Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 795/2022-T
Data da decisão: 2023-07-11  IVA  
Valor do pedido: € 5.766,47
Tema: Falta ou insuficiência de fundamentação; prova das transações intracomunitárias de bens (art. 14.º, n.º 1, al. a), do RITI).
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Sumário:

1. Não há falta ou insuficiência de fundamentação, se a AT indica os seus argumentos de forma sucinta, mas precisa, sendo totalmente compreendidos por destinatário médio e pela requerente;

2. Na inexistência de documento de transporte (que acompanha as mercadorias), o art. 14.º, n.º 1, al. a) do RITI obriga a prova, a cargo do contribuinte, do transporte dos bens do território nacional para outro Estado Membro, que se pode socorrer de qualquer meio de prova, que permita atestar a expedição do bem do território nacional para outro Estado Membro, sem a tornar excessivamente onerosa, desproporcional ou desatendendo à substância sobre a forma. Mas não o tendo efetuado, de forma cabal e concreta, improcede a pretensão do requerente.

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Decisão arbitral

O árbitro singular Tomás Cantista Tavares, designado pelo CAAD para formar o Tribunal Arbitral singular, constituído em 28/2/2023, acorda no seguinte:

1. Relatório

A..., SA, contribuinte..., com residência na ..., ... a ..., ... (doravante A... ou Requerente), apresentou um pedido de constituição do tribunal arbitral singular, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 2.º, n,º 1, al. a), 5.º, n.º 2, 6.º, n.º 1, todos do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, doravante RJAT), em que é Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira (doravante AT), com vista à declaração de ilegalidade das seguintes liquidações mensais de IVA de IRS de 2017 e 2018 de que resultaram a desconsideração de crédito de imposto nos dois anos de 5.766,47€ (e reflexamente a anulação, também, dos atos de indeferimento expresso das reclamações graciosas de IVA de 2017 e 2018).

 

Liq. Nº ... – Período: 17/01 – Crédito Desconsiderado - € 1.475,98 Liq. Nº ... – Período: 17/02 – Crédito Desconsiderado - € 1.519,92 Liq. Nº ... – Período: 17/03 – Crédito Desconsiderado - € 1.534,14 Liq. Nº ... – Período: 17/04 – Crédito Desconsiderado - € 1.637,39 Liq. Nº ... – Período: 17/05 – Crédito Desconsiderado - € 1.645,89 Liq. Nº ... – Período: 17/06 – Crédito Desconsiderado - € 1.823,40 Liq. Nº ... – Período: 17/07 – Crédito Desconsiderado - € 1.855,29 Liq. Nº ... – Período: 17/08 – Crédito Desconsiderado - € 2.436,15 Liq. Nº ... – Período: 17/09 – Crédito Desconsiderado - € 2.441,52 Liq. Nº ... – Período: 17/10 – Crédito Desconsiderado - € 2.481,35 Liq. Nº ... – Período: 17/11 – Crédito Desconsiderado - € 2.700,37 Liq. Nº ... – Período: 17/12 – Crédito Desconsiderado - € 2.822,77; Liq. Nº ... – Período: 18/01 – Crédito Desconsiderado - € 376,99 Liq. Nº ... – Período: 18/02 – Crédito Desconsiderado - € 760,31 Liq. Nº ... – Período: 18/03 – Crédito Desconsiderado - € 1.167,70 Liq. Nº ... – Período: 18/04 – Crédito Desconsiderado - € 1.239,65 Liq. Nº ... – Período: 18/05 – Crédito Desconsiderado - € 1.405,24 Liq. Nº ... – Período: 18/06 – Crédito Desconsiderado - € 1.487,53 Liq. Nº ... – Período: 18/07 – Crédito Desconsiderado - € 1.550,54 Liq. Nº ... – Período: 18/08 – Crédito Desconsiderado - € 1.792,99 Liq. Nº...– Período: 18/09 – Crédito Desconsiderado - € 2.145,36 Liq. Nº... – Período: 18/10 – Crédito Desconsiderado - € 2.389,89 Liq. Nº ... – Período: 18/11 – Crédito Desconsiderado - € 2.708,74 Liq. Nº ... – Período: 18/12 – Crédito Desconsiderado - € 2.943,70

O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD e seguiu a sua normal tramitação, nomeadamente com a notificação à AT. O árbitro comunicou a sua aceitação no prazo aplicável. As partes não manifestaram vontade de recusar a sua designação.

