Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 789/2022-T
Data da decisão: 2023-08-03  IRC  
Valor do pedido: € 461.988,75
Tema: IRC. Lapsos contabilísticos. Negligência. Vedação da equidade.
Versão em PDF

DECISÃO ARBITRAL

 

I – Relatório

 

  1. A contribuinte A..., Unipessoal, Lda., NIPC..., doravante “a Requerente”, apresentou, no dia 21 de Dezembro de 2022, um pedido de constituição de Tribunal Arbitral Colectivo, nos termos dos artigos 2º, 1, a), e 10º, 1 e 2 do Decreto-Lei nº 10/2011, de 20 de Janeiro, com as alterações por último introduzidas pela Lei nº 7/2021, de 26 de Fevereiro (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, doravante “RJAT”), e dos arts. 1º e 2º da Portaria nº 112-A/2011, de 22 de Março, em que é Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira (doravante “AT” ou “Requerida”).
  2. A Requerente pediu a pronúncia arbitral sobre a decisão de indeferimento expresso do pedido de revisão oficiosa apresentado contra a liquidação de IRC n.º 2020 ... nascida da declaração periódica Mod. 22 n.º..., de 28 de Junho de 2019 (liquidação n.º 2019... e subsequentes declarações de substituição n.os..., de 3 de Novembro de 2019 (liquidação n.º 2020...), e ..., de 5 de Novembro de 2020, todas referentes ao exercício de 2018; e, mediatamente, pediu a pronúncia arbitral sobre a ilegalidade, e consequente anulação parcial, da autoliquidação e subsequentes declarações de substituição, no montante de €461.988,75.
  3. O pedido de constituição do Tribunal Arbitral foi aceite pelo Exmo. Presidente do CAAD e automaticamente notificado à AT.
  4. O Conselho Deontológico designou os árbitros do Tribunal Arbitral Colectivo, que comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável, e notificou as partes dessa designação.
  5. As partes não se opuseram, para efeitos dos termos conjugados dos arts. 11º, 1, b) e c), e 8º do RJAT, e arts. 6º e 7º do Código Deontológico do CAAD.
  6. O Tribunal Arbitral Colectivo ficou constituído em 27 de Fevereiro de 2023; foi-o regularmente, e é materialmente competente.
  7. Por Despacho de 27 de Fevereiro de 2023, foi a AT notificada para, nos termos do art. 17º do RJAT, apresentar resposta.
  8. A AT apresentou a sua Resposta em 11 de Abril de 2023, juntamente com o Processo Administrativo.
  9. Em Requerimento de 13 de Abril de 2023, a Requerente juntou aos autos o Documento nº 9, explicando o respectivo alcance probatório.
  10. Em Requerimento de 26 de Abril de 2023, a Requerente reagiu à matéria de excepção apresentada pela Requerida na sua Resposta.
  11. Em Requerimento de 11 de Maio de 2023, a Requerida reagiu à junção aos autos do documento nº 9 e respectiva fundamentação, e ainda aos argumentos aduzidos pela Requerente na sua reacção à matéria de excepção.
  12. Por Despacho de 18 de Maio de 2023, dispensou-se a realização da reunião prevista no art. 18º do RJAT. As partes foram notificadas para apresentarem alegações escritas, indicando-se o dia 27 de Agosto de 2023 como data-limite para a prolação e comunicação da decisão arbitral.
  13. A Requerente apresentou alegações em 2 de Junho de 2023.
  14. A Requerida apresentou as suas alegações em 19 de Junho de 2023.
  15. As Partes têm personalidade e capacidade judiciárias, e têm legitimidade.
  16. A AT procedeu à designação dos seus representantes nos autos e a Requerente juntou procuração, encontrando-se assim as Partes devidamente representadas.
  17. O processo não enferma de nulidades.

 

II – Matéria de Facto

 

II. A. Factos provados

 

Com relevo para a decisão, consideram-se provados os seguintes factos:

  1. A Requerente é uma sociedade unipessoal por quotas, de Direito português, inserida no grupo multinacional B... (“Grupo B...”).
  2. A Requerente é integralmente detida pela sociedade de Direito espanhol C..., S.A.
  3. A Requerente produz e comercializa produtos alimentares, entre os quais uma linha de café da marca D... .
  4. Na comercialização de produtos D..., a Requerente utiliza um programa informático de gestão e contabilidade próprio (XXX), certificado em Portugal sob o n.º 2421/AT, o qual regista a facturação e pagamentos efectuados e arquiva documentos contabilísticos relevantes.
  5. O balancete estatutário da Requerente é composto por dois conjuntos de contas – as principais e as paralelas –, sendo que ambos têm o devido mapeamento para as contas do Sistema de Normalização Contabilística (“SNC”)
  6. As contas paralelas servem para proceder a reclassificações das contas do Grupo B... e, assim, obter o balancete para as contas nacionais estatutárias.
  7. Apenas os saldos credores e devedores das contas do software XXX são levados para a contabilidade geral da Requerente, e é nesta que se consolidam todos os gastos e ganhos que concorrem para a matéria colectável em sede de IRC.
  8. Um mapa detalhado dos quantitativos integrados no saldo da conta #2076110, evidenciava, em 31 de Dezembro de 2018, gastos no montante de €1.478.147,95 relativos à categoria D... .
  9. Contudo, o saldo total dos gastos com o leasing, incluindo os alugueres da categoria D..., evidenciava na mesma data um saldo total de €1.525.778,35, e esse novo valor foi comunicado pela Requerente à AT em 31 de Agosto de 2022, por ocasião do exercício do direito de audição prévia relativo ao projecto de decisão de indeferimento do pedido de revisão oficiosa.
  10. O Grupo B... decidiu introduzir em 2018, a nível mundial, nas várias empresas do Grupo, a Norma Internacional de Relato Financeiro n.º 16 (“IFRS 16”).
  11. Com a IFRS 16 surge a necessidade de, no final de cada exercício, se garantir que todas as contas de activo e passivo, depreciações do exercício e acumuladas, referentes a contratos de locação, sejam reclassificadas como “Alugueres operacionais” para efeitos do SNC.
  12. Ao mesmo tempo o Grupo B... adoptou, também a nível mundial, um sistema contabilístico mediante o qual é efectuado um lançamento do registo a crédito (da conta #2076110 Accrual dos pagamentos) e a débito (da conta #2100010 Redução do passivo).
  13. No programa XXX não se procedeu à compensação na conta #2076110, e por isso os débitos na conta #2100010, referentes a despesas de locação, não foram reclassificados como «Alugueres operacionais». O montante inicialmente inscrito na conta #2076110 foi manualmente anulado através da conta #2080021, não tendo, por isso, contribuído para o apuramento do lucro do exercício de 2018.
  14. A Requerente não detectou essa falha, dada a autonomia da gestão do XXX face à sua própria contabilidade geral.
  15. Na falta de compensação com a conta #2076110, referente aos alugueres da categoria D..., no momento da integração dos saldos credores e devedores provenientes do sistema contabilístico próprio daquela categoria, os respectivos pagamentos foram integrados na conta de fornecedores (a débito) do balancete geral da Requerente.
  16. Dado este lapso, as despesas com a locação de estabelecimentos comerciais, no montante de €1.595.870,45, não foram consideradas no apuramento do resultado líquido do exercício de 2018.
  17. A Requerente entregou em 28 de Junho de 2019 a declaração periódica Mod. 22 n.º ... (seguida de declarações de substituição n.os..., de 6 de Novembro de 2019, e ..., de 5 de Novembro de 2020), referente ao exercício de 2018.
  18. A Requerente apurou, por referência ao exercício de 2018, um total de IRC a pagar de €2.110.155,82, e procedeu ao respectivo pagamento.
  19. Em 2021, aquando da reconciliação do balancete final proveniente do sistema contabilístico da D..., verificou-se a existência de uma diferença entre a conta de saldo de fornecedores da D... (conta #2084001) do balancete geral, e a conta que continha o respectivo saldo de fornecedores do balancete interno da D... .
  20. Identificou-se, só então, a ocorrência do erro no programa informático que impediu a reclassificação automática das despesas de locação, provocando a omissão contabilística.
  21. Para corrigir essa discrepância, a Requerente efectuou um lançamento adicional a crédito na conta #2084001, relativo aos contratos de locação da categoria D... por reclassificar, o que permitiu o reconhecimento contabilístico do gasto por contrapartida da conta #4008064 (conta de fornecimentos e serviços externos).
  22. Estes movimentos permitiram reclassificar os gastos numa conta de resultados, já que os gastos estavam reflectidos na conta de fornecedores (apenas com reflexo no balanço).
  23. Nos resultados de 2021 foi reconhecido, por referência ao exercício de 2018, um gasto contabilístico no montante de €1.595.870,45, que acresceu, juntamente com outros valores, na linha 752 do quadro 07 da declaração Modelo 22 de IRC desse exercício de 2021.
  24. Cumprindo o princípio da especialização dos exercícios, o gasto suportado em 2018 não contribuiria para o apuramento da matéria colectável de IRC do exercício de 2021, na medida em que, pese embora tenha afectado o resultado líquido desse período em virtude da sua relevação contabilística nesse exercício, diminuindo o resultado líquido em €1.595.870,45, foi neutralizado com um acréscimo de igual montante, anulando assim qualquer impacto fiscal.
  25. Tratando-se de um gasto fiscalmente dedutível e não tendo o mesmo sido objecto de dedução em qualquer outro exercício, designadamente em 2021, a Requerente apresentou, em 28 de Junho de 2022, um pedido de revisão oficiosa.
  26. Nesse pedido de revisão oficiosa solicitou que, aplicando-se o princípio da especialização dos exercícios, fosse revista a sua declaração Modelo 22 de IRC do exercício de 2018, passando a mesma a reflectir os gastos suportados nesse exercício com a locação dos estabelecimentos comerciais no contexto da comercialização dos produtos D..., invocando a grave e notória injustiça de não o fazer (art. 78º, 4 da LGT).
  27. Notificada em 18 de Julho de 2022 do projecto de decisão, a Requerente exerceu o seu direito de audição prévia (art. 60º, 1, b) da LGT) em 31 de Agosto de 2022.
  28. O pedido de revisão oficiosa foi indeferido por Despacho de 16 de Setembro de 2022, notificado à Requerente em 20 de Setembro de 2022, com fundamento na inaplicabilidade do art. 78º, 4 da LGT, por se ter verificado “comportamento negligente do contribuinte” e a Requerente não ter feito prova da ausência de negligência (recaindo sobre ela o ónus de fazê-lo – art. 74º da LGT).
  29. Em 21 de Dezembro de 2022, a Requerente apresentou no CAAD o Pedido de Pronúncia Arbitral que deu origem ao presente processo.

