Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 636/2019-T
Data da decisão: 2020-06-24  IRC  
Valor do pedido: € 134.295,01
Tema: IRC - Pagamento especial por conta; Dedução no âmbito de grupos de sociedades.
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DECISÃO ARBITRAL (consultar versão completa no PDF)

Acordam em tribunal arbitral

 

I – Relatório

 

                               1. A..., SA, com o NIPC..., e sede na Rua ..., n o..., ...-... ..., vem requerer a constituição de tribunal arbitral, ao abrigo do disposto nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), e 10.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro, para apreciar a legalidade da decisão de indeferimento da reclamação graciosa deduzida contra a liquidação adicional de IRC e respetivos juros compensatórios, com o n.º  2018..., no montante de € 134 295,01, requerendo ainda a condenação da Autoridade Tributária no pagamento de juros indemnizatórios.

 

Fundamenta o pedido nos seguintes termos.

 

                A decisão de indeferimento da reclamação graciosa enferma de falta de fundamentação na medida em que a Requerente apenas pode inferir, através da demonstração de liquidação, que a Autoridade Tributária corrigiu a dedução do pagamento especial por conta para o montante de € 141.511,28, por confronto com a importância declarada de € 274.601,20, sem que se consiga descortinar o motivo que está subjacente à correcção, havendo de entender-se que a mera indicação do "valor corrigido", sem a mínima informação sobre os motivos que conduziram à fixação desse valor, não cumpre a exigência de fundamentação, nos termos do artigo 77.º da LGT.

 

Houve, por outro lado, um erro no apuramento do saldo dos pagamentos especiais por conta (PECs). A Autoridade Tributária parece ter considerado apenas as coletas relativas aos períodos de tributação de 2014 e seguintes, admitindo a dedução dos PECs realizados pela A... a partir de 2012, abstraindo-se dos antecedentes do Grupo e de cada uma das sociedades que o integram, e não tomando em consideração as deduções feitas nos períodos de 2012 e 2013 pela B... SGPS.

De facto, a B... SGPS efectuou PECs no montante de € 91 678 e € 225 252, nos períodos de 2010 e 2011, e quer tenham sido feitos a título individual quer na condição de sociedade dominante do Grupo, esses pagamentos poderiam ser reportados por esta sociedade para períodos posteriores. E tendo passado essa entidade, em 2012, a ser uma sociedade dominada do Grupo, que tinha como sociedade dominante a A..., o saldo ainda não deduzido desses PECs poderia ser deduzido à coleta deste Grupo.

 

Por conseguinte, não se trata de dedução PECs de um Grupo para outro, mas da dedução de PECs que estão na titularidade de uma sociedade e que são deduzidos à coleta do Grupo do qual ela passou a fazer parte como sociedade dominada, e, por isso, os PECs realizados em 2010 e 2011, pela B... SGPS, podem ser deduzidos, a partir de 2012, à coleta do Grupo que passou a ter como sociedade dominante a A... .

 

Além disso, feita que foi a prova da realização destes pagamentos, a sua não dedução à coleta constitui violação do princípio da justiça consagrado no artigo 266.º, n.º 2, da CRP, na medida em que estando a Requerente, à data em que foi efectuada a correcção, impossibilitada de solicitar a restituição dos pagamentos não deduzidos em tempo, a mesma configura uma arrecadação de impostos pela Fazenda Pública em manifesta inobservância do artigo 103.º , n.o 3, da CRP.

 

A Autoridade Tributária, na sua resposta, invoca a exceção da inutilidade superveniente da lide por efeito da revogação parcial do acto de liquidação pelo despacho de 5 de novembro de 2019, da Direcção de Serviços do IRC, que reduz o montante de PEC a deduzir à coleta ao valor de € 234 314,57.

 

Em sede de impugnação, considera que os PEC, nos montantes de € 91.678,00 e de € 225.252,00, efetuados por referência ao grupo B... SGPS, S.A, não são dedutíveis à coleta do grupo A..., e tratando-se de PECs efetuados nos anos de 2010 e 2011, o limite temporal para a dedução seria o 4.º período de tributação seguinte àquele em que foi realizado o PEC, correspondendo ao ano de 2014, no caso dos PEC de 2010, e ao ano de 2015, no caso dos PEC de 2011.

 

Com a alteração legislativa introduzida pela Lei n.º 2/2014, de 16 de Janeiro, os pagamentos especiais por conta passaram a ser dedutíveis até ao 6.º período de tributação seguinte, todavia, o legislador, através da disposição transitória constante do n.º 11 do artigo 12.º dessa Lei, veio prever que essa alteração se aplica a pagamentos especiais por conta relativos a períodos de tributação que se iniciem em, ou após, 1 de Janeiro de 2014, não sendo aplicável aos caso dos autos.

 

Por outro lado, o pedido de pronuncia arbitral refere-se a um indeferimento expresso da reclamação graciosa que se encontra devidamente fundamentado de facto e de direito, pelo que se não verifica o invocado vício de falta de fundamentação.

 

Conclui no sentido da procedência da excepção dilatória e da improcedência do pedido arbitral.

 

2. A Autoridade Tributária, por despacho da Subdirectora-Geral, de 5 de Novembro de 2019, revogou parcialmente o acto de liquidação, considerando, com base na informação dos serviços datada de 31 de Outubro, que a dedução à colecta no ano de 2017 é de € 234.314,57, mantendo a não aceitação da dedução de pagamentos especiais por conta no montante de € 40.286,63.

 

A revogação parcial do acto foi comunicada ao CAAD em 6 de Novembro e, por despacho do dia imediato, o Presidente do CAAD solicitou à Requerente, nos termos e para os efeitos do artigo 13.º, n.º 2, do RJAT, que informasse se mantém interesse no prosseguimento do processo.

 

Por requerimento de 19 de Novembro seguinte, a Requerente pronunciou-se no sentido do prosseguimento do processo por considerar que o despacho revogatório, embora tenha aceite o entendimento expresso no pedido arbitral, incorreu num erro relativamente ao montante deduzido em 2012, que foi de € 71.286,00 e não € 173.927,89, entendendo assim que o montante a considerar é a importância declarada de € 274.601,20.

  

No seguimento do processo, a Requerente respondeu à excepção da inutilidade superveniente da lide invocada pela Autoridade Tributária, com base na revogação parcial do acto, dizendo que o processo deve prosseguir e o pedido de pronúncia arbitral deve ser julgado totalmente procedente.

 

Por despacho arbitral de 17 de Fevereiro de 2020, o tribunal relegou para final o conhecimento da excepção e remeteu o processo para alegações escritas facultativas por prazo sucessivo.

determinou o Quanto à matéria de fundo, a Requerente reiterou o alegado na petição inicial, concluindo pela inconstitucionalidade da norma da alínea p) do n.º 1 do artigo 23.º-A do CIRC, interpretada no sentido de que não é dedutível o montante suportado a título de CBS.

 

Em alegações, a Requerente manteve o entendimento de que os PECs realizados pela B... SGPS em 2010 e 2011 são dedutíveis à colecta, a partir de 2012, no âmbito do Grupo que passou a ter como sociedade dominante a A..., defendendo que o valor total a deduzir não é o indicado no despacho revogatório mas aquele que consta da petição inicial, pelo que o pedido arbitral deve ser julgado procedente.

 

Autoridade Tributária não contra-alegou.

 

3. O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Presidente do CAAD e notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira nos termos regulamentares.

 

Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redação introduzida pelo artigo 228.° da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro, o Conselho Deontológico designou como árbitros do tribunal arbitral colectivo os signatários, que comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável.

 

As partes foram oportuna e devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de a recusar, nos termos conjugados do artigo 11.º, n.º 1, alíneas a) e b), do RJAT e dos artigos 6.° e 7.º do Código Deontológico.

 

Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redação introduzida pelo artigo 228.° da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro, o tribunal arbitral colectivo foi constituído em 17 de Dezembro de 2019.

 

O tribunal arbitral foi regularmente constituído e é materialmente competente à face do preceituado nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), e 30.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro.

 

As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão representadas (artigos 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março).

 

O processo não enferma de nulidades e foi invocada a exceção de inutilidade superveniente parcial da lide.

 

Cabe apreciar e decidir.

 

II - Fundamentação

 

Matéria de facto

 

4. Os factos relevantes para a decisão da causa que são tidos como assentes são os seguintes.

 

a)            A Requerente apresentou a declaração modelo 22 relativa ao ano de 2017, em que inscreveu como valor dedutível, a título de pagamentos especiais por conta, o montante de € 274.601,20;

b)           Posteriormente, a Autoridade Tributária emitiu a liquidação adicional n.º 2018..., na qual corrigiu a dedução do pagamento especial por conta inicialmente declarado para € 141.511,28;

c)            Por via dessa correcção, na liquidação adicional apurou-se um valor de imposto a pagar de € 134.295,01 (€ 274.601,20 - € 141.511,28 + € 0,80 [JC] + € 1.204,29 [JM]);

d)           Em 21 de janeiro de 2019, a Requerente apresentou uma reclamação graciosa contra o acto de liquidação adicional, que foi indeferida por despacho da chefe de divisão, de 25 de junho de 2019;

e)           O despacho de indeferimento fundamentou-se no projecto de decisão, notificado à Requerente para efeito do exercício do direito de audição, em que se refere, além do mais, o seguinte:

 

II. ANÁLISE E PARECER

13.          Vem a reclamante contestar a correção levada a cabo nessa liquidação adicional, com os fundamentos resumidamente descritos no ponto 8, para onde se remete.

14.          Feita a respetiva análise, é, a nosso ver, de relevar o seguinte.

15.          Resulta do n.0 12 do artigo 90.0 do Código do IRC que a liquidação efetuada, pelo sujeito passivo, na declaração modelo 22 (autoliquidação) pode ser corrigida, se for caso disso, dentro do prazo de caducidade, cobrando-se ou anulando-se as diferenças apuradas.

16.          Nessa fase, essas eventuais diferenças são identificadas informaticamente, através do confronto entre o que consta na base de dados informática da AT (por exemplo, a título de PEC, de retenções...) e o que foi declarado pelo contribuinte (para efeitos de autoliquidação).

17.          Tais diferenças traduzem-se em erros ou omissões do contribuinte a nível declarativo, e daí que na liquidação subsequente à autoliquidação constem as expressões "valores declarados" por contraponto com "valores calculados".

18.          Como se disse, tem-se aqui apenas por base os dados presentes no sistema informático da AT, dados que o contribuinte não considerou, mas que deles tinha necessariamente de ter conhecimento.

19.          Reportando-nos ao caso em apreço, em que foi corrigido o valor dos PEC, a reclamante, enquanto sociedade dominante do grupo, responsável pela determinação do valor global anual do PEC desse mesmo grupo, tem necessariamente de ter presente:

-              quanto foi pago, a esse título, ao longo dos anos (sendo aqui de destacar que a reclamante não contesta a dedução, em sede de liquidação, dos PEC dos grupos nas liquidações de IRC do grupo, ao longo dos vários exercícios);

-              a especificidade própria dos grupos de sociedades nesta matéria, para os quais existe um regime especial;

-              as normas legais aplicáveis no que respeita à dedução, em sede de liquidação, desses mesmos PEC.

20.          Refira-se que um eventual desconhecimento da lei não constitui argumento para se alegar falta de fundamentação.

21.          Não colhe, por isso, o argumento invocado pela reclamante de que desconhece a origem da correção efetuada, ao nível dos PEC, por ausência de fundamentação.

22.          Sem prejuízo do exposto, quanto aos PEC, nos valores de € 91.678,00 e de € 225.252,00, importa ter em linha de conta que estes:

foram efetuados no âmbito do grupo C... SGPS, SA, através da sua sociedade dominante, B... SGPS, SA  (cf. fls. 60 a 63 dos autos); não foram efetuados a título individual por essa sociedade (cf., de novo, fls. 60 a 63 dos autos).

23.          Os PEC efetuados relativamente a um grupo de sociedades, que cessou, não são dedutíveis à coleta de outro grupo.

24.          Pela sua pertinência, passamos a transcrever o teor de 2 partes de uma Informação elaborada pela Direção de Serviços do IRC (sancionada por despacho de 11/01/2018, proferido pela Subdiretora-Geral da Área do IR), na qual se analisaram as várias situações de deduções do PEC, no âmbito dos grupos de sociedades, algumas das quais fazendo-se referência às que foram já sancionadas (cf. fls. 66 a 68 dos autos):

- "[o]s PEC reportados de períodos de tributação anteriores à aplicação do RETGS e que ainda não foram deduzidos pelas sociedades de um Grupo são dedutíveis na declaração do Grupo, na medida em que haja coleta do Grupo e até à sua concorrência, sem limitação da coleta individual que seria apurada na ausência do regime, visto que a liquidação do imposto é efetuada na declaração do Grupo pela sociedade dominante" (ponto 1 da Informação);

"[q]uando cessa a aplicação do RETGS a um Grupo, deverá ser a ex-dominante a repodar os PEC efetuados no âmbito do Grupo e ainda não deduzidos, podendo, decorridos os períodos do direito à dedução sem que a mesma tenha sido possível efetuar, solicitar o reembolso da parte não deduzida, nos termos do no 3 do artigo 93. 0 do CIRC" (ponto 4 da Informação, no qual se reportou o teor da Informação Vinculativa no 779/2015, processo no 3988/2012, despacho de 3/06/2015).

25. Concluímos, em razão do exposto, que os PEC, nos valores de € 91.678,00 e de € 225.252,00, efetuados por referência ao grupo B... SGPS, S.A. não são dedutíveis à coleta do grupo D...,

26.          Mesmo que se admitisse a sua dedução, a condição temporal, plasmada no n. 0 1 do artigo 93.º do Código do IRC, não se encontra observada, inviabilizando-se também por aqui a dedução.

27.          Essa norma, na redação anterior à dada pela Lei n.0 2/2014, de 16/01 — aplicável aos PEC efetuados até 2013 inclusive admitia a dedução apenas até ao 4. 0 período de tributação seguinte àquele em que foi realizado o PEC.

28.          Estando-se, no caso, em presença de PEC efetuados nos anos de 2010 e 201 1, o último período de tributação, para efeitos de dedução, seria em 2014, no caso dos PEC de 2010, e 2015, no caso dos PEC de 2011

29.          Verificando a data de inclusão das sociedades no grupo (cf. ponto 9) é por demais manifesto que qualquer PEC efetuado, a título individual, antes desse momento, já não é suscetível de consideração na liquidação do IRC de 2017.

30.          Acrescentamos ainda o seguinte.

O valor total de PEC's pagos pela reclamante, no período compreendido entre 2012 a 2017, perfaz o total de € 675.049,00, não obstante o valor total deduzido nesse mesmo período, ultrapassa largamente esse montante pago, conforme discriminação nas tabelas seguintes:

 

2012      71.286,00

2013      187.286,00

2014      180.806,00

2015      91.227,00

2016      91,95800

2017      52.486 00

                                                                                                               

2012      71.286,00                            71.286 00                                                          

2013                      50.198 82            61.803 06                            24.385 61                           

2014                                                                     180.806 00                        

2015                                                                     91.227 00                           

2016                                                                     91.958,00           89.025.28            

2017                                                                                     52.486,00            

31. Assim, do anteriormente exposto, é forçoso concluir pela não verificação de ilegalidade na liquidação adicional, em crise, não sendo de dar razão à posição defendida pela reclamante.

f)            Por despacho da Subdirectora-geral, de 5 de Novembro de 2019, foi revogado parcialmente o acto de liquidação adicional.

g)            O despacho de revogação parcial fundamenta-se na informação dos serviços datada de 31 de Dezembro de 2019, em que se refere, além do mais, o seguinte:

 

ii) Da dedução de PECs efetuados, e ainda não deduzidos, no âmbito de um Grupo de sociedades, tributado pelo RETGS, cessado

40.No caso em apreço, pretende-se em concreto saber da possibilidade de dedução de PEC efetuados em 2010 e 2011, e não deduzidos, no âmbito do Grupo de sociedades tributado pelo RETGS denominado B... SGPS, S.A., cessado com data de 2011-12-31, cuja sociedade dominante foi B..., S.A., NIPC ...

41. à coleta do grupo de sociedades também tributado pelo RETGS denominado A..., S.A. no qual a sociedade B... SGPS, S.A. veio a ser integrada em 2012 — OI — OI, na qualidade de sociedade dominada.

42.A questão da dedutibilidade de PECs efetuados, e ainda não deduzidos, no âmbito de um grupo de sociedades num quadro de cessação da aplicação do RETGS a esse grupo, conforme bem referido pela Direção de Finanças de Lisboa em sede de Reclamação, foi já analisado por esta DSIRC, nomeadamente na informação .../2015 (Processo .../2012), cujo entendimento foi sancionado pela Sra. Diretora Geral em 2015-06-03 e mais recentemente na informação .../2017 (Proc. 1205/2017), sancionada pela Sra. Subdiretora Geral da Área de Gestão Tributária do IR em 2018-01-11. Refere-se nas informações mencionadas como segue.

 

Informação da DSIRC n.º .../2015 (Processo .../2012)

«Ao cessar a aplicação do RETGS a um Grupo, e, uma vez que não há possibilidade desses PEC permanecerem no Grupo, para serem deduzidos na coleta do mesmo, deverá ser a ex-dominante a reportar esses PEC ainda não deduzidos, podendo, decorridos os quatro períodos de direito à dedução, solicitar o reembolso da parte não deduzida, mediante inspeção a pedido, nos termos do n.º 3 do artigo 93.º do CIRC na redação à data.

Quando a ex-dominante seja integrada noutro grupo, a possibilidade de solicitar o reembolso será da responsabilidade da nova dominante, após decorridos os quatro períodos de direito à dedução.»

Informação da DSIRC n.º .../2017 (Processo ../2017)

«I- Dedução de PEC individuais de uma sociedade que é integrada num grupo sujeito ao RETGS (...)7

Os PEC reportados de períodos de tributação anteriores à aplicação do RETGS e que ainda não foram deduzidos pelas sociedades de um Grupo são dedutíveis na declaração do Grupo, na medida em que haja coleta do Grupo e até à sua concorrência, sem limitação da coleta individual que seria apurada na ausência do regime, visto que a liquidação do imposto é efetuada na declaração do Grupo pela sociedade dominante.

4. DEDUÇÃO DOS PEC APÓS CESSAÇÃO DA APLICAÇÃO DO RETGS AO GRUPO (...)

Quando cessa a aplicação do RETGS a um Grupo, deverá ser a ex-dominante a reportar os PEC efetuados no âmbito do Grupo e ainda não deduzidos, podendo, decorridos os períodos de direito à dedução sem que a mesma tenha sido possível efetuar, solicitar o reembolso da parte não deduzida, nos termos do no 3 do art. 930 do CIRC.

43.Do vertido supra, conclui-se, ao contrário do entendido pela Direção de Finanças de Lisboa no Despacho proferido na reclamação graciosa aqui em análise — no qual se refere10 que «[o]s PEC efetuados relativamente a um grupo de sociedades, que cessou, não são dedutíveis à coleta de outro grupo» - que os PEC efetuados e não deduzidos no âmbito de um grupo de sociedades que cessa a aplicação do RETGS serão reportáveis na esfera fiscal da sociedade anteriormente dominante do grupo cessado, de onde poderão ser deduzidos à coleta do grupo do qual venha a fazer parte a sociedade anteriormente dominante do grupo cessado.

44.Destarte, tendo sido efetuados PEC em 2010 e 2011, no montante de € 91 678 e € 225 25211, respetivamente, no âmbito do Grupo C... SGPS, S.A. e ali não deduzidos, poderão os mesmos ser deduzidos à coleta do grupo D..., S.A., até à concorrência da mesma e até ao quarto período posterior ao da realização do pagamento, em razão da entrada em 2012-01-01 neste grupo da sociedade B... SGPS, SA, anterior sociedade dominante do grupo cessado em 2011-12-13 B... SGPS, S.A.

45. Posto o anterior importa agora aferir em que medida a possibilidade de dedução à coleta do grupo D..., S.A. dos PEC efetuados e não deduzidos em 2010 e 2011, no âmbito do cessado grupo C... SGPS, SA, poderão ter impacto no montante dos PECs passiveis de dedução, ao longo dos anos fiscais de 2012 a 2017, às sucessivas coletas do Grupo D..., SA, apuradas nesses anos fiscais, tendo presente o disposto no artigo 93.º do CIRC (nas redacções em vigor aplicáveis),

46.A fim de a final aferir o montante de PECs, efetuados e não deduzidos, passiveis, nos termos do mencionado artigo 93.º do CIRC, de dedução à coleta apurada no ano económico de 2017, aqui em crise,

47.De recordar que nos termos do disposto no artigo 93.º do CIRC, a dedução dos PEC entregues é efetuada à coleta apurado na declaração periódica de rendimentos (declaração a que se refere o artigo 120.º do CIRC), do próprio período de tributação a que respeita out se insuficiente, até ao 4.º período de tributação seguinte - para exercícios fiscais até 2013- ou até ao 6.º período de tributação seguinte - para exercícios fiscais após 2013 -, depois de efetuadas as eventuais deduções relativas a dupla tributação jurídica internacional, dupla tributação económica e benefícios fiscais (sem que de tal, no entanto, possa resultar valor negativo);

48.Do previsto na lei, atendendo à possibilidade de reporte dos PEC efetuados e não deduzidos por insuficiência de coleta e a sua caducidade (de quatro ou seis anos), resulta que a dedução do PEC à coleta disponível em cada ano deverá ser efetuada em função da sua antiguidade;

49.Assim, para apurar o valor do PEC a deduzir, a final, à coleta no ano de 2017, ter-se-á que aferir qual o montante de PEC a deduzir à coleta em cada ano, desde 2012 até 2017, considerando para o efeito o valor de PECs que sucessivamente vão sendo reportados de anos anteriores (i.e. PEC pagos e não deduzidos e cujo direito à dedução não caducou em cada ano fiscal), o valor dos PECs que sucessivamente vão sendo pagos em cada ano e o valor dos PECs que sucessivamente vão sendo deduzidos em cada ano, até chegarmos ao ano de 2017;

50. Tem-se, deste modo, que:

PEC a deduzir à coleta em cada ano = [coleta disponíve1 — PEC reportados de anos anteriores (pagos e não deduzidos e não caducados) - PEC pago no ano], sendo que desta operação não poderá resultar valor negativo;

51.Destarte, analisando as coletas apuradas pelo Grupo D..., S.A, disponíveis para dedução de PECs efetuados e reportados nos períodos compreendidos no intervalo de 2012 a 2017, ambos inclusive, e tendo em conta as liquidações vigentes na ordem jurídica-tributaria na presente data, conclui-se, em resultado da análise e cálculos efetuados conforme operações enunciadas no ponto anterior e evidenciados no quadro infra, que o grupo poderá deduzir à coleta apurada no ano económico de 2017, aqui em análise, PEC no montante de € 234 314,57:

 

52.          Dos cálculos evidenciados no quadro apresentado, retira-se que considerando a possibilidade de dedução dos PECs pagos em 2010 e 2011, no âmbito do grupo C... SGPS, S.A. à coleta do grupo D..., S.A., aqui Requerente, e as sucessivas coletas apuradas, que os mesmos foram passíveis de dedução à coleta dos anos de 2012  a 2014, inclusive, sendo que, a final, em 2017 são passiveis de dedução à coleta apurada neste ano os PECs pagos e reportados dos anos de 2015 (parte), 2016 e 2017, num total de € 234.314,57.

53.          Pelo exposto, afigura-se proceder parcialmente a pretensão da Requerente nesta questão, i.e. que poderá deduzir à coleta apurada na liquidação de IRC referente ao ano económico de 2017, PECs no montante de € 234 314,57, atentas as liquidações de IRC vigentes na presente data na ordem jurídico-tributária da Requerente (e constantes na base de dados da AT).

h)           A revogação parcial do acto foi comunicada ao CAAD em 6 de Novembro e, por despacho do dia imediato, o Presidente do CAAD solicitou à Requerente, nos termos e para os efeitos do artigo 13.º, n.º 2, do RJAT, que informasse se mantém interesse no prosseguimento do processo.

i)             Por requerimento de 19 de Novembro seguinte, a Requerente pronunciou-se no sentido do prosseguimento do processo por considerar que o despacho revogatório, embora tenha aceite o entendimento expresso no pedido arbitral, incorreu num erro relativamente ao montante deduzido em 2012, que foi de € 71.286,00 e não € 173.927,89, entendendo assim que o montante a considerar é a importância declarada de € 274.601,20.

 

Factos não provados

 

Não existem quaisquer factos não provados relevantes para a decisão da causa.

 

O Tribunal formou a sua convicção quanto à factualidade provada com base no processo administrativo junto pela Autoridade Tributária com a resposta e em factos não questionados pelas partes.

 

Saneamento

 

5.  A Autoridade Tributária veio invocar a inutilidade superveniente da lide na parte referente ao montante dos pagamentos especiais por conta a deduzir à colecta que se encontra coberto pelo despacho de revogação parcial do acto tributário de liquidação, que admitiu que o valor dedutível era de € 234.314,57, e não o de € 141.511,28 que consta da liquidação.

Cabe preliminarmente referir que o novo Código de Procedimento Administrativo, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 4/2015, de 7 de janeiro, passou a distinguir entre a revogação e a anulação administrativa, fazendo corresponder a cada uma destas figuras as duas anteriores modalidades de revogação ab-rogatória ou extintiva e revogação anulatória. Segundo a definição constante do artigo 165.º, a revogação é “o ato administrativo que determina a cessação dos efeitos de outro ato, por razões de mérito, conveniência ou oportunidade”, ao passo que a anulação administrativa é “o ato administrativo que determina a destruição dos efeitos de outro ato, com fundamento em invalidade”. A revogação produz, em regra, apenas efeitos para o futuro (artigo 171.º, n.º 1), enquanto que a anulação administrativa, tendo por objeto a eliminação do mundo jurídico de atos anuláveis, tem, em regra, efeitos retroativos (artigo 171.º, n.º 3).