O tribunal arbitral foi constituído em 28/2/2023. A AT exerceu resposta, por impugnação – e enviou atempadamente o Processo Administrativo.

O Tribunal notificou as partes para se efetuar reunião do art. 18.º do RJAT, seguida de inquirição de testemunhas, no dia 15/5/2023. Os mandatários não compareceram à diligência, nem justificaram a falta – e a testemunha também não compareceu. Perante isso, o tribunal deu a inquirição sem efeito, e declarou encerrada a fase da prova; constatou ainda que o processo poderia prosseguir, notificando as partes para alegarem, querendo. A requerente efetuou alegações em linha com o declarado no requerimento inicial, e relativizou a falta de comparência e arguiu a desnecessidade da prova testemunhal, que havia arrolado. A requerida não apresentou alegações.

O tribunal arbitral foi regularmente constituído e é materialmente competente, como se dispõe no art. 2.º, n.º 1, al. a) e 4.º, ambos do RJAT.

As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão representadas (arts. 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e art. 1.º a 3.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março).

O processo não enferma de nulidades, aceita-se a cumulação de pedidos, e não há qualquer obstáculo à apreciação do mérito da causa.

A requerente estriba a sua pretensão nos seguintes argumentos essenciais:

  1. Falta ou insuficiência de fundamentação, com argumentos vários, nos termos do art. 77.º da LGT;
  2. Violação do procedimento inspetivo e anulação dos atos subsequentes
  3. Aplicação da isenção do art. 14.º, n.º 1, al. a) do RITI, por verificação, na sua opinião, dos requisitos legais e de prova da transmissão dos bens do território nacional para outro Estado Membro

A requerida refuta esses argumentos (como melhor se exporá adiante): entende que não existe qualquer falta ou insuficiência de fundamentação e que não tendo o requerente efetuado prova da transmissão intracomunitária, não pode beneficiar da isenção do art. 14.º, n.º 1, al. a), do RITI.

 

2. Matéria de facto

2.1. Factos provados

Consideram-se provados os seguintes factos relevantes para a decisão:

  1. A requerente dedica-se à transformação de produtos de pesca e congelados em conservas e patés.
  2. Na declaração periódica de IVA de 5/2021, a requerente solicitou o reembolso de 210 mil euros, de um crédito que se arrogava de 234.749,13€
  3. Perante isso, a AT encetou inspeção tributária, onde conclui pelo deferimento parcial do reembolso, mas, em relação a 2017 e 2018, desconsiderou o crédito de IVA no valor de 5.766,47€;
  4. Emitindo, para o efeito, fundamentação sumária e as correspondentes liquidações adicionais de IVA, objeto de contestação nesta arbitragem – com base, em síntese, na não aplicação da isenção de IVA do art. 14.º, n.º 1, al. a), do RITI, por o requerente não ter provado que os bens foram transportados para um sujeito passivo de outro Estado Membro da União Europeia
  5. Inconformada, a requerente apresentou reclamações graciosas (uma para 2017 e outra para 2018) que foram indeferidas – e perante isso, a deduziu a presente ação arbitral.
  6. As operações em causa não são acompanhadas pelo respetivo documento e transporte (que acompanha o transporte), que não foi exibido no processo.

 

2.2. Factos não provados

Em relação a todas e cada uma das operações em causa (suportadas por faturas), não está provado que os bens foram transportados de Portugal para outro Estado Membro.

Não está provado igualmente que tenha havido anterior inspeção externa sobre os mesmos factos – e que nessa inspeção a AT tenha aceitado a isenção do IVA nas operações em causa, por correta documentação e prova nos termos do art. 14.º, n.º 1, al. a) do RITI.

 

2.3. Fundamentação da fixação da matéria de facto

Relativamente à matéria de facto, o tribunal não tem de se pronunciar sobre tudo o que foi alegado pelas partes, cabendo-lhe apenas selecionar os factos que importam para a decisão e discriminar a matéria provada (art. 123.º, n.º 2, do CPPT e art. 607.º, n.º 3, do CPC, aplicável ex vi art. 29.º, n.º 1, al. a) e e) do RJAT.

