Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 734/2022-T
Data da decisão: 2023-11-30  IRS  
Valor do pedido: € 84.661,70
Tema: IRS – Mais-valia de alienação de imóveis; encargos com a valorização dos imóveis e despesas com a aquisição e alienação.
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Sumário:

- Para efeitos de determinação das mais-valias de alienação de imóveis, ao valor de aquisição acrescem os encargos com a valorização dos bens e as despesas necessárias e efetivamente praticadas, inerentes à aquisição e alienação, nos termos do artigo 51.º, n.º 1, al. a), do Código do IRS.

- Cabe ao sujeito passivo fazer prova dos encargos suportados e da sua relação intrínseca com o imóvel.

- São dedutíveis os encargos efetivamente suportados que sejam suscetíveis de valorizar os imóveis, excluindo-se as simples despesas de manutenção e conservação, elementos decorativos autónomos e destacáveis do imóvel ou eletrodomésticos.

- As comissões com imobiliárias e as despesas com advogados constituem encargos inerentes à alienação dos imóveis.

 

Os árbitros Prof. Doutor Victor Calvete (árbitro-presidente), Dr. André Festas da Silva (árbitro adjunto), Dr. Amândio Silva (árbitro adjunto e relator), designa­dos pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa para formarem o Tribunal Arbitral Coletivo dos presentes autos, acordam no seguinte:

 

DECISÃO ARBITRAL

 

1. Relatório

 

A..., contribuinte fiscal número..., residente na ..., n.º ..., ..., França e B..., contribuinte fiscal n.º ..., residente em ..., Paris, França, apresentaram pedido de constituição de Tribunal Arbitral em matéria tributária e pedido de pronúncia arbitral, ao abrigo do disposto na alínea a) do artigo 3.º, alínea a) do n.º1 do artigo 2.º e da alínea a) do n.º 1 do artigo 10.º, todos do Decreto-Lei n.º10/2011, de 20 de Janeiro - Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (RJAT), visando a anulação da decisão de indeferimento das reclamações graciosas com os n.ºs de Proc. ...2022... e ...2022... que tinham como objeto as demonstrações de liquidação de IRS n.ºs 2022 ... e 2022 ..., relativas ao período de tributação de 2016, com o valor a pagar de € 142.176,79 (cento e quarenta e dois mil, cento e setenta e seis euros e setenta e nove cêntimos) e de € 147.816,98 (cento e quarenta e sete mil, oitocentos e dezasseis euros e noventa e oito cêntimos), respetivamente.

 

É Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira (AT).

 

2. Como fundamento do pedido, apresentado em 30-11-2022, os Requerentes alegam, em síntese, que o ato tributário que constitui o objeto do presente processo se encontra ferido de ilegalidade, porquanto, não foram consideradas, no cálculo das mais-valias relativas à alienação de dois imóveis, a generalidade dos encargos com a sua valorização, bem como as despesas necessárias e efetivamente praticadas inerentes à aquisição e alienação.

           

2.1 A título prévio, os Requerentes demonstram e fundamentam a tempestividade do pedido de pronúncia arbitral, bem como o cumprimento dos requisitos legais para a coligação de autores e cumulação de pedidos.

2.2 Quanto ao pedido de pronúncia arbitral, no dia 1 de setembro de 2016, o Requerente B... e os seus pais C... e D... adquiriram a plena propriedade do prédio urbano denominado “Loteamento L 9 – Lote 6” (Doc. n.º 8).

2.3 Por escritura pública datada de 4 de fevereiro de 2020, C... doou a B..., ora Requerente, um terço da nua propriedade do aludido prédio, reservando para si e para o seu cônjuge o usufruto; simultaneamente, D... doou a A..., também Requerente, um terço da nua propriedade do prédio acima identificado, reservando para si e para o seu cônjuge o usufruto (Documento n.º 9).

2.4 No dia 30 de novembro de 2020, os Requerentes alienaram o seu direito sobre o prédio (Documento n.º 10), pelo valor total de €1.140.000,05, nos seguintes termos:

a) € 633.327,33, correspondente a 1/3 da propriedade plena e € 253.336,36 da nua propriedade do prédio supra descrito, de que B... era proprietário;

b) € 253.336,36 correspondente a 1/3 da nua propriedade do prédio de que A... era proprietário.

2.5 Além daquele prédio, no dia 3 de março de 2017, a mãe dos ora Requerentes, C..., e o Requerente A..., celebraram contrato de compra e venda (Documento n.º 11) no âmbito do qual adquiriram a plena propriedade do prédio urbano denominado “Loteamento L 9 – Lote 21”, na proporção de 2/3 e 1/3, respetivamente.

2.6 Por escritura pública, datada de 4 de fevereiro de 2020, C... doou a cada um dos Requerentes, respetivamente, um terço da nua propriedade do descrito prédio, reservando para si e para o seu cônjuge o usufruto (Documento n.º 12).

2.7 Por escritura pública, datada de 23 de outubro de 2020 (Documento n.º 13 junto à P.I.), alienaram o seu direito sobre o referido prédio por um valor total de €1.260.000,00, conforme se segue:

a) 700.000,00, correspondente a 1/3 da propriedade plena e € 280,000,00 correspondente a 1/3 da nua propriedade do prédio supra descrito de que A... era proprietário;

b) € 280.000,00, correspondente a 1/3 da nua propriedade do prédio supra descrito, de que B... era proprietário.

2.8 Foram emitidos os atos de liquidação de IRS ora impugnados, em resultado das mais-valias geradas com a venda da propriedade dos dois prédios urbanos.

2.9 Não podem, todavia, os Requerentes conformar-se a desconsideração pela AT da generalidade das despesas e encargos suportados com a alienação dos imóveis.

2.10 Os valores suportados relativamente ao Prédio urbano denominado “Loteamento L 9 – Lote 21” são de €347.300,50, na esfera do Requerente A... e €21.986,25, na esfera do Requerente B..., a saber:

a) €98.400,00 relativos a despesas com honorários de agentes imobiliários – cfr. Documento n.º 16 junto à P.I.;

b) €49.200,00 relativos a despesas adicionais com honorários de agentes imobiliários – cfr. Documento n.º 17 junto à P.I.;

c) €11.531,25 respeitantes a despesas com honorários de advogados – cfr. Documento n.º 18 junto à P.I.;

d) €659.911,49 relativos a custos de construção e despesas conexas com a valorização do imóvel – cfr. Documento n.º 19 junto à P.I.;

e) €19.500,00 relativos a despesas com impostos – valor para o qual os Requerentes não encontram o documento de suporte, mas que estará na posse dos doutos serviços da AT, relativo ao IMT Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis (“IMT”) e Imposto do Selo (“IS”) suportado na aquisição do imóvel.

2.11 Os encargos efetivamente suportados relativamente ao Prédio urbano denominado “Loteamento L 9 – Lote 6” são de €230.333,60, na esfera do Requerente B... e €28.136,25, na esfera do Requerente A..., relativos a:

▪ €129.150,00 relativos a despesas com honorários de agentes imobiliários – cfr. Documento n.º 20 junto à P.I.;

▪ €11.531,25 respeitantes a despesas com honorários de advogados – cfr. Documento n.º 18 junto à P.I.;

▪ €443.506,04 relativos a custos de construção – cfr. Documento n.º 21 junto à P.I.;

▪ €7.468,25 relativos a despesas com impostos – cfr. Documento n.º 6 junto à P.I.;

2.12 Quanto à falta comunicação à matriz invocada na resposta da AT e prevista no artigo 10.º, n.º 6, al. b) do CIRS, os Requerente alegam que só pode ser feita após a emissão de licença de habitabilidade a emitir pela Câmara Municipal, facto alheio aos Requerentes.

2.13 Apenas são considerados os valores que devidamente devem ser imputados aos ora Requerentes, em função das percentagens efetivas de detenção da propriedade dos dois imóveis.

2.14 Da decisão final da reclamação graciosa, conforme decorre dos Documentos n.ºs 1 e 2, a AT desconsiderou a generalidade das despesas e encargos relevantes para efeitos do cálculo das mais-valias imobiliárias, limitando “A consideração de despesas e encargos, no valor de € 58,63, relativamente ao Imóvel ...-U- ..., e de € 7.692,52, relativamente ao Imóvel ...-U-...”.

