Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 745/2016-T
Data da decisão: 2017-04-27  IRS  
Valor do pedido: € 22.343,24
Tema: IRS – mais-valias – reinvestimento valor de realização
Versão em PDF


 

Decisão Arbitral [1]

 

 

O Árbitro, Dra. Sílvia Oliveira, designado pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD) para formar o Tribunal Arbitral Singular, constituído em 27 de Fevereiro de 2017, com respeito ao processo acima identificado, decidiu o seguinte:

 

1.       RELATÓRIO

 

1.1.       A…, contribuinte nº… e B…, contribuinte nº …, casados em regime de separação de bens e ambos residentes na Rua do …, nº…, no Porto (doravante designados por “Requerentes”), apresentaram um pedido de pronúncia arbitral e de constituição de Tribunal Arbitral Singular, no dia 16 de Dezembro de 2016, ao abrigo do disposto no artigo 4º e nº 2 do artigo 10º do Decreto-lei nº 10/2011, de 20 Janeiro (RJAT), em que é Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira (doravante designada por “Requerida”).

 

1.2.       Os Requerentes tendo sido notificados do acerto de contas nº 2016… para pagamento, até 23/11/2016, da quantia de EUR 19.843,24 correspondente à liquidação de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS) nº 2016 … (respeitante ao IRS do ano de 2012) e à respectiva liquidação de juros nº 2016…, mas não se conformando com as referidas liquidações, vieram apresentar o presente pedido de pronúncia arbitral tendo em vista a declaração da “(…) ilegalidade e anulação dos actos tributários em crise, com todas as consequências legais, designadamente o reembolso da quantia paga acrescida de juros indemnizatórios, bem como das taxas de justiça e dos honorários suportados pelos Requerentes com o respectivo mandatário”.

 

1.3.    O pedido de constituição do Tribunal Arbitral foi aceite pelo Exmo. Senhor Presidente do CAAD em 19 de Dezembro de 2016 e notificado à Requerida na mesma data.

 

1.4.    O Requerente não procedeu à nomeação de árbitro pelo que, ao abrigo do disposto no artigo 6º, nº 2, alínea a) do RJAT, a signatária foi designada como árbitro pelo Senhor Presidente do Conselho Deontológico do CAAD, em 10 de Fevereiro de 2017, tendo a nomeação sido aceite, no prazo e termos legalmente previstos.

 

1.5.    Na mesma data foram as partes devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a designação do árbitro, nos termos do disposto no artigo 11º, nº 1, alíneas a) e b) do RJAT, conjugado com os artigos 6º e 7º do Código Deontológico.

 

1.6.    Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c), do nº 1, do artigo 11º do RJAT, o Tribunal Arbitral foi constituído em 27 de Fevereiro de 2017, tendo sido proferido despacho arbitral, na mesma data, no sentido de notificar a Requerida para, “(…) em 30 dias, responder, juntar cópia do processo administrativo e solicitar, querendo, a produção de prova adicional”.

 

1.7.    Em 23 de Março de 2017 a Requerida juntou aos autos cópia do processo administrativo bem como apresentou a sua Resposta, tendo-se defendido por impugnação e concluído que “face ao exposto (…) deve ser declarada a total improcedência do pedido, por total falta de apoio legal”.

 

1.8.       Por despacho arbitral de 23 de Março de 2016, o Tribunal Arbitral mandou notificar:

 

1.8.1.           “Os Requerentes para, no referido prazo de 5 dias, se pronunciarem sobre a possibilidade de dispensa da inquirição das duas testemunhas indicadas no pedido e, caso não prescindam da inquirição dessas testemunhas, ficam também desde já notificados para, no mesmo prazo, indicar os factos sobre os quais pretendem que a prova testemunhal incida”;

1.8.2.           “Ambas as Partes para se pronunciarem, no referido prazo de 5 dias, sobre a possibilidade de dispensa da realização da reunião a que alude o artigo 18º do RJAT e sobre a possibilidade de dispensa da apresentação de alegações”.

