Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 218/2015-T
Data da decisão: 2016-01-22  IMI  
Valor do pedido: € 1.069,15
Tema: IMI – Classificação dos prédios urbanos
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DECISÃO ARBITRAL

 

       I.             RELATÓRIO

 

1.      Em 27 de março de 2015, a sociedade A..., SA, contribuinte n.º..., doravante identificada por Requerente, apresentou pedido de pronúncia arbitral, nos termos do disposto nos artigos 2.º, n.º 1, alínea b) e 10.º, n.º 1, alínea b) do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, doravante designado por RJAT).

 

2.       No referido pedido de pronúncia arbitral a Requerente pretende que o Tribunal Arbitral determine a anulação do ato de fixação do valor patrimonial emitido com referência ao prédio inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ..., da freguesia de..., concelho da Lousada.

 

3.      O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite em 30 de março de 2015, pelo Exmo. Senhor Presidente do CAAD e, subsequentemente, foi promovida a notificação da Autoridade Tributária e Aduaneira (doravante identificada como Entidade Requerida).

 

4.      A Requerente não procedeu à nomeação de árbitro pelo que, ao abrigo do disposto no artigo 6.º, n.º 1, do RJAT, a signatária foi designada pelo Senhor Presidente do Conselho Deontológico do CAAD para constituir o presente Tribunal Arbitral singular, tendo a nomeação sido aceite nos termos legalmente previstos.

 

5.      Por acordo das partes não houve lugar à realização da reunião do artigo 18.º do RJAT nem à produção de alegações.

 

6.      A Requerente contesta o valor patrimonial tributário fixado por não acompanhar a classificação do prédio urbano como “Outros” e a fixação do valor patrimonial com base no método do custo adicionado do valor do terreno.

 

7.      A Requerente sustenta estar em causa um prédio comercial por estar licenciado para o exercício de uma atividade comercial e em virtude da atividade económica substantiva e efetivamente exercida consistir na venda de combustíveis e de bebidas e de produtos alimentares.

 

8.      Sustenta a Requerente que uma estação de serviços constitui um local que tem como destino normal a prática de atos de comércio (venda de combustíveis, bebidas e alimentos). 

 

9.      Acrescentando que a circunstância da licença estar preenchida nos campos “Comércio” e “Outros” não significa que o prédio esteja licenciado para “Outros”, nem que a licença o classifica como tal para efeitos de IMI, desde logo porque um posto de combustível é um local onde se praticam atos de comércio, devendo a classificação dos prédios urbanos ser feita em função da sua afetação.

 

10.  Mais avançando que no caso de uma estação de serviço não se encontram especificidades que justificam que o valor patrimonial seja encontrado fora das regras comuns, o que só se justificará quando estejam em causa estruturas que não se reconduzem ao conceito comum de prédio, entendido como uma edificação principal inserida num terreno com logradouro.

 

11.  Relativamente ao Manual de Avaliações dos Prédios Urbanos, a Requerente entende que o mesmo não se sobrepõe ao Código do IMI e que não tem eficácia externa, acrescentando que o artigo 6.º do Código é claro, subsumindo-se as estações de serviço – como qualquer prédio destinado à prática de atos de comércio e para tal licenciado – à figura de prédios “comerciais” ou para “serviços”.

 

12.  Mais sustenta a Requerente que os prédios comerciais ou para serviços se avaliam nos termos do artigo 38.º do Código do IMI e, bem assim que os prédios “Outros” são avaliados por essa mesma disposição legal, com as necessárias adaptações, não tendo o mesmo sido aplicado no caso vertente em virtude do disposto no Manual de Avaliações.

 

13.  Finalmente, a Requerente entende que a cobertura metálica não é um prédio para efeitos de IMI uma vez que a base de incidência do imposto não pode ser estendida aos bens de equipamento e maquinaria.

