Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 375/2015-T
Data da decisão: 2016-08-01  Selo  
Valor do pedido: € 40.225,15
Tema: IS – Verba 28 da TGIS - Terreno para construção
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                                                               Decisão Arbitral

 O árbitro Dr. Fernando Pinto Monteiro, designado pelo Exmº Presidente do Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD) para formar o Tribunal Tributário, constituído em 25-06-2015, decidiu o seguinte

 

 

I – RELATORIO

 

A   A…, S.A com sede na Rua…, …, em …(…-…) com o número único de matricula e de pessoa coletiva nº…, na sequencia da formação da presunção de indeferimento tácito do pedido de revisão oficiosa da liquidação do Imposto de Selo n.º 2012…, de 07.11.2012, no montante de € 40.225,15, emitida na sequencia da entrada em vigor da Lei n.º 55-A/2012, de 29 de outubro, vem requerer a Constituição do Tribunal Arbitral Singular, nos termos do disposto nos artigos 2.º, n.º1, alínea a), 5.º, n.º 2, alíneas a) e b), 6.º, n.º 1, 10.º, n.º 1, alínea a) e n.º 2, todos do Regime Jurídico de Arbitragem Tributária, visando o presente pedido

a)      a declaração de ilegalidade da liquidação do Imposto de Selo acima identificado, com fundamento na alínea a) do art.º 99.º do CPPT

b)      a restituição dos valores pagos, com juros indemnizatórios.

O pedido de constituição do Tribunal Arbitral foi aceite pelo Exmº. Presidente do CAAD e foi notificado a Autoridade Tributária e Aduaneira nessa mesma data.

A Requerente não procedeu à nomeação de Árbitro, pelo que, ao abrigo do disposto no Artigo 6.º, n.º 2, alínea a). do RJAT, foi o arbitro designado, tendo aceitado nos termos legalmente previstos.

 

I A TEMPESTIVIDADE

1.º Antes de mais há que apreciar a exceção arguida pela Requerida. Em 7/11/2014 a Requerente requereu revisão oficiosa da liquidação do imposto de Selo, nos termos do art.º 78.º da LGT, pedido que até à data não tinha tido qualquer decisão proferida.

2.º Como o art.º 57.º da LGT estatui, o procedimento tributário deve ser concluído no prazo de quatro meses sob pena de se presumir o seu indeferimento.

3.º A alínea a) do n.º 1 do art.º 10.º do RJAT determina que o pedido de constituição do tribunal arbitral é apresentado no prazo de 90 dias, contados da formação da presunção de indeferimento tácito, pelo que, tendo a reclamação graciosa sido apresentada em 07.11.2014 presume-se indeferida em 07.03.2015, pelo que não tem razão a requerida. O pedido de constituição do Tribunal Arbitral foi, pois, deduzido dentro do prazo.

 

II - SANEAMENTO

4.º O Tribunal é competente e encontra-se regularmente constituído, nos termos dos artigos 2.º, n.º1 alínea) e 5.º e 6.º todos do  RJAT;

5.º. As partes têm personalidade e capacidade judiciária, são legítimas e estão legalmente representadas, nos termos dos artigos 4.º e 10.º do RJAT e do artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março

6.º Não subsistem quaisquer questões prévias que cumpra apreciar nem vícios que invalidem o processo.

Impõe-se agora apreciar o pedido.

III – OS FACTOS

Factos provados

7.º A Requerente é uma sociedade comercial que se dedica à realização e desenvolvimento de negócios e projetos imobiliários.

8.º. Em 2012, a requerente era proprietária de um prédio urbano (talhão de terreno para construção) inscrito na matriz predial urbana da freguesia da …, concelho do …, sob o art.º…, com o valor patrimonial tributário de € 8.346.718,63

9.º Segundo o Plano de Pormenor das …, da área total do terreno, 17.400 m2 destinavam-se a habitação e 2.465 m2 a comércio e serviços.

10.º. Em 2012 não havia no terreno qualquer edificação ou construção nem se encontrava pendente qualquer pedido de obtenção de licença para construção.

11.º O prédio tinha sido avaliado, nos termos do Código do IMI e, com a entrada em vigor da Lei 55-A/2012, de 29 de outubro, foi a Requerente notificada da liquidação do Imposto de Selo, efetuada nos termos da verba n.º 28.1 da TGIS,

12.º Com base no VPT, a Autoridade Tributária e Aduaneira, procedeu à liquidação do Imposto de Selo da verba nº 28.1 da Tabela Geral, no montante total de € 40.225,15, em resultado da aplicação da taxa transitória de 0,5%, aplicável aos prédios com afetação habitacional avaliados nos termos do Código do IMI, pago em 20.12.2012.

