Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 395/2015-T
Data da decisão: 2016-01-20  Selo  
Valor do pedido: € 3.556,40
Tema: IS – Verba 28 da TGIS; Propriedade vertical; Inimpugnabilidade autónoma das prestações dos actos de liquidação
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DECISÃO ARBITRAL

 

 

 

1.      RELATÓRIO

 

1.1.  A..., na qualidade de cabeça de casal da herança indivisa aberta por óbito de B..., contribuinte n.º...., com domicílio na Rua..., ..., ..., em Lisboa (adiante designada “Requerente”), apresentou em 23/06/2015, pedido de pronúncia arbitral tendo em vista a apreciação e declaração de ilegalidade dos actos de liquidação de Imposto do Selo do ano de 2014, referentes à aplicação da Verba n.º 28.1 da Tabela Geral do Imposto do Selo (Tabela Geral), no valor total de € 3.556,40 (três mil, quinhentos e cinquenta e seis euros e quarenta cêntimos) a um prédio de que é proprietária.

 

1.2.  O Exmo. Senhor Presidente do Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD) designou, em 27/07/2015, como árbitro singular o signatário desta decisão.

 

1.3.  No dia 23/09/2015 ficou constituído o tribunal arbitral.

 

1.4.  Cumprindo-se o disposto no n.º 1 do artigo 17.º do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária (RJAT) foi a Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) notificada, em 23/09/2015, para, querendo, apresentar resposta e solicitar a produção de prova adicional.

 

1.5.  Em 28/10/2015 a AT apresentou a resposta, defendendo-se por excepção e por impugnação.

 

1.6.  Em 28/10/2015 o tribunal arbitral convidou a Requerente a pronunciar-se quanto à excepção de inimpugnabilidade do objecto do pedido de pronúncia arbitral.

 

1.7.  A Requerente não se pronunciou quanto à excepção invocada pela AT, nem logrou juntar aos autos, conforme solicitado pela AT, todos os documentos que sustentam os pedidos formulados a final na petição.

 

1.8.  Tratando-se de uma questão exclusivamente de direito, o tribunal arbitral em 28/12/2015 decidiu dispensar a realização da reunião a que n.º 1 do artigo 18.º do RJAT se refere, com fundamento no princípio da autonomia do tribunal arbitral na condução do processo, convidando ambas as partes para, querendo, apresentarem alegações escritas facultativas e agendou a data para prolação da decisão final.

 

1.9.  A Requerente não apresentou alegações escritas facultativas.

 

1.10.        A AT não apresentou alegações escritas facultativas.

 

 

2.      SANEAMENTO

 

O tribunal arbitral foi regularmente constituído.

 

As partes têm personalidade e capacidade judiciária e são legítimas, não ocorrendo vícios de patrocínio.

 

O processo não enferma de vícios que afectem a sua validade.

 

Verificam-se, consequentemente, as condições para ser proferida a decisão final.

 

 

3.      POSIÇÕES DAS PARTES

 

São duas as posições em confronto, a da Requerente, vertida no pedido de pronúncia arbitral e a da AT na sua resposta.

 

Para fundamentar o seu pedido a Requerente alega, em síntese:

 

a)      “A pronúncia arbitral tem por objecto a impugnação das liquidações constantes dos Documentos de Liquidação com os n.ºs 2015 ..., 2015 ..., 2015 ..., 2015..., 2015..., 2015 ..., 2015 ..., 2015 ..., 2015..., 2015 ..., 2015 ..., 2015..., 2015..., 2015 ..., 2015 ..., 2015 ..., 2015 ... e 2015 ..., respeitantes a Imposto de Selo, a Verba 28.1 TGIS”;

 

b)      Conforme “(…) consta expressamente das liquidações supra referidas que cada uma destas se refere a cada um dos andares descritos como «1 E-12», «1 D-12», «2 E-12», «2 D-12», «3 E-12», «3 D-12», «4 E-12», «4 D-12», «1 E-13», «1 D-13», «2 E-13», «2 D-13», «3 E-13», «3 D-13», «4 E-13» e «4 D-13» do prédio urbano (…)”  em causa;

