Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 349/2014-T
Data da decisão: 2014-10-20  IMT  
Valor do pedido: € 59.781,80
Tema: IMT – Isenção de IMT pela aquisição de prédios para revenda; caducidade da isenção
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A – PARTES

 

A… - …, S.A., com sede na Rua … Porto, matriculada na … Conservatória do Registo Comercial do Porto sob o número início de matricula de Pessoa Coletiva nº …, doravante designados de Requerente ou sujeito passivo.

AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA (que sucedeu à Direcção-Geral dos Impostos, por meio do Decreto-Lei n.º 118/2011, de 15 de Dezembro) doravante designada por Requerida ou AT.

O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Presidente do CAAD, e o Tribunal Arbitral foi regularmente constituído, no dia 24-04-2014, para apreciar e decidir o objeto do presente processo, e automaticamente notificado a Autoridade Tributaria e Aduaneira no dia 24-04-2014, conforme consta da respetiva ata.

A Requerente não procedeu à nomeação de árbitro, pelo que, ao abrigo do disposto no nº 1 do artigo 6º e da alínea b) do nº 1 do artigo 11.º do Decreto-Lei nº 10/2011, de 20 de janeiro, com a redação introduzida pelo artigo 228º da Lei nº 66-B/2012, de 31 de dezembro, o Conselho Deontológico, designou - Paulo Ferreira Alves, tendo a nomeação sido aceite nos termos legalmente previstos.

Em 01-07-2014 as partes foram devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a designação dos árbitros, nos termos do artigo 11º n.º 1, alínea a) e b), do RJAT e dos Artigos 6º e 7º do Código Deontológico.

Em conformidade com o preceituado na alínea c) do nº 1 do artigo 11º do Decreto-Lei nº 10/2011, de 20 de janeiro, com a redação introduzida pelo artigo 228º da Lei nº 66­B/2012, de 31 de dezembro, o tribunal arbitral singular fica regularmente constituído em 16­07­2014.

O tribunal arbitral encontra-se regularmente constituído. É materialmente competente, nos termos dos artigos 2º, nº 1, alínea a), e 30º, n.º 1, do Decreto-Lei nº 10/2011, de 20 de janeiro.

No dia 17-10-2014, realizou-se a reunião prevista no artigo 18.º do RJAT, nas quais foi dada a palavra aos representantes da requerente e da requerida.

As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e encontram-se legalmente representadas (artigos 4º e 10º, nº 2, do mesmo diploma e artigo 1º da Portaria nº 112-A/2011, de 22 de março).

O processo não enferma de vícios que o invalidem.

 

B – PEDIDO      

 

O ora Requerente, pretende a declaração de ilegalidade do ato tributário de liquidação em sede de Imposto sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis, liquidado a Requerente, que fixou um imposto global a pagar de €59.781,80 (cinquenta e nove mil e setecentos e oitenta e um euros e oitenta cêntimos).

 

C – CAUSA DE PEDIR

 

A fundamentar o seu pedido de pronúncia arbitral, a Requerente alegou, com vista a declaração do ato tributário de liquidação em sede de Imposto sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis, em síntese, o seguinte:

A requerente é uma sociedade comercial que tem por objeto social de indústria de construção civil, compra, venda, revenda e arrendamento de bens imobiliários.

A requerente submeteu-se a um Processo Especial de Revitalização (PER), processo número …/…TYVNG, o qual correu no Tribunal de Comércio de Vila Nova de Gaia.

A requerente adquiriu em 01/06/2012, por permuta, o prédio urbano composto por um terreno destinado a construção, inscrito sob o artigo ... da extinta freguesia de Cedofeita, atual artigo ... da União de Freguesia de Cedofeita, S. Ildefonso, Sé, Miragaia, S. Nicolau e Vitória.

A requerente alega que procedeu declaração de que o imóvel se destinada à revenda.

A requerente alega que no âmbito do PER, foi forçada a transmitir o referido imóvel ao B... - Banco ..., SA, com vista a extinguir as suas dívidas perante o mesmo, que consistia num dos principais credores da requerente.

A requerente sustenta, que a transmissão do imóvel foi uma medida que reuniu consenso do B... e dos demais credores, com vista à extinção das dívidas da requerente.

A requerente defende, que a operação realizada no âmbito e em conformidade com o PER inseriu-se no conjunto de medidas que a Requerente foi forçada a realizar com vista à sua revitalização, a qual pressupunha necessariamente a reestruturação do seu passivo, principalmente com a Banca.

Em 29.05.2013 a requerente transmitiu, por escritura pública de dação em cumprimento do referido imóvel ao B... - Banco ..., SA, com esta transmissão, foi totalmente saldada a dívida da requerente junto do B..., no valor global de 985.540.80€.

A requerente alega, que a operação de dação em cumprimento não se distinguiu da típica compra e venda de imóveis.

Sustenta que a operação de transmissão do imóvel aqui em análise foi, em conformidade com as normas contabilísticas aplicáveis e em vigor e, aliás, com o Parecer técnico da Associação Portuguesa das Empresas de Contabilidade e Administração, contabilisticamente registada como uma venda.

A requerente sustenta que procedeu ao registo da transmissão nos seguintes termos: a) Foi creditada a conta 7113101 no montante de € 985.540,80 - conta de Proveitos por Vendas; b) Foi debitada a conta 2111110645 no mesmo montante; c) Seguidamente, procedeu-se ao "encontro de contas" efetuado ao nível da conta de terceiros debitando as contas 251206 e 2722604 e creditando a conta 2111110645, anulando o valor em dívida existente com o valor creditado; d) Foram ainda movimentadas contas de existências e de custos das mercadorias vendidas para registar a saída do imóvel do património da sociedade.

A requerente abona, que com o cumprimento dos termos do PER, tem sido capaz de se manter em atividade, a qual tem vindo a desenvolver em termos que lhe permitem honrar os seus compromissos e respeitar os projetos que tem em curso.

A requerente foi notificada pelo ofício nº …/…-…, datado de ….12.2013, para efetuar a prova do cumprimento dos requisitos necessários à verificação da isenção de IMT conferida, nos termos do artigo 7º, na qual apresentou a sua resposta por meio de requerimento, alegando que procedeu a dação em cumprimento do imóvel nos termos do PER, invocando a isenção do artigo 7º do CIMT, suportado por um despacho do Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais de …/03/1987, proferido no Processo …/… - Lv. …/…, da … Direção de Serviços da DGCI, que pugnou pelo cumprimento dos requisitos necessários para a verificação da isenção.

A requerente foi notificada do ofício nº …/…-…, de …/01/2014, relativo à liquidação oficiosa de IMT referente à aquisição do prédio, para proceder no prazo estipulado, ao pagamento da importância de 59.781,80€, a título de IMT, acrescido de juros compensatórios no valor de 1.270,98€.

A requerente defende que a fundamentação da AT assentou única e exclusivamente no facto de considerar que a Requerente não fez prova do cumprimento dos requisitos necessários à verificação da isenção que lhe havia sido concedida, e que a AT entende que a requerente não havia revendido imóvel, tendo-lhe por meio da dação em cumprimento, dado outro destino.

A requerente sustenta que a AT, entendeu que a dação em cumprimento não se enquadra no conceito de “revenda”, para os efeitos do disposto no nº 5 do artigo 11º do CIMT, e considerou verificada a caducidade do direito a isenção.

A requerente argumenta que a dação em cumprimento foi tratada sob todos os prismas como se fosse uma venda, possuindo todos os contornos específicos de uma compra e venda.

A requerente sustenta que a liquidação efetuada pela AT padece de vício de violação da Lei, por se basear numa caducidade que não se verificou no caso.

A requerente sustenta que nos presentes autos, terá de se apurar, se a isenção de IMT consagrada no artigo 7° do CIMT deve caducar nos casos em que o imóvel sobre o qual a mesma recaiu é transmitido a título de dação em cumprimento.

A requerente refere que a isenção deixará de beneficiar o sujeito passivo, pois, caso se verifique uma de três condições: (i) o imóvel adquirido teve um destino diferente daquele que resultaria da revenda, (ii) manteve-se na esfera jurídica do sujeito por mais de três anos, contados da data da sua aquisição, ou (iii) foi transmitido novamente para revenda.

Na fundamentação da requerente, a mesma alega, que terá de se determinar se a dação em cumprimento pode considerar-se abrangida, para efeito do CIMT, no conceito de revenda, e terá igualmente de se apurar se o destino dado a um imóvel que é objeto de dação difere daquele que é dado a um imóvel que seja objeto de revenda.

A requerente entende que o conceito de revenda utilizado pelo CIMT, quanto às suas características essenciais e ao efeito económico - jurídico do contrato de dação em cumprimento coincide inteiramente.

A requerente fundamenta a sua posição, alegando que no plano contabilístico a dação em cumprimento é tratada como um venda, e em face dos mais elementares princípios contabilísticos, a operação de dação em cumprimento deve ser tratada contabilisticamente como se de uma qualquer venda de existências se tratasse.

