Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 450/2016-T
Data da decisão: 2016-11-29  Selo  
Valor do pedido: € 11.426,10
Tema: IS- Verba 28.1 da TGIS.
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Decisão Arbitral

 

 

 

I.                   RELATÓRIO

 

A…, S.A, doravante Requerente, apresentou um pedido de constituição do Tribunal Arbitral singular, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 2.º e 10.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, doravante apenas designado por RJAT), em que é Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira (adiante AT), com o objectivo de obter a declaração de ilegalidade do acto de liquidação de Imposto do Selo relativo ao ano 2015, no valor total de €11.426,10.

 

 

O pedido de constituição do Tribunal Arbitral foi aceite pelo Ex.mo Presidente do CAAD em 19.08.2016 e automaticamente notificado à AT.

 

Em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, o Tribunal Arbitral singular foi constituído em 19.10.2016.

 

A AT respondeu, defendendo a incompetência do Tribunal Arbitral e a improcedência do pedido.

 

Foi dispensada a reunião a que se refere o artigo 18.º do RJAT e a realização de alegações finais, em face do teor da matéria contida nos autos.

 

O Tribunal Arbitral encontra-se regularmente constituído e é materialmente competente, nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º do RJAT.

 

As partes gozam de personalidade e capacidade judiciária, são legítimas e estão representadas (artigo 4.º, e n.º 2 do artigo 10 do RJAT e artigo 1.º da Portaria n.º 112/2011, de 22 de Março).

 

Não ocorrem quaisquer nulidades, excepções ou questões prévias que obstem ao conhecimento imediato do mérito da causa.

 

II.                MATÉRIA DE FACTO

 

Com base nos elementos que constam do processo junto aos autos, consideram-se provados os seguintes factos:

 

A)    O Requerente é dono e legítimo proprietário do prédio urbano inscrito na matriz predial urbana da freguesia de …, concelho e distrito de Coimbra, sob o artigo…;

 

B)    O referido prédio esta constituído em propriedade total e é composto por 18 andares e divisões independentes, entre os quais 9 são afectas a habitação;

 

C)    O Requerente foi notificado, no montante total de €11.426,10 (onze mil, quatrocentos e vinte e seis Euros e dez cêntimos), dos actos de liquidação de IS, referentes ao prédio identificado, relativos ao ano 2015, que constam dos documentos n.º 1 a 27 junto aos autos pelo Requerente;

 

D)    Os andares e divisões independentes com afectação habitacional foram objecto de liquidação de IS, sendo o Valor Patrimonial Tributário (VPT) global superior a €1.000.000 (um milhão de euros);

 

E)    O VPT dos andares e divisões identificados foi determinado separadamente, nos termos do disposto no artigo 7.º, n.º 2, alínea b) do Código de Imposto Municipal sobre Imóveis (IMI);

 

F)     O Requerente apresentou um pedido de pronúncia arbitral do acto de liquidação de IS relativo ao ano 2015, no valor total de €11.426,10.

 

Não existem factos com relevo para a decisão da causa que devam considerar-se não provados.

 

Este Tribunal firmou a sua convicção na consideração dos documentos juntos aos autos pelas Partes.

 

III.             MATÉRIA DE DIREITO

 

A principal questão que se coloca nos presentes autos reconduz-se a saber qual é o VPT relevante para efeitos de aplicação da verba 28 e 28.1 da Tabela Geral do Imposto do Selo (TGIS) relativamente ao prédio urbano habitacional constituído em regime de propriedade vertical, que integra andares ou divisões susceptíveis de utilização independente, devidamente identificado nos autos.

 

A este propósito, a Requerente alega no seu pedido de pronúncia arbitral o seguinte:

 

  1. As liquidações de IS sub judice decorreram da consideração do VPT total dos “andares e divisões com utilização independente” afectos à habitação – e não do VPT de cada um dos “andares e divisões com utilização independente” afectos à habitação, individualmente considerados;

 

  1. Sucede que, para efeitos de IMI, a situação normal dos prédios urbanos não assume qualquer relevância, não distinguindo a lei consoante os mesmos se encontrem em propriedade horizontal – formalmente divididos em fracções autónomas – ou em propriedade vertical – formalmente constituídos por andares ou partes com utilização independente;
  2. Ora, não sendo distinguido o enquadramento em IMI consoante o prédio urbano esteja ou não em propriedade vertical, tal distinção não poderá jamais ser considerada para aplicação da verba 28.1 da TGIS;

 

  1. Assim, também na aplicação da verba 28.1 deve ser considerado isoladamente “cada andar ou parte de prédio susceptível de utilização independente”, enquanto uma realidade autónoma, com uma inscrição própria na matriz e com um VPT individual.

