Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 285/2014-T
Data da decisão: 2014-11-19  Selo  
Valor do pedido: € 14.626,50
Tema: IS – Verba 28.1 da TGIS – Propriedade vertical
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REQUERENTE: A... GESTÃO DE ACTIVOS – SOCIEDADE GESTORA DE FUNDOS DE INVESTIMENTO IMOBILIÁRIO, SA

 

REQUERIDA: Autoridade Tributária e Aduaneira

 

 

 

Decisão Arbitral[1]

 

 

 

I RELATÓRIO

 

 

 

A)    As Partes e a Constituição do tribunal Arbitral

 

 

  1. A... GESTÃO DE ACTIVOS – SOCIEDADE GESTORA DE FUNDOS DE INVESTIMENTO IMOBILIÁRIO SA, com sede no …, em Lisboa, pessoa colectiva nº …, na qualidade de sociedade gestora do FUNDO DE INVESTIMENTO IMOBILIÁRIO ABERTO B…, património autónomo com o NIF 720 001 200, doravante designado por “Requerente”, apresentou pedido de constituição de Tribunal Arbitral singular, ao abrigo do disposto na alínea a) do nº 1 do artigo 2º, nas alíneas a) e b) do número 2 do artigo 5º e alínea a) do nº 1 do artigo 10º, todos do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária, aprovado pelo Decreto-Lei nº 10/2011, de 20 de Janeiro, doravante designado por “RJAT” e dos artigos 1º e 2º da Portaria nº 112 – A/2011, de 22 de Março, para apreciar a demanda que a opõe à Autoridade Tributária e Aduaneira, doravante designada por “Requerida” ou “AT”, tendo em vista a anulação, com fundamento em ilegalidade, dos actos de liquidação de imposto de selo, referentes ao ano de 2012, conforme documentos de cobrança números 2013…, 2013… e 2013…, no valor global de €14.626,50, relativos ao prédio urbano em propriedade total sem andares ou divisões susceptíveis de utilização independente inscrito na matriz predial urbana de ... sob o artigo ... da Freguesia ... – União das Freguesias ... e ..., Concelho de ..., Distrito de Lisboa e descrito na Conservatória do Registo Predial de ... sob o número de registo ..., conforme documento nº 1 junto aos autos em anexo ao Pedido Arbitral que aqui se dá por integralmente reproduzido.

 

  1.  O pedido de constituição do Tribunal Arbitral, apresentado em 25 de Março de 2014, foi aceite pelo Exmo. Presidente do CAAD e automaticamente notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira em 26 de Março de 2014. A Requerente optou por não designar árbitro, pelo que, ao abrigo do disposto no nº 1, do artigo 6º do RJAT, foi designada, pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa, a ora signatária como árbitro do Tribunal Arbitral singular. A nomeação foi aceite e as partes, notificadas da aceitação, em 14 de Maio de 2014, não recusaram a designação, nos termos previstos nas alíneas a) e b), do nº1, do artigo 11º, do RJAT, conjugado com o disposto nos artigos 6º e 7º do Código Deontológico.

 

  1. Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c), do nº 1, do artigo 11º, do Decreto-Lei nº 10/2011, de 20 de Janeiro, com a redacção introduzida pelo artigo 228º, da Lei nº 66-B/2012, de 31 de Dezembro, o Tribunal Arbitral singular foi constituído em 29 de Maio de 2014.

 

  1. No dia 30 de Maio de 2014, foi a Requerida “AT” notificada para apresentar resposta no prazo legal, nos termos do disposto nos nºs 1 e 2, artigo 17º, do RJAT. A 6 de Julho de 2014 a AT juntou aos autos a sua Resposta e os documentos anexos designados por PA (processo administrativo).

 

  1. No dia 7 de Julho de 2014 foi proferido despacho para marcação da reunião prevista no artigo 18º do RJAT, a realizar no dia 5 de Setembro de 2014, pelas 14 horas. A AT apresentou requerimento sugerindo a dispensa da realização da reunião por não existirem questões de facto a esclarecer, nem excepções, tratando-se apenas de matéria de direito. Notificada a Requerente para se pronunciar esta concordou com a dispensa da reunião e da apresentação de alegações. Considerando a posição assumida pelas partes sobre esta questão, foi proferido em 4 de Setembro de 2014 despacho arbitral dispensando a realização da reunião e foi fixada data limite para proferir decisão arbitral até 20 de Novembro de 2014.

 

 

 

B)    Dos Pressupostos Processuais

 

 

  1. O Tribunal Arbitral encontra-se regularmente constituído e é materialmente competente, nos termos do artigo 2º, nº1, alínea a) do Decreto-Lei nº 10/2011, de 20 de Janeiro.

As Partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e encontram-se legalmente representadas.

O processo não enferma de nulidades que o invalidem e não foram suscitadas excepções que obstem ao julgamento do mérito da causa, pelo que o Tribunal está em condições de proferir a decisão arbitral.

 

 

C) DO PEDIDO FORMULADO PELA REQUERENTE

 

  1. A Requerente formula o presente pedido de pronúncia arbitral pugnando pela ilegalidade e consequente anulação dos actos de liquidação de Imposto de Selo referentes ao ano 2012, no montante de €14.626,50, conforme documentos nº1 junto aos autos pela Requerente e que aqui se dá por reproduzido.

