Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 104/2012-T
Data da decisão: 2013-01-31  IRS  
Valor do pedido: € 23.976,84
Tema: Tributação de mais-valias no caso de aquisição de imóveis efetuada no exercício do direito de opção de compra em contrato de locação financeira
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CENTRO DE ARBITRAGEM ADMINISTRATIVA E TRIBUTARIA


 


 

DECISÃO ARBITRAL


 


 

PROCESSO n.º 104/2012-T


 

Requerentes: A…, e mulher B…

Requerida: Autoridade Tributária e Aduaneira (Ministério das Finanças)


 

1. RELATORIO


 

1.1. A… e B…, (“Requerentes”), casados, contribuintes fiscais, n.º s … e …, respectivamente, residentes na Rua …, Tomar, apresentaram em 2012-09-19, pedido de pronuncia arbitral, ao abrigo da alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro - Regime Jurídico de Arbitragem Tributaria - (“RJAT”) visando a anulação da liquidação adicional n.º 2012…, datada de 2012-07-21, relativa a Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS), no valor de €30.990,31 (IRS) e €2.652,40 (juros compensatórios), respeitante ao ano de 2008.


 

1.2. Nos termos do disposto no art. 6.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, e no artigo 5.º do Regulamento de Selecção de Árbitros em Matéria Tributária, o Conselho Deontológico designou como Arbitra única, a Relatora e subscritora, Maria Celeste Cardona.


 

1.3. No dia 2012-10-26, foi constituído o Tribunal arbitral.


 

1.4. Em 2012-11-21, realizou-se a primeira reunião do tribunal arbitral, nos termos e com os objectivos previstos no artigo 18.º do RJAT.

 

 

No acto, foram os Requerentes notificados para juntar aos autos, no prazo de 10 dias, o documento de liquidação e cobrança do IRS de 2008 e comprovativo de pagamento das rendas relativas ao contrato de locação financeira, factos estes que foram invocados pelos mesmos no pedido de pronúncia arbitral.

 

Foram ainda notificadas as partes para apresentação de alegações escritas até ao dia 2012-12-24.

 

1.5. A Requerida apresentou Resposta e Processo administrativo, defendendo a improcedência do pedido de pronúncia arbitral apresentado pelos Requerentes.

 

1.6. Em 2012-11-30 os Requerentes procederam a junção aos autos de documentos consubstanciados na liquidação e cobrança do IRS de 2008 e comprovativo de pagamento das rendas relativas ao contrato de locação financeira, os quais não foram objecto de pronúncia pela Requerida.


 

1.7. No dia 2012-12-24 as partes não apresentaram alegações de Direito, pelo que, sem prejuízo da sua natureza facultativa, foi proferido Despacho pelo Tribunal Arbitral Singular em 2012-01-31, no sentido de notificar as mesmas para expressamente declararem, no prazo de 05 dias, se renunciariam a tal faculdade.

Em 2012-02-04 os Requerentes declararam prescindir da apresentação das alegações.

No prazo legal para o efeito, a Autoridade Requerida não se pronunciou.

 

1.8. O Tribunal é competente.

 

O processo não enferma de vícios que o invalidem na totalidade.

 

As partes têm personalidade e capacidade judiciárias, mostram-se legítimas e

encontram-se regularmente representadas.


 

Não se verificam nulidades.


 

2. MATERIA DE FACTO


 

Com base nos elementos constantes do Processo, consideram-se provados os seguintes factos:

  1. Em 1998-05-19 foi celebrado, por escritura pública outorgada no ….º Cartório Notarial de Lisboa, um Contrato de Locação Financeira, entre a sociedade anónima sob a firma “C..., , S.A”, e D… e E… tendo por objecto a fracção autónoma designada pela letra “A", pertencente ao prédio urbano, em regime de propriedade horizontal, sito na Rua …, na freguesia de S. João Baptista, concelho de Tomar, inscrito na matriz da referida freguesia sob o n.º … e descrito na Conservatória do Registo Predial de Tomar sob o n.º …, pelo valor de Escudos 18.500.000;

  2. O prazo contratual ajustado entre Locadora e Locatária foi de 10 anos, com início em 19 de Maio de 1998, tendo sido acordado o pagamento de 120 de rendas mensais a pagar pela Locatária, no montante de 195.965$00 cada, (excepto a primeira, cujo valor foi de Escudos 2.000.000) e um valor residual para efeitos de aquisição do Imóvel de 1.845.55 (Esc. 370.000$00);

  3. De acordo com a cláusula 26.º do Documento complementar anexo ao contrato de locação financeira (que faz parte integrante da escritura), estabeleceu-se a possibilidade de transmissão do direito dos locatários nos termos legais, salvo oposição da locadora;

  4. Em 2002-07-10 foi celebrado um Contrato de Cessão de Posição Contratual, por documento particular, entre os outorgantes da escritura referida em i) e A…, casado em regime de comunhão de adquiridos com B…, através do qual D… e E… cederam aos primeiros, a sua posição contratual no referido Contrato de Locação Financeira, pelo preço de €55.972,53;

  5. Nos termos da Cláusula 2ª do contrato de cessão de posição contratual, (“Quitação à Locatária cedente”), previu-se encontrarem-se pagas pela Locatária cedente 50 rendas, já vencidas, encontrando-se por pagar 70 rendas vincendas.


 

  1. No âmbito do referido contrato de locação, os Requerentes procederam ao pagamento de 58 rendas, entre 2003-02-20 e 2008-03-20, conforme facturas juntas ao processo pelo Requerimento apresentado pelos sujeitos passivos em 2012-11-30:

  2. Documento n.º …, de 2003-02-20, no montante de €657,34 (capital) e €288,73 (juros);

  3. Documento n.º …, de 2003-02-20, no montante de €660,98 (capital) e €235,09 (juros);

  4. Documento n.º …, de 2003-04-20, no montante de €674,43 (capital) e €263,54 (juros);

  5. Documento n.º …, de 2003-05-20, no montante de €677,97 (capital) e €260,00 (juros);

  6. Documento n.º … de 2003-08-20, no montante de €696,37 (capital) e €230,67 (juros);

  7. Documento n.º …, de 2003-09-20, no montante de €699,77 (capital) e €278,27 (juros);

  8. Documento n.º … de 2003-10-20, no montante de €703,19 (capital) e €224,85 (juros);

  9. Documento n.º …, de 2003-11-20, no montante de €706,62 (capital) e €231,42 (juros);

  10. Documento n.º …, de 2004-02-20, no montante de €717,01 (capital) e €211,03 (juros);

  11. Documento n.º …, de 2004-03-20, no montante de €720,51 (capital) e €207,53 (juros);

  12. Documento n.º …, de 2004-04-20, no montante de €724,03 (capital) e €204,01 (juros);

  13. Documento n.º …, de 2004-05-20, no montante de €727,56 (capital) e €200,45 (juros);

  14. Documento n.º …, de 2004-06-20, no montante de €731,11 (capital) e €196,93 (juros);

  15. Documento n.º …, de 2004-07-20, no montante de €734,68 (capital) e €193,36 (juros);

  16. Documento n.º …, de 2004-08-20, no montante de €738,27 (capital) e €189,77 (juros);

  17. Documento n.º …, de 2004-09-20, no montante de €741,87 (capital) e €186,17 (juros);

  18. Documento n.º …, de 2004-10-20, no montante de €928,93 (capital) e €182,55 (juros);

  19. Documento n.º …, de 2004-11-20, no montante de €749,13 (capital) e €178,91 (juros);

  20. Documento n.º …, de 2004-12-20, no montante de €752,78 (capital) e €175,26 (juros);

  21. Documento n.º …, de 2005-01-20, no montante de €756,46 (capital) e €171,58 (juros);

  22. Documento n.º … de 2005-02-20, no montante de €760,15 (capital) e €167,89 (juros);

  23. Documento n.º …, de 2005-03-20, no montante de €763,86 (capital) e €164,18 (juros);

  24. Documento n.º …, de 2005-04-20, no montante de €767,59 (capital) e €166,45 (juros);

  25. Documento n.º …, de 2005-05-20, no montante de €771,33 (capital) e €156,71 (juros);

  26. Documento n.º …, de 2005-06-20, no montante de €785,10 (capital) e €152,94 (juros);

  27. Documento n.º …, de 2005-07-20, no montante de €778,88 (capital) e €146,16 (juros);

  28. Documento n.º …, de 2005-08-20, no montante de €782,68 (capital) e €145,36 (juros);

  29. Documento n.º …, de 2005-09-20, no montante de €786,50 (capital) e €141,54 (juros);

  30. Documento n.º …, de 2005-10-20, no montante de €790,34 (capital) e €137,70 (juros);

  31. Documento n.º …, de 2005-11-20, no montante de €794,19 (capital) e €133,85 (juros);

  32. Documento n.º …, de 2005-12-20, no montante de €798,07 (capital) e €129,97 (juros);

  33. Documento n.º …, de 2006-01-20, no montante de €805,02 (capital) e €126,08 (juros);

  34. Documento n.º …, de 2006-02-20, no montante de €803,45 (capital) e €127,65 (juros);

  35. Documento n.º … de 2006-03-20, no montante de €807,54 (capital) e €123,56 (juros);

  36. Documento n.º …, de 2006-04-20, no montante de €811,66 (capital) e €139,44 (juros);

  37. Documento n.º …, de 2006-05-20, no montante de €815,30 (capital) e €115,30 (juros);

  38. Documento n.º … de 2006-06-20, no montante de €822,87 (capital) e €114,14 (juros);

  39. Documento n.º …, de 2006-07-20, no montante de €821,84 (capital) e €112,17 (juros);

  40. Documento n.º …, de 2006-08-20, no montante de €826,24 (capital) e €107,77 (juros);

  41. Documento n.º …, de 2006-09-20, no montante de €830,66 (capital) e €103,35 (juros);

  42. Documento n.º …, de 2006-10-20, no montante de €838,26 (capital) e €98,91 (juros);

  43. Documento n.º …, de 2006-11-20, no montante de €837,16 (capital) e €100,01 (juros);

  44. Documento n.º …, de 2006-12-20, no montante de €841,90 (capital) e €95,27 (juros);

  45. Documento n.º …, de 2007-01-20, no montante de €849,68 (capital) e €90,50 (juros);

  46. Documento n.º … de 2007-02-20, no montante de €849,36 (capital) e €90,62 (juros);

  47. Documento n.º …, de 2007-03-20, no montante de €854,45 (capital) e €85,53 (juros);

  48. Documento n.º …, de 2007-04-20, no montante de €859,57 (capital) e €80,41 (juros);

  49. Documento n.º …, de 2007-05-20, no montante de €864,72 (capital) e €75,26 (juros);

  50. Documento n.º …, de 2007-06-20, no montante de €871,45 (capital) e €70,07 (juros);

  51. Documento n.º …, de 2007-07-20, no montante de €874,05 (capital) e €87,47 (juros);

  52. Documento n.º …, de 2007-08-20, no montante de €879,50 (capital) e €62,02 (juros);

  53. Documento n.º …, de 2007-09-20, no montante de €885,29 (capital) e €55,59 (juros);

  54. Documento n.º …, de 2007-10-20, no montante de €890,32 (capital) e €51,51 (juros);

  55. Documento n.º …, de 2007-11-20, no montante de €895,73 (capital) e €46,70 (juros);

  56. Documento n.º …, de 2007-12-20, no montante de €901,45 (capital) e €40,96 (juros);

  57. Documento n.º …, de 2008-01-20, no montante de €907,36 (capital) e €34,27 (juros);

  58. Documento n.º …, de 2008-02-20, no montante de €913,01 (capital) e €28,62 (juros);

  59. Documento n.º …, de 2008-03-20, no montante de €918,71 (capital) e €22,92 (juros).

  60. Por escritura de Compra e Venda, lavrada em 2008-06-17, no Cartório Notarial de Lisboa, de …, o locatário A… exerceu a opção contratual de compra no âmbito do contrato de locação financeira, e adquiriu a dita fracção pelo valor residual de €1.907,90 à sociedade “C..., S.A”., anteriormente denominada “C..., , S.A”;