Os factos considerados provados constam de documentos e do consenso entre as partes

Em relação ao facto não provado, importa precisar: a AT, em sede inspetiva, constata que não existem documentos de transporte – o documento idóneo e direto para comprovar esse facto (transporte dos bens de Portugal para outro Estado Membro de União Europeia, para aproveitar da isenção na transmissão intracomunitária, como se arrogou a requerente); no processo inspetivo e nesta sede judicial, a requerente não logrou provar esse facto, que lhe competia, com base na repartição geral do ónus da prova. Com efeito, se a AT constata a falta da prova direta e perante os demais dados, pode não considerar provada essa situação [transporte intracomunitário] e então o contribuinte possui todos os meios de prova para esse facto essencial para o propósito do caso dos autos.

E, na verdade, a requerente não logrou fazer essa prova; referiu, no requerimento inicial, que juntaria documentação idónea a essa prova, mas afinal não a juntou e invocou, depois, nas alegações, que a mesma estaria já junta no processo administrativo e no processo, mas não o pormenoriza, nem detalha, com remissão concreta para as folhas do processo e na leitura guiadas desses mesmos documentos.

Mais ainda: no requerimento inicial indica que pretende prova testemunhal, seguramente também para fazer prova destes factos essenciais do processo; mas nas alegações, perante a falta da testemunha (e do mandatário) vem dizer depois, em alegações, que o seu depoimento seria meramente acessório e prescindível, pois o mais relevante estaria na prova documental do processo.

Quer dizer: quem tem prova direta, certa e concludente – junta-a ao processo e faz a ela referência exata, por remissão com o processo administrativo, mas suas páginas exatas, explicando o teor dos documentos, de forma precisa e clara, pelo menos por amostragem, se forem todos de natureza similar. E seguramente que completaria a prova, com prova testemunhal, por alguém com conhecimento direto dos factos, para enquadrar o tema: justificações da inexistência de documentos de transporte; e quais são os documentos existentes e como foram obtidos e como se processaram, etc. E nada disso foi efetuado pelo requerente, apesar de lhe terem sido concedidos todos os direitos processuais adequados nesta arbitragem.

 

3. Matéria de direito

A requerente invoca, em síntese, três grandes argumentos (cada um corresponde a um capítulo do requerimento inicial), que serão abordados autonomamente, de seguida, com a indicação dos argumentos das partes e a decisão que o tribunal efetua de cada uma dessas situações.

 

3.1 Falta de fundamentação

Ao que se percebe, a requerente advoga, em síntese, que as correções não poderiam ser dos anos de 2017 e 2018, mas de períodos posteriores, e que existem discrepâncias quantitativas, de 3 e 6 cêntimos, entre o valor total da liquidação e do relatório inspetivo, nos anos de 2017 e 2018, respetivamente – e um cêntimo é um cêntimo e, basta isso, para se consumar o vício formal de falta de fundamentação.

A Requerida advoga que a as correções são efetivamente de operações dos anos de 2017 e 2018 – e logo as correções são relativas a esses períodos, apesar de despoletadas por uma inspeção na sequência de pedido de reembolso de IVA na declaração periódica de maio de 2021.

Não assiste razão à requerente; não há qualquer falta ou insuficiência de fundamentação; as correções de IVA, por falta de prova das transações intracomunitárias efetuadas nos períodos de 2017 e 2018 têm de ser corrigias (e liquidadas adicionalmente) por referência a esses anos; as liquidações têm de se reportar a esses períodos de 2017 e 2018, não obstante despoletas por indeferimento parcial de pedido de reembolso solicitado em ano posterior.

Do mesmo modo, nenhum desvalor se verifica por causa discrepância referida de poucos cêntimos entre o valor anual da correção, tal como está no relatório inspetivo e nas respetivas liquidações. Por duas razões: por um lado, porque se trata de acertos de vários valores anuais (12 correções, uma por mês, no limite) e é possível que essa discrepância surja, pois, as liquidações adicionais são efetuadas de forma automática e podem acertar os cêntimos, para cima ou para baixo, até porque no IVA se lida com conta corrente de créditos e débitos entre o Estado e o contribuinte; numa discrepância sem qualquer dano, ou com dano marginal – sendo totalmente desproporcionado anular liquidações com base nessa situação, explicada e justificável. E por outro lado, porque a requerente sabe perfeitamente que os valores liquidados se reportam às situações descritas no relatório inspetivo, como aliás, o assume no requerimento inicial, e essa situação não cria, por si uma falta o insuficiência de fundamentação, no sentido do contribuinte ter dificuldade acrescida em perceber o iter cognoscitivo da AT, fragilizando a sua capacidade de defesa. A requerente compreende exatamente os motivos da correção da AT, em termos qualitativos e quantitativos.