 

  1. Os actos de liquidação de imposto de selo incidem sobre o prédio urbano em propriedade total sem andares ou divisões susceptíveis de utilização independente, inscrito na matriz predial urbana de ... sob o artigo ... da Freguesia ... – União de Freguesias ... e ..., Concelho de ... e Distrito de Lisboa, descrito na Conservatória do Registo Predial de ... sob o número de registo .... Os actos de liquidação impugnados têm como fundamento legal o disposto na verba nº 28.1 da tabela geral do imposto de selo (doravante TGIS), nos termos em que foi aplicada pela AT, no caso dos presentes autos

 

 

D) A Posição da Autoridade Tributária

 

 

  1. O prédio urbano ao qual se referem as liquidações de imposto impugnadas nos presentes autos, é propriedade do Fundo Imobiliário ora Requerente, o qual se encontra constituído em regime de propriedade total, também designada por vertical. O referido prédio, tal como consta da matriz predial e conforme resulta da respectiva caderneta predial, destina-se em habitação. O seu VPT é de €1.462.650,00, pelo que face ao disposto nos artigos 6º, nº1, alínea f), subalínea i), o imposto de selo da verba 28.1 da Tabela geral, na redacção dada pelo artigo 4º da Lei 55-A/2012, de 29 de Outubro, à taxa de 1% relativamente ao ano de 2012.

 

  1. Apesar da utilização do prédio se encontrar, por força de contrato de arrendamento cedido a favor de um estabelecimento de ensino “C... – Ensino de Crianças lda”, isso em nada altera o seu destino, ou seja, a sua afectação a habitação. Na verdade, apesar da licença de construção emitida, na qual se refere como destino do prédio a sua afectação a “equipamento escolar”, o prédio não dispõe, até ao momento, de licença de utilização para esse fim, pelo que, para efeitos tributários, se encontra afecto à habitação, pelo que os actos de liquidação de imposto de selo da verba 28.1 da TGIS, não são ilegais porque não violaram a citada norma de incidência. (Cfr. Artº 38º da Respostada AT)

Nesta conformidade a AT pugna pela legalidade dos actos tributários impugnados, pela improcedência do pedido arbitral.

 

 

II – Matéria de Facto

 

  1. Com relevância para a apreciação das questões suscitadas, consideram-se provados os seguintes factos:

 

  1. A Requerente foi notificada dos documentos de cobrança nºs 2013…, 2013… e 2013…, correspondentes, respectivamente, à primeira, segunda e terceira prestações de imposto de selo sobre o prédio urbano supra descrito no montante global de €14.626,50;
  2. Procedeu ao pagamento das referidas liquidações em 30 de Abril de 2013, 27 de Julho de 2013 e 4 de Dezembro de 2013; - Cfr.Doc. nºs 2 e 3 juntos à PI.
  3. O prédio urbano em propriedade total, sem andares ou divisões susceptíveis de utilização independente, tem um valor patrimonial tributário (VPT) de €1.462.650,00;
  4. Segundo o teor da caderneta predial e descrição do mesmo na matriz predial urbana, o prédio em causa nos presentes autos encontra-se em regime de propriedade total, sem andares nem divisões susceptíveis de utilização independente, afecto a “habitação”; - Cfr. Doc. 1 junto à PI.
  5. A Requerente adquiriu a propriedade do prédio em causa nos autos, conforme escritura pública celebrada em 5 de Agosto de 2008, constante do documento nº4, junto aos autos pela Requerente, em anexo à PI, exibindo a respectiva licença de habitação nº 252, mencionada na escritura junta como documento nº4 em anexo à PI;
  6. Por contrato de 15 de Julho de 2008 foi celebrado contrato de arrendamento do prédio em causa com o estabelecimento de ensino “O C..., Ensino de Crianças, Lda”, o qual sofreu alterações posteriores conforme documento nº 5 junto aos autos em anexo à PI, designado por “Alteração ao Contrato de Investimento e ao contrato de arrendamento celebrados em 15 de Julho de 2008”;
  7. Do conteúdo do contrato de investimento e de arrendamento supra referidos é possível concluir que “O C..., Ensino de Crianças, Lda” escolheu o prédio urbano em causa nos presentes autos para nele instalar o novo colégio, “actualmente utilizado para habitação e que será alvo de profunda remodelação e ampliação por forma a satisfazer todas as necessidades técnicas e funcionais impostas pela mudança de uso”(cláusula III);
  8. Foram emitidos dois Alvarás de construção com os nºs 164 e 81, a favor do arrendatário, emitidos em 6/09/2011 e 16/03/2010, respectivamente, nos termos dos quais foi autorizada uma “construção nova” com afectação a “equipamento escolar”; documentos nºs 6 e 7 juntos aos autos em anexo à PI;
  9. Até ao momento não foi emitido o Alvará de Utilização dos edifícios para o fim pretendido (“equipamento escolar”) em virtude de litígio entre a empresa construtora e o arrendatário e, por inerência, o proprietário do imóvel, ora Requerente.
  10. No prédio urbano, reconstruído, encontra-se em funcionamento, o colégio “O C... – Ensino de crianças Lda”.

