Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 571/2022-T
Data da decisão: 2023-02-21  ISV  
Valor do pedido: € 1.094,51
Tema: ISV – Tributação de veículos usados – Anos de uso por componente.
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SUMÁRIO:

1. A componente cilindrada e a componente ambiental, representada pelas emissões de dióxido de carbono, são critérios objetivos comprovados pelo certificado de conformidade de cada veículo, mas a aplicação conjugada das tabelas de reduções do ISV por anos de uso prevista no n.º 1 do artigo 11.º do CISV não pode onerar mais os veículos usados provenientes de outros Estados Membros do que os veículos nacionais similares, sendo a tributação daí resultante, contrária ao artigo 110º do Tratado de Funcionamento da União Europeia, quando o montante do imposto, calculado sem tomar em conta a depreciação real do veículo, exceda o montante residual do imposto incorporado no valor dos veículos automóveis usados semelhantes já matriculados no território nacional.

2. Cabe ao impugnante provar essa discrepância do montante do imposto, não bastando alegar a mera diferença legislativa entre a tabela de reduções escalonada em dez anos de uso para a cilindrada e a tabela de reduções escalonada em quinze anos de uso para a componente ambiental.   

 

DECISÃO ARBITRAL

I - RELATÓRIO

1. A..., com o número fiscal..., com residência na Rua ..., ..., ...-... Lisboa, nos termos do artigo 2.º, n.º 1, alínea a) do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro, que aprovou o Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, doravante «RJAT», com as alterações subsequentes, apresentou um pedido de pronúncia arbitral em que é requerida, a Autoridade Tributária e Aduaneira (AT), tendo, ao abrigo do disposto no artigo 99.º do Código do Procedimento e Processo Tributário, deduzido impugnação do ato de liquidação do Imposto Sobre Veículos (ISV) de um veículo por si admitido. 

2. O pedido foi apresentado em 28.09.2022, e visa a anulação do ato de indeferimento  do pedido de revisão oficiosa do ISV praticado pelo Diretor da Alfândega de Leixões, em 02.09.2022, relativo à liquidação do ISV, especificamente relativo à componente ambiental, na admissão de um veículo usado, proveniente de um país da União Europeia, de sua propriedade, requerendo a restituição da quantia cobrada em excesso, acrescida dos juros indemnizatórios calculados à taxa legal de 4%, desde a data do pagamento do imposto até à sua efetiva restituição.

3. Nos termos do disposto nos artigos 6.º, n.º 1 e 11.º, n.º 1, alínea a), do RJAT, o Presidente do Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD) nomeou o signatário como árbitro singular em 21.11.2022.

4. Na mencionada data foram as Partes notificadas dessa designação, nos termos conjugados do disposto no artigo 11.º, n.º 1, alínea b) do RJAT, na redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro, com os artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico do CAAD, não tendo as mesmas manifestado a intenção de recusar a designação do árbitro.

5. Em conformidade com o disposto na alínea c), do n.º 1, do artigo 11.º do RJAT, o Tribunal Arbitral Singular foi constituído em 13.12.2022.

6. Nos termos do artigo 17.º, n.ºs 1 e 2 do RJAT, a AT foi notificada, enquanto parte requerida, para no prazo de 30 dias apresentar resposta e, caso entendesse, solicitar a produção de prova adicional, devendo no mesmo prazo ser remetida cópia do processo administrativo. Nessa resposta, em 31.01.2022, a Requerida sustentou a legalidade da liquidação efetuada, tendo concluído pela improcedência do pedido de pronúncia arbitral, tendo remetido simultaneamente cópia do processo administrativo.

7. Em 07.02.2023, as Partes foram notificadas para se pronunciarem sobre a dispensa da reunião a que se refere o artigo 18.º, n.º 1 do RJAT, e alegarem sucessivamente pelo prazo de 5 dias, tendo sido anunciado como data-limite para a prolação do despacho a data de 24.02.2023.

8. Sobre a referida matéria, alegou a Requerida reiterando o pedido de improcedência do pedido de pronúncia arbitral pelas razões enunciadas na resposta já apresentada. 

II - PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS

9. O Tribunal Arbitral encontra-se regularmente constituído, é materialmente competente e as Partes gozam de personalidade e capacidade judiciária, sendo legítimas, à luz dos artigos 4.º e 10.º, n.º 2 do RJAT e do artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março.  

10. O processo não padece de vícios que o invalidem e não existem incidentes que importe resolver nem questões prévias sobre as quais o Tribunal Arbitral se deva pronunciar.

III – DA POSIÇÃO DAS PARTES

11. O Requerente, a fundamentar o pedido de pronúncia arbitral, no essencial, diz o seguinte:

11.1. Admitiu um veículo ligeiro de passageiros da marca «...», modelo G3X, proveniente da República Federal da Alemanha, matriculado pela primeira vez em 06.08.2019, onde circulou com a matrícula ... .

11.2 Para o efeito processou a respetiva Declaração Aduaneira de Veículo (DAV), na Alfândega de Leixões, a que foi atribuído o n.º 2021/..., de 19.05.2021.

11.3. Em resultado da apresentação da referida declaração, a AT liquidou o ISV de 13 464,81 €, correspondendo 3614,24 € à componente cilindrada e 9850,57 € à componente ambiental, o qual foi pago em 18.05.2021.

