Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 539/2023-T
Data da decisão: 2023-12-04  IRS  
Valor do pedido: € 57.583,76
Tema: IRS – Revogação Parcial Acto Tributário; Ampliação da instância arbitral; art.º 16.º do Código do IRS; Residentes e não Residentes; Domicílio e Residência Fiscal.
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SUMÁRIO:

 

  1. A revogação, ainda que parcial, dos atos tributários impugnados corresponde à integral satisfação da pretensão dos Requerentes, originando assim a inutilidade superveniente da lide, nos termos da alínea e) do artigo 277.º do Código do Processo Civil (CPC), aplicável ex vi pela alínea e) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT.

 

  1.  A revogação parcial de uma liquidação e a substituição do montante da mesma pelo novo montante, não se traduz na revogação da liquidação e sua substituição por outra, constituindo esta, uma liquidação correctiva que opera a sanação por reforma da liquidação inicial, retroagindo os seus efeitos à data do acto reformado (artigo 137.º, n.º 4 do CPA).

 

  1. Tal liquidação correctiva constitui fundamento de alteração objectiva da instância por ampliação do objecto da mesma, aplicando-se devidamente adaptado o art.º 64.º do CPTA.

 

  1. Os sujeitos passivos residentes em território nacional são tributados pela regra da universalidade ou de base mundial, segundo a qual, são tributadas pela totalidade dos rendimentos obtidos, incluindo os obtidos no estrangeiro; Os sujeitos passivos não residentes em território nacional são aqui tributados, de acordo com a regra da territorialidade, pelos rendimentos aqui obtidos. Para o efeito, no n.º 1 do artigo 18.º do Código do IRS são enumeradas as diversas situações que se configuram como rendimentos obtidos em território nacional, sendo apenas estes rendimentos quando obtidos por não residentes, aqui tributados.

 

  1. A qualificação como residente para efeitos fiscais em Portugal é determinada pelos critérios constantes do art.º 16.º do Código do IRS, sendo as noções de “residência fiscal” e de “domicílio fiscal” diferentes, pelo que o dever de comunicação, previsto no artigo 19.º, n.º 3, da LGT, não é uma formalidade ad substanciam e a sua preterição não tem necessária e definitivamente impacto em termos de tributação.

 

 

DECISÃO ARBITRAL

O árbitro António Pragal Colaço, designado pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa (“CAAD”) para formar o presente Tribunal Arbitral Singular, constituído em 3 de Outubro de 2023, decide neste Tribunal o seguinte:

 

  1. Relatório

 

A..., com o número de identificação fiscal..., casado, residente na Rua ... n.º ..., freguesia de ..., ...-..., Viana do Castelo, doravante abreviadamente designada por “Requerente”, veio, nos termos do disposto nos artigos 2°, n.° 1, alínea a), e 10.°, n.° 1, alínea a), do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (doravante “RJAT”), requerer a constituição de Tribunal Arbitral, sendo “Requerida” a Autoridade Tributária e Aduaneira.

 

  1. O pedido

 

O Requerente pede que seja declarada a (i) anulação da liquidação de IRS, n.° 2022... (documento n.º 2022...), referente a 2018 e respetivos juros compensatórios, do valor total de 57.583,76€ e bem assim (ii) a restituição da totalidade do imposto já pago pelo Requerente, do montante de 57.583,76€, acrescido dos juros indemnizatórios, contabilizados desde a data do seu pagamento voluntario (7.11.2022) e ate à emissão da nota de crédito, nos termos dos artigos 43.° e 100.° da LGT;

 

O Requerente nem no intróito do seu ppa, nem no pedido final, demanda expressamente a anulação da decisão de indeferimento da Reclamação Graciosa, a qual só se toma conhecimento após a leitura do art.º 5.º do seu ppa. O Requerente escreve no art.º 9.º o seguinte:

“O pedido de pronuncia arbitral tem, assim, por objeto a decisão de indeferimento da reclamação graciosa e, em especial, o ato tributário (liquidação) identificado no item 1 desta petição.”

Conforme se mencionou, apesar desta referência, o mesmo não consta nem do intróito, nem no pedido. No entanto, encontram-se identificados os actos que o Requerente demanda a intervenção deste Tribunal Arbitral, nem a Requerida os colocou em causa.

 

  1. Tramitação Processual

 

O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite em 24/7/2023.

Em 2029-09-10, foi proferido pela Sra SDG despacho de revogação parcial do ato contestado, exarado na informação n.º 1471/2023 da DSRI, conforme comunicado ao tribunal arbitral em 2023-09-25, do qual consta:

“Após apreciação do pedido de pronúncia arbitral e tendo em conta o anteriormente exposto, afigura-se-nos que o acto de liquidação de IRS n.º. 2022..., do ano de 2018, no valor de € 57.583,76, deverá ser parcialmente revogado na parte em que considerou que o período de permanência do Requerente na República Checa foi igual ou inferior a 183 dias e na parte em que não considerou o imposto pago na República Checa.”

Notificado o Requerente, o mesmo pronunciou-se requerendo “o prosseguimento do procedimento para prolação de douta decisão arbitral quanto à parte do ato tributário cuja legalidade se mantém controvertida.” (conforme requerimento de 2023-09-28).

O árbitro foi designado pelo Conselho Deontológico, que comunicou a aceitação do encargo no prazo aplicável, sendo que tal nomeação não foi objeto de objeção.

O Tribunal Arbitral Singular ficou constituído em 03/10/2023.

A Requerida apresentou Resposta, defendendo a improcedência do pedido arbitral e juntou o respetivo processo administrativo em 31/10/2023.

Por despacho arbitral de 1 de Novembro de 2023 foi dispensada a reunião do Tribunal com as partes (artigo 18º, do RJAT), considerando que se trata, no caso, de processo não passível duma definição de trâmites processuais específicos, diferentes dos comummente seguidos pelo CAAD na generalidade dos processos arbitrais e que não há exceções ou questões prévias a apreciar nesta fase, nem aparente necessidade de correção de peças processuais. Foram também prescindidas as alegações das partes uma vez que as questões a decidir são de direito e as partes, nos seus articulados, ja deixaram exaustivamente expostas as suas posições.

Foi também indicado o prazo previsível de prolacção da decisão final nos termos do art.º 21.º do RJAT, bem como ordenado ao Requerente o pagamento da taxa de arbitragem remanescente.

 

  1. Posições do Requerente e da Requerida

 

O Requerente considera que:

-  É nacional português com o NIF..., e que o seu domicílio fiscal está fixado na Rua da ..., freguesia de ..., ...-... Viana do Castelo, área do serviço de finanças de ... .

- Mais indica que formalizou em 12.12.2017 um contrato de trabalho com a empresa B..., Sp., com sede em ..., ... Varsovia, Polonia, com início em 10.01.2018 e termo em 30.09.2018, contrato esse que se foi sucessivamente renovando ate 30.04.2019, quando cessou, tendo sido admitido para exercer as funções de “piping supervisor” no âmbito do projeto “...”, que a referida empresa tinha em execução na Chéquia (ou República Checa).