  61. A referida fracção, descrita na Conservatória do Registo Predial de Tomar sob o número …, foi registada a favor A… através da Ap. 1 de 2008-07-17;

  62. De acordo com a referida escritura, a aquisição referida em vii), beneficiou de isenção de imposto municipal sobre transmissões onerosas de imóveis (IMT), nos termos do art. 3.º do Decreto-Lei n.º 311/82, de 4 de Agosto e do n.º 6 do art.º 31.º do Decreto-Lei n.º 287/2003, de 12 de Novembro;

  63. A mesma escritura, foi instruída com os seguintes Documentos, exibidos perante o Cartório Notarial:

  64. Certidão do Registo Predial de 8/5/2008, emitida pela Conservatória do Registo Predial de Tomar;

  65. Certidão emitida pela Câmara Municipal de Tomar, em 1992-04-28, comprovativa do alvará de licença;

  66. Imposto de selo liquidado e cobrado no montante de €305,97.


 

  1. Em 2008-12-09, por escritura lavrada no Cartório Notarial de Leiria, os Requerentes venderam a “ F…, S.A.”, a fracção autónoma adquirida através do exercício do direito de opção de compra no termo do contrato de locação financeira em causa, pelo preço de €162.500,00;

  2. No acto da escritura, foram exibidos os seguintes documentos:

  3. Certidão dos mencionados elementos do registo predial emitida em 20/11/2008 na competente Conservatória;

  4. Caderneta predial urbana impressa em 5.11.2008 no Serviço de Finanças de Tomar;

  5. Fotocópia autenticada em 28.01.92., na Câmara Municipal de Tomar do Alvará de Licença de utilização n.º …, emitido em 29.06.1989 pela dita Câmara, para todo o prédio;

  6. Em 2009-05-22 os Requerentes apresentaram a sua Declaração de Rendimentos – Modelo 3 – acompanhada dos anexos A, C, F, G e H, declarando no Anexo G – Campo 401-, a alienação onerosa da fracção autónoma referida, com o valor de realização de €162.500,00 e data de alienação de 2008/12 e com o valor de aquisição de €92.277,61 e data de Maio de 1998, e ainda o montante de €550,46, a título de despesas e encargos;

  7. Com base nesta Declaração, de acordo com respectiva Demonstração, foi efectuada a Liquidação n.º 2009…, de 2009-06-21, referente a IRS do exercício de 2008, na qual foi apurado imposto a pagar de €9.665,87;

  8. Em 2012-05-17, os Requerentes foram objecto de uma acção inspectiva interna, ao abrigo da ordem de serviço n.º …, levada a cabo pela Direcção de Finanças de Santarém, no âmbito da qual foram notificados, através do Oficio n.º …, de 2012-05-17 para, ao abrigo do artigo 59.º, n.º 3, alínea d) e n.º 4 da LGT, apresentarem, no prazo de 10 dias, comprovativos da data e aquisição do imóvel alienado, bem como das despesas e encargos que foram declarados no Anexo “G”, da Declaração Modelo 3, referente a 2008;

  9. Em 2012-05-31 os Requerentes apresentaram junto da Direcção de Finanças de Santarém - Divisão de Tributação e Cobrança - cópia dos seguintes Documentos:

  10. Guia de recebimento n.º …, emitida pelo Município de Tomar, em 2008-09-30, respeitante a fornecimento de extracto do PDM, no valor de €3,00;

  11. Guia de pagamento n.º …, emitida pela DGCI – Tesouraria de Finanças de Tomar, em 2008-06-18, respeitante a venda de impressos extraídos da Internet, no valor de €1,60;

  12. Guia de recebimento n.º …, emitida pelo Município de Tomar em 2008-09-18, respeitante a fornecimento de copia autenticada, no valor de €2,50;

  13. Guia de recebimento n.º …, emitida pelo Município de Tomar, em 2008-09-18, respeitante a plantas de localização, no valor de €5,00;

  14. Guia de recebimento n.º …, emitida pelo Município de Tomar, em 2008-06-18, respeitante a plantas de localização, no valor de €5,00;

  15. Guia de recebimento n.º …, emitida pelo Município de Tomar em 2008-06-26, respeitante a fornecimento de fotocopia autenticada, no valor de €4,20;

  16. Recibo n.º …/2008, emitido pela Conservatória do Registo Predial de Tomar em 2008-04-07, de certidão n.º … – Prédio n.º … – Fracção A, no valor de €31,50;

  17. Recibo n.º …/2008, emitido pela Conservatória do Registo Predial de Tomar em 2008-08-12, de certidão n.º … – Prédio n.º …– Fracção A, no valor de €30,00;

  18. Contrato de cessão de posição contratual celebrado em 2002-07-10, por documento particular;

  19. Contrato de locação financeira, lavrado em 1998-05-19 no ….º Cartório Notarial de Lisboa.

  20. Em 2012-05-15, a Divisão de Tributação e Cobrança da Direcção de Finanças de Santarém solicitou, via fax, cópia do contrato de compra e venda referido em vii) supra, o qual foi recepcionado pelos Serviços em 2012-05-17 depois de remetido, pela mesma via, pelo Cartório Notarial de Lisboa da licenciada … .

  21. Em resultado do esclarecimento, através do Oficio n.º …, de 2012-06-12, foram os Requerentes notificados pela Divisão de Tributação e Cobrança da Direcção de Finanças de Santarém, do Projecto de correcções relativo a IRS 2008, tendo sido efectuadas correcções ao Anexo G da Declaração Modelo 3, ao valor de aquisição da fracção de €92.277,61 (correspondente ao valor do contrato de locação financeira) para 1.907,90 (valor residual da opção de compra), bem como a data de aquisição de 1998-05-19 (data da celebração do contrato de locação financeira) para 2008-06-17 (data da escritura de compra do imóvel aquando do exercício de opção de compra).

  22. No referido Projecto de correcção, não foram aceites as despesas e encargos constantes dos documentos apresentados pelos Requerentes por falta de enquadramento legal.

  23. Os Requerentes não exerceram o direito de audição prévia e não apresentaram elementos adicionais.

  24. Por oficio n.º …, de 2012-07-05, da Chefe de Divisão de Tributação e Cobrança da Direcção de Finanças de Santarém, por delegação de competências, foi proferido Despacho final, que converteu em definitiva a proposta de alteração e correcção aos elementos declarados pelos contribuintes no Anexo G à Declaração de Rendimentos relativa a 2008;

  25. Os Requerentes foram notificados da referida correcção em 2012-07-09;

  26. As aludidas correcções deram origem a liquidação adicional de IRS n.º 2012 …, de 2012-07-21, no valor de €33.642,71;

  27. Por fim, foram os Requerentes notificados da Nota de Compensação – Demonstração de Liquidação n.º 2012 …, no valor de €33.642,71, relativo a IRS 2008, bem como da Demonstração de Acerto de Contas, que determina o estorno da liquidação n.º 2009 …, no valor de €9.665,87 e o acerto da mesma, mediante a liquidação correctiva n.º 2012 …, datada de 2012-07-21, no montante de €30.990,31, a título de IRS, referente a 2008 e de €2.652,40 a título de juros compensatórios, determinando o saldo de €23.976,84, com data limite de pagamento em 2012-09-05, cuja anulação se peticiona nesta sede;

  28. No dia 2012-09-24 os Requerentes procederam ao pagamento do valor liquidado, de €23.976,84, conforme recibo de multibanco ID … instruído nos autos com o pedido de pronúncia arbitral.

*

 

A convicção do Tribunal fundou-se na análise crítica da prova documental junta, não se assinalando divergências de posição das partes quanto aos factos. Não se provaram outros factos susceptíveis de influenciar a decisão de mérito.


 


 


 

3. MATÉRIA DE DIREITO


 

3.1. Os Requerentes começam por invocar a ilegalidade da liquidação, por vício de violação de Lei, por erro quanto aos pressupostos de direito, sustentando, em síntese que:


 

  1. Ao contrário do considerado pela Autoridade Tributária, o valor de aquisição a ter em conta na determinação das mais valias, no caso de aquisição de imóveis efectuada no exercício do direito de opção de compra por parte do locatário em contrato de locação financeira, não é apenas o que tiver servido para efeitos de liquidação de sisa, ou não havendo lugar à sua liquidação, o valor que lhe serviria de base, caso fosse devida, nos termos do nºs 1 e 2 do artigo 46.º do CIRS (artigo 24.º do pedido de pronuncia arbitral)

  2. O intérprete, dentro do elemento sistemático da hermenêutica jurídica, não pode desconhecer o comando do artigo 51.º do CIRS e, de acordo com este preceito, “as despesas necessárias e efectivamente praticadas, inerentes à aquisição e alienação de direitos reais sobre bens imóveis” - que a tanto se refere o artigo 10.º, n.º 1, alínea a) do CIRS, para o qual remete o artigo 51.º, n.º 1, alínea a) do mesmo CIRS – acrescem ao valor de aquisição tal como definido no artigo 46.º do CIRS. (artigos 25.º e 26.º do pedido de pronuncia arbitral)

  3. Pelo que perante este preceito, não podem deixar de ser acrescidas ao valor de aquisição tal como vem definido no artigo 46.º do CIRS, o valor das rendas pagas pelo locatário, no contrato de locação financeira de imóveis. (artigo 27.º do pedido de pronuncia arbitral), uma vez que é por força do pagamento de tais rendas que o locatário fica na posição de poder exercer o seu direito de propriedade do imóvel pelo valor residual. (artigo 27.º do pedido de pronuncia arbitral)

  4. Tais rendas, são despesas necessárias e efectivamente praticadas que, intrínseca e necessariamente, se prendem com o direito de aquisição dos direitos reais sobre o imóvel cuja alienação justifica a tributação em sede de IRS, pelos ganhos de mais valias. (artigo 30.º do pedido de pronuncia arbitral)


 

Da Contestação da Requerida decorre a conclusão segundo a qual, o valor de aquisição da fracção “A” é o valor de €1.907,90 (valor residual) nos termos do art. 46.º do CIRS, na redacção aplicável à data dos factos, na medida em que se o bem imóvel foi adquirido a título oneroso, considera-se valor de aquisição o que tiver servido para efeitos de liquidação de SISA (agora IMT) - n.º 1 do artigo - ou o que lhe serviria de base caso fosse devida, hipótese esta aplicável ao caso sub judice, por a aquisição do imóvel pelos requerentes ter beneficiado de isenção de IMT, nos termos do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 311/82, de 04 de Agosto e do n.º 6 do artigo 31.º do Decreto-Lei n.º 287/2003, de 12/11) determinado segundo as regras próprias daquele imposto. (n.º 2 do mesmo artigo).