12. Em termos de direito, o Requerente historia a evolução recente da tributação automóvel nacional relativamente à admissão dos veículos usados, concretamente o fator de redução do ISV em matéria de anos de uso, tendo por referência a aplicação da tabela dos veículos novos, e transcreve passagens da jurisprudência comunitária em que foi apreciada a legalidade da lei portuguesa face ao artigo 110.º do Tribunal de Funcionamento da União Europeia (TFUE). 

12.1 Designadamente, menciona o Acórdão C-200/15, proferido em 16.06.2016, e também o acórdão de 02.09.2021, proferido no processo C-169/20, em que se diz que «Ao não desvalorizar a componente ambiental no cálculo do valor aplicável aos veículos usados postos em circulação no território português e adquiridos noutro Estado Membro, no âmbito do cálculo do imposto sobre veículos previstos no Código do Imposto sobre Veículos, na redação que lhe foi dada pela Lei n.º 71/2018, a República Portuguesa não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 110.º TFUE». 

12.2 Refere que, antes ainda deste último acórdão ter sido proferido, o legislador nacional já tinha alterado o preceito objeto do acórdão, tendo dado uma nova redação ao artigo 11.º do CISV através da publicação da Lei do Orçamento do Estado para 2021 – Lei n.º 75-B/2020, de 31 de dezembro, em que fixou percentagens de redução por anos de uso do veículo diferenciadas em função da componente cilindrada ou da componente ambiental.

12.3 Sustenta o Requerente que a nova redação do artigo 11.º permite que a Administração Fiscal cobre um imposto sobre os veículos importados com base num valor superior ao valor real do veículo, onerando-os com uma tributação fiscal superior à que é aplicada aos veículos usados similares disponíveis no mercado nacional. 

12.4. O montante do imposto calculado sem tomar em consideração a depreciação real do veículo, excede o montante residual do imposto incorporado no valor dos veículos automóveis usados semelhantes já matriculados em território nacional.

12.5 «A AT quando procedeu à liquidação do ISV sob a presente impugnação, não levou em consideração a totalidade do número de anos de uso do veículo na sua componente ambiental, ao não aplicar a mesma percentagem de desvalorização que aplicou à componente cilindrada.», tendo-o feito com o recurso a uma norma jurídica que viola o artigo 110.º do TFUE, o que leva o Requerente a propor que, se subsistirem dúvidas sobre a interpretação e aplicação do disposto no artigo 110.º do TFUE, deve o Tribunal Arbitral proceder ao reenvio prejudicial da questão ao Tribunal de Justiça.

12.6 A final, solicita a anulação parcial da liquidação do ISV, a restituição da quantia cobrada em excesso, no montante de 1094,51 €, resultante do diferencial entre os 20% da redução da cilindrada e os 10% da redução da componente ambiental, e o pagamento de juros indemnizatórios.

13. Por seu turno, a Requerida em resposta ao pedido de pronúncia arbitral, vem dizer, no essencial, o seguinte:

13.1 Em matéria de facto dá como assente a informação constante da introdução no consumo do veículo através da DAV apresentada pelo Requerente, por via de transmissão eletrónica.

13.2 Em termos de direito, faz um enquadramento legal da questão, no que respeita à incidência objetiva e subjetiva do imposto, enuncia o facto gerador e outras regras que subjazem à instituição do ISV e, concretamente no que respeita à tributação do veículo, transcreve os n.ºs 1, 2 e 3 do artigo 11º do CISV que regulam a tributação de veículos usados provenientes de outros Estados da União Europeia. 

13.3 No que respeita à argumentação do Requerente, salienta que o ato de liquidação foi praticado tendo em conta as normas estabelecidas pelo CISV, pelo que, tendo as mesmas sido criadas por lei, em conformidade com o n.º 2 do artigo 103.º da CRP,  e encontrando-se a AT sujeita ao princípio da legalidade tributária prevista no artigo 8.º da LGT, não poderia ter atuado doutra maneira, sob pena de cometer uma ilegalidade ao deixar de aplicar as taxas que se encontram em vigor à data da introdução no consumo.

Por outro lado, salienta que não existe qualquer decisão que declare com força obrigatória geral o vício de violação de lei comunitária relativamente à nova redação do mencionado artigo 11.º do CISV, introduzida pelo artigo 391.º da Lei n.º 75-B/2020, de 31 de dezembro.

13.4 A título de justificação da atual redação, refere o que consta da «Proposta de Lei do OE para 2021, de que « ... se procurou salvaguardar os ambiciosos objetivos ambientais do País e a incorporar o essencial das preocupações levantadas pela Comissão Europeia em matéria de compatibilidade com o direito europeu ... o qual, ao contrário do que sucede com a componente cilindrada, não estará associado à desvalorização comercial dos veículos mas antes à sua vida útil média remanescente (medida pela idade média dos veículos enviados para abate) por se entender que a mesma é uma boa métrica do horizonte temporal de poluição do veículo, assegurando-se deste modo, que os carros poluentes serão justamente tributados à entrada em Portugal».

13.5 No Acórdão do Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE) n.º C-169/20 não foi entendido que a percentagem de redução de imposto a aplicar às componentes cilindrada e ambiental teria de ser a mesma, mas sim que a componente ambiental deveria ser desvalorizada, como já o foi, através da alteração ao n.º 1 do artigo 11.º do CISV., desconhecendo-se a existência de qualquer acórdão do TJUE que vede aos Estados Membros a possibilidade de fixação de reduções diferenciadas para as duas componentes do ISV.