Com base na cláusula 6.1 do referido contrato de trabalho, foi convencionada uma remuneração do valor mensal líquido (monthly net fixed fee, no texto original) de 5.000,00€ (cinco mil euros), creditado, mensalmente, na conta com o IBAN PT50..., domiciliada no Millennium BCP, em Portugal, sendo que os impostos sobre o rendimento, incidentes sobre o seu valor bruto ou ilíquido, eram objeto de retenção na fonte pela empregadora e pagos ou entregues junto das autoridades fiscais da República Checa, por ser o local da prestação do trabalho.

O Requerente auferia ainda, a título de ajudas de custo, o montante mensal de 1.000,00€ para transportes (carro, gasóleo e seguros), 1.200,00€ para alojamento (renda) e despesas domésticas e 950,00€ para alimentação, as quais eram creditadas mensalmente, na conta com o IBAN CZ..., que o Requerente, por determinação da empregadora, abriu no UniCredit Bank, na Chéquia pelo que auferia por mês, em média, o montante líquido de 8.150,00€, sendo 5.000,00€ de salário e 3.150,00€ de ajustas de custo.

No ano de 2018, o Requerente trabalhou, exclusivamente, na Chéquia ao serviço da referida empresa, estava inscrito como residente fiscal na Chéquia, tendo lhe sido atribuído o número de identificação fiscal (tax identification number ou, no original checo, vlastni cislo platce)... . Esteve hospedado entre 10.01.2018 e 31.03.2018, no hotel ..., em..., República Checa, disponibilizado pela sua empregadora e pago por esta, e a partir de 1.04.2018, passou a residir em casa arrendada, tendo, para esse efeito, celebrado um contrato de arrendamento, o que se manteve até 30.04.2019, quando cessou o seu contrato de trabalho, data em que entregou a casa ao senhorio.

 - Mais diz, que declarou os rendimentos que auferiu em 2018 na República Checa, no valor de 3.232. 811 e a matéria tributável (tax base) foi de 3.883.512. Em 31.12.2018, uma coroa checa valia 0,03887 euros, pelo que os valores em apreço correspondem a 126.079,63€ e 151.456,97€ (3.232.811x0,039 e 3.883.512 x 0,039, respetivamente).

O total de imposto pago pelo Requerente na Chéquia, reportado aos rendimentos auferidos em 2018 nesse país, foi de 683.253 (amount of tax paid) coroas checas, o que efetivou em 1.07.2018 (date of tax payment).

O Requerente, no período em que residiu e trabalhou na Chéquia, não alterou o seu domicílio fiscal em Portugal, mantendo-o e porque os rendimentos que auferiu em 2018 tinham sido declarados e tributados na Chéquia, por um lado, e, por outro, porque era nesse país que tinha fixada a sua vida pessoal e profissional, o Requerente assumiu que não tinha de os declarar também em Portugal e liquidar aí o respetivo imposto. No entanto, a Requerida emitiu uma nota de liquidação, na sequência de um procedimento de inspecção, constando como apurado um rendimento global de 125.619,19€ e como rendimento coletável 121.515,19€

- O Requerente disseca então sobre a questão de direito objeto deste ppa, que considera consistir essencialmente em saber se o Requerente no ano de 2018 deve ou não ser considerado como residente em Portugal e se, em face da resposta dada a essa questão, o Estado português tem ou não poderes para tributar os rendimentos auferidos pelo Reclamante na República Checa no mesmo período. Acrescenta ainda que, por outro lado, e a montante, perceber, também, qual a consequência material da não alteração e comunicação atempada da mudança de domicílio in casu operada, isto conforme o estatuído no art.º 19.º da LGT.

- Conclui então que deve ser considerado residente na República Chequia, e não-residente fiscal em Portugal, utilizando no entanto vários conceitos, domicílio fiscal, residência fiscal, residência própria e permanente, “[é] evidente que, sendo a residência habitual o local onde a pessoa normalmente vive e tem o seu centro de vida, não medeiam grandes diferenças entre o «domicílio fiscal» e a «habitação permanente»: há entre as duas figuras uma relação íntima, que se traduz em ambas pressuporem um lugar com o qual certa pessoa está em ligação, o local onde tem a sua existência organizada e que, como tal, lhe serve de base de vida.” (Cf. Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 11/23/2011, proferido no processo 0590/11), invocando a aplicação do artigo 15.º da CDT, qualificando o Requerente como residente na República Checa para efeitos da CDT, pelo que, ao Requerente assistia o direito de se ver tributado apenas pelo Estado Checo e não, também, pelo Estado Português.

Ou, e mesmo que assim não fosse, caso a administração tributária portuguesa tivesse competência para tributar o Requerente, ao imposto por ela liquidado teria sempre de ser deduzido o imposto já pago sobre os mesmos rendimentos no estado de origem (Chéquia), no valor de 26.817,68€, apurado nos termos referidos no item 41 deste articulado.

 

- A Requerida defende-se por impugnação: 

Aceitando que, por média, o Requerente auferia por mês o montante líquido de € 8.150,00 (€ 5.000,00 de salário + € 3.150,00 de ajudas de custo), articula que, ao montante alegadamente pago a título de ajudas de custo, a AT reitera o entendimento sufragado na decisão de indeferimento da Reclamação Graciosa nº. ...2023..., pois o Requerente não apresentou qualquer declaração emitida pela entidade patronal onde conste a discriminação destes valores anuais (equivalente à prevista no artigo 119º do CIRS), qual o valor bruto, qual o valor sujeito a imposto sobre o rendimento e qual o não sujeito, para comprovar que efetivamente se tratou de ajudas de custo e as respetivas deduções efetuadas.

É que, contrariamente ao alegado pelo Requerente, esse é um ónus seu e não da AT, nos termos das regras sobre o ónus da prova consagradas no nº. 1, do artigo 74º da LGT.

Impugna a declaração que o Requerente junta como documento nº. 16, uma vez que a mesma não pode servir para prova do alegado, pois, a referida declaração indica apenas o montante pago pela empresa ao Requerente e o certificado de imposto pago (junto como documento nº. 17 pelo Requerente) indica o rendimento total de CZK 3.232.811 (€ 125.672,95).

Desta forma, não tendo o Requerente efetuado prova inequívoca de que o montante de €125.672,95 inclui uma parte relativa a ajudas de custo afastadas de tributação, o mesmo deve ser tomado como base da mesma, concluindo que, deve ser julgado improcedente o presente pedido de pronuncia arbitral, por não provado, mantendo-se na ordem jurídica o ato tributário de liquidação impugnado, absolvendo-se, em conformidade, a entidade requerida do pedido.

 

  1. Saneamento

 

  1. O Tribunal Arbitral foi regularmente constituído.

O processo não enferma de nulidades ou outras irregularidades.