Mais sustenta, que o parecer técnico disponibilizado no sítio da APECA, quando questionada sobre o tratamento contabilístico a dar a entrada a uma dação em cumprimento, refere que a mesma "deve ser tratada como uma venda procedendo-se depois ao encontro das contas".

Mais diz que a conclusão da APECA, neste parecer técnico, e incontestável: “dação em cumprimento deve ser tratada como venda para todos os efeitos contabilísticos e fiscais".

E tal não poderia ser de outra forma, atendendo ao princípio contabilístico da Prevalência Substância sobre a Forma, ao qual a dação em cumprimento equivale a compra e venda.

Mais diz que a funcionalidade económica de ambas as figuras negociais é a mesma.

No entendimento da requerente, não se justifica distinguir as duas figuras em apreço no pelo do IMT.

Para efeitos da caducidade da isenção concedida pelo artigo 7.º do CIMT, a dação em cumprimento, é também equiparada à compra e venda.

Com efeito, a requerida sustenta que, se um determinado sujeito adquirir um imóvel por via de uma dação em cumprimento, a AT certamente não se coibira de lhe cobrar IMT devido.

A requerente invoca o justo impedimento, atendendo ao circunstancialismo próprio que rodeou a celebração do negócio em apreço, o qual é subsumível ao conceito de justo impedimento não foi por sua vontade, mas porque assim lhe foi imposto pelo PER, que a Requerente transmitiu o imóvel ao abrigo de uma dação, e não de um contrato de compra e venda.

Pelo que deverá admitir-se a dação em cumprimento como estando abrangida pela isenção, razão pela qual se afigura ilegal a determinação da sua caducidade realizada pela AT.

Em face dos argumentos, entende a Requerente que não poderá deixar de ser reconhecido o seu direito a beneficiar da isenção consagrada no artigo 7° do CIMT relativamente à aquisição do imóvel, de onde resultara necessariamente a conclusão de ter sido ilegítima a liquidação de imposto realizada pela AT, por se ter baseado na sua alegada caducidade.

Através de um negócio que em nada se distingue da compra e venda, quer no que concerne ao seu efeito translativo da propriedade, quer no que concerne ao resultado operacional que gerou para requerente, quer ainda no que respeita ao seu tratamento contabilístico.

Para a Requerente, suportada em jurisprudência do STA e em informações vinculativas do SEAF, este tipo contratual deve considerar-se abrangido no conceito de revenda, atenta a similitude da sua substância económica com a compra e venda, e a circunstância de, os destinos dos imóveis transmitidos ao abrigo de uma e outra figura jus negociais coincidirem inteiramente.

Sustenta desta forma a requerente pela anulabilidade do ato tributário de liquidação em sede de Imposto Municipal sobre os Imoveis, por violação de lei.

 

D- DA RESPOSTA DA REQUERIDA

 

A Requerida, devidamente notificada para o efeito, apresentou tempestivamente a sua resposta na qual, em síntese abreviada, alegou o seguinte:

A requerida alega que a interpretação efetuada pela requerente, é uma interpretação isolada e ultrapassada, que não está a ser seguida pelo Supremo Tribunal de Justiça.

A requerida invoca na sua fundamentação o acórdão proferido no âmbito do processo nº 01061/11, de 23.01.2013, do Pleno da Secção do Contencioso Tributário do STA, no qual salienta a requerida, que o acórdão foca a sua abordagem na questão de saber o que constitui "revenda", para efeitos de obstar à caducidade da isenção de SISA de um imóvel adquirido para revenda nos termos dos artigos 11º, nº 13-A e 16º do Código do SISA (CIMSISSD).

Alega a requerida que o acórdão recorrido, concluiu no sentido de a celebração do contrato-promessa de compra e venda acompanhada de tradição do imóvel para o promitente comprador preencher o conceito de revenda constante do artigo 16º do CMISISSD, uma vez que ocorreu a transmissão fiscal, e a posição do acórdão fundamento que considerou que o conceito de revenda constante desse normativo deve ser entendido em sentido técnico-jurídico, concretizando a celebração de um contrato de compra e venda, não se bastando com a celebração de um contrato-promessa mesmo que acompanhado de tradição.

Mais sustenta que, uma das conclusões que o acórdão apresenta é que a literalidade do preceito deve logo ser tida em conta na sua interpretação, reportando-se concretamente à expressão "revenda".

A requerente defende que o intérprete da lei fiscal, olhando, desde logo, e em primeiro lugar, para a letra da lei, não pode equiparar a transmissão fiscal definida na norma de incidência do imposto, com a exigência do normativo que estabelece a caducidade da isenção, definindo-a de forma clara, inequívoca e precisa: a não revenda, ou seja, exige-se a celebração de novo contrato de compra e venda dentro do prazo para obstar à caducidade.

Reitera a requerida, que as regras da interpretação do normativo que estabelece a caducidade da isenção pelo facto da revenda não se efetuar no período estabelecido, deve entender-se, portanto, que a revenda, somente, acontece com um novo contrato de compra e venda.

Assim o contrato de dação em cumprimento estabelecido nos artigos 837º e seguintes do Código Civil não deve ser considerado "revenda", ou equiparado a um contrato de compra e venda que tem também um regime próprio.

Assim, estes contratos, têm um regime jurídico-civilístico diferente, e a lei fiscal respeita-os.

A requerida alega, que o legislador no artigo 7° do CIMT, pretendeu distinguir o facto gerador da caducidade da isenção elegendo, especificamente, um de entre todos factos geradores de transmissão fiscal de um bem.

A requerida sustenta, que embora o contrato de dação em cumprimento foi forçado pelo PER, tal circunstância, não pode interferir na interpretação das normas jurídico-fiscais, não podendo valer como critério interpretativo.

Mais diz, a requerida quanto prevalência da substância económica dos factos, nesta senda só podemos considerar que as regras contabilísticas não podem interferir na interpretação dos conceitos jurídicos das normas.

A requerida conclui no sentido de que o ato em crise não padece de qualquer ilegalidade pelo que se impugna por infundado, devendo o presente pedido de pronúncia arbitral ser julgado improcedente por não provado, e, consequentemente, absolvida a entidade Requerida de todos os pedidos, mantendo-se na ordem jurídica as liquidações impugnadas, por configurarem uma correta aplicação da lei aos factos.

 

E-  FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

 

Antes de entrar na apreciação destas questões, cumpre apresentar a matéria factual relevante para a respetiva compreensão e decisão, efetuou-se com base na prova documental, e tendo em conta os factos alegados.

Em matéria de facto relevante, dá o presente tribunal por assente os seguintes factos:

A requerente é uma sociedade comercial que tem por objeto social de indústria de construção civil, compra, venda, revenda e arrendamento de bens imobiliários.

A requerente submeteu-se a um Processo Especial de Revitalização (PER), processo número …/…TYVNG, o qual correu no Tribunal de Comércio de Vila Nova de Gaia.

A requerente adquiriu em 01/06/2012, por permuta, o prédio urbano composto por um terreno destinado a construção, inscrito sob o artigo ... da extinta Freguesia de Cedofeita, atual artigo ... da União de Freguesia de Cedofeita, S. Ildefonso, Sé, Miragaia, S. Nicolau e Vitória.

A requerente procedeu declaração de que o imóvel se destinada à revenda, por meio da escritura pública.

A requerente transmitiu em 29.05.2013, por escritura pública de dação em cumprimento do referido imóvel ao B... - Banco ..., SA.

Com esta transmissão, foi totalmente saldada a divida da requerente junto do B..., no valor global de 985.540.80€.

A requerente foi notificada pelo ofício nº …/…-…, datado de ….12.2013, para efetuar a prova do cumprimento dos requisitos necessários à verificação da isenção de IMT conferida, nos termos do artigo 7.º do CIMT.

A requerente apresentou um requerimento de resposta ao ofício.

A requerente foi notificada do ofício nº …/…-…, de …/01/2014, relativo à liquidação oficiosa de IMT referente à aquisição do prédio, para proceder no prazo estipulado, ao pagamento da importância de 59.781,80€, a título de IMT, acrescido de juros compensatórios no valor de 1.270,98€.

A requerente foi posteriormente notificada do ato de liquidação nº … no valor de €59.781,80.

A Requerente procedeu a respetiva liquidação do imposto no valor de €59.781,80.

 

F-  FACTOS NÃO PROVADOS

 

Dos factos com interesse para a decisão da causa, constantes da impugnação, todos os objetos de análise concreta, não se provaram os que não constam da factualidade supra descrita.

 

G-  QUESTÕES DECIDENDAS

 

Atenta às posições das partes assumidas nos argumentos apresentados, constitui questão central dirimenda a seguinte, a qual cumpre, pois, apreciar e decidir:

A alegada pela Requerente, declaração de ilegalidade do ato tributário de liquidação em sede de Imposto sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis.

 

H-  MATÉRIA DE DIREITO

 

Atendendo às posições das partes assumidas nos articulados apresentados, a questão central a dirimir pelo presente tribunal arbitral consiste em apreciar a legalidade do ato de liquidação de Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis.