 

1.9.       A Requerida apresentou requerimento, em 27 de Março de 2017, no sentido de ser seu entendimento “(…) que a prova documental junta aos autos é a necessária e a suficiente para a decisão da causa, nada tendo a opor à dispensa da realização da reunião prevista no art. 18º do RJAT, bem como à dispensa de produção de alegações”.

 

 

1.10.   Os Requerentes apresentaram, em 28 de Março de 2017, requerimento no sentido de considerarem “(…) ter deixado de existir utilidade na produção da prova testemunhal que (…) dispensam”, e de nada terem “(…) a opor à dispensa da realização da reunião a que alude o artigo 18º do RJAT e (…) à dispensa da produção de alegações”.

 

1.11.   Nestes termos, por despacho deste Tribunal Arbitral, datado de 29 de Março de 2017, foi decidido:

 

1.11.1.       Prescindir da realização a que se refere o artigo 18º do RJAT;

1.11.2.       Prescindir da apresentação de alegações;

1.11.3.       Designar o dia 27 de Abril de 2017 para efeitos de prolação da decisão arbitral.

 

1.12.   Por último, foram os Requerentes ainda advertidos que “até à data da prolação da decisão arbitral deveriam proceder ao pagamento da taxa arbitral subsequente, nos termos do disposto no nº 3 do artigo 4º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária e comunicar esse pagamento ao CAAD” (o que vieram a efectuar com data de 11 de Abril de 2017).

 

2.         CAUSA DE PEDIR

 

Os Requerentes sustentam o seu pedido, em síntese, da seguinte forma:

 

2.1.    “Em 10/12/2003, (…) adquiriram a fracção autónoma designada pelas letras EV, destinada a habitação, e a fracção autónoma designada pelas letras AI destinada a aparcamento, ambas do prédio urbano em propriedade horizontal sito na Rua …, nº … e …, freguesia e concelho de …, respectivamente, pelos preços de € 139.663,41 e € 9.975,96  (…)”, sendo que “a referida fracção EV foi destinada a habitação própria e permanente dos Requerentes, que ali viveram durante quase 6 anos, (…) e para onde alteraram o respectivo domicílio fiscal (…)”.

 

2.2.    Mais referem os Requerentes que “em 17/07/2009, (…) adquiriam o prédio urbano (…) sito na Rua do … n°…, freguesia de …, concelho do Porto, descrito na … Conservatória do Registo Predial do Porto sob o número … e inscrito na respectiva matriz predial urbana sob o art. …[hoje artigo … da União de freguesias de …, … e … (…)]” e “conforme consignado na escritura pública de compra e venda, o imóvel do Porto foi adquirido para habitação própria e permanente dos Requerentes que aí passaram a residir e para onde em Agosto de 2009 alteraram o seu domicílio fiscal (…)”.

 

2.3.    Prosseguem os Requerentes referindo que “não tendo (…) conseguido vender o imóvel de Matosinhos antes de adquirirem o imóvel do Porto, este último ficou a aguardar pela venda do primeiro para nele serem realizadas obras de melhoramento”.

 

2.4.    “Em 27/02/2012, os Requerentes alienaram o imóvel de Matosinhos pelo preço global de € 250.000,00 dos quais € 241.900,00 relativos à fracção autónoma designada pelas letras EV e € 8.100 relativos à fracção autónoma designada pelas letras AI (…)”, tendo suportado “pela mediação imobiliária na venda do imóvel de Matosinhos (…) uma despesa de € 15.375,00 (…)”.