Cumpre agora apreciar o vício substantivo invocado pelos Requerentes, com base na interpretação conjugada, do n.º 2 do artigo 46.º do CIRS, e da alínea a) do n.º 1 do artigo 51.º do mesmo Código.


 

3.2. Do alegado vício de violação de Lei por erro quanto aos pressupostos de direito por errada interpretação e aplicação do n.º 2 do artigo 46.º do CIRS, e da alínea a) do n.º 1 do artigo 51.º do CIRS


 

As mais valias correspondem a ganhos ou rendimentos, de carácter ocasional ou fortuito, que não decorrem de uma actividade do sujeito passivo especificamente destinada à sua obtenção, mas relativamente aos quais o principio da capacidade contributiva determina a sujeição a imposto1.

Assim, constituem mais valias os ganhos decorrentes da transmissão onerosa de um bem ou de um direito, sem que tal transmissão constitua o objecto especifico de uma actividade empresarial.

O artigo 10.º do CIRS elenca exaustivamente os factos geradores de imposto. Nos termos do artigo 10.º, n.º 1, alínea a) do CIRS, constituem mais-valias os ganhos obtidos que, não sendo considerados rendimentos empresariais e profissionais, de capitais ou prediais resultem da alienação onerosa de direitos reais sobre imóveis.

O artigo 10.º contém ainda, no seu n.º 4, uma definição do ganho sujeito a imposto. Em termos gerais2, a mais-valia é um ganho que se materializa na diferença entre o valor por que um activo entrou no património individual e o valor por que dele saiu por força de um acto de disposição ou outro facto que, segundo a lei, constitua a realização da mais-valia.


 

Esta formulação geral terá ainda de ser completada pela definição do que se entende por “valor de aquisição”e “valor de realização”, resultado que determinará, assim, o apuramento do rendimento líquido, matéria esta que sistematicamente se encontra inserida no capítulo relativo à “determinação da matéria colectável”.

O ganho sujeito a IRS a título de mais-valias corresponde ao saldo apurado entre as mais-valias e as menos-valias realizadas no mesmo ano (artigo 43.º, n.º 1 do CIRS)

O art. 46.º do mesmo Código, relativamente à determinação do «valor de aquisição a título oneroso de bens imóveis», estabelecia – na redacção aplicável à data dos factos - que, se o bem imóvel houver sido adquirido a título oneroso, considera-se valor de aquisição o que tiver servido para efeitos de liquidação de SISA (agora IMT) - n.º 1 do artigo - ou o que lhe serviria de base caso fosse devida,, hipótese esta aplicável ao caso sub judice, por a aquisição do imóvel pelos requerentes ter beneficiado de isenção de IMT, nos termos do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 311/82, de 04 de Agosto e do n.º 6 do artigo 31.º do Decreto-Lei n.º 287/2003, de 12/11) determinado segundo as regras próprias daquele imposto.(n.º 2 do mesmo artigo).

Por sua vez, decorre do estabelecido no artigo 12.º, n.º 4, regra 14.º do Código do Imposto Municipal sobre Transmissões Onerosas (CIMT) que, no caso, o imposto incidirá sobre o valor residual dos bens imóveis adquiridos pelo locatário, no termo da vigência do contrato de locação financeira, determinado, ou determinável, nos termos do respectivo contrato.

O artigo 46.º do CIRS, foi entretanto alterado pela Lei n.º 55-A, de 31 de Dezembro (Orçamento de Estado para 2011) que procedeu ao aditamento de um número cinco, com a seguinte redacção:

«Nos casos de bens imóveis adquiridos através do direito de opção de compra no termo de vigência do contrato de locação financeira, considera-se valor de aquisição o somatório do capital incluído nas rendas pagas durante a vigência do contrato e o valor pago para efeitos de exercício de direito de opção, com exclusão de quaisquer encargos

Trata-se de uma norma não aplicável ao caso sub judice, na medida em que o facto gerador – alienação onerosa de direito real sobre imóvel – ocorreu em data posterior à da entrada em vigor do referido aditamento. (art. 12.º da Lei Geral Tributária).

Perante o circunstancialismo factual considerado provado, no exercício do direito de opção de compra do imóvel em causa nos autos, os Requerentes beneficiaram de isenção de IMT, nos termos do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 311/82, de 04 de Agosto e do n.º 6 do artigo 31.º do Decreto-Lei n.º 287/2003, de 12/11.

Não tendo ocorrido liquidação daquele imposto, a norma determinante para apurar o valor de aquisição para efeitos de apuramento do ganho é a prevista no n.º 2 do artigo 46.º do CIRS, nos termos da qual «Não havendo lugar à liquidação de sisa (actual IMT), considera-se o valor que lhe serviria de base, caso fosse devida, determinada de harmonia com as regras próprias daquele imposto

Como se referiu, à data dos factos, o artigo 12.º, n.º 4, regra 14.º do Código do Imposto Municipal sobre Transmissões Onerosas (CIMT) estabelecia que, no caso, o valor de aquisição seria o correspondente ao valor residual determinado, ou determinável, nos termos do respectivo contrato.

Para efeitos de IMT, o alcance prático da norma teria pouca relevância, na medida em que esta regra de quantificação serviria, por um lado, para efeitos de contabilização da receita cessante e, por outro, a aquisição, pelo locatário, no termo da vigência do contrato de locação financeira, beneficiaria, como ocorreu, de isenção nos termos do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 311/82, de 04 de Agosto e do n.º 6 do artigo 31.º do Decreto-Lei n.º 287/2003, de 12/11.3

Donde, de acordo com a literalidade da norma, acompanharíamos prima facie, a tese sustentada pela Autoridade Tributária que considera o valor de aquisição da fracção “A” o valor de €1.907,90 (valor residual) e que determinou a presente liquidação correctiva ora posta em crise.

Entende, porém, a Requerente, que o valor de aquisição a ter em conta na determinação das mais valias, no caso de aquisição de imóveis efectuada no exercício do direito de opção de compra por parte do locatário em contrato de locação financeira, não é apenas o que tiver servido para efeitos de liquidação de sisa, ou não havendo lugar à sua liquidação, o valor que lhe serviria de base, caso fosse devida, nos termos do n.ºs 1 e 2 do artigo 46.º (artigo 24.º do pedido de pronuncia arbitral)

Alega, para tanto, que nos termos do artigo 51.º do CIRS “as despesas necessárias e efectivamente praticadas, inerentes à aquisição e alienação de direitos reais sobre bens imóveis - que a tanto se refere o artigo 10.º, n.º 1, alínea a) do CIRS, para o qual remete o artigo 51.º, n.º 1, alínea a) do mesmo CIRS – acrescem ao valor de aquisição tal como definido no artigo 46.º do CIRS. (artigos 25.º e 26.º do pedido de pronuncia arbitral)

Apreciando:

O n.º 4 do art.º 10.º do CIRS prevê o modo como é determinada a mais-valia tributável, nos casos previstos na norma de incidência do n.º 1 do mesmo artigo. As mais-valias resultantes da alienação onerosa de bens imóveis, é constituída pela diferença entre o valor de realização e o valor de aquisição, líquidos da parte qualificada como rendimentos de capitais.

Esta é a fórmula legal para se determinar o rendimento que será sujeito a imposto pela Categoria G. O seu resultado determinará o ganho obtido, aquele que, numa primeira fase, constituirá, nesta sede, a base tributável.

Mas também é verdade que o resultado deste cálculo diz respeito ao ganho bruto porque, de acordo com o “princípio do rendimento líquido — ou “princípio do rendimento líquido objectivo” — apenas o montante líquido constitui (verdadeiro) rendimento para o pagamento dos impostos, constitui, pois decorrência do princípio da capacidade contributiva na modelação do imposto sobre o rendimento. E, em princípio, tal justifica que ao rendimento total auferido devam ser deduzidas despesas específicas com a sua obtenção, pois tais gastos constituem uma expressão negativa da capacidade contributiva e, como tal, devem ser excluídos desse conceito se se revelarem indispensáveis à produção ou obtenção do rendimento”

Assim, para além da correcção monetária, quando admitida, a lei consagra também a dedução de despesas e encargos para algumas mais-valias sujeitas a imposto, obrigando assim à dedução das despesas necessárias para que o rendimento pudesse ter ocorrido.

O artigo 51.º do CIRS, determina, assim, que devem acrescer ao valor de aquisição:

a) Os encargos com a valorização dos bens, comprovadamente realizados nos últimos cinco anos, e as despesas necessárias e efectivamente praticadas, inerentes à aquisição e alienação”

A questão dos autos é a da interpretação da alínea a) do art.º 51.º do CIRS, do inciso normativo “despesas necessárias e efectivamente praticadas, inerentes à aquisição”, invocando os Requerentes que não podem deixar de ser acrescidas ao valor de aquisição tal como vem definido no artigo 46.º do CIRS, o valor das rendas pagas pelo locatário, no contrato de locação financeira de imóveis.

Ora, no circunstancialismo factual, como melhor resulta do probatório, os Requerentes ingressaram no identificado contrato de locação financeira em resultado da cessão onerosa da posição contratual dos locatários originários, em 2002-07-10.

Acompanhando a alegação da Requerida, com a celebração do contrato de locação financeira não se operou a transmissão do direito real de propriedade, o qual permanece na titularidade da locadora até que o locatário venha a optar pela aquisição do direito de propriedade do imóvel.

No termo do prazo acordado para a vigência do contrato, e através do exercício do direito de opção contratual de compra, é que ocorre a transmissão do direito real sobre o imóvel, pressuposto necessário à respectiva alienação onerosa, e que constitui o facto gerador do ganho sujeito a imposto.