Sobre a questão sub júdice, o presente tribunal entende que sobre a mesma, promove como questões principais, que no qual se vai debruçar, fundam-se em determinar se o contrato celebrado entre a Requerente e o B..., no âmbito do Processo Especial de Revitalização que corria sobre a Requerente, é subsumível ao âmbito de incidência objetiva do artigo 2º do CIMT, e se respeita os requisitos necessários aí previstos para a tributação em sede desse imposto, e

Nos mesmos termos cumpre apreciar se o mesmo contrato está abrangido no âmbito da isenção do artigo 7º do CIMT, do qual cumpre verificar o cumprimento das regras de benefício pela requerente da isenção prevista nesse, e em especial cumpre determinar se o contrato celebrado se subsume à palavra revenda consagrada no artigo 7º nº 1 e no artigo 11º, nº 5 do CIMT.

Nestes termos, a presente decisão centra-se, primariamente, em duas questões.

 

SOBRE A DAÇÃO EM CUMPRIMENTO E O CONTRATO CELEBRADO

Em primeiro lugar importa definir o que se entende por dação em cumprimento, se o contrato aqui celebrado preenche os requisitos da dação em cumprimento, e se a dação em cumprimento é uma forma válida de aquisição e transição de prédios, i.e., direito de propriedade

Nos termos do artigo 837º e ss do Código Civil, a dação em cumprimento é uma forma de extinção das obrigações além do cumprimento, no qual o artigo 837º nos diz o seguinte: "A prestação de coisa diversa da que for devida, embora de valor superior, só exonera o devedor se o credor der o seu assentimento.".

A dação em cumprimento (datio in solutum), que é uma das formas possíveis de satisfação do direito do credor (cfr. art. 523º), distingue-se da dação em função do cumprimento (datio pro solvendo), regulada no artigo 840º; no primeiro caso, o devedor pretende, com a prestação diversa da devida, extinguir imediatamente a obrigação, ao passo que, no segundo, pretende apenas facilitar o cumprimento, fornecendo a credor os meios necessários para este obter a satisfação futura do seu crédito. (…) A dação em cumprimento tanto pode ter por objeto a entrega de dinheiro em lugar da coisa devida, como inversamente a entrega de certa coisa em vez da prestação pecuniária, como a entrega de uma coisa por outra (…). Fernando Andrade Pires de Lima e João de Matos Antunes Varela, Código Civil Anotado Volume II, Coimbra Edt., pag. 124 e 125.

Segundo Antunes Varela, a dação pode ter por objeto quer a transmissão (da propriedade) duma coisa, quer a transmissão de um (outro) direito, (v.g. de um uso fruto, de um crédito que o devedor tenha sobre terceiro, etc.), ou seja, pode ter objeto uma prestação pecuniária (em lugar da prestação da coisa devida) ou a prestação de coisa em lugar da prestação pecuniária. Mais nos diz o referido autor, que é essencial que a dação a) que haja uma prestação diferente da que é devida; b) que essa prestação tenha por fim extinguir imediatamente a obrigação. Mais diz que, para que haja uma pura dação em cumprimento é essencial que, a despeito da diferença de valor objetivo eventualmente existe entre prestações, estes tenham sido querias pelas partes como equivalente ou correspetivo uma da outra. De contrario haverá uma doação mista. cfr. Antunes Varela, Obrigações, 2.º ed., -135.

Na dação em cumprimento, vigora o princípio da liberdade da forma ou consensualidade, artigo 219º do CC, todavia quanto à dação aqui em apreço, como a mesma resulta sobre o direito de propriedade de um bem imóvel, tem de se recorrer efetivamente às regras do registo predial, porque diz respeito à transferência de direitos reais sobre imóveis.

O próprio regime da dação em cumprimento no seu artigo 838º "o credor a quem for feita a dação em cumprimento goza de garantia pelos vícios da coisa ou do direito transmitido, nos termos prescritos para a compra e venda; (…)", com aplicação com as devidas adaptações do artigo 914º do CC, aplica o regime referente ao contrato de compra e venda.

A remissão feita para as normas da compra e venda é explicada por Fernando Andrade Pires de Lima e João de Matos Antunes Varela, atreves do carácter de contrato oneroso que reveste da “datio in solutum” (dação em cumprimento). Entrega-se ou dá-se a coisa (lato sensu) em troca (da extinção) do crédito[1].

Para a extinção da obrigação é necessário que seja expressamente manifestada (artigo 837º parte final, e igualmente aplicação subsidiária do artigo 859º quanto a novação), a extinção da obrigação com a prestação do imóvel, extinguiu por consentimento do credor a dívida existente, caso contrário presume-se que estamos perante um dação «pro solvendo», artigo 840º, ou mesmo uma novação, artigo 857º[2].

Nestes termos, à dação em cumprimento são aplicáveis com as devidas adaptações, as demais disposições da secção respeitante à venda, remissão que à aplicação das disposições do contrato de compra e venda resulta não só da primeira parte do artigo 838º, como da remissão geral do artigo 939º[3].

A dação em cumprimento só extinguiu a obrigação primitiva da requerente, com a aceitação do B... de prestação diversa, aceitação esta que apenas se verifica no com a efetiva transmissão da propriedade (prédio urbano), que é apenas efetiva com o registo nos termos do CRPred, através, como aconteceu, de escritura pública.

Trata-se de um contrato real (quoad effectum), em que a propriedade se transfere, e se adquire, como efeito imediato do negócio jurídico, cfr. Artigo 408 nº1 do CC.

Do artigo 408º do nº1, resulta "A constituição ou transferência de direito reais sobre coisa determinada dá-se por mero efeito do contrato", consagra-se o princípio da consensualidade. Isto significa que os contratos implicam a constituição ou transmissão de direitos reais sobre coisas certas e determinadas, o efeito do contrato é real e não de um subsequente ato realizado em execução deste.

A regra de que a transferência se opera por mero efeito da celebração do contrato de dação em cumprimento encontra-se estabelecida no nº1 do artigo 408º do C.C.

Caso contrário, a não transmissão definitiva da esfera jurídica da requerente do imóvel supra referido, não teria sido extinta a obrigação primitiva desta, artigo 838º.

O contrato do qual resulta uma dação em cumprimento, nos termos do artigo 834º do CC, é um negócio jurídico bilateral [4] (ou contrato), no sentido de constituir um negócio jurídico, bilateral, desenhado para transmitir direitos, no qual deu origem à relação jurídica correspondente ao direito real, e modificou o nível de titularidade do direito de propriedade.

Diz-nos o artigo 1316º do CC, que o direito de propriedade adquire-se por contrato, e face ao exposto, resulta que o negócio jurídico sub júdice, do qual resulta a dação em cumprimento, e para todos os efeitos, um contrato nos termos dos artigos supra referidos.

 

No caso do contrato, o momento de aquisição do direito de propriedade é designado nos termos do artigo 408º[5], o qual estabelece, que a constituição ou transferência de direitos reais sobre coisa determinada dá-se por mero efeito do contrato. Consagra-se o princípio da consensualidade.

Isto significa que os contratos que implicam a constituição ou transmissão de diretos reais sobre coisa certas e determinadas produzem, em regra, de per si, essa consequência - quer dizer, por exclusivo, resultado do consequência das partes validamente manifestado e no próprio instante da celebração.

Todavia, uma vez que estamos face a um contrato do qual resulta a aquisição e modificação de direitos reais de propriedade, temos de complementar o regime do artigo 1316º e artigo 408º, com o regime jurídico do Registo Predial à data em vigor.

Mais nos diz sobre o modo de aquisição do direito de propriedade[6], o artigo 1316º do CC, que "O direito de propriedade adquire-se por contrato, sucessão por morte, usucapião, ocupação, cessão e demais modos previsto na lei", e enumeração não taxativa, segundo Oliveira de Ascensão, Sc. Iur, 21º-371.

O regime jurídico nacional, não considera de ordem pública o princípio da transferência da propriedade por mero efeito do contrato, ele é consagrado como regra supletiva, pelo que as partes podem afastá-lo, nos termos do artigo 1316º e 408º e 409º do CC.

A função essencial do registo predial conforme o Artigo 1º do CRPredial – “O registo predial destina-se essencialmente a dar publicidade à situação jurídica dos prédios, tendo em vista a segurança do comércio jurídico imobiliário”.

Diz-nos o regime do Registo predial que estão sujeitos a registo no seu artigo 2º nº 1 al. a) Os factos jurídicos que determinem a constituição, o reconhecimento, a aquisição ou a modificação dos direitos de propriedade, usufruto, uso e habitação, superfície ou servidão; 

Do qual resulta que o presente contrato tem de ser registado nos limites do registo predial para produzir os seus efeitos plenos e constitui presunção de que o direito existe e pertence ao titular inscrito (cfr. Artigo 7º do CRPred), o que foi feito por meio de escritura pública e registada na respetiva conservatória do registo predial.

A elaboração do registo, envolve naturalmente, vários suportes matéria e atos preparatório ou complementares do registo, ou seja, os documentos que os próprios interessados devem apresentar, servindo de título e comprovação do fato que pretendem registar.