 

 

  1. A convicção sobre os factos dados como provados fundou-se na prova documental junta aos autos pela Requerente (docs. nºs 1 a 8 juntos à petição inicial), ao que acresce a aceitação mútua das partes sobre os restantes.

 

  1.  Não se provaram outros factos com relevância para a decisão arbitral.

 

 

III – Matéria de Direito

 

 

 

  1. O quadro alegatório em que se sustenta o pedido de pronúncia arbitral pode sintetizar-se nos termos seguintes:

 

  1.  Segundo a AT, para efeitos tributários o prédio descrito nos presentes autos encontra-se afecto a habitação, uma vez que não ocorreu alteração na matriz predial urbana por via da qual o prédio visse alterado o seu fim. Uma vez que o seu VPT é superior a €1.000.000,00, enquadra-se no âmbito de incidência da verba 28.1 da Tabela anexa ao Código de Imposto de Selo.

Foi este entendimento que conduziu às liquidações de IS impugnadas nos autos.

 

  1. Para a Requerente, tal entendimento é ilegal, já que o prédio em causa foi adquirido com o propósito de nele instalar o Colégio de que é titular o arrendatário, como consta do contrato de investimento e de arrendamento junto aos autos. Pelo que, foram apresentados os necessários pedidos de licenciamento para obras destinadas a edificar uma construção nova destinada a equipamento escolar. A nova construção foi concluída (e demolido o original) e nela funciona o Colégio “O C..., ensino de crianças Lda”. Apesar de não estar ainda emitida a nova licença de utilização por força do litígio existente com a construtora, a nova construção foi terminada e o prédio está actualmente afecto a equipamento escolar e não a habitação, pelo que, o prédio em crise não integra o objecto de incidência da norma tributária consubstanciada no artigo 28.1 da TGIS.

 

 

 

  1. Estas são, sem síntese, as posições defendidas pelas partes, nos articulados junto aos autos.

Cumpre decidir.

 

 

  1.  A questão essencial a decidir é a de saber, com referência ao prédio em causa nos presentes autos, inscrito na matriz predial como prédio urbano, em propriedade total, afecto a habitação e com um VPT superior a €1.000.000,00, está sujeito a tributação em sede de Imposto de selo, ainda que se encontre a ser utilizado para uma outra actividade, no caso, o funcionamento de um estabelecimento escolar.

 

  1. A resposta a esta questão impõe a análise das normas jurídicas de referência de modo a determinar qual a interpretação conforme à Lei e à Constituição, com particular cuidado pois que se trata de aferir de um pressuposto de incidência de imposto, cuidadosamente protegido pelo princípio da legalidade fiscal resultante do disposto no artigo 103º, nº2 da CRP.

 

  1.  A sujeição a imposto do selo dos prédios com afetação habitacional resultou do aditamento da verba 28 da TGIS, efetuada pelo artigo 4º da Lei 55-A/2012, de 29/10, que tipificou os seguintes factos tributários:

“28 – Propriedade, usufruto ou direito de superfície de prédios urbanos cujo valor patrimonial tributário constante da matriz, nos termos do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (CIMI), seja igual ou superior a € 1.000.000,00 – sobre o valor patrimonial tributário para efeito de IMI:

28-1 – Por prédio com afectação habitacional – 1%

28.2 – Por prédio, quando os sujeitos passivos que não sejam pessoas singulares sejam residentes em país, território ou região sujeito a um regime fiscal claramente mais favorável, constante da lista aprovada por portaria do Ministro das Finanças – 7,5%.”

 

  1. Esta lei entrou em vigor no dia seguinte ao da sua publicação, ou seja, em 30 de outubro de 2012. Das normas transitórias constantes do seu artigo 6º resulta que o facto tributário se considera verificado a 31 de outubro de 2012 e que o valor patrimonial tributário a utilizar na liquidação do imposto corresponde ao que resulta das regras do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis por referência ao ano de 2011.
  2. De acordo, ainda, com o mesmo artigo 6º da Lei nº 55-A/2012, a tributação prevista na verba 28 da TGIS é, no ano de 2012, efetuada à taxa de 0,5% sobre o valor patrimonial tributário, desde que igual ou superior a €1.000.000,00 de prédios urbanos com afetação habitacional.

 

  1. A Lei 55-A/2012 nada diz quanto à qualificação dos conceitos em presença, nomeadamente, quanto ao conceito de “prédio com afectação habitacional.” No entanto o artigo 67º, nº 2 do Código do Imposto do Selo, aditado pela referida Lei, dispõe que “às matérias não reguladas no presente código respeitantes à verba 28 da Tabela Geral aplica-se subsidiariamente o CIMI.”

 

  1. A norma de incidência refere-se, pois, a prédios urbanos, cujo conceito é o que resulta do disposto no artigo 2º do CIMI, obedecendo a determinação do VPT aos termos do disposto no artigo 38º e seguintes do mesmo código.

Utilizando o critério que a própria lei introduziu no artigo 67º, nº 2 do Código do Imposto do Selo, “às matérias não reguladas no presente código respeitantes à verba 28 da Tabela Geral aplica-se subsidiariamente o CIMI.”