2.15 Das notificações de decisão final, ambas emitidas pelos serviços à data de 13 de setembro de 2022, e remetendo para o respetivo projeto de decisão, vêm os doutos serviços elencar os seguintes grupos de fundamentos, para efeito de desconsideração das despesas e encargos inerentes à alienação do imóvel:

a) Existência de mera lista de despesas e não cumprimento dos requisitos relativos à emissão de faturas compreendidos no artigo 36.º do Código do IVA e, bem assim, não comprovação pelos Requerentes das despesas e encargos incorridos, nos termos do artigo 74.º da LGT, conforme pontos 46.2 e 48.1;

b) Parte da documentação junta pelos Requerentes encontrar-se emitida em nome da sua mãe C..., conforme ponto 46.3;

c) Não aceitação de despesas em que, no respetivo documento, não conste, inequivocamente, a morada dos imóveis alienados, conforme ponto 46.4, assim como, a não consideração dos encargos com materiais adquiridos para a realização da obra enquanto elegíveis para efeitos de soma ao valor de aquisição, por não ser bastante a comprovação da realização da obra no imóvel alienado, nos termos da Informação Vinculativa n.º 2511/2018, de 2018-8-20224, conforme ponto 47.1;

d) Junção das faturas, no termo utilizado pelos serviços “documentos justificativos”, sem o respetivo recibo e/ou comprovativo de pagamento, conforme ponto 46.5;

e) Conjunto de bens passíveis de destacamento do imóvel, nomeadamente plantas e árvores de fruto, bem como móveis e objetos de decoração, que não podem ser aceites como encargo para a valorização do mesmo, nos termos da alínea a) do número 1 do artigo 51.º do Código do IRS, conforme pontos 47.2 e 47.3;

f) Divergência no preenchimento da expressão “despesas necessárias” e inerente desconsideração de despesas com honorários de advogados, conforme pontos 48 e seguintes.

2.17 Os Requerentes impugnam e fundamentam os argumentos apresentados pela AT, conforme infra se desenvolverá.

2.18 Terminam requerendo o pagamento de juros indemnizatórios, nos termos do artigo 43.º da LGT.

 

3. Em resposta, a Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) pronunciou-se no sentido da improcedência do presente pedido de pronúncia arbitral, considerando dever manter-se na ordem jurídica o ato tributário impugnado e, em conformidade, decidindo-se pela absolvição da entidade requerida, nos seguintes termos:

3.1 Os custos de construção mencionados nos artigos 46.º, 53.º, 86.º e 104.º do pedido arbitral e encargos com a alienação e também com a aquisição e valorização são realidades distintas, tratadas em distintos artigos do CIRS: as despesas e encargos com a aquisição e/ou alienação de imóvel, bem como a respetiva valorização são contempladas pela previsão da já mencionada al. a) do art.º 51.º; os custos de construção são objeto da facti specie do n.º 3 do art. 46.º do mesmo CIRS.

3.2 Acrescenta ainda que, nos termos do artigo 74.º da LGT, era aos Requerentes que competia provar terem suportado as despesas tituladas pelas faturas, bem como o facto de as aquisições de bens ou prestações de serviços mencionadas nas mesmas serem conexas com os imóveis objeto de alienação.

3.3 Relativamente às faturas apresentadas, a Requerida reitera o expresso na decisão relativa à reclamação graciosa apresentada: a AT não aceitou as despesas de construção e/ou valorização dos imóveis alienados, bem como as inerentes à respetiva alienação, por duas ordens de fatores:

1- Não emissão das mesmas com indicação do NIF correspondente ao nome dos ora Requerentes.

2- Não exibição de recibos comprovativos do efetivo pagamento das quantias naquelas mencionadas.

3.4 As faturas cujas cópias foram apresentadas em anexo ao pedido arbitral sob os documentos números 19 e 21 encontram-se emitidas com indicação do NIF..., pertencente à Sra. D. C..., em cujo nome (em muitos casos, abreviado) se encontram emitidas. Sendo que as indicadas pelos Requerentes sob os números 23 e 28 na lista referente ao lote 6 (emitidas por vente-privee.com) nenhum NIF sequer consta. Por conseguinte, são insuscetíveis de utilizar como elementos comprovativos de despesas suportadas pelos Requerentes faturas emitidas em nome de terceiros, com indicação do correspondente NIF, obviamente, diferente dos números de identificação fiscal dos ora Requerentes.

3.5 Quanto às faturas não acompanhadas pelo recebido comprovativo do efetivo pagamento, alega a Requerida que o recibo constitui o documento comprovativo de que os clientes (no caso, os ora Requerentes) pagaram a totalidade ou uma parte, se tal tiver sido convencionado, dos produtos adquiridos ou serviços contratados. Ora, competindo aos Requerentes efetuar a prova cabal e inequívoca que os valores constantes das faturas cujas cópias anexaram ao requerimento foi efetivamente pago às entidades que as emitiram, a simples junção de cópias de faturas não basta para comprovar.

3.6 Relativamente às faturas-recibo apresentadas pelos Requerentes sob os números 4 a 7, 21, 54 e 60 da lista relativa ao lote 6 e 11, 14, 19, 22, 27, 35 e 36 da referente ao lote 21, bem como a fatura n.º 27 da lista concernente ao lote 6 e as faturas 44 e 46 da mesma lista, conforme infra se desenvolverá, a Requerida justifica a não aceitação das mesmas nos artigos 11.º a 137.º da Resposta, com os seguintes fundamentos:

a) todas as faturas estão emitidas em nome de C..., ou C..., com indicação do respetivo NIF.

b) as faturas emitidas por E..., Lda. (n.º 27) e F... (n.º 45) indicam como local de descarga o lote ..., ... (Alcácer do Sal) ... –... Comporta. Ora, os imóveis cujas quotas-partes os Requerentes alienaram situam-se na freguesia de ..., concelho de Grândola, local diferente do “local de descarga” que consta das faturas.

c) nas faturas emitidas por Stork-Club não consta qualquer referência quer a local de entrega ou descarga (apenas se indicando “instalações do cliente”, quer, tão pouco, a qualquer morada da cliente nelas identificada (a Sra. D. C...). Acresce que se reportam a desenhos a tinta da China (elemento decorativo) ou cadeiras em ferro e madeira.

d) A alegação prevista no artigo 109.º, relativa ao extravio não foi provada.

e) Os elementos decorativos, bem como as almofadas, cadeiras, eletrodomésticos, espelhos, utensílios de cozinha, etc., são coisas que, ainda que instaladas no imóvel, dele não fazem parte, pelo que não aumentam o seu valor intrínseco.

f) Não consta das escrituras públicas a venda dos imóveis com o recheio.

g) As faturas identificadas nos artigos 183.º, 185.º, 187.º, 190.º, 191.º, 192.º da resposta não foram aceites porque não cumpre o requisito previsto na al. b) do n.º 5 do artigo 36.º, além de estarem emitidas em nome abreviado da Sra. D.ª C... .

3.7 Relativamente à prestação de serviços de advogados, as faturas relativas ao documento n.º 18, são emitidas em nome da Dra. C... e não vêm acompanhadas do respetivo recibo; duas delas emitidas pela sociedade G...– Sociedade de Advogados têm a menção genérica de serviços jurídicos, pelo que é absolutamente impossível estabelecer uma ligação entre os serviços e a questão controvertida. A fatura emitida H...– Sociedade de Advogados, SP, RL também não concretiza em que consistiram os serviços prestados.

Reitera ainda o entendimento da AT de que as despesas com advogados não são necessárias e inerentes à aquisição e alienação dos imóveis.

3.8 Quanto às despesas relativas à mediação imobiliária, as faturas emitidas por I..., Lda., não foram aceites porque (i) nenhuma escritura relativa à alienação do lote 21 (artigo ...; anterior ...) foi junta ao requerimento, para que se possa certificar a intervenção da sociedade mediadora na transação em causa; (ii) Uma das faturas não foi emitida em nome de qualquer dos Requerentes; e (iii) nem uma nem outra foram acompanhadas do correspondente recibo.

Quanto às faturas emitidas por J..., Lda., nenhuma delas foi emitida em nome de qualquer dos Requerentes e também ambas não foram acompanhadas dos respetivos recibos.

3.9 As despesas com imposto foram consideradas na sua totalidade (€ 19.002,74, resultantes da soma de € 7.751,15 pagos em impostos pelo Requerente B... aos € 11.251,59 pagos pelo seu congénere A...) para os efeitos previstos na al. a) do nº 1 do art. 51º do CIRS.

3.10 Conclui, por fim, que não se mostra verificado o preenchimento do requisito que exige a existência de um erro na liquidação imputável aos serviços, pois não

se descortinou ter sido cometida qualquer ilegalidade, não sendo devidos juros indemnizatórios.

 

4. O pedido de constituição do tribunal arbitral, apresentado em 30-11-2022, foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD e automaticamente notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira.

 

5. Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20/01, com a redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31/12, o Conselho Deontológico designou os árbitros do Tribunal Arbitral, que comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável.