13.6 Refere que a conformidade da atual redação com o direito comunitário foi reconhecida na decisão arbitral n.º 350/2021-T, de 22.02.2022, já transitada, tendo igualmente havido pronúncia na decisão arbitral proferida no Processo 209/2021-T, em 10.12.2021, igualmente transitada, de que transcreve os pontos 30 a 34, que aponta no mesmo sentido.

13.7 Argumenta igualmente que o Requerente não comprovou a alegação que fundamenta o seu pedido subsidiário de que o montante do imposto teria sido calculado sem tomar em consideração a depreciação real do veículo e excederia o montante residual do imposto incorporado no valor dos veículos automóveis usados semelhantes já matriculados em território nacional (§§ 51 e 56 da p.i. e, genericamente, §§ 51 a 59), acrescendo que remete a alegação da violação do artigo 110.º do TFUE para um processo que não incidiu sobre a nova redação do artigo 11.º do CISV. 

13.8 À semelhança do Requerente, também a Requerida sugere a este Tribunal que, caso subsistam dúvidas sobre a interpretação e aplicação do disposto no artigo 110.º do TFUE, poderá a questão ser submetida a título prejudicial ao TJUE no sentido de saber se a nova redação do n.º 1 do artigo 11.º do CISV, ao prever percentagens de redução para as duas componentes, cilindrada e ambiental, que não coincidem na totalidade, continua a violar o artigo 110.º do TJUE.

13.9 Sob a epígrafe «Do pedido de restituição de quantia certa» refere que a instância arbitral constitui um contencioso de mera anulação, competindo ao tribunal arbitral a apreciação da legalidade de atos de liquidação, não lhe competindo pronunciar-se sobre valores/montantes a restituir, rejeitando igualmente a existência de qualquer erro que possa ser imputável à administração tributária, que se limitou a aplicar a lei em vigor, pelo que agiu no estrito cumprimento da lei, não assistindo assim, qualquer direito ao pagamento de juros indemnizatórios. 

IV - DOS FACTOS

14. Em matéria de facto, relevante para a decisão a proferir, dá este Tribunal Arbitral como provado, face aos elementos constantes dos autos, os seguintes factos:

14.1 O Requerente procedeu à introdução no consumo por via da apresentação na Alfândega de Leixões da DAV n.º 2021/..., de 19.05.2021, do veículo da marca «...», Variante UZ35, Modelo G3X, com o n.º de chassis ..., de 1995 centímetros cúbicos de cilindrada e 179 g/Km de emissões de dióxido de carbono, com a anterior matrícula definitiva alemã ..., atribuída pela primeira vez em 06.08.2019, e a que veio a ser atribuída a matrícula nacional ... .

14.2 O veículo move-se a gasóleo, foi declarado aos serviços aduaneiros como tendo 11824 quilómetros no conta quilómetros, e teve um valor de aquisição de 44 000 €.

14.3 O referido veículo foi sujeito à liquidação do ISV de 13 464,81 €, em 08.04.2021, correspondendo 3614,24 €, a título de componente cilindrada, e 9850,57 €, a título de componente ambiental, tendo a referida importância sido paga em 18.05.2021.

14.4 O imposto foi formado a partir do cálculo das taxas em vigor para os veículos novos, com uma redução de 20%, na componente cilindrada, por força de uma tabela, em função dos anos de uso, e uma redução da 10% na componente ambiental, por força de uma tabela, em função dos anos de uso.

15. Os factos foram selecionados a partir da informação disponibilizada pelas Partes, por via da apresentação de cópia da DAV que suportou a introdução no consumo e do processo administrativo, tendo o Tribunal formado a sua convicção tendo em conta o relevo jurídico que assumem para a decisão

16. O Tribunal não dá como provados outros factos.

O Tribunal não está obrigado a pronúncia sobre toda a matéria alegada, tendo antes o dever de selecionar apenas a que interessa para a decisão, levando em consideração a causa (ou causas) de pedir que fundamentam o pedido formulado pelo autor (cf. artigos 596.º, n.º 1 e 607.º, n.ºs 2 a 4 do Código de Processo Civil) e dizer se a considera provada ou não provada (cf. artigos 123.º n.º 2 do Código do Processo e Procedimento Tributário (CPPT), ex vi artigo 29.º do RJAT.

Segundo o princípio da livre apreciação da prova, o Tribunal baseia a sua decisão, em relação às provas produzidas, na sua íntima convicção, formada a partir do exame e avaliação dos meios de prova trazidos ao processo e de acordo com a sua experiência de vida e de conhecimento das pessoas (cf. artigo 607.º n.º 5 do CPC)

Somente quando a força probatória de certos meios se encontra pré-estabelecida na lei (v.g. força probatória plena dos documentos autênticos – cfr. artigo 371.º do Código Civil) é que não domina na apreciação das provas produzidas o princípio da livre apreciação.

