Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 660/2016-T
Data da decisão: 2017-04-20  Selo  
Valor do pedido: € 17.057,16
Tema: IS - Propriedade Vertical - Verba nº 28.1. da TGIS.
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Decisão Arbitral [1]

 

 

O Árbitro, Dra. Sílvia Oliveira, designado pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD) para formar o Tribunal Arbitral, constituído em 20 de Janeiro de 2017, com respeito ao processo acima identificado, decidiu o seguinte:

 

1.       RELATÓRIO

 

1.1.       A…, com sede na …, nº…, no Porto, matriculada na Conservatória do Registo Comercial do Porto sob o número único de matrícula e de Pessoa Colectiva … (doravante designada por “Requerente”), apresentou um pedido de pronúncia arbitral e de constituição de Tribunal Arbitral Singular no dia 31 de Outubro de 2016, ao abrigo do disposto no artigo 4º e nº 2 do artigo 10º do Decreto-Lei nº 10/2011, de 20 Janeiro [Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (RJAT)], em que é Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira (doravante designada por “Requerida”).

 

1.2.    A Requerente pretende que o Tribunal Arbitral:

 

1.2.1.     Julgue “(…) procedente por provada a presente petição (…)” e declare “(…) a ilegalidade das liquidações objeto da presente pronúncia (…)” e, em consequência, ordene “(…) a sua anulação e restituição dos montantes já pagos pela Requerente, acrescidos de juros indemnizatórios contados até à data da emissão e processamento da nota de crédito”.

 

1.3.    O pedido de constituição do Tribunal Arbitral foi aceite pelo Exmo. Senhor Presidente do CAAD e automaticamente notificado à Requerida, em 3 de Novembro de 2016.

 

1.4.      A Requerente não procedeu à nomeação de árbitro pelo que, ao abrigo do disposto no artigo 6º, nº 2, alínea a) do RJAT, a signatária foi designada como árbitro pelo Senhor Presidente do Conselho Deontológico do CAAD, tendo a nomeação sido aceite, no prazo e termos legalmente previstos.

 

1.5.    Em 5 de Janeiro de 2017, foram as Partes devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a designação do árbitro, nos termos do disposto no artigo 11º, nº 1, alíneas a) e b) do RJAT conjugado com os artigos 6º e 7º do Código Deontológico.

 

1.6.    Em conformidade com o preceituado na alínea c), do nº 1, do artigo 11º do RJAT, o Tribunal Arbitral foi constituído em 20 de Janeiro de 2017, tendo sido proferido despacho arbitral na mesma data, no sentido de notificar a Requerida para, nos termos do disposto no artigo 17º, nº 1 do RJAT, apresentar Resposta, no prazo máximo de 30 dias e, caso quisesse, solicitar a produção de prova adicional.

 

1.7.    Adicionalmente, foi ainda referido naquele despacho arbitral que a Requerida deveria remeter ao Tribunal Arbitral, dentro do prazo da Resposta, cópia do processo administrativo.

 

1.8.    Em 21 de Fevereiro de 2017, a Requerida anexou aos autos o processo administrativo.

 

1.9.    Em 22 de Fevereiro de 2017, a Requerida apresentou a sua Resposta, tendo-se defendido por impugnação e concluindo que “deve ser julgado improcedente o presente pedido de pronúncia arbitral, por não provado, mantendo-se na ordem jurídica os actos tributários de liquidação impugnados, absolvendo-se, em conformidade, a entidade requerida do pedido”.

 

1.10.  Adicionalmente, na Resposta apresentada, a Requerida referiu ainda que “(…) não se verificando qualquer interesse e utilidade na realização da reunião arbitral prevista no artigo 18.º do RJAT, solicita-se a dispensa da mesma, bem como da produção de alegações, sendo que, caso a Requerente não dispense estas últimas, se requer, desde já, sejam as mesmas produzidas por escrito, de forma sucessiva”.

 

1.11.  A Requerente foi notificada por despacho arbitral, datado de 22 de Fevereiro de 2017, para no prazo de 5 dias se pronunciar sobre a possibilidade de dispensa da realização da reunião a que alude o artigo 18º do RJAT, bem como da apresentação de alegações.

 

1.12.   A Requerente apresentou, em 7 de Março de 2017, requerimento no sentido de não se opor à dispensa da realização da reunião a que alude o ponto anterior, mas referindo que se oponha à dispensa de apresentação de alegações por escritas.

 

 

1.13.   Nestes termos, por despacho deste Tribunal Arbitral, datado de 8 de Março de 2017, foi decidido:

 

1.13.1.       Prescindir da realização a que se refere o artigo 18º do RJAT;

1.13.2.       Não prescindir da apresentação de alegações e, em consequência, notificar a Requerente e a Requerida para, por esta ordem e de modo sucessivo, apresentarem alegações escritas no prazo de 10 dias, sendo que o prazo para a Requerida começará a contar da data da notificação da junção das alegações da Requerente ou do termo do prazo concedido para o efeito (no caso daquela não apresentar alegações);

1.13.3.       Designar o dia 24 de Março de 2017 para efeitos de prolação da decisão arbitral.

 

1.14.   Por último, foi a Requerente ainda advertida que “até à data da prolação da decisão arbitral deveria proceder ao pagamento da taxa arbitral subsequente, nos termos do disposto no nº 3 do artigo 4º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária e comunicar esse pagamento ao CAAD”.

 

1.15.   Em 23 de Março de 2017, a Requerente apresentou requerimento no sentido de anexar ao processo cópia dos comprovativos de pagamento da terceira prestação de Imposto do Selo objecto de pedido (que protestara juntar no pedido arbitral).

 

1.16.   Em 23 de Março de 2017, a Requerente apresentou alegações no sentido de reiterar a argumentação apresentada no pedido, entendendo que “pelos fundamentos aduzidos na Petição Inicial, e com base nos factos (…) referidos e que deverão ser dados como provados, (…) as liquidações (…) identificadas incorrem nos seguintes vícios: (a) Vício de falta de fundamentação; (b) Erro nos pressupostos da aplicação da verba 28 da TGIS”, “fundamentos pelos quais se requer (…) que as referidas liquidações sejam declaradas ilegais e, consequentemente, anuladas ordenando-se (…) o reembolso do imposto pago, acrescido de juros indemnizatórios”.

 

1.17.   Em 30 de Março de 2017, a Requerida apresentou alegações no sentido de manter “(…) na íntegra (…) todo o teor da sua Resposta, demonstrativo da inexistência de qualquer ilegalidade na tributação de imposto de selo objeto de contestação”, concluindo que “(…) os argumentos da Requerente não podem, de todo, proceder, porquanto fazem uma errada interpretação e aplicação das normas legais subsumíveis ao caso sub judice, como se demonstrou”, pelo que “(…) deverá o presente pedido de pronúncia arbitral ser julgado improcedente, dada a legalidade das liquidações, absolvendo- se a entidade Requerida do pedido”.

 

2.         CAUSA DE PEDIR

 

A Requerente sustenta o seu pedido, em síntese, da seguinte forma:

 

2.1.    Alega que é “em 31.12.2015 (…) era proprietária do prédio urbano sito na Rua…, …, Lisboa, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o número…, e inscrito na matriz predial urbana de Lisboa, concelho de Lisboa, freguesia de…, sob o artigo matricial … (…)”.

 

2.2.    Prossegue a Requerente referindo que “o referido imóvel encontra-se repartido em 14 divisões suscetíveis de utilização independente, duas divisões por piso, em 7 pisos distintos, incluindo cave, rés-do-chão e 5 pisos”, não se encontrando o mesmo “(…) constituído em propriedade horizontal”.

 

2.3.    Esclarece ainda a Requerente que “todas as divisões são afetas à habitação”, sendo que “nenhuma daquelas unidades de utilização independente tem um VPT superior a 1.000.000,00 EUR (…)”.

 

2.4.    Adicionalmente, refere a Requerente que “por referência a 31.12.2015, o valor patrimonial tributário global do imóvel era de 1.705.713,11 EUR”.

 

2.5.    Ora, prossegue a Requerente referindo que “nos meses de Março, Junho e Outubro de 2016, por referência à propriedade do imóvel acima identificado (…) foi notificada dos documentos para pagamento da primeira, segunda e terceira prestações das liquidações de imposto do selo realizadas a 20.03.2015, ao abrigo da Verba 28.1 da Tabela Geral do Imposto do Selo (…)”, tendo a Requerente, “sem renunciar ao direito de reagir contra as referidas liquidações (…)” procedido ao pagamento das referidas prestações.

 

2.6.    Com efeito, “entende a Requerente que as liquidações acima identificadas incorrem nos (…) vícios (…) de falta de fundamentação” e de “erro nos pressupostos da aplicação da verba 28 da TGIS”, “fundamentos pelos quais se requer a final que as referidas liquidações sejam declaradas ilegais e, consequentemente, anuladas ordenando-se a final o reembolso do imposto pago, acrescido de juros indemnizatórios”.

 

Do vício de falta de fundamentação

 

2.7.    No que diz respeito ao alegado vício de falta de fundamentação, entende a Requerente que “ao arrepio das normas legais (…) a verdade é que (…) foi notificada de vários documentos para pagamento, identificados com diferentes números, verificando-se, em suma, a falta de indicação, nas notificações em causa, do número da liquidação que se lhes encontra subjacente”, pelo que conclui a Requerente que “a ausência de fundamentação legal exigida constitui um vício que inquina o ato de ilegalidade, nos termos do (…) Código de Procedimento e de Processo Tributário (…)”.

 

2.8.    Assim, entende a Requerente que “pelos motivos (…) expostos, as liquidações em crise estão feridas de vício de falta de fundamentação devendo, consequentemente, ser declaradas ilegais e anuladas, ordenando-se o reembolso dos montantes já pagos acrescido de juros indemnizatórios (…)”.

 

Do erro nos pressupostos da aplicação da verba 28 da TGIS

 

2.9.    Por outro lado, e no que diz respeito ao alegado erro nos pressupostos de aplicação da verba n.º 28 da TGIS, entente a Requerente que “conforme resulta da verba 28 do Código do Imposto do Selo, o mesmo incide sobre a propriedade, usufruto ou direito de superfície de prédios ou terrenos para construção cujo valor patrimonial tributário constante da matriz, nos termos do Código do IMI, seja igual ou superior a € 1.000.000”, sendo que “no caso em apreço encontramo-nos, à data da liquidação, perante um prédio em propriedade total com andares ou divisões suscetíveis de utilização independente”.

 

2.10.  Ora, refere a Requerente, “nos termos do n.º 3 do artigo 12.º do Código do IMI, cada andar ou parte de prédio suscetível de utilização independente é considerado separadamente na inscrição matricial, a qual discrimina também o respetivo valor patrimonial tributário”, sendo que “da análise do acervo normativo aqui em causa não resulta qualquer disposição legal que faça corresponder o valor patrimonial tributário de um prédio composto por vários andares ou divisões suscetíveis de utilização independente à soma das respetivas partes”.

 

2.11.  Nestes termos, defende a Requerente que “(…) a ficção da existência de um valor patrimonial tributário correspondente à soma dos valores patrimoniais tributários das diversas partes suscetíveis de utilização independente não encontra suporte quer na letra, quer no espírito da lei”, sendo também esse “o entendimento da própria AT ao proceder a liquidações de IS por cada divisão suscetível de utilização independente”.

 

2.12.  Prossegue a Requerente, referindo que “para efeitos de IMI (e, logo, para efeitos de IS), o legislador não operou a qualquer distinção entre prédios constituídos em regime de propriedade horizontal ou propriedade total” pelo que entende que “trata-se de uma distinção ilegal e arbitrária e que resulta única e exclusivamente da errónea interpretação que os serviços da AT fizeram da referida verba”.

 

2.13.  Com efeito, entende a Requerente que “se o legislador de IMI não distingue entre aquelas duas realidades jurídicas (…) não deverá o intérprete de IS distinguir (…)”.

 

2.14.  Refere ainda a Requerente que “a ratio da introdução da verba n.º 28 é bastante clara: numa altura em que o País se encontra sobre um programa internacional de assistência financeira, é razoável pedir àqueles que têm casas de valor superior a um milhão de euros, um esforço adicional”, sendo que “foram essas as palavras ditas pelo Secretário de Estado: casas”, pelo que conclui, neste âmbito que “considerando a linguagem corrente” utilizado pelo Secretário de Estado, parece manifesto que, ainda que dentro daquele tipo de linguagem, caso o mesmo se quisesse referir a prédios inteiros, tinha-o dito: prédios”.

 

2.15.  Nestes termos, entende a Requerente que “o propósito da introdução da referida verba era precisamente o de pedir a estes proprietários que vivem em casas de luxo um esforço adicional em matéria de tributação sobre o património”, sendo que “o objetivo não foi o de tributar unidades autónomas com VPT inferior ao exigido por lei, ainda que incluídos em edificações cujo VPT global ascenda a € 1.000.000,00”.

 

2.16.  E para reforço da sua posição, a Requerente cita diversa jurisprudência arbitral bem como o Acórdão do STA de 09 de Setembro de 2015 (Processo 047/2015), nos termos do qual se refere que “relativamente aos prédios em propriedade vertical, para efeitos de incidência do Imposto do Selo (…) a sujeição é determinada pela conjugação de dois factores: a afectação habitacional e o VPT constante da matriz igual ou superior a € 1.000.000”, pelo que “tratando-se de um prédio constituído em propriedade vertical, a incidência do IS deve ser determinada, não pelo VPT resultante do somatório do VPT de todas as divisões ou andares susceptíveis de utilização independente (individualizadas no artigo matricial), mas pelo VPT atribuído a cada um desses andares ou divisões destinadas a habitação”.

 

2.17.Assim, conclui a Requerente a sua exposição no sentido de reiterar que “(…) as liquidações em crise estão feridas de vício de violação de lei por erro nos pressupostos de aplicação da verba 28.1 da TGIS devendo, consequentemente, ser declaradas ilegais e anuladas, ordenando-se o reembolso dos montantes já pagos, acrescido de juros indemnizatórios (…)”, porquanto entende que “(…) a Autoridade Tributária encontra-se obrigada à imediata e plena reconstituição da situação que existiria se não tivesse sido cometida a ilegalidade (…)”.

 

3.       RESPOSTA DA REQUERIDA

 

A Requerida, na resposta apresentada, defendeu-se por impugnação nos termos a seguir descritos:

 

Do alegado erro sobre os pressupostos de direito

 

3.1.    Neste âmbito, entende a Requerida que “o que aqui está em causa são liquidações que resultam da aplicação direta da norma legal, que se traduz em elementos objetivos, sem qualquer apreciação subjetiva ou discricionária”, pelo que “em consonância, estando correta a liquidação e sendo devido o imposto apurado, não são devidos quaisquer juros (moratórios ou indemnizatórios), desde logo por não existir qualquer erro imputável aos serviços, que se limitaram a atuar, como deviam, no estrito cumprimento da norma legal”.

 

3.2.      Com efeito, defende a Requerida que “carece (…) de sustentação legal a tese defendida pelo Requerente” porquanto “(…) embora a liquidação do IS, nas situações previstas na verba nº 28.1 da TGIS, se processe de acordo com as regras do CIMI, a verdade é que o legislador ressalva os aspetos que careçam das devidas adaptações, a saber aqueles em que, como é o caso dos prédios em propriedade total, ainda que com andares ou divisões suscetíveis de utilização independente (muito embora o IMI seja liquidado relativamente a cada parte suscetível de utilização independente) para efeitos de IS releva o prédio na sua totalidade pois que, as divisões suscetíveis de utilização independente não são havidas como prédio, mas apenas as frações autónomas no regime de propriedade horizontal (…)”.

 

3.3.    Assim, segundo a Requerida “o que, expressamente, resulta da letra da lei é que o legislador quis tributar com a verba 28.1 em discussão os prédios enquanto uma única realidade jurídico-tributária (…)”, sendo que “a sujeição ao imposto de selo da verba 28.1. da TGIS resulta da conjugação de dois factos: a afetação habitacional e o valor patrimonial do prédio urbano inscrito na matriz ser igual ou superior a € 1.000.000,00”.

 

3.4.    Nestes termos, “encontrando-se o prédio em regime de propriedade total (não possuindo frações autónomas, às quais a lei fiscal atribua a qualificação de prédio, porque da noção de prédio do n.º 4 do artigo 2º do CIMI resulta que só as frações autónomas de prédio em regime de propriedade horizontal são tidas como prédios), é o VPT global do prédio que deve, pois, relevar”, pelo que entende que “deve a alegada violação da verba 28.1 da TGIS ser julgada improcedente, mantendo-se na ordem jurídica as liquidações impugnadas por configurarem uma correta aplicação da lei aos factos”.

 

3.5.    Por outro lado, entende ainda a Requerida que “(…) a previsão da verba 28.1 da TGIS não consubstancia qualquer violação ao princípio da igualdade, inexistindo qualquer discriminação na tributação de prédios constituídos em propriedade horizontal e prédios em propriedade total com andares ou divisões suscetíveis de utilização independente, ou entre prédios com afetação habitacional e prédios com outras afetações”.

 

3.6.    Assim, entende a Requerida que “(…) se mantêm integralmente válidas e legais as notas de cobrança do imposto de selo, verba 28 da TGIS, impugnadas nos presentes autos, concluindo-se pela legalidade das mesmas”.

 

Da (alegada) falta de fundamentação do acto tributário

 

3.7.    Neste âmbito, refere a Requerida que “da consulta às referidas notas de cobrança, verifica-se que as mesmas se referem à liquidação do Imposto e Selo sobre imóveis verba 28 da TGIS, onde se encontra devidamente identificado o prédio pela descrição – município /freguesia/artigo – o valor patrimonial, a taxa aplicada, e nestas mesmas notas de cobrança, encontramos igualmente as disposições legais ao abrigo das quais a liquidação foi efetuada” pelo que discorda da posição da Requerente.

 

3.8.    Citando a Decisão Arbitral nº 42/2013, a Requerida defende-se referindo que “nos denominados atos de massa, como é o caso da liquidação impugnada, não deve ser exigido o mesmo rigor formal que se deve exigir de outros actos administrativos que se destinam a situações específicas individualizadas (…)”.[2]

 

3.9.    Adicionalmente, refere ainda a Requerida que “(…) no que respeita à fundamentação dos atos administrativos (…)”, entende-se “que o ato está fundamentado quando, pela motivação aduzida, se mostra apto a revelar a um destinatário normal as razões de facto e de direito que determinam a decisão, habilitando-o a reagir eficazmente pelas vias legais contra o mesmo, se assim entender”.

 

3.10.  Ora, para a Requerida, “resulta demonstrado que o Requerente entendeu perfeitamente o sentido e alcance das liquidações, como resulta do próprio exercício jurídico-argumentativo que faz (…) no presente pedido de pronúncia arbitral”, pelo que conclui a Requerida que “(…) não se vislumbra que a liquidação em causa no presente processo careça de fundamentação legal, pelo que se considera que o ónus de fundamentação foi cumprido e que o pedido do Requerente improcede necessariamente”.

 

3.11.  Adicionalmente, a Requerida por entender que não se verifica “(…) qualquer interesse e utilidade na realização da reunião arbitral prevista no artigo 18.º do RJAT (…)” veio solicitar na Resposta “(…) a dispensa da mesma, bem como da produção de alegações, sendo que, caso o Requerente não dispense estas últimas, se requer, desde já, sejam as mesmas produzidas por escrito, de forma sucessiva”.

 

3.12.  Conclui a Requerida a Resposta referindo que “por todo o exposto, as liquidações em crise consubstanciam uma correta interpretação e aplicação do direito aos factos, estão devidamente fundamentadas, não padecendo de vício de violação de lei, devendo, em consequência, julgar-se improcedente a pretensão aduzida”.

 

4.             SANEADOR

 

4.1.    O pedido de pronúncia arbitral é tempestivo uma vez que foi apresentado no prazo previsto na alínea a) do nº 1 do artigo 10º do RJAT.[3]

 

4.2.    As Partes gozam de personalidade e capacidade judiciária, são legítimas quanto ao pedido de pronúncia arbitral e estão devidamente representadas, nos termos do disposto nos artigos 4º e 10º do RJAT e do artigo 1º da Portaria nº 112-A/2011, de 22 de Março.

 

4.3.    O Tribunal é competente quanto à apreciação do pedido de pronúncia arbitral formulado pela Requerente.

 

4.4.    A cumulação de pedidos aqui efectuada pela Requerente, é legal e válida, nos termos do disposto no artigo 3º, nº 1 do RJAT, dado que a procedência dos pedidos depende, essencialmente, da apreciação das mesmas circunstâncias de facto e da interpretação e aplicação dos mesmos princípios ou regras de direito.

 

4.5.    No que diz respeito ao valor do pedido de pronúncia arbitral, tendo em consideração o disposto no artigo 306º e no artigo 297º, ambos do Código de Processo Civil (CPC), de que “cumulando-se na mesma acção vários pedidos, o valor é a quantia correspondente à soma dos valores de todos eles”, pelo que sendo pedido, no caso em análise, a anulação das liquidações de Imposto do Selo do ano de 2015 incidente sobre o prédio urbano identificado no processo, o valor do pedido deverá corresponder ao total dessas liquidações, ou seja, a EUR 17.057,16 (e não a
EUR 17.057,07, conforme indicado pela Requerente), sem que tal alteração tenha implicações no montante de custas finais do processo.

 

4.6.    Não foram suscitadas excepções de que cumpra conhecer.

 

4.7.    Não se verificam nulidades pelo que se impõe, agora, conhecer do mérito do pedido.

 

5.         MATÉRIA DE FACTO

 

Dos factos provados

 

5.1.    Consideram-se como provados os seguintes factos (suportados pelos documentos a seguir identificados, anexados pela Requerente, bem como pelo processo administrativo, anexado pela Requerida):

 

5.1.1.     A Requerente é proprietária do prédio urbano sito na Rua …, nº…, em Lisboa, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o número…, e inscrito na matriz predial urbana de Lisboa, concelho de Lisboa, freguesia de …, sob o artigo matricial …, conforme cópia da Caderneta Predial Urbana, anexada com o pedido (doc. nº 1).

5.1.2.     O referido prédio urbano encontra-se constituído em regime de propriedade vertical (ou total), sendo composto por 7 pisos (cave, rés-do-chão e cinco pisos), num total de catorze andares ou divisões susceptíveis de utilização independente, destinando-se todas, à data a que se reportam as liquidações de imposto, a habitação, conforme cópia da Caderneta Predial Urbana, anexada com o pedido (doc. nº 1).

5.1.3.     O VPT total do referido prédio urbano era, em 2015, de EUR 1.705.713,11, determinado no âmbito de avaliação realizada em 20 de Maio de 2010, conforme cópia da Caderneta Predial Urbana, anexada com o pedido (doc. nº 1).

5.1.4.     O VPT de cada uma das divisões (ou partes susceptíveis de utilização independente) destinadas à habitação, incluídas nas notas de liquidação de Imposto do Selo, relativo ao ano de 2015, situava-se entre os
EUR 114.943,53 (valor atribuído ao andar denominado por “5 ESQ”) e os EUR 126.794,68 (valor atribuído ao andar denominado por “4 ESQ”), conforme cópia da Caderneta Predial Urbana, anexada com o pedido (doc. nº 1).

5.1.5.     A Requerente foi notificada das notas de cobrança para pagamento das três prestações relativas às liquidações de Imposto do Selo nº 2015… a 2015…, datadas de 5 de Abril de 2016, referentes ao ano 2015 (cuja data limite de pagamento era, respectivamente, “Abril/2016”, “Julho/2016” e “Novembro/2016”), respeitantes ao imóvel acima identificado (vide pontos 5.1.1. e 5.1.2.), conforme cópias dos respectivos documentos de cobrança anexados com o pedido (docs. nº 3 a 16, 17 a 30 e 31 a 44, relativos às primeiras, segundas e terceiras prestações do imposto, respectivamente, e processo administrativo anexado pela Requerida) [os montantes estão expressos em Euro (EUR)]:

 

 

IDENTIFICAÇÃO NOTAS DE COBRANÇA DE IMPOSTO DO SELO RELATIVO AO ANO 2015

Nº DOCUMENTO

ANDAR

VPT

COLECTA

PRESTAÇÃO

DOC. ANEXO AO PEDIDO

2016 …

CV DT

117.848,43

1.178,48

392,84

3

2016 …

392,82

30

2016 …

392,82

36

2016 …

CV ESQ

118.532,55

1.185,33

395,11

4

2016 …

395,11

29

2016 …

395,11

38

2016 …

RC DT

121.037,50

1.210,38

403,46

6

2016 …

403,46

27

2016 …

403,46

37

2016 …

RC ESQ

119.721,88

1.197,22

399,08

5

2016 …

399,07

28

2016 …

399,07

39

2016 …

1 DT

122.363,65

1.223,64

407,88

7

2016 …

407,88

26

2016 …

407,88

31

2016 …

1 ESQ

124.352,88

1.243,53

414,51

8

2016 …

414,51

25

2016 …

414,51

44

2016 …

2 DT

123.563,50

1.235,64

411,88

9

2016 …

411,88

24

2016 …

411,88

32

2016 …

2 ESQ

125.573,78

1.255,74

418,58

10

2016 …

418,58

23

2016 …

418,58

43

2016 …

3 DT

123.563,50

1.235,64

411,88

11

2016 …

411,88

22

2016 …

411,88

33

2016 …

3 ESQ

125.573,78

1.255,74

418,58

12

2016 …

418,58

21

2016 …

418,58

41

2016 …

4 DT

124.763,35

1.247,63

415,89

13

2016 …

415,87

20

2016 …

415,87

34

2016 …

4 ESQ

126.794,68

1.267,95

422,65

14

2016 …

422,65

19

2016 …

422,65

42

2016 …

5 DT

117.080,10

1.170,80

390,28

15

2016 …

390,26

18

2016 …

390,26

35

2016 …

5 ESQ

114.943,53

1.149,44

383,16

16

2016 …

383,14

17

2016 …

383,14

40

TOTAL

1.705.713,11

17.057,16

 

 

 

 

5.1.6.     Para efeitos de determinação da incidência de Imposto do Selo da verba 28 sobre diversas partes autónomas do imóvel (acima identificadas), foi considerado pela Requerida (i) o somatório do VPT de todas as catorze divisões ou andares susceptíveis de utilização independente com afectação habitacional (o qual ascendia, em 31 de Dezembro de 2015, a
EUR 1.705.713,11) e (ii) a afectação habitacional das referidas partes autónomas.

5.1.7.     Para efeitos de liquidação do imposto, a Requerida aplicou a taxa de 1% de Imposto do Selo sobre o VPT individual de cada uma das fracções (todas destinadas à habitação) acima identificadas no ponto 5.1.5.

5.1.8.     A Requerente efectuou o pagamento das notas de cobrança acima identificadas no ponto 5.1.5., em 28 de Abril de 2016, em 22 e 26 de Julho de 2016 e 27 de Novembro de 2016, respectivamente, conforme cópias dos respectivos documentos de transferência bancária anexados com o pedido (docs. nº 45 a 58 e 59 a 72, relativos ao pagamento das primeiras e segundas prestações do imposto) e cópias dos respectivos documentos de transferência bancária, anexados com o requerimento apresentado em 23 de Março de 2017, relativos ao pagamento das terceiras prestações do imposto).

 

5.2.    Não se provaram quaisquer outros factos passíveis de afectar a decisão de mérito do pedido.

 

Dos factos não provados

 

5.3.    Não se verificaram quaisquer factos como não provados com relevância para a decisão arbitral.

 

6.             MATÉRIA DE DIREITO

 

6.1.    No caso em análise, cumpre agora proceder à análise da factualidade dada como provada de modo a aferir da (i)legalidade das liquidações de Imposto do Selo, respeitantes ao ano de 2015, objecto do pedido, tendo em consideração os argumentos apresentados pela Requerente de que “(…) as liquidações (…) identificadas incorrem nos (…) vícios (…) de falta de fundamentação” e de “erro nos pressupostos da aplicação da verba 28 da TGIS, “fundamentos pelos quais se requer (…) que as referidas liquidações sejam declaradas ilegais e, consequentemente, anuladas ordenando-se a final o reembolso do imposto pago, acrescido de juros indemnizatórios” (sublinhado nosso).

 

6.2.    Nesta conformidade, será importante dar resposta à seguinte questão de direito controvertida (subjacente ao pedido de pronúncia arbitral):

 

6.2.1.     A sujeição a Imposto do Selo, nos do disposto na verba nº 28.1. da TGIS (em vigor à data a que se reportam as liquidações objecto do pedido), era determinada pelo VPT que corresponde a cada uma das partes do prédio com afectação habitacional ou se, pelo contrário, era determinada pelo VPT global do prédio, o qual corresponderia à soma de todos os VPT dos andares (com aquele tipo de afectação), que dele fazem parte?

 

Do alegado erro nos pressupostos da aplicação da verba 28 da TGIS

 

6.3.       Neste âmbito, a Requerente defende que “conforme resulta da verba 28 do Código do Imposto do Selo, o mesmo incide sobre a propriedade, usufruto ou direito de superfície de prédios ou terrenos para construção cujo valor patrimonial tributário constante da matriz, nos termos do Código do IMI, seja igual ou superior a
€ 1.000.000
”, sendo que “no caso em apreço encontramo-nos, à data da liquidação, perante um prédio em propriedade total com andares ou divisões suscetíveis de utilização independente” (sublinhado nosso).

 

6.4.       Ora, entende a Requerente que, “nos termos do n.º 3 do artigo 12.º do Código do IMI, cada andar ou parte de prédio suscetível de utilização independente é considerado separadamente na inscrição matricial, a qual discrimina também o respetivo valor patrimonial tributário”, sendo que “da análise do acervo normativo aqui em causa não resulta qualquer disposição legal que faça corresponder o valor patrimonial tributário de um prédio composto por vários andares ou divisões suscetíveis de utilização independente à soma das respetivas partes”.

 

6.5.       Assim, entende a Requerente que “a AT introduziu nas liquidações uma distinção que o legislador não introduziu em qualquer parte da legislação, inexistindo assim base legal para a AT proceder à referida interpretação da verba 28 da TGISpelo que conclui que “(…) as liquidações em crise estão feridas de vício de violação de lei por erro nos pressupostos de aplicação da verba 28.1 da TGIS devendo, consequentemente, ser declaradas ilegais e anuladas, ordenando-se o reembolso dos montantes já pagos, acrescido de juros indemnizatórios (…)” (sublinhado nosso).

 

6.6.       Por outro lado, entende a Requerida que “carece (…) de sustentação legal a tese defendida pelo Requerente” porquanto “(…) embora a liquidação do IS, nas situações previstas na verba nº 28.1 da TGIS, se processe de acordo com as regras do CIMI, a verdade é que o legislador ressalva os aspetos que careçam das devidas adaptações (…) como é o caso dos prédios em propriedade total, ainda que com andares ou divisões suscetíveis de utilização independente (muito embora o IMI seja liquidado relativamente a cada parte suscetível de utilização independente) para efeitos de IS releva o prédio na sua totalidade pois que, as divisões suscetíveis de utilização independente não são havidas como prédio, mas apenas as frações autónomas no regime de propriedade horizontal (…)” (sublinhado nosso).

 

6.7.       Assim, entende a Requerida que “o que (…) resulta da letra da lei é que o legislador quis tributar (…) os prédios enquanto uma única realidade jurídico tributária (…)”, pelo que as liquidações impugnadas “(…) resultam da aplicação direta da norma legal, que se traduz em elementos objetivos, sem qualquer apreciação subjetiva ou discricionária” pelo que, “em consonância, estando correta a liquidação e sendo devido o imposto apurado, não são devidos quaisquer juros (moratórios ou indemnizatórios), desde logo por não existir qualquer erro imputável aos serviços, que se limitaram a atuar (…) no estrito cumprimento da norma legal” (sublinhado nosso).

 

6.8.       Ora, para efeitos de responder à questão acima enunciada no ponto 6.2.1., será importante analisar, desde já, as alterações decorrentes da Lei nº 55-A/2012, de 29 de Outubro (ou seja, o aditamento à TGIS da verba 28) e da Lei nº 83-C/2013 de 31 de Dezembro, porquanto aquele diploma “introduziu um conjunto de alterações nos diplomas codificadores de três impostos – IRS, IRC e Imposto do Selo – assim como na Lei Geral Tributária, entre as quais a norma em análise, todas norteadas à obtenção suplementar de receita fiscal e, em geral, a contrariar o desequilíbrio orçamental”. [4] [5]

 

6.9.       Com efeito, em 2012, “invocando os princípios da equidade social e justiça fiscal, foi agravada a tributação dos rendimentos de capitais e das mais-valias mobiliárias (…)”, tendo sido introduzidas “(…) medidas de reforço de combate à fraude e evasão fiscal (…) a que se somou a introdução, no âmbito do Imposto do Selo, da tributação de situações jurídicas (…), que se entendeu capazes de suportar esforço fiscal acrescidos, distribuindo desse modo mais equitativamente o sacrifício para atingir a consolidação orçamental exigido aos contribuintes” (sublinhado nosso).[6]

 

6.10.   E, se dúvidas houve quanto à alegada inconstitucionalidade da verba 28 da TGIS, por alegada violação dos princípios da proporcionalidade, da igualdade e da capacidade contributiva, o Tribunal Constitucional já se pronunciou sobre esta matéria, nomeadamente, no âmbito do Acórdão de 11 de Novembro de 2015 (processo nº 542/14), nos termos do qual decidiu “(…) não julgar inconstitucional a norma da verba 28. e 28.1 da Tabela Geral do Imposto do Selo, aditada pelo artigo 4º da Lei nº 55-A/20121, de 29 de outubro, na medida em que impõe a tributação anual sobre a propriedade de prédios urbanos com afectação habitacional, cujo valor patrimonial tributário seja igual ou superior a € 1.000.000,00”, “não se verificando a violação de parâmetros de constitucionalidade (…), nem quaisquer outros (…)” (sublinhado nosso).[7] [8]

 

6.11.  Assim, conforme acima já referido, importa analisar a essência da verba nº 28 da TGIS (aditada pelo artigo 4º da Lei nº 55-A/2012, de 29 de Outubro, em vigor desde 30 de Outubro de 2012 e alterada pelo artigo 194º da Lei nº 83º-C/2013, de 31 de Dezembro), em vigor à data a que se reportam as liquidações de Imposto do Selo em crise (ano 2015) porquanto, apesar de aquele diploma não ter procedido à qualificação dos conceitos que constavam da referida verba nº 28, nomeadamente, do conceito de “prédio com afectação habitacional”, se for observado o disposto no artigo 67º, nº 2, do Código do Imposto do Selo (também aditado pela referida Lei nº 55-A/2012), verifica-se que "às matérias não reguladas no presente Código respeitantes à verba 28 da TGIS se aplica, subsidiariamente, o Código do IMI”.

 

6.12.  Ora, da leitura do Código do IMI, facilmente é perceptível que o conceito de “prédio com afectação habitacional” remetia para o conceito de “prédio urbano”, definido nos termos dos artigos 2º e 4º daquele Código.[9]

 

6.13.  Com efeito, de acordo com o disposto no artigo 2º, nº 1 do Código do IMI, “para efeitos do presente Código, prédio é toda a fracção de território, abrangendo as águas, plantações, edifícios e construções de qualquer natureza nela incorporados ou assentes, com carácter de permanência, desde que faça parte do património de uma pessoa singular ou colectiva e, em circunstâncias normais, tenha valor económico, bem como as águas, plantações, edifícios ou construções, nas circunstâncias anteriores, dotados de autonomia económica em relação ao terreno onde se encontrem implantados, embora situados numa fracção de território que constitua parte integrante de um património diverso ou não tenha natureza patrimonial” (sublinhado nosso).

 

6.14.  Ainda de acordo com o nº 2 e o nº 3 do mesmo artigo, “os edifícios ou construções, ainda que móveis por natureza, são havidos como tendo carácter de permanência quando afectos a fins não transitórios”, presumindo-se “o carácter de permanência quando os edifícios ou construções estiverem assentes no mesmo local por um período superior a um ano”.

 

6.15.  Para efeitos de IMI, “cada fracção autónoma, no regime de propriedade horizontal, é havida como constituindo um prédio” e, de acordo com o disposto no artigo 4º do Código daquele imposto “prédios urbanos são todos aqueles que não devam ser classificados como rústicos (…)” (sublinhado nosso).

 

6.16.  Entre as várias espécies de “prédios urbanos” referidos no artigo 6º do Código do IMI, estão expressamente mencionados os “prédios urbanos habitacionais” [nº1, alínea a)], acrescentando o nº 2 do mesmo artigo que estes "são os edifícios ou construções para tal licenciados ou, na falta de licença, que tenham como destino normal cada um destes fins".

 

6.17.  Por outro lado, se é certo que o nº 4 do artigo 2º do Código do IMI refere que "para efeitos deste imposto, cada fracção autónoma, no regime de propriedade horizontal, é havida como constituindo um prédio" também é certo que não há nada na lei que aponte para a discriminação entre prédios em propriedade horizontal e prédio em propriedade vertical no que se refere à sua identificação como “prédios urbanos habitacionais”.

 

6.18.  Assim, daqui pode concluir-se que as partes autónomas de prédios em propriedade vertical, com afectação habitacional, devem ser consideradas como “prédios urbanos habitacionais”.

 

6.19.  Conforme defendido em diversas Decisões Arbitrais, nomeadamente, na que foi proferida no âmbito do Processo nº 88/2013-T, “na óptica do legislador, não importa o rigor jurídico-formal da situação concreta do prédio mas sim a sua utilização normal, o fim a que se destina”, pelo que, “há assim que concluir que para o legislador é irrelevante que o prédio esteja constituído em propriedade vertical ou em propriedade horizontal, relevando apenas a verdade material subjacente à sua existência enquanto prédio urbano e à sua utilização” (sublinhado nosso).

 

6.20.  Com efeito, na interpretação do texto legal, não faz sentido distinguir aquilo que a própria lei não distingue porquanto distinguir, neste contexto, entre prédios constituídos em propriedade horizontal e prédios constituídos em propriedade total seria uma "inovação" sem um suporte legal associado.

 

6.21.   Na verdade, nem na verba nº 28 da TGIS, nem no disposto no Código do IMI, nada indicia uma justificação para essa diferenciação sendo hoje entendimento pacífico que as leis fiscais se interpretam através da determinação do seu verdadeiro sentido, apurado de acordo com as técnicas e elementos interpretativos geralmente aceites pela doutrina [cfr. artigo 9º do Código Civil e artigo 11º da Lei Geral Tributária (LGT)].[10] [11]

 

6.22.   Por outro lado, é necessário ter também em consideração que as normas de incidência dos tributos devem ser interpretadas nos seus exactos termos, sem o recurso à analogia, tornando prevalente a certeza e a segurança na sua aplicação.[12]

 

6.23.   Nestes termos, o critério uniforme que se impõe é o que determina que a incidência do preceituado na norma em causa (verba 28 da TGIS) apenas tenha lugar quando alguma das partes, andares ou divisões com utilização independente de prédio em propriedade horizontal (ou total), com afectação habitacional, possua um VPT superior a EUR 1.000.000,00.

 

6.24.   Assim “se o critério legal impõe a emissão de liquidações individualizadas para as partes autónomas dos prédios em propriedade vertical, nos mesmos moldes em que o estabelece para os prédios em propriedade horizontal, claramente estabeleceu um critério, que tem de ser único e inequívoco, para a definição da regra de incidência da verba 28.1. da TGIS[13], pelo que fixar como valor de referência para esse objectivo, o VPT global do prédio em causa (como pretende a Requerida), não encontra base na legislação aplicável (sublinhado nosso).[14]

 

6.25.   Por último, importará ainda reforçar qual a ratio legis subjacente à regra da verba 28 da TGIS (em vigor à data das liquidações em crise), em obediência ao disposto no artigo 9º do Código Civil[15], tendo em consideração as circunstâncias em que a norma foi elaborada, bem como as condições específicas do tempo em que a mesma foi e é aplicada.

 

6.26.   Com efeito, à data das alterações introduzidas pela legislação já referida, o legislador pretendeu introduzir um princípio de tributação sobre a riqueza exteriorizada na propriedade, usufruto ou direito de superfície de prédios urbanos de luxo com afectação habitacional, tendo considerado, como elemento determinante da capacidade contributiva, os prédios urbanos, com afectação habitacional, de elevado valor (de luxo), ou seja, de valor igual ou superior a EUR 1.000.000,00, sobre os quais passaria a incidir uma taxa especial de Imposto do Selo.

 

6.27.   Na verdade, entendemos ser isso mesmo que se pode concluir da análise da discussão da proposta de Lei nº 96/XII na Assembleia da República[16], não se vislumbrando a invocação de uma ratio interpretativa distinta da aqui apresentada.[17]

 

6.28.   Com efeito, a fundamentação da medida designada por “taxa especial sobre os prédios urbanos habitacionais de mais elevado valorassenta pois, como vimos, na invocação dos princípios da equidade social e da justiça fiscal, chamando a contribuir de uma forma mais intensa os titulares de propriedades de elevado valor destinadas a habitação, fazendo assim incidir a nova taxa especial sobre as “casas de valor igual ou superior a 1 milhão de euros”.

 

6.29.   Ora, se tal lógica parece fazer sentido quando aplicada a uma “habitação (seja ela uma casa, uma fracção autónoma, uma parte de prédio com utilização independente ou uma unidade autónoma) sempre que a mesma representar, por parte do seu titular, uma capacidade contributiva acima da média (e, nessa medida, susceptível de determinar um contributo especial para garantir a justa repartição do esforço fiscal), já não faria qualquer sentido se aplicada “unidade a unidade” para, através do somatório dos VPT individuais das mesmas (porque detidas pelo mesmo indivíduo), apurar o tal valor igual ou superior a um milhão de euros.

 

6.30.   Acresce ainda que, admitir a diferenciação de tratamento poderia produzir resultados incompreensíveis e discriminatórios do ponto de vista jurídico, porquanto contrários aos objectivos (de promoção da equidade social e da justiça fiscal) que o legislador defendia ter ao aditar a referida verba nº 28 à TGIS.

 

6.31.   Assim, a existência de um prédio em propriedade vertical ou horizontal não pode, por si só, ser indiciador de capacidade contributiva, decorrendo da lei que uns e outros devem receber o mesmo tratamento fiscal em obediência aos princípios da justiça, da igualdade fiscal e da verdade material.

 

6.32.   Inversamente, a existência em cada prédio de habitações independentes, em regime de propriedade horizontal ou vertical, pode ser suscetível de desencadear a incidência do novo imposto se o VPT de cada uma das partes ou fracção for igual ou superior ao limite definido pela lei, ou seja, a EUR 1.000.000,00.

 

6.33.   Neste sentido se pronunciou o Acórdão do STA nº 0560/16, de 29 de Setembro de 2016, no sentido que “relativamente aos prédios em propriedade vertical, para efeitos de incidência do Imposto do Selo (Verba 28.1 da TGIS, na redacção da Lei n.º 55-A/2012, de 29 de Outubro), a sujeição é determinada pela conjugação de dois factores: a afectação habitacional e o VPT constante da matriz igual ou superior a
€ 1.000.000
. Tratando-se de um prédio constituído em propriedade vertical, a incidência do IS deve ser determinada, não pelo VPT resultante do somatório do VPT de todas as divisões ou andares susceptíveis de utilização independente (individualizadas no artigo matricial), mas pelo VPT atribuído a cada um desses andares ou divisões destinadas a habitação
” (sublinhado nosso).[18]

 

6.34.   No caso em análise, se o prédio identificado nos autos se encontrasse em regime de propriedade horizontal, era claro que nenhuma das divisões habitacionais passíveis de utilização independente, que dele fazem parte, estaria sujeita à incidência do novo imposto, porquanto em nenhuma delas o VPT, individualmente considerado, ultrapassa o limite de EUR 1.000.000,00 definido pela lei (vide ponto 5.1.4., supra).

 

6.35.   Será por isso mesmo, que o artigo 12º, nº 3 do Código do IMI dispõe que “cada andar ou parte de prédio suscetível de utilização independente é considerado separadamente na inscrição matricial a qual discrimina igualmente o respectivo VPT” para não gerar situações de violação dos princípios da equidade social e da justiça fiscal (sublinhado nosso).

 

6.36.   Dado que a constituição da propriedade horizontal implica uma mera alteração jurídica do prédio, não impondo sequer uma nova avaliação, será a verdade material a que se impõe como critério determinante da capacidade contributiva e não a mera realidade jurídico-formal do prédio pelo que, em consequência, a discriminação operada pela Requerida traduz-se numa discriminação arbitrária e ilegal.[19]

 

6.37.   E, tendo em conta toda a realidade social e económica muitas vezes subjacente em muitos dos prédios em propriedade vertical, o próprio legislador fiscal no Código do IMI tratou as duas situações (propriedade horizontal e vertical) de forma equitativa, aplicando os mesmos critérios.

 

6.38.   Com efeito, analisando a situação sub judice, e como já referido no ponto 6.34., supra, constata-se que o VPT das unidades autónomas com afectação habitacional no imóvel acima descrito (ponto 5.1.1. e 5.1.2., supra) varia, para o ano de 2015, entre o valor mais baixo de EUR 114.943,53 (valor atribuído ao andar denominado por “5 ESQ”) e o valor mais alto de EUR 126.794,68 (valor atribuído ao andar denominado por “4 ESQ”) pelo que, em qualquer um deles, individualmente considerado, o referido VPT é sempre inferior a EUR 1.000.000,00.

 

6.39.   Assim, face ao acima exposto, a resposta a dar à questão acima colocada (vide ponto 6.2.1.) será a de que a sujeição a Imposto do Selo, para efeitos da verba 28º da TGIS, era determinada pelo VPT que corresponde a cada uma das partes do prédio com afectação habitacional e não pelo VPT global do prédio, pelo que será de concluir que sobre os andares com afectação habitacional (do prédio identificado nos autos) não pode incidir o Imposto do Selo a que se refere a verba nº 28 da TGIS (em vigor à data a que se reportam os actos tributários), sendo assim ilegais as liquidações de Imposto do Selo, relativas ao ano de 2015, objecto do pedido de pronúncia arbitral apresentado pela Requerente, com fundamento em vício de violação de lei, por erro nos pressupostos de direito. [20][21]

 

Do alegado vício da falta de fundamentação

 

6.40.  Ora, tendo em consideração que “o julgador não tem que analisar e a apreciar todos os argumentos, todos os raciocínios, todas as razões jurídicas invocadas pelas partes em abono das suas posições”, e em face da resposta dada à questão central a decidir (vide acima ponto 6.2.1. e ponto anterior), no sentido de declarar ilegais as liquidações de Imposto do Selo, relativas ao ano de 2015, objecto do pedido de pronúncia arbitral apresentado pela Requerente, com fundamento em vício de violação de lei, por erro nos pressupostos de direito, entende este Tribunal Arbitral que, em consequência, fica prejudicada a análise do alegado vício de falta de fundamentação das liquidações de Imposto do Selo em crise.[22]

 

Do reembolso do imposto pago com juros indemnizatórios

 

6.41.  No que diz respeito ao pagamento de juros indemnizatórios, de acordo com o disposto no nº 5, do artigo 24.º do RJAT “é devido o pagamento de juros, independentemente da sua natureza, nos termos previsto na lei geral tributária e no Código de Procedimento e de Processo Tributário”, daqui resultando que uma decisão arbitral não se limita à apreciação da legalidade do acto tributário.

 

6.42.  De igual modo, de acordo com o disposto no artigo 24º, nº 1, alínea b) do RJAT, deverá ser entendido que o pedido de juros indemnizatórios é uma pretensão relativa a actos tributários (v.g. de liquidação), que visa explicitar/concretizar o conteúdo do dever de “restabelecer a situação que existiria se o acto tributário objecto da decisão arbitral não tivesse sido praticado, adoptando os actos e operações necessários para o efeito”.

 

6.43.  Como refere Jorge Lopes de Sousa “insere-se nas competências dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD a fixação dos efeitos da decisão arbitral que podem ser definidos em processo de impugnação judicial, designadamente, a anulação dos actos cuja declaração de ilegalidade é pedida, a condenação da Autoridade Tributária e Aduaneira no pagamento de juros indemnizatórios (…)” (sublinhado nosso).[23] [24]

 

6.44.  Assim, nos processos arbitrais tributários pode haver lugar ao pagamento de juros indemnizatórios, nos termos do disposto nos artigos 43º, nºs 1 e 2, e 100º da LGT, quando se determine que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido.

 

6.45.  Nestes termos, o direito a juros indemnizatórios dependerá sempre da verificação de um erro imputável aos serviços da Requerida, do qual tenha resultado um pagamento de dívida tributária em montante superior ao legalmente devido.

 

6.46.  Na sequência da declaração de ilegalidade dos actos de liquidação de Imposto do Selo acima já identificados (vide ponto 6.39.) e, nos termos do disposto na alínea b), do nº 1, do artigo 24º do RJAT (em conformidade com o que aí se estabelece), “a decisão arbitral sobre o mérito da pretensão de que não caiba recurso ou impugnação vincula a administração tributária a partir do termo do prazo previsto para o recurso ou impugnação, devendo esta restabelecer a situação que existiria se o acto tributário objecto da decisão arbitral não tivesse sido praticado, adoptando os actos e operações necessários para o efeito”, pelo que terá de haver lugar ao reembolso dos montantes pagos pela Requerente, relativos ao Imposto do Selo do ano de 2015, como forma de se alcançar a reconstituição da situação que existiria se não tivesse sido cometida a ilegalidade.

 

6.47.  Assim, face ao estabelecido no artigo 61º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), estando preenchidos os requisitos do direito a juros indemnizatórios (ou seja, verificada a existência de erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido, tal como previsto no nº 1, do artigo 43º da LGT), a Requerente terá direito a juros indemnizatórios, à taxa legal, calculados sobre as quantias pagas, no âmbito das liquidações de Imposto do Selo respeitantes ao ano de 2015 (objecto do pedido de pronúncia arbitral), os quais serão contados de acordo com o disposto no nº 3 do artigo 61º do CPPT, ou seja, desde a data do pagamento do imposto indevido até à data da emissão da respectiva nota de crédito.

 

 

Da responsabilidade pelo pagamento das custas arbitrais

 

6.48.  De harmonia com o disposto no artigo 22º, nº 4, do RJAT, “da decisão arbitral proferida pelo tribunal arbitral consta a fixação do montante e a repartição pelas partes das custas directamente resultantes do processo arbitral”.

 

6.49.  Assim, nos termos do disposto no artigo 527º, nº 1 do CPC (ex vi 29º, nº 1, alínea e) do RJAT), deve ser estabelecido que será condenada em custas a Parte que a elas houver dado causa ou, não havendo vencimento da acção, quem do processo tirou proveito.

 

6.50.  Neste âmbito, o nº 2 do referido artigo concretiza a expressão “houver dado causa”, segundo o princípio do decaimento, entendendo que dá causa às custas do processo a parte vencida, na proporção em que o for.

 

6.51.  No caso em análise, tendo em consideração o acima exposto, a responsabilidade integral pelas custas deste processo deve ser atribuída à Requerida, de acordo com o disposto no artigo 12º, nº 2 do RJAT e artigo 4º, nº 4 do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária.

 

7.          DECISÃO

 

7.1.    Tendo em consideração a análise efectuada, decidiu este Tribunal Arbitral:

 

7.1.1.     Julgar procedente o pedido de pronúncia arbitral, condenando a Requerida quanto ao pedido de declaração de ilegalidade das liquidações de Imposto do Selo, datadas de 5 de Abril de 2016, com fundamento em vício de violação de lei, por erro nos pressupostos de direito, anulando-se os respectivos actos tributários de liquidação de imposto identificados, com a consequente devolução das quantias indevidamente pagas, acrescidas de juros indemnizatórios à taxa legal, contados nos termos legais;

7.1.2.     Condenar a Requerida no pagamento integral das custas do presente processo.

 

*****

 

Valor do processo: Tendo em consideração o disposto nos artigos 306º, nº 2 do CPC, artigo 97º-A, nº 1 do CPPT e no artigo 3º, nº 2 do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se o valor do processo em EUR 17.057,16.

 

Custas do processo: Nos termos do disposto na Tabela I do Regulamento das Custas dos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se o valor das custas do Processo Arbitral em EUR 1.224,00, a cargo da Requerida, de acordo com o artigo 22º, nº 4 do RJAT.

 

*****

Notifique-se.

 

Lisboa, 20 de Abril de 2017

 

O Árbitro

 

 

Sílvia Oliveira

 



[1] A redacção da presente decisão rege-se pela ortografia anterior ao Acordo Ortográfico de 1990, excepto no que diz respeito às transcrições efectuadas.

[2] E, neste sentido, referência também o acórdão do STA de 22-11-2000 (processo nº 25389).

[3] Neste âmbito, refira-se que da análise do processo decorre que o pedido de pronúncia arbitral têm, expressamente, como objecto os actos de liquidação do Imposto de Selo identificados, referentes ao ano de 2015 (datados de 5 de Abril de 2016), decorrentes da aplicação da verba 28.1 da Tabela Geral do Imposto de Selo (TGIS), relativamente ao prédio urbano identificado nos autos, no montante total de EUR 17.057,16, sendo peticionada a declaração de ilegalidade das referidas liquidações (e consequentemente a anulação das mesmas), com fundamento na alegada falta de fundamentação dos actos tributários e em alegado erro nos pressupostos de aplicação da referida verba 28 da TGIS.

Assim sendo, foi analisado o momento do início da contagem do prazo para a dedução do pedido de pronúncia arbitral relativo ao pedido de anulação das liquidações de Imposto do Selo identificadas, tendo em consideração que o disposto no 10º, nº 1, alínea a) do RJAT (relativamente a actos de liquidação de imposto), remete (no que concerne ao início da contagem do prazo) para o estabelecido nos nºs 1 e 2 do artigo 102º do CPPT (ou seja, a contagem do prazo tem início no dia seguinte ao “termo do prazo para pagamento voluntário das prestações tributárias legalmente notificadas ao contribuinte”).

Ora, no caso em análise, temos liquidações de Imposto do Selo a pagar em três prestações (ou seja, até ao final dos meses de Abril, Julho e Novembro de 2016), sendo que este pagamento em prestações não é mais do que uma técnica de arrecadação do imposto e não um pagamento parcial propriamente dito.

Nestes termos, para efeitos de contagem do prazo previsto no artigo 10º do RJAT, este deverá ser aferido em função do “termo do prazo para pagamento de cada um das prestações tributários legalmente notificadas” e, dado que a lei não compreende a impugnação autónoma de cada uma das prestações de imposto em causa, à data da apresentação do pedido de pronúncia arbitral (31 de Outubro de 2016) estava ainda em curso o prazo de 90 dias (previsto no artigo 10º do RJAT), a contar do dia seguinte ao termo do prazo para pagamento da segunda prestação (31 de Julho de 2016) de imposto relativo a cada uma das liquidações de Imposto do Selo em crise, pelo que se conclui que o pedido arbitral é tempestivo.

[4] De acordo com o disposto no artigo 4º da Lei nº 55-A/2012, de 29 de Outubro, foi aditada a verba 28 da TGIS nos seguintes termos (negrito nosso):

“28. Propriedade, usufruto ou direito de superfície de prédios urbanos cujo VPT constante da matriz, nos termos do Código do IMI, seja igual ou superior a EUR 1.000.000,00 – sobre o VPT para efeito de IMI:

28.1 - Por prédio com afectação habitacional - 1%.

28.2 - Por prédio, quando os sujeitos passivos que não sejam pessoas singulares sejam residentes em país, território ou região sujeito a um regime fiscal claramente mais favorável, constante da lista aprovada por portaria do Ministro das Finanças - 7,5%".

Com as alterações introduzidas pelo artigo 194º da Lei nº 83º-C/2013, de 31 de Dezembro, a verba 28 e a verba 28.1. passaram a ter a seguinte redacção:

28. Propriedade, usufruto ou direito de superfície de prédios urbanos cujo valor patrimonial tributário constante da matriz, nos termos do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (CIMI), seja igual ou superior a (euro) 1 000 000 - sobre o valor patrimonial tributário utilizado para efeito de IMI:

28.1. Por prédio com afectação habitacional ou por terreno para construção cuja edificação, autorizada ou prevista, seja para habitação, nos termos do disposto no Código do IMI – 1%”.

[5] Vide Acórdão do Tribunal Constitucional nº 590/2015, de 11 de Novembro (processo nº 542/14) - ponto 9.

[6] Vide nota de rodapé anterior.

[7] E já se referindo às alterações introduzidas pela Lei nº 83-C/20123 de 31 de Dezembro.

[8] Com efeito, conclui o Tribunal Constitucional que “(…) a verba 28 da TGIS não enferma de nenhuma inconstitucionalidade, inexistindo qualquer violação dos princípios constitucionais conformadores da lei fiscal, especificamente, dos princípios da igualdade fiscal, da capacidade contributiva e da proporcionalidade (…)” (sublinhado nosso).

[9] Na verdade, tendo em consideração que o conceito de “prédio (urbano) com afectação habitacional” não foi definido nem pelo legislador, nem pelo texto da Lei nº 55-A/2012 (que o introduziu), nem pelo Código do IMI, para o qual o nº 2 do artigo 67º do Código do Imposto do Selo (igualmente introduzido por aquela Lei) remete a título subsidiário, teve uma vida bastante curta, dado que tal conceito foi abandonado aquando da entrada em vigor da Lei do Orçamento do Estado para 2014 (em vigor desde 1 de Janeiro de 2014 e, por isso, em vigor à data das liquidações de imposto objecto do pedido arbitral), a qual deu nova redacção àquela verba nº 28.1. da TGIS, nos termos da qual se recorta o seu âmbito de incidência objectiva através da utilização de conceitos que se encontram legalmente definidos no artigo 6º do Código do IMI.

[10] Neste âmbito, atente-se no disposto no artigo 12º, nº 3, do Código do IMI, ao referir que “cada andar ou parte de prédio susceptível de utilização independente é considerado separadamente na inscrição matricial, a qual discrimina também o respectivo VPT”.

[11] Neste sentido, vide AC TCAS Processo 07648/14, de 10 de Julho de 2014.

[12] Cfr. AC TCAS processo 5320/12, de 2 de Outubro de 2012, AC TCAS processo 7073/13, de 12 de Dezembro de 2013 e AC TCAS 2912/09, de 27 de Março de 2014.

[13] Vide Decisão Arbitral nº 50/2013-T, de 29 de Outubro de 2013.

[14] Que é o Código do IMI, dada a remissão feita pelo citado artigo 67º, nº 2, do Código do Imposto do Selo.

[15] Segundo o qual a interpretação da norma jurídica não deve cingir-se à letra da lei, mas reconstituir o pensamento legislativo, a partir dos textos e dos restantes elementos de interpretação, tendo em conta a unidade do sistema jurídico.

[16] Disponível para consulta no Diário da Assembleia da República, I série, nº 9/XII/2, de 11 de Outubro de 2012.

[17] Conforme já referido em diversas Decisões Arbitrais emitidas pelo CAAD (vide processo nº 48/2013-T e processo nº 50/2013-T).

[18] Neste sentido, cfr. Acórdão do STA de 9 de Setembro de 2015 (rec. nº 047/15), secundado pelos Acórdãos do STA de 27 de Abril de 2016 (rec. nº 1534/15), de 24 de Maio de 2016 (recs. nºs 1344/15 e 1352/15), de 4 de Maio de 2016, (recs. nºs 166/16, 1504/15 e 172/16) e de 29 de Junho de 2016 (rec. nº 408/15).

[19] Uma vez que a lei não impõe a obrigação de constituição do prédio em regime de propriedade horizontal.

[20] Neste sentido, vide nomeadamente, Decisão Arbitral nº 368/2014-T, de 18 de Dezembro de 2014, emitida pela signatária.

[21] Neste sentido, se pronunciou também o Acórdão do STA nº 01354/15, de 2 de Março de 2016, nos termos já referidos para o Acórdão do STA nº 0560/16, de 29 de Setembro de 2016 (vide ponto 7.38., supra).

[22] Neste sentido, vide Acórdão do STJ nº 05S2137, de 29 de Novembro de 2005, nos termos do qual se cita Alberto dos Reis [inCódigo de Processo Civil Anotado, Volume V”, Coimbra Editora, 1981 (reimpressão), página 143], autor que defendia que “há que não confundir questões suscitadas pelas partes com motivos ou argumentos por elas invocados para fazerem valer as suas pretensões. São, na verdade, coisas diferentes: deixar de conhecer de questão de que devia conhecer-se, e deixar de apreciar qualquer consideração, argumento ou razão produzida pela parte. Quando as partes põem ao tribunal determinada questão, socorrem-se, a cada passo, de várias razões ou fundamentos para fazer valer o seu ponto de vista; o que importa é que o tribunal decida a questão posta; não lhe incumbe apreciar todos os fundamentos ou razões em que elas se apoiam para sustentar a sua pretensão” (sublinhado nosso).

[23] Vide Leite de Campos, Diogo, Silva Rodrigues, Benjamim, Sousa, Jorge Lopes, in “Lei Geral Tributária - Anotada e Comentada”, 4.ª Ed., 2012, página 116).

[24] Sobre a temática dos juros indemnizatórios pode ver-se do mesmo autor (Sousa, Jorge Lopes), Juros nas relações tributárias, in “Problemas fundamentais do Direito Tributário”, Lisboa, 1999, página 155 e sgts).