 

  1. Questões Prévias
  1. Revogação Parcial do Acto Tributário

 

Em 2029-09-10, foi proferido pela Exma. Sr.ª SDG despacho de revogação parcial do ato contestado, exarado na informação n.º 1471/2023 da DSRI, conforme comunicado ao tribunal arbitral em 2023-09-25, da qual consta:

“36. Por conseguinte, a liquidação impugnada enferma de erro nesta parte, porquanto:

- o Requerente permaneceu na República Checa por um período superior a 183 dias (contrariamente ao indicado no quadro 4C da declaração oficiosa que esteve na base daquela liquidação);

- auferiu um rendimento bruto de € 125.672,95, correspondente a CZK 3.232.811, atenta a taxa de câmbio da coroa checa, à data de 2018/12/31: CZK 1 = € 0,03887, consultável em:

www.bportugal.pt/conversor-moeda?from=CZK&to=EUR&date=1546214400&value=3232811.00

(cumpre esclarecer que a diferença de € 53,76 para mais, relativamente ao montante de rendimento constante do SITI - € 125.619,19 – deve-se a diferenças cambiais sem relevância para efeitos de tributação);

- suportou imposto no total de € 26.560,92, equivalente a CZK 683.253, tendo por base a taxa de câmbio anteriormente referida.

37. Verifica-se assim, que o Requerente tem direito a um crédito de imposto por dupla tributação internacional (nº. 1, do artigo 81º do CIRS, conjugado com a subalínea i), da alínea a), do artigo 23º da CDT aqui em causa), que não foi considerado na liquidação controvertida.

38. E, relativamente a esta parte, o Requerente tem direito ao pagamento de juros indemnizatórios, encontrando-se verificados os pressupostos que determinam o respectivo pagamento, de acordo com o disposto no nº. 1, do artigo 43º da LGT.”

 

Já no que concerne à restante matéria objecto da reclamação graciosa, a qual se refere às ajudas de custo, consta da mesma informação n.º .../2023 da DSRI, que serviu de suporte ao despacho de revogação do acto parcial proferido em 2029-09-10, pela Sr.ª SDG, o seguinte:

“39. Por último, no que se refere ao montante alegadamente pago a título de ajudas de custo, reitera-se o entendimento sufragado na decisão de indeferimento da RG nº. ...2023...:

os € 5.000,00 auferidos mensalmente pelo Requerente corresponderiam ao valor líquido, ou seja, ao que resultava da dedução, ao valor bruto, dos montantes relativos ao imposto sobre o rendimento, (eventualmente) segurança social, e outros.

40. Não foi apresentada qualquer declaração emitida pela entidade patronal onde conste a discriminação destes valores anuais (equivalente à prevista no artigo 119º do CIRS), i.e., qual o valor bruto, qual o valor sujeito a imposto sobre o rendimento e qual o não sujeito (para comprovar que efectivamente se tratou de ajudas de custo) e as respetivas deduções efetuadas, sendo que, contrariamente ao alegado pelo Requerente, esse é um ónus seu e não da AT, nos termos das regras sobre o ónus da prova consagradas no nº. 1, do artigo 74º da LGT.

41. A declaração que junta como documento nº. 16, não pode servir esse propósito dado que indica apenas o montante pago pela empresa ao contribuinte. E o certificado de imposto pago (documento nº. 17), indica o rendimento total de CZK 3.232.811 (€ 125.672,95).

42. Ademais, e sem conceder, para se poder aferir com segurança do efectivo afastamento de tributação ao abrigo do disposto na alínea d) do nº 3 do artigo 2º do CIRS, sempre teriam de ser conhecidos os montantes que estiveram na base do cálculo das ajudas de custo:

«3 - Consideram-se ainda rendimentos do trabalho dependente: (…)

d) As ajudas de custo e as importâncias auferidas pela utilização de automóvel próprio em serviço

da entidade patronal, na parte em que ambas excedam os limites legais ou quando não sejam observados os pressupostos da sua atribuição aos servidores do Estado e as verbas para despesas

de deslocação, viagens ou representação de que não tenham sido prestadas contas até ao termo do exercício.»

43. Não tendo sido efectuada prova inequívoca de que o montante de € 125.672,95 inclui uma parte relativa a ajudas de custo afastadas de tributação, o mesmo deve ser tomado como base da mesma, conforme ponto 36. supra.”

 

Concluindo a mesma informação o seguinte:

“Após apreciação do pedido de pronúncia arbitral e tendo em conta o anteriormente exposto, afigura-se-nos que o acto de liquidação de IRS n.º. 2022 ..., do ano de 2018, no valor de € 57.583,76, deverá ser parcialmente revogado na parte em que em considerou que o período de permanência do Requerente na República Checa foi igual ou inferior a 183 dias e na parte em que não considerou o imposto pago na República Checa.”

 

Notificado o Requerente, o mesmo pronunciou-se requerendo “o prosseguimento do procedimento para prolação de douta decisão arbitral quanto à parte do ato tributário cuja legalidade se mantém controvertida.” (conforme requerimento de 2023-09-28).

 

Cabe então apreciar desde já a legalidade da revogação parcial e em caso de resposta afirmativa, os efeitos de tal revogação parcial.

 

Quer os Tribunais de natureza tributária, quer a lei, (cfr. artigos 79.º, n.º 1 e 100.º da Lei Geral Tributária; artigo 112.º, n.º 3, do Código de Procedimento e de Processo Tributário), têm preconizado a possibilidade de anulação parcial dos actos tributários.

A divisibilidade do acto tributário constitui o argumento utilizado pela jurisprudência para fundamentar a possibilidade da decisão judicial de anulação parcial dos actos tributários.

Baseando-se na classificação dos actos administrativos divisíveis (cfr. Marcello Caetano, Manual de Direito Administrativo, vol. II, Almedina, 1991, pág.1396; Acórdão do STA-Pleno da 1ª.Secção, 18/07/1985, rec.15294, A. Dout., n.º 300, pág.1533 e seg.), os Tribunais Superiores abundantes vezes já afirmaram que os actos que imponham a obrigação de pagamento de uma quantia, como é o caso dos actos de liquidação de tributos, são naturalmente divisíveis, uma vez que correspondem a um quantitativo pecuniário e são apurados através de operações aritméticas, divisibilidade essa que igualmente resulta da própria lei, em virtude de que é admissível a sua anulação parcial quando o fundamento da anulação apenas afecte uma parte do acto. Assim já não acontece no caso de acto tributário que assente na fixação da matéria colectável por métodos indirectos (v.g. ac.S.T.A.-2ª.Secção, 22/9/1999, rec.24101; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 16/5/2001, rec.25532; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 27/9/2005, rec.287/05; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 3/7/2012, proc.4397/10; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 16/10/2014, proc.7660/14; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 3/12/2015, proc.7421/14) – cfr. Acórdão do TCA Sul, de 08/06/2017, processo n.º 06112/12, o que não é o caso dos autos.

Igualmente a doutrina fiscal admite a característica da divisibilidade no acto tributário (cfr. José Casalta Nabais, Direito Fiscal, Almedina, 4ª. edição, 2006, pág.415; J.L. Saldanha Sanches, O contencioso tributário como contencioso de plena jurisdição, Fiscalidade, n.º 7/8, Julho/Outubro de 2001, pág.63 e seg.; André Festas da Silva, Princípios Estruturantes do Contencioso Tributário, Dislivro, 2008, pág.75).

Desta forma, o objeto da ação ficou circunscrito ao tema das ajudas de custo, verificando-se uma inutilidade superveniente parcial da lide em relação ao segmento remanescente, anulado pela AT, em conformidade com o disposto no artigo 277.º, alínea e) do CPC, aplicável ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e) do RJAT, que determina que a instância se extingue com “a impossibilidade ou inutilidade superveniente da lide”.