V - QUESTÕES A DECIDIR:

17. No entendimento do Tribunal Arbitral as questões a decidir são as seguintes:

a)  A nova redação do artigo 11.º n.º 1, 2 e 3 do CISV, ao prever na admissão de veículos usados provenientes de outros Estados Membros da União Europeia reduções do imposto diferenciadas em função dos anos de uso, consoante se trate da componente cilindrada ou da componente ambiental, é ou não compatível com o artigo 110.º do TFUE e com a jurisprudência comunitária produzida em volta da sua interpretação;

b) Caso não seja compatível, e proceda a impugnação do imposto, são ou não, devidos juros indemnizatórios.

VI – O DIREITO NACIONAL E COMUNITÁRIO

A) A Legislação nacional

18. A admissão do veículo foi sujeita a uma liquidação do ISV prevista no artigo 11.º n.º 1 do CISV, sob a epígrafe «Taxas – veículos usados», na redação dada pela Lei n.º 75-B/ 2020, de 31 de dezembro, o qual preceitua o seguinte: 

«1 - O imposto incidente sobre veículos portadores de matrículas definitivas comunitárias atribuídas por outros Estados-Membros da União Europeia é objeto de liquidação provisória nos termos das regras do presente Código, ao qual são aplicadas as percentagens de redução previstas na tabela D ao imposto resultante da tabela respetiva, tendo em conta a componente cilindrada e ambiental, incluindo-se o agravamento previsto no n.º 3 do artigo 7.º, as quais estão associadas à desvalorização comercial média dos veículos no mercado nacional e à vida útil média remanescente dos veículos, respetivamente:  

TABELA D

Componente Cilindrada

 

Tempo de uso

Percentagem de redução

Até 1 ano

10

Mais de 1 a 2 anos

20

Mais de 2 a 3 anos

28

Mais de 3 a 4 anos

35

Mais de 4 a 5 anos

43

Mais de 5 a 6 anos

52

Mais de 6 a 7 anos

60

Mais de 7 a 8 anos

65

Mais de 8 a 9 anos

70

Mais de 9 a 10 anos

75

Mais de 10 anos

80

 

 

 

Componente ambiental

 

Tempo de uso

Percentagem de redução

Até 2 anos

10

Mais de 2 a 4 anos

20

Mais de 4 a 6 anos

28

Mais de 6 a 7 anos

35

Mais de 7 a 9 anos

43

Mais de 9 a 10 anos

52

Mais de 10 a 12 anos

60

Mais de 12 a 13 anos

65

Mais de 13 a 14 anos

70

Mais de 14 a 15 anos

75

Mais de 15 anos

80

 

 

 

2 - ... 

3 – Sem prejuízo da liquidação provisória efetuada, sempre que o sujeito passivo entenda que o montante do imposto apurado nos termos do n.º 1 excede o imposto calculado por aplicação da fórmula a seguir indicada, pode requerer ao diretor da alfândega, mediante o pagamento prévio de taxa a fixar por portaria do membro do Governo responsável pela área das finanças, e até ao termo do prazo de pagamento a que se refere o n.º 1 do artigo 27.º, que a mesma seja aplicada à tributação do veículo, tendo em vista a liquidação definitiva do imposto.

                     ISV =    _V                   _U

                                           VR  x  Y +   (1 - UR) x  C

em que

ISV representa o montante do imposto a pagar;

V representa o valor comercial do veículo, tomando por base o valor médio de referência determinado em função da marca, do modelo e respetivo equipamento de série, da idade, do modo de propulsão e da quilometragem média de referência, constante das publicações especializadas do setor, apresentadas pelo interessado;  

VR é o preço de venda ao público de veículo idêntico no ano da primeira matrícula do veículo a tributar, tal como declarado pelo interessado, considerando-se como tal o veículo da mesma marca, modelo e sistema de propulsão, ou, no caso de este não constar de informação disponível, de veículo similar, introduzido no mercado nacional, no mesmo ano em que o veículo a introduzir no consumo foi matriculado pela primeira vez;

Y representa o montante do imposto calculado com base na componente cilindrada, tendo em consideração a tabela e a taxa aplicável ao veículo, vigente no momento da exigibilidade do imposto;

C é o «custo de impacte ambiental», aplicável a veículos sujeitos à tabela A, vigente no momento da exigibilidade do imposto, e cujo valor corresponde à componente ambiental da referida tabela, bem como ao agravamento previsto no n.º 3 do artigo 7.º;

U é o número de dias de tempo de uso da viatura;

UR é a média do número de dias de tempo de uso dos veículos contados desde a data da primeira matrícula até à data do cancelamento da matrícula dos veículos em fim de vida abatidos nos três anos civis anteriores à data de apresentação da DAV.  

4 - ...»

 

B) O Direito Comunitário

19. O artigo 110.º do TFUE (antes 90.º e 95.º noutras redações do Tratado), diz o seguinte:

«1) Nenhum Estado-Membro pode fazer incidir, direta ou indiretamente, sobre os produtos dos outros Estados-Membros imposições internas, qualquer que seja a sua natureza, superiores às que incidam, direta ou indiretamente, sobre produtos nacionais similares.

2) Além disso, nenhum Estado-Membro pode fazer incidir sobre os produtos dos outros Estados-Membros imposições internas de modo a proteger indiretamente outras produções».

20.1 Diversos acórdãos do Tribunal de Justiça apreciaram ao longo dos últimos trinta anos, questões relacionadas com este tipo de imposições, com características de imposto de registo ou matrícula, envolvendo a legislação portuguesa assim como também a de outros Estados Membros, com tributação semelhante.