No presente caso, verifica-se que as características e requisitos que constroem um contrato no qual há uma dação em cumprimento do artigo 834º do CC, foram cumpridas no negócio jurídico celebrado pela requerente, do qual resulta a transmissão por meio de escritura pública de imóvel e o direito de propriedade do mesmo da esfera jurídica da requerente para a esfera jurídica do B..., expressamente consentida pelo credor como forma de extinção e cumprimento de uma dívida monetária.

 

 

DA INCIDÊNCIA REAL DO ARTIGO 2º DO CIMT

Importa agora determinar o alcance da incidência real do imposto municipal sobre as transmissões onerosas de imóveis, e se a mesma abrange a transmissão do direito de propriedade que foi celebrada pelo requerente no contrato do qual resultou um dação em cumprimento, nos termos e forma em que foi celebrado no caso sub júdice.

Conforme estabelece a regra geral da incidência objetiva prescrita no artigo 2º nº1 do CIMT:

"1- O IMT incide sobre as transmissões, a título oneroso, do direito de propriedade ou de figuras parcelares desse direto, sobre bens imoveis situados no território nacional".

O conceito de transmissão de bens imóveis é ampliado pelo nº 2 e seguintes do mesmo artigo, para além do que é considerado civilisticamente"[7].

Pretende o legislador com a fórmula do artigo 2º nº 1, atingir as múltiplas situações existentes no regime jurídico Nacional em que a aquisição de imóveis, ou direitos reais não se celebra exclusivamente por meio de um contrato de compra e venda (entendido como contrato mais comum), pretende incidir sobras as transmissões onerosas de direitos de propriedade ou de figuras parcelas, tais como o usufruto, uso, e direito de superfície, acessão, permuta, e no presente caso como se ira demonstrar, a dação em cumprimento.

Nos números 2º e ss.º do artigo 2º do CIMT, prevê-se outras situações de incidência do imposto, normas estas que procuram evitar que seja evitada a tributação, através da imposição de regras de anti abuso específicas. Diz-nos Saldanha Sanches a incidência real do IMT, "existência destas normas, cabe recordar que a intensidade da intenção normativa de obstaculizarão de um qualquer negócio que tenha o efeito equivalente ao da compra e venda justifica à aplicação da cláusula geral anti abuso a qualquer negócio jurídico de efeito equivalente que não se encontra expressamente prevista no CIMT"[8][9].

O CIMT é bastante claro, ao incluir na sua esfera, todas as transmissões a título oneroso do direito de propriedade (excluído as doações e sucessões), conclusão que se retira da letra da lei, em especial no número 2 do artigo 2º, que utiliza uma enumeração não restritiva e apenas: "Para efeitos do nº 1, ainda, o conceito de transmissão de bens imoveis:", da qual se retira que a utilização do termo "ainda", o legislador pretende apenas incluir as situações previstas no número 2, para alem das já incluídas no número 1 do artigo 2º, o qual é bastante abrangente.

Em termos gerais o imposto é devido quanto há a aquisição onerosa de direitos reais, e por aquele que adquire os direitos.

Entende-se por negócios onerosos, aqueles onde se pressupõem atribuições patrimoniais de ambas as partes, existindo, segundo a perspetiva destas, um nexo ou relação de correspetividade entre as referidas atribuições patrimoniais[10].

Assim resulta, do presado artigo 2º nº1, a necessidade de comprovar se a transação resultante do contrato celebrado pela requerente cumpre os requisitos previstos para ser alvo de tributação em sede de IMT.

Requisitos estes que são os seguintes: existir a transmissão do direito de propriedade de um bem imóvel, que essa transmissão seja a título oneroso, conceitos que têm de ser preenchidos recorrendo às normas civis.

Quanto ao primeiro requisito, podemos desdobra-lo em duas partes, a primeira consiste em verificar a existência da transmissão de um direito de propriedade, e a segunda que o direito de propriedade transferido seja o de um bem imóvel.

Diz-nos o artigo 1316º do CC, "O direito de propriedade adquire-se por contrato, sucessão por morte, usucapião, ocupação, acessão e demais modos previstos na lei". Mais nos diz o artigo 408º n.º 1 do CC "A constituição ou transferência de direitos reais sobre coisa determinada dá-se por mero efeito do contrato, salvo as exceções previstas na lei."

Verifica-se que por contrato escrito, por meio de uma escritura pública celebrada entre a requerente, e o B..., resultou na transmissão do prédio urbano composto por um terreno destinado a construção, inscrito sob o artigo ... da extinta freguesia de Cedofeita, atual artigo ... da União de Freguesia de Cedofeita, S. Ildefonso, Sé, Miragaia, S. Nicolau e Vitória.

Verifica-se que o prédio urbano supra referido, constitui um imóvel nos termos do artigo 204º do CC, pelo que a sua transmissão constitui uma transferência do direito de propriedade de um bem imóvel, e assim se encontra preenchido a segunda parte que compõe o primeiro requisito da incidência objetiva do artigo 2º nº1.

Quanto ao segundo requisito, que a transmissão seja a título oneroso, afastasse as situações de sucessão e doação, verifica-se que igualmente que este requisito se encontra preenchido, se não vejamos.

O imóvel foi alvo de uma dação em cumprimento para extinção de uma dívida existente entre o requerente (devedor), e o B... (credor), do qual resultou um negócio avaliado em 985.540.80€, correspondente ao valor da dívida.

Com o preenchimento dos requisitos de incidência objetiva do IMT, a conclusão a que se chegará, é a de que a operação sub júdice integra o âmbito de incidência do referido imposto.

Resulta igualmente do regime jurídico o IMT, que a responsabilidade de pagamento do IMT nesta transação é do adquirente (B...).

Face ao exposto, o contrato celebrado, respeita o segundo requisito - transmissão seja a título oneroso - da regra de incidência objetiva do artigo 2º, nº 1.

Assim o presente tribunal, determina que a transmissão do imóvel efetuada por escritura pública através de uma dação em pagamento está abrangida no âmbito do IMT, nos termos do artigo 2º do CIMT, por cumprir com todos os seus requisitos.

 

DA ISENÇÃO DO ARTIGO 7º Nº 1 E DA CADUCIDADE DO ARTIGO 11º Nº 5

Face ao exposto, cabe agora ao presente tribunal, determinar se o negócio jurídico está abrangido para efeitos de benefício da isenção de IMT prevista no artigo 7º nº1, sendo que o negócio jurídico alvo desse benefício, na esfera jurídica da requerente, é a permuta realizada em 01/06/2012, momento em que se inicia a referida isenção, e que foi conferida até ao momento da celebração do contrato e efetiva transferência do direito de propriedade nos termos previstos no CRPred, sobre o mesmo imóvel.

Resulta do artigo 7º nº 1 do CIMT:

1 - São isentas do IMT as aquisições de prédios para revenda, nos termos do número seguinte, desde que se verifique ter sido apresentada antes da aquisição a declaração prevista no artigo 112º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS) ou na alínea a) do nº 1 do artigo 109º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (IRC), consoante o caso, relativa ao exercício da atividade de comprador de prédios para revenda.

A isenção nos moldes do artigo 7º nº 1 caduca nos termos do preceituado artigo 11º nº 5 do CIMT[11], o qual se transcreve:

5 - A aquisição a que se refere o artigo 7º deixará de beneficiar de isenção logo que se verifique que aos prédios adquiridos para revenda foi dado destino diferente ou que os mesmos não foram revendidos dentro do prazo de três anos ou o foram novamente para revenda.

Isenção cujo fundamento, por um lado, assenta, como assinala Nuno Sá Gomes, (Caducidade, por afetação a destino diferente, de isenção de Sisa, Parecer nº 119/95, de 11/7/1995, in CTF 380, pp. 488 e segts.) na circunstância de os prédios adquiridos se manterem, como mercadorias, no ativo permutável da empresa tributada pelo exercício da atividade de aquisição de prédios para revenda e que, por outro lado, tem como fim último afastar elevados encargos financeiros que, não obstante serem custos dedutíveis para efeitos de determinação do rendimento sujeito a imposto, tenderiam a repercutir-se no preço final da venda dos bens imóveis. (Cfr. Silvério Mateus e Corvelo de Freitas, Os Impostos sobre o Património. O Imposto do Selo: Anotados e Comentados, Lisboa, Engifisco, 2005, p. 385. )

Face à conjugação de ambos os artigos, resulta que a requerida ao adquirir o imóvel por permuta, na data de 01/06/2012 e cumprindo com as obrigações declarativas e os requisitos impostos no artigo 7º nº1 para beneficiar da isenção de IMT, possui um período de 3 anos para revender o imóvel nas mesmas condições e que não seja novamente para revenda.

Período que foi concedido pela AT, com base no contrato de permuta e não num contrato de compra e venda.