A impossibilidade ou inutilidade superveniente da lide têm lugar quando, nomeadamente, desaparece o objeto do processo, se extingue um dos interesses em conflito em virtude de novos factos ocorridos na pendência do processo, ou a decisão a proferir já não tem qualquer efeito útil, ou porque não é possível dar satisfação à pretensão que o demandante pretende fazer valer no processo, ou porque o fim visado com a ação foi atingido por outro meio.

No caso concreto, em relação ao valor da liquidação que foi anulado, está preenchida a condição prevista para a extinção da instância por inutilidade superveniente, sendo que o despacho de anulação parcial das liquidações, quanto aos juros indemnizatórios, menciona expressamente que o Requerente tem direito ao pagamento de juros indemnizatórios, encontrando-se verificados os pressupostos que determinam o respectivo pagamento, de acordo com o disposto no nº. 1, do artigo 43º da LGT.

 

Em consequência, na parte em que a presente ação arbitral se funda, exceptuando as ajudas de custos, na causa de pedir correspondente à parte em que em considerou que o período de permanência do Requerente na República Checa foi igual ou inferior a 183 dias e na parte em que não considerou o imposto pago na República Checa, e os respectivos juros indemnizatórios peticionados, declara-se extinta a instância processual, por já ter sido alcançado, de outra forma, o fim visado com a ação, nos moldes do disposto nos artigos 277.º, alínea e) e 611.º do CPC, aplicáveis por remissão do citado artigo 29.º, n.º 1 alínea e) do RJAT, ficando, nessa medida, prejudicado o seu conhecimento, por este Tribunal.

 

 

  1.  Alteração da instância

 

Entretanto, por requerimento impetrado em 7/11/2023, veio a Requerente deduzir a pretensão de ampliar a instância, com o fundamento de o presente pedido arbitral ter por objeto a liquidação de IRS n.° 2022..., do ano de 2018, do valor total de 57.583,76€, e respetivos juros compensatórios e justamente face à revogação parcial do acto tributário a Requerida procedeu a uma nova liquidação com o n.° 2023..., com data de liquidação de 7.10.2023 e data de acerto de 11.10.2023, referente a 2018, do valor total de 26.900,07, juros compensatórios, do valor de 3.077,94, ali já incluídos. Pede que seja admitida a modificação objetiva da instância, nos termos do artigo 20° do RJAT, ampliando o seu objeto à apreciação da legalidade da liquidação adicional de IRS substituta, nos termos e com os fundamentos explanados no PPA.

Notificada a Requerida para se pronunciar ao abrigo do princípio do contraditório, veio a mesma em súmula dizer que, a liquidação n.º 2023..., não consubstancia qualquer tipo de ampliação do pedido, mas tão só a concretização do despacho de revogação parcial de 2023-09-10, devendo o mesmo pedido ser indeferido.

Cumpre decidir.

Conforme se lê exemplificativamente na Decisão da CAAD, exarada no Processo nº 339/2021-T, de 2022-07-22, o artigo 20.º, n.º 1 do RJAT contempla a modificação objetiva da instância quando, na pendência do processo, sejam substituídos os atos objeto de pedido de decisão arbitral, como sucede nos presentes autos, prosseguindo a ação contra os novos atos, conforme manifestado nesse sentido pelos Requerentes (v. artigo 64.º do CPTA).[1]

Também o Tribunal Central Administrativo - Sul, no Acórdão proferido no processo n.º  01772/07, de 10-07-2015, entendeu que «a liquidação correctiva limita-se a revogar parte de anterior liquidação, não possuindo natureza de acto substitutivo porque não cria um novo quadro jurídico regulador de uma situação concreta, tratando-se antes de um acto que se limita a expurgar uma parte do acto primitivo e que, por isso, não inovando na ordem jurídica na parte não revogada, tem natureza meramente confirmativa que não admite impugnação autónoma».

Para o TCA-Sul, «estamos, assim perante uma nova liquidação, que se limita a revogar parte de anterior liquidação, não possuindo natureza de acto substitutivo porque não cria um novo quadro jurídico regulador de uma situação concreta, tratando-se antes de um acto que se limita a expurgar uma parte do acto primitivo e que, por isso, não inovando na ordem jurídica na parte não revogada, tem natureza meramente confirmativa que não admite impugnação autónoma.

 

Em idêntico sentido, o Supremo Tribunal Administrativo, em 18-02-2010, proferido no processo n.º 01195/09, veio a sufragar entendimento segundo o qual «a liquidação correctiva opera a sanação por reforma da liquidação inicial, retroagindo os seus efeitos à data do acto reformado»

«[…] a revogação parcial de uma liquidação e a substituição do montante da mesma pelo novo montante não se traduz na revogação da liquidação e sua substituição por outra: a liquidação continua a ser a mesma, se bem que corrigida ou expurgada da parte revogada.

Ou seja, o que se extrai do discurso jurídico da sentença recorrida não é que a liquidação efectuada em 2001, em resultado da anulação parcial da primeira liquidação inicial efectuada em 1999 por virtude do deferimento parcial de reclamação graciosa, não produza quaisquer efeitos jurídico-tributários inovadores mas apenas que esta segunda liquidação não tem autonomia em relação à liquidação inicial, sendo antes uma liquidação correctiva que se traduz na anulação parcial da primeira, expurgando esta dos vícios que a afectavam.

Na verdade, a liquidação correctiva opera a sanação por reforma da liquidação inicial, retroagindo os seus efeitos à data do acto reformado (artigo 137.º,  n.º  4  do  CPA).

Como referem Mário Esteves de Oliveira, Pedro Costa Gonçalves e Pacheco Amorim, no seu Código de Procedimento Administrativo comentado, a pág. 663, “em vez de se revogar o acto que está ferido de ilegalidade, ele é depurado das suas imperfeições iniciais e mantido (total ou parcialmente) na ordem jurídica, técnica que deve ser considerada como manifestação do princípio do aproveitamento do acto administrativo”.

Por último, e ainda tendo presente a decisão arbitral já parcialmente vinda de supra referir, atente-se no decidido no processo n.º 60/2019-T:

“No que concerne às consequências processuais da anulação administrativa interessa a norma do artigo 64.º do CPTA, subsidiariamente aplicável, que, entre outros dispositivos, se refere às situações em que, na pendência do processo impugnatório, o ato impugnado é objeto de anulação administrativa acompanhada ou seguida de nova definição da situação jurídica, caso em que se admite que o processo impugnatório prossiga contra o novo ato com fundamento na reincidência nas mesmas ilegalidades. Prevê-se aí a hipótese típica de ampliação do objecto do processo quando, na pendência de um processo impugnatório, a Administração anule o acto impugnado praticando um novo acto em sua substituição contra o qual o impugnante poderá ter ainda interesse em reagir.

Admite -se assim a alteração objectiva da instância por ampliação do objecto da mesma.

 

  1.  

