Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 295/2014-T
Data da decisão: 2014-11-21  Selo  
Valor do pedido: € 10.527,80
Tema: IS – Verba 28 da TGIS – Propriedade vertical
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Decisão Arbitral

 

Processo n.º 295/2014-T

 

 

I.                   Relatório

 

1. A… - ADMINISTRAÇÃO E SERVIÇOS, LDA., NIPC …, com sede no … Lisboa, e o capital social de € 50.000,00 (cinquenta mil euros), (adiante designada por «Requerente»), veio, nos termos do disposto no artigo 10.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (RJAT), na redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, requerer a constituição do tribunal arbitral tendo em vista a apreciação da legalidade das liquidações de Imposto do Selo (verba n.º 28 da Tabela Geral), relativas ao ano de 2012, no valor total de € 10.527,80, juntando como prova documentos numerados de 1 a 7.

2. Aceite o pedido, e tendo a Requerente optado por não designar árbitro, foi, nos termos do n.º 1 do artigo 6.º do RJAT, por decisão do Presidente do Conselho Deontológico, designada como árbitro único a signatária, que aceitou o cargo no prazo legalmente estipulado.

3. O tribunal arbitral singular ficou constituído em 4 de Junho de 2014.

4. Notificado o dirigente máximo do serviço da Administração Tributária e Aduaneira (também designada AT ou Requerida) nos termos do artigo 17º do RJAT, foi apresentada Resposta, em 7 de Julho de 2014, pelos juristas designados para o efeito.

5. Em resposta a despacho arbitral de 24 de Setembro de 2014, sobre a necessidade de realização da reunião do artigo 18º do RJAT e de apresentação de alegações, Requerente e Requerida declararam prescindir quer da reunião quer da produção de alegações.

6. O Tribunal decidiu ainda que a decisão seria proferida até à data limite para emissão de pronúncia.

 

7. O pedido de Pronúncia arbitral

  Sintetizando, os fundamentos apresentados pela Requerente são os seguintes:

-          A Requerente, proprietária de um imóvel urbano em Lisboa, dividido em 7 andares ou divisões com utilização independente em que se incluem 5 andares (1.º andar ao 5.º andar) com afectação habitacional, foi notificada de liquidações de Imposto do Selo (verba 28 da TGIS) nos valores de €2.084,70, € 2.084,70, € 2.105,60, € 2.126,40 e € 2.126,40 (num total de € 10.527,80), correspondentes aos diferentes andares, com valores patrimoniais tributários de € 208.470,00, € 208.470,00, € 210.560,00, € 212.640,00 e € 212.640,00.

-          As notificações relativas a cada um dos andares referem um «valor patrimonial do prédio - total sujeito a imposto: 1.052.780,00» mas não contém qualquer fundamentação para desconsiderar os valores patrimoniais tributários de cada um dos andares em causa para efeitos da verba 28 da Tabela Geral - todos eles claramente inferiores a €1.000.000,00.

-          A Requerente procedeu ao pagamento integral, nos prazos que lhe foram fixados, de todas as importâncias liquidadas a título de Imposto do Selo acima referidas mas não se conforma com a legalidade de tais liquidações, por entender que padecem de vício de violação de lei, conforme passa a demonstrar-se.

-          Segundo a verba n.º 28 da Tabela Geral do Imposto do Selo e o artigo 67.º, n.º 2, do Código do Imposto do Selo, em resultado das alterações introduzidas pela Lei n.º 55-A/2012, de 29 de Outubro, e o artigo 12.º, n.º 3, do Código do IMI, é com base no valor patrimonial tributário de cada andar ou parte de prédio susceptível de utilização independente e com afectação habitacional que se determina a sua sujeição a imposto ou não – como sucede no caso presente – pela verba n.º 28 da Tabela Geral, pelo que as liquidações incidentes sobre unidades autónomas com utilização independente, cujo valor patrimonial é inferior ao limiar mínimo de incidência do imposto, assentam em erro sobre os pressupostos de facto e direito da tributação em sede de Imposto do Selo, em violação do disposto na verba n.º 28 da TGIS, devendo ser anuladas.

-          Este entendimento tem sido reiterado em diversas Decisões Arbitrais (são citadas decisões 48/2013-T; 50/2013-T e 132/2013-T), de que se realça a referência aos trabalhos preparatórios da Lei nº 55-A/2012, realçando até a violação pelos actos de liquidação contestados de princípios constitucionais, designadamente princípio da igualdade (cfr. artigo 13.º da CRP), e em particular da igualdade em sede de tributação do património (cfr. artigo 104.º, n.º 3, da CRP) por tratarem os prédios em causa (unidades susceptíveis de utilização independente) diferentemente daqueles outros que se encontram em situação substancialmente igual, apesar de constituídos em propriedade horizontal, já que se o imóvel em causa tivesse sido dividido em propriedade horizontal, nenhuma das fracções autónomas seria tributada nesta sede.

-          Sendo ilegais as liquidações contestadas, a Requerente tem direito a juros indemnizatórios, de acordo com os artigos 35.º, n.º 1, da LGT, 61.º, n.º 5, do CPPT e 43.º, n.º 1, da LGT.

 

8.A Resposta da Autoridade Tributária e Aduaneira

A Requerida respondeu, em síntese:

-          O prédio urbano em causa foi avaliado nos termos do CIMI, no âmbito da avaliação geral, sendo descrito como «prédio em propriedade total com andares ou divisões susceptíveis de utilização independente», 2 caves, r/ch, e 5 andares ou divisões susceptíveis de utilização independente e afectos a habitação, com valor patrimonial tributário (VP) superior a € 1.000.000,00 (1.425.370,00 €).