 

c)      “Sucede que o prédio em causa não se encontra constituído em propriedade horizontal (…)”;

 

d)     “Não se encontrando sujeito ao regime de propriedade horizontal e, portanto, composto por fracções autónomas, não pode a liquidação incidir sobre cada uma destas, sob pena de erro sobre os pressupostos de facto (…)”;

 

e)      “Pois que, não só o tributo em causa pretende incidir sobre uma realidade que não existe, sem a invocação de qualquer fundamento para o efeito.”;

 

f)       “Como a ser assim, não se encontraria preenchido o requisito legal relativo ao valor patrimonial tributário constante do artigo 4.º e da Lei n.º 55-A/2012 e da verba 28 da Tabela Geral do Imposto do Selo, porquanto nenhum dos fogos objecto de liquidação ascende ao valor patrimonial tributário de € 1.000.000,00, conforme prevêem as citadas normas legais.”;

 

g)      “Ao que acresce o facto da própria lei estabelecer expressamente, na parte final da verba 28 da TGIS, que o IS a incidir sobre os prédios urbanos de valor igual ou superior a € 1.000.000,00 - «sobre o valor patrimonial tributário utilizado para efeito de IMI.» (…)” [realce da Requerente];

 

h)      “Assim, a adoção do critério defendido pela AT viola manifestamente os princípios da legalidade e da igualdade fiscal, bem assim, como o da prevalência da verdade material sobre a realidade jurídico-formal.”;

 

i)        “Dado que nenhum dos andares destinados a habitação tem valor patrimonial igual ou superior a € 1.000.000,00, como resulta dos documentos juntos aos autos, conclui-se pela não verificação do pressuposto legal de incidência do IS previsto na Verba 28 da TGIS.”;

 

j)        “No caso dos fogos em apreço nos presentes autos, nenhum apresenta valor patrimonial tributário que ultrapasse o valor fixado na norma de incidência.”;

 

k)      Por outro lado, “(…) o legislador ao introduzir esta inovação legislativa considerou como elemento determinante da capacidade contributiva os prédios, com afetação habitacional, de elevando valor (de luxo), mais rigorosamente, de valor igual ou superior a € 1.000.000,00, sobre os quais passou a incidir uma taxa especial de imposto de selo, prendendo introduzir um princípio de tributação sobre a riqueza exteriorizada na propriedade, usufruto ou direito de superfície de prédios urbanos de luxo com afetação habitacional. Por isso, o critério foi de aplicação da nova taxa aos prédios urbanos com afetação habitacional, cujo VPT seja igual ou superior a € 1.000.000,00.” [realce da Requerente];

 

l)        “Ora, sendo assim, considerando que a inscrição na matriz de imoveis em propriedade vertical, constituídos em diferentes partes, andares ou divisões com utilização independente, nos termos do CIMI, obedece às mesmas regras de inscrição dos imóveis constituídos em propriedade horizontal, sendo o respetivo IMI, bem como o novo IS, liquidados individualmente em relação cada uma das partes, não oferece qualquer dúvida que o critério legal para definir a incidência do novo imposto tem de ser o mesmo.”;

 

m)    “Logo, se o critério legal impõe a emissão de liquidações individualizadas para as partes autónomas dos prédios em propriedade vertical, nos mesmos moldes em que o estabelece para os prédios em propriedade horizontal, claramente estabeleceu o critério, que tem de ser único e inequívoco, para a definição da regra de incidência do novo imposto.”;

 

n)      “Assim, só haveria lugar a incidência do novo imposto de selo se alguma das partes, andares ou divisões com utilização independente apresentasse um VPT superior a € 1.000.000,00, o que não sucede.”;

 

o)      “Não pode, assim, a AT considerar como valor de referência para a incidência do novo imposto o valor total do prédio, quando o próprio legislador estabeleceu regra diferente em sede de CIMI, e este é o código aplicável às matérias não reguladas no que toca à verba 28 da TGIS.”;