Matéria de facto

 

  1. Factos provados

 

Consideram-se provados os seguintes factos:

 

  1. A..., com o número de identificação fiscal..., casado, residente actualmente na Rua ..., freguesia de ..., ...-..., Viana do Castelo, interpôs pedido de pronuncia arbitral tendo por objeto a decisão de indeferimento da reclamação graciosa e o acto de liquidação de IRS, n.° 2022... (documento n.º 2022...), referente a 2018 e respetivos juros compensatórios, do valor total de 57.583,76€, a qual se reproduz:

 

 

  1. O Requerente no ano de 2018 estava inscrito no sistema cadastral fiscal português como residente fiscal, com a morada constante da alínea a).

 

  1. O Requerente, no ano de 2018, estava inscrito como residente fiscal na Chéquia, tendo-lhe sido atribuído o número de identificação fiscal (tax identification number ou, no original checo, vlastni cislo platce) ... .

 

  1. A Requerida procedeu a uma declaração oficiosa DC de IRS referente ao ano de 2018, considerando-o residente em território Português, averbando no rosto da Modelo 3 o Requerente como solteiro, divorciado ou separado judicialmente, tendo preenchido o Anexo J, Rendimentos Obtidos nos Estrangeiro da seguinte forma:

 

 

 

 

 

  1. O Requerente deduziu Reclamação Graciosa contra a liquidação de imposto referida em A), por requerimento que dirigiu à Direção de Finanças de ... em 1.03.2023, a qual foi ali tramitada sob o processo n.º...2023...;

 

  1. Pelo ofício n.º 2023... de 20.04.2023, o Requerente foi notificado do projeto de decisão de indeferimento da reclamação graciosa;

 

  1. Pelo ofício n.º 2023..., expedido em 15.05.2023, o Requerente foi notificado do despacho proferido em 13.05.2023 pelo Diretor do Serviço de Finanças de ... que indeferiu a reclamação, presumindo-se a mesma recebida em 18.05.2023 – cfr. artigo 39º, n.º 1, do CPPT.

 

  1. O Requerente celebrou em 12.12.2017 um contrato de trabalho com a empresa B..., Sp., com sede em ..., ..., ... Varsovia, Polonia, com início em 10.01.2018 e termo em 30.09.2018, contrato esse que se foi sucessivamente renovando ate 30.04.2019, quando cessou.

 

  1. O Requerente foi admitido para exercer as (funções de “piping supervisor'" no âmbito do projeto“...",que a referida empresa tinha em execução na Chequia (ou República Checa).

 

  1. Nos termos da cláusula 6.1. do contrato de trabalho, foi convencionada uma remuneração do valor mensal líquido (monthly net fixed fee, no texto original) de 5.000,00€ (cinco mil euros).

 

  1. Os impostos sobre o rendimento, incidentes sobre o seu valor bruto ou ilíquido, eram objeto de retenção na fonte pela entidade empregadora e pagos ou entregues junto das autoridades fiscais da República Checa, por ser o local da prestação do trabalho.

 

  • O Requerente, em acréscimo ao seu vencimento, auferia retribuições no montante mensal de 1.000,00€ para transportes (carro, gasóleo e seguros), e 1.200,00€ para alojamento (renda) e despesas domésticas e 950.00€ para alimentação, nos termos fixados na clausula 6.3 e anexo A do contrato de trabalho, auferindo em média por mês, o montante líquido de 8.150,00€, sendo 5.000,00€ de salário e 3.150,00€ de despesas.

 

  1. O Requerente a partir de 1.04.2018, passou a residir em casa arrendada, tendo celebrado um contrato de arrendamento, situação que se manteve ate 30.04.2019, quando cessou o seu contrato de trabalho, data em que entregou a casa ao senhorio.

 

  • Por força e em contrapartida da sua prestação de trabalho o Requerente recebeu da referida B..., entre os meses de Janeiro e Dezembro de 2018, o seu salário, do referido valor liquido mensal de 5.000,00€, o qual era creditado, mensalmente, na conta com o IBAN PT..., domiciliada no Millennium BCP, em Portugal.

 

  • Em 2018, o Requerente recebeu nessa conta o salário do valor total líquido de 58.666.67€, assim discriminado:

a. 1.02.2018-3.666,676;

b. 2.03.2018-5.000,006;

c. 4.04.2018-5.000,006;

d. 2.05.2018-5.000,006;

e. 4.06.2018-5.000,006;

f. 29.06.2018-5.000,006;

g. 1.08.2018-5.000,006;

h. 1.10.2018-5.000,006;

i. 1.11.2018-5.000,006;

j. 3.12.2018-5.000,006;

k. 24.120.2018- 5.000.006:

 

  1. O valor auferido de salários no ano de 2018, no montante total de 58.666.67€ foram declarados na República Checa, sendo o total de rendimentos (total income) de 3.232. 811 e a matéria tributável (tax base) de 3.883.512, sendo que em 31.12.2018, uma coroa checa valia 0,03887 euros, pelo que os valores em apreço correspondem a 126.079,63€ e 151.456,97€ (3.232.811x0,039 e 3.883.512 x 0,039, respetivamente).

(https://www.bportugal.pt/conversor-inoeda‘?from=CZK&to=EUR&date=15462 1 4400&valuer12.00)

 

  1.  O total de imposto pago pelo Requerente na Chéquia, reportado aos rendimentos auferidos em 2018 nesse pais, foi de 683.253 (amount of tax paid) coroas checas, o que efetivou em 1.07.2018 (date of tax payment), porquanto, em 1.07.2019, uma coroa checa valia 0,03925 euros, pelo que o imposto sobre o rendimento pago pelo Requerente nesse ano foi de 26.817,68€ (683.253x0,03925).

(https://www.bportugal.pt/conversor-moeda?from=CZK&to=EUR&date=156 1935600&value= 1 2.00)

 

  1. Os valores de 1.000,00€ para transportes (carro, gasóleo e seguros), 1.200,00€ para alojamento (renda) e despesas domésticas e 950,00€ para alimentação, eram transferidos para uma conta bancária com o IBAN CZ..., que o Requerente, abriu no UniCredit Bank, na Chéquia;

 

  1. Por estes factos o Requerente permaneceu mais de 183 dias no ano de 2018 na República Checa.

 

  1. No despacho de revogação parcial do tributário constante da liquidação identificada em A), consta “Após apreciação do pedido de pronúncia arbitral e tendo em conta o anteriormente exposto, afigura-se-nos que o acto de liquidação de IRS n.º. 2022..., do ano de 2018, no valor de € 57.583,76, deverá ser parcialmente revogado na parte em que em considerou que o período de permanência do Requerente na República Checa foi igual ou inferior a 183 dias e na parte em que não considerou o imposto pago na República Checa.”

 

  1.  A Requerida procedeu a uma nova liquidação (correctiva), com o n.° 2023..., com data de liquidação de 7.10.2023 e data de acerto de 11.10.2023, referente a 2018, do valor total de 26.900,07, juros compensatórios, do valor de 3.077,94, ali já incluídos, resultante da execução do decidido no procedimento de Reclamação Graciosa:

 

 

 

  1.   A Requerente procedeu ao pagamento da primeira liquidação identificada na alínea a), no montante total de 57.583,76€, no dia 7/11/2022.