Consultado o CIMI verifica-se que o seu artigo 6º apenas indica as diferentes espécies de prédios urbanos, entre os quais menciona os habitacionais (vd. alínea a) do nº 1), esclarecendo no nº 2 do mesmo artigo que “habitacionais, comerciais, industriais ou para serviços são os edifícios ou construções para tal licenciados ou, na falta de licença, que tenham como destino normal cada um destes fins.”

 

  1. Daqui podemos concluir que, na ótica do legislador, não importa o rigor jurídico-formal da situação concreta do prédio mas sim a sua utilização normal, o fim a que se destina o prédio. O que releva é a verdade material subjacente à sua existência enquanto prédio urbano e à sua utilização.

 

  1. Importa ainda indagar qual a ratio legis subjacente à regra da verba 28 da TGIS, introduzida pela Lei nº 55-A/22012 de 29 de outubro, e em obediência ao disposto no artigo 9º do Código Civil, segundo o qual a interpretação da norma jurídica não deve cingir-se à letra da lei, mas reconstituir a partir dos textos e dos restantes elementos de interpretação o pensamento legislativo, tendo em conta a unidade do sistema jurídico, as circunstâncias em que foi elaborada e as condições específicas do tempo em que é aplicada.

 

  1. O legislador ao introduzir esta inovação legislativa considerou como elemento determinante da capacidade contributiva os prédios urbanos, com afetação habitacional, de elevado valor (de luxo), mais rigorosamente, de valor igual ou superior a €1.000.000,00, sobre os quais passou a incidir uma taxa especial de imposto de selo, pretendendo introduzir um princípio de tributação sobre a riqueza exteriorizada na propriedade, usufruto ou direito de superfície de prédios urbanos de luxo com afetação habitacional. Por isso, o critério foi de aplicação da nova taxa aos prédios urbanos com afetação habitacional, cujo VPT seja igual ou superior a €1.000.000,00.

 

  1. Isso mesmo se conclui da análise da discussão da proposta de lei nº 96/XII na Assembleia da República, disponível para consulta no Diário da Assembleia da República, I série, nº 9/XII/2, de 11 de outubro de 2012.

A fundamentação da medida designada por “taxa especial sobre os prédios urbanos habitacionais de mais elevado valor” assenta na invocação dos princípios da equidade social e da justiça fiscal, chamando a contribuir de uma forma mais intensa os titulares de propriedades de elevado valor destinadas a habitação, fazendo incidir a nova taxa especial sobre as “casas de valor igual ou superior a 1 milhão de euros.” 

  1. Claramente o legislador entendeu que este valor, quando imputado a uma habitação (casa, fração autónoma ou andar com utilização independente) traduz uma capacidade contributiva acima da média e, enquanto tal, susceptível de determinar um contributo especial para garantir a justa repartição do esforço fiscal.

 

  1. Logo, a verdade material é a que se impõe como critério determinante da capacidade contributiva e não a mera realidade jurídico- formal do prédio. – (Neste sentido cfr. Decisão arbitral nº 50/2013 de 29 de Outubro e Acórdão arbitral nº 53/2013 de 2 de Outubro)
  2.  Como se refere no Acórdão arbitral nº 53/2014 “o legislador optou por utilizar na referida verba 28.1 e nas subalíneas i) e ii) da3alínea f) do n.º 1 do artigo 6.º da º 55-A/2012, um conceito que não é utilizado em qualquer outra legislação tributária nestes precisos termos que é o de “prédio com afectação habitacional”. Na verdade, o CIMI, que em várias normas do CIS é indicado como diploma de aplicação subsidiária relativamente ao tributo previsto na referida verba n.º 28, o conceito utilizado não é coincidente com aquele.

 

  1. Assim, se atendermos aos tipos de prédios referidos em sede de IMI, encontramos os seguintes conceitos com relevância para a matéria dos autos:

1        – Segundo o artigo 2º do CIMI “prédio é toda a fracção de território, abrangendo as águas, plantações, edifícios e construções de qualquer natureza nela incorporados ou assentes, com carácter de permanência, desde que faça parte do património de uma pessoa singular ou colectiva e, em circunstâncias normais, tenha valor económico, bem como as águas, plantações, edifícios ou construções, nas circunstâncias anteriores, dotados de autonomia económica em relação ao terreno onde se encontrem implantados, embora situados numa fracção de território que constitua parte integrante de um património diverso ou não tenha natureza patrimonial.”

2        - Para efeitos deste imposto, “cada fracção autónoma, no regime de propriedade horizontal, é havida como constituindo um prédio.

3        – segundo o artigo 4º do CIMI consideram-se como prédios urbanos todos aqueles que não devam ser classificados como rústicos(…);”

4        – E segundo o artigo 6º os prédios urbanos dividem-se em: a) Habitacionais; b) Comerciais, industriais ou para serviços; c) Terrenos para construção; d) Outros.

5        – Consideram-se como habitacionais, comerciais, industriais ou para serviços os edifícios ou construções para tal licenciados ou, na falta de licença, que tenham como destino normal cada um destes fins.

