divisão susceptível de utilização independente 2.º D, no valor de € 1.040,10;

                                        vi.            Liquidação n.º … (…), referente ao andar ou divisão susceptível de utilização independente 2.º E, no valor de € 1.097,50;

                                      vii.            Liquidação n.º … (…), referente ao andar ou divisão susceptível de utilização independente 3.º D, no valor de € 1.040,10;

                                    viii.            Liquidação n.º … (…), referente ao andar ou divisão susceptível de utilização independente 3.º E, no valor de € 1.097,50;

                                        ix.            Liquidação n.º … (…), referente ao andar ou divisão susceptível de utilização independente 4.º D, no valor de € 1.040,10;

                                          x.            Liquidação n.º … (…), referente ao andar ou divisão susceptível de utilização independente 4.º E, no valor de € 1.097,50;

                                        xi.            Liquidação n.º … (…), referente ao andar ou divisão susceptível de utilização independente 5.º D, no valor de € 1.040,10;

                                      xii.            Liquidação n.º … (…), referente ao andar ou divisão susceptível de utilização independente 5.º E, no valor de € 1.097,50;

 

e)    Em finais de 2013, o prédio em questão foi constituído em regime de propriedade horizontal, tendo os treze andares ou divisões susceptíveis de utilização independente dado lugar a treze fracções autónomas (documento n.º 2, junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido).

 

3.1.2.      Factos que se consideram não provados

 

Não há factos relevantes para a decisão que se consideram não provados.

 

3.1.3.      Fundamentação da matéria de facto provada

Os factos provados baseiam-se nos documentos indicados no ponto 3.1.1. acima, cuja autenticidade e correspondência à realidade não foram questionadas.

 

3.2.  Do Direito

 

3.2.1. No que respeita ao mérito da causa, as questões que são objecto do presente processo são as de saber se (i) os Actos tributários contestados padecem de vício de violação de lei por erro nos pressupostos de direito e de inconstitucionalidade ao considerarem o somatório do VPT das áreas com afectação habitacional de prédio urbano em propriedade total, em detrimento do VPT individual de cada andar ou divisão susceptível de utilização independente, com afectação habitacional, para efeitos de incidência de Imposto do Selo previsto na verba 28.1 da TGIS e se (ii) há lugar a indemnização por prestação indevida de garantia.

 

3.2.2. O n.º 1 do artigo 1.º do Código do Imposto do Selo determina que “O imposto do selo incide sobre todos os atos, contratos, documentos, títulos, papéis e outros factos ou situações jurídicas previstos na Tabela Geral, incluindo as transmissões gratuitas de bens.”.

 

 

A verba 28.1 da TGIS, introduzida pelo artigo 4.º da Lei n.º 55-A/2012, de 29 de Outubro, tem, à data dos factos, a seguinte redacção:

 

“Propriedade, usufruto ou direito de superfície de prédios urbanos cujo valor patrimonial tributário constante da matriz, nos termos do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (CIMI), seja igual ou superior a (euro) 1 000 000 – sobre o valor patrimonial tributário utilizado para efeito de IMI:

 

28.1 Por prédio com afetação habitacional: 1%”

 

Do acima exposto resulta que os prédios urbanos (ou seja, “todos aqueles que não devam ser classificados como rústicos”[1]), com afectação habitacional, cujo VPT constante da matriz seja igual ou superior a € 1.000.000,00 ficam sujeitos a Imposto do Selo. A taxa aplicável é, genericamente, de 1% e deve incidir “sobre o valor patrimonial tributário utilizado para efeito de IMI”.

 

Na situação em análise, não há dúvidas que estamos perante um prédio urbano, nos termos consagrados no artigo 6.º do Código do IMI. Em concreto, trata-se de um imóvel constituído por treze andares ou divisões susceptíveis de utilização independente, doze das quais com afectação habitacional, o qual dispõe de um VPT total – ou seja, resultante da soma dos VPT relativos a cada parte autónoma – de € 1.289.820,00.

 

A AT considerou haver incidência de Imposto do Selo ao abrigo da verba 28.1 da TGIS com referência aos doze andares ou divisões susceptíveis de utilização independente com afectação habitacional, em virtude de, embora cada VPT individual variar entre € 43.900e€ 109.750, a soma dos respectivos VPT exceder o limiar de € 1.000.000,00.

 

Neste contexto, urge aferir se, no caso de prédios em propriedade total com andares ou divisões de utilização independente, como se verifica na situação concreta em análise, o VPT a considerar para efeitos de incidência de Imposto do Selo à luz da verba 28.1 da TGIS deve corresponder ao VPT de cada andar ou divisão com afectação habitacional ou, diversamente, ao VPT total do prédio, ou ainda, conforme procedimento adoptado pela AT, à soma dos VPT correspondentes a cada andar ou divisão de utilização independente com afectação habitacional.

 

O artigo 9.º do Código do Imposto do Selo dispõe que o valor tributável a considerar é o que resulta da TGIS.