 

2.2. Factos não provados

 

Não existem factos não provados que sejam considerados relevantes

 

2.3. Fundamentação da decisão da matéria de facto

 

O juiz (ou o árbitro) não tem o dever de pronunciar sobre toda a matéria de facto alegada, tendo antes o dever de selecionar a que interessa à decisão, tendo em conta a causa de pedir que suporta o pedido formulado pelo autor, e decidir se a considera provada ou não provada (artigos 123.º, n.º 2, do CPPT e 607.º, n.º 3 do Código de Processo Civil, aplicáveis ex vi artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e), do RJAT).

 

Os factos pertinentes para o julgamento da causa foram escolhidos e recortados em função da sua relevância jurídica, à face das soluções plausíveis das questões de direito, nos termos da aplicação conjugada dos artigos 123.º, n.º 2, do CPPT, 596.º, n.º 1 e 607.º, n.º 3, do CPC, aplicáveis ex vi artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e e), do RJAT.

 

A convicção do Tribunal fundou-se nos factos articulados pelas partes, cuja aderência à realidade não foi posta em causa, nem impugnados especificadamente e no acervo probatório carreado para os autos, os quais foram objeto de uma análise crítica e de adequada ponderação à luz das regras da racionalidade, da lógica e da experiência comum e segundo juízos de normalidade e razoabilidade.

 

3. Matéria de direito

 

O processo arbitral tributário, como meio alternativo ao processo de impugnação judicial (n.º 2 do artigo 124.º da Lei n.º 3-B/2010, de 28 de Abril), é, como este, um meio processual de mera legalidade, em que se visa declarar a ilegalidade de actos dos tipos indicados no artigo 2.º do RJAT e eliminar os efeitos jurídicos por eles produzidos, anulando-os ou declarando a sua nulidade ou inexistência [artigos 99.º e 124.º do CPPT, aplicáveis por força do disposto no artigo 29.º, n.º 1, alínea a), daquele].

Por isso, sendo o acto de liquidação praticado pela Administração Tributária o objecto do processo, tem de se apreciar a sua legalidade à face dos seus precisos termos, tal como ocorreu, com a fundamentação que nele foi utilizada, não sendo relevantes outras possíveis fundamentações que poderiam servir de suporte a outros actos, de conteúdo decisório total ou parcialmente coincidente com o acto praticado. São, assim, irrelevantes fundamentações invocadas a posteriori, após o termo do procedimento tributário em que foi praticado o acto cuja declaração de ilegalidade é pedida ([2] ).

 

A determinação da residência fiscal é de primordial importância em IRS, pois estabelece o âmbito de sujeição a este imposto. Sendo residente fiscal em território português, o IRS incide sobre a totalidade dos seus rendimentos, incluindo os obtidos fora desse território; se for não residente, o IRS incide unicamente sobre os rendimentos obtidos em território nacional.[3]

O Código do IRS contém critérios definidores dessa residência fiscal em Portugal, os quais são os seguintes:

 

·        Permanência mais de 183 dias, seguidos ou interpolados, em qualquer período de 12 meses com início ou fim no ano em causa; ou

 

·        Aí disponham, num qualquer dia do período referido na alínea anterior, de habitação em condições que façam supor intenção atual de a manter e ocupar como residência habitual; ou

 

·       Em 31 de dezembro, sejam tripulantes de navios ou aeronaves, desde que aqueles estejam ao serviço de entidades com residência, sede ou direção efetiva nesse território;  ou

 

·       Desempenhem no estrangeiro funções ou comissões de caráter público, ao serviço do Estado Português, inclusive funções de deputado ao Parlamento Europeu; ou

 

Como medida de prevenção de evasão fiscal, a lei Portuguesa considera também que são Residentes as, Pessoas de nacionalidade portuguesa que deslocalizem a sua residência fiscal para país, território ou região, sujeito a um regime fiscal claramente mais favorável constante de lista aprovada por portaria do membro do Governo responsável pela área das finanças, no ano em que se verifique aquela mudança e nos quatro anos subsequentes, salvo prova de exercício naquele território de atividade temporária por conta de entidade patronal domiciliada em território português.[4]

 

Segundo as alíneas s) e t), da matéria de facto dada como provada, o Requerente esteve mais de 183 dias na República Chequia, sendo então aí considerado residente fiscal e até já o era cadastralmente falando, sendo também residente em termos de habitação.

A Requerida coloca em crise os montantes auferidos provenientes de fonte Chequia a título de ajudas de custo, remetendo a sua fundamentação para a utilizada na reclamação graciosa.

Vejamos:

A fundamentação que consta da informação que sustentou a decisão tomada na reclamação graciosa, parte do pressuposto que consta do ponto 34:

“34. Assim, concluindo-se pela sua residência em território nacional, por não ter ficado comprovado o contrário, a competência para a tributação dos rendimentos auferidos na RC pelo ora reclamante cabe, efetivamente, a Portugal, nos termos do artigo 15º do CIRS.”

 

A fundamentação que foi utilizada, tanto para o salário, como para as ajudas de custo, arrimou-se nesse mesmo princípio de residência em território português, independentemente de se apreciar a natureza dos valores que o Requerente indica como tendo sido auferidos a título de ajudas de custo.

Sendo afinal o Requerente residente fiscal na República Checa, deve o mesmo ser considerado não residente. O único elemento de conexão do Requerente a Portugal face a este quadro fáctico é ser de nacionalidade Portuguesa e salvo o devido respeito, só a nacionalidade não gera residência e tributação em Portugal. [5]

 

O Requerente foi residente fiscal no ano de 2018 na República Checa, é aí que deve ser tributado, pois os rendimentos auferidos quanto à sua fonte, o foram na República Checa.

 

Existem duas regras de tributação previstas nos números 1 e 2 do artigo 15.º do Código do IRS:

«(...) 1 - Sendo as pessoas residentes em território português, o IRS incide sobre a totalidade dos seus rendimentos, incluindo os obtidos fora desse território.

2 - Tratando-se de não residentes, o IRS incide unicamente sobre os rendimentos obtidos em território português (...).»

Os sujeitos passivos residentes em território nacional são tributados pela regra da universalidade ou de base mundial, segundo a qual, são tributadas pela totalidade dos rendimentos obtidos, incluindo os obtidos no estrangeiro.

Os sujeitos passivos não residentes em território nacional são aqui tributados, de acordo com a regra da territorialidade, pelos rendimentos aqui obtidos. Para o efeito, no n.º 1 do artigo 18.º do Código do IRS são enumeradas as diversas situações que se configuram como rendimentos obtidos em território nacional, apenas estes rendimentos quando obtidos por não residentes são aqui tributados.

De acordo com a alínea a) do n.º 1 do artigo 18.º do Código do IRS consideram-se obtidos em território português «(...) os rendimentos do trabalho dependente decorrentes de atividades nele exercidas, ou quando tais rendimentos sejam devidos por entidades que nele tenham residência, sede, direção efetiva ou estabelecimento estável a que deva imputar-se o pagamento (...).»

Ora, nenhuma destas situações é aplicável no caso “sub judice”.