 

14.  Já a Entidade Requerida entende que, o destino do prédio da Requerente é a venda de combustível de retalho ao público, e o prédio onde desenvolve esta atividade é prima facie um posto de abastecimento com várias unidades de abastecimento, constituindo a loja de conveniência uma atividade acessória.

 

15.  Para a Entidade Requerida trata-se em suma de um posto de abastecimento de combustível, ou estação de serviço, ao qual se anexou uma loja de conveniência e é com base nesta premissa que a Autoridade Tributária classificou o prédio como urbano, da espécie “Outros”.

 

16.  Entende a Entidade Requerida que a categoria de prédios urbanos “outros” é uma categoria residual dentro das realidades consideradas prédios urbanos e que um posto de abastecimento de combustível comporta edifícios e construções licenciados para esse fim, que é a exploração de postos de abastecimento, e que não é um fim habitacional, comercial, industrial ou de serviços na ótica do destino do prédio.

 

17.  Para a Entidade Requerida não é a circunstância da Requerente praticar atos de comércio enquanto vende a retalho combustível que determina o prédio ter como fim o comércio, acrescentando, ainda, estar a atividade de Requerente sujeita a licenciamento, de acordo com o que estabelece o quadro legal para a aplicação do regime de construção e exploração de postos de abastecimento de combustíveis.

 

18.  Relativamente ao Manual de Avaliações dos Prédios Urbanos defende a Entidade Requerida tratar-se de um regulamento interno, de acesso restrito, apenas disponibilizado aos peritos regionais, para que todos os peritos avaliadores possam avaliar segundo as mesmas regras.

 

19.  No que respeita à determinação do valor patrimonial tributário, a Entidade Requerida sustenta a aplicação do método do custo adicionado ao valor do terreno, nos termos do artigo 46.º do Código do IMI, em virtude de estar em causa um prédio cujas características intrínsecas impede a utilização da fórmula do artigo 38.º, nomeadamente em virtude da inaplicabilidade ao caso em questão do coeficiente de conforto e de vetustez. Acrescentando, que na determinação do valor patrimonial tributário dos prédios urbanos com parte enquadráveis em mais de uma classificação, quando uma das partes seja principal e outra acessória se deve apurar o valor por aplicação das regras de avaliação da parte principal.

 

20.  Finalmente, a Entidade Requerida sustenta quanto à avaliação da pala metálica que se trata de um bem móvel integrado num prédio, pelo que lhe foi atribuído um valor integrado no valor da área de abastecimento.

 

    II.              SANEADOR

 

O Tribunal é materialmente competente e encontra-se regularmente constituído, nos termos dos artigos 2.º, 5.º e 6.º, todos do RJAT.

 

As partes têm personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão representadas, nos termos dos artigos 4.º e 10.º do RJAT e do artigo 1.º, da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março.

 

Não se verificam nulidades pelo que se impõe conhecer do mérito do pedido.

 

 III.            OBJECTO DA PRONÚNCIA ARBITRAL

 

Vêm colocadas ao Tribunal as seguintes questões, nos termos atrás descritos:

i)        Determinar se o prédio em apreciação deve ser classificado como um prédio urbano "Comercial” ou “para serviços” ou como um prédio “Outros”, nos termos e para os efeitos do artigo 6.º do Código do IMI;

ii)      Determinar se o valor patrimonial tributário de uma estação de serviço, classificada como um prédio “Outros”, deverá ser determinado nos termos do artigo 38.º do Código do IMI com as adaptações necessárias ou se deve ser utilizado o método do custo adicionado do valor do terreno, caso em que deverá ser, ainda, apreciado se deve ser tida em consideração a cobertura metálica.

 

 IV.            MATÉRIA DE FACTO

 

Factos provados

 

Com interesse para a decisão da causa, de acordo com as várias soluções plausíveis de direito, consideram-se provados os seguintes factos:

 

21.  Em 21 de novembro de 2013, foi submetida uma declaração de Modelo 1, para avaliação do prédio inscrito na matriz predial urbana sob o artigo..., da freguesia de..., concelho da Lousada (cf. processo administrativo e Doc. 1, junto com o pedido de pronúncia arbitral).