-          O conceito de prédio encontra-se definido no artigo 2º, n.º 1, do CIMI, cujo n.º 4 estatui que no regime de propriedade horizontal, cada fracção autónoma é havida como constituindo um prédio, mas o caso do prédio dos autos é um «prédio em propriedade total com andares ou divisões susceptíveis de utilização independente».

-          O artigo 12º do CIMI, nº 3, estatui exclusivamente quanto à forma de registar os dados matriciais, quanto à liquidação de IMI, enquanto, neste caso, o VP que serve de base ao seu cálculo, é indiscutivelmente o VP que a ora Requerente define como «valor global do prédio».

-          Embora a liquidação do IS, nas situações previstas na verba nº 28.1 da TGIS, se processe de acordo com as regras do CIMI, o legislador ressalva os aspectos que careçam das devidas adaptações: é o caso dos prédios em propriedade total, ainda que com andares ou divisões susceptíveis de utilização independente (muito embora o IMI seja liquidado relativamente a cada parte susceptível de utilização independente).

-          Para efeitos de IS releva o prédio na sua totalidade porque as divisões susceptíveis de utilização independente não são todas havidas como prédio, apenas o sendo as fracções autónomas no regime de propriedade horizontal, conforme nº 4 do art. 2º do CIMI.

-          A sujeição ao imposto de selo da verba 28.1. da Tabela Geral anexa ao CIS resulta da conjugação de dois factos: a afectação habitacional e o valor patrimonial do prédio urbano inscrito na matriz ser igual ou superior a € 1.000.000,00.

-          Consta da caderneta predial que o prédio se encontra em regime de propriedade total, composto por várias partes susceptíveis de utilização independente, e as liquidações de imposto do selo, reportadas ao ano de 2012, têm em conta o artigo 23º, n.º 7, do CIS, e o artigo 113º, n.º 1 - a liquidação efectua-se com base nos valores patrimoniais tributários dos prédios e em relação aos sujeitos passivos que constem das matrizes em 31 de Dezembro do ano a que as mesmas respeitam (no caso do imposto de 2012, 31 de Dezembro deste ano).

-          Encontrando-se o prédio em regime de propriedade total, não possuindo fracções autónomas, às quais a lei fiscal, atribua a qualificação de prédio, porque da noção de prédio do artigo 2º do CIMI, só as fracções autónomas de prédio em regime de propriedade horizontal são tidas como prédios (n.º 4 do citado artigo 2º) inexiste violação de lei por erro quanto aos pressupostos de direito.

-          Também não há violação do princípio de igualdade tributária e da capacidade contributiva: não há discriminação na tributação de prédios constituídos em propriedade horizontal e prédios em propriedade total com andares ou divisões susceptíveis de utilização independente, ou entre prédios com afectação habitacional e prédios com outras afectações.

-          A propriedade horizontal e a propriedade vertical são institutos jurídicos com regimes jurídico-civilísticos diferenciados, justificando-se beneficiar o instituto juridicamente mais evoluído da propriedade horizontal.

-          A verba 28.1 é uma norma geral e abstracta, aplicável de forma indistinta a todos os casos em que se verifiquem os respectivos pressupostos de facto e de direito, a tributação em sede de IS obedece ao critério de adequação, na exacta medida em que visa a tributação da riqueza consubstanciada na propriedade de imóveis de elevado valor, surgindo num contexto de crise económica que não pode de todo ser ignorado.

-          Este mecanismo de obtenção da receita não viola o princípio da proporcionalidade porque é aplicável de forma indistinta a todos os titulares de imóveis com afectação habitacional de valor superior a € 1.000.000,00.

-          A AT agiu em conformidade com uma informação vinculativa (despacho de concordância de 11.2.2013 do Substituto Legal do Director-Geral da Autoridade Tributária) - os actos tributários não violaram qualquer princípio legal ou constitucional nem há lugar a direito a juros indemnizatórios previsto no n.º1 do artigo 43º da LGT porque não ficou demonstrado que tenha havido erro imputável aos serviços de que tenha resultado pagamento de dívida tributária em montante superior ao legalmente devido.

-          A Administração Tributária, vinculada ao princípio da legalidade, não pode deixar de dar integral cumprimento aos normativos que o legislador ordinário criou e que estejam em vigor no ordenamento jurídico e, por força do disposto no artigo 55º da LGT, a Administração tributária fez a aplicação da lei, nos termos em que como órgão executivo está adstrita constitucionalmente, não se podendo falar em erro dos serviços nos termos do disposto no artigo 43º da LGT.

 

9.      Questões a decidir

No presente processo há que decidir:

  • Se o VPT relevante como critério de incidência do Imposto de Selo previsto na verba 28 da TGIS, relativamente a um prédio não constituído em regime de propriedade horizontal, integrado por diversos andares e divisões com utilização independente com afectação habitacional é o correspondente ao somatório do valor patrimonial tributário atribuído às diferentes partes ou andares (VPT global) ou o VPT atribuído a cada uma das partes ou andares habitacionais.
  • Se existe direito a juros indemnizatórios, no caso de ser declarada a ilegalidade da liquidação.

 

10. Saneamento

O tribunal arbitral colectivo é materialmente competente, nos termos do disposto nos artigos 2.º, n.º 1, al. a) do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária.

 

As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias e têm legitimidade nos termos do art.º 4.º e do n.º 2 do art.º 10.º do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (RJAT), e art.º 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março.

 

O processo não padece de qualquer nulidade nem foram suscitadas pelas partes quaisquer excepções que obstem à apreciação do mérito da causa, pelo que se mostram reunidas as condições para a prolação da decisão arbitral.