 

II. B. Matéria não-provada

 

Com relevância para a questão a decidir, nada ficou por provar.

 

II. C. Fundamentação da matéria de facto

 

  1. Os factos elencados supra foram dados como provados com base nas posições assumidas pelas partes nos presentes autos, e nos documentos juntos ao PPA e ao processo administrativo.
  2. Cabe ao Tribunal Arbitral seleccionar os factos relevantes para a decisão, em função da sua relevância jurídica, considerando as várias soluções plausíveis das questões de Direito, bem como discriminar a matéria provada e não provada (cfr. art. 123º, 2, do CPPT e arts. 596º, 1 e 607º, 3 e 4, do CPC, aplicáveis ex vi art. 29º, 1, a) e e) do RJAT), abrangendo os seus poderes de cognição factos instrumentais e factos que sejam complemento ou concretização dos que as Partes alegaram (cfr. arts. 13.º do CPPT, 99º da LGT, 90º do CPTA e arts. 5º, 2 e 411.º do CPC).
  3. Segundo o princípio da livre apreciação dos factos, o Tribunal baseia a sua decisão, em relação aos factos alegados pelas partes, na sua íntima e prudente convicção formada a partir do exame e avaliação dos meios de prova trazidos ao processo, e de acordo com as regras da experiência (cfr. art. 16º, e) do RJAT, e art. 607º, 4, do CPC, aplicável ex vi art. 29º, 1, e) do RJAT).
  4. Somente relativamente a factos para cuja prova a lei exija formalidade especial, a factos que só possam ser provados por documentos, a factos que estejam plenamente provados por documentos, acordo ou confissão, ou quando a força probatória de certos meios se encontrar pré-estabelecida na lei (por exemplo, quanto aos documentos autênticos, por força do artigo 371.º do Código Civil), é que não domina, na apreciação das provas produzidas, o referido princípio da livre apreciação (cfr. art. 607º, 5 do CPC, ex vi art. 29º, 1, e) do RJAT).
  5. Além disso, não se deram como provadas nem não provadas alegações feitas pelas partes, e apresentadas como factos, consistentes em afirmações estritamente conclusivas, insusceptíveis de prova e cuja veracidade se terá de aferir em relação à concreta matéria de facto acima consolidada, nem os factos incompatíveis ou contrários aos dados como provados.

 

III. Sobre o Mérito da Causa

 

III. A. Posição da Requerente

 