20.2 No acórdão de 22.02.2001, Processo C-393/98. (Caso Gomes Valente), em que foi visada a conformidade da legislação portuguesa, foi acordado que a aplicação de uma tabela de taxas para os veículos usados fundada num critério de depreciação único não seria contrário ao artigo 95.º, todavia, foi sublinhado que era importante que fossem tomados em conta outros fatores de depreciação que não apenas a antiguidade, de forma a garantir que a tabela forfetária refletisse de modo mais preciso a depreciação real dos veículos e permitisse alcançar de uma forma mais fácil o objetivo da tributação dos veículos usados, em termos de que, em nenhum caso, pudessem ser superiores ao montante da taxa residual incorporada no valor dos veículos usados já matriculados em território nacional.

20.3 Com a progressiva adoção de critérios ambientais na estruturação deste tipo de impostos, o Tribunal de Justiça (Primeira Seção), no âmbito do processo C-290/05, de 05.10.2006, (Ákos Nadasdi), pronunciou-se pela primeira vez sobre uma questão em que estava em causa a conformidade do sistema de tributação automóvel húngaro.

Em sede pré judicial, foi perguntado se o artigo 90.º, primeiro parágrafo, permite aos Estados Membros manter em vigor um imposto sobre os veículos automóveis usados provenientes de outros Estados Membros, que não tem absolutamente em conta o valor do veículo e cujo montante é determinado exclusivamente, com base nas características técnicas dos automóveis (tipo de motor, cilindrada) e numa classificação em função de considerações ambientais. 

A legislação húngara fixava montantes do imposto automóvel diferentes em função das normas de emissão, do tipo de carburante utilizado e da cilindrada do motor, sendo aplicáveis em função de uma tabela fixada e permaneciam inalterados quer se tratasse da matrícula de uma viatura nova ou de uma viatura usada.

No referido acórdão escreveu-se que «Assim, não obstante o caráter ambiental do objetivo e do fundamento do imposto automóvel e mesmo não tendo estes qualquer relação com o valor de mercado do veículo, o artigo 90º, primeiro paragrafo CE, exige que seja tida em conta a depreciação dos veículos usados que são objeto de tributação, visto que esses impostos se caracterizam por ser apenas cobrados uma vez aquando do primeiro registo do veículo para efeitos da sua utilização no EM em causa e por ser desta forma incorporado no referido valor», ponto 56.

No âmbito de um regime relativo ao imposto automóvel, critérios como o tipo de motor, a cilindrada e uma classificação assente em fatores ambientais constituem critérios objetivos e daí poderem ser utilizados num tal sistema de tributação, no entanto, dos mesmos não poderá resultar discriminação e o referido imposto não poderá onerar mais os produtos provenientes de outros EM do que os produtos nacionais similares, implicando que a cobrança por um EM de um imposto sobre os veículos usados provenientes de outro Estado-membro é contrária ao artigo 110º quando o montante do imposto, calculado sem tomar em conta a depreciação real do veículo, exceda o montante residual do imposto incorporado no valor dos veículos automóveis usados semelhantes já matriculados no território nacional.

20.4 Essa neutralidade, deve ser aferida no que respeita à concorrência entre os veículos usados admitidos e os veículos usados similares anteriormente matriculados no território nacional e sujeitos, no momento da matrícula, ao referido imposto, pelo que, a partir do momento em que se paga um imposto de matrícula num Estado-Membro, o montante desse imposto é incorporado no valor do veículo, pelo que, quando um veículo é matriculado no Estado-Membro e, em seguida, vendido como veículo usado nesse mesmo Estado-Membro, o seu valor de mercado, inclui um montante residual do imposto de matrícula, teoricamente igual a uma percentagem, determinada pela desvalorização desse veículo, do seu valor inicial (Acórdão de 07.04.2011, Processo C-402/09, Tatu).

20.5 Visando uma anterior redação do atual artigo 11.º do CISV, o Tribunal de Justiça (Nona Seção), proferiu um acórdão em 02.09.2021, em que concluiu que «Ao não desvalorizar a componente ambiental no cálculo do valor aplicável aos veículos usados postos em circulação no território português e adquiridos noutro Estado Membro, no âmbito do cálculo do imposto sobre veículos previsto no Código do Imposto sobre Veículos, na redação que lhe foi dada pela Lei n.º 71/2018, a República Portuguesa não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 110.º TFUE».

VII – FUNDAMENTAÇÃO

21. O Requerente salienta que as percentagens aplicadas à componente ambiental são inferiores às que são aplicadas à componente cilindrada, mantendo assim um tratamento desigual entre estas duas componentes, concluindo que a norma atualmente em vigor, introduzida pela Lei n.º 75-B/2020, de 31 de dezembro, e que esteve na base da liquidação do imposto, continua a violar frontalmente o artigo 110.º do TFUE, conforme já decidido pelo acima supracitado acórdão do Tribunal de Justiça.

22.1 Sobre a questão das componentes do imposto, importa referir que o antecessor do ISV, o Imposto Automóvel (IA), foi criado pelo Decreto-Lei n.º 405/87, de 31 de dezembro, e adaptou o regime de tributação automóvel às condições de livre importação decorrentes da cessação do período transitório da adesão de Portugal às Comunidades, tendo o legislador nacional feito uma opção por elementos de tributação objetiva, assentes na cilindrada, no combustível utilizado e nos anos de uso.