22.  Conforme comprovativo da 1.ª avaliação, ao prédio em questão foi atribuído o valor patrimonial tributário de € 334.780,00 (cf. processo administrativo).

23.  Da respetiva ficha de avaliação constam os seguintes elementos (cf. processo administrativo):

 

24.  Da referida ficha de avaliação resulta a seguinte demonstração do cálculo para apuramento do valor patrimonial tributário (cf. processo administrativo):

 

(…)

 

25.  Em 24 de janeiro de 2014, a Requerente requereu a segunda avaliação do prédio urbano em questão (cf. Doc. 2, junto com o pedido de pronúncia arbitral).

26.  Em 16 de janeiro de 2015 foi avaliado “com a inteira observância de todas as formalidades legais, conforme está descrito na ficha de avaliação n.º... ...  ..., do prédio com o artigo de matriz..., da freguesia de... .

Posto de abastecimento de combustível com edifício de apoio (loja de conveniência e cafetaria) com carater meramente acessório e pouco representativo, sendo avaliado pelo método de custo adicionado do valor do terreno, conforme determina o n.º 2 do artigo 46.º do CIMI.”, tendo sido fixado o valor de patrimonial tributário de € 288.960,00 (cf. processo administrativo).

27.  Da referida ficha de avaliação constam os seguintes elementos (cf. processo administrativo):

28.  Da referida ficha de avaliação resulta a seguinte demonstração do cálculo para apuramento do valor patrimonial tributário (cf. processo administrativo):

 (…)

29.  O louvado da parte fez constar do procedimento o seu voto de vencido “por discordar da classificação do prédio como “outros” e pela utilização do método de avaliação previsto para este tipo de prédio. Com efeito, estamos perante um prédio comercial, conforme quer da respectiva licença de utilização quer da actividade económica no mesmo exercida. Facto que, nos termos conjugados do n.º 2 e da alínea b) do n.º 1 do artigo 6.º do Código do IMI conduz à classificação do prédio como comercial.”.

30.  Por Ofício n.º..., de 11 de fevereiro de 2015, a Requerente foi notificada que em sequência da 2.ª avaliação efetuada foi atribuído ao imóvel o valor de patrimonial tributário de € 288.960,00 (cf. Doc. 3, junto com o pedido de pronúncia arbitral).

31.  Na sequência da notificação do valor patrimonial tributário fixado em sede de 2.ª avaliação, a Requerente apresentou o presente pedido de pronúncia arbitral.

32.  Com referência ao prédio em análise, em 22 de março de 1995, a Câmara Municipal de ... emitiu Alvará de Licença de Habitação/Ocupação de edificações para: “Comércio” e para “Outros”, respeitando este último a “Posto de abastecimento de combustíveis” (cf. Doc. 5, junto com o pedido de pronúncia arbitral).

33.  Em 27 de maio de 1997, foi emitido pela Delegação Regional da Economia do Norte, o Alvará n.º .../P que titula a licença pelo prazo de 20 anos para explorar uma inst. Armazenagem produtos deriv. Petróleo, const. Por oito reserv. subt. p/ venda com a capacidade de 119 940 litros sita em EN ..., Km..., ... , freguesia de ..., concelho de …, distrito do Porto (cf. Doc. 6, junto com o pedido de pronúncia arbitral).

 

A matéria de facto dada como provada assenta no exame dos documentos, não impugnados, juntos no pedido de pronúncia arbitral e no procedimento administrativo e na posição assumida pelas partes nos articulados.

 

Factos não provados

 

Não se constataram factos essenciais, com relevo para a apreciação do mérito da causa, que não se tenham provado.

 

    V.            DO DIREITO

 

34.  O presente pedido de pronúncia arbitral assenta na discordância da Requerente: i) perante a classificação do prédio em apreciação na espécie “Outros” e, ii) na aplicação do método do custo adicionado do terreno na determinação do respetivo valor patrimonial tributário e na consideração da cobertura metálica.