Efetivamente, a questão prende-se com o facto de se o negócio jurídico celebrado por meio de contrato na forma de escritura pública, do qual resultou a transmissão de um direito real sobre o direito de propriedade de um prédio urbano, um imóvel, devidamente registado e com fé pública, por meio de uma dação em cumprimento para extinção de uma obrigação pecuniária contraída pela requerente face a novo adquirente do imóvel, se o mesmo está abrangida na esfera jurídica da expressão revenda utilizada nos artigos 7º nº 1 e artigo 11 nº 5 do CIMT.

O entendimento preconizado sobre a noção de revenda intrinsecamente ligada a noção de “destino diferente” quanto aos efeitos da caducidade do artigo 11º nº 5. A jurisprudência do STA[12] já se pronunciou em matéria semelhante no âmbito do antigo Código do SISA, mas na situação de que o negócio jurídico que caduca a isenção é um contrato de promessa com tradição da coisa, e não um contrato real, como é o presente caso.

Jurisprudência, que face a semelhanças do Código do SISA com o atual código CIMI, ire-mos estudar, em especial quanto ao entendimento a conferir a destino diferente e à revenda.

Determinou o alcance do sentido da expressão “destino diferente”, no qual se pressupõe na revenda a transmissão do bem no estado em que o mesmo foi adquirido, ou seja, a comercialização do mesmo sem que este tenha sofrido uma transformação significativa ou substancial, e não resulte alteração substancial da estrutura externa ou da disposição interna das divisões dos edifícios.

Não se verifica na situação sub júdice que tenha sido dado um destino diferente ao imóvel, nos termos que a decisão supra invocada expõe, pelo que esse requisito está cumprido, nem tão pouco foi invocado pelas partes tal facto.

Contudo é sobre o âmbito da expressão revenda, que a mesma levanta maiores duvidas, quanto a sua aplicação face a este contrato em especial, é sobre o mesmo que o presente tribunal agora se vai debruçar.

A jurisprudência, sobre a aplicação do conceito revenda do artigo 7º e artigo 11º, sobre os contratos que resultem em dação em cumprimento ainda não se pronunciou diretamente, todavia, existem diversas sentenças do STA sobre o entendimento a conferir ao conceito de revenda desses artigos.

Todavia, é muito importante ter em consideração que a jurisprudência do STA que se pronunciou sobre o conceito de revenda, ainda no âmbito do antigo imposto CISA, e estando em causa um contrato de promessa de compra e venda com tradição da coisa, contrato onde não há transferência do direito de propriedade nos termos do artigos 1316º e 408º do CC, e jurisprudência essa que, não é unanime.

Mas em primeiro lugar importa referir o primeiro parágrafo do preâmbulo do CIMT, antes de nos debruçarmos na jurisprudência: O imposto municipal sobre as transmissões onerosas de imóveis (IMT), que substitui o imposto municipal de sisa, continua a incidir sobre as transmissões, a título oneroso, do direito de propriedade sobre imóveis e das figuras parcelares desse direito, podendo estes direitos transmitir-se sob diversas formas ou ocorrer na constituição ou extinção de diversos tipos de contratos. 

A jurisprudência[13] mais recente, tem sido do entendimento através da decisão do pleno do STA no processo 01061/11 de 01/23/12, no sentido: a celebração de contrato promessa de compra e venda de imóvel no período de três anos subsequente à aquisição para revenda, ainda que acompanhado da tradição do bem, tem decidido que a mesma não obsta à caducidade da isenção da sisa, a qual apenas subsiste com a celebração do contrato de compra e venda.

Segundo a jurisprudência é necessário, para preenchimento do critério de revenda dos artigos supra referidos, a transmissão definitiva do prédio por meio da finalização do contrato de compra e venda, que segue o contrato de promessa de compra e venda, não bastante para tal o contrato de promessa com tradição da coisa, mesmo que sobre esse imóvel tenha sido alvo de tributação em sede de IMT nos termos do artigo 2º nº 2 al. a).

Assim, nos termos da mais recente jurisprudência existe uma tributação simultânea de IMT sobre o mesmo imóvel, por parte da promitente vendedor (Imobiliária) e proprietário que requisitou a isenção nos termos do artigo 7 nº1, e por parte do promitente comprador, não detentor do direito de propriedade do imóvel.

Efetivamente, no contrato de promessa de compra e venda com tradição da coisa, não se verifica uma transmissão do direito de propriedade nos termos dos artigos 1316º e 408º do CC e do artigo 2º nº1 do CIMT, todavia o legislador previu uma regra anti abuso no número 2 al. a) do mesmo artigo para tributar esses mesmos contratos, considerando-os como transmissão de direitos imóveis, para efeitos de IMT.

Todavia parte da jurisprudência foi mais longe ao considerar que a revenda, não basta a tradição da coisa e a tributação respetiva como se de uma transmissão de propriedade de trata-se, mas tem de existir um contrato de compra e venda, para efetivar a transmissão do direito de propriedade.

A jurisprudência supra indicada, todavia, não decidiu sobre a aplicabilidade do termo revenda para efeitos de abranger ou não as restantes formas de contratos que permitam a transmissão de direito de propriedade nos termos do artigo 1316º e 408º do CC, contratos esses que se incluem o presente contrato.

Na nossa opinião, a jurisprudência, decidiu que o para beneficiar da isenção, tem de o contrato de promessa ser finalizado dentro do período de 3 anos no contrato final de compra e venda com a transmissão da propriedade.

Quanto ao termo revenda, é um termo inexistente no direito civil, e na legislação fiscal, sendo apenas referido nesta situação.

Não existe nenhum diploma legal, que se refira expressamente e unicamente que a revenda são os negócios celebrados por compra e venda, nem tão pouco se pode aceitar que a revenda do artigo apenas se dirige ao contrato de compra e venda como meio válido de transmissão do direito de propriedade de forma onerosa, de forma a cumprir com a regra geral de incidência do artigo 2.º  nº1 e com as regras civis dos artigos 1316º e 408º do CC.

O âmbito de incidência real do IMT, conforme o artigo 2º do CIMT, e o próprio CIMT, não refere em parte nenhuma expressamente que o CIMT, se cinja unicamente ao contrato de compra e venda, tanto não o faz, como se pode verificar que o âmbito de incidência objetiva do IMT é as transmissões, a título oneroso, do direito de propriedade, e mais diz o artigo 7º, que a referida isenção se destina a aquisição de prédios, urbanos ou rústicos, ou seja, a maioria do imóveis.

O presente tribunal entende que o termo revenda abrange todas as situações nas quais o sujeito passivo, se dedica à atividade de compra e venda de prédios, na qual adquire ou expressão comum "compra" um prédio/imóvel para posteriormente transmitir ou expressão mais comum "vender" de forma a obter um lucro. Mais se diz que o sujeito passivo tem, necessariamente, de transmitir o imóvel com o mesmo destino, afastando-se logo as situações de renovações profundas ou novas edificações, e o mesmo imóvel tem de ser transmitido para um adquirente que não beneficie igualmente da isenção do artigo 7º nº1.

Ao limitar a referida isenção a apenas quando a venda é feita por contrato de compra e venda, está-se a limitar o âmbito de atuação do sujeito passivo, e do próprio regime civil português.

Efetivamente, a isenção do artigo 7º, destina-se as pessoas (singulares ou coletivas), que se dedicam a atividade de comprador de prédios para revenda, ou seja, que os respetivos prédios são vistos como um investimento e como uma mercadoria, do qual resultaria a tributação apenas do ganho dessa atividade. É uma atividade como outra qualquer que envolva a compra e a venda de mercadoria.

O próprio artigo 7º, bem como a posição jurisprudencial, tem sido de aceitar para o início do período benefício da isenção, com a aquisição por parte do sujeito passivo que desenvolve atividade, todas as aquisições de prédios (expressão utlizada pelo artigo 7 nº 1), nos termos previstos no artigo 2º nº1 e artigos 1316º e 408º do CC

Tal se verifica no presente caso, que a AT conferiu o direito de isenção à requerente sobre o imóvel que adquiriu por permuta. Assim, numa situação hipotética, na qual a requerente teria transmitido o imóvel por um contrato de compra e venda, nunca preencheria os requisitos da revenda, porque não existe o primeiro contrato de compra e venda onde a requerente adquiriu o imóvel, logo não há revenda.

Ou seja, é relevante para efeitos do artigo 7º todas as formas de transmissão do direito de propriedade, isto inclui todos os contratos celebrados nos termos da lei civil para a transmissão de direitos reais, tal como contrato de compra e venda, o contrato do qual resulte a dação em cumprimento, e outros contratos que preencham os requisitos.

Com isto, o presente tribunal pretende concluir no sentido, que o conceito de revenda do artigo 7.º tem necessariamente de abranger todas as situações em que existe uma transmissão do direito de propriedade, situação que não se verifica no contrato de promessa de compra e venda, mas verifica-se com todos os efeitos legais e públicos no contrato aqui em apreço.

Os imóveis quanto a esta isenção têm de ser entendidos como mercadoria integrante de uma atividade desenvolvida, onde em princípio só será tributado o ganho ou aumento patrimonial.