Rompeu com um sistema baseado na tributação «ad valorem», em que havia uma aprovação formal de preços de venda ao público dos veículos apresentados pelos representantes das marcas de automóveis às extintas direções gerais do Comércio não Alimentar e posteriormente da Concorrência e Preços, do Ministério da Economia e do Comércio, e que era posteriormente aceite pelos serviços alfandegários para efeitos do desembaraço dos veículos. O Estado passou a ter uma maior segurança financeira na execução orçamental, uma vez que os critérios de tributação passaram a ser objetivos, o que nem sempre sucedia com as aprovações de preços dos veículos apresentados pelas marcas, que revelavam pouco rigor relativamente ao verdadeiro valor dos veículos, ocultando, muitas vezes extras e outras mais valias.

22.2 A conjugação dos referidos elementos passou a ser entendida como base para referenciar o valor dos veículos, sendo considerado que um veículo tem um maior valor comercial consoante tenha uma maior cilindrada e menores anos de matriculação, considerando-se deste modo existir, para efeitos de tributação, uma aproximação ao valor real dos veículos.

Todavia, a combinação destes elementos não pode deixar de se considerar um critério relativamente grosseiro, pois é um facto público e notório que o mercado tem disponíveis veículos com uma mesma motorização que tem valores díspares, seja pelo valor intrínseco da marca, o tipo de conceção e construção do veículo, ou a imagem que os consumidores fazem dos desempenhos dos veículos.

22.3 Não obstante, o legislador nacional nunca prescindiu de uma tributação mínima relativamente aos veículos admitidos com mais de dez anos de uso, sendo certo que estes continuam a desvalorizar após os referidos anos, embora geralmente em montante menos significativo, o que não impede que o imposto residual incorporado continue a diminuir.

23. Com a publicação do acórdão respeitante ao processo C-393/98, (Gomes Valente) o legislador nacional passou a disponibilizar, em termos facultativos, um método de cálculo do imposto, baseado inicialmente numa pura tributação «ad valorem», mais tarde, mitigada com uma remissão para uma tabela de percentagens de reduções do imposto justificada à luz de considerações sociais e económicas, e que atualmente corresponde ao n.º 3 do artigo 11.º do CISV.

24.1 A componente ambiental, representada pelas emissões de CO2, veio apenas a ser introduzida em 2005, tendo sido consagrada definitivamente no CISV. É um critério objetivo de natureza técnico-científica feito constar obrigatoriamente, desde 1999, nos certificados de conformidade de cada veículo emitidos pelos fabricantes, aliás, de resto como a cilindrada, permanecendo, salvo raras exceções de mudança de motorização, imutáveis durante toda a vida útil do veículo.

Todavia, é um facto científico que a introdução no consumo de automóveis, em termos de externalidades negativas, não se circunscreve às referidas emissões, havendo um conjunto de outras substâncias que contribuem para a degradação climática, caso dos monóxidos de carbono, óxido de nitrogénio, etc , que o legislador especificamente não considerou em termos de tributação (excetuando as partículas, que tem um tratamento fiscal próprio).

24.2 Através da nova redação do artigo 11.º A do CISV a componente ambiental veio a sofrer uma modificação concetual uma vez que, deixou de prever reduções do imposto meramente em função dos anos de uso dos veículos para passar a ter em consideração reduções do imposto em função da vida útil remanescente dos veículos.

É nesta perspetiva que o legislador justifica que as percentagens de redução do ISV em função dos anos de uso, e os próprios anos de uso, se diferenciem, consoante está em causa a componente cilindrada ou ambiental.

Também nesta última, independentemente dos anos de uso com que se possam apresentar para além dos 15 anos de antiguidade, os veículos ficam sempre sujeitos a uma tributação mínima de 20% do ISV do veículo novo, havendo uma espécie de critério oculto de repercutir outros danos ambientais, resultantes do facto de nem todos os resíduos sólidos ou gasosos, serem suscetíveis de aproveitamento ou valorização energética, e serem simplesmente depositados em aterro.

25.1 A proposta de Lei do OE 2021, justifica a opção em termos de que «..a vida útil média remanescente, medida pela idade média dos veículos enviados para abate, por se entender que a mesma é uma boa métrica do horizonte temporal de poluição do veículo ...».

25.2 Ao novo paradigma de tributação não será alheia a estratégia comunitária já aprovada de pretender impedir, no próximo decénio, a entrada em circulação dos veículos a combustão, aproveitando o legislador nacional para gradualmente dissuadir a entrada no mercado nacional de veículos com essas caraterísticas, que seguramente implicará uma alteração da relação de valor de mercado entre os veículos a gasolina e a gasóleo e os veículos elétricos, com consequências tributárias. Com efeito, estes últimos, novos ou usados, não são objeto de tributação em sede de ISV e, talvez por isso, a quota de mercado dos veículos elétricos supera já, atualmente, a dos veículos a gasóleo.

26.1 O legislador preceituou que a fixação do fator UR do n.º 3 do artigo 11.º, fosse efetuada a partir da informação relativa aos veículos abatidos nos últimos três anos civis anteriores à data de apresentação da DAV. 