 

p)      “O critério pretendido pela AT, de considerar o valor do somatório dos VPT atribuídos às partes, andares ou divisões com utilização independente, com o argumento do prédio não se encontrar constituído em regime de propriedade horizontal, não encontra sustentação legal e é contrário ao critério que resulta aplicável em sede de CIMI e, por remissão, em sede de IS.”;

 

q)      “A fundamentação da medida designada por «taxa especial sobre os prédios urbanos habitacionais de mais elevado valor» assenta na invocação dos princípios da equidade social e da justiça fiscal, chamando a contribuir de uma forma mais intensa os titulares de propriedades de elevando valor destinadas a habitação, fazendo incidir a nova taxa especial sobre as «casas de valor igual ou superior a 1 milhão de euros».” [realce da Requerente];

 

r)       “Claramente o legislador entendeu que este valor, quando imputado a uma habitação (casa, fração autónoma ou andar com utilização independente) traduz uma capacidade contributiva acima da média e, enquanto tal, suscetível de determinar um contributo especial para garantir a justa repartição do esforço fiscal.”;

 

s)       “O legislador fiscal não pode tratar situações iguais de forma diferente. Ora, se o prédio se encontrasse em regime de propriedade horizontal, nenhum das suas frações habitacionais sofreia incidência do novo imposto.”;

 

t)       “A norma do artigo 12.º, nº 3 do CIMI (à semelhança do que era previsto no artigo 232º, regra 1º, do Código da Contribuição Predial e do Imposto sobre a Indústria Agrícola) releva para efeitos de inscrição na matriz predial a autonomia que, dentro do mesmo prédio, pode ser atribuída a cada uma das suas partes, económica e funcionalmente independentes.”;

 

u)      “Ora, tal não se afigura coerente com a decisão da AT tributar a partes habitacionais de um prédio em propriedade vertical, em função do VPT global do prédio e não do que é efetivamente atribuído a cada parte.”;

 

v)      “Logo, a verdade material é a que se impõe como critério determinante da capacidade contributiva e não a mera realidade jurídico-formal do prédio.”;

 

w)    “Em consequência, a discriminação operada pela AT traduz uma discriminação arbitrária e ilegal.”;

 

x)      “Nada na lei impõe a obrigação de constituição de propriedade horizontal (…).”;

 

y)      “A AT não pode distinguir entre as duas situações (propriedade horizontal e vertical) onde o próprio legislador entendeu não o fazer, sob pena de violar coerência do sistema fiscal, bem assim como o princípio da legalidade fiscal previsto no artigo 103º, nº 2 da CRP, e ainda os princípios da justiça, igualdade e proporcionalidade fiscal.”;

 

z)      “As liquidações em causa enfermam, portanto, de nulidade que expressamente se invoca para todos os efeitos.”;

 

aa)   “Ainda que assim não se entenda, no que se não concede, devem os actos tributários em causa ser anulados por preterição de formalidades legais, erro sobre os pressupostos de facto e falta de fundamentação.”.

 

 

Doutro modo, a AT, defendendo-se por excepção e por impugnação, sustenta, em síntese, o seguinte:

 

 

Por excepção:

 

 

a)      O acto de liquidação da Verba n.º 28 da Tabela Geral é único e o facto de poder ser pago em várias prestações não implica que tenham ocorrido várias liquidações;

 

b)      De facto, a natureza das prestações de uma liquidação de Imposto do Selo é a de divisão da liquidação global, efectuada anualmente, não podendo cada prestação per si ser impugnada autonomamente, na medida em que o objecto da impugnação judicial ou do processo arbitral é o acto tributário de liquidação;

 

c)      Nesta medida, a anulação do acto tributário de liquidação releva necessariamente para todas as prestações, fazendo cessar a obrigação de as pagar ou impondo à AT a obrigação de restituir os montantes eventualmente pagos pelo sujeito passivo;

 

d)     Em face do exposto, tendo presente a manifesta inimpugnabilidade autónoma das prestações dos actos de liquidação constantes das notas de cobrança que constituem o presente pedido de pronúncia arbitral, deverá a AT ser absolvida da instância.