 

6. Devidamente notificadas dessa designação, as partes não manifestaram vontade de recusar a designação dos árbitros nos termos conjugados do artigo 11.º, n.º 1, alíneas a) e b) do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico. Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, com a redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31/12, o tribunal arbitral foi constituído em 06-02-2023.

 

7. Por subsequente nomeação do Presidente do Tribunal Arbitral para funções incompatíveis com as arbitrais, por despacho de 17 de Março de 2023 do Presidente do Conselho Deontológico do CAAD foi determinada a sua substituição pelo Prof. Doutor Victor Calvete, não tendo as partes suscitado qualquer objeção. 

 

8. Por despacho de 27 de Abril de 2023 do Presidente do Conselho Deontológico do CAAD, face à renúncia às funções arbitrais do árbitro adjunto Prof. Doutor Leonardo Marques dos Santos, foi determinada a sua substituição pelo Dr. Amândio Silva, não tendo as partes suscitado qualquer objeção. 

 

9. As partes, devidamente representadas, gozam de personalidade e capacidade judiciárias e têm legitimidade (artigos. 4.º e 10.º, n.º 2, do RJAT, e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22/03).

 

10. Atento o conhecimento que decorre das peças processuais juntas pelas Partes, que julgou suficiente para a decisão, o Tribunal, por a “posição das partes estar plenamente definida nos Autos e suportada pelos meios de prova documental juntos”, por despacho de 01-11-2021, decidiu dispensar a reunião a que se refere o artigo 18.º do referido Regime, tendo as partes apresentado alegações finais.

 

11. Foi indicada como data limite para prolação da decisão arbitral o dia 06-12-2023.

 

II. Matéria de facto

12. Com relevância para a apreciação da questão suscitada, destacam-se os seguintes elementos factuais, que, com base no acervo documental junto aos autos, mormente o processo administrativo e documentos que o integram, se consideram provados:

 

12.1 No dia 30 de novembro de 2020, os Requerentes alienaram os seus direitos sobre o prédio urbano, denominado “...”, sito em..., ..., ..., freguesia do ..., concelho de Grândola, composto por edifício de um piso, destinado a habitação, com logradouro, pérgulas e piscina, inscrito na respetiva matriz sob o artigo ..., e descrito na competente conservatória do registo predial sob o número ..., da referida freguesia, nos seguintes termos:

- O Requerente B... alienou, por €633.327,33, 1/3 da propriedade plena e, por €253.336,36, 1/3 da nua propriedade;

- O Requerente A... alineou, por €253.336,36, 1/3 da nua propriedade.

 

12.2 No dia 23 de outubro de 2020, os ora Requerentes alienaram os seus direitos sobre o prédio urbano, denominado “...”, sito em ..., ..., freguesia do ..., concelho de Grândola, composto por casa de habitação com um piso e logradouro, inscrito na respetiva matriz sob o artigo ..., e descrito na competente conservatória do registo predial sob o número..., da referida freguesia, nos seguintes termos:

- O Requerente A... alienou, por €700.000,00, 1/3 da propriedade plena e, por € 280.000,00, 1/3 da nua propriedade do prédio.

- O Requerente B... alineou, por €280.000,00, 1/3 da nua propriedade do prédio.

 

12.3 Em 3 de junho de 2021, o Requerente B... procedeu à entrega, em seu nome, de uma declaração modelo 3 relativa ao ano de 2020, a qual foi acompanhada do anexo G, da qual resultou a liquidação de IRS n.º 2021 ... e apurado o montante de imposto a pagar de € 252.748,92.

 

12.4 Em 22 de novembro de 2021, a AT procedeu à liquidação oficiosa n.º 2021..., apurando o montante de imposto a pagar de € 296.253, à qual acrescia o montante de € 691,29 de juros compensatórios, no valor total a pagar de € 296.944,29.

 

12.5 O Requerente B... apresentou reclamação graciosa contra aquela liquidação, sobre a qual recaiu despacho de deferimento parcial, proferido pelo Diretor de Finanças Adjunto da Direção de Finanças de Lisboa em 12-09-2022.

 

12.6 Com relevância para o presente processo, do deferimento parcial resultou a dedução de despesas e encargos com a valorização ou com a aquisição/alienação das quotas-partes que alienou do imóvel inscrito na matriz predial urbana da freguesia do..., concelho de Grândola, sob o artigo..., no montante de € 3.846,24 e de € 29,32 relativamente à quota-parte que alienou do imóvel inscrito na mesma matriz predial sob o artigo ... .

 

12.7 Com base no deferimento parcial da reclamação graciosa, foi efetuada em 18-11-2022, em nome do Requerente B..., a liquidação de IRS no 2022..., no âmbito da qual foi apurado o montante de imposto a pagar de € 142.176,79.

 

12.8 Em 2021-06-30, o Requerente A... procedeu à entrega da declaração modelo 3 relativa ao ano de 2020. A liquidação da declaração foi efetuada em 05-07-2021 com o n.º 2021..., tendo apurado o montante de imposto a pagar de € 215.695,02.

 

12.9 A AT procedeu à liquidação oficiosa n.º 2021..., na qual foi apurado o montante de imposto a pagar de € 306.713,29, à qual acresceu o montante de € 1.446,31 de juros compensatórios, no montante total a pagar de € 308.159,60.

 

12.10 O ora Requerente A... apresentou reclamação graciosa contra a liquidação 2021..., identificada com o n.º ...2022..., sobre a qual recaiu despacho de deferimento parcial proferido pelo Diretor de Finanças Adjunto da Direção de Finanças de Lisboa, em 2022-09-12.

 

12.11 Com relevância para o presente processo, do deferimento parcial da reclamação graciosa resultou a aceitação da dedução de despesas e encargos com a valorização, ou com a aquisição/alienação das quotas-partes que alienou do imóvel inscrito na matriz predial urbana da freguesia do ..., concelho de Grândola sob o artigo ... no montante de € 5.504,32 e de € 121,48 relativamente à quota-parte que alienou do imóvel inscrito na mesma matriz predial sob o artigo ... .

 

12.12 Em conformidade, foi o Requerente A... notificado da liquidação de IRS no 2022..., no âmbito da qual foi apurado o montante de imposto a pagar de € 147.816,98.

 

12.13 Das liquidações efetuadas, apresentaram os Requerentes o presente pedido arbitral.

 

13. A matéria de facto dada como provada assenta na prova documental apresentada, designadamente a constante do processo administrativo junto pela Requerida.

 

14. Não existem factos relevantes para a decisão que não se tenham provado.

 

III. Matéria de direito

 

No pedido de pronúncia arbitral, os Requerentes submetem à apreciação deste tribunal a legalidade dos atos de liquidação de IRS do ano de 2020, solicitando, consequentemente, a declaração de ilegalidade desse ato, na parte que diz respeito à não consideração no cálculo da mais-valia dos imóveis dos encargos com a valorização dos imóveis, bem como as despesas relativas à aquisição e alienação do imóvel.

 

Para devido enquadramento das despesas apresentadas, analisemos o enquadramento jurídico da tributação das mais-valias relativas à alienação de bens imóveis.

 

  1. Tributação das mais-valias relativas à alienação de bens imóveis

 

Nos termos do artigo 10.º do Código do IRS, na versão então vigente:

 

“1 – Constituem mais-valias os ganhos obtidos que, não sendo considerados rendimentos empresarias e profissionais, de capitais ou prediais, resultem de:

a) Alienação onerosa de direitos reais sobre bens imóveis e afetação de quaisquer bens do património particular a atividade empresarial e profissional exercida em nome individual pelo seu proprietário;

(…)

3 – Os ganhos consideram-se obtidos no momento da prática dos atos previstos no n.º 1, sem prejuízo do disposto nas alíneas seguintes:

(…)

4 – O ganho sujeito a IRS é constituído:

a) Pela diferença entre o valor de realização e o valor de aquisição, líquidos da parte qualificada como rendimento de capitais, sendo caso disso, nos casos previstos nas alíneas a), b) e c) do n.º 1;

(…)”

 

Simultaneamente, dispunha o artigo 43.º, sobre o conceito de mais-valias que:

 

1 – O valor dos rendimentos qualificados como mais-valias é o correspondente ao saldo apurado entre as mais-valias e as menos-valias realizadas no mesmo ano, determinadas nos termos dos artigos seguintes.