Uma disposição respeitante à fixação de um elemento relevante na fixação do imposto, como a que está em causa, deveria ser sustentada por portaria ou despacho normativo, anualmente publicado, e deveriam estar explicitados, pelo menos, os critérios de recolha por segmento de veículo.

A divulgação pela AT de um ofício circulado em que se refere que com base em informação obtida junto do Instituto da Mobilidade e dos Transportes Terrestres, para o ano de 2021, o fator UR é fixado em 8282 dias, (Ofício circulado n.º 35 140, de 2.12.2020) não supre a referida ilegalidade, mas permite ter uma ideia sobre a vida útil dos veículos que vão sendo abatidos e o resultado demonstra que a idade média dos veículos destruídos em fim de vida é de cerca de vinte e dois anos e meio (8282:365).

Por outro lado, com base na informação publicamente divulgada por associações do setor, a idade média atual do parque automóvel nacional é atualmente de cerca de treze anos.

A circunstância de o legislador prever percentagens de redução do imposto até quinze anos quando a idade média atual do parque automóvel é de treze anos e, quando os veículos abatidos em território nacional, nos últimos três anos, tem vinte e dois anos e meio de vida útil, induz a considerar que há um crescente envelhecimento do parque automóvel, e cria incerteza quanto às bases como se construiu a referida tabela ambiental, pois ela própria apresenta-se como um critério grosseiro de tributação do dano ambiental que o veículo a introduzir no consumo irá produzir no seu restante período de vida útil.

26.2 Ou seja, nem o cálculo da componente cilindrada, baseado nos anos de uso e na cubicagem, nem a componente ambiental baseada na vida útil remanescente dos veículos e nas emissões, são critérios que possam garantir uma absoluta neutralidade tributária relativamente a veículos similares introduzidos no consumo, no estado de novo, funcionando mais como um sistema de cálculo aproximado do imposto residual incorporado, seja por excesso, seja por defeito.

26.3 Ambos os critérios são objetivos, se bem que os escalonamentos aparentem ser fixados arbitrariamente, e podem ser aplicados separadamente, mas há que considerar que há veículos admitidos com muitos anos de uso e apresentam uma  quilometragem média muito inferior a uma utilização normal, com a sua consequente valorização relativamente aos demais veículos objeto de uma utilização regular que se encontram a circular no mercado nacional onde foram introduzidos no estado de novo, assim como há veículos de tecnologia avançada, com poucos anos de uso e muito baixas emissões que projetarão um dano ambiental pouco significativo, no entanto, são da gama alta e de elevado preço.

27. Tendo em conta o novo pressuposto considerado, diretamente conexionado com o ambiente, o Tribunal Arbitral considera  que há uma certa liberdade conformadora do imposto pelo legislador nacional, pois desde que ele tenha adotado critérios objetivos, de todos conhecidos e a todo o momento verificáveis, nada obriga a que as regras que funcionam para a componente cilindrada tenham necessariamente de ser aplicáveis à componente ambiental, estando neste caso justificada a diferenciação que se estabelece entre as diferentes percentagens por tempos de uso consoante as componentes.

28. O mecanismo do artigo 110.º do TFUE visa eliminar entraves legais que se possam levantar à livre circulação de mercadorias entre Estados Membros, de forma a assegurar a todos uma igualdade de oportunidades, obrigando os legisladores a afastar qualquer efeito protetor da produção ou do comércio local em detrimento dos outros agentes do mercado, e é um complemento das disposições relativas à supressão dos direitos aduaneiros e dos encargos de efeito equivalente constantes do Tratado.

Teve sempre a mesma redação e nasceu num contexto em que não existiam outras preocupações que não fossem as comerciais, pelo que tem sido sempre interpretado como fazendo parte de uma espinha dorsal do Tratado. Isto não impede que outro tipo de políticas inovatórias, designadamente as relacionadas com o ambiente, não deixem igualmente de passar a ser consideradas nos direitos nacionais, como resulta do artigo 191.º (ex. artigo 174.º do Tratado), tendo em conta a prossecução de determinados objetivos, sem afetar, todavia, uma pretendida harmonização do quadro legislativo comunitário.

29.  A combinação da soma da aplicação dos dois critérios não deverá, no entanto, conduzir, mesmo no período de transição para a supressão dos motores de combustão, a uma tributação superior àquela que resulta do imposto incorporado no valor residual de veículos similares matriculados, no estado novo, em território nacional, na mesma data do veículo a admitir.

Um veículo quando é vendido no estado de novo em território nacional tem um preço de venda ao público que engloba o preço de custo, a margem de comercialização do operador e outras despesas, o ISV e o IVA, estabelecendo-se uma relação de percentagem entre o preço de venda ao público do veículo e o ISV pago.

A tributação em ISV de um veículo admitido doutro Estado Membro no estado de usado deve ser calculada a partir da cotação do preço de venda de um veículo da mesma marca e modelo introduzido no consumo no ano da primeira matrícula do veículo a admitir e da aplicação dessa percentagem.

A informação para o cálculo dessa tributação, quer no que respeita ao veículo novo, quer à sua cotação, enquanto veículo usado, pode ser encontrada em revistas credíveis de automóveis e «sites» especializados, sendo o ISV do veículo novo a considerar o correspondente à taxa então em vigor.  