 

  1.  No caso do prédio em discussão nos presentes autos, afigura-se necessário determinar a sua correcta qualificação, face aos factos considerados provados e à sua afectação efectiva. A questão decidenda é tão só a de saber se o prédio deve ou não considerar-se com afectação habitacional ou serviços.

 

  1. Sabemos que o prédio em causa nos autos se encontra inscrito na matriz predial urbana como tendo “afectação habitacional” e a única licença de utilização que lhe foi atribuída confirma o seu fim ou afectação habitacional. O destino actual do prédio construído de novo, conforme licenças de construção juntas aos autos, é a de “equipamento escolar”, ou seja, serviços. Porém, ainda sem licença de utilização para este fim.

 

  1. A interpretação das normas fiscais deve obedecer aos princípios de interpretação consagrados no artigo 11.º da Lei Geral Tributária, o qual estabelece as regras essenciais da interpretação das leis tributárias, bem assim como aos princípios consignados no artigo 9º do Código Civil.

 

O artigo 11º da LGT dispõe que:

 

“1 - Na determinação do sentido das normas fiscais e na qualificação dos factos a que as mesmas se aplicam, são observadas as regras e princípios gerais de interpretação e aplicação das leis.

2. Sempre que, nas normas fiscais, se empreguem termos próprios de outros ramos de direito, devem os mesmos ser interpretados no mesmo sentido daquele que aí têm, salvo se outro decorrer directamente da lei.

3. Persistindo a dúvida sobre o sentido das normas de incidência a aplicar, deve atender-se à substância económica dos factos tributários.

4. As lacunas resultantes de normas tributárias abrangidas na reserva de lei da Assembleia da República não são susceptíveis de integração analógica.”

 

 

  1. Os princípios gerais da interpretação das leis, para que remete o n.º 1 do artigo 11.º da LGT, são estabelecidos no artigo 9.º do Código Civil, que estabelece o seguinte:

“1. A interpretação não deve cingir-se à letra da lei, mas reconstituir a partir dos textos o pensamento legislativo, tendo sobretudo em conta a unidade do sistema jurídico, as circunstâncias em que a lei foi elaborada e as condições específicas do tempo em que é aplicada.

2. Não pode, porém, ser considerado pelo intérprete o pensamento legislativo que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso.

3. Na fixação do sentido e alcance da lei, o intérprete presumirá que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados.”

 

  1.  A questão que cumpre agora decidir é qual a interpretação do conceito de «prédio com afectação habitacional» utilizada pelo legislador na norma 28.1 da TGIS. Vejamos a este propósito o entendimento vertido no Acórdão Arbitral nº 53/2013 sobre esta mesma questão:  

“(…) nas normas do CIMI transcritas, não é utilizado na classificação dos prédios o conceito de «prédio com afectação habitacional». Também não se encontra este conceito, com esta terminologia, em qualquer outro diploma.

Assim, na falta de correspondência terminológica exacta do conceito de «prédio com afectação habitacional» com qualquer outro utilizado noutros diplomas, podem aventar-se várias hipóteses interpretativas. O ponto de partida da interpretação daquela expressão «prédios com afectação habitacional» é, naturalmente, o texto da lei, sendo com base nele que há que reconstituir o «pensamento legislativo», como impõe o n.º 1 do artigo 9.º do Código Civil, aplicável por força do disposto no artigo 11.º, n.º 1, da LGT.

O conceito mais próximo do teor literal desta expressão utilizada é manifestamente o de «prédios habitacionais», definido no n.º 2 do artigo 6.º do CIMI como abrangendo «os edifícios ou construções» licenciados para fins habitacionais ou, na falta de licença, que tenham como destino normal fins habitacionais.”

 

  1. Ora, a entender-se que a expressão «prédio com afectação habitacional» coincide com o de «prédios habitacionais», e que se entende como tal aquele que se encontre licenciado para esse fim, parece que não resta dúvida que a licença de utilização do prédio em causa é para habitação, pois que o mesmo não se encontra, ainda, licenciado para outro fim. Do texto da lei contido no artigo 6º, nº2 do CIMI o primeiro critério, vinculativo, nele estabelecido é que se atenda à licença de utilização do prédio e só na falta desta ao fim a que o prédio esteja a ser utilizado.

 

  1. No entanto, a não coincidência dos termos da expressão utilizada na verba n.º 28.1 da TGIS com a que se extrai do n.º 2 do artigo 6.º do CIMI, aponta no sentido de não se ter pretendido utilizar o mesmo conceito. Parece que o conceito de «prédio com afectação habitacional» será algo distinto de «prédios habitacionais»

 

  1. A palavra «afectação», neste contexto de utilização de um prédio, tem o significado de «acção de destinar alguma coisa a determinado uso». ( 1 ) «Quando, como é de regra, as normas (fórmulas legislativas) comportam mais que um significado, então a função positiva do texto traduz-se em dar mais forte apoio a ou sugerir mais fortemente um dos sentidos possíveis. É que, de entre os sentidos possíveis, uns corresponderão ao significado mais natural e directo das expressões usadas, ao passo que outros só caberão no quadro verbal da norma de uma maneira forçada, contrafeita. Ora, na falta de outros elementos que induzam à eleição do sentido menos imediato do texto, o intérprete deve optar em princípio por aquele sentido que melhor e mais imediatamente corresponde ao significado natural das expressões verbais utilizadas, e designadamente ao seu significado técnico-jurídico, no suposto (nem sempre exacto) de que o legislador soube exprimir com correcção o seu pensamento». ( 2 )