No presente caso, o requerente desenvolve a atividade de compra, venda, revenda e arrendamento de bens imobiliários, e no desenvolver da sua atividade contraiu dívidas perante um devedor (B...), a quais não conseguiu extinguir pela forma originariamente consagrada, e como forma de extinguir a dívida recorreu a uma figura prevista no Código Civil, e celebrou um contrato para produzir os efeitos necessários.

Verificam-se exatamente os mesmo efeitos jurídicos e fiscais de um contrato de compra e venda, e igualmente se verifica os requisitos de forma do contrato de compra e venda (escritura pública) e de transmissão do direito de propriedade (artigo 2 nº1 do CRPred), e ainda mais se diz que o contrato em tudo preenche os requisitos do contrato de compra e venda previsto no artigo 874º "compra e venda é o contrato pelo qual se tramite a propriedade de uma coisa, ou outro direito mediante um preço".

Tão pouco se pode aceitar que o termo revenda se limite unicamente aos contratos de compra e venda, uma vez que o próprio IMT não se limita aos contratos de compra e venda. O conceito de revenda, não pressupõem um contrato de compra e venda, porque o próprio CIMT não pressupõem para a sua incidência real a existência de um contrato de compra e venda, como já ficou demonstrado.

Entende-se sim, conforme a jurisprudência supra citada, que para beneficio da isenção, o contrato de promessa de compra e venda, mesmo com tradição da coisa, tem de ser efetivamente celebrado o respetivo contrato que finalize a transferência do direito de propriedade, contrato esse que seria no presente caso o contrato de compra e venda, porque no contrato de promessa não há a aquisição do prédio, conforme impõem a expressão do artigo 7º nº1.

E mais importante ainda, o próprio artigo 7º nº 1, não utiliza a expressão compra e venda, mas sim revenda, no sentido de se referir a atividade de compra e venda de imóveis, atividade esta que não esta limitada a atuação por meio de contratos de compra e venda, realidade esta, bem do conhecimento do legislador, que no próprio preâmbulo do CIMT, faz referência expressa a mesma.

E neste sentido, seria incongruente, presumir que o legislador para o âmbito de incidência do IMT não o limita expressamente o mesmo ao contrato de compra e venda, mas confere uma isenção no âmbito do desenvolvimento de uma atividade de comercialização de imóveis para revenda, o qual apenas beneficiária da isenção apenas quando à venda do imóvel fosse por meio de contrato de compra e venda, sendo que a aquisição pudesse ser por meio de outro contrato.

Não se pode prejudicar o sujeito passivo, de recorrer a uma figura legalmente prevista no Código Civil, validamente executada, com preenchimento de requisitos de forma extra (escritura pública), não exigidos para aquela figura, corretamente registado, e validamente tributável em sede IMT, ao contrário do que se verifica com a figura da revenda, que é inexistente, quer no código civil, quer no código do IMT, quer na LGT.

Tão pouco a nível civilístico, a figura da revenda se encontra prevista ou associada ao contrato de compra e venda. Mais se diz, que a própria figura de revenda, não vem expressamente prevista no código civil, nem tão pouco se pode considerar como sendo o resultado direto de uma primeira compra e venda, porque se tal o fosse, a permuta efetuada por parte da Requeria na qual adquiriu o direito de propriedade sobre o prédio urbano não beneficiaria da referida isenção porque não é uma compra e venda.

A dação em cumprimento não é uma forma de transmissão de propriedade de bens imóveis.

Admitir a tributação na esfera jurídica da requerida, quando respeitou todos os requisitos necessários para beneficiar da isenção, sobre um bem que transmitiu e já não detém o respetivo direito de propriedade, utilizando uma figura legalmente consagrada, através de um contrato oneroso do qual resultou uma troca onerosa, nos mesmo termos que se verificaria na compra e venda, seria contra a própria natureza do IMT.

De um ponto de vista pratico, o banco comprou a requerente o imóvel a troco preço, preço esse que já tinha sido pago resultante de outro negócio jurídico na atividade da requerida, da qual não cumpriu com o mesma, e conforme já se disse, o preço praticado tem de corresponder ao preço real do negócio jurídico a celebrar, como se de um contrato de compra e venda se tratasse para termos comparativos, porque do ponto de vista da atividade da requerente, caso contrário estaríamos perante uma doação quanto a parte que excedesse o valor do imóvel e da dívida prévia.

Tratou-se de facto de uma venda, porque o imóvel adquirido foi com a intenção de venda por parte da requerida, intenção essa expressa.

Mais se diz, quanto aos efeitos da compra e venda, artigo 879º a mesma prevê três efeitos fundamentais, o primeiro, a transmissão da coisa ou da titularidade do direito, a segunda a obrigação de entregar a coisa, e a terceira, a obrigação de pagar o preço.

O contrato sub júdice preenche os requisitos do artigo 874º e os efeitos do artigo 879º, se não vejamos, que estamos perante um contrato, e é um contrato valido para a transmissão de um direito de propriedade imóvel (prédio urbano), é oneroso e celebrado mediante um preço, preço esse que foi pago antes da celebração do negócio, e o artigo 885º do CC não impõem o momento do pagamento.

Diz nos o Autor Soares Martinez, citado no Acórdão do STA, de 21/4/2010 «o legislador fiscal receou que, a fim de evitar o pagamento do imposto de sisa, o promitente comprador não celebrasse o respetivo contrato de compra e venda, contentando-se com uma transmissão de facto», ( Soares Martinez, Direito Fiscal, 7ª ed., Coimbra, Almedina, 1993, p. 67. ) quer razões que se prendem com a circunstância de os contratos promessa de compra e venda de imóveis terem deixado de ser, progressivamente, com o desenvolvimento da atividade económica, meros negócios preparatórios de contratos de compra e venda, passando a ser utilizados como instrumentos de realização de investimentos e de especulação imobiliária com base em transmissões puramente económicas dos bens, proporcionadoras de rendimentos. (Cfr. o Acórdão do STA, de 21/4/2010, rec. nº 924/09; bem como José Maria Fernandes Pires, Lições de Impostos sobre o Património e do Selo, ed. Almedina, 2010, pp. 263 a 266. )

Receio esse que não se verifica na presente situação uma vez que há a transmissão definitiva do imóvel, tal como também não se verifica conforme estabelece o acórdão supra citado, de um mero negócio preparatório, ou como instrumentos de realização de investimentos e de especulação imobiliária com base em transmissões puramente económicas dos bens, proporcionadoras de rendimentos.

Mais nos diz a jurisprudência, quanto ao conceito revenda: "Ora, se é certo que o Sisa consagra um conceito próprio de transmissão de imóveis sujeita a esse imposto (considerando como transmissões, para esse efeito, negócios jurídicos que, à luz da lei civil, não transmitem, ipso facto, o direito de propriedade – como é o caso do contrato promessa de compra e venda de imóveis com tradição da posse) também é certo que aquele mesmo código não equipara tais atos à própria revenda. Daí que, utilizando o legislador, no nº 1 do art. 16º do CSisa, o conceito de revenda e não o de transmissão, se conclua que não pode aí apelar-se a outro qualquer conceito de revenda (conceito inexistente na lei fiscal), sendo, antes, indispensável que ocorra a nova venda do prédio (que só pode ser o ato jurídico definido no art. 874º do Civil), ou seja, a transmissão do título de propriedade e não bastando, por essa razão, a celebração de contrato promessa de compra e venda, ainda que com tradição do prédio. Ou seja, embora a celebração deste tipo de contratos com tradição da posse seja considerada pelo CSisa como um facto sujeito a imposto, o certo é que no caso da isenção de prédios adquiridos para revenda, a lei exige, sem mais, a efetivação da revenda como pressuposto essencial da isenção, sem àquela equiparar qualquer outro tipo de ato ou contrato. (Neste sentido, embora reportando ao atual IMT, cfr. José Maria Fernandes Pires, ob. cit., pp. 422 a 424. Bem como, Pinto Fernandes e Cardoso dos Santos, Código da Sisa e do Imposto sobre as Sucessões e Doações, edição da Imprensa Nacional, Vol. I, pag. 371; e Silvério Mateus/Corvelo de Freitas, ob. citada p. 386. )[14] [15]".

Do exposto, do acórdão retiram-se as seguintes conclusões, das quais embora corretas, não são aplicáveis ao presente contrato, conforme refere os acórdão:

"CSisa consagra um conceito próprio de transmissão de imóveis sujeita a esse imposto." - Conceito esse que é complementado como já vimos pelas regras do negócios jurídicos e da transferência de propriedade, i.e. direito reais, nos termos da lei civil e registo predial, como exponente máximo o contrato - como negocio jurídico bilateral, que o presente contrato cumpre na plenitude.

"também é certo que aquele mesmo código não equipara tais atos à própria revenda." e " o conceito de revenda e não o de transmissão, se conclua que não pode aí apelar-se a outro qualquer conceito de revenda" - è verdade que do código Civil do Código do IMT, da LGT, ou qualquer outro diploma, exista uma referencia ao termo revenda, ou mesmo ao que se entende sobre o mesmo, tem de se recorrer as regras de interpretação da lei, tal como diz a própria sentença "revenda (conceito inexistente na lei fiscal),"

"Indispensável que ocorra a nova venda do prédio, ou seja, a transmissão do título de propriedade;" - Na linha do que dispõe o código civil quanto a transmissão do direito de propriedade, onde se entende que há a transmissão do direito por meio de contrato, e não limita essa transferência de direito de propriedade, inclusive de bens imoveis, ao contrato de compra e venda (nominado), podem ser feita por um contrato inominado, desde que respeite as regras gerais.