2 – O saldo referido no número anterior, respeitante às transmissões efetuadas por residentes previstas nas alíneas a), c) e d) do n.º 1 do artigo 10º, positivo ou negativo, é apenas considerado em 50% do seu valor. (…)”

 

Acrescentava ainda o artigo 51.º que, para o cálculo das mais-valias, acrescem ao valor de aquisição as despesas e encargos tidos com a valorização dos imóveis e com a aquisição e venda dos mesmos, nos seguintes termos:

Artigo 51.º

Despesas e encargos

1 - Para a determinação das mais-valias sujeitas a imposto, ao valor de aquisição acrescem:

  1. Os encargos com a valorização dos bens, comprovadamente realizados nos últimos 12 anos, e as despesas necessárias e efetivamente praticadas, inerentes à aquisição e alienação, bem como a indemnização comprovadamente paga pela renúncia onerosa a posições contratuais ou outros direitos inerentes a contratos relativos a esses bens, nas situações previstas na alínea a) do n.º 1 do artigo 10.º;(...).”

 

Os conceitos de “encargos com a valorização dos bens” e “despesas necessárias e efetivamente praticadas” é o cerne do presente processo e carecem de concretização em cada situação concreta, sem prejuízo de uma maior definição do seu sentido e âmbito.

 

Como refere o Acórdão do STA, 0585/09 de 18.11.2009, “(…) Este conceito de «encargos com a valorização dos bens» encerra alguma margem de indeterminação e necessita de ser preenchido.”

 

Neste sentido, a Prof.ª Paula Rosado Pereira considera que “Nas situações previstas no artigo 10.º, n.º 1, alínea a) do CIRS, a dedução de despesas e encargos, para efeitos do cálculo das mais-valias tributáveis, é efetuada mediante uma técnica de acréscimo, ao valor de aquisição do bem imóvel objeto de alienação onerosa (ou de quaisquer bens do património particular que sejam afetos a atividade empresarial e profissional exercida em nome individual pelo seu proprietário). O acréscimo, nos termos do artigo 51º, n.º 1, alínea a) do CIRS, pode corresponder a:

i) Encargos com a valorização do bem, comprovadamente realizados nos últimos 12 anos. Estão aqui em causa encargos intrinsecamente ligados ao bem alienado, conducentes a uma valorização, quer material ou física, quer económica, do mesmo. Carecem de relevância os encargos destinados à mera preservação do valor do bem, e não à sua valorização. Estas questões são abordadas com maior detalhe infra.

ii) Despesas necessárias e efetivamente praticadas, inerentes à aquisição e alienação dos bens em causa;

iii) Indemnização comprovadamente paga pela renúncia onerosa a posições contratuais ou outros direitos inerentes a contratos relativos a esses bens.              

Em termos gerais – uma vez que o cálculo da mais-valia tributável assenta na diferença entre o valor de realização e o valor de aquisição (cfr. artigo 10.º, n.º 4, alínea a) do CIRS) –, o acréscimo, ao valor de aquisição do imóvel, dos encargos e das despesas suportados pelo sujeito passivo para obter o rendimento em causa, tem como efeito uma redução do valor da mais-valia sujeita a IRS.”

(PAULA ROSADO PEREIRA, Manual de IRS, 2.ª Edição, Almedina, 2019, p. 247).

 

A Prof.ª Paula Rosado Pereira apresenta ainda, para melhor compreensão, um conjunto de exemplos que constituem encargos com a valorização dos bens, a saber:

 

Uma situação bastante comum de encargos com a valorização de bens imóveis alienados prende-se com a realização de obras pelo proprietário do imóvel, nos últimos 12 anos, relativamente às quais se encontre devidamente comprovado o encargo.

Desde que as aludidas obras originem uma melhoria ou valorização do imóvel, enquadram-se na previsão do artigo 51.º, n.º 1, alínea a) do CIRS e, portanto, acrescem ao valor de aquisição do imóvel alienado (o mesmo é dizer, deduzem-se para efeitos do cálculo da mais-valia sujeita a IRS), se o encargo estiver devidamente comprovado e tiver ocorrido nos últimos 12 anos. Importa notar que é necessária não apenas a comprovação de que o encargo foi efetivamente suportado pelo vendedor, mas também a comprovação da efetiva ligação do encargo com a valorização do imóvel alienado.

Outra questão frequentemente discutida prende-se com o conceito de valorização do imóvel a adotar, o qual condiciona a dedutibilidade fiscal ou não dos encargos que lhe estão subjacentes. A este propósito, a jurisprudência já sustentou que “a alínea a) do artigo 51.º do CIRS não restringe os encargos com a valorização dos bens, comprovadamente realizados nos últimos cinco anos [atualmente, doze], às valorizações materiais ou físicas daqueles, antes abrangendo também os encargos efetivamente suportados que os valorizem economicamente” (In Acórdão do STA, de 21 de março de 2012, proferido no Processo no 0587/11).

Quanto às despesas necessárias e inerentes à aquisição / alienação de direitos reais sobre bens imóveis, é entendimento consolidado que são dedutíveis, para efeitos do cálculo da mais-valia tributável, o IMT suportado aquando da aquisição do imóvel ora alienado e, ainda, os encargos notariais e de registo predial incorridos.

Também são tidas como despesas necessárias à alienação e, portanto, contribuem para a redução do valor da mais-valia, as despesas com a mediação imobiliária eventualmente incorridas para efeitos da alienação do imóvel, desde que devidamente comprovadas. A comprovação requerida deve abarcar o efetivo pagamento das despesas pelo proprietário do imóvel e, ainda, a conexão destas com o imóvel alienado / intervenção do mediador imobiliário na alienação em causa.

São, ainda, aceites, para efeitos do cálculo da mais-valia tributável, as despesas incorridas pelo proprietário do imóvel com a solicitação do certificado energético. Esta despesa releva desde que, simultaneamente, se encontre comprovada através do recibo de pagamento e o certificado demonstre inequivocamente a sua conexão com o imóvel alienado. A partir de 2009, a compra e venda de um imóvel obriga o respetivo proprietário à obtenção de um certificado energético, o que contribuiu para vulgarizar bastante este tipo de despesa.” (Idem, pp. 248-249).

 

Sobre a matéria, também o Prof. José Guilherme Xavier de Bastos manifesta expressamente a sua discordância com o entendimento da AT de que só devam ser considerados os encargos que “dizem respeito à valorização do próprio imóvel” (obras de beneficiação, por exemplo).

 

A resistência radica, por um lado, em não vermos na lei qualquer apoio a restringir a relevância dos encargos com a valorização dos bens comprovadamente realizados nos últimos cinco anos aos encargos com a valorização física ou material, com exclusão de todos os outros. A lei não faz qualquer distinção, limitando-se a referir os “encargos com a valorização dos bens”. Há-de tratar-se, pois, de despesas que contribuem e são dirigidas, não meramente a comprovar o valor do bem, mas a aumentar o seu valor. Não são as simples despesas de manutenção e conservação que são elegíveis para esse efeito. Só as que “valorizam” o bem estão em causa. De entre estas, porém, a lei não parece autorizar distinções”.

(...)

No que respeita aos encargos inerentes à aquisição e alienação, a lei usa a fórmula despesas “necessárias”, a qual tem alguma margem de indeterminação, incluindo certamente os “custos burocráticos” e fiscais da operação...”.

JOSÉ GUILHERME XAVIER DE BASTOS, Incidência real e determinação dos rendimentos líquidos, Coimbra Editora, Coimbra, 2007, pp. 460 a 462.

 

Sobre este conceito de “encargos com a valorização dos bens”, o STA tem considerado que:

 

«I – A al. a) do art. 51.º do CIRS não restringe os encargos com a valorização dos bens, comprovadamente realizados nos últimos cinco anos [atualmente, 12 anos], às valorizações materiais ou físicas daqueles, antes abrangendo também os encargos efectivamente suportados que os valorizem economicamente.”

(Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 21.03.2012, proferido no processo n.º 0587/11)

 

“II – O qualificativo "inerente", logo etimologicamente – in re – contem, a se, uma ideia de inseparabilidade, uma relação intrínseca – que não meramente extrínseca – com a alienação: para ser considerada relevante, a despesa há-de sê-lo pela sua posição relativamente à alienação, há-de, em suma, ser dela indissociável.” (Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 18.11.2009, proferido no processo n.º 0585/09)

 

Também relevante para o presente processo é o ónus da prova das despesas e encargos efetivamente realizados.

 

O n.º 1 do artigo 128.º do Código do IRS determina que as pessoas sujeitas a IRS devem apresentar os documentos comprovativos dos rendimentos auferidos, das deduções e de outros factos ou situações mencionadas na respetiva declaração, quando a autoridade tributária e aduaneira os exija. No seu n.º 4 concretiza-se que o extravio dos documentos referidos no n.º 1 por motivo não imputável ao sujeito passivo não o impede de utilizar outros elementos de prova daqueles factos.

