Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 324/2020-T
Data da decisão: 2020-12-18  IRC  
Valor do pedido: € 48.083,94
Tema: IRC
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DECISÃO ARBITRAL

I - RELATÓRIO

 

1 – A..., SOCIEDADE UNIPESSOAL, LDA., NIPC  n.º..., com sede no ..., n.º..., ..., ...-... Lisboa, veio, em 30 de Junho de 2020, ao abrigo do disposto na alínea a) do nº1 do artigo 2º,da alínea a) do nº 2 do artigo 5º e nº1 do artigo 6º, artigo 10º e seguintes todos do RJAT , apresentar, um pedido de pronúncia arbitral, com vista à apreciação da legalidade da liquidação de IRC , conforme documento 2019..., relativa ao saldo apurado, de acordo com a demonstração de acerto de contas do exercício de 2015, de IRC e de juros compensatórios, no montante global de € 48.083,94, tudo como melhor consta na respetiva petição e documentos anexos que aqui se dão como reproduzidos para todos os efeitos legais.

2 – O pedido de constituição do tribunal arbitral foi feito sem exercer a opção de designação de árbitro, vindo a ser aceite na mesma data, pelo Exmº Senhor Presidente do CAAD  e automaticamente notificado à ATA  na mesma data.

3 – Nos termos e para os efeitos do disposto no nº2 do artigo 6º do RJAT, por decisão do Exmo Senhor Presidente do Conselho Deontológico, devidamente comunicada às partes, nos prazos legalmente aplicáveis, foi, em 12/08/2020, designado o licenciado Arlindo José Francisco, na qualidade de árbitro, que comunicou ao Conselho Deontológico de Arbitragem Administrativa a aceitação do encargo no prazo legalmente estipulado, não tendo as partes manifestado vontade de recusar a designação do Árbitro.

4 – O Tribunal foi constituído em 11/09/2020 de harmonia com as disposições contidas na alínea c) do nº 1 do artigo 11º do RJAT, na redação introduzida pelo artigo 228º da Lei nº 66-B/2012, de 31 de Dezembro.

5 – Com o seu pedido visa o Requerente a declaração de ilegalidade da aludida liquidação de IRC e juros compensatórios, nos termos e montantes já referidos, com o fundamento de ilegalidade da mesma, por vício de violação de lei, designadamente, os artigos 16º nº 4, 28.º-B e 57º e seguintes todos do CIRC , bem como dos artigos 6º e 8º do RCPIT , artigos 55º, 58.º e 87º da LGT  o que motivará a sua anulação.

6 - Por sua vez a ATA considera que não assiste razão à Requerente devendo o pedido ser julgado improcedente, por não provado, mantendo-se na ordem jurídica o ato tributário de liquidação impugnado e absolvendo-se a ATA do pedido.

 

II – SANEAMENTO

 

O Tribunal foi regularmente constituído e é abstratamente competente, as partes têm personalidade e capacidade judiciárias, mostram-se legítimas e encontram-se regularmente representadas de harmonia com os artigos 4º e 10º, nº2 do RJAT e artigo 1º da Portaria nº 112-A/2011, de 22 de Março.

Em 11 de setembro de 2020 o Tribunal proferiu despacho em cumprimento do artigo 17º do RJAT, tendo a requerida, em 14/10/2020, apresentado a resposta e em 17/10/2020, o Tribunal proferiu o seguinte despacho:

“Após a junção da resposta da ATA e análise dos autos, verifica-se que  não há exceções a apreciar, e apesar do arrolamento de uma testemunha por parte da requerente, o Tribunal considera desnecessária a sua audição para proferir decisão, dado que o que está em causa são correções à matéria coletável, por eventuais incumprimentos das normas previstas no artigo 28º-B do IRC, cuja análise será de documentos que suportem ou não o procedimento, ao mesmo tempo que, a situação de pandemia obriga a um agendamento das reuniões no CAAD, com vista a serem observadas as medidas de segurança aplicáveis, o que dificultaria a obtenção da decisão em prazo razoável.