"a lei exige, sem mais, a efetivação da revenda como pressuposto essencial da isenção, sem àquela equiparar qualquer outro tipo de ato ou contrato." - Ora na interpretação da lei há-de presumir-se que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados (artº 9º, nº 3 do Código Civil). Assim para a análise do preceito forçoso é recorrer ao subsídio interpretativos do elemento gramatical e também à ratio legis, tendo sempre como presente que a captação do sentido de uma norma não pode fazer-se de uma forma isolada. O IMT tributa a transmissão, a título oneroso, dos bens imóveis, sendo o seu sujeito passivo o comprador ou adquirente desses bens. Porque incide sobre aquisições onerosas, o imposto não tem por finalidade a sujeição do aumento líquido da riqueza, porque ele não se pode verificar. Na verdade, sendo a aquisição onerosa, dela não resulta qualquer aumento líquido do património do adquirente, mas antes uma mera substituição do suporte em que se materializa esse património ou riqueza, dinheiro por imóveis na maioria dos casos (Ver neste sentido, José Maria Fernandes Pires, Lições de Impostos sobre o Património e do Selo, pag. 151.). Trata-se, afinal, de situação que tem algum paralelismo com os regimes de não sujeição e isenção de prédios adquiridos para revenda e para construção quando os adquirentes e proprietários são empresas que exercem atividade de compra de prédios para revenda, para quem esses imóveis são apenas a mercadoria com que exercem a sua atividade comercial. Cfr. Acórdão nº 0599/10 do STA.

Ao limitar o conceito de revenda, a aquisição de prédios unicamente por meio de contrato de compra e venda por força do artigo 1316º e 874º ambos do C.C., é algo que o artigo 1316º não diz, até pelo aposto, face a sua enumeração não taxativa[16], nem tão pouco diz a lei civilista, o qual acentua nos importantes princípios, da autonomia privada e da liberdade contratual, artigo 405 do CC.

A autonomia privada, tem a sua manifestação mais expressiva nos negócios jurídicos bilaterais, ou contratos, enquanto liberdade contratual, a sua consagração legal tem lugar no artigo 405º, integrando na secção relativa aos contratos como fontes de obrigações, e a autonomia da vontade encontra, nesse domínio dos contratos obrigacionais, a sua mais ampla dimensão. Carlos Alberto da Mota Pinto, Teoria Geral do Direito Civil, 4 ed. Coimbra edt.

O artigo 405º estabelece os princípios contidos na liberdade contratual, da liberdade de modelação, liberdade de fixação ou liberdade de estipulação do conteúdo contratual.

Com o princípio da liberdade de modelação, podem as partes celebrar contrato típicos ou nominados, acrescentar cláusulas a estes ou concluir contratos atípicos ou inominados, aplicando-se a ambos as regras gerais civis.

Nos contratos com eficácia real, isto é, constitutivos, modificativos ou extintivos de direitos reais, há liberdade de celebração, mas a liberdade de fixação do conteúdo contratual sobre uma importante restrição. Os contraentes, podendo embora celebrar contratos inominados, não podem constituir direitos reais que se não integrem nos tipos previsto na lei - princípio da tipicidade ou do «números clausus» dos direitos reais. Não é possível alterar por contrato as características dos direitos reais tipificados pela lei nem criar ex contratu outros tipos, artigo 1306º do CC. Cfr. Carlos Alberto da Mota Pinto, Teoria Geral do Direito Civil, 4 ed. Coimbra edt.

Concretamente se a lei prevê a possibilidade de um direito real se transferir por contrato, isso poderá realizar-se mesmo através de um contrato atípico ou inominado, não se pode é constituir por contrato um direito real, se a lei não indicar o contrato entre os modos de constituição desse direito real. (Mota Pinto, Direitos Reais, 1970/17, pagº 117 e ss).

Concretamente, o negócio jurídico é uma manifestação do princípio da autonomia privada ou da autonomia da vontade, subjacente a todo o direito privado, autonomia privada ou da autonomia da vontade que consiste no poder reconhecido aos particulares de autorregulamentação dos seus interesses, de autogoverno na sua esfera jurídica. Na realização de negócios jurídicos, de atos pelos quais os particulares ditam a regulamentação das suas relações, constituindo-as, modificando-as, extinguindo-as e determinado o seu conteúdo. (Carlos Alberto da Mota Pinto, Teoria Geral do Direito Civil, 4 ed. Coimbra ed.).

Como já se referiu não há referência a termo de revenda, tal como não se pode limitar o conceito de revenda como sendo unicamente o contrato de compra e venda, porque tal não resulta da legislação em vigor. Assim a interpretação que deve ser feita do conceito de revenda, é aquela que o sujeito passivo desenvolve na sua atividade a compra e venda de imóveis, ou por outras palavras, a aquisição e transmissão de prédios, únicos termos utilizados pelo CIMT e CC, uma vez que em nenhum destes diplomas se compara compra com aquisição tal como vem prescrito no artigo 874º do CC, artigo que diz que a Compra e Venda, é o contrato pelo qual se transmite o direito de propriedade sobre o uma coisa, fala-se em transmissão.

Destes requisitos resulta com toda a clareza que se pretende conferir a isenção pela transmissão, mas atendendo à qualidade de revendedor do adquirente.

E no exercício dessa atividade transmite prédios de forma onerosa, por meio de contrato, tal como o Código Civil prevê para esses negócios jurídicos.

É no sentido de que é adquirido o prédio como uma mercadoria, para ser transmitido em troco de um lucro.

No presente contrato há a transmissão definitiva, ao contrario do que se verifica no contrato promessa de compra e venda.

Todavia temos a decisão do acórdão nº 01205/12 de 02/20/2013 do STA, no sentido, sobre a acessão o qual diz: "sendo apenas de considerar a revenda no seu sentido técnico-jurídico. No conceito de “revenda” a que se referia o artº 11º, nº 3 do CIMSISSD enquadra-se apenas a transmissão do direito de propriedade efetuada por contrato de compra e venda tal como este é definido no artº 874º do Código Civil, realizada pelo adquirente que exercesse a atividade de aquisição de imóveis para revenda. Assim, fica excluída da referida isenção a transmissão (aquisição) de propriedade por qualquer das outras formas previstas no artº 1316º do Código Civil."

O acórdão supra referido remete para a lei civil, "fica excluída da referida isenção a transmissão (aquisição) de propriedade por qualquer das outras formas previstas no artº 1316º do Código Civil", de uma breve leitura do artigo 1316º, é empregue a expressão contrato, e não contrato de compra e venda, entende-se por contrato o negócio jurídico bilateral há duas ou mais declarações de vontade, de conteúdo oposto, mas convergente, ajustando-se na sua comum pretensão de produzir resultado jurídico unitário, embora com um significado para cada parte. É o caso paradigmático da compra e venda[17], mas não é o único.

Coloca-se o que já se foi dito supra, que o artigo 1316º do CC, não refere contrato de compra e venda, mas sim apenas a expressão contrato, e não se pode limita transmissão (aquisição) de propriedade conforme diz a sentença ao contrato de compra e venda, porque não é isso que esta estabelecido na nesse artigo.

Uma vez que se tem de recorrer a lei civil para determinar o alcance de conceitos previsto no CIMT, em especial, o termo revenda, o termo aquisição de prédios ambos do artigo 7º, e também os termos empregues na definição da incidência objetiva do artigo 2º, conclui-se que tem de ser utilizadas as regras civis na sua definição, e não poderia ser de outra forma.

A dação em cumprimento é uma das formas que o Código Civil prevê para a extinção de obrigações, por si só a dação não constitui um contrato e tão pouco não é entendido como um contrato nominado[18]. O que constitui um contrato de acordo com a regras geral dos contratos prevista nos artigos 405.º a 456º do CC, e da teoria geral do negocio jurídico do artigo 217º a 294º do CC, é o contrato sobre o qual é transmitida o direito de propriedade de coisa móvel ou imóvel, ou direito, crédito, ou pecuniária, em troca da extinção da obrigação existente, no qual segundo o artigo 834º a dação que o contrato prevê tem de necessariamente de valor semelhante, embora inferior ou superior, caso contrário estaríamos perante um contrato de doação. Contrato este que normalmente se dá o nome de Dação em Cumprimento, porque resulta da aplicação de uma figura já regulada.

Embora a dação em cumprimento não exige no seu regime, forma, o que se exige é o cumprimento das regras gerais quanto a direitos reais, exige-se a celebração de um contrato onde resulta uma dação em cumprimento, e dessas regras, em especial do artigo 408º nº1, em conformidade com as regras de registo predial, tem de ser regista a transmissão de um prédio, a qual apenas pode ser feita mediante um contrato, contrato esse que tem de ser escrito e assinado por ambas as partes, por meio de um documento particular, um documento particular autenticado, e por escritura pública, que possui o maior valor probatório, e que foi utilizado pelas requerente.