 

Por impugnação:

 

 

a)      “O prédio está constituído em propriedade total compreende divisões de utilização independente, afectas a habitação, cujo valor patrimonial tributário foi determinado separadamente, nos termos do art. 7º, nº 2, alínea b), do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (C.I.M.I.).”;

 

b)      “O valor patrimonial relevante para efeitos da incidência do imposto é, assim, o valor patrimonial total do prédio urbano e não o valor patrimonial de cada uma das partes que o componham, ainda quando susceptíveis de utilização independente.”;

 

c)      “O prédio urbano em causa nos presentes autos não está em regime de propriedade horizontal, caso em que cada uma das fracções autónomas seria havida como prédio urbano, incluindo para efeitos da sujeição ao imposto de selo da verba 28.1. da Tabela Geral, mas em regime de propriedade vertical.”;

d)     “Dispõe, no entanto, como consta da respectiva matriz predial de andares ou divisões independentes, avaliadas nos termos do art. 12º, nº 3, do C.I.M.I., que diz que cada andar ou prédio susceptível de utilização independente é considerado separadamente na inscrição matricial, a qual discrimina igualmente o respectivo valor patrimonial tributário sobre o qual é liquidado IMI.”;

 

e)      “Tal norma legal releva, deste modo, para efeitos da inscrição na matriz predial, a autonomia que, dentro do mesmo prédio, pode ser atribuída a cada uma das suas partes, económica e funcionalmente independentes.”;

 

f)       “A unidade do prédio urbano em propriedade vertical composto por vários andares ou divisões não é, no entanto, afectada pelo facto de todos ou parte desses andares ou divisões serem susceptíveis de utilização económica independente.”;

f)

g)      “Tal prédio não deixa, pelo facto de ser um apenas, não sendo, assim, as suas partes distintas juridicamente equiparadas às fracções autónomas em regime de propriedade horizontal.”;

 

h)      “No presente caso, o valor patrimonial tributário de que depende a incidência do imposto de selo da verba 28.1. da Tabela Geral tinha de ser, como foi, o valor patrimonial global do prédio e não o de cada uma das suas partes independentes.”;

 

i)        “O facto de o IMI ter sido apurado em função do valor patrimonial tributário de cada parte de prédio com utilização económica independente não afecta igualmente a aplicação da verba 28º, nº 1, da Tabela Geral.”;

 

j)        “Na verdade, a propriedade horizontal e a propriedade vertical são institutos jurídicos diferenciados.”;

 

k)      “A constituição da propriedade horizontal implica, é facto, uma mera alteração jurídica do prédio, não havendo uma nova avaliação (…)”;

l)        “O legislador pode, no entanto, submeter a um enquadramento jurídico tributário distinto, logo, discriminatório, os prédios em regimes de propriedade horizontal e vertical, em especial, beneficiando o instituto juridicamente mais evoluído da propriedade horizontal, sem que essa discriminação deva ser considerada necessariamente arbitrária.”;

 

m)    “O facto de a Autora do pedido de pronúncia arbitral legitimamente discordar dessa discriminação não implica a violação de qualquer princípio constitucional.”;

 

n)      “Assim, a tributação em sede de imposto do selo haverá de obedecer ao critério da adequação, aplicando-se de forma indistinta a todos os titulares de imóveis com afectação habitacional de valor superior a € 1.000.000,00, incidindo sobre a riqueza evidenciada no valor dos imóveis.”;

 

o)      “Os actos tributários impugnados, em termos de substância, não violaram qualquer preceito legal ou constitucional, devendo ser mantidos na ordem jurídica.”.

o)

 

4.      OBJECTO DO PEDIDO

 

Nos presentes autos as questões a decidir são:

 

a)      Conhecer da excepção de inimpugnabilidade do objecto do pedido;

 

b)      Determinar se, para efeitos da aplicação da Verba n.º 28.1 da Tabela Geral, no caso de prédios não constituídos em propriedade horizontal, o Imposto do Selo incide sobre o somatório do valor patrimonial tributário atribuído às diferentes partes ou andares, ou antes, sobre o valor tributário de cada parte do prédio com utilização económica independente.