 

 

II. FUNDAMENTAÇÃO

11. Factos provados

Com base nas peças juntas pela Requerente (Pedido de pronúncia arbitral e Documentos nº 1 a 7 juntos) e pela Requerida (Resposta), fixa-se a seguinte factualidade, sendo que os factos provados se mostram suficientes para emissão de pronúncia:

11.1. A Requerente é proprietária de um imóvel sito no …, em Lisboa, freguesia de …, prédio urbano com o artigo matricial …, correspondente anteriormente ao artigo matricial U-… da matriz urbana da (extinta) freguesia … (Caderneta predial, documento nº 6 junto com o pedido, e os Documentos de cobrança juntos com o Pedido).

11.3. O prédio objecto dos autos é um prédio em propriedade total com andares ou divisões susceptíveis de utilização independente, tem oito (8) pisos e divisões susceptíveis de utilização independente, em que se incluem cinco (5) andares (1.º andar ao 5.º andar) com afectação habitacional (Caderneta predial, documento nº 6 junto com o pedido).

11.4. A Requerente foi notificada para pagar liquidações de Imposto de Selo respeitantes aos 1.º, 2.º, 3.º, 4.º e 5.ºandares do prédio acima identificado, referentes ao ano de 2012 e para pagamento até final de Dezembro de 2013, através dos Documentos de cobrança com os números 2013 …, 2013 …; 2013 …, 2013 … e 2013 … (documentos nºs 1 a 5 e doc. n.º 6, juntos com o pedido).

11.5. As liquidações referidas no número anterior indicam como fundamento a Verba 28.1 da TGIS e correspondem à aplicação de uma taxa de 1% aos valores patrimoniais tributáveis dos diversos andares (1º, 2º, 3, 4º e 5º), de € 208.470,00, € 208.470,00, € 210.560,00, € 212.640,00 e € 212.640,00, respectivamente, sendo apuradas colectas nos montantes de €2.084,70, € 2.084,70, € 2.105,60, € 2.126,40 e € 2.126,40, também respectivamente, incluindo-se em cada um dos documentos de cobrança a indicação “valor patrimonial do prédio – total sujeito a imposto : € 1.052.780,00” (documentos. 1 a 5).

11.6. Em 27 de Fevereiro de 2013, a Requerente procedeu ao “pagamento integral voluntário em processo de execução fiscal” (Doc. 7 junto com o Pedido de pronúncia).

 

12. Factos não provados

Não há factos não provados com relevância para a decisão da causa.

 

13. O Direito aplicável

13.1. O âmbito de incidência da verba 28 da Tabela Geral do Imposto do Selo

A questão fundamental de direito controvertida nos presentes autos consiste em saber se no caso de prédios em propriedade total, com andares ou divisões de utilização independente mas não constituídos em regime de propriedade horizontal, o VPT a considerar para efeitos de incidência de Imposto do Selo previsto na verba 28.1 da TGIS deve corresponder ao VPT de cada andar ou divisão com e afectação habitacional e utilização independente ou à soma dos VPT correspondentes aos andares ou divisões de utilização independente com afectação habitacional. Ou seja, saber se o VPT relevante como critério de incidência do imposto é o correspondente ao somatório do valor patrimonial tributário atribuído às diferentes partes ou andares (VPT global) ou, antes, o VPT atribuído a cada uma das partes ou andares habitacionais. 

 

Esta questão já foi apreciada em vários processos no âmbito da Arbitragem Tributária [1], não se identificando, até agora, argumentos que permitam quebrar a unanimidade que vem sendo alcançada nas decisões proferidas [2].

 

A verba 28 da Tabela Geral do Imposto do Selo, anexa ao Código do Imposto do Selo (CIS), foi aditada pelo artigo 4º da Lei nº 55-A/2012, de 29 de Outubro, com o seguinte conteúdo:

“28 – Propriedade, usufruto ou direito de superfície de prédios urbanos cujo valor patrimonial tributário constante da matriz, nos termos do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (CIMI), seja igual ou superior a € 1.000.000 – sobre o valor patrimonial tributário para efeito de IMI:

28-1 – Por prédio com afectação habitacional – 1%;

28.2 – Por prédio, quando os sujeitos passivos que não sejam pessoas singulares sejam residentes em país, território ou região sujeito a um regime fiscal claramente mais favorável, constante da lista aprovada por portaria do Ministro das Finanças – 7,5%.”

 

Segundo resulta das alterações ao Código do Imposto do Selo, introduzidas pelo artigo 3º da Lei nº 55-A/2012, de 29/10, o Imposto do Selo previsto na verba 28 da TGIS incide sobre uma situação jurídica (nº 1 do art. 1º e nº 4 do art. 2º do CIS), em que os respectivos sujeitos passivos são os referidos no artigo 8.º do CIMI (nº 4 do art. 2º do CIS), aos quais cabe o encargo do imposto (alínea u) do nº 3 do artigo 3º do CIS). 

 

O disposto no Código do Imposto do Selo (CIS), na redacção dada pela Lei nº 55-A/2012, quer no artigo 4º, nº 6 (“Nas situações previstas na verba 28 da Tabela Geral, o imposto é devido sempre que os prédios estejam situados em território português”), quer no artigo 23º, nº 7 (“Tratando-se do imposto devido pelas situações previstas na verba n.º 28 da Tabela Geral, o imposto é liquidado anualmente, em relação a cada prédio urbano, pelos serviços centrais da Autoridade Tributária e Aduaneira, aplicando-se, com as necessárias adaptações, as regras contidas no CIMI”), conjugados com o art. 1º do CIMI, consideram o prédio em si como o facto tributário (a situação que desencadeia a tributação) desde que atinja o valor previsto na verba 28 da Tabela Geral do Selo, independentemente do número de sujeitos passivos, possuidores (enquanto proprietários, usufrutuários ou superficiários) dos bens em causa.   