 

Forçoso será pois concluir que, no caso específico do 51.º do CIRS, o legislador não procedeu a qualquer densificação sobre qual ou quais os meios ou os elementos de prova suscetíveis de comprovar as despesas e os encargos de valorização.

 

Neste mesmo sentido, anote-se o acordado pelo Supremo Tribunal Administrativo, no âmbito do processo n.º 01254/04, de 20.04.2005, segundo o qual a “lei não estipula um regime de prova vinculada. Pelo contrário, nesta matéria, o n.º 3 do art.º 128º, do CIRS aponta até em sentido diverso”.

 

O ónus da prova dos encargos e despesas cabe ao sujeito passivo, nos termos do artigo 74.º da LGT.

 

Neste sentido, considerou o STA que “A essência do critério de repartição do ónus da prova, como previsto no artigo 342.º do Código Civil, é também adoptado no procedimento e processo tributário, nos termos do disposto no artigo 74.º, n.º 1, da LGT, aí se estabelecendo que “O ónus da prova dos factos constitutivos dos direitos da administração tributária ou dos contribuintes recai sobre quem os invoque.”, sendo que é à luz destas regras que se forma a convicção e o julgamento de que é sobre o sujeito passivo que pretende que para a determinação das mais valias sejam considerados os encargos e despesas por si tidas nos 5 anos antecedentes da venda do imóvel, que impende a realização dessa prova.”

 

Em conformidade, caberá aos Requerentes apresentar e comprovar as despesas ou encargos que tiveram com os imóveis. Esta prova exige um duplo exercício: apresentar não só as evidências documentais relativas aos gastos efetivamente suportados, mas demonstrar que estes encargos estão “intrinsecamente ligados”[1] aos bens alienados.

 

Face ao enquadramento doutrinário e jurisprudencial apresentado, cabe aferir se, com a ampla liberdade de prova admitida, os Requerentes fizeram prova dos encargos e despesas feitos nos imóveis objeto de alineação melhor identificados supra.

 

  1. Documentos em que consta o nome de outro comproprietário

 

Alegam os Requerentes que, conforme expresso no ponto 46.3 da resposta da Autoridade Tributária à reclamação graciosa apresentada pelos Requerentes, não foi aceite a dedução dos encargos relativos a documentos que se encontram emitidos em nome de outros comproprietários (os Requerentes não pretendem deduzir a totalidade dos gastos mas apenas pretendem que os valores sejam imputados em função das percentagens efetivas de detenção da propriedade dos imóveis).

 

Alegam ainda que tais despesas foram deduzidas na esfera de dois dos comproprietários na proporção da sua detenção efetiva do imóvel, pelo que a não aceitação do restante para os ora Requerentes configura uma situação de enriquecimento sem causa na esfera da AT.

 

Em resposta, a Requerida considera que todos os documentos fiscalmente relevantes têm de ser emitidos contendo o número fiscal correspondente a cada sujeito passivo para que possam ser considerados em sede de liquidação do imposto por cada um destes devido. Isso mesmo ressalta, alega, por analogia, com o disposto nas das alíneas a) e b) do no 6 do art. 78.º do CIRS, que vem exigir a identificação dos sujeitos passivos (ou membros do respetivo agregado familiar) através do correspondente número de identificação fiscal (NIF) para efeitos de dedução à coleta de um determinado conjunto de despesas.

 

Na defesa da consideração destas despesas, alegam os Requerentes que, atendendo a que o imóvel foi adquirido em compropriedade, é natural que na relação com os fornecedores, a faturação seja emitida em nome de um só sujeito passivo.

 

Parece-nos ser de considerar, verificados os demais requisitos legais, estas despesas porque tal resulta do regime da compropriedade e, conforme supra referido, o legislador não estabeleceu requisitos específicos para a respetiva provas.

 

Num regime de compropriedade, determina o n.º 1 do artigo 1405.º do Código Civil que “Os comproprietários exercem, em conjunto, todos os direitos que pertencem ao proprietário singular; separadamente, participam nas vantagens e encargos da coisa, em proporção das suas quotas e nos termos dos artigos seguintes.”(nosso sublinhado).

 

Ou seja, decorre do regime jurídico da compropriedade que cada comproprietário participa nos encargos do imóvel na proporção das suas quotas. Ainda que o pagamento seja feito por um dos comproprietários, tal cria um direito de regresso relativamente aos demais comproprietários.

 

Assim, para efeitos de prova dos encargos relevantes para efeitos fiscais, se os comproprietários apresentam uma despesa cujo documento é titulado por um dos comproprietários, tal despesa deverá ser reconhecida na proporção da respetiva quota-parte na sua esfera, porque tal resulta do regime jurídico da compropriedade que lhe está subjacente.

 

  1. Não apresentação dos recibos ou comprovativos de pagamento

 

Relativamente à não junção de recibos ou comprovativos de pagamento (ponto 46.5 dos Documentos n.º 1 e n.º 2) alegam os Requerentes que, a respeito do artigo 74.º da LGT e do ónus da prova da efetiva realização das despesas e demais encargos, a “lei não estipula para efeitos de comprovação dos elementos declarados em sede de IRS, no âmbito do artigo 128.º (...) qualquer regime de prova vinculada”.

 

Neste sentido, dispõe o n.º 1 do artigo 128.º do Código do IRS, sob a epígrafe “Obrigação de comprovar os elementos das declarações” que “as pessoas sujeitas a IRS devem apresentar no prazo de 15 dias, os documentos comprovativos dos rendimentos auferidos, das deduções e de outros factos ou situações mencionadas na respetiva declaração, quando a Autoridade Tributária e Aduaneira os exija”. Mais, no n.º 4 do mesmo artigo prevê-se que “o extravio dos documentos referidos no n.º 1 por motivo não imputável ao sujeito passivo não o impede de utilizar outros elementos de prova daqueles factos”.

 

Para a sua defesa, invocam o entendimento do Advogado-Geral Sir Sir Gordan Slynn, “(...) uma fatura que preencha as condições constitui o título de acesso ao direito à dedução, sob reserva da administração fiscal vir a demonstrar posteriormente que é falsa; se a fatura não preenche as condições, pode acontecer que o sujeito passivo esteja em condições de provar a existência da transação e que o seu fornecedor tenha declarado o imposto pago a montante, mas se a fatura está incompleta num aspeto essencial, cabe ao sujeito passivo fazer prova do seu direito à dedução.” (Cfr. Acórdão de 14 de julho de 1988, Lea Jeunehomme e EGI, C-123 e 130/87).

 

Também cita o entendimento presente na Decisão do CAAD, proferida no âmbito do processo n.º 191/2021-T, “O mesmo se diga da necessidade de demonstrar documentalmente o seu efectivo pagamento, seja por recibos ou extractos bancários, por exemplo. A lei, da leitura que dela fazemos, não o exige nestes precisos termos. Não resulta do preceito aplicável que o contribuinte faça forçosa prova de ter pago as facturas que lhe são dirigidas. Uma vez mais é útil reportarmo-nos a um ambiente de normalidade, de razoabilidade. É normal e razoável que o sujeito passivo para demonstrar custos de construção que alegadamente suportou exiba grande número de facturas que nunca pagou? É normal e razoável que uma habitação seja construída por alguém que não pagou a construção, apesar de esta lhe ter sido facturada? Não, não é normal nem razoável.”

 

A Requerida contrapõe que, no universo juscivilístico português existe a figura da quitação, sendo um direito de quem cumpre uma obrigação exigir a respetiva quitação, nos termos prescritos no artigo 787.º do Código Civil, a qual, nos contratos de natureza pecuniária, é geralmente conferida através da emissão de recibo.

 

O recibo constitui o documento comprovativo de que os clientes (no caso, os ora Requerentes) pagaram a totalidade ou uma parte, se tal tiver sido convencionado, dos produtos adquiridos ou serviços contratados.

 

Por sua vez, uma fatura é um documento que atesta uma transação comercial entre duas pessoas (individuais e/ou coletivas) que deve conter informação sobre o produto transmitido ou o serviço prestado, bem como a quantidade e o valor desta transação ou prestação.

 

O recibo e a fatura constituem, por isso, realidades documentais distintas.

 

Cita, neste contexto, o Acórdão proferido em 2018-10-11 - processo no 02773/11.6BEPRT 0501/18:

Deve considerar-se que existiu pagamento efetivo da despesa cuja elegibilidade é questionada, se a mesma se mostrar comprovada pela emissão, no período elegível, da respetiva fatura, do cheque para pagamento da mesma e do correspondente recibo de quitação.”

(...)