Deste modo, ao abrigo dos princípios da autonomia do Tribunal Arbitral na condução do processo, da celeridade, da simplificação e informalidades processuais (artigos 19º nº.2 e 29º nº.2 do RJAT) fica dispensada não só a audição da testemunha arrolada bem como a reunião prevista no artigo 18º do RJAT.

Assim os autos prosseguem com alegações escritas, facultativas, por um período de 10 dias, iniciando-se, com a notificação do presente despacho, o prazo para alegações da Requerente e com a notificação da apresentação das alegações da Requerente, o prazo para alegações da Requerida.

Indica-se o dia 18/12/2020 para prolação da decisão arbitral. Até essa data, a Requerente deverá fazer prova, junto do CAAD, do pagamento da taxa de justiça subsequente.

Notifique”

A requerente produziu alegações que apresentou em 03/11/2020, nas quais para além de manter o seu ponto de vista sobre a questão, rebateu a resposta da ATA, que não contra alegou.

 Deste modo, não enfermando o processo de nulidades e não havendo questões prévias a apreciar, consideram-se reunidas as condições para ser proferida decisão final.

 

III- FUNDAMENTAÇÃO

 

1- Questão a dirimir

 

a)            Apurar se, conforme documento 2019..., relativa ao saldo apurado, de acordo com a demonstração de acerto de contas do exercício de 2015, de IRC e de juros compensatórios, no montante global de € 48.083,94, padece do vício de violação da lei, designadamente, o artigos 16º nº 4, 28.º-B e 57º e seguintes todos do CIRC, bem como dos artigos 6º e 8º do RCPIT, artigos 55º, 58.º e 87º da LGT o que motivará a sua anulação ou se pelo contrário como defende a ATA, não sofre do referido vício de violação da lei e deverá ser mantida na ordem jurídica.

b)           Em caso da procedência do pedido com a consequente anulação e reembolso do montante indevidamente pago, se ao mesmo deverão acrescer juros indemnizatórios, nos termos do artigo 43.º da LGT.

 

2 – Matéria de facto

 

I – Factos considerados provados

 

A matéria de facto relevante para a decisão e considerada provada pelo Tribunal é a seguinte:

 

a)            A Requerente exerce a atividade de agentes aduaneiros e similares de apoio ao transporte, com o CAE  52292, da área do ... serviço de finanças de Lisboa, enquadrada no regime geral de determinação do lucro tributável, previsto no nº 1 do artigo 3º do CIRC e tributação à taxa prevista no nº 1 do artigo 87º do mesmo Código.

b)           Conforme Ordem de Serviço n.º OI2018..., de 30.05.2018, da Direção de Finanças de Lisboa teve lugar uma ação de inspeção externa de âmbito parcial em IRC e IVA , referente ao ano de 2015.

c)            Já no decurso da ação inspetiva, mais concretamente em 05.06.2019, a Requerente apresentou declaração Modelo 22 de IRC de substituição, tendo retificado as rubricas a acrescer (campos 718 e 721) e a deduzir (campo 762), resultando um acréscimo de € 158.872,58 ao lucro tributável, face à 1ª declaração submetida, referente ao exercício de 2015, sem que disso tenha dado conhecimento às técnicas dos serviços inspetivos da ATA.

d)           Os serviços inspetivos por mail de 26/06/2019, solicitaram diversos elementos à Requerente, designadamente todos os documentos justificativos relativos a provisões e imparidades de clientes, relativas ao exercício de 2015.

e)           Notificada do projeto de relatório de inspeção em 22/11/2019, no qual eram evidenciadas as correções à matéria coletável em sede de IRC, no valor de € 227.971,82, sendo € 181.385,46 por alegado incumprimento da alínea c) do n.º 1 do artigo 28.º-B do CIRC; € 40.824,85, por alegado incumprimento do n.º 2 do artigo 28.º-B do CIRC; e € 5.761,51 por alegado incumprimento das alíneas a), b) e c) do n.º 1 do artigo 28.º-B do CIRC.

f)            Em 05/12/2019, a Requerente exerceu o seu direito de audição, no qual contestou apenas as duas primeiras correções (€ 181.385,46 e € 40.824,85).

g)            Notificada em 18/12/2019, do relatório final de inspeção tributária, nos termos do qual se verifica que foi retirada a correção de € 40.824,85, ficando assim reduzidas as correções inicialmente propostas, a € 187 1496,96, por alegado incumprimento da alínea c) do n.º 1 do artigo 28.º-B do CIRC.