 

O disposto na Lei nº 55-A/2012, de 29 de Outubro, quanto à nova verba 28 da Tabela Geral de Imposto de Selo, entrou em vigor no dia seguinte à publicação da lei, ou seja, 30 de Outubro de 2012. O artigo 6º da Lei nº 55-A/2012, prevê disposições transitórias por virtude das quais, nesse primeiro ano de vigência, ou seja, 2012: o facto tributário verifica-se no dia 31 de Outubro (quando, de acordo com o artigo 8º do CIMI, aplicável por remissão do nº 4 do art. 2º do CIS, seria em 31 de Dezembro); o sujeito passivo do imposto é o titular do prédio (n.º 4 do artigo 2.º do CIS) também nesse dia 31 de Outubro; o valor patrimonial tributário a utilizar na liquidação do imposto corresponde ao que resulta das regras previstas no CIMI por referência ao ano de 2011; a liquidação do imposto pela AT é efectuada até ao final do mês de Novembro de 2012; o imposto deverá ser pago numa única prestação, pelos sujeitos passivos, até ao dia 20 de Dezembro desse ano 2012.

 

Quanto às taxas, a alínea f) do nº 1 do mesmo artigo 6º, da Lei nº 55-A/2012, prevê a aplicação em 2012 de uma taxa inferior à taxa de 1%, prevista na verba 28.1 da TGIS para prédios com afectação habitacional, distinguindo-se ainda entre os casos de prédios avaliados nos termos do Código do IMI (taxa de 0,5 %) e prédios com afectação habitacional ainda não avaliados nos termos do Código do IMI (taxa de 0,8 %).

 

13.2. O conceito de prédio utilizado na verba 28 da TGIS

O conceito de “prédios com afectação habitacional” utilizado na verba 28.1 [3] não se encontra expressamente definido em qualquer disposição do CIS nem no CIMI, diploma para que remete o n.º 2 do art.º 67.º do CIS.

 

No caso dos autos, quer se tome em conta todo o prédio (edifício) da Requerente em propriedade vertical quer cada uma das respectivas divisões autónomas, trata-se (não vem contestado) de prédio classificado como urbano e habitacional de acordo com os critérios estabelecidos nos artigos 2.º, 4.º e 6.º do Código do IMI, aplicáveis por remissão do artigo 67º do CIS.

 

Assim, está apenas em causa o exacto sentido do segmento "valor patrimonial considerado para efeitos de IMI", constante da norma de incidência do imposto do selo no corpo da verba 28 da TGIS: no caso de prédios em propriedade total mas com andares ou divisões susceptíveis de utilização independente, com afectação habitacional, o VPT relevante corresponde à soma do VPT das diversas divisões/andares, como pretende a AT, ou o que há que ter em conta é o VPT de cada um dos respectivos andares ou divisões autónomas, como defende a Requerente?

 

Ora esse segmento está integrado num texto que define como objecto de incidência do imposto do selo a “Propriedade, usufruto ou direito de superfície de prédios urbanos cujo valor patrimonial tributário constante da matriz, nos termos do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (CIMI), seja igual ou superior a € 1.000.000 – sobre o valor patrimonial tributário para efeito de IMI(bold nosso).

 

Como tem sido repetidamente invocado e admitido, o Código do IMI consagra, quer quanto à inscrição matricial e discriminação do respectivo valor patrimonial tributário, quer quanto à liquidação do imposto, a autonomização das partes de prédio urbano susceptíveis de utilização independente e a segregação/individualização do VPT relativo a cada andar ou parte de prédio susceptível de utilização independente [4].

 

Assim, a cada prédio corresponde um único artigo na matriz (nº 2 do artigo 82º do CIMI) mas, segundo o nº 3 do art. 12.º do mesmo Código, referente ao conceito de matriz predial (registo do prédio, sua caracterização, localização, VPT e titularidade), "cada andar ou parte de prédio susceptível de utilização independente é considerado separadamente na inscrição matricial, a qual discrimina o respectivo valor patrimonial tributário”, não se tomando como referência o somatório dos valores patrimoniais atribuídos às partes autónomas de um mesmo prédio, mas o valor atribuído a cada uma delas individualmente considerado.

 

Quanto à liquidação do IMI - aplicação da taxa à base tributável - o art. 119.º, n.º 1 dispõe que “o competente documento de cobrança” contém a “discriminação dos prédios, suas partes susceptíveis de utilização independente, respectivo valor patrimonial tributário e da colecta (…)”.

 

Ou seja, a regra é a autonomização, a caracterização como “prédio” de cada parte de um edifício, desde que funcional e economicamente independente, susceptível de utilização independente [5], de acordo com o conceito de prédio definido logo no nº 1 do artigo 2º do CIMI: prédio é toda a fracção (de território, abrangendo águas, plantações, edifícios e construções de qualquer natureza nela incorporados ou assentes, com carácter de permanência) desde que faça parte do património de uma pessoa singular ou colectiva e, em circunstâncias normais, tenha valor económico, bem como as águas, plantações, edifícios ou construções, nas circunstâncias anteriores, dotados de autonomia económica (apresentação e sublinhado nossos). [6]

 

Assim, quando o nº 4 do artigo 2º dispõe que “Para efeitos deste imposto, cada fracção autónoma, no regime de propriedade horizontal, é havida como constituindo um prédio”, não consagra propriamente um regime excepcional ou especial para os prédios em propriedade horizontal.