Por outro lado, quando a lei exige ainda que essa despesa para além de realizada esteja “paga” quer dizer que a respetiva obrigação esteja cumprida. Como o cumprimento se presume com a quitação (artigo 786.º, 1, do Código Civil), a prova do cumprimento da obrigação é feita através do recibo de quitação. Daí que para efeitos contabilísticos a despesa seja justificada com dois documentos: a fatura e o recibo ou documento de quitação. A nosso ver, para efeitos de elegibilidade da despesa é quanto basta: que a despesa tenha ocorrido no período elegível e nesse período o credor tenha emitido o recibo de quitação.”

 

Refere ainda que era aos Requerentes que competia, nos termos do artigo 74.º, n.º 1, da LGT, efetuar a prova cabal e inequívoca que os valores constantes das faturas cujas cópias anexaram ao requerimento foi efetivamente pago às entidades que as emitiram.

 

Considera ainda que, mesmo tratando-se de faturas-recibo, estas são insuscetíveis de ser utilizadas como elemento suscetível de demonstrar ter o efetivo pagamento das quantias nelas mencionadas sido suportado pelos ora Requerentes, por estarem emitidas em nome de terceiras pessoas e o local de descarga que consta das faturas não ser a morada dos imóveis

 

Ora, face às regras relativas ao ónus da prova, é pacífico na doutrina e jurisprudência citadas pelas partes e também no enquadramento supra descrito, que cabe aos Requerentes comprovar os “encargos efetivamente realizados” e as “despesas efetivamente necessárias e efetivamente praticadas”.

 

Para tal, o CIRS – contrariamente ao que acontece, nos termos do artigo 23.º, n.ºs 4 a 6, do CIRC para as pessoas coletivas residentes que exercem a título principal uma atividade comercial, industrial ou agrícola - não define quais os elementos de prova que devem suportar a comprovação dos encargos e despesas.

 

Não há, por outro lado, qualquer remissão para os requisitos previstos no Código do IVA para as faturas mas tão só que “as pessoas sujeitas a IRS devem apresentar os documentos comprovativos dos rendimentos auferidos, das deduções e de outros factos ou situações mencionadas na respetiva declaração, quando a autoridade tributária e aduaneira os exija” (artigo 128.º, n.º 1 do CIRS).

 

Neste sentido, veja-se o processo do CAAD n.º 416/2020-T, de 2021-09-24: “A sua comprovação pode ser efetuada por qualquer meio de prova ao seu alcance. Este entendimento, vai ainda de encontro ao sufragado pelos Acórdãos do TCA Norte de 04-05-2017, proferido no processo nº. 00314/06.6BEBRG e de 29-3-2012, proferido no processo nº. 00011/04.7BEMDL e Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, processo n.º 00926/08.3BEBRG, de 25 de março de 2021, todos alinhados com o entendimento que vinha sido seguido pelo Supremo Tribunal Administrativo.”

 

Tendo a AT solicitado a prova dos gastos deduzidos no cálculo da mais-valia, os Requerentes apresentaram, conforme exige o artigo 74.º, os elementos de prova que entenderam e ao seu alcance.

 

O ónus da prova obedece ao princípio da proporcionalidade, pelo que os elementos de prova exigidos aos Requerentes serão apenas aqueles que estejam ao seu alcance e criem no tribunal a presunção de veracidade exigível na produção de prova.

 

Quanto à questão concreta do pagamento, conforme alega a Requerida, a apresentação das faturas, per si, não prova que os Requerentes efetivamente suportaram aquelas despesas e encargos mas constitui, diga-se, uma forte presunção que aqueles serviços ou bens foram prestados e, consequentemente, pagos, segundo o normal funcionamento do comércio jurídico.

Deverá, ainda assim, ser complementado por outros elementos de prova que confirmem o pagamento ou a efetivação das operações, nomeadamente recibos (documento que legalmente comprova o pagamento), comprovativo de pagamento bancário, apresentação de prova documental visual ou testemunhal dos serviços, etc., de forma a que o tribunal forme uma convicção sobre a sua veracidade.

 

  1. Ligação entre o custo de construção ou a despesa de valorização e o imóvel objeto de alienação.

 

A Requerida alega ainda que existem inúmeras faturas que se reportam a aquisição de bens (de jardinagem e outros) alegadamente a ser implantados nos imóveis mas em que não é feita prova dessa conexão.

 

Embora os Requerentes tenham junto, sob os documentos 22 e 23, um conjunto de fotos de várias fases da intervenção nos imóveis cujas quotas-partes alienaram, a verdade é que estas apenas demonstram ter sido realizada essa mesma intervenção. Delas não se retira a conclusão de que determinados bens constantes das faturas que não contêm qualquer indicação sobre o local de descarga ou entrega dos bens nelas referidos foram efetivamente colocados, empregues ou aplicados num daqueles imóveis ou que os trabalhos, tarefas ou atividades em que se consubstanciaram os serviços descritos em faturas sem indicação do local de prestação dos mesmos tenham, efetivamente, tido lugar nos sobreditos imóveis.

 

É o caso das muitas faturas cujas cópias juntaram, emitidas por K..., Lda., em que a descrição dos serviços prestados se reconduz a “execução de trabalhos de construção civil na vossa moradia no..., ..., segundo auto de medição no...” (em que se refere um número) ou concluindo apenas – fatura no 9 da lista relativa ao lote 6 “- segundo autos de medição”. Ora, junto ao pedido arbitral não consta qualquer elemento ou documento relativo a qualquer auto de medição.

 

Sobre esta matéria, é clara a doutrina e jurisprudência quando dizem deve ser comprovado que os encargos foram efetivamente suportados com a valorização daquele imóvel específico. Caberá, para cada um dos encargos, avaliar toda a prova apresentada e de acordo com as regras da experiência, avaliar se foi demonstrada a ligação ao bem alineado.

 

  1. Dedução dos encargos com bens móveis (objetos de decoração, eletrodomésticos, utensílios de cozinha)

 

Em defesa da dedução destes encargos, os Requerentes alegam que se trata de despesas que valorizaram o imóvel e que, atentos ao princípio de tributação do rendimento real e capacidade contributiva, devem ser atendidos no cálculo da mais-valia ou menos-valia.

 

Acrescentam ainda que ambos os imóveis foram alienados com o respetivo recheio, sendo por isso, evidente que estes objetos constituem uma condição necessária e inerente à valoração do imóvel, sendo indissociáveis do imóvel.

 

Em sentido contrário, a Requerida considera que estamos perante coisa móveis, no sentido previsto nos artigos 204.º e 205.º do Código Civil, que permitem melhorar as condições de utilização do imóvel, mas não se incorporam nele (ou, se incorporadas, são passíveis de fácil separação), o que não aumenta o seu valor intrínseco. Não o fazendo, não farão acrescer o seu valor económico.

 

Quanto à venda dos imóveis com o recheio, o teor da escritura relativa à alienação das quotas-partes detidas pelos Requerentes no imóvel inscrito na matriz predial urbana da freguesia do ..., concelho de Grândola sob o artigo ... que estes anexaram ao pedido arbitral sob o doc. no 10 – e nada anexaram relativamente ao inscrito na mesma matriz sob o artigo ... (ex ...) – não faz qualquer referência ao recheio. Tal alienação constitui uma venda de bens móveis em conjunto com o imóvel, mas que não está sujeita a tributação por não serem sujeitas a tributação a venda de bens móveis.

 

É nossa opinião que as despesas de artigos consumíveis, eletrodomésticos, artigos de decoração não são elegíveis para os efeitos previsto no artigo 51º, n. º1, al. a), do CIRS, porque não constituem encargos intrinsecamente ligados ao imóvel mas separados, pelo que não podem ser deduzidos.

 

  1. Despesas com honorários de advogados

 

Relativamente às despesas com advogados, alega a Requerida que os Requerentes apresentaram três faturas (Doc. 18) emitidas em nome da Sra. D. C... e não acompanhadas do respetivo recibo.

 

Mais, as faturas apresentadas por G...- Sociedade de Advogados, contém apenas a descrição de “prestação de Serviços Jurídicos”, sem que se possa estabelecer qualquer ligação entre os serviços prestados e a alienação dos imóveis.

 

Quanto a estes, a requerente alega que foram todas emitidas no período da celebração do contrato de compra e venda dos imóveis, cujas escrituras de venda foram celebradas, respetivamente, à data de 30 de outubro de 2020 e de 30 de novembro de 2020.

 

Relativamente às faturas emitidas pelas Sociedade de Advogados H..., o descritivo refere expressamente “a prestação de serviços jurídicos relacionados com a venda de ... e ...”. Apesar desta referência, a Requerida considera que não foram discriminados os serviços efetivamente prestados naquela operação de venda, nem foi acompanhada de qualquer nota de honorários.