 

Por seu turno, a verba 28.1 da TGIS refere que o VPT a utilizar na liquidação do Imposto do Selo corresponde ao que resulta das regras previstas no Código do IMI (“sobre o valor patrimonial tributário utilizado para efeito de IMI”).

 

Ademais, o n.º 2 do artigo 67.º do Código do Imposto do Selo prevê expressamente que“Às matérias não reguladas no presente Código respeitantes à verba n.º 28 da Tabela Geral aplica-se, subsidiariamente, o disposto no CIMI”.

 

Por conseguinte, importa atender às regras previstas no Código do IMI.

 

Este compêndio tributário dispõe no seu artigo 7.º que:

 

“1 – O valor patrimonial tributário dos prédios é determinado nos termos do presente Código.

2 – O valor patrimonial tributário dos prédios urbanos com partes enquadráveis em mais de uma das classificações do n.º 1 do artigo anterior determina-se:

(…)

b) Caso as diferentes partes sejam economicamente independentes, cada parte é avaliada por aplicação das correspondentes regras, sendo o valor do prédio a soma dos valores das suas partes.”.

As normas acima elencadas consagram o princípio da autonomização das partes independentes de um prédio urbano, mesmo quando não esteja constituído em propriedade horizontal. Ou seja, cada parte susceptível de utilização independente deve ser, para efeitos de IMI, valorizada em face das suas especificidades e afectação, resultando num VPT autónomo, individualizável e correspondente a cada parte susceptível de utilização independente.

Por seu turno, o n.º 3 do artigo 12.º do Código do IMI determina que “Cada andar ou parte de prédio susceptível de utilização independente é considerado separadamente na inscrição matricial, a qual discrimina também o respectivo valor patrimonial tributário.”.

Mais uma vez, o Código do IMI consagra o princípio da autonomização das partes independentes de um prédio urbano e destaca a segregação/individualização do VPT relativo a cada andar ou parte de prédio susceptível de utilização independente.

Por outro lado, importa trazer à colação o princípio da universalidade do VPT, segundo o qual a avaliação efectuada nos termos do Código do IMI tem plena aplicação nos restantes impostos, incluindo no Imposto do Selo. Há, assim, uma harmonização dos VPT para efeitos de tributação dos rendimentos e da riqueza, nos diversos impostos, no sentido em que o VPT determinado de acordo com as regras consagradas no Código do IMI prevalece para efeitos dos restantes impostos, nomeadamente, no IMT, nos impostos sobre o rendimento e no Imposto do Selo, sem prejuízo de regras especiais aplicáveis.

Portanto, à luz do Código do IMI, cada parte autónoma do imóvel dispõe de VPT próprio, constituindo o valor tributável para efeitos deste imposto, pelo que deve ser esse o valor tributável para efeitos de Imposto do Selo, nomeadamente, no domínio da aplicação da verba 28.1 da TGIS que, de resto, o exige expressamente ao mencionar que o valor a considerar é o“valor patrimonial tributário utilizado para efeito de IMI”.

No que concerne ao artigo 2.º n.º 4 do Código do IMI invocado pela AT para defender que o Imposto do Selo incide sobre o prédio na sua totalidade, uma vez que os andares ou divisões susceptíveis de utilização independente não são havidos como prédio (ao contrário do que acontece com as fracções autónomas), consideramos que o mesmo não deve merecer acolhimento.

Com efeito, a ratio da norma invocada reside no facto de a fracção autónoma poder pertencer a um único proprietário, pelo que à luz das normas previstas no referido compêndio tributário, deve ser tratada como um prédio. Tal não significa que, por oposição, os andares ou divisões de utilização independente tenham um enquadramento fiscal totalmente distinto.

Importa notar que andares ou divisões de utilização independente e fracções autónomas são, em substância, realidades idênticas.

De facto, ambas as realidades – andares ou divisões de utilização independente e fracções autónomas – preenchem os requisitos previstos no artigo 1415.º do Código Civil, a saber, (i) são unidades independentes, (ii) distintas e isoladas entre si e (iii) com saída própria para uma parte comum do prédio ou para a via pública.

Tais realidades divergem apenas em virtude de, no primeiro caso, não ter sido formalizada a constituição do prédio em propriedade horizontal, caso em que não pode haver proprietários distintos para as diferentes áreas, excepto em regime de compropriedade.

Acresce que a posição da AT é incoerente e sem fundamento legal, uma vez que não considera o VPT individual de cada andar ou divisão de utilização independente mas atende à respectiva afectação (in casu, afectação habitacional) para fazer incidir Imposto do Selo.

Por conseguinte, a posição da AT não merece acolhimento.

Posto isto, é de concluir que para efeitos de liquidação do Imposto do Selo previsto na verba 28.1 da TGIS deve ser tido em consideração o VPT determinado de acordo com o Código do IMI, ou seja, no caso concreto de prédios em propriedade total com andares ou divisões de utilização independente, o VPT individual de cada um dos andares ou divisões de utilização independente.

Pelo que se referiu, nenhum dos andares ou divisões de utilização independente do prédio urbano inscrito no artigo … da matriz predial urbana da freguesia da …, propriedade da Requerente, tem um VPT igual ou superior a € 1.000.000,00, pelo que não incide Imposto do Selo ao abrigo da verba 28.1 da TGIS.