 

  1. A relevância do texto da lei é especialmente acentuada em matéria de interpretação de normas de incidência do Imposto do Selo, que se reconduzem a uma amálgama, sob uma denominação comum, de um conjunto incongruente de tributos de naturezas completamente distintas (sobre o rendimento, sobre a despesa, sobre o património, sobre actos, etc.), que não deixa margem apreciável para aplicação do critério interpretativo primordial, que é a unidade do sistema jurídico, que reclama a sua coerência global.
  2. A reconhecida falta de coerência do Imposto do Selo é particularmente exuberante no caso desta verba n.º 28.1, apressadamente incluída à margem do Orçamento Geral do Estado, por um legislador fiscal sem orientação fiscal global perceptível, que vai implementando sucessivamente normas de agravamento fiscal à medida dos revezes da execução orçamental, das imposições dos credores institucionais internacionais (representados pela «troika») e da fiscalização do Tribunal Constitucional.
  3. Na verdade, embora na «Exposição de Motivos» da Proposta de Lei n.º 96/XII/2.ª ( 3 ), em que se baseou a Lei n.º 55-A/2012, se faça referência à louvável preocupação do Governo de «reforçar o princípio da equidade social na austeridade, garantindo uma efectiva repartição dos sacrifícios necessários ao cumprimento do programa de ajustamento» e ao seu empenho «em garantir que a repartição desses sacrifícios será feita por todos e não apenas por aqueles que vivem do rendimento do seu trabalho», é manifesto, por um lado, que essas razões de equidade, decerto existentes, não começaram a valer em meados de 2012, já existindo no início do ano, quando entrou em vigor o Orçamento Geral do Estado e, por outro lado, que o alcance da verba n.º 28.1, ao tributar acrescidamente os prédios com afectação habitacional e não também os prédios que a não têm, deixa entrever que as preocupações de equidade social e a proclamada intenção de repartição dos sacrifícios por todos, atinge muito mais alguns do que propriamente todos.

 

  1. Neste contexto, não existindo elementos interpretativos seguros que permitam detectar coerência legislativa na solução adoptada na referida verba n.º 28.1 ou o acerto ou desacerto da solução adoptada (relevante para efeitos interpretativos à face do n.º 3 do artigo 9.ºç do Código Civil), o teor do texto legal tem de ser o elemento primacial da interpretação, em conformidade com a presunção, imposta pelo mesmo n.º 3 do artigo 9.º, de que o legislador soube exprimir o seu pensamento em termos adequados.

 

  1. À face daqueles significados das palavras «afectação» e «afectar», que são «dar destino» ou «aplicar», a fórmula utilizada naquela verba n.º 28.1 da TGIS, abrange, manifestamente, os prédios que já estão aplicados a fins habitacionais, pelo que importa indagar se abrangerá também os prédios que, apesar de não estarem ainda aplicados a fins habitacionais, estão a estes destinados e aqueles cujo destino é desconhecido.

 

  1. Por isso, haverá que esclarecer quando é que se pode entender que um prédio está afectado a fim habitacional, designadamente se é quando lhe é fixado esse destino num acto de licenciamento ou semelhante, ou apenas quando a efectiva atribuição desse destino é concretizada. Desde logo, o confronto da verba n.º 28.1 da TGIS com n.º 2 do artigo 6.º do CIMI, que define o conceito de prédios habitacionais, aponta manifestamente, no sentido de ser necessária uma afectação efectiva.

 

  1. Na verdade, um edifício ou construção licenciado para habitação ou, mesmo sem licença, mas que tenha como destino normal a habitação, é, à face do n.º 2 daquele artigo 6.º um prédio habitacional.

 

  1. Por isso, no pressuposto de que o legislador da Lei n.º 55-A/2012 soube exprimir o seu pensamento em termos adequados (como impõe o artigo 9.º, n.º 3, do Código Civil que se presuma), se pretendesse reportar-se a esses prédios já licenciados para habitação ou que tenham a habitação como destino normal, decerto teria utilizado o conceito de «prédios habitacionais», que expressaria perfeita e claramente o seu pensamento, à face da definição dada por aquele n.º 2 do artigo 6.º do CIMI.

 

  1. Consequentemente, deve presumir-se que o uso de uma expressão diferente tem em vista uma realidade distinta, pelo que, em boa hermenêutica, «prédio com afectação habitacional», não poderá ser um prédio apenas licenciado para habitação ou destinado a esse fim (isto é, não bastará que seja um «prédio habitacional»), tendo de ser um prédio que tenha já efectiva afectação a esse fim.

 

  1. Que é este o sentido da expressão «afectação», no mesmo contexto de classificação de prédios que faz o CIMI, confirma-se pelo artigo 3.º em que, relativamente aos prédios rústicos, se faz referência aos que «estejam afectos ou, na falta de concreta afectação, tenham como destino normal uma utilização geradora de rendimentos agrícolas», que evidencia que a afectação é concreta, efectiva. Na verdade, como se vê pela parte final deste texto, um prédio pode ter como destino uma determinada utilização e estar ou não afecto a ela, o que evidencia que a afectação é, a nível da ligação de um prédio a determinada utilização, algo mais intenso que o mero destino.