Não tendo o legislador ficcionado, como sucede quanto à promessa de compra e venda de imóvel, a existência de qualquer transmissão económica do bem antes da sua alienação jurídica (Cfr. alínea a) do n.º 3 do art. 10.º do CIRS).

De onde resulta que as despesas de aquisição e alienação, nos termos da alínea a) do n.º 1 do art.51.º do CIRS, se deverão reportar, não ao contrato de locação originariamente celebrado, mas à aquisição onerosa decorrente da opção de compra.

Neste pressuposto, poder-se-á ainda questionar se, ao valor de compra do imóvel, deverão ser consideradas as rendas de locação financeira como despesas necessárias e efectivamente praticadas, inerentes à aquisição, na medida em que os Requerentes alegam que “é por força do pagamento de tais rendas que o locatário financeiro fica na situação de poder exercer o seu direito de opção de aquisição do direito de propriedade do imóvel pelo valor residual determinado, ou determinável e, uma vez paga uma coisa e outra, adquirir o direito de propriedade do imóvel.” (artigo 28.º do pedido de pronuncia arbitral)

Ora, os Requerentes confundem, neste conspecto, a discussão da natureza do valor ficcionado para cálculo do valor de aquisição de um imóvel por força de opção de compra no contrato de locação financeira, com o acréscimo de despesas, que, nos termos da Lei, deverão entrar no cômputo do cálculo do valor de aquisição.

Na verdade, depois de determinado o valor de aquisição para efeitos fiscais, nos termos do artigo 46.º, é que se poderá, ou não, questionar, se deverão acrescer as despesas necessárias e inerentes à aquisição.

O conceito de despesas necessárias e inerentes, in casu, à compra do imóvel, é um conceito indeterminado susceptível de causar dúvidas, e por isso, necessariamente objecto de contencioso.

Nesta matéria, e perante as dúvidas de interpretação e à margem de indeterminação contida na norma, a Administração Fiscal produziu a seguinte doutrina administrativa, com relevância para a decisão:

*Processo: 12/2008, com despachos concordantes do Substituto Legal do Senhor Director-Geral dos Impostos, de 2008-07-14 e 2008-08-12.

«1. Nos termos do artigo 51º alínea a) do Código do IRS, para determinação das mais-valias sujeitas a imposto, ao valor de aquisição acrescem os encargos com a valorização dos bens, comprovadamente realizados nos últimos 5 anos, e as despesas necessárias e efectivamente praticadas, inerentes à aquisição e alienação de direitos reais sobre imóveis

A expressão “despesas necessárias” constante da alínea a) do artigo 51.º encerra alguma margem de indeterminação, pelo que cabe à DGCI proceder ao seu preenchimento, para o que terá de fazer apelo a, pelo menos, três tipos de considerações fundamentais: (i) o rendimento a tributar como mais-valia deve ser, sempre que possível um rendimento líquido, (ii) dever-se-á evitar a dupla tributação económica; e (iii) ter-se-ão de acautelar eventuais esquemas de fraude fiscal.

À luz destas considerações, as despesas indissociáveis da operação de venda de um imóvel que o alienante comprovadamente suportou para a sua realização, deverão, em princípio, ser tidas em conta na determinação das mais-valias. Assim, uma vez preenchidos todos os requisitos necessários para demonstrar de forma inequívoca a conexão do montante pago ao mediador imobiliário com a transacção concreta que originou a mais-valia tributável e estando devidamente documentada a intervenção do respectivo mediador nos termos legais aplicáveis, poderá considerar-se a comissão de intermediação como “despesa necessária” para efeitos da alínea a) do artigo 51.º do CIRS. 2. O entendimento sancionado é aplicável às situações tributárias que se constituam para o futuro bem como, aquelas que ainda sejam passíveis de decisão por parte da Administração Tributária incluindo-se, nestas últimas quer as situações objecto de um litígio pendente, quer as situações que ainda possam ser objecto de reclamação graciosa ou impugnação judicial, nos termos, respectivamente, dos artigos 70.º e 102.º do Código do Procedimento e do Processo Tributário.»

*Enquadramento Fiscal de encargos com Certificação Energética no âmbito das deduções da Categoria G

Processo: 3089/10, com despacho concordante da Sra. Subdirectora-Geral, de 2010-07-08

«Conteúdo: Nos termos da alínea a) do artigo 51.º do Código do IRS, para determinação das mais-valias sujeitas a imposto, ao valor de aquisição acrescem os encargos com a valorização dos bens comprovadamente realizados nos últimos cinco anos, e as despesas necessárias e efectivamente praticadas, inerentes à aquisição e alienação de direitos reais sobre imóveis. Atendendo às obrigações resultantes da legislação relativa à Certificação Energética (nomeadamente, Decreto-lei n.º 78/2006, de 4 de Abril, Portaria n.º 461/2007, de 5 de Junho e Portaria n.º 835/2007, de 7 de Agosto), a partir de 2009 é obrigatória a obtenção do certificado energético pelos proprietários dos edifícios no acto de compra e venda, o qual implica um determinado custo, ficando sujeitos a penalizações no caso de incumprimento.

Assim, para o apuramento da mais-valia resultante da alienação do imóvel, é aceite para efeitos do disposto na alínea a) do artigo 51.º do Código do IRS as despesas efectuadas com a certificação energética prevista no Decreto-Lei n.º 78/2006, de 4 de Abril.

A prova do encargo deverá ser efectuada através de recibo de pagamento da respectiva certificação, devendo do mesmo constar os elementos que inequivocamente associam a despesa com o imóvel alienado. Caso tenha sido obtido pelo proprietário mais do que um certificado energético relativamente ao mesmo imóvel, apenas é de aceitar a despesa realizada com a obtenção do certificado que esteja ainda válido e seja apresentado aquando da celebração da escritura de venda.»

*Informação Vinculativa
Assunto: Indemnização paga a inquilino. Mais-valias - Despesas e Encargos, determinação do rendimento líquido da categoria.


 

«Proc. N.º 2483/2004, com despacho concordante da Senhora Directora de Serviços de 2005-03-04
Conteúdo: Nos termos do artigo 51º do Código do IRS (CIRS), para determinação das mais – valias sujeitas a imposto, ao valor de aquisição acrescem os encargos com a valorização dos bens, comprovadamente realizados nos últimos 5 anos, e as despesas necessárias e efectivamente praticadas, inerentes à aquisição e alienação de direitos reais sobre bens imóveis. Os encargos dizem respeito à valorização do próprio bem imóvel, isto é, são as despesas que, por natureza, trazem ao imóvel um valor adicional, como por exemplo as obras de beneficiação. O pagamento de uma indemnização ao inquilino, possibilita que se disponha do imóvel em melhores condições, mas não faz aumentar o seu valor intrínseco, embora o valor de mercado possa vir a ser superior.
A Administração Fiscal tem vindo a considerar, como despesas necessárias e inerentes à aquisição e alienação, o Imposto Municipal sobre Transmissões e os encargos notariais e de registo predial, por, sem elas, a operação não se poder vir a realizar.
Este assunto foi analisado pela Direcção de Serviços Jurídicos e do Contencioso nas Informações n/s 173/0304 e 8/04, sobre as quais foi exarado o despacho do Exmº Senhor Director-Geral de 2003-11-03 e 2004-03-04, respectivamente, no sentido de que, os encargos com o processo judicial de despejo de ocupantes de um imóvel não são dedutíveis na determinação do rendimento colectável (mais-valias) em IRS a título de despesas necessárias inerentes à aquisição e alienação, bem, como não o são, a título de encargos com a valorização nos termos do artigo 51º do CIRS.»


 

A Informação vinculativa, referente ao Processo 12/2008, que se pretendera mais esclarecedora do conceito de «despesas inerentes à aquisição», acaba por ser redundante na interpretação do conceito de “despesas necessárias”.

Exposto o respectivo conteúdo, a primeira consideração fundamental é a de que i) o rendimento a tributar como mais-valia dever ser, sempre que possível, um rendimento líquido, o que constitui uma mera enunciação da opção constitucional da tributação pelo rendimento líquido.

A segunda consideração que se apresenta como fundamental, é a de evitar que se tribute duplamente o sujeito passivo, pelo que estamos em crer pretender a AT referir-se à contabilização de despesas legais com impostos, como o IMT e o I. Selo.

A terceira e última consideração, diz respeito à prevenção da fraude e evasão fiscais, tendo em vista que as despesas que sejam efectivamente praticadas e devidamente documentadas, como se ressalta da fundamentação no caso concreto suscitado na Informação.

Mas a par desta Informação, a restante doutrina ressalta a caracterização de tais despesas, mediante o recurso aos conceitos de conexão com a transacção - Processo: 12/2008 necessidade decorrente de obrigação legal - Processo: 3089/10 e Proc. N.º 2483/2004.

Como se sabe, a doutrina administrativa apenas vincula os Serviços, não se impondo aos Tribunais, que apenas devem obediência à Lei (art. 203.º da CRP).

No entanto, o entendimento administrativo veiculado pelos Serviços, parece assumir o pressuposto base já afirmado, e que decorre da Lei, segundo o qual, as despesas necessárias e inerentes à aquisição, assumem um carácter de acessoriedade, seja de natureza formal ou material, em relação à transacção – aquisição – propriamente dita – não se integrando na mesma, nem se constituindo por força das cláusulas contratuais que formem o respectivo conteúdo.

Por outras palavras, as despesas incorridas para celebrar a aquisição do imóvel por opção de compra, não se confundem com o pagamento do preço da transacção propriamente dita.

Admitir que o artigo 51.º permita, como pretendem os Requerentes, clarificar o conceito de aquisição previsto no artigo 46.º - cuja discussão está em aberto, como se verá supra – é colocar na disponibilidade das partes a eleição de despesas contratualmente acordadas, para efeitos fiscais, o que favoreceria a fraude fiscal e conduziria à distorção, na prática, do princípio da capacidade contributiva e da tributação segundo o rendimento real. (neste sentido Cfr. Acórdão do STA n.º 585/09, de 18/114 e Acórdão do TC 451/20105)

Concluindo, as rendas pagas por força do contrato de locação financeira não se subsumem ao conceito de despesas necessárias e inerentes à aquisição nos termos e para os efeitos do artigo 51.º, n.º 1 alínea a) do CIRS.

Quanto a este fundamento, o acto cuja declaração de ilegalidade é pedida não enferma, assim, de vício por errada interpretação e aplicação dos artigos 46.º, n.º 2 e alínea a) do artigo 51.º, ambos do CIRS.