 

35.  A primeira questão em apreciação nos presentes autos prende-se, assim, com a classificação atribuída ao prédio cuja avaliação se contesta nos presentes autos, entendendo a Requerente que o mesmo deve ser qualificado como um prédio comercial ou para serviços, recusando em consequência a qualificação que serviu de base à avaliação contestada, como prédio urbano integrado na espécie “Outros”.

 

36.  O número 1, do artigo 6.º do Código do IMI divide os prédios urbanos em três grandes categorias, a saber: i) Habitacionais, comerciais, industriais ou para serviços, ii) terrenos para construção e, iii) “Outros”.

 

37.  No que ao presente caso respeita importa determinar se um “Posto de abastecimento de combustível com edifício de apoio (loja de conveniência e cafetaria)” deve ser qualificada para efeitos do artigo 6.º do Código do IMI como um edifício para “Comércio ou serviços” ou na categoria “Outros”.

 

38.  Do referido número 1, do artigo 6.º do Código do IMI resulta uma segmentação dos prédios urbanos mas não se oferece uma definição do conceito de cada um dos tipos de prédios aí previstos. 

 

39.   Relativamente à primeira das categorias identificadas, o Código do IMI determina que são habitacionais, comerciais, industriais ou para serviços “os edifícios ou construções para tal licenciados ou, na falta de licença, que tenham como destino normal cada um destes fins”(cf. número 2, do artigo 6.º do Código do IMI).

 

40.  Resulta imediato que o Código do IMI na qualificação dos prédios como habitacionais, comerciais, industriais ou para serviços remete para a utilização atribuída pelo licenciamento e, na falta de licença, para o critério da afetação normal.

 

41.  A classificação dos prédios urbanos depende, em regra, “de um requisito de natureza formal que é o seu licenciamento” (MATEUS, J. Silvério e DE FREITAS, L. Corvelo – Os Impostos sobre o Património Imobiliário O Imposto do Selo Anotados e Comentados, Engifisco, 2005, pág. 116).

 

42.  E, ainda, no sentido da relevância do licenciamento: “Esta classificação atende essencialmente ao licenciamento da utilização que impropriamente é considerada nas operações de avaliação como “afectação””. (cf. Cadernos de Ciência e Técnica Fiscal, n.º 209 - Competitividade, Eficiência e Justiça do Sistema Fiscal - Relatório do Grupo para o Estudo da Política Fiscal, 2009, pág. 481).

43.  E, “Apenas no caso de inexistir licença de utilização emitida com referência a dado prédio, é que é possível, ou seja, é que deve ser, com vista ao seu enquadramento num dos vários tipos de prédios urbanos, aferida a afetação efetiva do mesmo” (ROCHA, António Santos e BRÁS, Eduardo José Martins – Tributação do Património IMI-IMT e Imposto do Selo (Anotados e Comentados), Almedina, 2015, pág. 43).

 

44.  Acrescentando, ainda, os citados autores que “qualquer prédio urbano que esteja devidamente licenciado para o exercício de comércio, mesmo que esteja, na realidade, afeto, por exemplo, à habitação, deverá ser enquadrado – e avaliado- pelas regras atinentes aos prédios do tipo “Comerciais” (ROCHA, António Santos e BRÁS, Eduardo José Martins – Tributação do Património IMI-IMT e Imposto do Selo (Anotados e Comentados), Almedina, 2015, pág. 43).

 

45.  Este entendimento de que releva em primeiro lugar o que resulta da respetiva licença e que só releva o destino normal do prédio na falta dessa mesma licença parece ser também pacífico na jurisprudência, conforme Acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo Sul, no Processo n.º 08035/14, em 4 de Junho de 2006, de acordo com o qual “´(…) é por referência à finalidade do edifício ou construção resultante do seu licenciamento ou do destino normal, caso esse licenciamento não exista, que se devem classificar os prédios urbanos como habitacionais, comerciais, industriais ou para serviços.” ( http://www.dgsi.pt/jtca.nsf/170589492546a7fb802575c3004c6d7d/55ddc8a03e601fe480257e5e0060115d?OpenDocument&Highlight=0,08035%2F14).