 

3.2. Alegada violação do procedimento inspetivo

Neste segmento, a requerente invoca, que o indeferimento parcial do pedido de reembolso nunca poderia dar azo a liquidações adicionais de 2017 e 2018, porque esses períodos já haviam sido objeto de reembolsos de IVA; quando muito, a AT teria de efetuar uma inspeção autónoma a esses períodos sem conexão com o processo de pedido de reembolso.

A AT contesta, dizendo, em síntese, que os anteriores reembolsos de 2017 e 2018 foram automáticos e não precedidos de ação inspetiva; e, em todo o caso, que não existe qualquer princípio ou regra que impossibilite tal situação.

O tribunal decide no sentido da inexistência de qualquer vício de procedimento. Se uma inspeção tributária deteta qualquer incorreção, tem obrigação, pelo princípio da legalidade, de proceder em conformidade, liquidando adicionalmente os períodos em causa, ainda que extravasassem o intervalo temporal inicial da inspeção, desde que asseguradas ao contribuinte todos os seus direitos, para de participação e colaboração (e demais direitos processuais) e desse que não verificada a caducidade do direito à liquidação. E a AT respeitou todos estes direitos do contribuinte – não se verifica a caducidade do direito à liquidação (aliás, nem foi invocada) e a requerente pôde pronunciar-se sempre sobre este tema, assegurando-lhe todos os seus direitos de defesa.

Fica apenas uma última questão, que não foi esgrimida claramente pela requerente, mas apenas nas entrelinhas da sua retórica, mas que o tribunal tem de se debruçar, com os elementos que possui, pois está minimamente exposta. A lei contém uma regra de proibição de sucessivas ações inspetivas, nos apertados termos do art. 63.º, n.º 4, da LGT – como direito de defesa dos cidadãos contra um Estado intrusivo nos seus direitos e segurança: assim, diz a lei que, por regra, não pode haver dois processos inspetivos externos sobre o mesmo ano e imposto, exceto se fundar em factos novos e outras situações excecionais.

Ora, o requerente não alega e não prova que a primeira inspeção ao ano de 2017 e 2018 tenha sido de natureza externa, sobretudo quando a AT argumenta que se tratara de reembolsos processados automaticamente, com base no pedido anterior. E além disso, o requerente não prova que estes dados (falta de prova das transações intracomunitárias) já estavam contidos no anterior reembolso – e que a AT, no passado, considerou que estaria tudo correto, e que agora mudou de posição, estando isso assumido na anterior inspeção.

Quer dizer: a requerente não tem a tutela do art. 63.º, n.º 4, da LGT, porque no caso não se verificam os pressupostos desse instituto que proíbem a dupla inspeção; e, por outo lado, fora desse preceito legal, não existe qualquer princípio geral que proíba uma segunda inspeção fiscal: a justiça na tributação, em que os sujeitos devem ser tributados pela sua capacidade contributiva, impõe um largo espectro corretivo a cargo da AT, fora do condicionalismo do art. 63.º da LGT.

 

3.3. isenção nas transações intracomunitárias – prova e art. 14º, n.º 1, al. a), do RITI

Segundo o art. 14.º, n.º 1, al. a), do RITI, as transmissões intracomunitárias de bens estão isentas de IVA: as transmissões de bens transportadas a partir do território nacional para outro Estado Membro da União Europeia com destino ao adquirente.

Tal traduz-se, na verdade, de regime diverso do IVA em operações totalmente domésticas (quando os bens não saem de território nacional) – em que estão sujeitas e não isentas de imposto.

Donde, a verificação e comprovação do requisito material assume uma importância capital, até para evitar abusos e fraudes – declaração de que se trata de operação intracomunitária, quando não o é na realidade, na mira de defraudar a lei do IVA, com ilícito acesso a benefício fiscal.