 

 

  1. Pelo que, considerar, para efeitos de aplicação da referida verba 28.1 da TGIS, o VPT resultante do somatório dos valores patrimoniais dos andares ou divisões susceptíveis de utilização independente (propriedade total) será sempre contrário à lei.

 

  1. Acresce que a alegada diferenciação entre prédios em propriedade horizontal e prédios em propriedade vertical – pretendida (e aplicada) pela AT – não resulta do espirito subjacente à criação da tributação especial prevista na verba 28.1. da TGIS.

 

  1. O legislador teve intenção de tributar prédios urbanos com afectação habitacional, especificamente “casas” com VPT superior a €1.000.000, independentemente de estar em causa uma moradia, uma “fracção autónoma” de um prédio em propriedade horizontal ou um “andar ou parte com utilização independente” de um prédio em propriedade vertical;

 

  1. Pelo que não poderá jamais a AT – para efeito de aplicação da referida verba 28 – tomar em consideração o VPT do prédio em que as “casas” se inserem – este superior a €1.000.000 – e, partindo, desse valor global, tributar em IS cada uma das “casas”, todas de valor patrimonial individual inferior a €1.000.000;

 

 

  1. No caso concreto, todos os “andares e partes suscetíveis de utilização independente” dos prédios aqui em análise (afectos à habitação) têm um VPT inferior a €1.000.000;

 

  1. Deste modo, a verba 28.1 da TGIS não pode ser aplicada sobre aqueles “andares e partes susceptíveis de utilização independente”.

 

 

  1. A título subsidiário, entende a Requerente que a tributação especial prevista na verba 28 da TGIS é contrária ao princípio basilar da igualdade, consagrado no artigo 13.º da Constituição da República Portuguesa (CRP) e, em paralelo, contrária ao princípio da igualdade fiscal e da capacidade contributiva consagrados no artigo 104.º, n.º 3 da CRP;

 

  1. De facto, não sujeitando aquela norma a tributação os prédios urbanos que não estejam afectos a habitação, diferencia os contribuintes sem atender à respectiva capacidade contributiva;

 

 

  1. Atento o exposto, requer-se, a título subsidiário, seja a verba 28 da TGIS desaplicada porque manifestamente inconstitucional e, em consequência, sejam as liquidações de IS anuladas.

 

Por sua vez a AT alega, em síntese, o seguinte:

 

  1. Por excepção: o Requerente não impugna um acto tributário, mas impugna, antes, o pagamento de um acto tributário constante de um documento que é uma nota de cobrança, isto é, o objecto do processo é a anulação não de um acto tributário, mas sim de notas de cobrança para o pagamento de um imposto; Matéria esta, que não consta, em absoluto, do conjunto da norma que delimita a competência dos tribunais arbitrais tributários, constante do artigo 2.º do RJAT;

 

  1. O acto objecto de pedido de pronúncia arbitral extravasa a competência do Tribunal arbitral;
  2. Por impugnação: o Requerente é proprietário de um prédio em regime de propriedade total ou vertical. Da noção de prédio do artigo 2.º do CIMI, só as fracções autónomas de prédio em regime de propriedade horizontal são havidas como prédios - n.º 4 do citado artigo 2.º do CIMI. Logo,

 

  1. Encontrando-se o prédio de que é proprietário, em regime de propriedade total, não possui fracções autónomas, às quais a lei fiscal atribui a qualificação de prédio.

 

 

  1. Assim, o Requerente, para efeitos de IMI e também de IS, por força da redacção da referida verba, não é proprietário de 20 fracções autónomas, mas sim de um único prédio;

 

  1. A lei fiscal não comporta qualquer lacuna, pois, o Código do IMI determina que no regime da propriedade horizontal as fracções constituem prédios. Não estando o prédio submetido a este regime, juridicamente as fracções são partes susceptíveis de utilização independente, sem que haja partes comuns;

 

  1. Não podemos, pois, aceitar que se considere, que para efeitos da verba 28.1 da Tabela Geral anexa ao CIS, que as partes susceptíveis de utilização independente tenham o mesmo regime fiscal das fracções autónomas do regime da propriedade horizontal;

 

  1. Um tipo de incidência de acordo com o qual o VPT dos prédios urbanos de que depende a aplicação da verba 28.1. da TGIS é o valor patrimonial de cada andar ou divisão susceptível de utilização independente e não o valor patrimonial tributário global do prédio urbano com afectação habitacional não tem seguramente qualquer expressão na lei.