 

46.  Em suma, releva em primeiro lugar o conteúdo da respetiva licença de utilização. Já nos casos de falta de licença releva o destino normal.

 

47.  Integram, por sua vez, a categoria “Outros” “os terrenos situados dentro de um aglomerado urbano que não sejam terrenos para construção nem se encontrem abrangidos pelo disposto no n.º 2 do artigo 3.º e ainda os edifícios e construções licenciados ou, na falta de licença, que tenham como destino normal outros fins que não os referidos no n.º 2 e ainda os da excepção do n.º 3.” (cf. número 4, do artigo 6.º do Código do IMI).

 

48.  Trata-se, assim, de uma categoria residual onde se integram os prédios que não possam ser classificados como urbanos de uma das categorias remanescentes, a saber, habitacionais, comerciais, industriais, para serviços ou terrenos para construção.

 

49.  Neste sentido o já citado Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, no Processo n.º 08035/14 de acordo com o qual “ (...) no que diz respeito à classificação do prédio urbano como pertencente à espécie “outros” o legislador adoptou um critério de finalidade “residual” por referência aos fins enunciados no n.º 2. Com efeito, o critério da finalidade “residual” da espécie “outras” resulta claramente do disposto no n.º 4 do art. 6.º do CIMI ao excluir-se desta espécie todos os edifícios e construções que tenham como destino normal os fins referidos no n.º 2 (“os edifícios e construções licenciados ou, na falta de licença, que tenham como destino normal outros fins que não os referidos no n.º 2”). Deste modo, há que concluir, com relevo para a decisão dos autos, que apenas se poderá classificar um prédio urbano na espécie “outras” prevista na alínea d) do n.º 1 do art. 6.º do CIMI quando o edifício ou construção não seja de classificar na espécie comerciais, industriais ou para serviços. Dito de outro modo, sempre que um prédio urbano possa ser classificado na espécie de prédios urbanos “comerciais, industriais ou para serviços”, de acordo com os critérios fixados no n.º 2 do art. 6.º do CIMI, então, fica excluída a possibilidade de ser classificado na espécie “outros” ( http://www.dgsi.pt/jtca.nsf/170589492546a7fb802575c3004c6d7d/55ddc8a03e601fe480257e5e0060115d?OpenDocument&Highlight=0,08035%2F14).

 

50.  Para o que para a presente análise importa devem, assim, ser considerados prédios urbanos do tipo “Outros” os edifícios e construções licenciados para fins diferentes dos habitacionais, comerciais ou de serviços e os edifícios e construções não licenciados mas afetos a fins diferentes dos habitacionais, comerciais ou de serviços.

 

51.  Antes de avançar cabe referir que estando em causa postos de abastecimento de combustíveis a regra será a existência de licença de utilização pelo que os prédios deverão ser classificados em função do que resultar dessa mesma licença.

 

52.  Ora, no caso vertente, e de acordo com a respetiva licença de utilização, o prédio encontra-se licenciado para “Comércio” e “Outros”, respeitando esta último tipo de utilização ao posto de estabelecimento de combustíveis.

 

53.  Sendo de atender em primeiro lugar ao que resulta da licença, resulta claro no que respeita ao posto de abastecimento de combustíveis, que o mesmo foi enquadrado em “Outros”.

 

54.  Sustenta a Requerente que a licença municipal está preenchida nos campos “Comércio” e “Outros”, acrescentando que a licença foi emitida em 1995, precedendo o Código do IMI pelo que por esse motivo o prédio não está licenciado para “Outros”, nem a licença o classifica como tal para efeitos de IMI.