 

h)           Destas correções resultou o documento 2019..., referente ao saldo apurado, de acordo com a demonstração de acerto de contas do exercício de 2015, de IRC e de juros compensatórios, no montante global de € 48.083,94, que a requerente pagou em 04/02/2020.

i)             Houve dificuldade da Requerente em remeter elementos solicitados pelos serviços inspetivos, não remetendo designadamente o ficheiro normalizado de exportação de dados -SAF-T (PT), previsto na Portaria n.º 321-A/2007 de 26 de Março, com a última alteração efetuada através da Portaria n.º302/2016, de 2 de dezembro, tendo esta sugerido que a inspeção fosse feita por amostragem, estando em crise, nesta altura, apenas as correções por imparidade em créditos (art.º 28. -B, n.º 1, alínea c do CIRC) no montante de € 181 385,46.

j)             Com a petição, a Requerente juntou documentação onde constam as entidades com faturas vencidas em 31 de Dezembro de 2014, com valores mais elevados B..., S.A. 5 155,33 C... 99 101,99 D... 11 768,87 E... 22 723,60 F..., S.A. 10 129,92 G... 1 755,00 H... SA 7 946,22 I... 679 802,91 J..., SA 5 114,77 K..., LDA. 12 695,73 L..., LDA 260 648,24 M..., SL 1 460,71 N... 35 114,40 e das diligências de cobrança realizadas junto das mesmas.

 

 Esta é a matéria de facto fixada por este Tribunal Arbitral e a sua convicção ficou formada com base nas peças processuais e requerimentos apresentados pelas Partes e nos documentos juntos por estas ao presente Processo e que as mesmas aceitam.

 

Relativamente à matéria de facto o Tribunal não tem o dever de se pronunciar sobre toda a matéria alegada, tendo antes o dever de selecionar a que interessa para a decisão, levando em consideração a causa (ou causas) de pedir que fundamentem o pedido formulado pelo autor, conforme n.º 1 do artigo 596.º e n.os 2 a 4 do artigo 607.º, ambos do CPC , aplicáveis ex vi das alíneas a) e e) do n.º do artigo 29.º do RJAT e consignar se a considera provada ou não provada, conforme n.º 2 do artigo 123.º do CPPT .

Segundo o princípio da livre apreciação da prova, o Tribunal baseia a sua decisão, em relação às provas produzidas, na sua íntima convicção, formada a partir do exame e avaliação que faz dos meios de prova trazidos ao processo e de acordo com a sua a sua prudente convicção acerca de cada facto, conforme n.º 5 do artigo 607.º do CPC. Somente quando a força probatória de certos meios se encontrar pré-estabelecida na lei, como é o caso dos documentos autênticos, conforme artigo 371.º do CC  é que não domina na apreciação das provas produzidas o princípio da livre apreciação.

 

II - Factos não provados                                         

 

O Tribunal não considerou a existência de factos relevantes para a decisão que não tenham sido dados como provados.

 

3- Matéria de Direito     

 

A Requerente contesta apenas as correções referentes a perdas por imparidade em créditos a que alude o art.º 28. -B, n.º 1, alínea c) do CIRC no montante de € 181 385,46 Alegando que do montante total das provisões registadas no ano de 2015 para os clientes selecionados na amostra analisada pela equipa de inspeção (€ 992 107,82), são aceites as provisões constituídas para os clientes O... e P... (no montante de € 506 818,09), tendo sido rejeitado o montante remanescente de € 485 289,73 o que equivale a que do total do reforço constituído em 2015 (€ 279.437,00), a Q... aceitou €98.051,54 e rejeitou o restante, com base em amostragem.