 

Afinal, cada edifício em propriedade horizontal (artigo 92º) tem apenas uma só inscrição matricial (nº 1), descrevendo-se genericamente o edifício e mencionando-se o facto de ele se encontrar em regime de propriedade horizontal (nº 2) e a autonomia matricial concretiza-se na atribuição a cada uma das fracções autónomas, pormenorizadamente descrita e individualizada, de uma letra maiúscula, segundo a ordem alfabética (nº 3). Esta parece ser a especificidade dos edifícios em propriedade horizontal; nos outros casos, de prédios em propriedade vertical ou total, as divisões ou andares com autonomia mas sem o estatuto de propriedade horizontal, a matriz consagra também a autonomia mas evidenciando as unidades com indicação do tipo de piso/andar.

 

Nem parece aceitável a argumentação que tem vindo a ser apresentada pela AT baseada na importância da propriedade horizontal e incentivo legislativo ao seu desenvolvimento. Com efeito, não são identificáveis, na Lei nº 55-A/2012, de 29 de Outubro, quaisquer elementos de interpretação que permitam identificar e legitimar uma finalidade (extra-fiscal) no sentido defendido pela Requerida. Antes parece que tal discriminação, inesperada, se arriscaria a violar o princípio da confiança...

 

Nem a existência da crise financeira, também invocada, parece poder fundamentar por si um tratamento distinto de prédios em regimes de propriedade horizontal e vertical. Uma incidência diferente para realidades em grande parte idênticas dificilmente fugiria à acusação de arbitrariedade, tanto mais que existe, efectivamente, o risco de situações geralmente relacionadas com menor capacidade tributária (são os prédios mais antigos, relacionados com rendas mais dificilmente actualizáveis, os que em geral mantém a forma de propriedade total ou vertical) serem as abrangidas por um tratamento fiscal mais gravoso.

 

Nem convence a argumentação da Requerida (ponto 6 da Resposta) de que embora a liquidação do IS, nas situações previstas na verba nº 28.1 da TGIS, se processe de acordo com as regras do CIMI, o legislador ressalva os aspectos que careçam das devidas adaptações, como é o caso dos prédios em propriedade total, ainda que com andares ou divisões susceptíveis de utilização independente (sublinhados nossos), em que apesar de o IMI ser liquidado relativamente a cada parte susceptível de utilização independente “para efeitos de IS releva o prédio na sua totalidade pois que as divisões susceptíveis de utilização independente não são havidas como prédio, mas apenas as fracções autónomas no regime de propriedade horizontal, conforme nº 4 do art. 2º do CIMI.” (ponto 15 da Resposta).

 

A questão é que, precisamente, carece de demonstração a razão pela qual devem ser aceites as “adaptações” às normas do CIMI, preconizadas pela AT. 

 

Tudo dito, não se encontra razão para, em matéria de incidência do Imposto do Selo previsto na verba 28.1 da TGIS, dar às fracções de prédios em “propriedade vertical”, dotadas de autonomia, tratamento diferente do concedido aos prédios em propriedade horizontal, quando em qualquer dessas situações o IMI é aplicado ao valor patrimonial evidenciado na matriz para cada uma das unidades autónomas.

 

13.2. A ratio legis da verba 28 e 28.1 da TGIS

A interpretação acima sustentada, decorrente da análise da letra da lei e sua inserção no conjunto de outras normas tributárias aplicáveis, é a mais consonante com o espirito das alterações legislativas introduzidas pela Lei nº 55-A/2012, de 29 de Outubro.

 

Como já foi evidenciado em outras decisões arbitrais, “o legislador ao introduzir esta inovação legislativa considerou como elemento determinante da capacidade contributiva os prédios urbanos, com afetação habitacional, de elevado valor (de luxo), mais rigorosamente, de valor igual ou superior a €1.000.000,00 sobre os quais passou a incidir uma taxa especial de imposto de selo, pretendendo introduzir um princípio de tributação sobre a riqueza exteriorizada na propriedade, usufruto ou direito de superfície de prédios urbanos de luxo com afetação habitacional. Por isso, o critério foi de aplicação da nova taxa aos prédios urbanos com afetação habitacional, cujo VPT seja igual ou superior a € 1.000.000,00”. (...) “A fundamentação da medida designada por taxa especial sobre os prédios urbanos habitacionais de mais elevado valor” assenta na invocação dos princípios da equidade social e da justiça fiscal, chamando a contribuir de uma forma mais intensa os titulares de propriedades de elevado valor destinadas a habitação, fazendo incidir a nova taxa especial sobre as casas de valor igual ou superior a 1 milhão de euros. Claramente o legislador entendeu que este valor, quando imputado a uma habitação (casa, fração autónoma ou andar com utilização independente) traduz uma capacidade contributiva acima da média e, enquanto tal, suscetível de determinar um contributo especial para garantir a justa repartição do esforço fiscal." [7]

 

Ora, parece carecer totalmente de adesão à realidade a sustentação da tese de que a detenção de fracções desprovidas de estatuto de propriedade horizontal denuncia maior capacidade contributiva do que se forem providas daquela natureza….

 

Pelo contrário, na maioria dos casos, como evidenciado pela Decisão Arbitral nº 50/2013, “muitos dos prédios existentes em propriedade vertical são antigos, com uma utilidade social inegável, pois em muitos casos acolhem moradores com rendas módicas e mais acessíveis, fatores que necessariamente devem ser tidos em conta.”

 

Assim, considera-se correcta a interpretação de que a verba 28 da TGIS não abrange cada um dos andares, divisões ou partes susceptíveis de utilização independente quando apenas do respectivo somatório resulta um VPT superior ao que prevê a mesma verba.

 

Tal como decidido em outros processos arbitrais, este tribunal entende que no tocante à data da constituição da obrigação tributária, conexão fiscal, determinação da base tributável, liquidação e pagamento do imposto do selo em causa, são aplicáveis as correspondentes regras do CIMI, por remissão expressa dos artigos 5.º, n.º1, alínea u), 4.º, n.º 6, 23.º, n.º 7, 44.º, n.º 5, 46.º, n.º 5 e 49.º, n.º 3, do CIS.