 

 

  1. É, assim, inconstitucional, por ofensiva do princípio da legalidade tributária, a interpretação da verba 28.1. da TGIS, no sentido de o valor patrimonial de que depende a sua incidência ser apurado globalmente e não andar a andar ou andar ou divisão a divisão.

 

  1. Por fim, saliente-se, que a inscrição matricial de cada parte susceptível de utilização independente não é autónoma, por matriz, mas consta da uma descrição na matriz do prédio na sua totalidade - veja-se a caderneta predial deste prédio que representa o documento do proprietário contendo os elementos matriciais do prédio dado que, como cabalmente demonstrado, inexiste “in casu” erro imputável aos serviços, não há lugar ao pagamento de juros indemnizatórios.

 

  1.  Mas, ainda que se viesse a considerar procedente o pedido de juros indemnizatórios, o que se admite por mera hipótese e sem conceder, o seu pagamento seria enquadrável no n.º 3, alínea c) do artigo 43.º da LGT, o qual determina que nas situações de revisão do acto tributário por iniciativa do contribuinte são devidos juros indemnizatórios apenas a partir de um ano após a apresentação do pedido de revisão.

 

Vejamos o que deve ser entendido.

 

A – Das excepções invocadas pela AT

 

Na resposta apresentada, vem a AT defender-se por excepção, alegando por um lado que o presente Tribunal é incompetente para a apreciação do pedido formulado, que é, no seu entender, uma nota de cobrança e, por outro lado, que os documentos de cobrança de IS sub judice não são impugnáveis.

Sobre a competência do Tribunal Arbitral prescreve a alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º do RJAT que os tribunais arbitrais são competentes para apreciar as pretensões de declaração de ilegalidade de actos de liquidação de tributos, de autoliquidação, de retenção na fonte e de pagamento por conta.

Por seu turno, quanto à vinculação da administração tributária à jurisdição dos tribunais arbitrais, dispõe o n.º 1 do artigo 4.º do citado regime que esta depende de portaria dos membros do Governo responsáveis pelas áreas das finanças e da justiça.

A competência da instância arbitral encontra-se, assim, delimitada, pela portaria de vinculação da Administração Tributária à jurisdição do Centro de Arbitragem Administrativa (Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março).

Nos termos do disposto no artigo 2.º da indicada Portaria, a Direcção-Geral dos Impostos e a Direcção-Geral das Alfândegas e dos Impostos Especiais sobre o Consumo vinculam-se à jurisdição dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD que tenham por objecto a apreciação das pretensões relativas a impostos cuja administração lhes esteja cometida, referidas no n.º 1 do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (RJAT), nas quais expressamente se incluem as pretensões de declaração de ilegalidade de actos de liquidação de tributos, de autoliquidação, de retenção na fonte e de pagamento por conta.

Conclui-se, assim, que o processo arbitral tributário tem por objecto, mediato ou imediato, o acto tributário de liquidação, enquanto acto de determinação do quantitativo do imposto a pagar (colecta), por aplicação de uma taxa à matéria colectável.

A apreciação das excepções suscitadas depende, por isso, da questão de saber se o Requerente impugna o acto de liquidação de Imposto do Selo (IS) ou se, ao invés disso, se limita a impugnar cada uma das prestações de IS de per si.

Ora, nos casos em que o imposto deva ser pago em prestações, a liquidação é notificada ao sujeito passivo conjuntamente com a notificação para pagamento de cada uma das prestações, apenas podendo ser impugnada na sua totalidade e não prestação a prestação.

A este respeito, elucida o ilustre Professor José Casalta Nabais, in Direito Fiscal, 3ª Edição, Almedina, 2005 “A liquidação lato sensu, ou seja, enquanto conjunto de todas as operações destinadas a apurar o montante do imposto, compreende: 1) O lançamento subjectivo destinado a determinar ou identificar o contribuinte ou sujeito passivo da relação jurídico-fiscal, 2) O lançamento objectivo através do qual se determina a matéria colectável ou tributável do imposto e, bem assim, se determina a taxa a aplicar, no caso de pluralidade de taxas, 3) A liquidação stricto sensu traduzida na determinação da colecta através da aplicação da taxa à matéria colectável ou tributável, e 4) as (eventuais) deduções à colecta.”.