 

Em suma, conclui a Requerida que a forma como os serviços “não” foram descritos nas três faturas, a sua emissão em nome da Sra. D. C... e o facto de não serem acompanhas de recibos bastariam para não aceitar como despesas inerentes à dita alienação os montantes delas constantes. Sem prejuízo, acrescenta ainda que a intervenção dos advogados não era necessária para que a operação se processasse, não se verificando os requisitos da letra do artigo 51.º, n.º 1, al. a) do CIRS que diz expressamente “necessárias e inerentes” à aquisição e alienação.

 

Sobre a natureza desta despesa, consideramos que a dedução das despesas com honorários de advogados que intervêm para negociar e redigir o contrato de compra e venda e cumprir as demais formalidades legais é uma despesa necessária e inerente à alienação do imóvel, desde que devidamente comprovada e conexa com a operação.

 

Conforme se refere na Decisão do CAAD, de 25-06-2021, relativa ao Proc. n.º 676/2020, “A dedutibilidade, para efeitos de cálculo das mais-valias imobiliárias tributadas, das despesas inerentes à alienação dos bens mais não é que expressão do princípio (constitucional) da tributação do rendimento líquido. A capacidade contributiva não equivale àquilo que se obtém, mas sim à diferença entre o que se obtém e o que se despendeu para obter o rendimento (gastos suportados).

 

A questão da dedutibilidade fiscal dos gastos tem sido amplamente abordada, pela doutrina e jurisprudência, a propósito dos gastos empresariais, em termos que consideramos transponíveis para o presente caso, uma vez que, também aqui, está em causa a concretização da noção de rendimento líquido.

 

As ideias chave que importa realçar são: gasto (despesa) é um conceito aberto, a ser preenchido em cada caso concreto; os gastos têm que ser suportados visando a obtenção do rendimento; o direito à propriedade privada, constitucionalmente garantido, implica o respeito pelas opções de gestão dos cidadãos, pelo que a AT não pode substituir pelo seu critério as decisões do contribuinte quanto à necessidade e montante de gastos tidos por necessários à obtenção do rendimento.

 

A indissociabilidade, que a AT invoca como argumento central para a não-aceitação das despesas em causa, apenas pode assim ser aferida partindo da motivação do sujeito passivo (tal qual a jurisprudência entendia relativamente à indispensabilidade dos gastos, antes prevista no art. 23º do CIRC). O que releva é o intuito de tais despesas, o seu escopo, e não quaisquer considerações sobre a necessidade objetiva, a “indispensabilidade”, a “razoabilidade”, a” ligação intrínseca” de tais gastos.”

 

Com efeito, o conceito de “despesas necessárias” não se reduz a despesas legais obrigatórias, mas abrange todas aquelas “inequivocamente, conexas com a transação concreta na origem das mais-valias[2] e que lhe são inerentes. Não existindo dúvidas quanto à conexão dos serviços prestados por um advogado na negociação e formalização do contrato de venda, não deve a sua dedutibilidade depender de juízos de oportunidade ou eventual indispensabilidade, no âmbito de uma normal atuação de um contribuinte que se faz acompanhar de um profissional para a boa concretização de um negócio jurídico.

 

Conclusões:

 

Do exposto e após análise de toda a documentação junta pelos Requerentes, concluímos que:

 

  1. Imóvel relativo ao “Loteamento L 9 - Lote 21”

 

  1. Documento n.º 16 - FAC A20/26, no valor de € 98.400,00 – Mediação Imobiliária referente à venda do imóvel situado no Loteamento ..., localizado no ... N.º ..., Freguesia ..., Concelho de Grândola no Registo Predial de Grândola No ... .

 

  1. Documento n.º 17 – FAC A20/23, no valor de € 49.200,00 - Mediação Imobiliária referente à venda do imóvel situado no ..., localizado no ... N.º ..., Freguesia do ..., Concelho de Grândola no Registo Predial de Grândola No ...

 

A operação/prestação de serviços concretizou-se, conforme escritura pública junta aos Autos e não contestada pela Requerida, pelo que consideramos provado o encargo suportado com a mediação imobiliária.

 

  1. Documento n.º 18 – Honorários de advogados

 

As faturas n.º FT/2020/578, no valor de € 9.225,00, e FT2020/510, no valor de € 10.455,00 não podem ser aceites por não ter sido provado um nexo de ligação entre o serviço prestado e a alienação dos imóveis.

 

É aceite metade do custo relativo ao serviço de assessoria jurídica “For professional services in regard to the sale of ... and...” prestado pela sociedade H...– Sociedade de Advogados, SP, RL., no valor total de € 3.382,50, por se tratar de um encargo inerente à alienação do imóvel.

 

  1. Documento n.º 19 – Custos de construção

 

As faturas do fornecedor K... relativas à construção e edificação do imóvel, devidamente identificado, são ainda acompanhadas do orçamento e fotos dos trabalhos constituem provas da efetiva realização da obra de construção que, em boa verdade, a Requerida não questiona e cujas dúvidas não são suficientes para afastar a presunção de veracidade das mesmas.

 

O mesmo se diga relativamente às faturas-recibo da sociedade L..., Unipessoal, Lda, relativas à fiscalização da obra.

 

As faturas relativas aos fornecedor M..., Lda., com expressa indicação do local e fotos apresentadas também constituem provas da efetiva realização da obra, pelo que podem ser aceites nos termos do artigo 51.º do CIRS.

 

As despesas relativas à sociedade N..., Lda., não identificam o imóvel onde foram executados os trabalhos nem demonstram que aquelas árvores e outras plantas foram plantadas no imóvel, pelo que não é possível fazer a conexão entre os encargos e o imóvel em causa. Simultaneamente, não existindo estas evidências, o próprio pagamento é posto em causa.

 

As faturas-recibo do Engenheiro O... são relativas a serviços de coordenação da segurança em obra, necessárias para a valorização do imóvel, pelo que devem ser acrescidas ao valor de aquisição para efeitos de cálculo da mais-valia.

 

As faturas-recibo relativas à sociedade L..., Unipessoal, Lda, são relativas à fiscalização da obra, pelo que tendo si provada a realização da empreitada, presumem-se verdadeiras.

 

A fatura n.º FA2018/7 da sociedade P..., Lda., na parte relativa ao .../projeto de arquitetura inc. topografia e .../Projeto de engenharia, nos valores de 7.030,00 e 1.950,00, respetivamente, por estarem diretamente relacionados com o imóvel, devem ser aceites.

 

As faturas n.ºs FAC LOJ2/36, FAC LOJ2/396 e FAC LOJ2/396, emitidas pela sociedade W..., Lda., não identificam o imóvel onde foram instaladas, pelo que não é possível fazer a conexão entre o encargo suportado e o imóvel, não podendo ser aceite.

 

A fatura n.º FT-2018/15 emitida pela sociedade Q..., Unipessoal, Lda, com a descrição genérica e pouco clara de “house management” não é elegível para os efeitos previstos no artigo 51.º, n.º 1, al. a).

 

A fatura n.º 309 da sociedade R..., Lda., no valor de 8.940,00, relativa a trabalhos de carpintaria efetuados na moradia não é elegível porque não identifica o imóvel onde foram executados os trabalhos, não sendo possível fazer a conexão com o imóvel.

 

Relativamente aos impostos, não tendo sido feita prova pelos Requerentes, mantém-se a dedução já feita nas liquidações ora impugnadas.

 

Pelo exposto, acrescem ao valor de aquisição aos encargos com a valorização e despesas relativas à alineação do imóvel identificado como “Lote 21” no valor total de € 794.991,62, incluindo impostos, a deduzir na proporção do direito de cada um dos Requerentes sobre o imóvel.

 

 

  1. Imóvel relativo ao “Loteamento L 9 - Lote 6

 

  1. Documento n.º 20 – Faturas n.ºs FT 0301V301/200015 e FT 0301V301/200016, nos valores de 64.575,00 cada, relativas à prestação de serviços de mediação imobiliária relativa à venda de um imóvel sito no ..., ....

 

A operação/prestação de serviços concretizou-se, conforme escritura pública, pelo que consideramos provado o encargo suportado com a mediação imobiliária.

 

  1. Documento n.º 18 – Honorários de advogados

 

As faturas n.º FT/2020/578, no valor de € 9.225,00, e FT2020/510, no valor de € 10.455,00 não podem ser aceites por não ter sido provado um nexo de ligação entre o serviço prestado e a alienação dos imóveis.