 

3.3. Sustentam ainda os Requerentes que as rendas pagas em contrato de locação financeira terão de ser tidas em conta na parte em que estas traduzem o montante de capital financeiro que o locatário teve de pagar. Para o efeito, alegam, em síntese:

  1. Recorrendo ao elemento teleológico da interpretação, só é possível sustentar a existência de um rendimento acréscimo, susceptível de ser abarcada pela tributação, na parte que vai além do que o contribuinte teve necessariamente de suportar para adquirir o bem cuja alienação gera mais-valia. Tal postulado resulta da própria concepção de mais-valia que se encontra positivamente assumida no artigo 43.º, n.º 1 do CIRS (artigo 35.º do pedido e pronuncia arbitral);

  2. Assim sendo, no caso de aquisição dos bens imóveis, que geram mais-valias, haver sido efectuada em contrato de locação financeira, e por força do cumprimento das regras contratuais dele constantes, não podem as rendas deixar de ser tidas em conta, na sua totalidade, pelo menos na parte em que estas traduzem o montante de capital financeiro que o locatário teve de pagar (artigo 36.º do pedido de pronuncia arbitral);

  3. Concluindo, no artigo 41.º do pedido, que todo o montante das rendas da locação financeira pagas, declarado na Modelo 3, pelos requerentes, deve ser tido em conta, acrescendo ao valor residual existente aquando do exercício do direito de opção de compra.

A Autoridade Tributária conclui que a tese das Requerentes não encontra qualquer apoio na letra do 46º., n.º 1 do CIRS, nem, tão-pouco decorre do artigo 43.º, n.º 1 do mesmo Código ou da alínea a) do artigo 51.º do CIRS.

Alega, para o efeito, que o legislador não consagrou a possibilidade de o valor de aquisição resultante da opção de compra no termo do contrato de locação poder equiparar-se ao preço da locação financeira declarado pelo locador e consentido pelo locatário.

Como se já se referiu antes, de acordo com a literalidade da norma, acompanharíamos prima facie, a tese sustentada pela Autoridade Tributária que considera o valor de aquisição da fracção “A” o valor de €1.907,90 (valor residual) e que determinou a presente liquidação correctiva ora posta em crise, nos termos conjugados do n.º 2 do artigo 46.º do CIRS e do artigo 12.º, n.º 4, regra 14.º do Código do Imposto Municipal sobre Transmissões Onerosas (CIMT).

Mas será essa a solução imposta pelo espírito do sistema, conformado pelos princípios legais e constitucionais e legais pertinentes, atendendo à natureza das normas em causa?


 

No que respeita à fundamentação jurídica aduzida pelos Requerentes quanto à interpretação teleológica do artigo 43.º do CIRS, para depois concluir pela subsunção das rendas decorrentes do contrato de locação financeira, à norma contida na alínea a) do n.º 1 do artigo 51.º do CIRS, não podemos acolher a sua tese.

Na verdade, como se deixou exposto – Cfr. 3.2.-, deverá destrinçar-se, para efeitos legais, o conceito de valor de aquisição previsto no artigo 46.º do CIRS, do conceito de despesas a acrescer a tal aquisição.

Apesar dos requerentes invocarem a interpretação conjugada dos artigos 46.º e 51.º do CIRS para sustentar o vício de violação de Lei, a mesma não se integra, porém, na causa de pedir do pedido, nem na qualificação jurídica das ilegalidades invocadas, pois o tribunal no que concerne à indagação6, interpretação e aplicação das regras de direito, não está limitado pelo alegado pelas partes, estando apenas limitado pelos factos alegados (art. 664.º do CPC)

Ora, o que, verdadeiramente está em causa quando se invoca o princípio do rendimento acréscimo, é a questão de saber se o valor o montante das rendas da locação financeira pagas, declaradas na Modelo 3, pelos requerentes, deve ser tido em conta, acrescendo ao valor residual existente aquando do exercício do direito de opção de compra, nos termos e para os efeitos do n.º 2 do artigo 46.º do CIRS, aplicável à data dos factos.

No entender dos Requerentes, foi esta questão que o legislador quis resolver, no artigo 96.º do OE para 2011, através do aditamento do actual n.º 5 ao artigo 46.º do CIRS, nos termos do qual, «Nos casos de bens imóveis adquiridos através do direito de opção de compra no termo de vigência do contrato de locação financeira, considera-se valor de aquisição o somatório do capital incluído nas rendas pagas durante a vigência do contrato e o valor pago para efeitos de exercício de direito de opção, com exclusão de quaisquer encargos

Como se referiu, esta norma não é aplicável ao caso sub judice, por força do artigo 12.º da Lei Geral Tributária.

No entanto, a respectiva natureza clarificadora e interpretativa, convoca-nos, para uma ponderação sobre o regime instituído, à data do facto gerador, quanto à determinação do ganho sujeito a mais valias e ao conceito de valor de aquisição previsto na alínea b) do n.º 2 do artigo 46.º do CIRS., nos termos da qual, «Não havendo lugar à liquidação de sisa (actual IMT), considera-se o valor que lhe serviria de base, caso fosse devida, determinada de harmonia com as regras próprias daquele imposto

À data dos factos, o artigo 12.º, n.º 4, regra 14.º do Código do Imposto Municipal sobre Transmissões Onerosas (CIMT) estabelecia que, no caso, o valor de aquisição seria o correspondente ao valor residual determinado, ou determinável, nos termos do respectivo contrato.


 

No entanto, apesar de se tratar de uma regra de determinação da matéria colectável para efeitos de sisa (IMT), o respectivo valor estaria isento por força do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 311/82, de 04 de Agosto, pelo que, se poderá questionar qual o alcance prático desta norma, e bem assim, se a mesma terá efeito revogatório da isenção anteriormente consagrada.

Quanto ao efeito revogatório, o mesmo é de afastar em face do n.º 6 do art. 31.º do Decreto-Lei n.º 287/2003, de 12 de Novembro, o qual manteve em vigor a mesma isenção.

Assim, a regra de cálculo do valor tributável para efeitos de IMT, só manteve o respectivo alcance prático decorrente da possibilidade dos sujeitos passivos locatários poderem, nos termos dos artigos 13.º e 14.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais, perder o direito à isenção em razão de dívidas fiscais.

Por outro lado, o facto de se determinar o valor residual como base de cálculo para efeitos de IMT, consubstancia uma medida de neutralidade fiscal com o objectivo de evitar a dupla tributação económica, na esfera do locatário, na medida em que o IMT incide sobre a aquisição pelo locador, e sobre a aquisição do locatário.

A locadora, porque sujeita a imposto, acaba por repercutir o IMT pago na aquisição nas rendas a pagar pelo locatário pelo que, para evitar uma diferença de tratamento fiscal em relação à compra e venda, o legislador optou por sujeitar a imposto um valor que seria fiscalmente menos oneroso para o locatário.7

Temos, por conseguinte, que a eleição do valor residual para efeitos de cálculo do IMT, resulta de uma opção legislativa circunscrita ao cumprimento do princípio de neutralidade fiscal, procurando desonerar o locatário adquirente no âmbito deste imposto sobre o património.

Acresce que, no que respeita à natureza da norma contida no n.º 2 do artigo 46.º do CIRS que prevê a determinação do valor de aquisição a título oneroso de bens imóveis, a mesma insere-se sistematicamente no Capítulo II - Secção do CIRS relativo à «Determinação do Rendimento colectável» dos «Incrementos Patrimoniais», autonomizando-se, do ponto de vista legislativo, a propósito da matéria colectável, entre a sua «definição» - incidência e «determinação».

São normas de incidência, em sentido lato, as que «definem o plano de incidência, ou seja, o complexo de pressupostos de cuja conjugação resulta o nascimento da obrigação de imposto, assim como os elementos da mesma obrigação.8»


 

No artigo 73.º da Lei geral Tributária (LGT), estabelece-se que as presunções consagradas nas normas de incidência tributária admitem sempre prova em contrário, referindo-se este artigo às presunções legais, que são as ilações que a lei retira de um facto conhecido para firmar um facto desconhecido (artigo 349.º do CC)

O Tribunal Constitucional tem vindo a entender uniformemente9, que entre as normas de incidência a que se reporta o artigo 103.º, n.º 2 da CRP, se incluem as normas sobre a determinação da matéria colectável que têm a ver com critérios materiais de definição da incidência real, isto é, quando o seu alcance transcenda a pura esfera processual, assumindo um carácter «material».

Em consonância com esta Jurisprudência, «a regra estabelecida no artigo 73.º da LGT vale, não apenas para as normas de incidência tributária em sentido próprio, mas também em relação a outras normas que estabelecem ficções que influenciam a determinação da matéria colectável (quer directamente através de valores ficcionados para a matéria colectável, quer indirectamente, ao fixarem ficcionadamente os valores dos rendimentos relevantes para a sua determinação), pois que o advérbio «sempre» aí utilizado inculca a ideia de tratar-se de um princípio basilar da globalidade do ordenamento jurídico tributário, corolário do princípio da igualdade na repartição dos encargos públicos, assente no princípio da capacidade contributiva»10

Assim, quer do ponto de vista jurisprudencial, quer do ponto de vista doutrinal, a norma que emana do artigo 73.º da LGT, abrange as normas de incidência tributária, quer as de incidência subjectiva, quer as de incidência objectiva ou real, abrindo assim a possibilidade de o sujeito passivo provar que o valor de aquisição ou o valor de realização foi, efectivamente superior ou inferior ao valor ficcionado na lei, correspondendo assim ao “rendimento real.”

Retomando a análise da norma aplicável ao valor de aquisição ao caso concreto – n.º 2 do artigo 46.º do CIRS – estabelece a mesma que para a determinação dos ganhos sujeitos a IRS, a título de mais-valias, se considera valor de aquisição, quando não há lugar à liquidação de imposto de sisa (actual IMT), os valores que lhe serviriam de base, caso fossem devidos, determinados de harmonia com as regras próprias daqueles impostos.


 

Assim, deverá entender-se de acordo com os princípios expostos, que esta norma (em que em causa está a determinação e quantificação do rendimento sujeito a IRS) é uma norma de incidência objectiva de IRS, ou, pelo menos, uma norma que densifica e concretiza a norma prevista no n.º 4 do artigo 10.º do CIRS que define o ganho sujeito a imposto.

A mesma, prevê a determinação do valor de aquisição de um imóvel a título oneroso, ficcionando uma base tributável, mas numa situação em que, de facto, não é inviável apurar o respectivo valor real, consubstanciando, assim, uma presunção implícita na norma de incidência.