Para cada facto tributário haverá, em princípio, uma única liquidação, pela qual se determinará a colecta a pagar.

Nestes termos, dispõe o n.º 7 do artigo 23.º do Código do Imposto do Selo que “tratando-se do imposto devido pelas situações previstas na verba nº 28 da Tabela Geral, o imposto é liquidado anualmente (…)” aplicando-se, com as necessárias adaptações, as regras contidas no CIMI”.

No mesmo sentido, dispõe ainda o n.º 5 do artigo 44.º do CIS que “havendo lugar a liquidação do imposto a que se refere a verba n.º 28 da Tabela Geral, o imposto é pago nos prazos, termos e condições definidos no artigo 120.º do CIMI”.

Ou seja, nos termos do n.º 2 do artigo 113.º do CIMI, “a liquidação (…) é efetuada nos meses de fevereiro e março do ano seguinte”, devendo o imposto ser pago, em três prestações, nos meses de abril, julho e novembro, atento o seu quantitativo – cfr. al. c), n.º 1 do artigo 120.º do CIMI.

Da conjugação das disposições legais supra citadas retira-se que o IS é liquidado anualmente, não sendo o pagamento em prestações mais do que uma técnica de arrecadação do imposto e não um seu pagamento parcial, tal como se refere na decisão arbitral proferida no âmbito do processo n.º 408/2014-T, disponível em www.dgsi.pt, citada pela AT.

Desta feita, a liquidação é só uma e só ela constitui acto lesivo, susceptível de ser impugnado.

Dito isto, da análise da petição arbitral resulta que o Requerente requer a constituição do tribunal arbitral singular para se pronunciar sobre a ilegalidade dos actos de liquidação de imposto de selo emitidos pela Autoridade Tributária e Aduaneira, ou seja, requer-se a declaração de ilegalidade do acto tributário de liquidação de IS, a que correspondem as respectivas prestações de pagamento.

Do exposto resulta que, ao contrário do que refere a AT, o objecto do pedido de pronúncia arbitral é o acto tributário de liquidação e não cada uma das prestações de IS individualmente consideradas.

Tanto assim é que o Requerente, na delimitação do objecto da acção arbitral, circunscreve a instauração do respectivo processo à anulação do acto de liquidação de IS relativo ao ano de 2015, indicando como valor da utilidade económica do pedido o valor global da liquidação de IS.

Assim, muito embora o Requerente associe o acto tributário de liquidação às prestações de IS, procedendo à sua junção e identificação, o certo é que aquele não circunscreve o objecto do pedido de pronúncia arbitral a nenhuma das prestações de IS em particular, mas sim à liquidação anual do IS.

Soçobra, por isso, a argumentação invocada pela AT relativamente à incompetência do tribunal arbitral, bem como à inimpugnabilidade dos actos, alicerçada na alegada impugnação por parte do Requerente de meras notas de cobrança e não do próprio acto tributário de liquidação.

Em face do exposto, e sem necessidade de mais considerações, julgam-se improcedentes as excepções de incompetência material do tribunal arbitral e de inimpugnabilidade dos actos.

 

B – Da interpretação da Verba 28.1 da TGIS

 

Resulta do artigo 11.º da Lei Geral Tributária (LGT) que a interpretação da lei fiscal deve ser efectuada atendendo aos princípios gerais de interpretação.

 

Os principais gerais de interpretação estão estabelecidos no artigo 9.º do Código Civil (CC), nos seguintes termos:

 

 

“1. A interpretação não deve cingir-se à letra da lei, mas reconstituir a partir dos textos o pensamento legislativo, tendo sobretudo em conta a unidade do sistema jurídico, as circunstâncias em que a lei foi elaborada e as condições específicas do tempo em que é aplicada.

 
2. Não pode, porém, ser considerado pelo intérprete o pensamento legislativo que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso
.


3. Na fixação do sentido e alcance da lei, o intérprete presumirá que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados.”

 

Atendendo às regras de interpretação da Lei, importa saber que a Lei n.º 55-A/2012, de 29 de Outubro, veio aditar à TGIS a verba 28 e 28.1, criando a taxa de IS sobre prédios urbanos de elevado valor patrimonial.

 

A criação deste novo facto tributário ocorreu no contexto de crise económica e de grave crise nas finanças públicas, com o propósito de aumentar as receitas fiscais do Estado, através da tributação daqueles que revelam maiores indicadores de riqueza.

 

A taxa especial de IS sobre os prédios de valor superior a €1.000.000,00, também conhecida como “taxa de luxo”, visou garantir a repartição dos sacrifícios por todos e não apenas por aqueles que vivem do rendimento do seu trabalho.