Porém, entende que quanto a esta parte da amostra também foi provada a realização de diligências de cobrança das importâncias devidas, não podendo aceitar o método de amostragem para efeitos fiscais, tendo em conta o princípio da legalidade, não tendo a ATA procedido à sua verificação, extrapolando um resultado fiscal para o remanescente do reforço efetuado, o que não está conforme com o quadro legal em vigor, assemelhando-se o procedimento à utilização de métodos indiretos.

Considera que os atos tributários em questão padecem do vício de violação da lei, designadamente, os artigos 16º nº 4, 28.º-B e 57º e seguintes todos do CIRC, bem como dos artigos 6º e 8º do RCPIT, artigos 55º, 58.º e 87º da LGT o que motivará a sua anulação.

Por sua vez a ATA vem dizer que as perdas por imparidade só poderão ser aceites como gasto fiscal, se estiverem evidenciadas na contabilidade, cumprindo as respetivas regras, e respeitarem a créditos de cobrança duvidosa assim evidenciados na contabilidade.

Tendo em conta que a Requerente não disponibilizou toda a documentação solicitada, nem disponibilizou o Ficheiro Normalizado de Exportação de Dados -SAF-T (PT), previsto

na Portaria n.º 321-A/2007 de 26 de Março, com a última alteração efetuada através da Portaria n.º 302/2016, de 2 de dezembro, relativo à contabilidade, como lhe impõe o nº 8 do artigo 123º do CIRC, levou a que os serviços inspetivos utilizassem um método de análise com qual fizeram uma cobertura de 98%, embora não evidenciada no relatório inspetivo, do total registado na conta 2911 no montante de 2.103.097,36€, não havendo por isso qualquer aplicação de métodos indiretos. Sucede ainda que a Requerente juntou com a petição documentos que não apresentou aos serviços de inspeção, ao mesmo tempo que para serem considerados gastos fiscais as perdas por imparidade dos créditos sobre os quais existam provas objetivas de imparidade e desde que existam evidências das diligências de cobrança efetuadas, alínea c) do n.º1 do artigo 28º do CIRC, e que respeitem os montantes anuais acumulados, conforme nº 2 do mesmo artigo, de acordo com a antiguidade da dívida, contada a partir do seu vencimento. Dos documentos exibidos aos serviços inspetivos estes concluíram que na maioria dos clientes a requerente manteve a emissão de faturas até ao final do ano de 2015, o que confirma a existência de relações comerciais normais, e desta forma não cumpre os requisitos da NORMA CONTABILISTICA E DE RELATO FINANCEIRO 27 paragrafo 24 devendo o pedido ser julgado improcedente, por não provado, mantendo-se na ordem jurídica o ato tributário de liquidação impugnado e absolvendo-se a Requerida do pedido.

Apreciado, ainda que de forma sucinta, o dissenso das partes, o que cabe apreciar é se   estão ou não verificados os requisitos de perda por imparidade que o artigo 28.º-B, do CIRC, sob a epígrafe de perdas por imparidade em créditos, visando evitar que o sujeito passivo possa conformar livremente o conceito de créditos de cobrança duvidosa e assim limitar a possibilidade de redução artificial da base tributável, fixando, nesse sentido, regras objetivas, conforme transcrição:       

“ Para efeitos da determinação das perdas por imparidade, o seguinte :

“1 - Para efeitos da determinação das perdas por imparidade previstas na alínea a) do n.º 1 do artigo anterior, consideram-se créditos de cobrança duvidosa aqueles em que o risco de incobrabilidade esteja devidamente justificado, o que se verifica nos seguintes casos:

a) O devedor tenha pendente processo de execução, processo de insolvência, processo especial de revitalização ou procedimento de recuperação de empresas por via extrajudicial ao abrigo do Sistema de Recuperação de Empresas por Via Extrajudicial (SIREVE), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 178/2012, de 3 de agosto.

b) Os créditos tenham sido reclamados judicialmente ou em tribunal arbitral [v]

c) Os créditos estejam em mora há mais de seis meses desde a data do respetivo vencimento e existam provas objetivas de imparidade e de terem sido efetuadas diligências para o seu recebimento.