 

É aceite metade do custo relativo ao serviço de assessoria jurídica “For professional services in regard to the sale of ... and ...” prestado pela sociedade H...– Sociedade de Advogados, SP, RL., no valor total de € 3.382,50, por se tratar de um encargo inerente à alienação do imóvel.

 

  1. Documento n.º 19 – Custos de construção

 

As faturas do fornecedor K... relativas à construção e edificação do imóvel, devidamente identificado, são ainda acompanhadas do orçamento e fotos dos trabalhos constituem provas da efetiva realização da obra de construção que, em boa verdade, a Requerida não questiona e cujas dúvidas não são suficientes para afastar a presunção de veracidade das mesmas.

 

O mesmo se diga relativamente às faturas-recibo do prestador de serviço S..., relativas à fiscalização da obra.

 

As despesas relativas à sociedade N..., Lda., não identificam o imóvel onde foram executados os trabalhos nem demonstram que aquelas árvores e outras plantas foram utilizadas no imóvel, pelo que não é possível fazer a conexão entre os encargos e o imóvel em causa.

 

As despesas relativas à sociedade T..., Unipessoal, Lda, não identificam o imóvel onde foram executados os trabalhos nem demonstram que aquelas árvores e outras plantas foram utilizadas no imóvel, pelo que não é possível fazer a conexão entre os encargos e o imóvel em causa.

 

As faturas-recibo do Engenheiro O... são relativas a serviços de coordenação da segurança em obra, necessárias para a valorização do imóvel, pelo que devem ser acrescidas ao valor de aquisição para efeitos de cálculo da mais-valia.

 

As faturas da sociedade L..., Unipessoal, Lda, são relativas à fiscalização da obra, pelo que tendo si provada a realização da empreitada, presumem-se verdadeiras.

 

As faturas n.º FA2017/72 e FA 2017/73, da sociedade P..., Lda., no valor de € 1346,67 cada, por estarem diretamente relacionados com o imóvel, devem ser aceites. A fatura n.º FA 2018/7, no valor de € 1.200,00 não pode ser aceite pois não foi comprovado tratar-se de um encargo com a valorização do bem, não se compreendendo o que significa “art diretion” para os efeitos aqui relevantes.

 

A fatura n.º 794, emitida pela sociedade U..., Lda., não identifica o imóvel onde foi instalada, pelo que não é possível fazer a conexão entre o encargo suportado e o imóvel, não podendo ser aceite.

 

A fatura n.º v41 2018/375, emitida pela sociedade E..., Lda., não identifica o imóvel onde foi instalada, pelo que não é possível fazer a conexão entre o encargo suportado e o imóvel, não podendo ser aceite.

 

A fatura n.º F61 A/98, emitida pela sociedade V..., S.A., não identifica o imóvel onde foram instaladas, pelo que não é possível fazer a conexão entre o encargo suportado e o imóvel, não podendo ser aceites.

 

A faturas n.º LOJ 2/181 e LOJ 2/75, emitidas pela sociedade W..., Lda., não identificam o imóvel onde foram instaladas, pelo que não é possível fazer a conexão entre o encargo suportado e o imóvel, não podendo ser aceites.

 

A fatura n.º FAC A11/11849, emitida por X... não identifica o imóvel onde foram usados os materiais pelo que não é possível fazer a conexão entre o encargo suportado e o imóvel, não podendo ser aceites.

 

As faturas n.º 000122275 e 0001222288, emitidas pela sociedade Y..., Lda., não identificam o imóvel onde foram usados os materiais pelo que não é possível fazer a conexão entre o encargo suportado e o imóvel, não podendo ser aceites.

 

As faturas n.ºs 1/69, 1/68, 1/70 e 1/77, emitidas pela sociedade Z..., Lda, não identificam o imóvel, pelo que não é possível fazer a conexão entre o encargo e o imóvel, não podendo ser aceites.

 

As faturas emitidas elas entidades AA..., Lda., (...) BB...Unipessoal, Lda., CC..., Unipessoal, Lda. e DD..., SA, por se tratarem de artigos de decoração, eletrodomésticos e louças não são elegíveis para os efeitos previstos no artigo 51.º, n.º 1, al. a). do CIRS, porque porque não constituem encargos intrinsecamente ligados ao imóvel, mas separados, pelo que não podem ser deduzidos.

 

A cópia da fatura relativa à “EE...” não se apresenta legível, pelo que não é aceite.

 

As faturas emitidas pela FF... estão parcialmente ilegíveis. Os elementos percetíveis não permitem identificar o imóvel onde as árvores foram plantadas, pelo que não foi provado o nexo ligação aos imóveis.

 

Relativamente aos impostos, não tendo sido feita prova pelos Requerentes, mantém-se a dedução já feita nas liquidações ora impugnadas.

 

Pelo exposto, acrescem ao valor de aquisição aos encargos com a valorização e despesas relativas à alineação do imóvel identificado como “Lote 6” no valor total de € 498.345,87.

 

IV. JUROS INDEMNIZATÓRIOS

 

Nos termos do n.º 1 do art.º 43º da LGT, “São devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido.”

 

Os requisitos do direito a juros indemnizatórios previsto no artº.43, nº.1, da LGT, são os seguintes:

a) Que haja um erro num ato de liquidação de um tributo;

b) Que o erro seja imputável aos serviços;

c)Que a existência desse erro seja determinada em processo de reclamação graciosa ou de impugnação judicial;

d)Que desse erro tenha resultado o pagamento de uma dívida tributária em montante superior ao legalmente devido.

 

Após a apresentação da reclamação graciosa, a AT possuía todos os elementos de facto e de direito para repor a legalidade da tributação, pelo que a partir da 25-03-2022.

 

À AT cabe repor a legalidade (art. 55º da LGT), não lhe podendo ser indiferente a manutenção de um ato ilegal. Mais, a AT tem o dever de rever os atos tributários caso detete uma situação de cobrança ilegal de tributos (art. 266.º, n.º 2, da C.R.P. e 55.º da LGT), dentro dos limites temporais do art. 78º da LGT.

 

Assim, procede, pois, na parte anulada, o pedido de juros indemnizatórios, que deverão ser contados, à taxa apurada de harmonia com o disposto no artigo 43.º, n.º 4, da LGT, desde 25-03-2022, até à restituição do imposto pago em excesso.

 

V. DECISÃO

Termos em que se decide neste Tribunal Arbitral:

  1. Julgar parcialmente procedente o pedido arbitral de declaração de ilegalidade da liquidação de IRS dos Requerentes, na parte relativa à não consideração do valor dos encargos aceites fiscalmente com a valorização dos imóveis e despesas com a aquisição e alienação, nos valores totais de € 498.345,87, relativamente ao prédio urbano denominado “Loteamento L9 – Lote 6” e de € 794.991,62, relativamente ao prédio urbano “Loteamento L 9 – Lote 21”, na proporção das respetivas percentagens de participação na propriedade dos Requerentes;
  2. Condenar a Requerida na devolução do imposto pago, por força da liquidação parcialmente anulada, acrescido de juros indemnizatórios.
  3. Condenar os Requerentes e a Requerida nas custas do processo, na proporção de 9,57% e 90,43%, respetivamente, face ao decaimento

 

Valor do processo:

De harmonia com o disposto nos artigos 306.º, n.º 2 do Código de Processo Civil e 97.º-A, n.º 1, alínea a) do CPPT e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária (“RCPAT”) fixa-se ao processo o valor de € 84.661,70, nos termos apresentados pela Requerente e não contestado pela Requerida.

 

Custas: Ao abrigo do artigo 22.º, n.º 4, do RJAT, e nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixo o montante das custas em € 2,754,00, a pagar pelos Requerentes (9,57%) e Requerida (90,43%,).

 

Lisboa, 30 de novembro de 2023

Os Árbitros

 

 

(André Festas da Silva)

 

 

 (Amândio Silva)

 

Com a declaração de que votei vencido quanto à consideração das despesas com advogados como encargos inerentes à alienação dos imóveis, pelas razões que subscrevi na decisão do Processo n.º 646/2022-T do CAAD. Demais, o que retiro da decisão do STA no Proc.  0245/17.4BELRA é isso mesmo, e as ponderosas razões invocadas na Decisão do Proc. n.º 676/2020 do CAAD só poderiam levar, a meu ver, à eventual inconstitucionalidade da norma da alínea a) do n.º 1 do artigo 51.º Código do IRS interpretada como excluindo tais despesas, não à sua correcção pelo aplicador.

 

 

(Victor Calvete)

 



[1] Acórdão do TCAN, de 02-06-2022, relativo ao Proc. n.º 01334/10.1BEBRG.

[2] Acórdão do STA, de 18-11-2020, relativo ao Proc. 0245/17.4.