O Requerente deve ser considerado residente na República Chequia no ano de 2018 e, por não ter auferido rendimentos em Portugal está sujeito a tributação apenas na República Chequia e em mais nenhuma jurisdição fiscal. [6]

 

Apenas dois acrescentos:

Um primeiro, para o mecanismo da troca de informações previsto na Diretiva 2011/16/EU pode ser realizado a pedido de qualquer dos Estados – Membros, de forma espontânea. Tal asserção permite concluir que um Estado-Membro pode trocar informações de forma espontânea apenas pela singela razão de determinado sujeito passivo ser nacional do Estado a quem se presta informação e não porque o considera residente no Estado da sua Nacionalidade. Por outras palavras, se um Estado membro ao abrigo da troca de informações remete espontaneamente informações, tal não significa que o faça porque considera que os rendimentos que foram auferidos no seu território devam ser tributados no território de destino da informação. É um argumento descabido.

 

Um segundo, respeita ao facto da Requerida professar o entendimento veiculado em muitas informações vinculativas que, caso um sujeito não participe ao cadastro fiscal Português a sua mudança de domicílio fiscal, como foi o caso dos autos, estamos perante um Residente Fiscal.

Como podemos abundantemente ver na doutrina e jurisprudência, a “vexato quaestio” de saber se alguém e ou não residente em Portugal é independente da do domicílio fiscal. Aquele que efetivamente transferiu a sua residência para o estrangeiro não pode mais ser considerado residente em Portugal, mesmo que nos registos da administração fiscal continue a figurar como domiciliado em Portugal (mesmo que por omissão dele, sujeito passivo, em promover a necessária alteração. [7]

 

A definição de residência é feita unilateralmente por cada Estado. As convenções internacionais sobre dupla tributação (CDT) aceitam tal competência, limitando-se a estabelecer regras de "desempate" que permitem qualificar um contribuinte como residente em apenas um dos Estados contratante, quando ambos (por força das divergências entre as respetivas leis) o consideram como tal.

  1. A tributação em sede de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares centra-se no conceito de residência: dividem-se os contribuintes entre residentes e não residentes, entendendo-se por residentes aqueles que permaneçam no território nacional mais de 183 dias, seguidos ou interpolados, ou que disponham de habitação em condições que façam supor a intenção de manter e ocupar como residência habitual (artigo 16º CIRS).
  2. Para considerar o contribuinte, como residente ou não em Portugal, importa o disposto no artigo 16º CIRS e nos artigos 4º e 15º da Convenção entre os Estados para evitar a dupla tributação.[8]

Não se verificando, no ano a que os rendimentos respeitam (2018), qualquer dos requisitos de que o artigo 16.º do CIRS faz depender a qualificação de Residente das pessoas singulares, não pode a pessoa em causa qualificar-se como Residente fiscal em Portugal.[9]

 

 

4. Reembolso e juros indemnizatórios

 

              Em 7/11/2022, a Requerente procedeu ao pagamento da primeira liquidação no montante total de 57.583,76€, pedindo o reembolso do imposto e juros compensatórios pagos.

              Acontece que a Requerida procedeu a uma liquidação correctiva, com o n.° 2023..., com data de liquidação de 7.10.2023 e data de acerto de 11.10.2023, referente a 2018, do valor total de 26.900,07, juros compensatórios, do valor de 3.077,94 nele incluídos, pelo que o valor sem juros é de 23.822,13€, e por conseguinte toda essa parte que foi corrigida, ficou prejudicada no seu conhecimento conforme supra decidido, conhecendo-se então apenas destes montantes.

              De harmonia com o disposto na alínea b) do artigo 24.º do RJAT, a decisão arbitral sobre o mérito da pretensão de que não caiba recurso ou impugnação vincula a Administração Tributária a partir do termo do prazo previsto para o recurso ou impugnação, devendo esta, nos exactos termos da procedência da decisão arbitral a favor do sujeito passivo e até ao termo do prazo previsto para a execução espontânea das sentenças dos tribunais judiciais tributários, «restabelecer a situação que existiria se o acto tributário objecto da decisão arbitral não tivesse sido praticado, adoptando os actos e operações necessários para o efeito», o que está em sintonia com o preceituado no artigo 100.º da LGT [aplicável por força do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT] que estabelece, que «a administração tributária está obrigada, em caso de procedência total ou parcial de reclamação, impugnação judicial ou recurso a favor do sujeito passivo, à imediata e plena reconstituição da legalidade do acto ou situação objecto do litígio, compreendendo o pagamento de juros indemnizatórios, se for caso disso, a partir do termo do prazo da execução da decisão».

              Embora o artigo 2.º, n.º 1, alíneas a) e b), do RJAT utilize a expressão «declaração de ilegalidade» para definir a competência dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD, não fazendo referência a decisões condenatórias, deverá entender-se que se compreendem nas suas competências os poderes que, em processo de impugnação judicial, são atribuídos aos tribunais tributários, sendo essa a interpretação que se sintoniza com o sentido da autorização legislativa em que o Governo se baseou para aprovar o RJAT, em que se proclama, como primeira directriz, que «o processo arbitral tributário deve constituir um meio processual alternativo ao processo de impugnação judicial e à acção para o reconhecimento de um direito ou interesse legítimo em matéria tributária».

              O processo de impugnação judicial, apesar de ser essencialmente um processo de anulação de actos tributários, admite a condenação da Administração Tributária no pagamento de juros indemnizatórios, como se depreende do artigo 43.º, n.º 1, da LGT, em que se estabelece que «são devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido» e do artigo 61.º, n.º 4, do CPPT (na redacção dada pela Lei n.º 55-A/2010, de 31 de Dezembro, a que corresponde o n.º 2 na redacção inicial), que «se a decisão que reconheceu o direito a juros indemnizatórios for judicial, o prazo de pagamento conta-se a partir do início do prazo da sua execução espontânea».

              Assim, o n.º 5 do artigo 24.º do RJAT, ao dizer que «é devido o pagamento de juros, independentemente da sua natureza, nos termos previsto na Lei Geral Tributária e no Código de Procedimento e de Processo Tributário», deve ser entendido como permitindo o reconhecimento do direito a juros indemnizatórios no processo arbitral.

              Como o pagamento de juros indemnizatórios depende de existir quantia a reembolsar, insere-se no âmbito das competências dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD apreciar se há direito a reembolso e em que medida.

              Cumpre, assim, apreciar os pedidos de reembolso da quantia paga e de juros indemnizatórios.

              Na sequência da anulação das liquidações, o Requerente tem direito a ser reembolsado das quantias indevidamente pagas, sendo o valor de imposto sem juros de 23.822,13€, juros compensatórios pagos do valor de 3.077,94, tudo no montante global de 26.900,07€.

              No que concerne ao direito a juros indemnizatórios, é regulado no artigo 43.º da LGT, que estabelece, no que aqui interessa, o seguinte:

 

Artigo 43.º

Pagamento indevido da prestação tributária

 

1 – São devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido.