Acompanhando o Senhor Conselheiro Jorge Lopes de Sousa, pretendendo-se com esta norma “em sede de mais-valias tributar os «incrementos patrimoniais» e constituindo mais-valias os «ganhos obtidos» (artigos 1.º, n.º 1e 10.º, n.º 1 do CIRS), as normas que determinam valores ficcionados para o seu cálculo, têm ínsita presunção de que eles correspondem à realidade, pois só em função desta se pode apurar se houve ganhos e a sua extensão e os «ganhos obtidos» não são ganhos irreais ou fictícios mas sim incrementos patrimoniais reais11

Ou seja, no n.º 2 do artigo 46.º do CIRS contém uma presunção de incidência objectiva quanto ao valor de aquisição de imóveis a título oneroso, não podendo deixar de ser reconhecido ao contribuinte o direito de provar a divergência quanto à respectiva quantificação em sintonia com o previsto no artigo 73.º da LGT ao dispor expressamente que «as presunções consagradas nas normas de incidência tributária admitem sempre prova em contrário»

Isto porque, acompanhando os Requerentes, o que se pretende é tributar é “a parte que vai além do que o contribuinte teve de suportar economicamente para adquirir o bem cuja alienação gera a mais-valia”, isto é o rendimento real ou o rendimento acréscimo.

Sustentar a literalidade da norma prevista no n.º 2 do art.46.º do CIRS – como pretende a AT – é afastar o princípio da proibição de presunções legais absolutas derivada do princípio da capacidade contributiva12

Foi, aliás, a realidade económica subjacente aos contratos de locação financeira, que o legislador quis prever, e bem, no n.º 5 do artigo 46.º do CIRS, na redacção da Lei n.º 55-A, de 31 de Dezembro (OE para 2011), ao consagrar, expressamente, a inclusão dos valores das rendas pagas na vigência do contrato de locação financeira, para além do valor residual para cálculo do valor de aquisição.

Trata-se de uma solução legal, imposta pelo espírito do sistema13, conformado pelos princípios legais e constitucionais e legais pertinentes atendendo à natureza da norma em causa.

Resolveu-se assim, por via legislativa, a flagrante incongruência entre a regra de determinação do valor tributável para efeitos de IMT, ditada, como vimos, por razões de neutralidade fiscal, com a regra de determinação do valor de aquisição para efeitos de apuramento do ganho sujeito a mais-valias.

Pelo que, apesar de não aplicável ao caso sub judice, o n.º 5 do art. 46.º do CIRS assume, assim, a nosso ver, uma natureza claramente interpretativa.14

Ora, IN CASU, ao contestar o valor de aquisição, consideram os Requerentes que deverão ser tomadas em conta todas as rendas pagas na vigência do contrato, ou, pelo menos na parte em que estas traduzem o montante de capital financeiro que o locatário teve de pagar (artigo 36.º do pedido de pronuncia arbitral).

Decorre da alínea vi) do probatório, que, no âmbito do referido contrato de locação, os Requerentes procederam ao pagamento de 58 rendas, entre 2003-02-20 e 2008-03-20, conforme facturas juntas ao processo pelo Requerimento apresentado pelos sujeitos passivos em 2012-11-30, no montante total de €45.235,54.

No entanto, e aqui acompanhando a alegação da Requerida, não se poderão incluir no valor de aquisição, as rendas pagas pelo locatário originário, as quais foram suportadas por aquele, e não pelos Requerentes.

Os valores que os Requerentes efectivamente suportaram na aquisição do imóvel compreende, de facto, a soma do preço pago pela aquisição da posição contratual do locatário anterior, o somatório das parcelas de capital contidas nas rendas ulteriores constantes do Ponto vi) do probatório, incluindo a parcela destinada ao exercício da opção de compra constante do Ponto vii) do Probatório.

Neste conspecto, os Requerentes não alegam, como decorre do pedido, a inclusão do preço pago pela cessão da posição contratual para efeitos do cálculo do valor de aquisição, pelo que o Tribunal não poderá, quanto a este montante, exceder os seus poderes de cognição sob pena de afectar a necessária identidade entre a causa de pedir e a causa de julgar.15

Assim, a inclusão do preço de aquisição da posição contratual para efeitos de cálculo do valor de aquisição do imóvel pelos Requerentes, não decorre do pedido, o qual não o circunscreve como thema decidendum, pelo que o Tribunal está, neste âmbito limitado quanto aos seus poderes de cognição, em termos quantitativos e qualitativos, sob pena de condenação em objecto diverso do pedido, o que consubstanciaria erro de julgamento.

Na verdade, ainda que se procure extravasar o exame literal do pedido formulado pelos Requerentes, através do cálculo do valor das rendas pagas pelo locatário originário – 50 rendas – e respectiva comparação com o preço do contrato de cessão de posição contratual, verifica-se que não são montantes coincidentes.

Contudo, o vício de erro quanto aos pressupostos de direito invocado pelos Requerentes não tem como fundamento de facto a inclusão do preço da cessão de posição contratual pelo que não existe identidade entre a situação factual pressuposta e a fundamentação jurídica aduzida.

Do probatório – Ponto vi), resulta que os Requerentes carrearam para o processo cópia das facturas das 58 rendas pagas entre 2003-02-20 e 2008-03-20, conforme facturas juntas ao processo pelo Requerimento apresentado pelos sujeitos passivos em 2012-11-30

Tendo-se por isso, como ilidida a presunção segundo a qual, o valor de aquisição do imóvel a título oneroso, não corresponde apenas ao valor residual pago aquando da opção de compra, mas inclui, igualmente o valor das rendas suportadas pelos Requerentes durante a vigência do contrato de locação financeira.

Aplicar a norma do n.º 2 do art. 46.º do CIRS sem considerar o valor das rendas suportadas pelos Requerentes na qualidade de locatários, consubstancia uma clara violação do art. 73.º da LGT e, deve entender-se, como também aponta o Senhor Conselheiro Jorge de Sousa16, não está ainda em sintonia, por um lado, com o princípio enunciado no artigo 11.º, n.º 3 da LGT de que, nos casos de dúvida sobre a interpretação das normas tributárias «deve atender-se à substancia económica dos factos tributários”, e por outro lado, com o principio da igualdade na repartição dos encargos públicos que impõe que a tributação da generalidade dos contribuintes, sempre que possível, assente na realidade económica subjacente aos factos tributários e não se compagina com a existência de casos especiais de tributação com base em valores fictícios em situações em que é conhecido ou é apurável o valor real dos factos tributários.

Acompanhando ainda, o Ilustre Conselheiro, «Pode tributar-se com base em ficções de rendimentos, quando a lei os presume, mas só se pode fazê-lo porque se presume que os valores dos rendimentos ficcionados são os que correspondem à realidade, admitindo-se «sempre» a prova de que há dissonância entre os rendimentos ficcionados e a realidade»17

Quanto à possibilidade de ilisão da presunção legal, o entendimento da Autoridade Tributária, veiculado pela Direcção dos Serviços de IRS através do Ofício Circulado n.º 20061/2002, de 18 de Fevereiro é o de que «O interessado que pretenda ilidir qualquer presunção nas normas de incidência tributária, deverá, para o efeito, solicitar a abertura de procedimento contraditório próprio) junto do Serviço de Finanças».

No entanto, como decorre do n.º 1 do art. 64.º do CPPT, que se refere ao procedimento de ilisão das presunções, a utilização do procedimento administrativo não é obrigatória, e é permitida em alternativa com as possibilidades de impugnação administrativa ou contenciosa, pelo que se admite, nesta sede arbitral, a ilisão da presunção aplicada por força do n.º 2 do art. 46.º do CIRS.

Nos termos do artigo 64. do CPPT, a ilisão da presunção poderá ser alegada dentro do prazo em que pode ser impugnado graciosa ou contenciosamente o acto tributário, pelo que os efeitos da decisão repercutem-se no acto referido, tendo os efeitos que teria sobre o acto uma decisão proferida nesses processos de impugnação.

Em conclusão, considera-se ilidida a presunção segundo a qual, o valor de aquisição do imóvel a título oneroso, não corresponde apenas ao valor residual pago aquando da opção de compra, mas inclui, igualmente, o valor das rendas suportadas pelos Requerentes durante a vigência do contrato de locação financeira, devendo as mesmas ser incluídas para efeitos de valor de aquisição no cálculo do ganho sujeito a mais-valias.

De resto, sustentando a natureza interpretativa do n.º 4 do art. 46.º do CIRS, a desconsideração do valor das rendas pagas pelos locatários, aquando da vigência do contrato de locação financeira seria ainda violadora do principio da igualdade, na medida em que, aos sujeitos passivos que exerceram a opção de compra após 2011, seria permitido acrescer tal valor para apuramento do ganho, enquanto os locatários, como é o caso dos Requerentes que exerceram tal opção dois anos antes, já seriam penalizados por esse facto.


 


 

Em consequência, o acto cuja declaração de ilegalidade é pedida enferma, assim, de vício de violação de lei, por erro quanto aos pressupostos de facto, e ainda por errada interpretação e aplicação dos artigos 46.º, n.º 2 do CIRS, conjugado com os artigos 73.º e 11.º, n.º 3 da LGT, devendo por isso ser parcialmente anulado na parte que desconsidera, no computo do valor de aquisição declarado pelos Requerentes no Anexo G – Campo 401- o valor das rendas suportadas pelos mesmos, na qualidade de locatários.


 

3.4. Alegam ainda os Requerentes vício de violação de Lei por erro quanto aos pressupostos de Direito, por considerarem que a data de aquisição do imóvel é a de 1998-06-18 (data da celebração do contrato de locação financeira) e não a de 2008-06-17 (data do exercício da opção de compra).

Neste sentido, alegam que a opção de compra nasceu no dia em que foi celebrado o contrato de locação financeira que atribui contratualmente esse direito, e que o momento da aquisição é aquele que começa com o pagamento do preço, em forma de rendas, cujo preço global é pago ao longo do tempo.

Contesta a Requerida que não se ficciona qualquer transmissão económica do bem antes da sua alienação jurídica, só ocorrendo a transmissão do direito de propriedade quando o locatário exerceu a sua opção de compra.

De facto, na consideração do interesse económico das partes, o contrato de locação financeira18 e a compra e venda (a prestações) apresenta semelhanças consideráveis, não só porque o locatário obtém, aquando da sua vigência, todas as utilidades do bem, suportando integralmente os riscos, como se de uma compra se tratasse, como também pelo facto da dívida existir desde a celebração do contrato, embora o seu reembolso seja fraccionado.

Acolhemos por isso a fundamentação dos Requerentes quanto à substância económica do contrato de locação financeira: «No fim do contrato, o locador receberá o equivalente do custo da coisa, enquanto o locatário receberá o equivalente económico da coisa»19

Nestes termos, seja ou não exercida a opção de compra, a locação financeira tem os mesmos fins económicos da compra e venda a prestações, reservando o locador a propriedade da coisa a título de garantia como em qualquer compra e venda a prestações com reserva de propriedade.

Acolhemos, porém, a tese da Requerida quanto à estrutura contratual da locação, enquanto instrumento jurídico: a compra do bem realiza-se por contrato posterior ao contrato de locação financeira, não sendo um efeito operado pelo pagamento da última prestação. São por isso, dois contratos distintos.