 

 

5.      MATÉRIA DE FACTO

 

5.1.  FACTOS QUE SE CONSIDERAM PROVADOS

 

Em face dos documentos carreados para o processo, dá-se como provado que:

 

5.1.1.      A Requerente é proprietária de um prédio urbano sito na freguesia de..., concelho de Lisboa, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo matricial n.º..., composto de rés-do-chão e 4 andares.

 

5.1.2.      O prédio urbano está constituído em propriedade total compreende divisões susceptíveis de utilização independente, a saber: 1 E-12, 1 D-12, 2 E-12, 2 D-12, 3 E-12, 3 D-12, 4 E-12, 4 D-12, 1 E-13, 1 D-13, 2 E-13, 2 D-13, 3 E-13, 3 D-13, 4 E-13 e 4 D-13.

 

5.1.3.      À data das liquidações, o valor patrimonial tributário em causa variava entre € 48.240,00 e € 65.840,00, perfazendo o total o montante de € 1.114.850,00.

 

 

 

5.1.4.      A Requerente foi notificada dos actos de liquidação do Imposto do Selo do ano de 2014, constante dos documentos de cobrança para pagamento da primeira prestação do imposto liquidado por cada andar ou divisão com utilização independente e que integram o mencionado prédio urbano, à taxa de 1%, com a data limite de pagamento em 30/04/2015, nos termos a seguir discriminados:

 

 

 

IDENTIFICAÇÃO DO DOCUMENTO

DESCRIÇÃO DO PRÉDIO

VALOR PATRIMONIAL

TAXA (%)

COLECTA

1.ª PRESTAÇÃO

2015 ...

1D 13

60.300,00

1%

603,00

201,00

2015 ...

1E 13

65.190,00

1%

651,90

217,30

2015 ...

2D 13

60.300,00

1%

603,00

201,00

2015...

2E 13

65.190,00

1%

651,90

217,30

2015 ...

4D 13

60.910,00

1%

609,10

203,04

2015 ...

4E 13

65.840,00

1%

658,40

219,48

2015 ...

3D 13

60.910,00

1%

609,10

203,04

2015 ...

3E 13

65.840,00

1%

658,40

219,48

2015 ...

4E 12

60.910,00

1%

609,10

203,04

2015 ...

1D 12

65.190,00

1%

651,90

217,30

2015 ...

1E 12

60.300,00

1%

603,00

201,00

2015 ...

R/C D

48.240,00

1%

482,40

241,20

2015 ...

4D 12

65.840,00

1%

658,40

219,48

2015 ...

3E 12

60.910,00

1%

609,10

203,04

2015 ...

3D 12

65.840,00

1%

658,40

219,48

2015 ...

2E 12

60.300,00

1%

603,00

201,00

2015 ...

2D 12

65.190,00

1%

651,90

217,30

2015 ...

R/C E

57.650,00

1%

576,50

192,18

 

 

 

5.2.  FACTOS QUE NÃO SE CONSIDERAM PROVADOS

 

5.2.1.      A Requerente não procedeu à junção e identificação dos actos de liquidação do Imposto do Selo do ano de 2014, constante dos documentos de cobrança para pagamento da segunda e terceira prestações do imposto liquidado por cada andar ou divisão com utilização independente e que integram o mencionado prédio urbano.

 

 

O DIREITO

 

5.3.  DA INIMPUGNABILIDADE DO OBJECTO DO PEDIDO

 

A AT fundamenta a sua pretensão, no que à excepção de inimpugnabilidade autónoma das prestações dos actos de liquidação constantes das notas de cobrança que constituem o objecto do presente pedido de pronúncia arbitral, no facto de não ter sido impugnado um acto tributário, mas antes o pagamento das primeiras prestações de Imposto do Selo.

 

O objecto de processo corresponde, assim, na óptica da AT, não à anulação de um acto tributário, mas sim de uma mera nota de cobrança.

 

Vejamos.