 

  1. De resto, o texto da lei ao adoptar a fórmula «prédio com afectação habitacional», em vez de «prédios urbanos de afectação habitacional», que aparece na referida «Exposição de Motivos», aponta fortemente no sentido de que se exige que a afectação habitacional já esteja concretizada, pois só assim o prédio estará com essa afectação. – Neste sentido, cfr. Acórdão arbitral nº 53/2014 – T.

 

  1. Esta interpretação, no sentido de que só prédios que estejam efectivamente afectos à habitação, se inserem no âmbito de incidência da verba n.º 28.1 da TGIS, é também confirmada pela ratio legis perceptível da restrição do campo de aplicação da norma aos prédios com afectação habitacional, no contexto das «circunstâncias em que a lei foi elaborada e as condições específicas do tempo em que é aplicada», que o artigo 9.º, n.º 1, do Código Civil também erige em elementos interpretativos.

 

  1. Por último, a limitação da tributação em Imposto do Selo aos «prédios com afectação habitacional» deixa perceber que não se pretendeu abranger no âmbito de incidência do imposto os prédios com afectação a serviços, indústria ou comércio, isto é, os prédios afectos à actividade económica, o que se compreende num contexto em que, como é notório, a economia se encontra em espiral recessiva, publicamente proclamada ao mais alto nível, com as taxas de desemprego a atingir níveis máximos históricos, com avalanche de encerramento de empresas derivado de insustentabilidade económica.

 

  1. Por isso, é de concluir que os elementos interpretativos disponíveis, inclusivamente as «circunstâncias em que a lei foi elaborada e as condições específicas do tempo em que é aplicada», apontam claramente no sentido de não se ter pretendido abranger no âmbito de incidência da verba n.º 28.1 as situações de prédios cuja afectação efectiva seja uma actividade económica, comércio, indústria ou serviços. No caso em apreciação o imóvel adquirido foi adquirido em 2008 pela Requerente com o objectivo de o ceder por contrato de arrendamento à entidade titular do colégio “O C...” para o destinar ao funcionamento do colégio, resultando do contrato de investimento e arrendamento a intenção de alteração da utilização a dar ao imóvel. Ficou provado nos autos que o arrendatário desenvolveu os procedimentos de licenciamento para construção do edifício escolar, e que este foi concluído e que se encontra em funcionamento o estabelecimento de ensino referenciado nos supra referidos contratos. Assim, o próprio procedimento de licenciamento para o novo destino do prédio foi iniciado e desenvolvido apenas não tendo sido ainda emitida a nova licença de utilização em virtude de um litígio pendente.

 

  1. A aplicação dos princípios supra expostos à situação da Requerente resulta que o prédio em causa nos autos foi adquirido como prédio licenciado para habitação já com a intenção de alterar o seu fim. Isso mesmo resulta do contrato de investimento e do contrato de arrendamento juntos aos autos. Isso mesmo se veio a confirmar com os pedidos de licenciamento requeridos e deferidos à arrendatária e, por consequência à ora Requerente que autorizou e negociou com a arrendatária os supra mencionados contratos para esse fim. Esta finalidade é aliás anterior à própria aquisição do imóvel pela ora Requerente, como resulta do contrato de investimento e de arrendamento juntos aos autos.

 

  1. A habitação lá existente à data da aquisição foi demolida e substituída por outra destinada a “equipamento escolar”, na qual funciona o Colégio designado por C... – Ensino de crianças Lda.

 

  1. Apesar do litígio com a construtora que tem impedido a emissão da nova licença de utilização definitiva para o fim pretendido “equipamento escolar” a verdade é que já lá funciona um colégio, ou seja, um estabelecimento escolar. Pelo que a afectação efectiva do prédio em 2012 já não era a habitação mas sim uma actividade económica em processo de licenciamento definitivo para esse fim.

 

  1. Pelo que, parece ser uma evidência que o prédio actualmente existente não tem afectação efectiva a habitação, e já à data de 2012 se encontrava afecto ao funcionamento do estabelecimento escolar. Ora, se à data da introdução do imposto contemplado na verba 28.1 da TGIS o prédio em causa já não se encontrava com afectação efectiva para habitação as liquidações de IS afiguram-se ilegais, por violação do disposto na norma do artigo 28.1 da TGIS.

 

  1. Assim, entende este Tribunal arbitral que pelo teor das licenças de construção e pela existência em funcionamento de um Colégio no prédio em causa, não estamos perante um prédio com afectação habitacional, pelo que não incide sobre tal prédios o Imposto do Selo previsto na verba 28.1 da TGIS.

 

  1. Por isso, as liquidações cuja declaração de ilegalidade é pedida enfermam de vício de violação daquela verba n.º 28.1, por erro sobre os pressupostos de direito, que justifica a declaração da sua ilegalidade e anulação, nos termos previstos no artigo 135º do CPA.