No entanto, ambos os contratos, por se tratar de uma locação financeira, são indissociáveis, isto é, a escolha do bem determina a sua compra posterior e o financiamento consubstancia-se na compra prévia do bem cuja retribuição é obtida através do pagamento subsequente das rendas integradas no contrato de locação.

Por isso, existe, como referem os Requerentes, uma ligação indissociável entre os dois contratos, na sua génese – a opção nasceu no dia em que foi celebrado o contrato de locação financeira que atribui contratualmente esse direito e condicional – o momento da aquisição é aquele que começa com o pagamento do preço, em forma de rendas, cujo preço global é pago ao longo do tempo.

Pelo que, do ponto de vista jurídico, 20 a locação financeira contém elementos dos tipos compra e venda e locação, sendo pois, um contrato nominado misto.

Do ponto de vista de Direito instituído, exactamente por ser difícil regular as situações em que o valor de aquisição decorre de um direito obrigacional, mas em que a opção de compra determina o momento da aquisição onerosa do direito real sobre o imóvel, é que se prevê, no n.º 4 do artigo 46.º do CIRS, na redacção dada pela Lei n.º 55-A, de 31 de Dezembro que, «Nos casos de bens imóveis adquiridos através do direito de opção de compra no termo de vigência do contrato de locação financeira, considera-se valor de aquisição o somatório do capital incluído nas rendas pagas durante a vigência do contrato e o valor pago para efeitos de exercício de direito de opção, com exclusão de quaisquer encargos

Assim, não subsistem dúvidas que é a aquisição onerosa do direito real sobre o imóvel que determina o ganho sujeito a mais-valias. A alienação onerosa do direito real pressupõe ex ante a respectiva aquisição onerosa.

Mas o momento da aquisição, não se confunde com o respectivo cálculo e quantificação. No caso das locações adquiridas pelos locatários originários, o n.º 4 do art.46.º do CIRS é esclarecedor neste ponto: ainda que a aquisição se opere pelo exercício de opção de compra, as rendas pagas aquando da sua vigência são quantificadas, acrescendo ao valor residual, para apuramento desse valor, dada a natureza mista do contrato em questão.


 

No caso sub judice, temos uma situação jurídico-factual distinta, na medida em que não é o locatário originário a exercer a opção de compra, mas os locatários subsequentes, o que determina o nascimento de um facto gerador antecedente, sujeito a mais-valias, consubstanciado na cessão de direito sobre o imóvel, tributável nos termos da alínea d) do n.º 1 do art. 10.º do CIRS.

Razão pela qual, como se deixou exposto supra, na quantificação do valor de aquisição, não se atenderá ao valor das rendas pagas pelo locatário originário, mas apenas ao valor das rendas ulteriores pagas pelos locatários subsequentes, não se computando o valor pago pela cessão, apenas porque não foi alegado, como vimos, tal facto.

Pelo exposto, não acolhe o vício de violação de Lei, invocado pelos Requerentes, quanto ao momento da aquisição do imóvel declarado pelos sujeitos passivos.


 

3.4. Do alegado vício de erro quanto aos pressupostos de facto e de direito, por violação da alínea a) do n.º 1 do art. 51.º do CIRS


 

Finalmente, pedem ainda os Requerentes, para cálculo do valor de aquisição sujeito a imposto, a consideração dos encargos e despesas que os mesmos suportaram com a celebração das escrituras do contrato de locação financeira, do contrato de compra do imóvel, do contrato de venda do imóvel, e finalmente, as suportadas com a formalização do contrato de cessão da posição do locatário financeiro, no montante total de €550,46. (artigos 53.º, 60.º e 64.º do pedido de pronuncia arbitral).

Afigura-se-nos, porém, que as despesas necessárias e encargos previstos na alínea a) do n.º. 1 do art. 51.º se reportam à aquisição e alienação onerosas do imóvel, e não, também, ao contrato de cessão de posição contratual, na medida em que o mesmo, como vimos, desencadeia o nascimento de outro facto gerador, para efeitos de mais-valias.

Apesar de não se compreender a diferença de critério, no que respeita à dedução de despesas inerentes à cessão de posição contratual, o legislador – eventualmente por lapso - não prevê, sequer, o respectivo computo no cálculo do valor de aquisição, como decorre do artigo 51.º do CIRS.

Acresce, como também se referiu, a aquisição a que se reporta a alínea a) do n.º 1 do artigo 51.º do CIRS corresponde à aquisição onerosa do imóvel, e não à aquisição de direito contratual da posição de locatário.

Na petição do pedido de pronúncia arbitral, apresentaram os Requerentes como Documento, cópia da escritura de Compra e Venda, lavrada em 2008-06-17, no Cartório Notarial de Lisboa, de …, em que o locatário A…, exerceu a opção contratual de compra, e adquiriu a fracção pelo valor residual de €1.907,90 a sociedade “C..., S.A”., anteriormente denominada “C…, S.A” – Ponto vii) do Probatório

No procedimento administrativo, consta, igualmente, escritura lavrada no Cartório Notarial de Leiria, em que os Requerentes venderam em 2008-12-09, a “F…, S.A.”, a fracção autónoma adquirida através do exercício do direito de opção de compra no termo do contrato de locação financeira em causa, pelo preço de €162.500,00 - Ponto xii) do Probatório – Fls. 91 Livro 146-A do processo administrativo.

Em 2012-05-31 os Requerentes apresentaram junto da Direcção de Finanças de Santarém (Divisão de Tributação e Cobrança), cópia dos Documentos constantes do Ponto xv do Probatório, destinados a fazer prova das despesas e encargos inerentes à aquisição/alienação, na sequência do pedido de esclarecimento, formulado para o efeito, pela Requerida.

A AT impugna o respectivo valor, no art. 51.º da sua Contestação, considerando que as despesas suportadas somam o valor de €51,30 e não, como afirmam os requerentes, de €550,46.

Considerando, porém, nos artigos 53.º e 54.º que, ainda que necessárias e comprovadas, as mesmas não reúnem, para efeitos legais, a qualificação de despesas inerentes à aquisição e alienação, por se tratarem de “despesas meramente instrumentais” e na medida em que “ resultem de negociações bilaterais que não decorram de obrigações legais impostas aos adquirentes e alienantes.

Esta interpretação, necessariamente restritiva, contrasta, porém, com a recente doutrina veiculada pelos Serviços no Processo 12/2008, com despachos concordantes do Substituto Legal do Senhor Director-Geral dos Impostos, de 2008-07-14 e 2008-08 – acima transcritoem que se admite a inclusão das despesas de mediação imobiliária, com base no critério da conexão entre o montante pago ao mediador imobiliário e a transacção concreta.

Pela Informação Vinculativa referente ao Processo n.º 2483/2004, de 2005-03-04acima transcrito – a Administração Fiscal tem vindo igualmente a considerar, como despesas necessárias e inerentes à aquisição e alienação, o Imposto Municipal sobre Transmissões e os encargos notariais e de registo predial, por, sem elas, a operação não se poder vir a realizar, de onde decorre que as despesas legais inerentes às transacções, serão igualmente de considerar na determinação do valor de aquisição.


 

Neste enquadramento, e perante a matéria de facto considerada como provada, deverão considerar-se como despesas necessárias e inerentes:


 

Quanto ao acto de aquisição:

  • Despesas de registo predial, consubstanciadas nos Recibo n.º …/2008, emitido pela Conservatória do Registo Predial de Tomar em 2008-04-07, de €31,5021 - Pontos x.a) e xvi g) do Probatório

  • Imposto de Selo, no montante de €305,97.- Ponto x.c) do Probatório

Quanto ao acto de alienação:

  • Recibo n.º …/2008, emitido pela Conservatória do Registo Predial de Tomar em 2008-08-12, de certidão n.º … – Prédio n.º … – Fracção A, no valor de €30,00;

Na verdade, quer as despesas de registo predial, quer o imposto de selo, são despesas que, do ponto de vista legal, são necessárias à concretização dos actos translativos, as primeiras, por necessidade de exibição no acto de escritura, a segunda, por imposição legal.

Quanto aos demais valores, consubstanciados nas guias/recibos de pagamentos efectuados à Câmara de Tomar ou ao Serviço de Finanças de Tomar, a saber, certidão comprovativa de alvará (Ponto x.b.) do Probatório); caderneta predial impressa em 5.11.2008 e fotocópia autenticada da licença de utilização, os Requerentes não lograram provar, a respectiva inerência e conexão com as transacções em causa nos autos, na medida em que os documentos juntos aos autos não permitem aferir a correspondência entre a natureza dos documentos e a despesa efectuada.

Concluindo,

Ao valor de aquisição deverão ser acrescidas as despesas de aquisição e alienação suportadas pelos Requerentes, nos termos da alínea a) do n.º 1 do art. 51º.º do CIRS, no montante de €367,47.


 

Pelo exposto, é acolhida, parcialmente, a alegação do vício por erro quantos aos pressupostos de facto e de direito na desconsideração das despesas e encargos suportadas pelos Requerentes, nos termos da alínea a) do n.º 1 do art. 51.º do CIRS.


 

3.5. Da anulação parcial da liquidação e do pedido de anulação dos juros compensatórios


 

Do enquadramento exposto, decorre a ilegalidade parcial do acto tributário, e, em consequência, a anulação parcial do acto de liquidação, por se concluir que o valor das rendas pagas pelos Requerentes, acrescendo ao valor residual pago aquando da opção de compra, totalizam a quantia de €48.062,15, valor de aquisição a atender para cálculo do ganho sujeito a mais-valias.

A acrescer ao valor de aquisição, deverão ainda considerar-se as despesas de aquisição e alienação suportadas pelos Requerentes, nos termos da alínea a) do n.º 1 do art. 51º.º do CIRS, no montante de €367,47.

Nos termos do art. 100.º da LGT, a administração tributária está obrigada, em caso de procedência total ou parcial de reclamações ou recursos administrativos, ou de processo judicial a favor do sujeito passivo, à imediata e plena reconstituição da situação que existiria se não tivesse sido cometida a ilegalidade, compreendendo o pagamento de juros indemnizatórios, nos termos e condições previstos na lei. (Redacção dada pela Lei n.º 64-B/2011, de 30 de Dezembro)

Desta norma, infere-se a possibilidade de anulação parcial dos actos tributários, dada a sua natureza de acto divisível. É esta, aliás, a posição consensual da doutrina e da jurisprudência da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo. 22 a qual, para além de apelar a essa divisibilidade, apela, também, à natureza de plena jurisdição da sentença de anulação parcial do acto, invocando razões ligadas aos princípios processuais da economia processual (para que da sentença ou acórdão do tribunal saia logo uma definição da situação que não careça de qualquer nova pronúncia da administração tributária) e ligadas ao próprio âmbito do contencioso de mera anulação (no qual os limites à plena jurisdição só serão de aceitar em relação àqueles aspectos da acção administrativa em que a plena jurisdição implique para o juiz tributário, enquanto juiz administrativo, a prática de actos que afrontem o núcleo essencial da função administrativa). 23

 

Em consequência da ilegalidade da liquidação adicional de IRS, os Requerentes pagaram IRS em excesso e juros compensatórios que não eram devidos, impondo-se, desta forma, o respectivo reembolso, nos termos dos artigos 24.º, n.º 1, alínea b) do RJAT e 100.º da LGT.