 

55.  Não se acompanha o raciocínio do Requerente na medida em que da licença de utilização, junta pela própria ao presente processo resulta, inequivocamente, que o posto de abastecimento de combustíveis surge integrado no tipo de utilização “Outros” identificado na mencionada licença, em oposição ao tipo de utilização “Comércio”, que o antecede nessa mesma licença.

 

56.  E a classificação para efeitos de IMI é determinada pelo artigo 6.º do Código do IMI, de acordo com o qual são prédios urbanos da espécie “Outros” os edifícios e construções licenciados para fins diferentes dos habitacionais, comerciais, industriais ou para serviços, como é o caso no que, em concreto, respeita ao posto de abastecimento, já que da licença de utilização em apreciação não resulta o licenciamento para qualquer destes fins (não obstante serem na licença identificados como tipos de utilização possíveis).

 

57.  Recorde-se que é classificar um prédio urbano na espécie “Outros” quando o edifício ou construção não seja de classificar na espécie comerciais, industriais ou para serviços. E, para ser classificado como prédio urbano “comercial, industrial ou para serviços” tem que ser licenciado para um destes fins ou, na ausência de licença, ter como destino normal cada um destes fins.

 

58.  No caso vertente, não há que procurar o destino normal porque se trata de um prédio licenciado. E trata-se de um prédio licenciado que, no que ao posto de abastecimento respeita, não está licenciado nem para habitação, nem para indústria comércio ou serviços, mas antes para “Outros”.

 

59.  Contra o exposto, não procede a circunstância da licença ter sido emitida em 1995, em data anterior à da entrada em vigor do IMI, desde logo porque a classificação dos prédios urbanos nas espécies identificadas no artigo 6.º do Código do IMI, encontra correspondência no artigo 6.º do Código da Contribuição Autárquica, então, em vigor.

 

60.  Logo, no que ao posto de abastecimento respeita o mesmo deve ser qualificado como um prédio da espécie “Outros”, nos termos e para os efeitos da alínea d), do número 1, e do número 4 do artigo 6.º do Código do IMI, estando quanto à parte remanescente licenciado para “Comércio”, em conformidade com a mesma licença de utilização e nos termos e para os efeitos da alínea b), do número 1, do artigo 6.º do Código do IMI

 

61.  O prédio cuja avaliação se contesta no presente processo apresenta assim partes enquadráveis em mais de uma das espécies identificadas no número 1, do artigo 6.º do Código do IMI.

 

62.  De acordo com o número 1, do artigo 7.º do Código do IMI, o valor patrimonial tributário dos prédios urbanos com partes enquadráveis em mais de uma das identificadas espécies determina-se consoante as diferentes partes sejam ou não economicamente independentes.

 

63.  Caso uma das partes seja principal e a outra ou outras meramente acessórias, o valor patrimonial tributário determina-se por aplicação das regras de avaliação da parte principal, tendo em atenção a valorização resultante da existência das partes acessórias.

 

64.   Já na hipótese em que as diferentes partes sejam economicamente independentes, cada parte é avaliada por aplicação das correspondentes regras, sendo o valor do prédio a soma dos valores das suas partes.

 

65.  Assim, se se estiver perante um prédio urbano com partes enquadráveis em mais de uma das espécies elencadas no número 1, do artigo 6.º, como é o caso, há que determinar se existe, ou não, uma relação de subordinação entre ambas as partes do prédio.

 

66.  Esta relação de subordinação é aferida “não em função da área ocupada por cada uma das partes em confronto, mas antes pelo seu peso – ou relevância – económica.

Deste modo, existindo a referida relação de subordinação económica entre ambas – ou as várias – partes constitutivas do mesmo prédio, preceitua o n.º 2, a) do normativo, sob anotação, que a avaliação é regulada pelas regras da parte principal, mas tendo em conta a valorização causada pela existência das partes acessórias, ou seja, avaliado o prédio de harmonia com as regras resultantes e atinentes à identificação da parte principal, o valor apurado terá de ser majorado na justa medida do aumento de valor que resultar para o prédio pela existência da – ou das – parte considerada como acessória” (in ROCHA, António Santos e BRÁS, Eduardo José - Tributação do Património – IMI-IMT e Imposto do Selo (Anotados e Comentados), Coimbra, 2015, págs. 50 e 51).