  1. A Requerente começa por assinalar que é uma injustiça grave e notória, para efeitos da aplicação do art. 78º, 4 da LGT a circunstância de, por erro contabilístico, não serem relevados fiscalmente, no exercício de 2018, gastos suportados para a obtenção de rendimentos sujeitos a IRC, dedutíveis nos termos do art. 23º, 2, d) do CIRC, dai resultando um montante de imposto a pagar superior ao legalmente devido.
  2. Retira, dessa circunstância, o argumento de que o resultado colide com o princípio da tributação segundo o lucro real, ínsito no artigo 104º, 2 da Constituição.
  3. E que a desconsideração de gastos por simples lapso formal fere os princípios da proporcionalidade e da justiça (arts. 55º da LGT, 46º do CPPT, 18º, 2 e 266º, 2 da Constituição).
  4. A afronta a tais princípios bastaria, segundo a Requerente, para ferir de ilegalidade o acto decisório que, indeferindo o pedido de revisão, manteve os efeitos da autoliquidação e recusou a reposição da legalidade.
  5. Acresce ainda que, no entender da Requerente, foi violado o princípio do inquisitório (art. 58º da LGT), por preterição de formalidades instrutórias que cabiam à AT.
  6. A Requerente sublinha que, confrontada com erros nas liquidações que tenham conduzido a tributação indevida, a AT está obrigada, no exercício do seu poder-dever de promoção da justiça material na tributação, a tomar a iniciativa de rever oficiosamente aquelas liquidações, revogando actos ilegais, e mais ainda quando demandada a fazê-lo por pedido dos interessados – desde que sejam respeitados os prazos do art. 78º da LGT.
  7. E sublinha também que a revisão nos termos do art. 78º, 4 da LGT não pode estar condicionada pela utilização prévia de qualquer outro meio procedimental ou processual, pois é um meio de correcção de erros que tem os seus pressupostos e prazos próprios.
  8. Além da verificação do requisito formal da tempestividade, a Requerente sustenta que se verifica o requisito material positivo para a aplicação do art. 78º, 4 da LGT, especificamente a situação de injustiça grave ou notória.
  9. A injustiça seria grave por resultar de tributação excessiva e desproporcionada em sede de IRC, porque a Requerente pagou imposto a mais, em montantes manifestamente superiores (€461.988,75) aos que corresponderiam à tributação pelo lucro real, ao não terem sido relevados, para efeitos de apuramento do seu lucro tributável de 2018, os gastos suportados com a locação dos estabelecimentos comerciais para a comercialização de produtos D... .
  10. A injustiça seria notória por estar documentada e corresponder inequivocamente a gastos incorridos pela Requerente para pagar as rendas dos estabelecimentos comerciais e, assim, manter activo um dos seus principais canais de comercialização e venda dos produtos da marca D... .
  11. Sustenta também a Requerente que se verifica o requisito material negativo para a aplicação do art. 78º, 4 da LGT, especificamente a ausência de um comportamento negligente do contribuinte.
  12. Sendo uma modalidade de culpa, a negligência não pode corresponder à mera constatação da existência de um erro não ocasionado pela AT, tendo, antes, de ser aferida casuisticamente, dependendo da identificação de um dever de diligência que impende sobre o sujeito passivo, e da constatação de que a sua actuação se deu ao arrepio de tal dever, em termos censuráveis – a ponto de se vedar a reposição da legalidade por essa via (reposição que se manterá caso o erro seja imputável ao contribuinte, mas não tenha ocorrido negligência).
  13. E a Requerente recusa, liminarmente, que sobre ela impendesse um dever que ela tenha violado.
  14. A adopção da IFRS 16 foi da iniciativa do Grupo B... e a Requerente acatou-o, com excepção do software XXX, que se manteve paralelamente operativo e funcional, sob pena de um grave incremento do grau de complexidade subjacente às práticas de registo contabilístico adoptadas. A partir de 2018 coexistiram dois sistemas informáticos de gestão e contabilidade complexos no seio da estrutura empresarial da Requerente, sendo que, quanto a um deles (IFRS 16), a Requerente se encontrava ainda em fase de adaptação de utilização e migração da informação contabilística – e essa coexistência é que propiciou a ocorrência do lapso contabilístico que obstou à reclassificação dos gastos referentes à categoria D... e, bem assim, impediu a sua dedutibilidade.
  15. Conclui a Requerente que foi uma vítima das circunstâncias que deram azo ao erro no programa informático de gestão e contabilidade próprio da categoria D... (o software XXX), que, por sua vez, impediu a reclassificação automática dos gastos.
  16. E para refutar a existência de qualquer negligência ou de qualquer conduta censurável, e sublinhar a sua boa fé, a Requerente lembra que quando, por ocasião da submissão da declaração Modelo 22 de IRC do exercício de 2021, se apercebeu da referida omissão contabilística, prontamente diligenciou pela sua correcção contabilística e pela preparação e apresentação do pedido de revisão oficiosa, tendo tido o cuidado de não efectuar a sua dedução no exercício de 2021 a fim de poder cumprir o princípio da especialização dos exercícios estabelecido no artigo 18º, 1 do CIRC.
  17. Alega ainda a Requerente que a sua conduta não foi censurável, antes, e quando muito, desculpável; e que não vislumbra em que é que, face às circunstâncias, poderia ter adoptado conduta distinta – entendendo não ser exigível ao contribuinte médio que, colocado na posição da Requerente, conseguisse compatibilizar, harmonizar e executar, sem qualquer margem de erro, dois sistemas informáticos completamente díspares entre eles.
  18. Estando assim preenchidos o requisito formal e os dois requisitos materiais, positivo e negativo, de aplicação do art 78º, 4 da LGT, entende a Requerente que se impõe à AT que anule parcialmente a autoliquidação, sendo ilegal a recusa de fazê-lo consubstanciada no indeferimento do pedido de revisão oficiosa.
  19. Quanto à violação do princípio do inquisitório por preterição de formalidades instrutórias que cabiam à AT (art. 58º da LGT: “(…) deve, no procedimento, realizar todas as diligências necessárias à satisfação do interesse público e à descoberta da verdade material, não estando subordinada à iniciativa do autor do pedido”), entende a Requerente que a AT deveria ter ouvido a testemunha apresentada no pedido de revisão oficiosa, visto que o depoimento da testemunha poderia demonstrar a ausência de negligência da Requerente, desmentindo a alegação de que a Requerente não teria cumprido o ónus da prova que sobre ela recaía.
  20. Sublinhando a funcionalização do princípio do inquisitório ao interesse público na descoberta da verdade material, a Requerente sustenta que a AT deveria ter esgotado os meios de correcta averiguação da realidade factual, seja por iniciativa própria, seja, por maioria de razão, quando o contribuinte solicite a realização de uma diligência que se afigure necessária ao esclarecimento da verdade material.
  21. No caso, como a AT indicou, para fundamentar o seu indeferimento do pedido de revisão, que a Requerente não provara a ausência de negligência quando sobre ela recaía o ónus de prová-lo, a Requerente entende que a AT tinha a obrigação legal de inquirição da testemunha – e que a ausência dessa diligência torna, por si, o acto anulável, nos termos do art. 163º do CPA, por preterição de formalidade essencial, violando o art. 58º da LGT.
  22. Quanto ao argumento de que o resultado colide com o princípio da tributação segundo o lucro real, ínsito no artigo 104º, 2 da Constituição, a Requerente entende que ficou desrespeitado o princípio da capacidade contributiva, que é basilar na Constituição Fiscal, e que exigiria que todas as componentes do rendimento tivessem relevância para cálculo do IRC, incluindo as negativas, isto é, os gastos necessários à obtenção de um rendimento, que devem ser descontados para que se considere unicamente o rendimento líquido, como consta do art. 23º, 1 do CIRC.
  23. Não aceitando, por isso, que lhe seja negado que deduza um conjunto de gastos documentalmente comprovados, suportados com a locação de estabelecimentos comerciais onde se dá a venda de produtos D..., pretendendo fazê-lo no exercício em que os suportou.
  24. Ou seja, não aceita que, embora não desconheça a existência dos gastos e a suficiência do respectivo suporte documental, a ausência de dedução destes gastos, por parte da Requerente, em qualquer outro exercício e a circunstância de o imposto suportado pela Requerente, no exercício de 2018, exceder em muito o seu rendimento real desse exercício, a AT recuse repor a correcta consideração dos gastos no exercício em que ocorreram, com devolução do imposto suportado em excesso, escudando-se para o efeito na alegação de negligência da Requerente.
  25. Quanto ao argumento de que a desconsideração de gastos por simples lapso formal fere os princípios da proporcionalidade e da justiça (arts. 55º da LGT, 46º do CPPT, 18º, 2 e 266º, 2 da Constituição), a Requerente toma-os, respectivamente, como vedando à AT a imposição de formalidades desnecessárias que perturbem a tributação segundo o lucro real, e como uma ponderação que “matize” a rigidez da aplicação da lei fiscal, por exemplo a consideração sobre a ausência de prejuízo ao erário público no caso concreto, ou a superação do princípio da especialização dos exercícios quando da sua aplicação resultem, como “consequências práticas”, injustiças no caso concreto.
  26. Em suma, a Requerente invoca:
    1. a inexistência de negligência, e a existência de injustiça grave e notória, para justificar a revisão oficiosa nos termos do art. 78º, 4 da LGT;
    2. a violação do princípio da tributação segundo o lucro real, resultante da conjugação do art. 23º do CIRC e do art. 104º, 2 da Constituição;
    3. a violação dos princípios de proporcionalidade e justiça, por empolamento das consequências de um mero lapso formal (art. 55º da LGT, art. 46º do CPPT, arts. 18º, 2 e 266º, 2 da Constituição).
    4. A violação do princípio do inquisitório plasmado no art. 58º da LGT, por falta de uma diligência instrutória da parte da AT
  27. Termina pedindo a anulação da decisão de indeferimento expresso do pedido de revisão oficiosa, a anulação das liquidações, a devolução do que foi pago e o pagamento, pela AT, de juros indemnizatórios contados a partir do indeferimento do pedido de revisão oficiosa.
  28. Em alegações, a Requerente, para além de breves considerações sobre a matéria de excepção, recapitula os factos e os argumentos formulados no pedido de pronúncia e nos subsequentes requerimentos, enfatizando que sobre ela não recaía nenhum dever de diligência que tivesse incumprido com a comissão do erro contabilístico, e que ela foi vítima de um erro no software XXX que impediu a reclassificação automática dos gastos com as locações e que conduziu à indevida anulação manual de todo o saldo da conta # 2076110.
  29. Configurando a recusa de revisão oficiosa como uma “punição”, realça o carácter desculpável da negligência que possa ter ocorrido, e insiste que “a Autoridade Tributária entende ser de prevalecer um lapso formal – perfeitamente compreensível e desculpável, não censurável e não prejudicial para o erário público – sobre o direito (material) à tributação pelo lucro real, o qual tem assento e dignidade constitucional” (§ 63 das alegações).
  30. E insiste que “na interpretação e aplicação da lei fiscal, não pode o intérprete alhear-se das consequências práticas que a recusa de relevação fiscal destes gastos no exercício de 2018 tem para a esfera da Requerente” (§ 72 das alegações).