Nos termos do n.º 1 do art. 35.º da LGT, são devidos juros compensatórios quando, por facto imputável ao sujeito passivo, for retardada a liquidação de parte ou da totalidade do imposto devido ou a entrega de imposto a pagar antecipadamente, ou retido ou a reter no âmbito da substituição tributária

Os juros compensatórios, acrescem sempre ao montante de imposto calculado, com o qual são conjuntamente liquidados. (n.º 8 do art. 35.º da LGT).

Voltando ao caso concreto, tendo a Requerida efectuado uma liquidação correctiva na qual a matéria colectável sujeita a tributação, e o correspondente imposto liquidado, devem ser anulados parcialmente, óbvia é a conclusão de que o montante de juros compensatórios devem igualmente ser anulados na mesma proporção.


 

3.6. Do direito a juros indemnizatórios

 

No que se refere aos juros indemnizatórios, prevê o art. 100.º da LGT que “A administração tributária está obrigada, em caso de procedência total ou parcial de reclamações ou recursos administrativos, ou de processo judicial a favor do sujeito passivo, à imediata e plena reconstituição da situação que existiria se não tivesse sido cometida a ilegalidade, compreendendo o pagamento de juros indemnizatórios, nos termos e condições previstos na lei”. (Redacção dada pela Lei n.º 64-B/2011, de 30 de Dezembro)

 

A partir da redacção dada a este artigo pela Lei n.º 64-B/2011, de 30 de Dezembro, é agora, pacifico que o direito a juros indemnizatórios deverá ser reconhecido oficiosamente pelo Tribunal, que não está vinculado ao pedido formulado pelas partes, na medida em que se eliminou a parte final do artigo que determinava o pagamento “a partir do termo do prazo de execução da decisão”.

 

Na verdade, a mesma norma, interpretada conjugadamente com o número 4 do art. 61.º do CPPT, nos termos do qual, se a decisão que reconheceu o direito a juros indemnizatórios for judicial, o prazo de pagamento conta-se a partir do início do prazo da sua execução espontânea.  (Redacção da Lei n.º 55.º-A/2010 - 31/12) e com o n.º 7 do mesmo artigo, nos termos do qual, o interessado pode ainda, no prazo de 30 dias contados do termo do prazo de execução espontânea da decisão, reclamar, junto do competente órgão periférico regional da administração tributária, do não pagamento de juros indemnizatórios no caso da execução de uma decisão judicial de que resulte esse direito. (Redacção da Lei n.º 55.º-A/2010 - 31/12), permite-nos concluir que os juros deverão ser incluídos na condenação, contando-se os mesmos a partir do início do prazo da sua execução espontânea.

Conforme já decidido no Acórdão Arbitral proferido no processo n.º 14/2012-T, de 29 de Junho de 2012, compreendem-se nas competências dos tribunais arbitrais tributários as pronúncias condenatórias que em processo de impugnação judicial são admitidas aos tribunais tributários estaduais, sendo de igual forma admissível o reconhecimento do direito a juros indemnizatórios no processo arbitral.

 

Igual conclusão se infere do disposto no n.º 5 do art. 24.º do RJAT.

 

In casu, a anulação da liquidação decorre de uma ilegalidade substantiva, consubstanciada em erro quanto aos pressupostos de facto e de direito, imputável à Autoridade Tributária (Requerida) que, considerando-se assim verificadas as condições constitutivas na esfera dos Requerentes do direito a juros indemnizatórios, de acordo com o preceituado nos artigos 43.º da LGT e 61.º do CPPT, aplicáveis ex vi por força do n.º 5 do art. 24.º do RJAT, calculados sobre a quantia de IRS e juros compensatórios paga em excesso e contados desde a data de pagamento, 2012-09-24, até integral restituição. (n.º 5 do art. 61.º do CPPT).

 

4 – DECISÃO

 

 

Em face do exposto, o Tribunal Arbitral Singular decide julgar parcialmente procedente o pedido de pronuncia arbitral, fundado em ilegalidade parcial ao acto tributário e, em consequência,

 

  1. Anular parcialmente o acto de liquidação de IRS e juros compensatórios correspondentes, com fundamento em vício de violação de lei, por erro quanto aos pressupostos de facto e de direito, por errada interpretação e aplicação dos artigos 46.º, n.º 2 do CIRS, conjugado com os artigos 73.º e 11.º, n.º 3 da LGT, e violação da alínea a) do n.º 1 do art. 51.º do CIRS;

 

  1. Condenar a Autoridade Requerida a restituir o montante correspondente à importância a mais, indevidamente liquidada;

 

  1. Condenar a Autoridade Requerida ao pagamento de juros indemnizatórios até integral reembolso da prestação tributária entregue em excesso.

 

 

 

Valor da causa: € 23.976,84 (97.º-A do CPPT aplicável nos termos do artigo 3.º, n.º 2 do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária)

 

Custas: a cargo da Requerida fixando-se o respectivo montante em € 1.224.00, de acordo com a Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, e com o disposto no artigo 12.º, n.º 2 do RJAT e artigo 4.º, n.º 4 do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária.

 

* * *

 

 

Notifique-se.

 

 

Lisboa, 31 de Janeiro de 2013.

 

 

 

A Árbitra

 

 

 

Maria Celeste Cardona

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

1 In, PAULA ROSADO PEREIRA, Estudos sobre o IRS: Rendimentos de Capitais e Mais-Valias, Cadernos IDEFF, n.º 2, Almedina, 2007, pp88

2 In JOSE GUILHERME XAVIER DE BASTO, IRS, Incidência Real e Determinação dos Rendimentos Líquidos, Coimbra Editora, 2007, p.431

3 Neste sentido, SILVERIO MATEUS, CORVELO DE FREITAS, Os Impostos sobre o Património Imobiliário, anotados e comentados, Engifisco, 1ª Edição, p.424

4 Disponível em www.dgsi.pt

5 Diário da República, 2.ª série — N.º 13 — 19 de Janeiro de 2011

6 O juiz é livre na busca e na escolha da norma justa que considera adequada. O autor ou o réu invoca determinada disposição legal; se o juiz entender que tal disposição não existe, ou que, apesar de existir, não é a que se ajusta ao caso concreto em litigio, põe completamente de parte a indicação feita pela parte e vai buscar a regra de direito que, em seu modo de ver, regula a espécie de que se trata (ALBERTO DOS REIS, Código de Processo Civil anotado, Volume V, p. 93)

7 Para aprofundamento do sentido do artigo 12.º, n.º 4, regra 14.º do Código do Imposto Municipal sobre Transmissões Onerosas (CIMT), em face da evolução do regime jurídico de locação financeira, JOSÉ MARIA FERNANDES PIRES, Lições de Imposto sobre o Património e Selo, Almedina, 2ª Edição, 2012, pp. 237 e ss

8 SOARES MARTINEZ, Direito Fiscal, 7ª Edição, p.126

9 Acórdãos do TC 358/92 (DR I Série, de 1993-01-26); 57/95 (DR II Série, de 1995-04-12); 211/03 (DR II Série, de 2003-06-21);84/03 (DR II Série, de 2003-05-29) e 452/2003 (DR II Série, de 2003-11-21)

10 Acórdão do STA n.º 553/09, de 2009-11-04.Também neste sentido, no plano doutrinal, JORGE LOPES DE SOUSA, CPPT anotado e comentado, Áreas Editora, 6ª Edição, VOL I, pp. 586 e 587 e JOSE GUILHEME XAVIER DE BASTO, IRS, Incidência Real e Determinação dos Rendimentos Líquidos, Coimbra Editora, 2007, p.447

 

11 JORGE LOPES DE SOUSA, CPPT anotado e comentado, Áreas Editora, 6ª Edição, VOL I, Anotação 5 ao art.64.º, p.589

12 Neste sentido, JOSÉ CASALTA NABAIS, O Dever Fundamental de Pagar Impostos, Coimbra, Almedina, 1998, em especial pp. 497/498

13 Cfr. N.º 2 do art. 44.º do CIRS quanto ao valor de realização

14 Como diz BAPTISTA MACHADO, «A razão pela qual a lei interpretativa se aplica a factos e situações anteriores reside fundamentalmente em que ela, vindo consagrar e fixar uma das interpretações possíveis da LA com que os interessados podiam e deviam contar, não é susceptível de violar expectativas seguras e legitimamente fundadas» (() (Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador, Almedina, pág. 246.)).

 

15 MANUEL DE ANDRADE, Noções Elementares de Processo Civil, 1979, p.374

16 JORGE LOPES DE SOUSA, CPPT anotado e comentado, Áreas Editora, 6ª Edição, VOL I, Anotação 5 ao art.64.º, pp. 590 e 591

 

17 Idem, Ob. Citada. Com interesse doutrinal sobre a questão entre os conflitos entre as normas de simplificação e o princípio da capacidade contributiva, veja-se GUSTAVO CALDAS GUIMARÃES DE CAMPOS, Estudos de Direito Fiscal, Almedina, 2007, pp. 103 e ss.

18 Nos termos do art.1.º do DL n.º 149/95, de 24/6 «a Locação Financeira é o contrato através do qual uma das partes se obriga, mediante retribuição, a ceder à outra o gozo temporário de uma coisa móvel ou imóvel, adquirida ou construída por indicação desta, e que o locatário poderá comprar, decorrido o período acordado, por um preço nele determinado ou determinável, mediante simples aplicação dos critérios nele fixados

19 DIOGO LEITE DE CAMPOS, A Locação Financeira, AAFDL, 2012, pp. 128 e ss.

20 DIOGO LEITE DE CAMPOS, Ob. Citada, p. 136

21 Este documento, apesar de não elencado pela Requerida, foi apresentado em sede de audição prévia pelos Requerentes – Cfr. Procedimento administrativo

22 Cfr., entre outros, os acórdãos proferidos em 9/07/1997, no processo n.º 5874; em 22/09/1999, no processo n.º 24101; em 16/05/2001, no processo n.º 25532; em 26/03/2003, no processo n.º 1973/02; em 27/09/2005, no processo n.º 287/05; e em 12/01/2011, no processo n.º 583/10.),

23 Cfr. o Prof. Saldanha Sanches, in Fiscalidade, 7/8, Julho-Outubro de 2001, págs. 63 e segs., e o Prof. Casalta Nabais, in Direito Fiscal, 2ª ed., pág. 397.