 

67.  Do Termo de Avaliação resulta que a loja de conveniência e cafetaria tem carácter meramente acessório e pouco representativo (cf. procedimento administrativo).

 

68.  Este carácter acessório não é afastado pela “Descrição da Avaliação” que integra a Ficha de avaliação n.º... e que concretiza em maior detalhe as características do prédio avaliado nos seguintes termos: “Posto de abastecimento de combustíveis, composto por ilhas de abastecimento de combustíveis com cobertura metálica, ilha de bombas de abastecimento de combustíveis descoberta, ilha de abastecimento para ar/água, edifício de apoio com loja de venda e cafetaria, escritório, casas de banho, edifício técnico, parque de estacionamento para veículos ligeiros e parque de tanques.” (cf. procedimento administrativo).

 

69.  Na Declaração de voto de vencido, que acompanha o Termo de Avaliação, não se questiona o carácter acessório da loja de conveniência e cafetaria e nenhum elemento foi trazido ao processo que permita questionar o carácter acessório desta.

 

70.  Conclui-se, assim, que no caso vertente, por força da aplicação da alínea a), do número 2 do artigo 7.º do Código do IMI são aplicáveis as regras de avaliação da parte principal, ou seja, do posto de abastecimento, o que significa que são aplicáveis as regras de avaliação dos prédios da espécie “Outros”.

 

71.  Concluindo-se pela classificação do prédio urbano em questão nas espécies “Comercial” e “Outros”, nos termos e para os efeitos das alíneas b) e d), do número 1, e do número 4 do artigo 6.º do Código do IMI e, bem assim, que por força da aplicação da alínea a), do número 2 do artigo 7.º do mesmo Diploma são no caso vertente aplicáveis as regras de avaliação da espécie “Outros” importa analisar as regras em questão.

 

72.  O procedimento avaliativo com vista à determinação do valor patrimonial tributário dos prédios urbanos do tipo "Outros" encontra-se estabelecido no artigo 46.° do Código do IMI.

 

73.  A referida disposição legal distingue entre as regras aplicáveis aos edifícios - previstas nos seus números 1 e 2 -, aos terrenos - previstas no seu número 3 -, e aos prédios em ruínas - previstas no seu número 4.

 

74.   O número 1 do preceito regula a avaliação dos edifícios, determinando a aplicação com as adaptações necessárias, do método de avaliação próprio dos prédios urbanos para habitação, comércio, indústria e serviços previsto nos artigos 38.° e seguintes do Código.

 

75.  E o número 2 determina que, não sendo possível utilizar as regras do artigo 38.°, se recorra ao método do custo adicionado do valor do terreno.

 

76.  O legislador não determinou a aplicação do número 1 ou do número 2 em função daquele cujo método se revelar mais adequado, mas antes em função da não possibilidade de utilização do método de avaliação previsto no artigo 38.º, exigindo a sua aplicação mesmo que só seja possível fazê-lo com adaptações.

 

77.  Ou seja, no caso de estar em causa um edifício da espécie “Outros” são-lhe aplicáveis as regras do artigo 38.º do Código do IMI, com as necessárias adaptações, exceto se em função da natureza do prédio essas regras não possam ser utilizadas, hipótese em que é aplicável o método do custo adicionado do valor do terreno.

 

78.  Deste modo, estando em causa edificações só se não for efetivamente possível aplicar as regras do artigo 38.° e seguintes do Código, com as adaptações que se revelarem necessárias no caso concreto, é que se deverá recorrer ao método do custo adicionado do valor do terreno.

 

79.  Do Termo de Avaliação resulta a imediata aplicação do número 2, do artigo 46.º do Código do IMI, sem consideração da possibilidade de aplicação das regras resultantes do número 1 dessa mesma disposição legal.