13.º Em 2013 a Requerente foi notificada da liquidação do imposto, referente ao ano de 2012, no montante de € 83.467,19, pagável em três prestações.

 14.º Não se conformando com essa liquidação, a Requerente deduziu reclamação graciosa que seria indeferida.

15.º A Requerente deduziu, então, pedido de pronuncia arbitral, tendo sido instaurado o processo 66/2014-T, do CAAD, no âmbito da qual viria a ser determinada a anulação daquele ato tributário.

 

Factos não provados

16.º Não se provaram outros factos com interesse para a decisão.

 

IV O DIREITO

17.º A Lei nº 55-A/2012, de 29 de outubro, veio aditar à TGIS, anexa ao Código do Imposto de Selo, a verba 28 sujeitando a IS a propriedade, o usufruto ou o direito de superfície de prédios urbanos cujo valor patrimonial, determinado nos termos do Código do IMI, seja igual ou superior a € 1.000.000,00

18.º A verba 28.1 da TGIS, dispunha, ao tempo, que estava sujeito a Imposto de Selo

28 -  A propriedade, usufruto ou o direito de superfície de prédios urbanos cujo valor patrimonial tributário constante da matriz, nos termos do Código do Imposto Municipal sobre imóveis (CIMI) seja igual ou superior a € 1.000.000 – sobre o valor patrimonial tributário utilizado para efeito de IMI:

28.1 – Por prédio com afetação habitacional -  1%

28.2 – Por prédio, quando os sujeitos passivos que não sejam pessoas singulares sejam residentes em país, território ou região sujeito a um regime fiscal claramente mais favorável, constante da lista aprovada por portaria do Ministro da Finanças – 7,55 (Cf. Artigo 4.º da Lei n.º 55-A/2012, de 29 de outubro.)

19º. Determina ainda o n.º 4 do artigo 2.º do Código do imposto de Selo na redação da Lei n.º 55-A/2012, que “nas situações previstas na verba 28 da Tabela Geral, são sujeitos passivos do imposto os referidos no artigo 8.º do CIMI “, i.e., o proprietário do prédio em 31 de dezembro do ano a que o imposto respeitar.

20.º. Nos termos dos artigos n. 23.º, n.º 7 e 44.º, n. º5 do Código do Imposto de Selo o imposto era liquidado e remetido, pela administração tributária ao sujeito passivo, até ao fim do mês anterior ao do pagamento, para ser pago em duas ou três prestações consoante o valor da coleta.

21.º. Para o ano de 2012, a lei 55-A/2012, de 29 de outubro, estabeleceu o seguinte regime transitório:

            a) facto tributário relevante ocorreria até 31 de outubro de 2012

            b) sujeito passivo – o proprietário do prédio urbano em 31 de outubro de 2012

            c) a administração tributária liquidaria e remeteria o imposto até final do mês de novembro de 2012

            d) o pagamento teria de ser pago até 20 de dezembro de 2012

22.º. As taxas aplicáveis seriam as seguintes:

i)                    Prédios com afetação patrimonial avaliados nos termos do IMI: 0,5%

ii)                  Prédios com afetação habitacional ainda não avaliados nos termos do Código do IMI: 8%

iii)                Prédios urbanos quando os sujeitos passivos que não sejam pessoas singulares sejam residentes em país, território ou região sujeito a um regime fiscal mais favorável, constante da lista aprovada por Portaria do Ministro das Finanças; 7,5%

23.º. Na sequencia da entrada em vigor da lei a Requerente foi notificada da liquidação, mas não pode conformar-se com a liquidação porque:

a)      À data dos factos o prédio urbano era qualificado como terreno para construção e, assim, não se enquadrava na categoria de prédio urbano com afetação habitacional previsto na verba 28.1 da TGIS, não sedo a sua propriedade sujeita a imposto de selo.

b)      O imposto de Selo sobre a propriedade definido nos termos da verba 28.1 da TGIS afigura-se inconstitucional por violação dos princípios da igualdade e capacidade contributiva e da progressividade.

 24.º A incidência objetiva do Imposto de Selo sobre a propriedade é assim, delimitada pelo conceito de prédio urbano com “afetação habitacional”

25.º A verdade é que nem no Código do Imposto de Selo, nem no Código do IMI, para o qual remete o Código do Imposto de Selo para regular os demais aspetos com a incidência, liquidação, e cobrança deste imposto, nem em qualquer outro diploma legal, vem definido o conceito de “prédio com afetação habitacional”.