 

III. B. Posição da Requerida

 

III. B. 1. Por excepção

 

  1. A Requerida começa por apresentar uma defesa por excepção, invocando não estar vinculada à jurisdição arbitral relativamente a parte do pedido, especificamente à parte em que este não foi precedido de pedido de revisão oficiosa, no montante de €117.722,50.
  2. No procedimento de revisão oficiosa, a ora Requerente tinha referido ter suportado despesas com locação, em 2018, no valor de €1.478.147,95.
  3. No presente processo, refere ter suportado despesas com locação no valor de €1.595.870,45.
  4. Significa isso, no entender da Requerida, que a diferença de valores, €117.722,50, é uma parte do pedido arbitral que não foi antecedida do pedido de revisão oficiosa cujo indeferimento é objecto do presente processo.
  5. Tratando-se, assim, de uma pretensão relativa à declaração de ilegalidade de acto de autoliquidação que não foi precedido de recurso à via administrativa, ela não se encontra abrangida pela Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março, que vincula a AT à jurisdição dos tribunais arbitrais que funcionam sob a égide do CAAD, aplicável ex vi art. 4º do RJAT.

 

III. B. 2. Por impugnação

 

  1. Na sua resposta, a Requerida lembra que o art. 78º da LGT estabeleceu um regime que visa sanar injustiças da tributação para lá dos estritos limites da impugnação, e reafirma que é dever da AT efectuar a revisão de quaisquer actos tributários dos quais resultem afrontas aos princípios da justiça, da igualdade, da legalidade, da capacidade contributiva, da tributação do lucro real, e de quaisquer actos dos quais resulte a arrecadação de tributos indevidos.
  2. Lembra, contudo, que a revisão oficiosa ao abrigo do art. 78º da LGT reclama, por estrito imperativo legal, que estejam reunidos os requisitos para a sua aplicação – requisitos cumulativos.
  3. A Requerida reafirma que a Requerente teve uma conduta negligente, como se deu por provado no procedimento de revisão, e como ela entende que está provado nos presentes autos.
  4. A negligência, como fonte não-dolosa do erro, é aferida no momento da comissão do erro, e não em função do seu reconhecimento ou de esforços posteriores para repará-lo.
  5. E a Requerida faz notar que, não constando do art. 78º, 4 da LGT qualquer distinção entre graus de censurabilidade e de desculpabilidade da negligência, nada se pode inferir, na interpretação da norma, da introdução dessas categorias.
  6. A Requerida lembra que a invocação, pela Requerente, de que foi “vítima das circunstâncias”, não a irresponsabiliza, não sendo aceitável que uma alegada complexidade contabilística diminuísse o padrão de zelo e de observância da lei que, no cumprimento de deveres declarativos, se exige de qualquer contribuinte.
  7. Conclui que a actuação negligente da Requerente afasta a subsunção do caso ao art. 78º, 4 da LGT – e que a AT não pode desviar-se da estrita legalidade, nos termos dos arts. 5º, 8º e 55º da LGT e do art. 266º, 2 da Constituição.
  8. Quanto à alegada preterição de formalidade essencial no procedimento de revisão oficiosa, a Requerida sustenta que o depoimento testemunhal se tornou inútil no momento em que a Requerente, logo no pedido de revisão, assumiu ter cometido o erro, bastando essa admissão para se formar a convicção de que o erro fora negligente.
  9. A Requerida acrescenta que muitas das invocações de princípios, formuladas pela Requerente, se encontram subjacentes à solução plasmada no art. 78º da LGT: um artigo reforçadamente garantístico, mas que não deixou de conciliar ponderações de proporcionalidade e de justiça com interesses gerais de certeza e de segurança.
  10. Quanto aos juros indemnizatórios, a Requerida sustenta não ter havido erro dos serviços, e, portanto, não serem devidos tais juros. Mas lembra que, se o pedido for procedente, só o retardamento no reconhecimento do direito da Requerente é que podia fundamentar o direito a juros, e então aplicar-se-ia o art. 43º, 3, c) da LGT, contando-se os juros a partir de um ano após a apresentação do pedido de revisão oficiosa, ou seja a partir de 28 de Junho de 2023.
  11. Em alegações, a Requerida, para lá de reiterar a sua defesa por excepção, retoma os argumentos apresentados na sua resposta para reclamar a improcedência do pedido.