No caso vertente, a Autoridade Tributária, pelo despacho de 5 de novembro de 2019, entendeu, contrariamente ao decidido no despacho de indeferimento da reclamação graciosa, que os PEC efetuados e não deduzidos no âmbito de um grupo de sociedades são reportáveis na esfera fiscal da sociedade anteriormente dominante do grupo cessante, e poderão ser deduzidos à coleta do grupo em que essa sociedade venha a fazer parte, e, desse modo, os PEC efectuados em 2010 e 2011, no âmbito do Grupo C... SGPS, S.A. poderão ser deduzidos à coleta do grupo D..., S.A., até à concorrência da mesma e até ao quarto período posterior ao da realizacão do pagamento. Por outro lado, para apurar o valor do PEC a deduzir no ano de 2017, atendeu aos montantes pagos e a deduzir em cada ano, de 2012 até 2017, vindo a concluir que a pretensão da Requerente, formulada na reclamação graciosa, procede parcialmente, havendo lugar à dedução à colecta, no ano económico de 2017, no montante de € 234. 314,57.

 Deste modo, a Autoridade Tributária praticou, segundo a nova terminologia, um acto de anulação administrativa, isto é, um acto que tem como fundamento considerações de legalidade administrativa e não de mera discricionariedade. Assim sendo, o falado despacho de 5 de novembro de 2019, embora adopte a fórmula verbal anteriormente aplicável, corresponde a um verdadeiro acto anulatório.

 

Por outro lado, a Requerente não põe em causa a anulação parcial do anterior acto de indeferimento da reclamação graciosa e unicamente se insurge contra a não aceitação da dedução do valor remanescente, em atenção ao montante global de € 274.601,20, que entende ser o valor efectivamente passível de dedução.

 

Assim sendo, não pode deixar de reconhecer-se que o pedido arbitral se encontra reduzido ao montante de € 40.286,63, que é o que se encontra ainda em discussão por efeito da anulação parcial.

 

Matéria de direito

 

6. A questão que vem colocada traduz-se em saber em que termos há lugar à dedução de pagamentos especiais por conta efectuados pela B... SGPS, enquanto sociedade dominante do grupo de sociedades, relativamente a um período de tributação em que tinha ocorrido uma alteração da composição societária e essa sociedade passou a integrar o grupo na condição de sociedade dominada.

 

A Requerente começou por suscitar o vício de falta de fundamentação da decisão impugnada por considerar que a Autoridade Tributária, relativamente ao ano de 2017, corrigiu a dedução do pagamento especial por conta para o montante de € 141.511,28, por confronto com o valor declarado de € 274.601,20, sem qualquer indicação dos motivos que conduziram à fixação desse valor, apenas sendo possível concluir, da demonstração da liquidação, que esse era o "valor corrigido".

 

A arguição é inteiramente improcedente.

 

         A fundamentação do acto de indeferimento da reclamação graciosa não pode ser aferida pela demonstração da liquidação mas pela informação dos serviços que serviu de base à prática desse acto e com a qual o seu autor manifestou concordância. E dessa informação resulta claro que, segundo o entendimento da Autoridade Tributária, os PEC efetuados relativamente a um grupo de sociedades cessante não são dedutíveis à coleta de um outro grupo societário, devendo ser a sociedade ex-dominante a reportar os PEC efetuados no âmbito do grupo e ainda não deduzidos, e, decorrido o prazo de dedução, exercer o direito de reembolso da parte não deduzida, nos termos do n.o 3 do artigo 93.º do CIRC. Indicando-se ainda, como um segundo fundamento de indeferimento, a circunstância de se ter ultrapassado o limite temporal do direito à dedução que, à época, apenas podia ser exercido até ao 4.º período de tributação seguinte àquele em que foi realizado o pagamento, pelo que, estando em causa pagamentos especiais por conta efectuados em 2010 e 2011, não poderiam ser deduzidos na declaração de IRC de 2017 (cfr., em especial, os pontos 23 a 25 e 27 a 29 da informação).

 

                Motivação que a Requerente bem compreendeu, visto que não deixou de contrapor a essa argumentação que não se tratava, no caso, de dedução de pagamentos especiais por conta  de um grupo para um outro grupo, mas da dedução de pagamentos que estão na titularidade de uma sociedade que continua a fazer parte integrante do grupo como sociedade dominada, e que não foi também inobservado o prazo de dedução, porquanto os pagamentos feitos em 2010 e 2011 tinham sido deduzidos nos períodos de 2012 e 2013 (cfr. pontos 32., 34. e 35. da petição inicial).

 

                Por outro lado, a questão está ultrapassada, visto que, no despacho anulatório de 5 de novembro de 2019, a Autoridade Tributária explicitou, ao contrário do que havia sido consierado na decisão de indeferimento da reclamação graciosa, que os PEC efetuados e não deduzidos pela sociedade dominante de um grupo cessante poderão ser deduzidos à coleta do grupo que essa sociedade venha a integrar como dominada.