26.º A afetação de um prédio urbano a habitação pressupõe que tenha condições mínimas de habitabilidade, ou seja, que seja um prédio edificado e habitável que preserve a intimidade e a privacidade familiar

27.º Independente da afetação que for dada à futura habitação, um terreno, para construção, enquanto tal, não pode ser licenciado para fins habitacionais nem tão-pouco pode ter como destino normal a habitação, porque não reúne condições de habitabilidade.

28.º Ao empregar a expressão “terreno com afetação habitacional” pretendeu o legislador tributário apenas e tao só abranger os prédios urbanos com funcionalidade habitacional real e presente, e não alargar, para efeitos de incidência do imposto de selo, às espécies de prédios previstas no artigo 6.ºn. º 1 do Código do IMI

29.º Por outro lado, os terrenos para construção passaram a ser tributados em Imposto de Selo, apenas com a entrada em vigor do Orçamento de Estado de 2014, aprovado pela Lei n.º 83.º-C/2013, de 31 de dezembro, que no art.º 194.º, sob a epigrafe - Alteração à Tabela Geral do Imposto do Selo, estabeleceu:

“A verba 28.1 da Tabela Geral do Imposto do Selo, anexa ao Código do Imposto do Selo, aprovado pela Lei n.º 150/99, de 11 de setembro, passa a ter a seguinte redação:
«28.1 - Por prédio habitacional ou por terreno para construção cuja edificação, autorizada ou prevista, seja para habitação, nos termos do disposto no Código do IMI - 1 %»

30.º Para interpretar a norma, o artigo 11.º da Lei Geral Tributária, remete a interpretação das normas fiscais para o Código Civil, artigo 9.º que estabelece que:

1. A interpretação não deve cingir-se à letra da lei, mas reconstruir o partir dos textos o pensamento legislativo, tendo sobretudo em conta a unidade do sistema jurídico, as circunstancias em que a lei foi elaborada e as condições específicas do tempo em que é aplicada.

2. Não pode, porém, ser considerada pelo interprete o pensamento legislativo que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso.

3. Na fixação do sentido e alcance da lei, o interprete presumirá que o legislador consagrou as soluções mais adequadas e que soube exprimir o seu pensamento em termos adequados.

31.ºAssim entendo que o legislador não pretendeu incluir, para o exercício de 2013, na previsão da verba n.º 28.1 do TGIS, a tributação dos terrenos para construção.

32.º Questões de conhecimento prejudicados.

Relativamente à matéria de facto o Tribunal não tem que se pronunciar sobre tudo o que for alegado pelas partes, cabendo-lhe, sim, o dever de selecionar os factos que importem para a decisão, a matéria provada da não provada (art.º 123.º, n. º2 do CPPT e art.º 607, nº 3 do Código Processo Civil, aplicável “ex vi” art.º 29, nº 1 alínea a) e e) do RJAT. Deste modo. os factos pertinentes para o julgamento da causa são escolhidos e recortados em função da sua relevância jurídica, a qual é estabelecida em atenção as varias soluções plausíveis das questões de direito ( cfr. anterior art.º511.º do CPC correspondente ao atual 596.º, aplicável “ex vi” do a art.º 29 n.º 2 e) do RJAT

33.º. Na verdade, o art.º 124º do º do CPPT, subsidiariamente aplicável por força do art.º 29 n.º 1 do RJAT, ao estabelecer uma ordem de conhecimento de vícios, pressupor que, julgado procedente um vício que assegura a eficaz tutela dos direitos dos impugnantes, não é necessário conhecer os restantes, pois, se fosse sempre necessário apreciar todos os vícios imputados aos atos impugnados, seria indiferente a ordem do seu conhecimento.

34.º. Em face do supra exposto, conclui-se assistir razão à Requerente e, consequência decide-se:

a)      Declarar a ilegalidade das liquidações objeto destes autos e, em consequência, julgar procedente o pedido de pronuncia arbitral, com a consequente anulação, com todos os efeitos legais, dos atos de liquidação de imposto de selo melhor identificados nos autos.

b)      Julgar procedente o pedido de juros indemnizatórios peticionados pela requerente.

 

VALOR DO PROCESSO –De harmonia com o disposto no art.º 306 n.º 1 e 2 do CPC e 97-A, n.º 1, alínea a) do CPPT e 3º nº 2 do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária fixa-se ao processo o valor de € 40.225,15

 CUSTAS - As custas, na importância de € 2.142,00 (Tabela I, anexo ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, ficam integralmente a cargo da requerida (Artigo 24ºA do Regulamento do CAAD)

Notifique-se e Registe-se

Lisboa, 2016-08-01

O Arbitro,

 

(Fernando Pinto Monteiro)