 

III. C. Fundamentação da decisão

 

III. C. 1. Quanto à excepção

 

  1. A Requerida apresentou uma excepção inominada “de falta de vinculação à jurisdição arbitral”, visando a absolvição parcial de instância.
  2. Tratar-se-ia da diferença entre os €1.478.147,95 que foram objecto do procedimento de revisão oficiosa e os €1.595.870,45 que são objecto do presente processo – o que levou a Requerida a deduzir que haveria, no pedido de pronúncia arbitral, uma parte de €117.722,50 que, não tendo sido precedida de pedido de revisão oficiosa, não se encontraria abrangida pela Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março, que vincula a AT à jurisdição dos tribunais arbitrais que funcionam sob a égide do CAAD, e aplicável ex vi art. 4º do RJAT.
  3. Em requerimentos de 13 e 24 de Abril de 2023, e novamente nas suas alegações apresentadas a 2 de Junho de 2023, a Requerente contrapôs ter rectificado o valor, de €1.478.147,95 para €1.595.870,45, logo na audição prévia apresentada no âmbito do procedimento de revisão oficiosa (como consta do documento nº 15 junto ao Pedido de Pronúncia Arbitral).
  4. Alegando que, tendo a Requerida sido confrontada com esse novo valor sem ter reagido a ele, teve, logo no procedimento de revisão oficiosa, oportunidade de apreciar a legalidade do pedido quanto à globalidade dos gastos comprovadamente suportados pela Requerente com a locação de estabelecimentos comerciais D... no exercício de 2018, não sendo, pois, verdade que o referido montante de €117.722,50 do pedido de pronúncia arbitral não tenha sido precedido de recurso à via administrativa.
  5. Em requerimento de 11 de Maio de 2023, a Requerida alega que não reagiu à alteração do montante do pedido, não por entender a mesma admissível, mas somente por considerá-la prejudicada pelas razões que determinaram o indeferimento do pedido de revisão.
  6. Nesse mesmo requerimento de 11 de Maio de 2023, a Requerida tece detalhadas considerações sobre as implicações da alegada adopção da IFRS 16 no período de 2018, apontando para uma fundamental incongruência: é que, a adoptar-se a IFRS 16, a contabilização dos gastos do período referentes às locações operacionais passariam a corresponder à amortização do “activo sob direito de uso” (activo intangível), reconhecido contabilisticamente e consubstanciado no contrato de locação e correspondentes encargos financeiros da locação incluídos nas rendas, e não pelo valor das rendas pagas mensalmente, conforme a Requerente solicita, sob pena de duplicação de gastos.
  7. A IFRS 16 assenta na classificação e no reconhecimento das locações nas demonstrações financeiras dos locatários: o locatário deve reconhecer um ativo sob direito de uso (ativo intangível) e um passivo da locação (correspondente ao valor presente das rendas a pagar ao longo do contrato de locação, descontadas à taxa de juro implícita na locação, ou na falta desta à taxa de juro de mercado): e em razão disso o locatários deixa de contabilizar a renda como gasto e passa a registar as depreciações associadas ao uso do bem e os encargos financeiros da locação incluídos nas rendas. Os gastos com contratos de locação a reconhecer contabilisticamente no Resultado Líquido passam a corresponder, não às rendas anuais pagas, mas sim à amortização anual do activo intangível (sob direito de uso, e calculado pela vida útil do activo) relevado na contabilidade, e aos encargos financeiros da locação incluídos nas rendas.
  8. Ou seja, a alegada desconsideração dos valores das rendas de locação pagas, constantes em recibos, não constituiria um lapso ou um erro, mas pelo contrário uma consequência da adopção de uma nova norma contabilística, perante a qual a consideração dos valores das rendas de locação pagas seria redundante – visto que esse valor terá que estar já contabilizado, segundo a IFRS 16, a título de depreciações do mesmo período (o valor da amortização do activo sob direito de uso correspondente às locações).
  9. No mesmo requerimento de 11 de Maio de 2023, a Requerida invoca ainda que a documentação apresentada pela Requerente em apoio dos valores em causa é nalguns casos insuficiente, nuns casos por consistir em documentos avulsos que não jogam inteiramente com a contabilidade de 2018, e nem permitem por vezes destrinçar o que se reporta a 2018 e o que se refere a 2021, e noutros casos por não permitir efectuar qualquer validação entre valores constantes nas contas “paralelas” do Software XXX e valores transpostos para as contas da contabilidade geral da Requerente.
  10. Ainda no requerimento de 11 de Maio de 2023, a Requerida assinala, entre outras, a insuficiência de elementos contabilísticos (balancetes, extractos de conta) que permitam excluir a hipótese de os gastos alegadamente desconsiderados terem sido contabilizados de outra forma – como a imposta pela IFRS 16 – e por essa via terem já sido considerados no cálculo do resultado líquido de 2018, ou no de 2021.
  11. Todavia, no entender deste Tribunal, a posição assumida pela Requerida, mormente no seu requerimento de 11 de Maio de 2023, prova demasiado: seria todo o montante do pedido neste processo que ficaria em causa, e não somente os €117.722,50.
  12. De facto, duas simples alegações, se fossem provadas, iriam atingir o âmago da contabilização de todo o montante em causa nos presentes autos:
    1. a alegação de que os montantes peticionados já tinham sido considerados noutras categorias contabilísticas por força da aplicação da IFRS 16, e por essa outra via teriam contribuído para o cálculo rigoroso e legal do valor tributável em 2018;
    2. a alegação de que a contabilidade apresentada, e o suporte documental, não permitem uma destrinça rigorosa entre os exercícios de 2018 e de 2021.
  13. Talvez por essa razão, a própria Requerida não retoma essas observações de natureza jurídico-contabilística nas suas alegações entregues posteriormente, em 19 de Junho de 2023, e nelas volta a concentrar-se nos argumentos para a impugnação do pedido que já apresentara na sua resposta de 11 de Abril de 2023.
  14. No que exclusivamente respeita à excepção, demos como provado, na matéria de facto, que:

8. Um mapa detalhado dos quantitativos integrados no saldo da conta #2076110, evidenciava, em 31 de Dezembro de 2018, gastos no montante de €1.478.147,95 relativos à categoria D... .

9. Contudo, o saldo total dos gastos com o leasing, incluindo os alugueres da categoria D..., evidenciava na mesma data um saldo total de €1.525.778,35, e esse novo valor foi comunicado pela Requerente à AT em 31 de Agosto de 2022, por ocasião do exercício do direito de audição prévia relativo ao projecto de decisão de indeferimento do pedido de revisão oficiosa.”

  1. No que respeita às alegações de irrelevância dessa comunicação de 31 de Agosto de 2022, há que distinguir o conhecimento da factualidade envolvida no procedimento de revisão oficiosa, por um lado, e qualquer juízo de relevância dessa factualidade para o desfecho desse procedimento, por outro lado.
  2. Nesse sentido, o montante de €1.595.870,45 foi apresentado, mesmo que tardiamente, nesse procedimento, e havia tempo e oportunidade para ser atendido; se o não foi, por um juízo de precedência ou prejudicialidade por parte da AT, que a própria assume ter sido determinante da desconsideração, isso não remove o facto de esse montante ter sido integrado na factualidade plena de uma “pretensão relativa à declaração de ilegalidade de acto de autoliquidação”, e nessa condição ter sido objecto da via administrativa que obrigatoriamente precede o processo arbitral, preenchendo assim o requisito da “Portaria de vinculação”.
  3. A ressalva contida nesta Portaria, e especificamente na alínea a) do seu art. 2º, visa claramente evitar que a AT, em certas matérias, seja confrontada directamente com a via arbitral, sem ter a oportunidade de prevenir esse contencioso através da resolução de diferendos pela via administrativa.
  4. Ora, no caso vertente, e porque a excepção apresentada pela Requerida se concentra exclusivamente numa divergência de valores, impõe-se reconhecer que o valor total do pedido que desencadeia o presente processo já tinha sido apresentado à AT no procedimento de revisão oficiosa – e que, portanto, no que respeita à ratio do art. 2º, a) da Portaria nº 112-A/2011, de 22 de Março, a AT não foi surpreendida com montantes novos.
  5. Em consequência, não pode senão concluir-se pela improcedência da excepção invocada pela Requerida.