 

Nestas circunstâncias, fixou a verba 28 e 28.1, a incidência de IS nos seguintes termos:

Propriedade, usufruto ou direito de superfície de prédios urbanos cujo valor patrimonial tributário constante da matriz, nos termos do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (CIMI), seja igual ou superior a €1.000.000 – sobre o valor patrimonial tributário utilizado para efeito de IMI:

28.1. – Por prédio habitacional ou por terreno para construção cuja edificação, autorizada ou prevista, seja para habitação, nos termos do disposto no Código do IMI…… 1%.”

 

Resulta, portanto, da letra da lei que a taxa prevista na verba 28.1 é aplicável ao direito de propriedade sobre prédio com afectação habitacional, cujo VPT utilizado para efeito de IMI seja igual ou superior a €1.000.000,00.

 

De acordo com o disposto no artigo 1.º, n.º 6 do Código do IS, “Para efeitos do presente Código, o conceito de prédio é o definido no Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (CIMI).”

 

 

Por sua vez, o Código do IMI determina no seu artigo 2.º, o seguinte:

 

Conceito de prédio

1 - Para efeitos do presente Código, prédio é toda a fracção de território, abrangendo as águas, plantações, edifícios e construções de qualquer natureza nela incorporados ou assentes, com carácter de permanência, desde que faça parte do património de uma pessoa singular ou colectiva e, em circunstâncias normais, tenha valor económico, bem como as águas, plantações, edifícios ou construções, nas circunstâncias anteriores, dotados de autonomia económica em relação ao terreno onde se encontrem implantados, embora situados numa fracção de território que constitua parte integrante de um património diverso ou não tenha natureza patrimonial. 



2 - Os edifícios ou construções, ainda que móveis por natureza, são havidos como tendo carácter de permanência quando afectos a fins não transitórios. 



3 - Presume-se o carácter de permanência quando os edifícios ou construções estiverem assentes no mesmo local por um período superior a um ano. 


4 - Para efeitos deste imposto, cada fracção autónoma, no regime de propriedade horizontal, é havida como constituindo um prédio.”

 

Tendo em conta o conceito de prédio estabelecido na Lei, é claro que os prédios constituídos em propriedade vertical constituem prédios, para efeitos da verba 28.1 da TGIS.

 

Na medida em que o prédio em análise (doravante Prédio) constitui um Prédio, nos termos previstos no artigo 2.º do Código do IMI, este encontra-se literalmente abrangido pela verba 28 e 28.1.

 

Na verdade, a lei não distingue, em momento algum, entre prédio em propriedade horizontal e prédio em propriedade vertical, limitando-se o n.º 4 do artigo 2.º a estabelecer que no regime da propriedade horizontal cada fracção autónoma é havida como prédio.

 

Do referido no n.º 4 do artigo 2.º não resulta, contrariamente ao defendido pela Requerida na resposta apresentada, que só as fracções autónomas de prédio em regime de propriedade horizontal são havidas como prédios.

 

Não obstante, a taxa especial de IS fixada na verba em questão apenas se aplica caso o Prédio constitua um prédio habitacional, cujo valor patrimonial tributário constante da matriz, nos termos do Código do CIMI, seja igual ou superior a €1.000.000.

 

Uma vez que o Código do IS não estabelece o que se entende por “habitacional”, por força do disposto no n.º 2 do artigo 67.º do referido Código, são, também, aqui aplicáveis as regras previstas no Código do IMI, nomeadamente as estabelecidas nos artigos 6.º e no artigo 41.º desse Código.

 

Da análise das referidas regras, resulta, também, claro que, o Prédio está abrangido pela verba 28.1, enquanto prédio urbano com afectação habitacional.

 

Resta, portanto, averiguar se o VPT constante da matriz do Prédio, nos termos do Código IMI, é igual ou superior a €1.000.000.

 

Ora, conforme decorre da letra da Lei, o VPT do Prédio será aquele que for utilizado para efeito de IMI.

 

A este propósito, determina-se no n.º 1 do artigo 7.º, do Código do IMI, aplicável ex vi do n.º 7 do artigo 23.º, do Código do IS, que “O valor patrimonial tributário dos prédios é determinado nos termos presente Código.”.

 

Por sua vez nos n.º 2 e 3 do artigo 7.º do Código do IMI, estabelecem-se as regras para a determinação do VPT dos prédios com duas ou mais classificações.