30. O Tribunal Arbitral atribui uma presunção de legalidade nas percentagens mencionadas na referida tabela que só teriam ficado em crise se fundamentadamente tivesse sido demonstrado pelo Requerente que a redução de 10%. do imposto por tempo de uso na componente ambiental que lhe foi aplicada, somada à redução pela componente cilindrada, não acompanhou o montante de imposto residual incorporado num veículo da mesma marca e modelo, introduzido no consumo em Portugal, no ano de 2019, sendo certo que o artigo 28.º, n.º 2 do CISV impede a restituição de importâncias inferiores a 30 € e que as próprias cotações dos veículos são sempre valores aproximados entre a oferta e a procura.

31. O Requerente solicita no seu pedido que a impugnação seja dada como provada e seja ordenada a anulação parcial da liquidação do ISV, de forma a aplicar-se a redução prevista no artigo 11.º do CISV, em matéria de cilindrada, à componente ambiental.

Sobre esta questão, importa referir que a redução prevista no artigo 11.º do CISV foi efetivamente aplicada à componente ambiental, e o que o Requerente verdadeiramente pretende é que as reduções constantes da componente ambiental sejam desaplicadas e em sus substituição sejam aplicadas as reduções constantes da componente cilindrada, sendo nessa base que se compreende o raciocínio de ser devolvido ao Requerente o diferencial de montante resultante de ter beneficiado apenas de uma redução de 10% quando deveria ter sido de 20%. sendo esse montante calculado em 1094,51 euros.

32. A competência do tribunal arbitral compreende nos termos do artigo 2.º, n.º 1, alínea a) do RJAT a apreciação da legalidade de atos de liquidação de tributos, preceituando o n.º. 2, que os tribunais arbitrais decidem de acordo com o direito constituído sendo vedado o recurso à equidade.

O Requerente pretende que o Tribunal Arbitral se substitua ao legislador e na base de uma pretensa coerência e equidade, seja anulada parcialmente a liquidação do ISV, procedendo-se à sua correção no sentido de serem tomadas em consideração as percentagens de redução da componente cilindrada em vez das legalmente consideradas para a componente ambiental, mas essa discriminação entre as componentes não se verifica necessariamente, pois os critérios são diferenciados, e nenhum deles pode ser considerado como o mais preciso para aferir a igualdade com o valor residual incorporado em veículos similares matriculados no estado novo, em território nacional, não se podendo dar como provada uma evidente desconformidade com a  jurisprudência comunitária.      

33. Dando assim resposta à primeira questão a decidir, o Tribunal Arbitral não considera que o artigo 11.º, n.º 1 do CISV, ao prever, na admissão de veículos usados provenientes de outros Estados Membros da União Europeia, reduções do imposto diferenciadas em função dos tempos de uso, consoante se trate da componente cilindrada ou da componente ambiental, seja incompatível com a jurisprudência comunitária dimanada da interpretação pelo TJUE do artigo 110.º do TFUE, contanto que as componentes que integram o imposto assentem em critérios objetivos e verificáveis, cuja aplicação não implique uma significativa diferenciação relativamente ao imposto residual incorporado no preço de venda de veículo similar,  

VIII – JUROS INDEMNIZATÓRIOS   

34. Uma vez que a impugnação do imposto improcede, não há lugar, consequentemente à restituição do imposto e ao pagamento de juros indemnizatórios

IX - DECISÃO

Nestes termos, julga o Tribunal Arbitral Singular o seguinte:

 

  1. Manter na ordem jurídica o ato de liquidação impugnado, por a referida liquidação efetuada ao abrigo do artigo 11.º n.º 1, com remissão para o artigo 7.º, n.º 1 do CISV, aprovado pela Lei n.º 22-A/2007, de 29 de julho, na redação dada pela Lei n.º 75-B/2020, de 31 de dezembro, gozar de uma presunção de legalidade de  não se encontrar em desconformidade com o direito comunitário, designadamente do artigo 110.º do TFUE, aplicável por força do artigo 8.º, n.º 4 da CRP, que não foi ilidida pelo Requerente, por prova ou demonstração em contrário, no que respeita ao facto do ISV ser reduzido por anos de uso, de forma diferenciada, consoante se trate da componente cilindrada ou da componente ambiental.
  2. Consequentemente, rejeitar o pedido efetuado pelo Requerente de restituição da importância paga a mais em sede de ISV a título de componente ambiental relativamente à componente cilindrada, bem como o correspondente pedido de pagamento de juros indemnizatórios.
  3. Condenar o Requerente no pagamento das respetivas custas arbitrais.

 

X - VALOR

35. Nos termos do disposto no artigo 32.º do CPTA, aplicável por força do que se dispõe no artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e b) do RJAT e no artigo 3.º, n.º 2 do RCPAT, é fixado o valor do processo em € 1094,51 (mil e noventa e quatro euros e cinquenta e um cêntimos).

 

XI – CUSTAS PROCESSUAIS.

36. Nos termos da Tabela I anexa ao RCPAT, aplicável por remissão do seu artigo 4.º, n.º 1, as custas são fixadas no valor de € 306 (trezentos e seis euros), a pagar pelo Requerente.

Notifiquem-se as partes.

 

Lisboa, 21 de fevereiro de 2023.

 

O Árbitro Singular

António Manuel Melo Gonçalves