À luz do que antecede, as liquidações cuja declaração de ilegalidade é pedida pela Requerente enfermam de vício de violação de lei, por erro nos pressupostos de direito, que justifica a declaração da sua ilegalidade e anulação.

 

 

3.2.3.      Indemnização por garantia indevida   

A Requerente pede ainda indemnização pelos encargos a incorrer com a prestação de garantia com vista a suspensão do processo de execução fiscal.

O artigo 171.º do CPPT prevê que “a indemnização em caso de garantia bancária ou equivalente indevidamente prestada será requerida no processo em que seja controvertida a legalidade da dívida exequenda» e que «a indemnização deve ser solicitada na reclamação, impugnação ou recurso ou em caso de o seu fundamento ser superveniente no prazo de 30 dias após a sua ocorrência.”.

Assim, é inequívoco que o processo de impugnação judicial abrange a possibilidade de condenação no pagamento de garantia indevida e até é, em princípio, o meio processual adequado para formular tal pedido, o que se justifica por evidentes razões de economia processual, pois o direito a indemnização por garantia indevida depende do que se decidir sobre a legalidade ou ilegalidade do acto de liquidação.

O pedido de constituição do tribunal arbitral tem como corolário passar a ser no processo arbitral que vai ser discutida a “legalidade da dívida exequenda”, pelo que, como resulta do teor expresso daquele n.º 1 do referido artigo 171.º do CPPT, é também o processo arbitral o adequado para apreciar o pedido de indemnização por garantia indevida.

Aliás, a cumulação de pedidos relativos ao mesmo acto tributário está implicitamente pressuposta no artigo 3.º do RJAT, ao falar em “cumulação de pedidos ainda que relativos a diferentes actos”, o que deixa perceber que a cumulação de pedidos também é possível relativamente ao mesmo acto tributário e os pedidos de indemnização por juros indemnizatórios e de condenação por garantia indevida são susceptíveis de ser abrangidos por aquela fórmula, pelo que uma interpretação neste sentido tem, pelo menos, o mínimo de correspondência verbal exigido pelo n.º 2 do artigo 9.º do Código Civil.

O artigo 53.º da LGT estabelece que:

1. O devedor que, para suspender a execução, ofereça garantia bancária ou equivalente será indemnizado total ou parcialmente pelos prejuízos resultantes da sua prestação, caso a tenha mantido por período superior a três anos em proporção do vencimento em recurso administrativo, impugnação ou oposição à execução que tenham como objecto a dívida garantida.

            2. O prazo referido no número anterior não se aplica quando se verifique, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços na liquidação do tributo.

            3. A indemnização referida no número 1 tem como limite máximo o montante resultante da aplicação ao valor garantido da taxa de juros indemnizatórios prevista na presente lei e pode ser requerida no próprio processo de reclamação ou impugnação judicial, ou autonomamente.

            4. A indemnização por prestação de garantia indevida será paga por abate à receita do tributo do ano em que o pagamento se efectuou.”

No caso em apreço, o erro que está subjacente aos actos de liquidação de Imposto do Selo é imputável à Autoridade Tributária e Aduaneira, pois a Requerente em nada contribuiu para que esse erro fosse praticado.

Não havendo elementos que permitam determinar o montante da indemnização, a condenação terá de ser efectuada com referência ao que vier a ser liquidado em execução da presente decisão arbitral (artigo 609.º do Código de Processo Civil de 2013, e artigo 565.º do Código Civil).

 

4.        DISPOSITIVO

Face ao exposto, conclui-se assistir razão à Requerente, em consequência, decide-se em:

i)                    julgar procedente o pedido de declaração de ilegalidade e de anulação dos actos tributários de liquidação de Imposto do Selo;

ii)                  julgar procedente o pedido de indemnização por garantia indevida e condenar a Autoridade Tributária e Aduaneira a pagar à Requerente a indemnização que for liquidada em execução da presente decisão arbitral.

 

Valor do processo: fixa-se em € 12.167,10 (doze mil, cento e sessenta e sete euros e dez cêntimos), de harmonia com o disposto no artigo 3.º, n.º 2 do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária (“RCPAT”), no artigo 97.º-A, n.º 1 do Código de Procedimento e de Processo Tributário e no artigo 305.º e seguintes do Código de Processo Civil.

 

Custas: fixa-se em € 918,00 (novecentos e dezoito euros) o valor das custas, nos termos da Tabela I anexa ao RCPAT, a cargo da AT.

* * *

Notifique.

Lisboa, 15 de Setembro de 2014.

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A Árbitro,

Lina Ramalho

 

(O texto da presente decisão foi elaborado em computador, nos termos do artigo 131º, n.º 5 do Código de Processo Civil (ex-138.º, n.º 5), aplicável por remissão do artigo 29.º n.º 1 alínea e) do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (RJAT), regendo-se a sua redacção pela ortografia anterior ao Acordo Ortográfico de 1990.)

 



[1]Cf.artigo 4.º do Código do IMI.