Assim o conceito de revenda prescrito no artigo 7º nº 1 do CIMT, refere as situações previstas no código civil de transmissão de propriedade, (de forma onerosa artigo 2º nº1 do CIMT), por aplicação do artigo 408º, que exige que a transição tem de ser feita por meio de contrato, complementado pelo artigo 1316º do CC, que estabelece que tem de ser adquirida por contrato.

E mesmo entendendo que o conceito de revenda está ligado apenas ao contrato de compra e venda, conexão não prevista na lei civil ou fiscal, mais se diz, que o artigo 874º e ss, no tratamento que dá ao contrato nominado de compra e venda, refere expressamente que o contrato de compra e venda é um contrato do qual resulte a transmissão de propriedade mediante um preço, o que resulta do contrato é uma transmissão, uma obrigação de entregar, e uma obrigação de pagar. Transmissão essa que é regulada pelos mesmo regime que regula o contrato da requerente com o B....

O contrato do qual resultou a dação em cumprimento, é um contrato definido e aceite nos termos do artigo 1316º, esta incluído da esfera civil do conceito de contrato, tal como esta o contrato de compra e venda.

Quanto aos demais requisitos impostos para a verificação da isenção, sobre os mesmos se diz que foram cumpridos, assim tendo a requerida transferido o respetivo prédio urbano por meio de escritura pública, na data de 29.05.2013, verifica-se que foi o imóvel revendido dentro do período de 3 anos previsto no artigo 11º nº 5. Igualmente não caduca a isenção, porque não se verifica a declaração por parte do adquirente do imóvel (B...), da intenção de revenda do imóvel nos termos do artigo 7 nº 1º, que afastaria o direito de benefício da isenção da requerida nos termos do artigo 11º 5 parte final.

Face à factualidade apresentada e dada como provada, fica provado que a requerida preenche os restantes requisitos do artigo 7º nº 1, quanto a apresentação da declaração do na alínea a) do nº 1 do artigo 109º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (IRC) consoante o caso, relativa ao exercício da atividade de comprador de prédios para revenda.

Face ao exposto, o presente tribunal conclui pela declaração de ilegalidade das liquidações sub Júdice, por enfermem de vício de violação do artigo 2º nº 1, 7º nº 1, e 11º nº 5 todos do CIMT, por erro sobre os pressupostos de direito, que justifica a declaração da sua ilegalidade e anulação (artigo 135º do CPA).                 

 

I - DECISÃO

Destarte, atento a todo o exposto, o presente Tribunal Arbitral, decide-se:

Julgar procedente o pedido de declaração de ilegalidade dos ato tributário de liquidação em sede, por erro sobre os pressupostos de direito, que justifica a declaração da sua ilegalidade e anulação.

Condena a Requerida, a restituir à requerente essa quantia indevidamente liquidada e paga.

Fixa-se o valor do processo em €59.781,80 o valor da liquidação, atendendo ao valor económico do processo aferido pelo valor das liquidações de imposto impugnadas, e em conformidade fixa-se as custas, no respetivo montante em 2.142.00€ (dois mil cento e quarenta e dois euros), a cargo da requerida de acordo com o artigo 12º, nº 2 do Regime de Arbitragem Tributária, do artigo 4º do RCPAT e da Tabela I anexa a este último. – nº 10 do artigo 35º, e nº 1, 4 e 5 do artigo 43º da LGT, artigos 5.º, n.º 1, al. a) do RCPT, 97º-A, n.º 1, al. a) do CPPT e 559º do CPC).

 

Notifique-se.

Lisboa, 20 de Outubro de 2014

O Árbitro

Paulo Renato Ferreira Alves



[1] Fernando Andrade Pires de Lima e João de Matos Antunes Varela, Código Civil Anotado Volume II, Coimbra Edt., pag. 124 e 125.

[2] Fernando Andrade Pires de Lima e João de Matos Antunes Varela, Código Civil Anotado Volume II, Coimbra Edt., pag. 124 e 125.

[3] Fernando Andrade Pires de Lima e João de Matos Antunes Varela, Código Civil Anotado Volume II, Coimbra Edt., pag. 124 e 125.

[4] Os negócios jurídicos são atos jurídicos constituídos por uma ou mais declarações de vontade, dirigidas à realização de certos efeitos práticos, com intenção de os alcançar sob e a tutela do direito, determinando o ordenamento jurídico a produção dos efeitos jurídicos conforme à intenção manifestada pelo declarante ou declarantes. Cfr Carlos Alberto da Mota Pinto, Teoria Geral do Direito Civil, 4 ed. Coimbra edt.

[5] O número nº1 do artigo 408.º, possui uma forma ampla, de forma a abranger a transferência de todos os direitos reais e também a constituição de direitos reais limitadas. Em consequência da regra do nº1 os direitos reais primeiramente constituídos sobre a coisa prevalecem em relação aos constituídos posteriormente, sem prejuízo das regras do registo, quando, pela natureza imóvel da coisa, ou natureza equiparada, a constituição ou transferência esteja sujeita a registo. Confirma, de uma maneira geral, a doutrina deste artigo na alínea a) do artigo 1317º, quanto a constituição do direito de propriedade. Cfr. Fernando Andrade Pires de Lima e João de Matos Antunes Varela, Código Civil Anotado Volume I, Coimbra Edt., pag. 374 e 375.

[6] Sobre o direito de propriedade, cfr os artigos 1302.º e ss do Código Civil.

[7] Cfr. Manuel Pires, Rita Calçada Pires, Direito Fiscal, 5º Edição, Almedina, Pag.751.

[8] Cfr. J.L. Saldanha Sanches, Manual de Direito Fiscal, 3º Edição, Coimbra edt. Pag. 439

[9] Mais diz o referido autor, quanto a incidência pessoal ou subjetiva, que as regaras que se encontram nas alíneas do artigo 4.º "dizem respeito as múltiplas situações em que a aquisição de direitos reais se faz mediante negócios jurídicos que não são o mero contrato de compra e venda."

[10] Cfr Carlos Alberto da Mota Pinto, Teoria Geral do Direito Civil, 4 ed. Coimbra edt.

[11] Este regime já se encontrava previsto com idênticos contornos no artigo 11.º, ponto 3.º do Código do Imposto Municipal da Sisa e do Imposto sobre Sucessões e Doações (“Código da Sisa”), segundo o qual: “Ficam isentas de sisa: (…) 3.º As aquisições de prédios para revenda, nos termos do artigo 13.º-A, desde que se verifique ter sido apresentada antes da aquisição a declaração prevista no artigo 105.º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS) ou na alínea a) do n.º 1 do artigo 94.º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (IRC), consoante o caso, relativa ao exercício da atividade de comprador de prédios para revenda”. E quanto a caducidade da isenção o Código da Sisa (artigo 16.º, ponto 1.º) previa que a mesma caducava logo que se verificasse que “aos prédios adquiridos para revenda foi dado destino diferente (…)”.

[12] Acórdão do STA, processo n.º 016153, de 27 de Maio de 1970; Acórdão do STA, processo n.º 016253, de 16 de Maio de 1973

[13] E este tem sido, igualmente, o entendimento maioritário da jurisprudência deste STA (cfr. acórdãos de 4/11/1970, rec. nº 16201; de 16/6/1972, rec. nº 1981; de 11/3/1981, rec. nº 1462; de 10/11/1982, Pleno, rec. nº 1462; de 6/3/1985, rec. nº 2732; de 13/10/1993, rec. nº 15334; de 8/11/2006, rec. nº 642/06; de 13/05/2009, rec. nº 234/09; de 16/11/2011, rec. nº 303/11; e de 21/11/2012, rec. nº 0957/11

[14] Acórdão do Pleno desta Secção, de 23.01.2013 – Processo nº 01061/11;

[15] No mesmo sentido, cfr. acórdãos de 4/11/1970, rec. nº 16201; de 16/6/1972, rec. nº 1981; de 11/3/1981, rec. nº 1462; de 10/11/1982, Pleno, rec. nº 1462; de 6/3/1985, rec. nº 2732; de 13/10/1993, rec. nº 15334; de 8/11/2006, rec. nº 642/06; de 13/05/2009, rec. nº 234/09; de 16/11/2011, rec. nº 303/11; e de 21/11/2012, rec. nº 0957/11.

[16] Resulta do artigo 1316.º do CC, uma enumeração não taxativa (cfr. Oliveira Ascensão, Sc. Iur-371)

[17] Cfr Carlos Alberto da Mota Pinto, Teoria Geral do Direito Civil, 4 ed. Coimbra edt.

[18] Na enumeração dos contrato nominados, Mota Pinto não prevê o contrato de dação em cumprimento, tal como Mário Júlio de Almeida Costa, que se refere apenas aos contratos previsto entre os artigos 874.º e 1250.º do CC.