 

7. Quanto ao fundo da questão, conforme se depreende de todo o anteriormente exposto, o despacho de anulação parcial da decisão de indeferimento da reclamação graciosa concedeu já razão à Requerente no tocante à dedutibilidade no âmbito do grupo D... dos pagamentos especiais por conta realizados pela B... SGPS quando esta entidade continuou a fazer parte do grupo não obstante a alteração da sua composição.

 

O que está agora em discussão é o cálculo da dedução, entendendo a Requerente que o valor a considerar é de € 274.601,20, e não de € 234.314,57, como se fixou no despacho anulatório.

 

Nos termos do artigo 90.º, n.º 2, alínea d), do Código do IRC, à colecta apurada mediante a aplicação da taxa à matéria colectável são efectuadas as deduções relativas aos pagamentos especiais por conta a que se refere o artigo 106.º benefícios fiscais. Dessas deduções não pode resultar um valor negativo que implique o direito ao reembolso, pelo que as deduções são feitas apenas até concorrência da colecta (n.º 9). E quando seja aplicável o regime especial de tributação dos grupos de sociedades, as deduções relativas a cada uma das sociedades são efectuadas no montante apurado relativamente ao grupo (n.º 6).

 

                Por outro lado, o artigo 93.º do CIRC, regulando a dedução dos pagamentos especiais nos termos da referida a alínea d) do n.º 2 do artigo 90.º, na redacção anterior à Lei n.º 2/2014, de 16 de Janeiro, determinava que é efetuada ao montante apurado na declaração de rendimentos do próprio período de tributação a que respeita ou, se insuficiente, até ao 4.º período de tributação seguinte, depois de efetuadas as deduções referidas nas alíneas a) a c) do n.º 2 e com observância do n.º 9, ambos do artigo 90.º (n.º 1). Os n.ºs 2 e 3 estabelecem, por sua vez, o direito ao reembolso em caso de cessação de atividade no próprio período de tributação ou até ao 3.º período de tributação posterior àquele a que o pagamento especial por conta respeita, ou relativamente à parte que não foi deduzida até ao final do período de tributação referido no n.º 1.

 

                               O regime especial de tributação dos grupos de sociedades tem igualmente um regime específico de dedução dos prejuízos fiscais, conforme o previsto no artigo 71.º. Assim, “os prejuízos das sociedades do grupo verificados em períodos de tributação anteriores ao do início de aplicação do regime só podem ser deduzidos ao lucro tributável do grupo, nos termos e condições previstos no n.º 2 do artigo 52.º, até ao limite do lucro tributável da sociedade a que respeitam” (artigo 71.º, n.º 1, alínea a)). Aquele preceito, por sua vez, estabelece um limite quantitativo quanto ao reporte dos prejuízos fiscais, ao consignar que a dedução a efectuar em cada um dos períodos de tributação não pode exceder o montante correspondente a 70 % do respetivo lucro tributável, sem prejuízo de a parte cuja dedutibilidade não tenha sido possível no exercício poder ser efectuada em um ou mais dos 12 períodos de tributação posteriores (n.º 1). O reporte dos prejuízos fiscais tende assim a implicar o apuramento de um resultado positivo e o consequente pagamento de imposto.

 

Na situação do caso, o que está em causa é a dedução de pagamentos especiais por conta já existentes na esfera jurídica do Grupo C... SGPS quando esta empresa, por efeito da alteração da composição do grupo, passou a integrar o Grupo D... .

 

O Código não contém qualquer norma que regule especificamente esta questão, limitando-se a estabelecer um princípio geral – já há pouco enunciado – segundo o qual, no âmbito do regime especial de tributação dos grupos de sociedades, as deduções relativas a cada uma das sociedades são efectuadas no montante apurado relativamente ao grupo.

 

Em todo o caso, deve começar por sublinhar-se que, no regime jurídico português, a substância económica do regime de tributação especial dos grupos de sociedades assenta na possibilidade de determinação de uma base de tributação comum e não se assume como um modelo de consolidação total e pleno. Aquilo que existe é um modelo de Group Pooling que permite a agregação dos resultados individuais de cada membro do grupo societário (rendimentos e perdas) por forma a permitir-se a compensação. A gestão dessa agregação é da competência da sociedade dominante, mas não implica a perda da existência jurídica individual e das obrigações fiscais individuais de cada uma das sociedades dominadas. Daí resultam implicações práticas na forma como os direitos e as obrigações fiscais são tratados.

 

A alteração da composição do grupo societário ou a passagem de uma entidade de grupo empresarial para outro grupo empresarial não implica dissolução da entidade nem afasta os seus direitos e as suas obrigações, uma vez que a entidade continua a ser juridicamente autónoma, transportando consigo todo o seu universo de direitos e obrigações para o novo grupo societário.

 

E esta concepção coaduna-se com o disposto no artigo 70.º, n.º 1, do Código do IRC, que prevê que, não obstante a agregação dos resultados, cada entidade pertencente ao grupo tem de apresentar declaração periódica individual, sendo com base nessas múltiplas declarações individuais – devidas por cada um dos membros do grupo – que a sociedade dominante poderá calcular o lucro tributável do grupo. Ou seja, não há a criação de um novo sujeito passivo de imposto, mas antes a sujeição a um regime especial de tributação (sobre estes aspectos, cfr. o acórdão proferido no Processo n.º 133/19-T).