 

III. C. 2. Quanto ao mérito da causa

 

III. C. 2. A. A EXCEPCIONALIDADE DO REGIME DO ART. 78º, 4 DA LGT

 

  1. Comecemos por sublinhar o carácter excepcional da revisão prevista no art. 78º, 4 da LGT:

O dirigente máximo do serviço pode autorizar, excepcionalmente, nos três anos posteriores ao do acto tributário a revisão da matéria tributável apurada com fundamento em injustiça grave ou notória, desde que o erro não seja imputável a comportamento negligente do contribuinte.” (sublinhado nosso).

  1. É verdade que a própria AT resolveu, no seu ofício circulado nº 002 802/2002, esclarecer esse requisito do art. 78º, 4 da LGT: “O carácter excepcional previsto na norma legal tem mais a ver com as características incomuns das situações que a lei visa tutelar, do que propriamente com a prerrogativa ou privilégio concedido ao dirigente máximo do serviço para autorizar tal revisão, a qual deve ser sempre autorizada, caso se verifique os requisitos previstos na lei.”.
  2. Dado que hoje é pacífico na jurisprudência que o “pode autorizar” espelha um poder-dever e não exclui a própria iniciativa do particular no impulso a essa revisão, a interpretação do ofício circulado perdeu utilidade: porque remete para outro requisito de aplicação da norma e se esgota nele, o de ocorrer injustiça grave e notória, o que sempre se presumirá constituir uma situação excepcional.
  3. Na economia do artigo 78º, o “excepcionalmente” do nº 4 tem objectivamente outro alcance, que é o de contrastar esse regime de revisão com os outros dois previstos no mesmo artigo, nos seus n.os 1 e 6, e que nenhum deles aparece com essa qualificação: a revisão com fundamento em erro imputável aos serviços, por um lado, e a revisão por motivo de duplicação de colecta, por outro.
  4. Porquê, então, esse carácter excepcional da revisão prevista no nº 4 do art. 78º da LGT?
  5. É que, por uma vez, olha-se para um resultado, e reage-se a esse resultado independentemente da imputação desse resultado à conduta da AT, o que já não sucede nas hipóteses dos n.os 1 e 6 do mesmo artigo.
  6. Compreende-se, por isso, a especial cautela que há que ter no recurso a essa solução, e a necessidade de fundamentação rigorosa, e de observância estrita dos seus pressupostos, sem concessões nem analogias – estas vedadas pela própria natureza excepcional desta solução.

 

III. C. 2. B. A QUESTÃO DA NEGLIGÊNCIA

 

  1. Feita esta observação, vejamos, com o rigor suplementar que se impõe, se está verificado o último pressuposto estabelecido pela norma: “desde que o erro não seja imputável a comportamento negligente do contribuinte”.
  2. Está verificado este pressuposto? Manifestamente – não está.
  3. Não estando verificado este pressuposto, e dada a excepcionalidade desta via, que não dispensa, insistamos, a verificação rigorosa de todos os seus requisitos, que são cumulativos, fecha-se esta porta, e o pedido da Requerente tem de improceder.
  4. A Requerente assume, como já o fazia no pedido de revisão, que o erro é seu, resulta de conduta sua e não é atribuível a qualquer conduta ou informação da AT – e apenas procura sublinhar que a sua conduta não é censurável, ou é desculpável, ou foi seguida de um esforço espontâneo de reparação da sua parte.
  5. Para defender-se com a sugestão de que se trata de uma “culpa levíssima”, ou porventura até de uma ausência de culpa, a Requerente alega ter, na sua conduta, revelado a diligência do homem médio, do “bom pai de família”, ou seja, do contribuinte mediano que, no cumprimento dos deveres acessórios da relação tributária, está exposto a falhas, a erros, a lapsos, a insuficiências informativas e a vieses cognitivos, quando confrontado, nomeadamente, com a complexidade dos sistemas contabilísticos, ou, mais especificamente ainda, com a sucessão de padrões contabilísticos.
  6. Sem desprimor para a argumentação defensiva, que se compreende, impõe-se reconhecer que a Requerente não é um sujeito passivo qualquer: é uma grande empresa, um grande contribuinte, sendo de esperar que, no decurso normal da sua actividade, recorra a um capital humano e técnico que a compagine com as mais recentes e sofisticadas exigências de cumprimento de deveres contabilísticos e tributários – até para evitar consequências económicas negativas de algum incumprimento de tais deveres, como se afigura ser o caso presente.
  7. A Requerente é um contribuinte de elevada relevância económica e fiscal, para efeitos do art. 68º-B da LGT, e o seu nome consta do Cadastro dos Grandes Contribuintes (Anexo I do Despacho n.º 7048/2022, de 2 de Junho, DR, 2ª série – Parte C, nº 107, p. 70), sendo o seu acompanhamento permanente assegurado pela Unidade dos Grandes Contribuintes da AT (ver, também, Portaria n.º 318/2021, de 24 de Dezembro).
  8. Não se afigura, pois, justificável, ou até verosímil, que a Requerente não disponha de meios internos, ou não consiga mobilizar meios externos, para assegurar o pontual cumprimento de tais deveres através de sistemas de controlo operacional, demorando, pelo contrário, três anos a detectar meros “erros” contabilísticos que poderiam, ou deveriam, ser objecto de uma detecção automática por sistemas de auditoria informatizados.
  9. Há assim, claramente, uma conduta abaixo do standard exigível a um contribuinte com as características da Requerente – que, insista-se, não é de modo algum o contribuinte “homem médio” –.
  10. E em resultado dessa conduta, por força do não-preenchimento dos pressupostos cumulativos do art. 78º, 4 da LGT, as autoliquidações consolidaram-se na ordem jurídica, não podendo, agora, haver lugar a revisão oficiosa por não estar em causa nem um erro imputável aos serviços, nem uma questão relativa à quantificação da matéria colectável, nem uma situação de injustiça não imputável ao sujeito passivo[1].

 

III. C. 2. C. QUESTÕES PREJUDICADAS

 

  1. Quanto às alegadas violações, seja do princípio da tributação segundo o lucro real, seja dos princípios da proporcionalidade e justiça, elas perdem o significado perante a inaplicabilidade do art. 78º, 4 da LGT. Sem embargo do que diremos adiante sobre considerações equitativas de conveniência ou de oportunidade, há que reconhecer que a invocação daqueles princípios não pode servir para afastar o regime do art. 78º, 4 – até em razão da já assinalada excepcionalidade desse regime.
  2. O que a Requerente pretende, com a invocação de tais princípios, só pode ser uma de duas coisas:
    1. ou uma decisão segundo a equidade, que já veremos que está vedada;
    2. ou a desconsideração do próprio art. 78º, 4 da LGT, com a sugestão de que ele comporta uma violação de princípios constitucionalmente tutelados, e, logo, é inconstitucional.
  3. Ora a verdade é que a Requerente, com prudência, se limita a sugerir ambas as soluções, mas não assume expressamente qualquer delas.
  4. Retenhamos, para já, que a invocação do princípio da tributação segundo o lucro real, e a dos princípios da proporcionalidade e justiça, não perturba a aplicação estrita do art. 78º, 4 da LGT, devendo, ao invés, presumir-se que a solução legal incorpora aqueles princípios e espelha já a respectiva ponderação: “Na fixação do sentido e alcance da lei, o intérprete presumirá que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados”, como estabelece o art. 9º, 3 do Código Civil.