 

              No caso em apreço, conclui-se que há erro nas liquidações, mas que a mesma não é imputável aos serviços, exactamente porque lhe é ineficaz para esses efeitos a falta de comunicação da alteração do domicílio fiscal para a República Checa, sendo-lhe imputada toda a culpa apreciada em termos de imputabilidade de erro.[10] Conforme nos diz o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, exarado no Processo 1275/11.5BESNT, de 13/9/2023, TÂNIA MEIRELES DA CUNHA, “Há erro imputável aos serviços, sustentador do direito a juros indemnizatórios, quando a AT, tendo, em sede de reclamação graciosa, todos os elementos que lhe permitam decidir no sentido de suprir um erro nos pressupostos de facto, não o faz.”

Ora, a Requerida só será responsável por juros indemnizatórios a partir da data da notificação da reclamação graciosa, que nos termos da alínea g) da matéria de facto dada como provada será então a partir de 19/5/2023.

              Os juros indemnizatórios devem ser contados, quanto a cada quantia paga, desde essa data de 19/5/2023, até ao integral reembolso do montante pago, à taxa legal supletiva, nos termos dos artigos 43.º, n.º 4, e 35.º, n.º 10, da LGT, do artigo 61.º do CPPT, do artigo 559.º do Código Civil e da Portaria n.º 291/2003, de 8 de Abril.

 

 

5. Decisão

 

Nestes termos, decide este Tribunal Arbitral em:

  1. Julgar procedente o pedido de pronúncia arbitral;
  2. Declarar extinta a instância processual, por já ter sido alcançado, de outra forma, o fim visado com a ação, nos moldes do disposto nos artigos 277.º, alínea e) e 611.º do CPC, aplicáveis por remissão do citado artigo 29.º, n.º 1 alínea e) do RJAT, ficando, nessa medida, prejudicado o seu conhecimento, por este Tribunal, na parte em que a Requerida procedeu à revogação parcial da liquidação de IRS, n.° 2022... (documento n.º 2022...), referente a 2018 e respetivos juros compensatórios, do valor total de 57.583,76€, nos exactos moldes constantes da mencionada revogação;
  3. Anular a liquidação correctiva de IRS n.º 2023..., com data de liquidação de 7.10.2023 e data de acerto de 11.10.2023, referente a 2018, do valor total de 26.900,07€, juros compensatórios, do valor de 3.077,94, ali já incluídos;
  4. Anular a decisão da reclamação graciosa;
  5. Julgar procedente o pedido de reembolso da quantia paga e de juros indemnizatórios, mas estes somente a partir de 19/5/2023, e condenar a Autoridade Tributária e Aduaneira a pagar ao Requerente a quantia de € 26.900,07€, acrescida de juros indemnizatórios determinados nos termos referidos no ponto 4 da presente decisão;

 

6. Valor do processo

 

De harmonia com o disposto no artigo 306.º, n.º 2, do CPC, 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária fixa-se ao processo o valor de 57.583,76

 

7. Custas

 

Nos termos do artigo 22.º, n.º 4, do RJAT, fixa-se o montante das custas em € 2.142,00, nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, a cargo da Autoridade Tributária e Aduaneira.

 

 

Lisboa, 04-12-2023

O Árbitro


(António Pragal Colaço)

 



[1] https://www.caad.org.pt;

[2]             Essencialmente neste sentido, podem ver-se os seguintes acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo, a propósito de situação paralela que se coloca nos processos de recurso contencioso:

– de 10-11-98, do Pleno, proferido no recurso n.º 32702, publicado em AP-DR de 12-4-2001, página 1207.

– de 19/06/2002, processo n.º 47787, publicado em AP-DR de 10-2-2004, página 4289.

– de 09/10/2002, processo n.º 600/02.

– de 12/03/2003, processo n.º 1661/02;

– de 28-10-2020, processo n.º 2887/13.8BEPRT.

 

[3] Território, Fonte e Residência: Em busca de um Sentido, Catarina Isabel Vicente Martins Ferreira, Dissertação de Mestrado, p, 35 e segs., Universidade Católica Portuguesa, Faculdade de Direito, Escola do Porto;

[4] Fonte: Autoridade Tributária e Aduaneira 25/2/2022;

[5] A aceitação universal do princípio da residência, como elemento de conexão determinante na delimitação do direito à tributação, expressa a crise do princípio da nacionalidade. Na verdade, a nacionalidade dos sujeitos passivos, enquanto elemento de conexão pessoal, apenas assume relevo significativo no ordenamento jurídico norte-americano. Este pais sujeita a tributação os seus nacionais, mesmo que não-residentes (embora relativamente aos nacionais não-residentes não haja, normalmente, lugar a uma tributação efetiva mas apenas à obrigação de entrega de declarações).

No mais, a nacionalidade tem uma importância meramente secundária ao nível das relações fiscais internacionais (cf. Rui Duarte Morais, A Imputação dos Lucros..., pp.133ss);

[6] O mesmo se deduz da Convenção celebrada entre Portugal e a República Chequia, no seu art.º 15.º;

[7] Cfr. na Doutrina Rui Morais, Sobre o IRS, p. 20, nota 45,

E na Jurisprudencia, CAAD Processo nº 155/2022-T, decisão de 2022-10-11

SUMÁRIO:

A qualificação como residente para efeitos fiscais em Portugal é determinada pela correta subsunção nos critérios constantes do art.º 16.º do Código do IRS, sendo que, se a qualidade de residente, nos termos da respetiva al. a) resulta, automaticamente, de um critério fáctico, meramente numérico, a presença em Portugal, a al. b) exige, pela falta de maior presença no território, um elemento adicional de intenção.

As noções de “residência fiscal” e de “domicílio fiscal” são diferentes, pois que, enquanto o conceito de residência releva para efeitos de aplicação de normas tributárias materiais e substantivas, determinantes da existência e da extensão da obrigação de imposto, a questão do domicílio fiscal projeta-se em consequências processuais.

O não cumprimento do dever de comunicação previsto no artigo 19.º, n.º 3, da LGT, não tem necessário e definitivo impacto em termos de tributação.

Não existe qualquer norma legal, nomeadamente no Código do IRS, que condicione/limite os meios de prova de que o contribuinte se pode servir para comprovar a sua residência fiscal, designadamente exigindo a apresentação de um certificado de residência fiscal emitido pelas autoridades fiscais de outro país, também CAAD Processo nº 36/2022-T, de 13-7-2022, onde se afirma que II.            O dever de comunicação, previsto no artigo 19.º, n.º 3, da LGT, não se trata de formalidade ad substanciam, pelo que a sua preterição não tem necessária e definitivamente impacto em termos de tributação, ainda CAAD Processo nº 803/2021-T, de 31-8-2022, Processo n.º 856/2021-T, de 11-8-2022, todos in.www.caad.org e ao nível dos Tribunais Judiciais, Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, Processo 803/05.0BESNT, de 8/7/2021, MARIA CARDOSO, in.www.dgsi.pt;

[8] Cfr. Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, Processo 21/04.4BECTB, de 11-11-2021, SUSANA BARRETO, in.www.dgsi.pt;

[9] Cfr. Acórdão CAAD,  Processo nº 62/2022-T, 2022-10-14, IRS, in.www.caad.org.pt; 

[10] Quem deu causa à ação (na expressão utilizada no artigo 527.º, n.º 1 do CPC):