 

                Sendo este o regime jurídico aplicável, não pode sequer configurar-se uma lacuna de regulação legal no que se refere à dedução dos pagamentos especiais por conta de que as empresas eram já titulares quando transitaram para um grupo de sociedades com diferente composição. Com efeito, o Código estabelece como regra que, no âmbito do regime especial de tributação dos grupos de sociedades, as deduções relativas a cada uma das sociedades são efectuadas no montante apurado relativamente ao grupo (artigo 90.º, n.º 6). E, por outro lado, para efeito da agregação dos resultados, o Grupo D... passou a incorporar os direitos e as obrigações das empresas que passaram a integrar o Grupo, incluindo o direito aos pagamentos especiais por conta que já detinham à data em que se operou a alteração da composição do Grupo.

 

A lei é clara ao associar a dedução de pagamentos especiais por conta ao resultado fiscal do grupo e não ao resultado que tenha sido apurado individualmente por cada uma das sociedades que o integram.

 

Torna-se assim patente que há lugar ao direito à dedução. A questão que subsiste respeita – como se referiu - ao cálculo da dedução.

 

A informação em que baseia o despacho anulatório concluiu, através do quadro em que se encontram referenciados os pagamentos especiais por conta efetuados entre 2012 e 2017, que o montante a deduzir é de € 234.314,57, não acrescentando qualquer outra explicação. A Requerente considera que existe um erro de cálculo, visto que nesse quadro vem referido, relativamente ao ano de 2012, a dedução de € 173.927,89 quando o valor efectivamente deduzido foi de € 71.287,00. E com as alegações juntou o documento de demonstração da liquidação de IRC relativa a 2012 em que esta última importância surge como valor dedutível corrigido a par do montante de € 173.927,89 que havia sido inscrito na declaração de rendimentos.

 

É por isso de considerar que se verifica o apontado erro de cálculo, e, em todo o caso, tratando-se de uma correcção aritmética efectuada pela Administração era a esta que competia o ónus da prova do direito que se arroga, nos termos do artigo 74.º, n.º 1, da LGT,  prova que não logrou realizar por via do mero quadro descritivo que consta da informação dos serviços que o autor do acto anulatório se limitou a validar.

 

O pedido arbitral mostra-se ser, por conseguinte, procedente por violação das disposições conjugadas dos artigos 90.º, n.º 2, alínea d), e 93.º, n.º 3, do Código do IRC.

 

Em face do exposto, fica prejudicado o conhecimento do invocado vício de violação do princípio da justiça.

 

                Juros indemnizatórios

 

                7. A Requerente pede ainda a condenação da Autoridade Tributária no pagamento de juros indemnizatórios por efeito da indevida cobrança de imposto.

 

De harmonia com o disposto na alínea b) do artigo 24.º do RJAT, a decisão arbitral sobre o mérito da pretensão de que não caiba recurso ou impugnação vincula a Administração Tributária, nos exactos termos da procedência da decisão arbitral a favor do sujeito passivo, cabendo-lhe “restabelecer a situação que existiria se o acto tributário objecto da decisão arbitral não tivesse sido praticado, adoptando os actos e operações necessários para o efeito”. O que está em sintonia com o preceituado no artigo 100.º da LGT, aplicável por força do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT.

 

Ainda nos termos do n.º 5 do artigo 24.º do RJAT “é devido o pagamento de juros, independentemente da sua natureza, nos termos previstos na Lei Geral Tributária e no Código de Procedimento e de Processo Tributário”, o que remete para o disposto nos artigos 43.º, n.º 1, e 61.º, n.º 5, de um e outro desses diplomas, implicando o pagamento de juros indemnizatórios desde a data do pagamento indevido do imposto até à data do processamento da respectiva nota de crédito.

 

Há assim lugar, na sequência de declaração de ilegalidade do acto de liquidação, ao pagamento de juros indemnizatórios, nos termos das citadas disposições dos artigos 43.º, n.º 1, da LGT e 61.º, n.º 5, do CPPT, calculados sobre a quantia que a Requerente pagou indevidamente, à taxa dos juros legais (artigos 35.º, n.º 10, e 43.º, n.º 4, da LGT).

 

III – Decisão

Termos em que se decide:

a)            Julgar procedente o pedido arbitral e declarar a ilegalidade do despacho de anulação da decisão de indeferimento da reclamação graciosa deduzida contra a liquidação de IRC n.º …, na parte em que limita a dedução dos pagamentos especiais por conta ao montante de € 234.314,57;

b)           Condenar a Autoridade Tributária no pagamento de juros indemnizatórios desde a data do pagamento indevido do imposto até à data do processamento da respectiva nota de crédito.

 

Valor da causa

 

A Requerente indicou como valor da causa o montante de € 134.295,01 que não foi contestado pela Requerida e corresponde ao valor da liquidação a que se pretendia obstar, pelo que se fixa nesse montante o valor da causa.

 

Custas

 

Nos termos dos artigos 12.º, n.º 2, e 24.º, n.º 4, do RJAT, e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária e Tabela I anexa a esse Regulamento, fixa-se o montante das custas em € 3060,00, que fica a cargo da Requerida.

 

Notifique.

 

Lisboa, 24 de Junho de 2020  

 

O Presidente do Tribunal Arbitral

Carlos Fernandes Cadilha

 

O Árbitro vogal

António Lobato Neves

 

O Árbitro vogal

Mariana Vargas