 

III. C. 2. D. O PRINCÍPIO DO INQUISITÓRIO

 

  1. Quanto à alegada violação do princípio do inquisitório plasmado no art. 58º da LGT, por falta de uma diligência instrutória da parte da AT, comecemos por reconhecer a preeminência do princípio da verdade material em direito tributário, um princípio que, não sendo absoluto (bastando pensar-se na chamada avaliação indirecta - art. 83º, 2 e arts. 87º segs. da LGT), é a própria base do princípio da cooperação, consagrado no art. 59º da LGT[2], e é a razão de ser e o alicerce da revisão dos actos tributários, prevista no art. 78º LGT, uma das garantias procedimentais mais importantes dos contribuintes, e uma poderosa salvaguarda contra erros.
  2. Por seu lado, o princípio do inquisitório é um corolário da subordinação da actividade administrativa à prossecução do interesse público, e da subordinação ao dever de imparcialidade (arts. 55º da LGT e 266º da Constituição), e está consagrado no art. 58º da LGT: “A administração tributária deve, no procedimento, realizar todas as diligências necessárias à satisfação do interesse público e à descoberta da verdade material, não estando subordinada à iniciativa do autor do pedido” (sublinhado nosso).
  3. Lido correctamente, o artigo impõe à AT, antes de tudo o mais, um juízo de necessidade: deve ponderar-se se uma diligência é necessária (adequada, útil) para se alcançar o duplo objectivo da satisfação do interesse público e da descoberta da verdade material.
  4. Só em função desse primeiro juízo é que a AT fica obrigada, por razões que se prendem com o dever de imparcialidade, a realizar todas as diligências que tenham sido consideradas como necessárias (por uma avaliação sua que é contenciosamente sindicável), e a não se escudar numa espera da iniciativa do contribuinte (como se se tratasse de acatamento do princípio dispositivo em processo).
  5. Em contrapartida, nunca pode presumir-se que uma diligência é necessária; essa necessidade deve resultar do próprio regime jurídico.
  6. Como se refere na fundamentação da decisão no Proc. nº 294/2019-T do CAAD, “em geral, haverá uma margem de livre apreciação da Autoridade Tributária e Aduaneira sobre as diligências que são de considerar potencialmente úteis”.
  7. Provada a necessidade de uma diligência (necessidade que, insista-se, não se presume), a sua omissão poderá representar uma violação dos princípios do inquisitório e da imparcialidade, afectando os pressupostos probatórios em que assenta a decisão procedimental – além de que, do dever de realizar todas as diligências, decorre o dever de ponderar, na decisão procedimental, o valor probatório dos factos através delas apurados, chegando-se, por essa via, ao erro de direito na aplicação da regra do ónus da prova, em desfavor da AT (devendo lembrar-se que, a montante do ónus da prova, a AT está obrigada pelo princípio do inquisitório).
  8. No caso: era necessária, no procedimento desencadeado pelo pedido de revisão, a prova testemunhal então oferecida? Não podia a AT alegar que se tratava de uma diligência desnecessária, por redundante face à prova documental e face à própria admissão de que existira um erro, uma falha, uma omissão? Não podia a AT considerar desnecessária essa prova testemunhal, se ela visasse demonstrar a desculpabilidade de um erro – e essa alegada desculpabilidade fosse tida por irrelevante no quadro legal aplicável?
  9. Como lapidarmente se estabelece na fundamentação da decisão no Proc. nº 652/2021-T do CAAD, “afigura-se claro que o princípio do inquisitório não tem por escopo suprir falhas das partes, designadamente nas hipóteses em que estas não procedem ao cumprimento de deveres declarativos ou à impugnação oportuna de atos tributários”.
  10. Mais precisamente ainda: poderia o recurso a uma prova testemunhal, ou a uma outra qualquer diligência probatória, alicerçar a dispensa de verificação de um dos pressupostos cumulativos de aplicação de um regime excepcional como o é o do art. 78º, 4 da LGT?
  11. Encontremos uma resposta na fundamentação da decisão no Proc. nº 413/2022-T do CAAD, que lidou com uma questão similar: “a verdade é que o acesso à justiça ou o direito à tutela judicial efetiva não é um direito absoluto, devendo articular-se em conformidade com outros princípios e valores fundamentais da ordem jurídica constitucional, como a certeza e a segurança jurídicas, ao serviço dos quais se encontra a fixação de prazos de acesso aos tribunais. Acresce que a existência de prazos legais de acesso aos tribunais também serve o princípio da igualdade de tratamento, não podendo olvidar-se que os princípios da justiça, da igualdade e da legalidade que enformam a atividade da AT impõem a correção oficiosa (como remédio último), mas desde que verificados os respetivos pressupostos. E nunca a mero título de uma alegada prevalência da justiça material sobre a forma. A prevalecer este entendimento facilmente se cairia no arbítrio”.
  12. Regressando ao plano do procedimento, caberá reconhecer que, perante a admissão do que se passara, e que objectivamente configura negligência, e perante a indiferença, no critério legal da norma aplicável, a qualquer graduação dessa negligência (consciente, inconsciente, desculpável, não-desculpável), a formalidade da obtenção do depoimento de uma testemunha, que assumidamente procuraria demonstrar algo sobre essa graduação da negligência, já tida por normativamente irrelevante, não iria alterar em nada, no juízo da AT, acerca do sentido da decisão a tomar quanto ao pedido de revisão apresentado.
  13. Mesmo numa perspectiva dita “garantística”, não pode escamotear-se a prioridade de um juízo de necessidade e de adequação na obtenção da prova.
  14. Por outras palavras, a AT não fica subordinada a ter que aceitar toda e qualquer prova que um interessado queira apresentar-lhe, sob pena de deixar-se enredar em actos inúteis e em esforços fúteis: “A eventual degradação da formalidade em questão em formalidade não essencial, preservando a legalidade do ato final do procedimento, apenas é de aceitar quando se possa concluir que a realização das diligências instrutórias ilegitimamente omitidas levaria à corroboração da base factual fixada sem a realização das mesmas[3].
  15. É, de resto, a aplicação do princípio geral consagrado no art. 58º do Código do Procedimento Administrativo:

O responsável pela direção do procedimento e os outros órgãos que participem na instrução podem, mesmo que o procedimento seja instaurado por iniciativa dos interessados, proceder a quaisquer diligências que se revelem adequadas e necessárias à preparação de uma decisão legal e justa, ainda que respeitantes a matérias não mencionadas nos requerimentos ou nas respostas dos interessados” (sublinhado nosso).

  1. O primeiro juízo a formular-se é, insistamos, um juízo de necessidade; e a ideia de que a administração deve admitir toda a prova já fica circunscrita à prova necessária (ou adequada, ou útil), permitindo prescindir daquela que o não seja.
  2. E é nesses termos que devem ser interpretadas, no âmbito do direito tributário, normas procedimentais (art. 63º, 1 da LGT, art. 6º do RCPITA) e normas processuais (art. 99º, 1 da LGT, art. 13º do CPPT).
  3. Em suma, não se afigura que a diligência instrutória preterida no procedimento nascido do pedido de revisão fosse essencial, necessária, adequada ou útil, ou que a sua não-preterição conduzisse, de alguma forma, a um desfecho diverso daquele que concluiu o referido procedimento.
  4. Não ocorreu aí, portanto, violação do princípio do inquisitório.