2 - O montante anual acumulado da perda por imparidade de créditos referidos na alínea c) do número anterior não pode ser superior às seguintes percentagens dos créditos em mora:

a)            25% para créditos em mora há mais de 6 meses e até 12 meses;

b)           50% para créditos em mora há mais de 12 meses e até 18 meses;

c)            75% para créditos em mora há mais de 18 meses e até 24 meses;

d)           100% para créditos em mora há mais de 24 meses.”

 

Há que ter em conta ainda as disposições contidas no $ 24 da NCRF 27 que também se transcreve:

 

“24. Evidência objectiva de que um activo financeiro ou um grupo de activos está em imparidade inclui dados observáveis que chamem a atenção ao detentor do activo sobre os seguintes eventos de perda:

(a) significativa dificuldade financeira do emitente ou devedor;

(b) quebra contratual, tal como não pagamento ou incumprimento no pagamento do juro ou amortização da dívida; (c) o credor, por razões económicas ou legais relacionados com a dificuldade financeira do devedor, oferece ao devedor concessões que o credor de outro modo não consideraria;

(d) torne-se provável que o devedor irá entrar em falência ou qualquer outra reorganização financeira;

(e) o desaparecimento de um mercado activo para o activo financeiro devido a dificuldades financeiras do devedor;

 (f) informação observável indicando que existe uma diminuição na mensuração da estimativa dos fluxos de caixa futuros de um grupo de activos financeiros desde o seu reconhecimento inicial, embora a diminuição não possa ser ainda identificada para um dado activo financeiros individual do grupo, tal como sejam condições económicas nacionais, locais ou sectoriais adversas.

 

O Tribunal é chamado a decidir se nas correções por imparidade em créditos a que alude, art.º 28. -B, n.º 1, alínea c) do CIRC, no montante de € 181 385,46 foram observadas ou não as normas aplicáveis à situação.

Determina o artigo 28º-A do CIRC que podem ser deduzidas para efeitos fiscais as perdas por imparidade, quando contabilizadas no mesmo período de tributação ou em períodos de tributação anteriores, relacionadas com créditos resultantes da atividade normal, incluindo os juros pelo atraso no cumprimento de obrigação, que, no fim do período de tributação, possam ser considerados de cobrança duvidosa e sejam evidenciados como tal na contabilidade, estando a sua determinação prevista no já citado artigo 28º-B do CIRC, sendo a sua dedução indissociável dos princípios constitucionais da tributação de acordo com a capacidade contributiva e o rendimento real.

 A empresa pode deduzir perdas por imparidade relativamente a créditos resultantes da sua atividade normal que venham ser considerados de cobrança duvidosa, devendo a sua dedução estar expressamente relacionada com o princípio da especialização de exercícios, ou seja, ligar-se a um determinado período de tributação e à correspondente periodização do lucro tributável, devendo ocorrer no momento em que se torna claro que se está diante de uma dívida de cobrança duvidosa.

 

Da matéria de facto dada como provada resulta as dificuldades da requerente em apresentar aos serviços inspetivos, nomeadamente o ficheiro normalizado de exportação de dados -SAF-T (PT), previsto na Portaria n.º 321-A/2007 de 26 de Março, com a última alteração efetuada através da Portaria n.º302/2016, de 2 de dezembro, não dando cumprimento cabal ao disposto no nº.8 do artigo 123º do CIRC, o que levou os serviços inspetivos a fazer a sua análise de acordo como os dados que foram postos à sua disposição, tendo inicialmente apresentado um projeto de relatório em que o montante das correções se cifrava € 227 971,82, deste montante a Requerente aceitou a correção de € 5 761,51 e não aceitou as restantes, vindo a ATA, no relatório final a reduzir as correções para € 187 146,97, ficando o litígio reduzido € 181 385,46, por alegado incumprimento da alínea c) do n.º 1 do artigo 28.º-B do CIRC.

 

As perdas por imparidade para serem considerados como gasto fiscal, deverão estar devidamente evidenciadas na contabilidade, observando as regras de contabilidade aplicáveis, e respeitarem a créditos de cobrança duvidosa, o que não foi possível verificar pelos serviços inspetivos relativamente ao valor não aceite.