 

80.  A Entidade Requerida sustenta na sua Resposta a inaplicabilidade da fórmula do artigo 38.º ao caso vertente, em virtude da alegada impossibilidade de se aplicar o coeficiente de qualidade e conforto e o coeficiente de vetustez.

 

81.  A doutrina admite como adaptações possíveis, a mero título de exemplo, que a utilização da fórmula do artigo 38.º do Código do IMI “sem os factores Cq e Cv, pode responder à avaliação de um complexo desportivo, com uma componente edificada e com espaços livres” (MATEUS, J. Silvério e FREITAS, L. Corvelo - Os Impostos sobre o Património Imobiliário, O Imposto do Selo, Anotados e Comentados, Engifisco, 2005, pág. 226).

 

82.  Um “Posto de abastecimento” consiste numa instalação à qual corresponde a área onde se inserem as unidades de abastecimento, os respetivos reservatórios e as zonas de segurança e de proteção, bem como os edifícios integrados (locais destinados a atividades complementares, fins administrativos, armazenagem de produtos e serviços técnicos) e as vias necessárias à circulação dos veículos rodoviários a abastecer (cf. alínea q) do número 1, do Regulamento de Construção e Exploração de Postos de Abastecimento de Combustíveis, aprovado pela Portaria n.º 131/2002, de 9 de Fevereiro).

 

83.  Atenta as características típicas de um posto de combustível, e as que se encontram reunidas no caso vertente, não resulta que ao prédio em apreciação não possam ser aplicáveis as regras de avaliação previstas no artigo 38.° e seguintes, com as adaptações que os peritos fundadamente considerarem justificadas.

 

84.  Aliás, anteriores decisões nesta matéria permitem concluir que foi determinada a aplicação das regras de avaliação previstas no artigo 38.° e seguintes quer a postos de abastecimento de combustível como o presente (cf. decisões do CAAD proferidas nos processos 62/2013-T, 348/2015-T e 271/2015-T) quer a edificações de características próximas como é o caso dos centros de lavagem e de aspiração de automóveis (cf. Acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo Sul, no Processo n.º 08035/14, em 4 de Junho de 2006, in www.dgsi.pt).

 

85.  Conclui-se assim que o valor patrimonial do prédio em apreciação devia ter sido determinado em conformidade com as regras resultantes da aplicação do número 1, do artigo 46.º do Código do IMI e não pelo método do custo adicionado do valor do terreno como se verificou.

 

86.  Em face do exposto, procede o presente pedido arbitral com a consequente anulação do ato cuja legalidade se contesta.

 

 VI.            DECISÃO

 

Em face do supra exposto, decide-se julgar procedente o pedido de pronúncia arbitral, determinando-se a anulação do ato de fixação do valor patrimonial contestado, emitido com referência ao prédio inscrito na matriz predial urbana sob o artigo..., da freguesia de..., concelho da ….

 

Fixa-se o valor do processo em € 1.069,15 (mil e sessenta e nove euros e quinze cêntimos), nos termos do artigo 97.º-A do Código do Procedimento e Processo Tributário, aplicável por de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária (RCPAT).

 

Custas a cargo da Entidade Requerida, no montante de € 306,00 (trezentos e seis euros), nos termos da Tabela I do RCPAT, dado que o presente pedido foi julgado procedente, e em cumprimento do disposto no número 2, do artigo 12.º, e número 4, do artigo 22.º, ambos do RJAT, e do disposto no número 4, do artigo 4.º, do citado Regulamento.

 

Notifique.

Lisboa, 22 de janeiro de 2016

 

[Texto elaborado em computador, nos termos do artigo 131.º, número 5 do Código de Processo Civil (CPC), aplicável por remissão do artigo 29.º, n.º 1, alínea e) do RJAT, com versos em branco e revisto pela signatária].

 

 

A Árbitra

 

(Ana Moutinho Nascimento)