 

Estabelece a alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º do RJAT que os tribunais arbitrais são competentes para apreciar as pretensões de declaração de ilegalidade de actos de liquidação de tributos, de autoliquidação, de retenção na fonte e de pagamento por conta.

 

Já quanto à vinculação da AT à jurisdição dos tribunais arbitrais, dispõe o n.º 1 do artigo 4.º do RJAT que esta depende de portaria dos membros do Governo responsáveis pelas áreas das finanças e da justiça.

 

Nesta medida, a competência da instância arbitral encontra-se, assim, delimitada, pela portaria de vinculação da Administração Tributária à jurisdição do Centro de Arbitragem Administrativa. [1]

 

Nos termos do disposto no artigo 2.º da referida Portaria, a Direcção-Geral dos Impostos e a Direcção-Geral das Alfândegas e dos Impostos Especiais sobre o Consumo (actualmente, AT) vinculam-se à jurisdição dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD que tenham por objecto a apreciação das pretensões relativas a impostos cuja administração lhes esteja cometida, nos termos do n.º 1 do artigo 2.º do RJAT, nas quais expressamente se incluem as pretensões de declaração de ilegalidade de actos de liquidação de tributos, de autoliquidação, de retenção na fonte e de pagamento por conta.

 

Conclui-se, assim, que o processo arbitral tributário tem por objecto, mediato ou imediato, o acto tributário de liquidação, enquanto acto de determinação do quantitativo do imposto a pagar (colecta), por aplicação de uma taxa à matéria colectável.

 

Ora, a apreciação da excepção suscitada depende, por isso, da questão de saber se a Requerente impugna o acto de liquidação de Imposto do Selo ou se, pelo contrário, se limita a impugnar cada uma das prestações de Imposto do Selo de per si.

 

Nos casos em que o imposto deva ser pago em prestações, a liquidação é notificada ao sujeito passivo conjuntamente com a notificação para pagamento de cada uma das prestações, apenas podendo ser impugnada na sua totalidade e não prestação a prestação. [2]

 

A este respeito, sustenta José Casalta Nabais que “A liquidação lato sensu, ou seja, enquanto conjunto de todas as operações destinadas a apurar o montante do imposto, compreende: 1) O lançamento subjectivo destinado a determinar ou identificar o contribuinte ou sujeito passivo da relação jurídico-fiscal, 2) O lançamento objectivo através do qual se determina a matéria colectável ou tributável do imposto e, bem assim, se determina a taxa a aplicar, no caso de pluralidade de taxas, 3) A liquidação stricto sensu traduzida na determinação da colecta através da aplicação da taxa à matéria colectável ou tributável, e 4) as (eventuais) deduções à colecta.”. [3]

 

Para cada facto tributário haverá, em princípio, uma única liquidação, pela qual se determinará a colecta a pagar.

 

Por outro lado, dispõe, ainda, o n.º 7 do artigo 23.º do Código do Imposto do Selo que “tratando-se do imposto devido pelas situações previstas na verba n.º 28 da Tabela Geral, o imposto é liquidado anualmente (…)” aplicando-se, com as necessárias adaptações, as regras contidas no CIMI”.

 

No mesmo sentido, estabelece o n.º 5 do artigo 44.º do Código do Imposto do Selo que “havendo lugar a liquidação do imposto a que se refere a verba n.º 28 da Tabela Geral, o imposto é pago nos prazos, termos e condições definidos no artigo 120.º do CIMI”.

 

Ou seja, à luz do disposto no n.º 2 do artigo 113.º do Código do IMI, “a liquidação (…) é efetuada nos meses de fevereiro e março do ano seguinte”, devendo o imposto ser pago, em três prestações, nos meses de Abril, Julho e Novembro, respectivamente, em função do seu quantitativo. [4]

 

Em suma, e da conjugação das disposições legais acima referidas, é possível concluir que o Imposto do Selo é liquidado anualmente, não sendo o pagamento em prestações mais do que uma técnica de arrecadação do imposto e não um seu pagamento parcial. [5]

 

Desta feita, a liquidação é só uma e só ela constitui acto lesivo, susceptível de ser impugnado.