 

  1.  Nestes termos e com a fundamentação que se deixa exposta decide este tribunal arbitral julgar procedente o pedido de pronúncia arbitral, com a consequente anulação do ato de liquidação impugnado, consubstanciado na liquidação de IS com referência ao ano de 2012, cobrado em três prestações.

 

  1. Em consequência de todo o supra exposto, resulta as liquidações impugnadas são ilegais, padecem do vício de violação de lei, por erro sobre os pressupostos de facto e de direito, pelo que, devem ser objecto de anulação, procedendo-se, consequentemente, ao reembolso à Requerente do montante indevidamente pago.

 

 

IV- do pedido e do direito a pagamento de juros indemnizatórios.

 

  1. Dispõe a alínea b), do nº 1, do art.º 24º, do RJAT, que a decisão arbitral sobre o mérito da pretensão de que não caiba recurso ou impugnação vincula a administração tributária a partir do termo do prazo previsto para o recurso ou impugnação, devendo esta - nos exactos termos da procedência da decisão arbitral a favor do sujeito passivo e até ao termo do prazo previsto para a execução espontânea das sentenças dos tribunais judiciais tributários - restabelecer a situação que existiria se o acto tributário objecto da decisão arbitral não tivesse sido praticado, adoptando os actos e operações necessários para o efeito.

 

  1. Tal dispositivo está em sintonia com o disposto no art.º 100º, da LGT, aplicável ao caso por força do disposto na alínea a), do nº 1, do art.º 29º, do RJAT, no qual se estabelece que “A administração tributária está obrigada, em caso de procedência total ou parcial de reclamações ou recursos administrativos, ou de processo judicial a favor do sujeito passivo, à imediata e plena reconstituição da situação que existiria se não tivesse sido cometida a ilegalidade, compreendendo o pagamento de juros indemnizatórios, nos termos e condições previstos na lei.”

 

  1. Dispõe, por sua vez, o artigo 43º, nº1, da Lei Geral Tributária que “são devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido.”

 

  1. Da análise dos elementos probatórios constantes dos presentes autos não é possível inferir que a AT tivesse conhecimento dos elementos factuais relevantes para proceder à correcta liquidação do imposto em momento anterior à notificação da apresentação do Pedido Arbitral. Mas é certo que nesse momento teve conhecimento dos factos relevantes e do teor da resposta apresentada pela AT é possível inferir que era do seu conhecimento que o prédio em causa estava e está afecto ao funcionamento do Colégio. Certo é que, com a notificação do Pedido arbitral apresentado e dos meios de prova juntos em anexo ao Pedido a AT teve a possibilidade de revogar os actos travando os seus efeitos, o que não sucedeu. Não o tendo feito e mantendo as liquidações inquinadas de erro sobre os pressupostos, está obrigada a indemnizar.

 

  1. Assim sendo, atento o disposto no artigo 61º, do CPPT e considerando que se encontram preenchidos os requisitos do direito a juros indemnizatórios, ou seja, verificada a existência de erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido, tal como previsto no nº 1 do art.º 43º da LGT, a Requerente tem direito a juros indemnizatórios à taxa legal, calculados sobre a quantia de €14.626,50, a contar da data em que foi efectuado o pagamento até ao seu integral reembolso.

 

  1. No caso dos presentes autos, há que aplicar os supra mencionados princípios e, na sequência da ilegalidade dos actos de liquidação, referenciados neste processo, terá, por força dessas normas, de haver lugar ao reembolso dos montantes pagos, seja a título do imposto pago, seja dos correspondentes juros indemnizatórios, como forma de se alcançar a reconstituição da situação que existiria se não tivesse sido cometida a ilegalidade.

 

  1. Não se afigura existirem outras questões relevantes suscitadas pelas partes.

 

V - DECISÃO

 

Face ao exposto, este Tribunal Arbitral decide:

 

A) - Julgar procedente o pedido de declaração da ilegalidade das liquidações de Imposto de selo impugnadas nos presentes autos, por padecerem do vício de violação de lei por erro sobre os pressupostos de facto e de direito, anulando-se, consequentemente, os correspondentes actos tributários;

 

B)- Julgar procedente o pedido de condenação da Administração Tributária no reembolso da quantia indevidamente paga, no montante de €14.626,50, acrescida de juros indemnizatórios à taxa legal, contados desde o dia do pagamento efectuado até ao integral reembolso do mencionado montante, condenando a Autoridade Tributária e Aduaneira a efectuar estes pagamentos.

 

Valor do processo: Em conformidade com o disposto nos artigos 306º, nºs 1 e 2 do CPC, artigo 97º - A, nº 1, alínea a), do CPPT e artigo 3º, nº 2 do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se ao processo o valor de €14.626,50.

 

Custas: Nos termos do disposto no nº 4, do art.º 22º, do RJAT e nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se o montante das custas em €918,00 a cargo da Requerida Autoridade Tributária e Aduaneira.

 

 

Registe-se e notifique-se. 

 

Lisboa, 19 de Novembro de 2014

 

A Juiz-Árbitro singular,

 

 

 

(Maria do Rosário Anjos)

 

 

 

 



[1] A presente decisão é redigida de acordo com a ortografia antiga.