Na narrativa da Requerente, foi invocada a aplicação de métodos indiretos, por parte da ATA ao ter partido de amostragens para chegar a um resultado mas, em momento algum foi argumentado pela ATA a existência dos pressupostos previstos nos artigos 87º e seguintes da LGT, designadamente a impossibilidade de determinação direta e exata da matéria tributável, como impõem o seu artigo 88º, limitou-se a analisar os elementos que lhe foram sendo disponibilizados, fixando as correções € 187 146,97 devidamente justificadas.

Para além do cumprimento deficiente por parte da Requerente de procedimentos a que está obrigada, como já se referiu, há situações de elementos que não foram disponibilizados, atempadamente, aos serviços inspetivos e que apenas acompanharam a petição.

O princípio da capacidade contributiva impõe que sejam contempladas as deduções, gastos ou perdas, que objetivamente contribuíram e tenham sido necessárias à determinação da base tributável do IRC, porém, elas carecem de um enquadramento legal como meio de garantir o princípio da universalidade e da igualdade no pagamento de impostos. Nesta perspetiva impõe-se que os custos incorridos tenham cobertura legal, tornando-se impossível e mesmo ilegal a dedução de custos ou perdas assim contabilizados quando da parte do sujeito passivo haja incumprimento de requisitos ou critérios legalmente definidos, como foi o caso da situação aqui em análise e, já se viu (incumprimento do nº 8 do artigo 123º do CIRC e não disponibilidade de elementos solicitados).

 

Há ainda que considerar que a jurisprudência quando invocada, é sempre um precioso indicador e ajuda na análise da situação concreta, mas há que ter em conta que a mesma respeita única e exclusivamente aos casos reais em que foi aplicada e ainda ter em conta as modificações legislativas entretanto ocorridas, o que obsta a sua aplicabilidade a outras situações.

Entende o Tribunal que houve da parte da Requerente dificuldade em apresentar atempadamente ou não apresentando mesmo os elementos que lhe foram solicitados, para além do não cumprimento integral do disposto no nº 8 do artigo 123º do CIRC, o que impossibilita a consideração como perda da imparidade no montante de € 181 385,46, dado não estar demonstrada objetivamente, ao mesmo tempo que não foi provado a existência de diligências concretas com vista ao seu recebimento, como impões a alínea c) do nº 1 do artigo 28º-B do CIRC.

Do exposto conclui-se que não se verifica o invocado vício de violação da lei, designadamente dos artigos 16º nº 4, 28.º-B e 57º e seguintes todos do CIRC, bem como dos artigos 6º e 8º do RCPIT, artigos 55º, 58.º e 87º da LGT, devendo, por isso, o pedido improceder e a liquidação posta em crise permanecer na ordem jurídica.

 

4 – Juros indemnizatórios

 

A requerente solicitava ainda o pagamento de juros indemnizatórios, porém, atendendo à improcedência do pedido, torna-se desnecessário o Tribunal debruçar-se sobre esta questão.

 

IV - DECISÃO

 

Face ao exposto o Tribunal declara:

 

a)            O pedido de pronúncia arbitral improcedente, com a consequente absolvição da Requerida e manutenção na ordem jurídica da liquidação de IRC, conforme documento 2019..., relativa ao saldo apurado, de acordo com a demonstração de acerto de contas do exercício de 2015, de IRC e de juros compensatórios, no montante global de € 48.083,94.                                                    

 

b)           Fixar o valor do processo em € 48.083,94, tendo em vista as disposições contidas nos artigos 299º nº1 do CPC, 97-A nº 1 alínea b) do CPPT e 3º nº 2 do RCPAT .                                                

 

c)            Fixar as custas, no montante de € 2 142,00 de acordo com o disposto na tabela I referida no artigo 4º do RCPAT, que ficam a cargo da Requerente.

                                              

Notifique

 

Texto elaborado em computador, nos termos, nos termos do artigo 131º, nº 5 do CPC, aplicável por remissão do artigo 29º, nº1, alínea e) do RJAT, com versos em branco e revisto pelo tribunal

 

Lisboa,18 de dezembro de 2020

 

O Árbitro singular,

Arlindo Francisco