 

III. C. 2. E. A JUSTIÇA DO CASO CONCRETO E A VEDAÇÃO DA EQUIDADE

 

  1. A Requerente desdobra-se em apelos à justiça do caso concreto:
    1. Sugere que a “injustiça grave ou notória” resultante do indeferimento do pedido de revisão oficiosa constitui uma “punição” da negligência.
    2. Procura excluir qualquer nota de censurabilidade ou de culpabilidade para afastar, na especificidade do caso, a própria negligência, que alega dever se casuisticamente aferida (embora procure escudar-se no padrão abstracto de diligência do “homem médio”).
    3. Diz-se “vítima das circunstâncias”, para enfatizar a desculpabilidade da sua conduta.
    4. Chama a atenção para a diligência e boa fé com que procurou corrigir a situação de erro contabilístico quando se apercebeu dela.
    5. Apela à tributação do lucro real e à consideração da capacidade contributiva para tentar contornar, no caso concreto, as consequências económicas da aplicação da norma.
    6. Especificamente apela a factores “matizadores” da rigidez da aplicação da lei fiscal, como a ausência de prejuízo ao erário público no caso concreto, ou a superação do princípio da especialização dos exercícios quando da sua aplicação resultem, como “consequências práticas”, injustiças no caso concreto.
    7. E por fim, apela (implicitamente) à equidade lembrando os efeitos gravosos de um indeferimento do seu pedido: ““na interpretação e aplicação da lei fiscal, não pode o intérprete alhear-se das consequências práticas que a recusa de relevação fiscal destes gastos no exercício de 2018 tem para a esfera da Requerente[4]
  2. Tudo convites à consideração da justiça do caso concreto, à justiça material em torno dos efeitos da autoliquidação alegadamente errónea, e dos efeitos do indeferimento do pedido de revisão oficiosa dessa autoliquidação.
  3. Cabe, então, perguntar: será este resultado, consolidado na ordem jurídica, materialmente injusto?
  4. Poderíamos até admiti-lo – embora, depois das observações jurídico-contabilísticas apresentadas pela Requerida no seu requerimento de 11 de Maio de 2023, não consigamos ter a certeza de qual o sentido em que essa materialidade se traduz: se no sentido de coincidência com a liquidação legalmente devida, se no sentido do excesso ou do defeito em relação àquilo que devia ter resultado da aplicação correcta do quadro normativo.
  5. Sucede que essa materialidade eventualmente injusta não pode ser apreciada por este tribunal arbitral, pois, nos termos do art. 2º, 2 do RJAT,

Os tribunais arbitrais decidem de acordo com o direito constituído, sendo vedado o recurso à equidade”.

  1. E é de prevalência da equidade sobre a legalidade estrita que se trataria, se ousássemos embrenhar-nos em considerações de conveniência ou oportunidade, mesmo em casos em que a lei incluísse ponderações equitativas na própria norma[5] – como ocasionalmente o faz no Código Civil, por exemplo[6].
  2. O art. 4º do Código Civil está, portanto, vedado aos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD, e isto porque “A resolução dos casos segundo a equidade contrapõe-se à resolução dos casos segundo o direito estrito. Pode haver regras e haver equidade, quando o juiz estiver autorizado a afastar-se da solução legal e a decidir de harmonia com as circunstâncias do caso concreto[7].
  3. Assim, não cabe a este tribunal ponderar, na sua decisão, “razões de conveniência e de oportunidade, principalmente de justiça concreta, em que a equidade se funda[8].
  4. Isto mesmo que, em concreto, não se trate de corrigir uma norma inadequada, ou de afastar o critério legal, ou de testar os limites da plasticidade decisória, mas tão-somente de utilizar o ex aequo et bono como “instrumento de concretização de uma determinada quantificação, mediante a ponderação das circunstâncias do caso concreto[9].
  5. Aliás, mesmo que a equidade estivesse autorizada pelo RJAT, isso não quer dizer que a decisão fosse necessariamente diversa daquela que, em estrito acatamento do direito constituído, este Tribunal tomará: seja por causa das dúvidas suscitadas pelas observações jurídico-contabilísticas apresentadas pela Requerida no seu requerimento de 11 de Maio de 2023, seja pela interpretação literal do que está disposto no art. 78º, 4 da LGT, e que sempre balizaria qualquer decisão de qualquer tribunal “a prevalência da equidade sobre a legalidade estreita, nas providências que o tribunal tome, não vai obviamente ao ponto de se permitir a postergação de normas imperativas aplicáveis à situação[10].
  6. Em suma, também neste ponto não é possível atender às pretensões da Requerente.
  7. Foram conhecidas e apreciadas as questões relevantes submetidas à apreciação deste Tribunal, não o tendo sido aquelas cuja decisão ficou prejudicada pela solução dada a outras, ou cuja apreciação seria inútil – art. 608º do CPC, ex vi art. 29º, 1, e) do RJAT.

 

IV. Decisão

 

Nos termos expostos, acordam neste Tribunal Arbitral em:

 

  1. Julgar improcedente a excepção apresentada pela Requerida.
  2. Julgar improcedente o pedido de pronúncia arbitral, mantendo na ordem jurídica a liquidação de IRC n.º 2020 ... e a decisão de indeferimento do pedido de revisão oficiosa apresentado contra ela;
  3. Absolver a Autoridade Tributária e Aduaneira do pedido formulado;
  4. Condenar a Requerente no pagamento das custas do processo.

 

V. Valor do processo

 

Fixa-se o valor do processo em € 461.988,75 (quatrocentos e sessenta e um mil, novecentos e oitenta e oito euros e setenta e cinco cêntimos), nos termos do disposto no art.º 97.º-A do CPPT, aplicável ex vi art.º 29.º, n.º 1, alínea a), do RJAT e art.º 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processo de Arbitragem Tributária (RCPAT).

 

VI. Custas

 

Custas no montante de € 7.344,00 (sete mil, trezentos e quarenta e quatro euros) a cargo da Requerente (cfr. Tabela I, do RCPAT e artigos 12.º, n.º 2 e 22.º, n.º 4, do RJAT).

 

Lisboa, 3 de Agosto de 2023

 

Os Árbitros

 

 

Fernando Araújo

 

 

 

Sofia Quental

 

 

 

Rui Manuel Correia de Pinho

 

 



[1] Veja-se um caso similar, com uma decisão no mesmo sentido, no Proc. nº 457/2022-T do CAAD.

[2] Também no âmbito processual, no sentido específico de que não cabe ao juiz substituir-se à parte no pedido de realização de diligências probatórias, sob pena de se violar o princípio da igualdade das partes.

[3] Matos, Pedro Vidal (2010), O Princípio Inquisitório no Procedimento Tributário, Coimbra, Wolters Kluwer / Coimbra Editora, 147.

[4] § 72 das alegações.

[5] Cordeiro, António Menezes (1990), “A Decisão segundo a Equidade”, O Direito, 122/2, 270.

[6] Entre outros, artigos 72º, 283º, 339º, 2, 400º, 437º, 1, 462º, 489º, 1, 494º, 496º, 3, 566º, 3, 812º, 992º, 3, 993º, 1, 1158º, 2, 1215º, 2, 1407º, 2, 1675º, 3 e 2016º, 3.

[7] Ascensão, José de Oliveira (2008), O Direito - Introdução e Teoria Geral, 13.ª ed., Coimbra, Almedina, 247.

[8] Lima, Pires de & Antunes Varela (1987), Código Civil Anotado, 4.ª ed., Coimbra, Coimbra Editora, I, 54.

[9] Ascensão, José de Oliveira (2008), O Direito - Introdução e Teoria Geral, 13.ª ed., Coimbra, Almedina, 251.

[10] Varela, João de Matos Antunes, J. Miguel Bezerra & Sampaio e Nora (1985), Manual de Processo Civil, 2.ª ed., Coimbra, Coimbra Editora, 72.