Por regra, o transporte dos bens é acompanhado de documento de transporte, com obrigação legal, que documenta e comprova, de forma estável e fácil, a verificação do requisito em causa. Com efeito, o documento de transporte é documento standard que existe na documentação de uma transação (juntamente com a fatura).

Nos casos dos autos, temos situações de alegadas transações intracomunitárias, mas sem esse documento idóneo e normal de comprovação. Perante isso, a AT não aceita a isenção do art. 14.º do RIT, após ter solicitado ao contribuinte que o comprovasse de outras aneiras que entendesse – e entendeu que não o fez cabalmente.

Para o Tribunal, perante esta tela factual, passa a caber ao requerente a prova da existência de uma transação intracomunitárias, pois não está munido do documento direto e concludente (art. 342.º do Código Civil). E o requerente poderia apresentar qualquer meio de prova (ou meios de prova) que explicassem que ocorreram de facto transações intracomunitárias, e que tem assim acesso à isenção do art. 14.º do RITI.

Mas, o requerente não o conseguiu provar – em relação a todas e cada uma das operações em causa; não junta documentação que protestou juntar no requerimento inicial, com esse propósito; e diz depois que estão juntos ao processo, sem a detalhar em concreto para o processo administrativo, e sem a explicar em termos concretos em como se corporiza essa prova; como por atos imputáveis ao requerente, não foi ouvida a prova testemunhal que havia arrolado no requerimento inicial, que depois, em alegações declara que seria sempre uma prova acessória. Numa palavra, o requerente não prova a verificação do pressuposto do art. 14.º, n.º 1, al. a), do RITI.

O requerente alega ainda que essa prova não lhe competiria; também nos termos do art. 75.º da LGT; e que a AT teria uma obrigação oficiosa de inquisitório, de descobrir a verdade material. Mas não tem razão em ambos os casos.

O art. 75.º da LGT, na dimensão da fatura, confere presunção de veracidade de ocorrência da operação – mas não do modo e destino do transporte. Isso seria obtido com o documento de transporte, que não existe no caso dos autos. Logo, na sua ausência, é ao requerente que compete a prova do transporte de Portugal para outro Estado Membro, por quaisquer formas ao seu alcance – mas que não o fez.

Por outro lado, não existe um princípio do inquisitório com uma dimensão e intensidade tal, que anulem a obrigação de prova a cargo do requerente. Claro que a AT está vinculada à lei – e se conclui pelo preenchimento dos requisitos da isenção, tem de a conceder, se os factos estão na sua esfera, não obstante a inexistência do documento de transporte. Mas não o considerando provado, não tem esse dever de investigação oficiosa, pois não é esse o ponto de equilíbrio entre o ónus da prova e o poder de investigação da AT.

Por todos estes motivos, não se anulam as liquidações de IVA em causa: não provando o requerente a existência de operações intracomunitárias, não se lhes pode aplicar a isenção descrita no art. 14.º, n.º 1, al. a), do RITI.

Perante esta decisão, torna-se desnecessário, por irrelevante, que o tribunal se debruce sobre os demais temas apontados pelo requerente, nomeadamente a putativa anulação do indeferimento parcial do pedido de reembolso e o tema dos juros indemnizatórios.

 

4. Decisão

De harmonia com o exposto, este Tribunal Arbitral:

  1. Julga totalmente improcedente o pedido da requerente
  2. Não anula as liquidações de IVA impugnadas dos anos de 2017 e 2018
  3. Condena a requerente à totalidade das custas

 

6. Valor do processo

De harmonia com o disposto no art. 97.º-A, n.º 1, alínea a), do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária fixa-se ao processo o valor de € 5.766,47€, indicado pela Requerente e sem oposição da Autoridade Tributária e Aduaneira.

 

7. Custas

Nos termos do n.º 4 do art. 22.º do RJAT, fixa-se o montante das custas em 612,00€ (seiscentos e doze euros), nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, a cargo da Requerente.

 

8. Comunicação ao Ministério Público 

Comunique-se ao Ministério Público, nos termos do artigo 17.º, n.º 3, do RJAT

Notifique-se

Porto, 11 de julho de 2023

O Árbitro singular

 

Tomás Cantista Tavares

 

 

(Texto elaborado em computador, nos termos do artigo 131º nº 5 do Código de Processo Civil, aplicável por remissão do artigo 29º nº 1 alínea e) do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária)