Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 704/2016-T
Data da decisão: 2017-07-18  IRC  
Valor do pedido: € 142.093,79
Tema: Imposto sobre o rendimento das pessoas colectivas (IRC) - Tributações autónomas - dedução dos PEC’s - Lei interpretativa
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DECISÃO ARBITRAL

 

Os Árbitros Maria Fernanda dos Santos Maçãs (Árbitro Presidente), Diogo Bonifácio e Maria Isabel Guerreiro, designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa para formarem o presente Tribunal Arbitral, acordam o seguinte:

 

I. Relatório

 

1.     A sociedade A…– SOCIEDADE GESTORA DE PARTICIPAÇÕES SOCIAIS, S.A. (doravante apenas “Requerente”), pessoa coletiva nº…, com sede em Rua …, n.º…, …-…, …, com o capital social de € 837.880,00, veio, ao abrigo do disposto nos artigos 2º, nº 1, alínea a) e 10º, nº 1, alínea a), do Decreto-Lei nº 10/2011, de 20 de Janeiro, diploma que aprovou o Regime Jurídico da Arbitragem Tributária (doravante apenas “RJAT”), bem como do disposto nos artigos 1º e 2º, da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março, apresentar pedido de constituição de tribunal arbitral, no qual é Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira (doravante apenas "Requerida" ou “AT”).

2.     No âmbito do pedido de pronúncia arbitral por si apresentado, a Requerente peticionou a declaração de ilegalidade das decisões de indeferimento do recurso hierárquico e das reclamações graciosas apresentadas contra os atos de autoliquidação de IRC do “Grupo Fiscal B…”, relativos aos exercícios de 2014 e 2015, na parte correspondente às Tributações Autónomas, respetivamente, nos montantes de € 69.328,04 (ano 2014) e de € 72.765,75 (ano 2015).

3.     A Requerente optou por não designar árbitro, tendo solicitado ao Conselho Deontológico do CAAD essa designação, nos termos do disposto nos artigos 6º, nº 1 e 11º do RJAT.

4.     O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Exmo. Senhor Presidente do CAAD e automaticamente notificado à AT em 13/12/2016, tendo as Partes sido notificadas, em 25/01/2017, dos árbitros designados pelo Conselho Deontológico do CAAD.

5.     Após aceitação por parte dos árbitros designados, o presente Tribunal Arbitral considerou-se constituído no dia 09/02/2017, em conformidade com o disposto nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), 5º, 6º, n.º 1, e 11º, n.º 1, todos do RJAT (com a redação introduzida pelo art. 228.º, da Lei nº 66-B/2012, de 31 de dezembro).

6.     Através de despacho arbitral de 15/03/2017, foi dispensada a Reunião do Tribunal Arbitral, a que alude o artigo 18.º do RJAT, ao abrigo do princípio da autonomia do Tribunal na condução do processo e em ordem a promover a celeridade, simplificação e informalidade deste. Mais foi fixada como data de prolação da Decisão Arbitral o dia 9 de Agosto de 2017.

7.     Foi igualmente dispensada a audição de testemunhas, por não haver matéria de facto controvertida e por se tratar de questões exclusivamente de direito, nisso convergindo ambas as partes, que aceitaram essa dispensa.

8.     As partes apresentaram alegações escritas.

9.     A Requerente invoca em síntese o seguinte:

i)            A conclusão de que a norma do Código do IRC que prevê as deduções à colecta em IRC (artigo 90.º, n.º 2) abrange a colecta em IRC das tributações autónomas, é uma exigência, em primeiro lugar, da própria letra da lei, tal como entendida pela própria AT e por avassaladora jurisprudência tributária: quer a AT, quer os tribunais arbitrais em dezenas de decisões arbitrais que deram razão à AT, entendem que a coleta da tributação autónoma em IRC é IRC, inclusive nos propósitos ou função que aquela serve (combate, através de tributação compensatória, a despesas e encargos de duvidosa empresarialidade, pelo menos na sua totalidade, mas não obstante deduzidas/os pelas empresas no apuramento do seu lucro tributável em IRC);

ii)          E é também uma exigência do princípio da coerência e da interpretação sistemática: não se pode simultaneamente concluir (sem lei que, previamente, crie a dissonância) que quando o Código do IRC se refere à colecta do IRC no seu artigo 45.º, n.º 1, alínea a) (na redacção e numeração em vigor até 2013), aí se inclui, sem necessidade de nomeação própria, a colecta da tributação autónoma em IRC (e assim concluiu avassaladora jurisprudência tributária, a pedido da AT;

iii)        E nuns artigos mais à frente (artigo 90.º, n.º 2, do Código do IRC) concluir, em oposição, que a colecta do IRC não abrange a colecta da tributação autónoma em IRC;

iv)        Que essa incoerência interpretativa não é sustentável foi a conclusão, até à Lei do Orçamento do Estado para 2016 (LOE 2016), de 4 acórdãos arbitrais protagonizados por 8 árbitros, a cujo entendimento aderiu ainda um nono árbitro em voto de vencido num quinto acórdão arbitral de data também anterior à entrada em vigor da LOE 2016;

v)           Deste consenso se desviou uma corrente minoritária constituída por este quinto acórdão arbitral e por uma decisão arbitral (tribunal singular), ambos com data anterior à entrada em vigor da LOE 2016 (e até esta data não há mais decisões arbitrais ou acórdãos sobre o âmbito de aplicação do artigo 90.º, n.º 2, do Código do IRC). Decisões divergentes estas que no seu conjunto obtiveram a adesão de apenas dois árbitros;

vi)        A tentativa argumentativa usada para afastar a colecta da tributação autónoma em IRC da norma que prevê as deduções à colecta, não é persuasiva. Falha na tentativa de justificar a dissonância interpretativa, o rompimento com o que é exigido pelo princípio da coerência e da interpretação sistemática, e as particularidades que de vários ângulos tenta invocar para distinguir, não resistem também ao exame;

vii)      Donde que quer de um prisma de contagem de espingardas até à LOE 2016 (número de decisões arbitrais em cada um dos campos opostos), quer de um ponto de vista substantivo ou material, se possa e deva concluir que a correcta interpretação (fundada no respeito pelo princípio da coerência exigida ao intérprete/aplicador da lei) era a de que na colecta do IRC a que se dirige o n.º 2 do artigo 90.º do CIRC se abrange a colecta da tributação autónoma em IRC;

viii)           Mas há mais: onde se encontra a norma interpretada, o objecto da interpretação na norma da LOE 2016 que alterou este estado de coisas? De parte alguma da LOE 2016 resulta identificada a norma que a parte 2 do novo n.º 21 do artigo 88.º do CIRC visaria interpretar. O que constitui mais um forte sintoma de que se está perante uma novidade normativa, por oposição a visão interpretativa de norma velha;

ix)        E há mais ainda: quer o artigo 89.º, quer o artigo 90.º, n.ºs 1 e 2, do CIRC, referem-se ao IRC, a todo o IRC (nenhuma ressalva fazem ou faziam), e ambos se inserem na mesma fase lógica da regulamentação da liquidação do IRC, pós obtenção da colecta primária (apurada de acordo com os antecedentes oitenta e oito artigos, onde se inclui o da tributação autónoma);

x)           Neste contexto (que é o real), como podem ambas as partes, 1 e 2, do novo n.º 21 do artigo 88.º do CIRC (introduzido pela LOE 2016), serem simultaneamente interpretativas do que dispõem os artigos 89.º e 90.º do CIRC, em sentidos opostos? Como podem ser simultaneamente interpretativas (nos dizeres do artigo 135.º da LOE 2016) no sentido de que o IRC do artigo 89.º inclui também as tributações autónomas (parte 1 do n.º 21 do artigo 88.º), e no sentido oposto de que o IRC do artigo 90.º, pelo menos o do seu n.º 2, não inclui as tributações autónomas?;

xi)        Não podem, isso é uma impossibilidade lógica e sistémica. Uma das duas prescrições, ou a da parte 1, ou a da parte 2, do novo n.º 21 do artigo 88.º do CIRC, não tem, e não tem necessariamente, por impossibilidade lógica, carácter interpretativo;

xii)           E sabendo-se da esmagadora jurisprudência, acompanhada pela AT, no sentido da qualificação da colecta da tributação autónoma em IRC como possuindo a natureza de IRC (conforme 2.º Acto desta história, atrás relatado), fácil é concluir que quem nesta dualidade de prescrições de sentido oposto tem natureza interpretativa é a parte 1. E que portanto, e necessariamente, a parte 2 do novo n.º 21 do artigo 88.º do CIRC tem carácter inovatório (contra-corrente, no caso contra a inserção da colecta primária da tributação autónoma na colecta do IRC);

xiii)           Por todas estas razões, algumas das quais por si sós suficientes, crê-se, a requerente julga ter podido demonstrar que não é materialmente interpretativa a exclusão das deduções à colecta da tributação autónoma constante da segunda parte do novo n.º 21 do artigo 88.º do Código do IRC, introduzida pela LOE 2016;

xiv)           Mas mesmo que não houvesse certeza a propósito da ausência de carácter interpretativo na nova norma, atento o papel garantístico, com dignidade constitucional, da proibição de retroactividade da lei fiscal, a dúvida razoável é suficiente: no mínimo, transfere o ónus (se é que não esteve lá sempre, atentas as regras gerais do ónus da prova) para quem clama pela natureza interpretativa de uma lei fiscal e com isso pretenda aplicá-la retroactivamente sem a oposição da norma constitucional que o proíbe, de mostrar (anulando a dúvida razoável) que é essa realmente, em substância, para lá da mera proclamação, a sua natureza;

xv)            Como se demonstrou, uma norma como a introduzida pela LOE 2016 (o novo n.º 21 do artigo 88.º do CIRC), que impede que haja deduções à colecta sobre a colecta da tributação autónoma em IRC, é um dos tipos de norma (entre muitos outros, conforme supra exemplificado) que interfere com o quantum do imposto a pagar por referência ao facto tributário/exercício fiscal em concreto em causa. Pelo que, provocando aumento do imposto a pagar, como sucede, está sujeita à proibição de retroactividade prevista no artigo 103.º, n.º 3, da Constituição;

xvi)           Sem a interferência da LOE 2016, antes da LOE 2016, variadas decisões arbitrais no exercício da função de julgar com isenção e imparcialidade o que diz a lei em vigor à data dos factos (anteriores a 2016), entenderam que o âmbito de aplicação do artigo 90.º do CIRC e das deduções à colecta aí previstas abrangia a colecta das tributações autónomas em IRC. Função de julgar que, acrescenta-se, é poder soberano que no seu exercício não pode nem deve ser condicionado pelos outros poderes soberanos;

xvii)         Julga-se ser de rejeitar que a LOE 2016 dite ao julgador como deverá ser julgada/interpretada a lei em vigor à data dos factos anteriores a 2016. Isto porque onde a Lei Fundamental proíbe que o legislador altere o passado normativo, não lhe é constitucionalmente admitido que o altere ditando à função soberana de julgar como deve ser entendido esse passado normativo;

xviii)       Com efeito e em primeiro lugar, quer a requerente lembrar que a proibição constitucional em causa não distingue entre mais imposto aplicável ao passado por força de lei dita interpretativa, e mais imposto aplicável por força de lei que tal não se arrogue;

xix)           E há razão para respeitar essa indiferenciação. Com efeito, se o legislador de hoje tem necessidade de aprovar nova lei que esclareça o que no seu entendimento foi querido pelo legislador que fez a lei do passado, é porque detectou o risco de este por si querido entendimento acerca do legislador no passado não ser partilhado quer pelos destinatários dessa lei antiga quer, sobretudo, pelos órgãos de soberania que têm por missão, e com independência do poder legislativo ou de qualquer outro, decidir o que diz a lei;

xx)       Ora, se assim é a nova lei com pretensão de fixar o sentido do quadro jurídico anterior a ela, adita inevitavelmente nova juridicidade a esse quadro. Pode-se insistir em usar a terminologia de que o faz interpretativamente, mas o que não se pode negar é que essa “interpretação” acrescenta ao que havia anteriormente, mesmo que se pudesse concluir que, ao contrário da interpretação oposta, é respeitadora dos limites (regras) da interpretação: escolhe uma opção interpretativa (que origina mais imposto, no caso) e exclui a outra, condicionando com isso, para mais, o imposto aplicável. Imposto este que, pretendendo-se aplicá-lo ao passado, viola a proibição constitucional de retroatividade;

xxi)           De ângulo equivalente: ao excluir a interpretação oposta da lei antiga por quem de direito (os tribunais, no limite) que não gerava esse imposto, origina a lei nova, necessariamente (e outro não é o seu objectivo), imposto. Com o que a pretensão da sua aplicação ao passado viola também, necessariamente, a proibição constitucional de retroactividade em matéria de imposto;

xxii)         De outro modo, já se o disse, o aplicador da Constituição estará a escancarar a janela àquilo (proibição de retroactividade em matéria de imposto) a que a Constituição fechou a porta;

xxiii)       Mas mais ainda. Em matéria fiscal quis o legislador uma protecção reforçada: só há impostos autorizados pelo Parlamento, e o próprio Parlamento está proibido de autorizar impostos para o passado;

xxiv)       É de recordar aqui o acórdão do Tribunal Constitucional n.º 172/00. Em suma, como se expressou este acórdão do Tribunal Constitucional, o reforço constitucional da protecção contra o poder legislativo que se contém na proibição de retroactividade das suas leis, é um reforço da segurança jurídica e da protecção da tutela da confiança que se não compagina com interferências no processo de aplicação da lei pelos órgãos nela investidos, o que afasta a admissibilidade de leis interpretativas nas matérias sob aquela protecção constitucional. Sejam as leis interpretativas autênticas, ou não, o que quer que se entenda por autênticas, questão em si mesma com respeito à qual dificilmente se eliminará a imprecisão e a discussão;

xxv)          Em conclusão, entende a requerente que a atribuição pelo artigo 135.º da LOE 2016 (Lei n.º 7-A/2016, de 30 de Março) de natureza interpretativa também à parte 2 do novo n.º 21 do artigo 88.º do CIRC, isto é, também ao segmento normativo “não sendo efetuadas quaisquer deduções ao montante global [de tributação autónoma em IRC] apurado”, introduzido pela mesma LOE 2016 (pelo seu artigo 133.º), (ii) e consequente atribuição de carácter retroactivo a esta nova norma fiscal, configura uma inconstitucionalidade material do referido artigo 135.º da LOE 2016, por violação da proibição de retroactividade em matéria de impostos prevista no artigo 103.º, n.º 3, da Constituição, quer se tenha concluído, quer não (e entende-se que não), estar-se perante uma lei materialmente interpretativa;

xxvi)       E por violação, também, do princípio da separação entre poderes legislativo e judicial e do princípio da independência do poder judicial, reforçados que são sempre que se esteja perante matéria sujeita à proibição constitucional de retroactividade de novas leis;

xxvii)     Violação, pois, também, em articulação com a proibição de retroactividade, do artigo 2.º (Estado de direito democrático, e separação e interdependência de poderes, sendo que quanto a este último aspecto no caso está em causa a perspectiva da interdependência – e por conseguinte negação de excessos e de ocupação de espaço que não lhe pertence – do poder político-legislativo face ao poder judicial), do artigo 111.º, n.º 1 (separação e interdependência dos órgãos de soberania, que é ainda um limite material de revisão – artigo 288.º, alínea j), da Constituição), e do artigo 203.º (independência dos tribunais, outro limite material de revisão – artigo 288.º, alínea m), da Constituição), todos da Constituição.

10. Por seu lado, a Requerida apresentou Resposta, defendendo-se por impugnação, sustentando a sua posição e a improcedência da pretensão da Requerente nas seguintes conclusões:

i)                   As tributações autónomas, ao arrepio do que vem escorado na douta jurisprudência arbitral e na argumentação da AT, pese embora se tratar de uma colecta em IRC, distingue-se por incidir não sobre os lucros mas, antes sim, sobre despesas incorridas pelo sujeito passivo ou por terceiros que com ele tenham relações;

ii)                 Em face da sua teleologia, as tributações autónomas, enquanto instrumento fiscal anti-abusivo, esvaziar-se-iam de qualquer conteúdo prático-tributário na eventualidade de se acolher a tese defendida pela Requerente nos seus extensíssimos e prolixos excursos – o que apenas por mero exercício académico se concederia;

iii)              Sob pena de se subverter os fins das tributações autónomas, ao conferir-lhes, com esta interpretação, um efeito nulo, em conformidade com o que a AT vem exaustivamente pugnando;

iv)               Ora, a lei e a sua interpretação não se compaginam com meras aparências ou juízos valorativos construídos ao redor das conveniências das teses de quem as defende, sem que se tenha presente a hermenêutica da teleologia do normativo em apreço;

v)                 Novamente, reitere-se, que a admissibilidade de uma interpretação desta estirpe, permitiria uma inadmissível limitação da liberdade de conformação da iniciativa do legislador, que ao criar as tributações autónomas o fez com um propósito que pertence ao plano das evidências, i.e.: a) a luta contra a evasão fiscal; b) a intenção de tributar rendimento de terceiros cujo acréscimo de rendimento, de outra maneira, se subtrairia à tributação; c) a penalização, pela via fiscal, do pagamento de rendimentos considerados excessivos face à conjuntura de crise económica de que, ainda hoje, existem resquícios;

vi)               Pelo que, permitir devaneios interpretativos que redundariam na admissibilidade de dedução de PEC’s à colecta das tributações autónomas – à semelhança daquilo que a lei permite à colecta do IRC – como pretende a Requerente, amputa inexoravelmente as tributações autónomas naquilo que foram os princípios e fins em que assentou a sua criação pelo legislador;

vii)             Destarte, as pretensões aduzidas assentam, com o devido respeito, numa construção fantasiosa e falaciosa sem qualquer sustentáculo legal, escorando-se numa qualquer tentativa forçada de interpretação ab-rogante do normativo vigente, termos em que fenecem in totum os argumentos esgrimidos pela Requerente;

viii)          A interpretação propugnada pela Requerente, salvo o respeito por diverso e antagónico entendimento, mais não é do que um atropelo às regras vigentes de apuramento do imposto;

ix)               Pelo que, respeitosamente considerando a douta jurisprudência arbitral arvorada pela Requerente (desconstruída e reconstruída ao sabor do seu ficcional ideário argumentativo), interpretar o normativo vigente para as tributações autónomas no sentido que se propugna na falácia acolhida e defendida por aquela, mais não é do que, repise-se à saciedade, uma interpretação ab-rogante travestida de impulso legiferante, podendo constituir, em última análise, uma violação ao princípio da separação de poderes;

x)                 E se dúvidas subsistissem sobre a autonomia das Tributações Autónomas, passemos o pleonasmo, atente-se à declaração de voto do juiz Vítor Gomes no Acórdão do TC n.º 18/2011, proc.º 204/2010, onde o mesmo afirma que «Embora formalmente inserida no CIRC e o montante que permita arrecadar seja liquidado no seu âmbito e a título de IRC, a norma em causa [art.º 88.º] respeita a uma imposição fiscal que é materialmente distinta da tributação nesta cédula, (…)» e mais adiante «Com efeito,, estamos perante uma tributação autónoma, como diz a própria letra do preceito. E isso faz toda a diferença.(…)» (negrito nosso);

xi)     Finalmente, e sem prescindir, sempre se terá que chamar à colação, dissipando-se definitivamente a questão controvertida, o teor do artigo 133.º, o qual aditou o número 21 ao artigo 88.º do CIRC, com os efeitos previstos no artigo 135.º, ambos constantes da Lei do Orçamento de Estado para 2016, publicado a 30.03.2016, com entrada em vigor no dia seguinte, nos quais se preconiza, com carácter interpretativo, que «A liquidação das tributações autónomas em IRC é efetuada nos termos previstos do artigo 89.º e tem por base os valores e as taxas que resultem do disposto nos números anteriores, não sendo efetuadas quaisquer deduções ao montante global apurado.»;

xii)   Tal norma veio clarificar positivando, como se evidenciou supra, o entendimento e prática perfilhados pacificamente pela doutrina e pelos contribuintes em geral, os quais nunca foram postos em causa pela AT, pelo que qualquer interpretação dissonante será materialmente inconstitucional;

xiii) Com efeito, desde a criação das Tributações Autónomas, no início da década de 90, e a sua evolução legislativa, sempre foi pacífico por “aqueles que contam” que as tributações autónomas não admitiam qualquer dedução;

xiv) Adoptar a posição da Requerente, como supra referido, sempre teria como consequência lógica e inerente ao funcionamento do IRC que os valores apurados a título de tributações autónomas, se entendidos como integrantes duma colecta única – o que só por mero exercício académico se pode conceber – fossem tidos em conta no cálculo dos pagamentos por conta;

xv)    Consequência lógica que foi completamente escamoteada do discurso da Requerente, seja num plano real ou meramente intencional;

xvi) Ora, salvo o devido respeito, a Requerente parece “sofrer do mesmo mal” que imputa à Requerida, pretendendo o melhor de dois mundos, porquanto é evidente a existência de dois pesos e duas medidas no seu comportamento, por um lado defende a existência de uma coleta onde as tributações autónomas estarão incluídas, para assim poder beneficiar das deduções melhor descritas, por outro lado, nenhuma consequência retira no que concerne ao cálculo dos pagamentos por conta, enquanto consequência evidente do acto por si pretendido;

xvii)         Face ao que, não merecem censura os actos tributários impugnados pela ora Requerente, devendo os mesmos permanecer válidos na ordem jurídica.

 

II. Saneamento

 

O tribunal é competente e está regularmente constituído.

As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, estando devidamente representadas.

O meio processual é o próprio e não enferma de nulidades.

Também não foram invocadas excepções ou questões prévias que obstem à apreciação do mérito da causa.

 

 

 

III. Matéria de facto considerada assente

 

Tendo em consideração a posição assumida pelas partes, a prova documental e o PA junto aos autos, consideram-se provados, com relevo para a decisão, os factos a seguir indicados:

 

A)    A Requerente procedeu à entrega, em 29 de Maio de 2015, da declaração de IRC Modelo 22 referente ao exercício de 2014 do grupo fiscal a que pertence, nos termos da qual apurou um montante de tributações autónomas de € 69.328,04 (Cf. Doc. n.º 1 junto com o pedido arbitral);

B)    Em 10 de Novembro de 2015, a Requerente viria a apresentar, relativamente ao mesmo exercício de 2014, uma declaração de substituição, na qual foi mantido o a montante das tributações autónomas, tendo sido corrigido o valor da derrama municipal (Cf. doc. n.º 2 junto com o pedido arbitral);

C)    Em 30 de Maio de 2016, a Requerente apresentou a declaração de IRC Modelo 22 respeitante ao exercício de 2015, na qual foi apurado um montante de tributações autónomas € 72.765,75 (Cf. Doc. n.º 3 junto com o pedido arbitral);

D)    Segundo a informação prestada pelo Técnico Oficial de Contas e atentos também os comprovativos de pagamento que foram juntos ao pedido arbitral como Docs. n.ºs 7, 8 e 9, a Requerente tinha à sua disposição, nos exercícios de 2014 e 2015, a possibilidade de dedução à colecta de IRC dos montantes dos Pagamentos Especiais por Conta efectuados e não deduzidos, que ascenderiam, respectivamente, a € 413.045,04 e a € 426.941,06 (Cf. Docs. n.ºs 9, 10 e 11 juntos com o pedido arbitral);

E)     A Requerente apresentou reclamação graciosa contra o ato de autoliquidação de IRC do exercício de 2014, na qual pugnava o direito de proceder à dedução, à colecta de IRC produzida pela aplicação das taxas de tributação autónoma, dos referidos Pagamentos Especiais por Conta, tendo-lhe sido notificada, em 27/06/2016, a respetiva decisão de indeferimento (Cf. Doc. n.º 4 junto com o pedido arbitral);

F)     Desta decisão apresentou a Requerente Recurso Hierárquico, em 11/07/2016 (Cf. Doc. n.º 5 junto com o pedido arbitral);

G)    Por não ter sido decidido, no respetivo prazo legal, o Recurso Hierárquico deduzido contra o indeferimento da Reclamação Graciosa do IRC de 2014, a Requerente presumiu o seu indeferimento tácito;

H)    Com os mesmos fundamentos, a Requerente apresentou reclamação graciosa contra o ato de autoliquidação de IRC do exercício de 2015, tendo-lhe sido notificada, em 26/10/2016, a respetiva decisão de indeferimento (Cf. Doc. n.º 6 junto com o pedido arbitral);

 

Não se provaram outros factos com relevância para a decisão final.

 

 

IV. Do Direito

A)    Questões a decidir

Antes de mais, importa referir que os Tribunais, aqui se incluindo os Tribunais Arbitrais, não têm que apreciar todos os argumentos apresentados pelas partes, tal como se constata a título exemplificativo do Acórdão do Pleno da 2ª Secção do STA, de 07/06/1995, proferido no recurso nº 5239.

Assim e tendo em consideração o que foi alegado, quer em sede de pedido arbitral, quer em sede de alegações finais escritas, com a apresentação do presente pedido presente o Requerente a declaração de ilegalidade do indeferimento das reclamações graciosas e do recurso hierárquico acima referidos e, bem assim, as autoliquidações de IRC e respectivas taxas de tributação autónoma, respeitantes aos exercícios de 2014 e 2015, por considerar que não lhe deve ser vedada a possibilidade de dedução do Pagamento Especial por Conta à parte da colecta de IRC correspondente às taxas de tributação autónoma.

Em face disso, requer que:

i)       Seja declarada a ilegalidade, anulando-se, o indeferimento das reclamações graciosas e do recurso hierárquico em causa, na medida em que recusam a anulação da parte ilegal, nos termos que aqui se discutiram, das autoliquidações de IRC na parte produzida pelas taxas de tributação autónoma, dos exercícios de 2014 e 2015, com isso violando o princípio da legalidade;

ii)     Seja declarada a ilegalidade de tais autoliquidações, sendo consequentemente anuladas, nas partes correspondentes aos montantes de € 69.328,04 (2014) e € 72.765,75 (2015);

iii)   Seja reconhecido o direito ao reembolso dos aludidos montantes, bem como, do montante de € 231,31, com referência aos juros de mora pagos quanto à declaração modelo 22 de IRC de 2015, e, bem assim, o direito a juros indemnizatórios pelo pagamento de imposto indevidamente liquidado, contados, até integral reembolso, no que respeita a € 69.328,04 (2014) desde 1 de Setembro de 2015, e contados no que respeita a € 72.765,75 (2015) desde 21 de Setembro de 2016 quanto a € 25.133,50, e desde 1 de Setembro de 2016 quanto aos restantes € 47.632,25;

iv)   Subsidiariamente, caso se entenda que o artigo 90.º do CIRC não se aplica às tributações autónomas, ser declarada a ilegalidade das liquidações das tributações autónomas (e consequentemente anuladas), por ausência de base legal para a sua efectivação (cfr. artigo 8.º, n.º 2, alínea a), da LGT, e artigo 103.º, n.º 3, da CRP), com o consequente reembolso dos mesmos montantes e pagamento de juros indemnizatórios contados das mesmas datas.

 

São estas as questões a decidir.

B)    Da natureza das tributações autónomas na jurisprudência e na doutrina nacional

Tal como resulta do enquadramento legal e factual acima efectuado, a questão que o Tribunal terá que decidir é se existe a possibilidade de dedução do PEC à parte da colecta de IRC correspondente às tributações autónomas, o que pressupõe, desde logo, a análise histórica da evolução da figura das tributações autónomas, da sua natureza e da sua razão de ser.

Antes de mais, refira-se que, tendo presente a posição adoptada nas Decisões Arbitrais nº 722/2016-T, de 28 de Junho de 2016, nº 443/2016 de 23 de Fevereiro de 2017 e n.º 504/2016-T, de 21 de Março de 2017, cujos colectivos foram presididos pelo aqui também Árbitro Presidente (e para as quais desde já aqui remetemos), entende este Tribunal, em conjunto também com a demais jurisprudência nesse sentido, que as tributações autónomas visam tributar a despesa e não o rendimento.

Esta posição é igualmente assumida pelo Exmo. Senhor Conselheiro Vítor Gomes (voto de vencido aposto no Acórdão n.º 204/2010 do Tribunal Constitucional), nos termos do qual afirma, referindo-se às tributações autónomas, que “embora formalmente inserida no CIRC e o montante que permita arrecadar seja liquidado no seu âmbito e a título de IRC, a norma em causa respeita a uma imposição fiscal que é materialmente distinta da tributação nesta cédula (….)”.

Ainda segundo tal entendimento, “Com efeito, estamos perante uma tributação autónoma (…) e isso faz toda a diferença. Não se trata de tributar um rendimento no fim do período tributário, mas determinado tipo de despesas em si mesmas, pelas compreensíveis razões de política fiscal que o acórdão aponta”.[1].

Acrescentando que “deste modo, o facto revelador de capacidade tributária que se pretende alcançar é a simples realização dessa despesa, num determinado momento. Cada despesa é, para este efeito, um facto tributário autónomo, a que o contribuinte fica sujeito, venha ou não a ter rendimento tributável em IRC no fim do período, sendo irrelevante que esta parcela de imposto só venha a ser liquidada num momento posterior e conjuntamente com o IRC” (sublinhado nosso).

Como se adiantou, foi também reconhecido pela jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo (STA) “que sob a designação de tributações autónomas se escondem realidades muito diversas, incluindo, nos termos do n.º 1 do (então) art.º 81.º do CIRC, as despesas confidenciais ou não documentadas, que são tributadas autonomamente, à taxa de 50%, que será elevada para 70%, nos casos de despesas efectuadas por sujeitos passivos total ou parcialmente isentos, ou que não exerçam, a título principal, actividades de natureza comercial, industrial ou agrícola (n.º 2 do [então] art.º 81.º) e que não são consideradas como custo no cálculo do rendimento tributável em IRC. Refira-se contudo que já as despesas de representação e as relacionadas com viaturas ligeiras, nos termos do disposto no (então) art. 81.º n.º 3 do CIRC e ajudas de custo estão afectas á actividade empresarial e indispensáveis pelo que são fiscalmente aceites nalguns casos ainda que dentro de certos limites”.[2].

Ainda no que se refere à posição que era assumida pelo Tribunal Constitucional, importa fazer menção ao Acórdão n.º 18/11, nos termos do qual se referiu o seguinte: “existem factos sujeitos a tributação autónoma, que correspondem a encargos comprovadamente indispensáveis à realização dos proveitos e (…) isto significa que a tributação autónoma também recai sobre encargos que correspondem ao núcleo do conceito de rendimento real, rendimento líquido e cumprimento de obrigações contabilísticas” (sublinhado nosso).

Mais recentemente, o Tribunal Constitucional veio reformular a doutrina do acima referido Acórdão n.º 18/11, aproximando-se do então voto de vencido do Conselheiro Vítor Gomes e do Acórdão do STA n.º 830/11 (acima também citado), no sentido de entender que “contrariamente ao que acontece na tributação dos rendimentos em sede de IRS e IRC, em que se tributa o conjunto dos rendimentos auferidos num determinado ano (o que implica que só no final do mesmo se possa apurar a taxa de imposto, bem como o escalão no qual o contribuinte se insere), no caso tributa-se cada despesa efetuada, em si mesma considerada, e sujeita a determinada taxa, sendo a tributação autónoma apurada de forma independente do IRC que é devido em cada exercício, por não estar diretamente relacionada com a obtenção de um resultado positivo, e por isso, passível de tributação. Assim, e no caso do IRC, estamos perante um imposto anual, em que não se tributa cada rendimento percebido de per si, mas sim o englobamento de todos os rendimentos obtidos num determinado ano, considerando a lei que o facto gerador do imposto se tem por verificado no último dia do período de tributação (cfr. artigo 8.º, n.º 9, do CIRC). Já no que respeita à tributação autónoma em IRC, o facto gerador do imposto é a própria realização da despesa, não se estando perante um facto complexo, de formação sucessiva ao longo de um ano, mas perante um facto tributário instantâneo” (sublinhado nosso).

Como bem se deu nota naquele Acórdão do Tribunal Constitucional “esta característica da tributação autónoma remete-nos, assim, para a distinção entre impostos periódicos (cujo facto gerador se produz de modo sucessivo, pelo decurso de um determinado período de tempo, em regra anual, e tende a repetir-se no tempo, gerando para o contribuinte a obrigação de pagar imposto com caráter regular) e impostos de obrigação única (cujo facto gerador se produz de modo instantâneo, surge isolado no tempo, gerando sobre o contribuinte uma obrigação de pagamento com caráter avulso). Na tributação autónoma, o facto tributário que dá origem ao imposto, é instantâneo: esgota-se no ato de realização de determinada despesa que está sujeita a tributação (embora, o apuramento do montante de imposto, resultante da aplicação das diversas taxas de tributação aos diversos atos de realização de despesa considerados, se venha a efetuar no fim de um determinado período tributário). Mas o facto de a liquidação do imposto ser efetuada no fim de um determinado período não transforma o mesmo num imposto periódico, de formação sucessiva ou de caráter duradouro. Essa operação de liquidação traduz-se apenas na agregação, para efeito de cobrança, do conjunto de operações sujeitas a essa tributação autónoma, cuja taxa é aplicada a cada despesa, não havendo qualquer influência do volume das despesas efetuadas na determinação da taxa” (sublinhado nosso). [3].

Da parte da doutrina e no essencial, o entendimento não se tem afastado, no que concerne ao conceito e natureza das tributações autónomas, da jurisprudência constitucional, nomeadamente, da que foi acima referida.

Com efeito, considera RUI MORAIS, que “está em causa uma tributação que incide sobre certas despesas dos sujeitos passivos, as quais são havidas com constituindo factos tributários. É difícil descortinar a natureza desta forma de tributação e, mais ainda, a razão pela qual aparece prevista nos códigos dos impostos sobre o rendimento”.[4]

No mesmo sentido, JOSÉ ALBERTO PINHEIRO PINTO entende que “não se trata propriamente de IRC – que visa tributar o rendimento das pessoas colectivas e não despesa por elas efectuadas -, mas da substituição de uma tributação de rendimentos “implícitos” de pessoas singulares, que se considera não exequível directamente”.[5]

Ou seja, alguma doutrina e jurisprudência, aqui se incluindo a do Tribunal Constitucional, têm vindo a considerar que as tributações autónomas são factos tributários autónomos, que incidem sobre a despesa, pelo que, apesar de inseridas formalmente no Código do IRC, dizem respeito a uma tributação distinta do imposto sobre o rendimento. Isto porque se considera que as mesmas visam prevenir práticas abusivas de remuneração de trabalhadores, gerentes e sócios/accionistas da sociedade.

Neste sentido, veja-se SALDANHA SANCHES, para quem “neste tipo de tributação, o legislador procura responder à questão reconhecidamente difícil do regime fiscal de despesas que se encontram na zona de intersecção da esfera pessoal e da esfera empresarial, de modo a evitar remunerações em espécie mais atraentes por razões exclusivamente fiscais ou a distribuição oculta de lucros. Apresenta a norma uma característica semelhante à que vamos encontrar na sanção legal contra custos não documentados, com uma subida de taxa quando a situação do sujeito passivo não corresponde a uma situação de normalidade fiscal.”[6].

Também CASALTA NABAIS considerou o seguinte: “trata-se de uma tributação que se explica pela necessidade de prevenir e evitar que, através dessas despesas, as empresas procedam à distribuição camuflada de lucros, sobretudo de dividendos que, assim, ficariam sujeitos ao IRC enquanto lucros da sociedade, bem como combater a fraude e evasão fiscais que tais despesas ocasionam (…)”.[7]

No mesmo sentido, ainda, veja-se ANA PAULA DOURADO (Direito Fiscal, Lições, 2015, p. 237).

C) Da evolução da figura das tributações autónomas

Na redação inicial do Código do IRC (aprovada pelo Decreto-Lei n.º 442-B/88, de 30 de Novembro), não se fazia nenhuma referência expressa ou implícita a tributações autónomas. Só com a Lei n.º 101/89, de 29 de dezembro, que aprovou o Orçamento do Estado para 1990, foi feita uma primeira referência a tributações autónomas no âmbito do IRC, através da autorização legislativa que consta do n.º 3 do seu artigo 15.º, em que se preceitua o seguinte:

3 - Fica o Governo autorizado a tributar autonomamente em IRS ou IRC, conforme os casos, a uma taxa agravada em 10% e sem prejuízo do disposto na alínea h) do n.º 1 do artigo 41.º do CIRC, as despesas confidenciais ou não documentadas efectuadas no âmbito do exercício de atividades comerciais, industriais ou agrícolas por sujeitos passivos de IRS que possuam ou devam possuir contabilidade organizada ou por sujeitos passivos de IRC não enquadrados nos artigos 8.º e 9.º do respetivo Código.

Como é consabido, a origem no ordenamento jurídico fiscal português das tributações autónomas remonta a 1990, com a publicação do Decreto-Lei nº 192/90, de 9 de Junho, nos termos do qual (no seu artigo 4º), se estabelecia uma tributação autónoma: a) À taxa de 10% relativa a despesas confidenciais ou não documentadas e; b) À taxa de 6.4%, relativamente a despesas de representação e encargos relacionados com viaturas ligeiras de passageiros.

Foi com a aprovação do Decreto-Lei n.º 192/90 (e concretizando aquela autorização legislativa), que foi incluída à margem dos códigos do IRS e do IRC, uma norma sobre tributações autónomas, nos termos da qual “as despesas confidenciais ou não documentadas efectuadas no âmbito do exercício de actividades comerciais, industriais ou agrícolas por sujeitos passivos de IRS que possuam ou devam possuir contabilidade organizada ou por sujeitos passivos de IRC não enquadrados nos artigos 8.º e 9.º do respectivo Código são tributadas autonomamente em IRS ou IRC, conforme os casos, a uma taxa de 10% sem prejuízo do disposto na alínea h) do n.º 1 do artigo 41.º do CIRC”.

Esta norma e, de uma forma geral, o regime das tributações autónomas, veio a ser objecto de diversas alterações (v. g. a Lei n.º 52-C/96, de 27 de Dezembro, a Lei n.º 87-B/97, de 31 de Dezembro, a Lei n.º 3-B/2000, de 4 de Abril e a Lei n.º 30-G/2000, de 29 de Dezembro), nomeadamente, através de sucessivas modificações, quer das taxas, quer da sistematização e redação às mesmas conferida, nos respectivos códigos sobre os impostos sobre os rendimentos (ou seja, quer no Código do IRC, quer no Código do IRS).

Com a aprovação da Lei nº 30-G/2000, de 29 de Dezembro, o decreto que consagrou as “tributações autónomas” foi revogado, aditando-se ao Código do IRC o artigo 69º-A [correspondente à data dos factos subjacentes (2011 e 2012) ao artigo 88º] no qual, para além da manutenção da incidência destas às despesas não documentadas, às despesas de representação e às despesas com viaturas, se estendeu a mesma a outras situações da natureza diversa.

Em consequência desta análise da evolução da figura das tributações autónomas, julga o Tribunal poder retirar-se, desde logo, duas conclusões:

i) A primeira é a de que as tributações autónomas incidem quer sobre encargos dedutíveis, quer sobre encargos não dedutíveis em sede de IRC;

(ii) A segunda é a de que as tributações autónomas visam evitar a erosão da base tributável em sede de IRC, fazendo incidir tributação sobre encargos que podem ser deduzidos pelos sujeitos passivos de IRC mas que, sendo-o, se transformam num agravamento da tributação, pretendendo, portanto, servir como desincentivo à despesa com tais encargos.

Em relação às tributações autónomas sobre despesas não dedutíveis, caso se admitisse a sua dedutibilidade, estaria a admitir-se a dedutibilidade de um encargo não indispensável para a realização dos rendimentos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora.

Deste modo, poderá considerar-se como assente, e para o que relevará no sentido da decisão a proferir no âmbito dos presentes autos, os seguintes pressupostos:

i) As tributações autónomas de IRC, ancoradas nos diversos números e alíneas do artigo 88º do Código do IRC, traduzem situações diversas, às mesmas cabendo também taxas de tributação diferentes;

ii) As tributações autónomas de IRC, incidentes sobre determinados encargos de sujeitos passivos de IRC, devem ser entendidas como pagamentos independentes da existência ou não de matéria coletável;

iii) Interpretadas como pagamentos, associados ao IRC, ou com este pelo menos relacionados, podendo entender-se como uma excepção no que respeita ao princípio da tributação das pessoas colectivas de acordo com o lucro real e efectivo apurado (artigo 3º do Código do IRC);

iv)Nas tributações autónomas, o facto tributário que dá origem à tributação é instantâneo, ou seja, esgota-se no acto de realização de determinadas despesas que estão sujeitas a tributação (embora o apuramento do montante de imposto resultante das diversas taxas de tributação aos diversos actos de realização de despesas considerados, se venha a efetuar no fim de um determinado período tributário);

v) O facto de a liquidação do imposto ser efectuada no fim de um determinado período não o transforma num imposto periódico, de formação sucessiva ou de carácter duradouro, porquanto essa operação de liquidação traduz-se apenas na agregação, para efeito de cobrança, do conjunto de operações sujeitas a essa tributação, cuja taxa é aplicada a cada despesa, não havendo qualquer influência do volume das despesas efetuadas na determinação da taxa;

vi) A tributação autónoma não é equivalente à não dedutibilidade das despesas realizadas pelo sujeito de IRC.

Nessa medida, reconhecem-se as características que, já há alguns anos, a doutrina vem imputando às tributações autónomas, nomeadamente, que:

a)         A tributação autónoma só faz sentido porque os custos/gastos relevam como componentes negativas do lucro tributável do IRC, sendo isso que motiva os sujeitos passivos do IRC a relevar um valor tão elevado quanto possível desses gastos para diminuir a matéria tributável do IRC, a colecta e, consequentemente, o imposto a pagar;

b)         Com o regime fiscal associado, pretende-se desincentivar esse tipo de gastos em sujeitos passivos que apresentam resultados negativos mas que, independentemente disso, continuam a evidenciar estruturas de consumo pouco ou nada compagináveis com a saúde financeira das suas empresas;

c)         Trata-se, em tese mais geral, de modelar o sistema fiscal de modo que este revele um certo equilíbrio tendo em vista uma melhor repartição da carga tributária efectiva entre contribuintes e tipos de rendimento;

d)         Considera-se desfavoravelmente determinados gastos em que, reconhecidamente, não é fácil determinar a medida exacta da componente que corresponde a consumo privado e relativamente aos quais é conhecida a prática geral de abuso na sua relevação.

D) Da causa e da função das tributações autónomas em sede de IRC

É pacífico que as tributações autónomas radicam, como se aflorou, na necessidade de evitar abusos quanto à relevação de certos encargos ou despesas e que poderão ser facilmente objeto de desvio para consumos privados ou que, de algum modo, são susceptíveis de configurar, formalmente, um gasto de uma pessoa colectiva mas que, substancialmente, representam ou podem configurar abusos que visam minimizar a medida real do imposto.

Ciente desta dificuldade de, muitas vezes, se efetuar uma separação rigorosa destas duas realidades, foi sucessivamente “enxertado”, conforme supra descrito, no regime de tributação do lucro real e efectivo estabelecido no Código do IRC, como padrão geral, um regime autónomo de tributação de certos gastos, no todo ou em parte indesejados e indesejáveis, que contaminam os termos do dever de imposto que, assim, surge configurado abaixo da real capacidade contributiva da entidade que a releva como tal.

Nestes termos, pode afirmar-se que as tributações autónomas surgem integradas no regime do IRC, são apuradas e devidas no âmbito da relação jurídica de imposto sobre o rendimento das pessoas colectivas e é, neste quadro, que se efectua o seu apuramento. Mas não são IRC, tout court, como a Requerente lapidar e definitivamente o afirma.

Com efeito, para que fossem assim consideradas teriam, desde logo, que tributar o rendimento e isso, como vimos, não é o que sucede, em momento algum.

Na verdade, embora exista uma instrumentalidade evidente entre o IRC e o modelo de tributação da renda em Portugal e as tributações autónomas (facto de resto bem evidenciado na jurisprudência dos Tribunais Superiores e, em especial, do Tribunal Constitucional), prevalece o entendimento de que as tributações autónomas tributam despesas.

De facto, as tributações autónomas são um instrumento que (afastando-se e introduzindo alguma medida de entorse num sistema que declara tributar rendimentos reais e efetivos), afinal também tributa gastos, dedutíveis ou não em IRC, sem que com isso sejam violados os preceitos constitucionais já que a norma aplicável (art.º 104.º, n.º 2 da CRP) declara imperativa a tributação das empresas “fundamentalmente” sobre o seu rendimento real, sem prejuízo quer das situações de tributação segundo os lucros ou o rendimento real (quando seja apurado por métodos indiretos), quer das situações de tributação de gastos objeto de tributação autónoma (por expressa opção de lei), do estabelecimento de soluções técnicas (como é o caso do PEC) e das regras específicas visando a sua devolução.

Neste âmbito, vale a pena ainda recordar que, nem os sistemas fiscais, nem os modelos de imposição concreta correspondem a modelos puros, isentos de elementos de extraneidade ao próprio sistema fundacional, de valores, ou ao próprio regime geral de um qualquer imposto abstratamente considerado. Com efeito, todos os impostos possuem caraterísticas ou soluções que, quando vistas isoladamente, podem representar objectivamente uma descaraterização do modelo tal como na pureza dos conceitos foi concebido mas que, quando articuladas com o modelo, se verifica que concorrem para a sua efectividade, e lhe conferem ou reforçam a sua coerência.

Essas soluções, mais pragmáticas ou específicas, não ferem tais ditames valorativos essenciais, sejam eles de proteção da receita ou de densificação dos ideais valorativos gerais (da ordem tributária) ou específicos do imposto (como é o caso da necessidade de evitar abusos) desde que, eles mesmos, não sejam de tal modo relevantes que abjurem o modelo de tributação-regra ou falseiem estruturalmente os valores em que radica.

Na situação em apreço, apesar de a opção da lei fundamental e da lei ordinária, por consequência, ter sido claramente no sentido de tributar o rendimento das pessoas colectivas e, nas formas possíveis de apuramento deste, se haja escolhido a tributação do rendimento real e efectivo como manifestação do mais elevado padrão de justiça fiscal, a verdade é que o sistema sempre conheceu desvios mais ou menos relevantes, seja porque certos gastos não são considerados como tal pela lei fiscal (embora objectivamente possam ser imputáveis a uma actividade comercial), seja porque a lei fiscal, reconhecendo essa essencialidade, teme a ocorrência de abusos (como é o caso das tributações autónomas, genericamente falando).

Em parte, este afastamento da pureza dos conceitos é uma consequência inevitável da complexidade das relações da vida, seja porque modelos de imposição fiscal puros são mais onerosos de implementar e gerir já que requerem informação relevante muito mais apurada, seja porque no campo dos impostos, como noutros campos da vida, há que temperar o ideal de justiça consagrado com soluções de razoabilidade normativa na qualificação dos factos relevantes e técnica nas soluções e exigências a estabelecer, com o objectivo de evitar que os modelos tributários sejam excessivamente complexos e onerosos deixando de atingir realidades e práticas que mitiguem a carga tributária ou concorram para uma má distribuição da mesma.

Deste balanceamento dos valores que suportam o dever de estabelecer/suportar imposto com as realidades da vida pode resultar a necessidade de estabelecer limites (fiscais ou outros) ao comportamento dos sujeitos passivos, com o objectivo de manter dentro de padrões gerais de equilíbrio, as soluções legais do sistema.

Por outro lado, importa ter presente (porque isso releva para efeitos da decisão a tomar) que as tributações autónomas configuram normas anti-abuso dirigidas a racionalizar comportamentos específicos dos contribuintes (face ao dever de imposto) pelos quais, tradicionalmente, conseguiam alcançar uma medida de imposto inferior ao que o evidenciava a sua capacidade contributiva efectivamente revelada mas que, mercê, desses comportamentos abusivos era passível de ser mitigada ou eliminada, com evidente violação ou postergação do princípio da justiça, de justa repartição da carga fiscal por quem revela capacidade contributiva.

Consequentemente, faz sentido admitir que se façam deduções gerais à colecta do imposto, que são permitidas por lei para dar sentido efectivo ao princípio da tributação do rendimento real e efectivo.

Mas, relativamente à colecta devida por tributações autónomas, essa dedução geral deixa de fazer sentido porque, não tributando os lucros, mas despesas, não se coloca, quanto a elas, a questão da justiça na repartição do encargo geral do imposto, pelo que seria ilógico permitir a dedução de encargos quando tal dedução, na prática, destruiria o sentido anti-abusivo que as impregna, ou seja, o desincentivo de comportamentos desviantes que a sua instituição reprime ou dirime.

Ora, as tributações autónomas, como parece claro, não têm uma finalidade marcadamente reditícia, isto é, não visam, primacialmente, a obtenção de (mais) receita fiscal, embora este possa não ser um aspecto despiciendo, verificável. Visam dissuadir comportamentos, práticas ou opções das empresas radicadas em razões essencialmente de natureza de poupança fiscal, reditícia e, por outro lado, preservam os equilíbrios próprios do regime de tributação das pessoas colectivas, evitando distorções não apenas ao nível dos resultados tributáveis, como ondas de comportamentos desviantes, afectadores da expectativa jurídica da receita, em cada ano económico.

E, através destas cláusulas gerais anti-abuso, forçam a manutenção de uma correlação saudável entre os volumes de negócios, os lucros tributáveis e o imposto devido a final pelas entidades sujeitas a IRC, em linha com os níveis médios de carga fiscal efectiva que recai sobre os diferentes grupos de contribuintes, dentro do sistema fiscal português e, até, comparativamente com a dos estados membros da OCDE ou fora dela.

Deste modo, as tributações autónomas, incluindo as previstas na alínea b), do n.º 13, do art.º 88.º do Código do IRC têm, pois, uma função disciplinadora geral que não é alheia às finalidades sistémicas do imposto, até porque, como mecanismo anti abuso, as tributações autónomas não são alheias aos fins gerais do sistema fiscal.[8]

Nestes termos, a adopção de regimes legais que limitem os efeitos nefastos que resultem de comportamentos afectadores da equilibrada repartição da carga fiscal sobre os diferentes grupos de contribuintes não constitui apenas uma opção do legislador mas, é antes, uma obrigação estrita, em resultado na obrigatoriedade de gizar e fazer funcionar o sistema como um todo de forma equilibrada.

Mais, as tributações autónomas introduzem mecanismos de tributação que, naturalmente, desagradarão aos seus destinatários, mas impedem ou limitam os efeitos nefastos de práticas abusivas que prejudicariam outros e são, por isso, necessárias à preservação dos equilíbrios do sistema.

Ora, as empresas, tal como as pessoas singulares, também estão sujeitas e com a mesma intensidade ao dever geral de pagar impostos e, nesta medida, a lei fiscal não pode deixar de consagrar mecanismos que limitem procedimentos desviantes porquanto cada um deve suportar imposto segundo pode, isto é, segundo são as suas capacidades contributivas reveladas.

Acrescente-se que, em face da adoção, como regra geral, do regime da tributação segundo o rendimento real e efetivo, quanto às pessoas colectivas, esta não constitui uma mera opção de funcionamento do sistema fiscal de entre várias outras possíveis. É, isso sim, uma manifestação concreta da modernidade e da maturidade de um sistema fiscal que exige dos seus destinatários/beneficiários uma madureza da mesma estatura pois representa também uma nova forma de responsabilização ética e social perante o fenómeno do imposto. [9]

Tal como considerou, uma vez mais, SALDANHA SANCHES (citado na Decisão arbitral 187/2013-T, pp. 28): “as tributações autónomas constituem uma forma de obstar a actuações abusivas “(...) que o normal funcionamento do sistema de tributação era incapaz de impedir, sendo que outras, incluindo formas mais gravosas para o contribuinte, eram possíveis. Este caráter anti abuso das tributações autónomas, será não só coerente com a sua natureza “anti sistémica” (como acontece com todas as normas do género), como com uma natureza presuntiva, apontada quer pelo Prof. Saldanha Sanches quer pela jurisprudência que o cita. Elas terão então materialmente subjacente uma presunção de empresarialidade parcial das despesas sobre que incidem, em função da supra apontada circunstância de tais despesas se situarem numa linha cinzenta que separa aquilo que é despesa empresarial, produtiva, daquilo que é despesa privada, de consumo, sendo que, notoriamente, em muitos casos, a despesa terá mesmo na realidade uma dupla natureza (parte empresarial, parte particular)”. [10]

Todas estas considerações convocam o que nos parece ser a verdadeira sententia legis, posto que a descoberta do verdadeiro sentido da lei constitui um imperativo, pois que importa assegurar que a actividade do intérprete atinja um sentido interpretativo pelo qual a lei exteriorize o seu sentido mais benéfico, mais profícuo e mais salutar, no dizer de FRANCESCO FERRARA.[11]

Por outro lado, o sentido lógico da interpretação não nos conduz senão no sentido de considerar que as tributações autónomas assentam numa lógica segundo a qual a lei pretende evitar ou desincentivar tais pessoas colectivas de relevar (abusivamente) como gastos valores relativos a bónus ou remunerações variáveis. Assim, é a relevação como gasto para efeitos de IRC, em toda a sua extensão, que se pretende desincentivar.

Deste modo e fazendo apelo à ratio legis, parece evidente que as tributações autónomas são cobradas, no âmbito do processo de liquidação do IRC, de acordo com uma raiz e uma dogmática próprias que levam a que a colecta total do imposto não seja uma realidade unitária mas composta.[12]. Com efeito, nela é possível descortinar a colecta de imposto propriamente dita, resultante da mecânica geral de apuramento do IRC, que é devida com fundamento constitucional assente no dever geral de cada um (neste se englobando as pessoas colectivas) de contribuir para as despesas públicas segundo os seus haveres (art.º 103.º, n.º 1 da CRP).

Tudo no respeito e em cumprimento dos princípios da justiça, da igualdade e do dever de pagar imposto segundo a capacidade contributiva revelada. E a que se deduzem as importâncias referidas no artigo 90.º do Código do IRC e nos termos e modos ali referenciados.

E a esta colecta geral, radicada neste fundamento de ordem fundacional, adiciona-se a colecta específica, devida por tributações autónomas, que tem, como se deixou claro, uma raiz, um sentido e um fundamento próprios, qual seja o de desincentivar a adopção dos comportamentos por elas tributados, elencados no art.º 88.º do Código, que configura uma norma anti abuso, o que nos permite convocar aqui toda a dogmática própria em que se fundamenta.

Neste caso, por se tratar de cumprir finalidades que extravasam os fins puramente reditícios do imposto, para se situar no campo dos comportamentos que a lei considera abusivos e/ou não desejados, parece claro que não faz sentido que se lhe efectuem deduções, sob pena de se esvaziar, na prática, de qualquer sentido o regime anti abusivo criado.

Atento todo o exposto, está este Tribunal em condições de analisar o pedido da Requerente, quanto à legalidade da dedução do PEC à parte da colecta de IRC correspondente às taxas de tributações autónomas, nos exercícios de 2014 e de 2015.

E) A evolução do PEC e seu regime

A génese e a evolução do PEC desenvolvem-se em três estádios, designadamente (i) o regime que vai do seu nascimento até ao ano 2000; (ii) o regime aplicável aos exercícios de 2001 e 2002; e o regime subsequente que vigora até hoje.

Na sua versão inicial, o PEC foi apresentado como ferramenta de melhoria do sistema, que era e é muito baseado na declaração dos rendimentos pelos contribuintes. A sua introdução no sistema fiscal foi simultânea com a redução da taxa geral do IRC em dois pontos percentuais.

A ocorrência daqueles dois factos não é coincidência, porquanto, se por um lado, se reduziu a taxa aplicável aos contribuintes pagadores de imposto, por outro lado, através do PEC, promoveu-se o pagamento especial de quantia a título de imposto, ainda que a título provisório, pelos sujeitos passivos que apesar de continuarem a desenvolver a sua actividade ano após ano, persistiam em declarar rendimentos negativos ou nulos, escapando à tributação efectiva.

Nestes termos, foi pois, como medida de combate às “práticas evasivas de ocultação de rendimentos ou de empolamento de custos” que o PEC foi justificado no preâmbulo do Decreto-Lei n.º 44/98, de 3 de Março (diploma que o instituiu).

A provisoriedade do pagamento do imposto residia afinal na possibilidade de deduzir as quantias pagas como PEC ao IRC, apurado nos termos gerais, fixados no artigo 71.º do CIRC então vigente (do qual ainda não faziam parte as tributações autónomas), embora essa dedução só fosse possível se, apesar dessa operação, o valor do imposto a pagar fosse positivo (conforme artigo 71º, n.º 6 do CIRC/1998).

Não havendo IRC a pagar nos termos gerais, o valor do PEC satisfeito podia ser reportado para o exercício seguinte (conforme artigo 74º-A, n.º 1) ou reembolsado mais tarde (conforme artigo 74º-A, n.º 2). Procurava-se garantir que a generalidade dos sujeitos passivos satisfizesse valor por conta do IRC, calculado provisoriamente sobre o volume de negócios do exercício anterior (conforme artigo 83º-A).

No fundo, ficcionava-se que todas as empresas teriam por tendência um lucro tributável, calculado de acordo com os parâmetros gerais, equivalente a 1% do seu volume de negócios do ano anterior, acertando-se posteriormente a conta se assim não fosse.

A reforma do IRC operada em 2000-2001, através da Lei n.º 30-G/2000, de 29 de Dezembro, reduziu o carácter de pagamento por conta que o imposto tinha, impedindo o seu reembolso enquanto o contribuinte se mantivesse em actividade e impôs que o reporte das quantias satisfeitas fosse feito apenas até ao quarto exercício subsequente (conforme artigo 74º-A, n.º 1, do Código do IRC/2001).

Desta norma restritiva resulta, pela primeira vez, a possibilidade do PEC se transformar em colecta mínima quando não fosse possível deduzir as quantias satisfeitas, por se esgotar o período de reporte.[13]

Em síntese, é possível afirmar que as alterações introduzidas nesta reforma não só mantiveram como acentuaram a tónica de combate à evasão fiscal que tinha animado a introdução do PEC. Contudo, apesar de nesta ocasião as “tributações autónomas” terem sido introduzidas no CIRC, não foi previsto qualquer mecanismo de articulação entre os dois instrumentos.

A terceira configuração do PEC foi introduzida pela Lei n.º 32-B/2002, de 30 de Dezembro, que no seu artigo 27.º introduziu um novo regime da dedutibilidade do PEC no artigo 87.º, n.º3, do CIRC, repondo a possibilidade de reembolso das quantias entregues a título de PEC e não abatidas na liquidação anual de IRC. Manteve-se ainda aqui o carácter de medida de perseguição da evasão fiscal, embora se tenha aligeirado, sem o abolir completamente, o cunho de colecta mínima, face aos apertados condicionalismos impostos para o reembolso.

Dispõe o artigo 104.º do CIRC que “as entidades que exerçam, a título principal, actividade de natureza comercial, industrial ou agrícola, bem como as não residentes com estabelecimento estável em território português, devem proceder ao pagamento do imposto (…) em três pagamentos por conta, com vencimento em Julho, Setembro e 15 de Dezembro do próprio ano a que respeita o lucro tributável ou, nos casos dos nºs 2 e 3 do artigo 8.º, no 7.º mês, no 9.º mês e no dia 15 do 12.º mês do respectivo período de tributação (…)”.

E o art.º 106.º do CIRC dispõe que “sem prejuízo do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 104.º, os sujeitos passivos aí mencionados ficam sujeitos a um pagamento especial por conta, a efectuar durante o mês de Março ou em duas prestações, durante os meses de Março e Outubro do ano a que respeita ou, no caso de adoptarem um período de tributação não coincidente com o ano civil, nos 3.º e 10.º meses do período de tributação respetivo”.

Do exposto resulta a obrigatoriedade, para os sujeitos passivos de IRC, de efectuarem pagamentos por conta do IRC que será devido a final.

Como é sabido, a técnica dos pagamentos por conta consiste, no geral, num mero mecanismo de antecipação do imposto que venha a ser devido a final. Com efeito, trata-se, como é pacificamente aceite, de um meio que tem vantagens para o Estado pois permite-lhe antecipar o recebimento do imposto, ao mesmo tempo que assegura a sua colecta no momento ou à medida que o rendimento se produz, sem prejuízo do apuramento final e com observância do apuramento do que for devido, segundo o método geral de tributação pelo lucro real.

É verdade que a razão de ser dos pagamentos por conta e do PEC, partindo deste tronco comum (já que, inequivocamente, ambos são o produto de uma técnica tributária pela qual a colecta do imposto devido a final) é antecipada. Contudo, ainda assim, apresentam (no segundo caso), justificações algo diferenciadas.

Desde logo, no que diz respeito à razão de ser dos pagamentos, no caso dos pagamentos por conta, porquanto estes esgotam-se, em nossa opinião, nos fundamentos supra evidenciados, mas já o PEC, não perdendo essa finalidade de vista, tem ainda uma outra que se lhe adicionou.

Como bem se refere na Decisão Arbitral proferida no âmbito do processo n.º 113/2015-T, “na doutrina e na jurisprudência o regime do PEC sempre foi tido como sistema para evitar a evasão fiscal e para garantir o pagamento de imposto por todas as empresas em atividade”.

E é também isso que resulta do trabalho doutrinário desenvolvido pelo Tribunal Constitucional porquanto do seu Acórdão n.º 494/2009 resulta evidenciado que o PEC, no recorte que lhe foi dado no CIRC, está também “indissociavelmente ligado à luta contra a evasão e fraude fiscais”, procurando garantir que os rendimentos manifestados pelos contribuintes “correspond[i]am ao rendimento tributável realmente auferido”. [14]

Na verdade, o citado Acórdão do Tribunal Constitucional identifica múltiplos trabalhos científicos que se pronunciaram no mesmo sentido, como é o caso de Teresa Gil, (ob. e loc. cit.), que deu conta das circunstâncias que rodearam a introdução do PEC, designadamente das dificuldades na aplicação do princípio da tributação pelo lucro real, constatadas face à “divergência que existe entre os lucros efetivamente obtidos e aqueles que são declarados pelas empresas e, portanto, objeto de tributação”.

Neste passo, fazemos nossas a síntese invocada na supra referida Decisão Arbitral, em que o regime actual do PEC é assim caracterizado por “(i) ter ligação indissociável à luta contra a evasão e fraude fiscais; (ii) ter sido introduzido no CIRC em março de 1998, antes das taxas de tributação autónoma que só passaram a fazer parte da sua sistemática na reforma de 2000-2001; (iii) na conceção do PEC previu-se a sua dedução à colecta na liquidação do IRC calculado sobre o rendimento real; (iv) a recuperação do crédito resultante do PEC está subordinada a condições de obtenção de rácios de rentabilidade próprios das empresas do sector de atividade em que se inserem ou à justificação da situação de crédito por ação de inspeção feita a pedido do sujeito passivo (87º-3 do CIRC)”.

Questão subsequente é a de saber se estas razões especiais convocam a possibilitar que se deduza, à colecta das tributações autónomas, o próprio PEC, porquanto ele não é mais do que um pagamento por conta do IRC que será (presumivelmente) devido a final pelo sujeito passivo, ainda que com algumas caraterísticas especiais. E, logo assim, ele é IRC para todos os efeitos legais havendo, todavia, regras especiais para a sua devolução.

Ao contrário das tributações autónomas, que são colecta devida em razão de comportamentos que a lei deseja desincentivar e, por isso, penalizam a relevação de certos gastos pelas razões indicadas, no PEC do que se trata é de garantir que seja adiantado a título de IRC, e sem prejuízo da sua dedução à colecta geral do imposto, apurada por efeito da operação de liquidação stricto sensu, certa medida do imposto.

Como bem se refere na Decisão Arbitral proferida no âmbito do processo 113/2015-T, acima referida, “o PEC passou a fazer parte do sistema do IRC cuja liquidação foi concebida para apurar o imposto diretamente incidente sobre o rendimento declarado. Quando haja lugar a prejuízo fiscal o sujeito passivo tem ainda assim que suportar o PEC; essa foi aliás a razão da sua introdução. Se determinada empresa tiver sucessivamente prejuízos fiscais, suportará sistematicamente imposto, pois o sistema duvida da sua possibilidade de funcionamento em situação permanentemente deficitária, exigindo-lhe que satisfaça provisoriamente (por conta), determinado valor.

Poderá reembolsá-lo se provar que essa situação é comum no seu setor de atividade ou se a AT verificar a regularidade das suas declarações. Este foi o equilíbrio que o CIRC exigiu para manter um sistema baseado nas declarações feitas pelos contribuintes. Já o imposto resultante da tributação autónoma fundamenta-se tão só na perseguição à evasão fiscal por transferência de rendimento e tem o efeito dissuasor e compensatório. Se se permitir a dedução do PEC à colecta resultante da tributação autónoma, gorar-se-ão os propósitos do sistema em que a norma do 83º-2-e CIRC se insere, pois o produto do pagamento especial por conta que deveria manter-se “estacionado” na titularidade da Fazenda Pública será afetado à extinção da dívida do sujeito passivo resultante das tributações autónomas, aligeirando assim a pretendida pressão para evitar a evasão fiscal “declarativa”. Existe efetivamente um conflito inconciliável entre a ratio do PEC – o combate à evasão ou a pressão para correção das declarações – e a afetação dos seus créditos à satisfação de outras obrigações que não sejam as que resultam do apuramento do IRC calculado sobre o resultado tributável.

Em termos práticos a possibilidade de dedução do PEC às tributações autónomas implicaria que mesmo que determinada empresa estivesse eternamente em situação de prejuízo, nenhum imposto sobre o seu rendimento real teria que suportar, enquanto aplicasse o PEC à satisfação das tributações autónomas. Para mais as próprias tributações autónomas (Cfr. Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 617/2012, citado) perderiam o seu caráter anti abuso, passando a confundir-se afinal com o imposto calculado sobre o lucro tributável.

Ora não são esses os objetivos do sistema de tributação do rendimento das pessoas coletivas e a melhor interpretação da norma contida no artigo 83º-2-e CIRC não é essa decididamente aquela que permite deduzir os pagamentos especiais por conta à coleta resultante da aplicação das taxas de tributação autónoma”.

Em suma, ponderáveis razões, derivadas das finalidades que se pretenderam alcançar legislativamente com a criação do PEC, justificam uma interpretação restritiva dos artigos 90.º, n.º 1, e 93.º, n.º 3, do CIRC, em especial da referência que neste último se faz “ao montante apurado na declaração a que se refere o artigo 120.º do CIRC”.

De realçar que este entendimento arbitral se encontra mais uma vez em sintonia com o novo n.º 21 do artigo 88.º do CIRC aditado, como vimos, pela Lei n.º 7-A/2016, de 30 de Março, ao estabelecer que ao montante apurado das tributações autónomas não são “efectuadas quaisquer deduções”.

Também, neste caso, o legislador se limitou a acolher, clarificando-a, uma solução que os tribunais, com o recurso às regras vigentes e por aplicação dos critérios de hermenêutica jurídica estavam em condições de extrair do regime a aplicar, o que se limitou a fazer este colectivo, no caso dos autos.

Por fim, refira-se que, embora o artigo 135.º da LOE de 2016 atribua, como resultou evidenciado, natureza interpretativa ao n.º 21 do artigo 88.º do CIRC (o que conjugado com o artigo 13.º do Código Civil conduz à sua aplicação retroactiva), a solução encontrada por este colectivo não necessitou de fazer aplicação deste novo preceito, caindo, assim, por terra, as inconstitucionalidades que a Requerente imputa ao referido preceito.

No mesmo sentido, veja-se o Acórdão Arbitral n.º 673/2015-T, onde a este propósito se concluiu igualmente que a solução já resultava do teor literal do artigo 93.º, n.º1, do CIRC, “(…) sem ultrapassar os limites normalmente impostos à interpretação e aplicação da lei, já que a interpretação restritiva é admissível quando haja razões ponderosas para concluir que o alcance do texto legal atraiçoa o pensamento legislativo ou é necessário optimizar a harmonização de interesses conflituantes que duas normas visam tutelar”.

Assim, apreciados os factos e a pretensão da Requerente, no sentido de ver deduzido à parte da colecta do IRC, produzida pelas taxas de tributação autónoma, o montante do PEC efectuado em sede de IRC, à luz de tudo quanto vem exposto, não pode deixar de improceder o pedido.

 

V. Outros Pedidos

Improcedendo o pedido de declaração de ilegalidade dos actos de liquidação em crise,  ficam igualmente prejudicados os pedidos feitos pela Requerente de devolução de quantias pagas e de respectivos juros indemnizatórios.

 

VI. Decisão

 

Em face do exposto, decide este Tribunal Arbitral:

a)         Julgar totalmente improcedente o pedido arbitral de declaração de ilegalidade das autoliquidações de IRC, nas partes relativas às tributações autónomas dos exercícios de 2014 e 2015, que constituem o objecto da presente acção;

b)        Em consequência, julgar improcedente o pedido de reembolso dos montantes de € 69.328,04 (2014) e € 72.765,75 (2015), bem como, o pedido de reembolso do montante de € 231,31, com referência aos juros de mora pagos quanto à declaração modelo 22 de IRC de 2015, e, bem assim, o direito a juros indemnizatórios;

c)         Manter a decisão de indeferimento das reclamações graciosas respeitantes aos actos tributários de autoliquidação de IRC relativos aos exercícios de 2014 e 2015;

d)        Condenar a Requerente no pagamento das custas do presente processo.

 

VII. Valor do processo:

Fixa-se o valor do processo em € 142.093,79, nos termos do disposto no artigo 97.º-A, nº 1, alínea a), do Código de Procedimento e do Processo Tributário, aplicável por força do disposto nas alíneas a) e b), do nº 1, do artigo 29.º, do RJAT e do n.º 2 do artigo 3.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária.

 

VIII. Custas:

Fixa-se o valor das custas do processo em € 3.060,00, nos termos da Tabela I do Regulamento das Custas dos Processos de Arbitragem Tributária, a pagar pela Requerente.

 

Notifique-se.

 

Lisboa, 18 de Julho de 2017

 

O Árbitro Presidente,

 

Fernanda Maçãs

 

 

Diogo Bonifácio (vogal- relator)

 

 

Maria Isabel Guerreiro (vogal), com declaração de voto

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Declaração de Voto

 

Concordo com o sentido da decisão a que se chegou neste Processo 704/2016-T, que corresponde à não dedução do montante dos Pagamentos Especiais por Conta à parte da coleta do IRC produzida pelas taxas de tributação autónoma, em face do aditamento do nº 21 ao artigo 88º do Código do IRC, considerando a sua natureza interpretativa, até pela decisão que subscrevi no Processo 219/2015-T, anterior à introdução daquele aditamento pela Lei nº 7-A/2016, de 30 de Março (Lei do OE para 2016).

 

Maria Isabel Guerreiro

 

 

 



[1] No mesmo sentido, vide também o “Voto de Vencido” do mesmo Árbitro Presidente, aposto na Decisão Arbitral nº 5/2106-T, de 27 de Julho de 2016 (e para cujo teor desde já aqui remetemos).

[2] Vide processo nº 830/11, de 21-03-2012 (2ª secção).

[3] Neste sentido, vide Acórdão n.º 310/12, de 20 de Junho (Relator Conselheiro João Cura Mariano), jurisprudência reiterada pelo Acórdão do Plenário, no Acórdão n.º 617/2012 (processo n.º 150/12, de 31 de Janeiro de 2013) e no Acórdão n.º 197/2016 (processo n.º 465/2015, de 23 de Maio de 2016).

[4] Vide RUI DUARTE MORAIS, inApontamentos ao IRC”, Almedina, 2009, pp. 202-203.

[5] Também CASALTA NABAIS considera que se “trata de uma tributação sobre a despesa e não sobre o rendimento” (inDireito Fiscal, 6.ª Ed., p. 614) e, no mesmo sentido, cfr. ANA PAULA DOURADO (inDireito Fiscal, Lições”, 2015, p. 237).

[6] Vide SALDANHA SANCHES, in “Manual de Direito Fiscal”, 3.ª Ed., Coimbra Editora, 2007, p. 406.

[7] Vide CASALTA NABAIS, Idem, p. 614.

[8] Com efeito, conforme se refere no Acórdão do Tribunal Constitucional nº 197/2916, de 23 de Maio, “(…) o IRC e as tributações autónomas são impostos distintos, com diferente base de incidência e sujeição a taxas específicas. O IRC incide sobre os rendimentos obtidos e os lucros diretamente imputáveis ao exercício de uma certa atividade económica, por referência ao período anual, e tributa, por conseguinte, o englobamento de todos os rendimentos obtidos no período de tributação. Pelo contrário, na tributação autónoma em IRC – segundo a própria jurisprudência constitucional – o facto gerador do imposto é a própria realização da despesa, caracterizando-se como acto tributário instantâneo que surge isolado no tempo e gera uma obrigação de pagamento com caráter avulso (…)”.

Por outro lado, conforme se refere no Acórdão do STA, de 12 de Abril de 2012 (processo nº 77/12), citado no Acórdão acima referido, “(…) a tributação autónoma, embora prevista no CIRC e liquidada conjuntamente com o IRC para efeitos de cobrança, nada tem a ver com a tributação do rendimento e dos lucros imputáveis ao exercício económico da empresa, uma vez que incidem sobre certas despesas que constituem factos tributários autónomos que o legislador, por razões de política fiscal, quis tributar separadamente mediante a sujeição a uma taxa predeterminada que não tem qualquer relação com o volume de negócios da empresa (…)”.

[9] A propósito das questões sobre os limites da moral face ao imposto vejam-se SUSANNE LANDREY, STEF VAN WEEGHEL e FRANK EMMERINK). No que diz respeito à interligação profunda e indiscutível entre o direito e a moral, vide JOÃO BAPTISTA MACHADO, Introdução do Direito e ao Discurso Legitimador, Almedina, 9.ª Reimp. pp. 50 e segs.

[10] A Decisão Arbitral do CAAD nº 210/13-T refere que as “despesas (…) partilham entre si um risco de não empresarialidade, isto é, um risco de não serem realizadas com fins empresariais, mas sim extra-empresariais ou privados”.

[11] In “Interpretação e Aplicação das Leis”, Arménio Amado, editores, 1978, p. 137 e segs.

[12] Vide MANUEL DE ANDRADE, in “Ensaio sobre a teoria da interpretação das leis”.

[13] Neste sentido, vide TERESA GIL, inPagamento Especial por Conta”, Revista Fisco. Ano XIV, (Março 2003), n.º 107-108, pág. 12).

[14] Neste sentido, cfr. Acórdão do Tribunal Constitucional (plenário) n.º 494/2009 de 29-09-2009, processo n.º 150/12 (VÍTOR GOMES), disponível em http://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/20090494.