 

Sujeitar ao novo imposto do selo partes autónomas sem o estatuto jurídico de propriedade horizontal e não sujeitar nenhuma das fracções habitacionais se o prédio se encontrasse em regime de propriedade horizontal constituiria violação do princípio constitucional da igualdade, tratando situações iguais de forma diferente.

 

Nem se pode desconhecer a incoerência, em termos de tributação de património, do diferente tratamento dado a detentores de fracções concentradas num mesmo prédio ou dispersos por prédios diferentes….

 

No caso dos autos, verificando-se que nenhuma das “fracções” de qualquer dos edifícios em causa apresenta, per se, “valor igual ou superior a 1 milhão de euros”, não há lugar a incidência da verba 28 prevista na Tabela Geral do Imposto do Selo.

 

14. Direito a juros indemnizatórios

A Requerida sustenta a tese de que ainda que as liquidações venham a ser julgadas ilegais não são devidos juros indemnizatórios ao contribuinte porque não existe erro imputável aos serviços quando a AT age em conformidade com uma “informação vinculativa”. É que, encontrando-se vinculada ao princípio da legalidade, não violou qualquer princípio legal ou constitucional.

 

Este raciocínio significaria, em última análise, que uma actuação da Administração Tributária convictamente fundamentada, objecto de confirmação superior, traduz automaticamente o princípio da legalidade, não podendo ser considerada “erro” e que a interpretação administrativa, desde que superiormente confirmada, constitui a realização do princípio da legalidade, adquirindo a mesma força que a lei.

 

Parece existir aqui uma eventual confusão entre, por um lado, o actual regime de responsabilização da Administração face a legislação vigente em tempos, e, talvez ainda, com a questão da competência da Administração para decidir sobre questões de inconstitucionalidade ainda não declarada pelo Tribunal Constitucional.

 

Quanto à responsabilização da AT pelo pagamento de juros indemnizatórios, o artigo 43º, nº 1 da LGT é bastante claro ao dispor que: “são devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido”.

 

De realçar que o nº 2 do artigo 43º da LGT prevê que há igualmente direito a juros indemnizatórios em situação de liquidação feita com base na declaração do contribuinte, mas segundo a interpretação constante de orientações genéricas, publicadas, da Administração [8], o que claramente significa a imputação a esta de responsabilidade por erro cometido pelo próprio contribuinte se derivado de uma interpretação jurídica administrativa, se vier a ser contrariada pelos tribunais ou alterada pela própria administração. 

 

Este regime de direito a juros indemnizatórios a favor do contribuinte constitui uma forma de indemnização da AT “resultante da forçada improdutividade das importâncias desembolsadas pelo contribuinte” [9] e já existia nos Códigos fiscais aprovados aquando da reforma fiscal na década de 1960 [10]. A responsabilidade pelo erro era, contudo, muito mais restrita: a lei previa obrigação de indemnizar em situações de erro de facto [11].

 

O art. 24º do Código de Processo Tributário, aprovado pelo Decreto-Lei nº 154/91, de 23, alargou o direito a juros indemnizatórios a todo o erro imputável aos serviços, independentemente de ser de facto ou de direito e o conceito de culpa funcional agora tem um sentido lato, não depende de uma interpretação grosseira ou manifestamente errónea das normas tributárias e passa a abranger erro de direito[12].

 

“Esta imputabilidade dos erros à Administração é independente da prova da existência de culpa concreta de qualquer dos seus órgãos, funcionários ou agentes, ou mesmo da prova da culpa global dos serviços”. E tem-se em conta o serviço “globalmente considerado”, “independentemente da culpa de qualquer das pessoas ou entidades que a integram, qualquer ilegalidade não resultante de uma actuação do sujeito passível será culpa dos próprios serviços”.[13]

 

É certo que a utilização da expressão erro e não vício ou ilegalidade revela que apenas se abrange os vícios do acto “erros sobre os pressupostos de facto e erro sobre os pressupostos de direito”, excluindo os vícios de forma e de incompetência.

 

A restrição a fazer ao âmbito do artigo 43º da LGT é a de que os juros indemnizatórios aí previstos abrangem apenas as decisões, anulatórias de acto administrativo ou de liquidação, incidentes sobre a relação jurídica fiscal, casos em que se verificou lesão de uma situação jurídica substantiva e prestação patrimonial indevidamente exigida [14] mas não a restrição defendida pela AT nos autos.

 

Neste caso, é indiferente que os serviços tenham agido de acordo com as orientações vinculativas superiormente aprovadas – questão é se a interpretação e aplicação das normas controvertidas traduzem ou não uma errada definição da situação tributária abrangida pelo direito em vigor.

 

Porque “a administração tributária está obrigada, em caso de procedência total ou parcial de reclamações ou recursos administrativos, ou de processo judicial a favor do sujeito passivo, à imediata e plena reconstituição da situação que existiria se não tivesse sido cometida a ilegalidade, compreendendo o pagamento de juros indemnizatórios, nos termos e condições previstos na lei” (art. 100º da LGT).

 

Por outro lado, também não é invocável aqui a questão de, no Direito Constitucional Português, a Administração não poder recusar-se a obedecer a uma norma que considera inconstitucional, substituindo-se aos órgãos de fiscalização da constitucionalidade, a menos que esteja em causa a violação de direitos, liberdades e garantias constitucionalmente consagrados[15].

 

É que, no caso dos autos, a interpretação e aplicação da verba 28.1 da TGIS aos prédios em propriedade vertical não implica um juízo de constitucionalidade sendo suficiente o apelo às normas do Código do Imposto do Selo e do CIMI, assim como a Lei nº 55-A/2012, apelando para todos os elementos de interpretação disponíveis[16].

 

15. Conclusão

Assim, o presente tribunal arbitral conclui que as liquidações de Imposto do Selo, com base na verba 28/28.1 da TGIS, relativamente a cada um dos andares ou partes susceptíveis de utilização independente, propriedade da Requerente, objecto dos presentes autos, estão feridas de ilegalidade porque os referidos dispositivos não podem ser interpretados no sentido da sua aplicação a andares ou partes susceptíveis de utilização independente de um prédio em propriedade vertical, quando apenas do somatório de cada um desses andares ou partes se logra obter um VPT igual ou superior a € 1.000.000,00 (um milhão de Euros), não ultrapassando o VPT de cada um dos ditos andares ou partes essa fasquia legal.  

 

E, como resulta da factualidade fixada que nenhum dos andares destinados a habitação, do prédio em propriedade vertical objecto deste processo, tem valor patrimonial igual ou superior a €1.000.000,00, conclui-se pela não verificação do pressuposto legal de incidência do IS previsto na Verba 28 da TGIS.

 

E, pelas razões apontadas no número anterior, são devidos juros indemnizatórios.

 

17. Decisão

Com os fundamentos expostos, o tribunal arbitral decide:

a)      Julgar procedente o pedido de pronúncia arbitral e, em consequência, declarar ilegais as liquidações de Imposto do Selo constantes dos Documentos de liquidação números 2013…; 2013…; 2013…; 2013… e 2013…, com consequente anulação dessas liquidações, e reembolso das importâncias em causa.

b)      Julgar procedente o pedido de juros indemnizatórios, nos termos dos artigos 35.º, n.º 1, e 43.º, n.º 1, da LGT e artigo 61.º, n.º 5, do CPPT.

c)      Condenar a AT em custas.

 

18. Valor do processo

De harmonia com o disposto no n.º 2 do art.º 315.º do CPC, na alínea a) do n.º1 do art.º 97.º-A do CPPT e ainda do n.º 2 do art.º 3.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária fixa-se ao processo o valor de € 10.527,80 (dez mil quinhentos e vinte sete euros e oitenta cêntimos).

 

 

19. Custas

Para os efeitos do disposto no n.º 2 do art.º 12 e no n.º 4 do art.º 22.º do RJAT e do n.º 4 do art.º 4.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se o montante das custas em € 918,00 (novecentos e dezoito euros), nos termos da Tabela I anexa ao dito Regulamento, a suportar integralmente pela Requerida.

Notifique-se.

 

Lisboa, 21 de Novembro de 2014.

 

A Árbitro

 

 

(Maria Manuela Roseiro)

 

[Texto elaborado em computador, nos termos do artigo 131.º, número 5 do Código de Processo Civil (CPC), aplicável por remissão do artigo 29.º, n.º 1, alínea e) do Regime de Arbitragem Tributária. A redacção da presente decisão rege-se pela ortografia anterior ao Acordo Ortográfico de 1990]

 



[1]Sobre a aplicação da verba 28 da TGIS no caso de prédios em propriedade vertical, estão já publicitadas decisões no site do CAAD, designadamente, nos processos nºs 50/2013-T; 132/2013-T; 181/2013-T; 182/2013-T;183/2013-T; 185/2013-T; 240/2014-T; 248/2013-T; 268/2014-T; 280/2014-T.

[2] Reproduziremos, em grande parte, o texto da decisão proferida no âmbito do CAAD, no processo nº 194/2014-T julgado por colectivo com participação da signatária.

[3] A redacção deste número foi alterada pela Lei n.º 83-C/2013, de 31 de Dezembro, passando a utilizar-se o conceito “prédio habitacional”, mas as liquidações objecto dos presentes autos têm por referência o ano de 2012.

[4] “Um outro aspecto que deve ser evidenciado na matriz tem a ver com a necessidade de fazer relevar a autonomia que, dentro do mesmo prédio, pode ser atribuída a cada uma das suas partes, funcional e economicamente independentes. Nestes casos, a inscrição matricial não só deve fazer referência a cada uma das partes como deve fazer referência expressa ao valor patrimonial correspondente a cada uma delas” (Silvério Mateus e Freitas Corvelo, Os Impostos sobre o Património Imobiliário e o Imposto do Selo, Comentados e Anotados", Engifisco, Lisboa 2005, pags.159 e 160). E diziam ainda os mesmos autores (ibidem, p. 160): “Esta autonomização das partes autónomas de um prédio, aplicável sobretudo aos prédios urbanos, justificava-se no âmbito da antiga Contribuição Predial em que o rendimento colectável correspondia à renda ou valor locativo de cada uma dessas componentes, continuou a justificar-se no caso da Contribuição Autárquica em que o valor patrimonial tinha subjacente a renda efectiva ou potencial e continua a ser pertinente em sede do IMI, dado que os factores de valorização previstos nos artigos 38º e seguintes podem não ser os mesmos para todas essas componentes (...) o facto de um prédio estar ou não arrendado continua a ter relevância para efeitos de determinação do valor patrimonial tributário quer para efeitos de IMI quer para IMT (vd. Artigo 17º do DL 287/2003)” (referiam-se à redacção original “regime transitório para prédios urbanos arrendados”, norma a rever, segundo o seu nº 5, quando se procedesse a revisão da lei do arrendamento urbano, o que aconteceu com a Lei nº 6/2006, de 27/02).