 

Uma vez que a taxa prevista na verba 28 e 28.1 da TGIS apenas se aplica a prédios de afectação habitacional, as regras estabelecidas no n.º 2 e 3 do artigo 7.º do Código do IMI não são aplicáveis à determinação do VPT relevante no âmbito da referida verba.

 

Na verdade, o VPT dos prédios de afectação habitacional, previstos na verba 28 e 28.1., tem de ser determinado tendo em conta o n.º 3 do artigo 12.º do Código do IMI, segundo o qual:

Cada andar ou parte de prédio susceptível de utilização independente é considerado separadamente na inscrição matricial, a qual discrimina também o respectivo valor patrimonial tributário.”

 

Assim, tendo em conta que o legislador não atribui qualquer relevância ao facto do prédio estar constituído em regime de propriedade vertical, o VPT deve ser imputado a cada andar ou parte de prédio susceptível de utilização independente.

 

De facto, não se encontra no Código do IMI nenhuma norma que permita concluir no sentido de que o VPT de prédio em regime de propriedade vertical deve ser obtido pela soma dos VPT que foram atribuídos isoladamente às partes que o constituem (Vide, entre outras, as decisões arbitrais proferidas no Processo 50/2013-T, 131/2013-T, 177/2014-T, 396/2014-T).

 

Tendo em conta que as normas de incidência estão sujeitas ao princípio da legalidade tributária (Cfr. Artigo 103.º da Constituição da República Portuguesa (CRP) e artigo 8.º da LGT), parece inexistir base legal à liquidação de IS com base na soma dos VPT de cada uma das partes do Prédio.

 

De facto, a AT não pode realizar uma operação de liquidação com base numa norma de incidência, que não prevê expressamente a base de incidência do imposto nos termos liquidados, pois, que as normas de incidência dos tributos devem ser interpretadas nos seus exactos termos, sem recurso à analogia, tornando prevalente a certeza e a segurança na sua aplicação (Vide Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, proferido no âmbito do proc. 7648/14, de 10.07.2014).

 

Entende-se, assim, que não existe base legal que permita à AT adicionar os valores patrimoniais tributários dos andares ou partes de prédio susceptíveis de utilização independente, por forma a atingir-se o limiar de tributação elegível de €1.000.000,00, previsto na verba 28 da TGIS.

 

Em face do exposto, não tendo nenhum dos andares, susceptíveis de utilização independente VPT superior a €1.000.000,00, não há lugar a incidência da taxa prevista na verba 28 da TGIS.

 

Em consequência, impõe-se a anulação do acto de liquidação de IS sub judice, e o reconhecimento do direito a juros indemnizatórios do Requerente relativamente às prestações de IS pagas, uma vez que a ilegalidade do acto de liquidação é imputável a erro da Requerida, nos termos previstos no artigo 43.º, n.º 1 da LGT.

 

 

IV.             DECISÃO

 

Termos em que este Tribunal Arbitral decide:

 

 

A)    Julgar totalmente procedente o pedido de anulação do acto de liquidação de IS referente ao prédio urbano inscrito na matriz predial urbana da freguesia de …, sob o número …, relativo ao ano 2015;

 

B)    Condenar a Administração Tributária e Aduaneira a restituir ao Requerente o montante de imposto pago, acrescido de juros indemnizatórios, nos termos legais;

 

C)    Condenar a Requerida nas custas do presente processo, por ser a parte vencida.

 

V.                VALOR DO PROCESSO

 

Em conformidade com o disposto no artigo 306.º, n.º 2 do Código de Processo Civil, 97.º-A, n.º 1 a) do CPPT e artigo 3.º, n.º 2 do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, o valor do pedido é fixado em €11.426,10.

 

 

VI.             CUSTAS

 

Nos termos do disposto nos artigos 12.º, n.º 2 e 22.º, n.º 4, ambos do RJAT, e no artigo 4.º, n.º 4 do Regulamento das Custas dos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se o valor da taxa de arbitragem em €918, nos termos da Tabela I do mencionado Regulamento, a cargo da Requerida.

 

 

Notifique-se.

 

Lisboa, 29 de Novembro de 2016

 

A Árbitro

 

 

 

Magda Feliciano

 

(O texto da presente decisão foi elaborado em computador, nos termos do artigo 131.º, n.º 5, do Código de Processo Civil, aplicável por remissão do artigo 29.º, n.º 1, da alínea e) do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (RJAT) regendo-se a sua redacção pela ortografia anterior ao Acordo Ortográfico de 1990).