 

 

Dito isto,

 

Da análise ao pedido de pronúncia arbitral resulta que a Requerente requer a constituição do tribunal arbitral com vista à “(…) impugnação das liquidações constantes dos Documentos de Liquidação com os n.ºs 2015 ..., 2015 ..., 2015 ..., 2015 ..., 2015..., 2015 ..., 2015 ..., 2015 ..., 2015..., 2015 ..., 2015 ..., 2015..., 2015 ..., 2015 ..., 2015 ..., 2015 ..., 2015 ... e 2015 ..., respeitantes a Imposto do Selo, da verba 28.1TGIS (…)” peticionando, a final, a declaração de “(…) nulidade dos actos tributários que constituem o seu objecto (…)” ou, subsidiariamente, a “(…) anulação dos actos tributários que constituem o seu objecto (…)”.

 

Ou seja, requer-se a declaração de ilegalidade dos actos tributários de liquidação de Imposto do Selo, a que correspondem as respectivas prestações de pagamento.

 

Resulta, assim, do exposto que o objecto do pedido de pronúncia arbitral corresponde apenas à primeira prestação de Imposto do Selo.

 

Tanto assim é que a própria Requerente, na delimitação do objecto da acção arbitral, circunscreve a instauração do respectivo processo à anulação dos actos de liquidação de Imposto do Selo acima identificados, indicando como valor da utilidade económica do pedido, não o valor global da liquidação, mas o montante de € 3.556,40 correspondente apenas à primeira prestação.

 

Note-se, aliás, que a Requerente não procedeu sequer à identificação e junção das demais notas de cobrança (correspondentes à segunda e terceira prestações) de Imposto do Selo associando, claramente, o objecto do pedido de pronúncia arbitral à primeira prestação de Imposto do Selo.

 

Em face do exposto, somos levados a concluir pela procedência da verificação da excepção em apreço.

 

 

6.      DECISÃO

 

Nestes termos e com a fundamentação acima descrita, o tribunal arbitral decide:

 

·         Julgar procedente a excepção dilatória da incompetência absoluta do tribunal arbitral (tendo em consideração a inimpugnabilidade autónoma dos actos de cobrança objecto do pedido) e, em consequência, absolver a AT da instância;

·         Condenar a Requerente no pagamento das custas do presente processo.

 

 

7.      VALOR DO PROCESSO

 

Fixa-se o valor do processo em € 3.556,40 (três mil, quinhentos e cinquenta e seis euros e quarenta cêntimos), nos termos do artigo 97.º-A do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), aplicável por força das alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT e do n.º 2 do artigo 3.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária (RCPAT).

 

 

8.      CUSTAS

 

Custas a suportar pela Requerente, no montante de € 612,00 (seiscentos e doze euros), nos termos da Tabela I do Regulamento das Custas dos Processos de Arbitragem Tributária, nos termos do n.º 2 do artigo 22.º do RJAT.

 

 

Notifique.

Lisboa, de 20 de Janeiro de 2016

 

 

 

O árbitro,

 

 

(Hélder Filipe Faustino)

 

 

Texto elaborado em computador, nos termos do disposto no n.º 5 do artigo 131.º, do CPC, aplicável por remissão da alínea e) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT. A redacção da presente decisão rege-se pela ortografia anterior ao Acordo Ortográfico de 1990.

 



[1] Cfr. a Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março.

[2] Cfr. decisão arbitral proferida no âmbito do processo n.º 27/2015-T, disponível em www.caad.org.pt.

[3] Cfr. “Direito Fiscal”, 3.ª Edição, Almedina, 2005, pág. 318 por força da decisão arbitral proferida no âmbito do processo n.º 736/2014-T, disponível em www.caad.org.pt.

[4] Cfr. alínea c) do n.º 1 do artigo 120.º do Código do IMI.

[5] Neste sentido, veja-se a decisão arbitral proferida no âmbito do processo n.º 408/2014-T, disponível em www.caad.org.pt.