[5] Sobre este aspecto, e na linha do comentário citado na nota anterior, veja-se a fundamentação contida na decisão nº248/2013-T: “A autonomização na matriz das partes funcional e economicamente independentes de um prédio em propriedade total prende-se com razões de índole fiscal e extrafiscal. No plano fiscal, essa autonomização tem a ver com a própria determinação do valor patrimonial tributário, que constitui a base tributável do IMI, dado que a fórmula de determinação desse valor, prevista no art. 38.º do mesmo Código, comporta índices que variam em função da utilização atribuída a cada uma dessas partes. No plano extrafiscal, essa autonomização continua a encontrar justificação na relevância atribuída ao valor patrimonial tributário de prédios e suas partes autónomas na legislação do arrendamento urbano.” Aí se menciona também o n.º 1 do art. 15.º- O, do Decreto-Lei n.º 287/2003, de 12/11, aditado pela Lei n.º 60-A/2011, de 30/11 (prevendo que a cláusula de salvaguarda relativa ao agravamento da tributação em IMI decorrente da avaliação geral dos prédios urbanos, é aplicável por prédio ou parte de prédio urbano que seja objecto da referida avaliação) como confirmando a individualização, para efeitos tributários, das partes autónomas dos prédios urbanos.     

[6] Como observado no Proc.132/2013:“As normas (...) elencadas consagram o princípio da autonomização das partes independentes de um prédio urbano, mesmo quando não esteja constituído em propriedade horizontal. Ou seja, cada parte susceptível de utilização independente deve ser, para efeitos de IMI, valorizada em face das suas especificidades e afectação, resultando num VPT autónomo, individualizável e correspondente a cada parte susceptível de utilização independente.”

[7] Excertos da Decisão no processo nº 50/2014-T, referindo também a Decisão Arbitral no processo nº 48/2013-T, quanto à análise da Discussão da proposta legislativa na Assembleia da República.

[8] “Considera-se também haver erro imputável aos serviços nos casos em que, apesar de a liquidação ser efectuada com base na declaração do contribuinte, este ter seguido, no seu preenchimento, as orientações genéricas da administração tributária, devidamente publicadas”.

[9] Lima Guerreiro, LGT anotada, Ed Rei dos Livros, p. 205.

[10] Por exemplo, artigos 155º, § 1º, do Cód. da Sisa e Imposto sobre Sucessões e Doações, 140º, § 1º do Cód. da Contribuição Industrial, 145º, §1º, do Cód. Imposto de Capitais, 45º, §1º, do Cód. Imposto de Mais-Valias, 293º, § 1º, do Cód. Cont Predial, 57º, § 1º, do Cód. Imposto Profissional, 62º§1, do Cód Imposto Complementar. Em todas essa normas se previa que com a anulação da liquidação, oficiosamente ou por decisão da entidade ou tribunal competente, se contassem, no título de anulação, juros a favor do contribuinte “sempre que, estando pago o imposto, a Fazenda seja convencida em processo gracioso ou judicial, de que na liquidação houve erro de facto imputável aos serviços” .

[11] “(...) fundamentava-se na orientação do Acórdão do STA de 30 de Novembro de 1977, em um tipo peculiar de responsabilidade extra-contratual do Estado resultante de culpa funcional : tinha o erro ser devido a má organização ou negligência dos agentes para que pudesse ser considerado imputável aos serviços” (...). Os juros “não eram devidos se os funcionários agissem com diligência suficiente e normal, tal como o contribuinte só estava sujeito a juros moratórios quando o atraso lhe era imputável”. (Lima Guerreiro, ob. cit. ibidem).

[12] Também Lima Guerreiro, idem, ibidem. Já na vigência do art. 24º do CPT, o Tribunal Constitucional, confirmando acórdão do STA (de 11/04/1998, proferido no proc. 017796) veio a julgar “inconstitucional o artigo 65º § 1º, do Código do Imposto de Capitais, na parte em que exclui o direito do contribuinte a juros indemnizatórios quando haja ocorrido manifesto erro de direito da Administração Fiscal”, por violação do princípio constitucional da igualdade, dado o diferente tratamento de contribuinte (prevendo situações de erro de facto e erro de direito) e da Fazenda (apenas erro de facto). (Acórdão 647/99, de 24 de Novembro de1999).

[13] Citações de comentários de Jorge Lopes de Sousa, CPPT anotado, Ed. VISLIS, nota ao artigo 61º.

[14] Cf ainda Jorge Lopes de Sousa, CPPT anotado, Ed. VISLIS, nota ao artigo 61º, e Acórdão do STA de 5/5/1999, rec 5557-A. De realçar porém que o art. 43.º da LGT não traduz uma indicação exaustiva dos casos em que os contribuintes têm direito a ser indemnizados por actos da Administração Tributária mas uma lista de situações em que é de presumir a existência de um prejuízo para os contribuintes e a responsabilidade daquela Administração pela ocorrência do mesmo. Noutros casos poderá ver reconhecido direito de indemnização por prejuízos mas necessitando de propor a adequada acção para efectivação da responsabilidade civil (cf. autor citado e Acórdão do T. Constitucional nº 83/2014, de 22 de Janeiro de 2014).

[15] Cf. Acórdão do STA de 12 de Outubro de 2011, in proc. 0860/10 e doutrina aí citada. 

[16] De qualquer modo, em caso de decisão com base na inconstitucionalidade, não estaria em causa a obrigatoriedade da Administração ter conhecido da questão, mas sim se, anulada a liquidação por decisão judicial nesse sentido, haveria ou não direito a juros indemnizatórios. E, mesmo nesse caso, crê-se ser pacífico que, não resultando a ilegalidade de actuação do sujeito passivo, haveria de reconstituir a situação hipotética que existiria se não tivessem sido praticados os actos anulados, devendo ser restituídas as quantias indevidamente exigidas e pagos juros indemnizatórios nos termos dos artigos 43º da LGT e 61º do CPPT (cf. por exemplo Acórdãos do STA de 09/10/2002, in proc.789/02, e de 14/07/2008, in proc. 204/08).