 

2.5.    Alegam ainda os Requerentes que, por referência ao ano de 2012, “(…) na sua declaração de IRS nº …… -… (…) declararam a realização de uma mais valia com a venda do imóvel de Matosinhos e, (…) manifestaram a intenção de proceder ao reinvestimento do valor de realização da fracção EV, deduzido da amortização do empréstimo que tinham contraído para a respectiva aquisição, no melhoramento do imóvel do Porto (…)”, sendo que “no melhoramento do imóvel do Porto, os Requerentes reinvestiram as seguintes importâncias:

 

a)        Em 2012, € 6.950,00;

b)      Em 2013, € 118,998,41; e

c)      Em 2014, € 341.830,90 (…)”.

 

2.6.    Esclarecem ainda os Requerentes que “aquando da respectiva aquisição (…) requereram a isenção de IMI (…) relativa a aquisição para habitação própria e permanente do imóvel do Porto, a qual lhes foi concedida (…)”.

 

2.7.    Assim, não concordam os Requerentes com o entendimento da Requerida ([2]) porquanto entendem que o mesmo “(…) afasta por completo o previsto na alínea b) do nº 5 do art. 10° do CIRS que prevê que o reinvestimento (....) seja efectuado entre os 24 meses anteriores e os 36 meses posteriores contados da data da realização”, “ou seja, a ser como a ATA defende jamais os sujeitos passives poderiam adquirir um imóvel destinado a habitação própria e permanente antes de terem alienado o imóvel que constitua a sua habitação própria e permanente”.

 

2.8.    Na verdade, para os Requerentes, “(…) tal argumentário não procede e além de violar gravemente a lei fundamental, a letra e o espírito do CIRS provoca uma entorse insolúvel na unidade do sistema jurídico fiscal que obriga a que, para que beneficiem da exclusão de tributação das mais valias sobre imóveis, os sujeitos passivos afectem o novo imóvel à sua habitação própria e permanente, exigência que também é requerida para que possam usufruir da isenção de IMI (…)”.

 

2.9.    E, acrescentam que “de facto não é sustentável nem tem cabimento que os Requerentes, havendo adquirido o imóvel do Porto antes de conseguirem vender o imóvel de Matosinhos neste último tivessem de permanecer não mudando a sua vida para o imóvel do Porto que justamente tinham adquirido para fazer face às suas necessidades quotidianas (…)”, tanto mais que “(…) se não tivessem mudado a sua habitação própria e permanente para o imóvel do Porto não teriam possibilidade de usufruir do beneficio fiscal em sede de IMI”.

 

2.10.  Ora, segundo os Requerentes, invocada a legislação aplicável, pelo facto de “(…) nas respectivas declarações de IRS (…)” terem “(…) manifestado o propósito de proceder ao reinvestimento do valor de realização da venda do imóvel de Matosinhos no melhoramento do imóvel do Porto (…)” e terem efectuado esse reinvestimento “(…) no prazo que a lei lhes concede, não há lugar a tributação das mais valias geradas e, como tal, são ilegais as liquidações em crise”.

 

2.11.  Assim, segundo os Requerentes, “(…) tendo o valor de realização obtido com a alienação do imóvel de Matosinhos sido reinvestido no melhoramento do imóvel do Porto (…) mostra-se a mais valia excluída de tributação, não havendo lugar a qualquer correcção dos valores inscritos na declaração (…) nem a qualquer tributação a eles relativa e sendo, consequentemente, ilegal a liquidação oficiosa adicional em crise”.

 

Dos honorários

 

2.12.  Adicionalmente, peticionam ainda os Requerente que “em virtude das ilegalidades que originaram a liquidação em crise (…)” “(…) tiveram de se pronunciar por diversas vezes em sede administrativa e de lançar mão do presente Pedido de Pronúncia Arbitral, o que se traduz numa despesa equivalente às despesas e honorários do seu mandatário”,despesas e custos (…) que por ter sido a Administração Tributária que aos mesmos deu causa, deve ser condenada a pagar, por serem considerados danos emergentes da ilicitude dos actos anulados, logo, indemnizáveis pela parte vencida (…)” “e que provisoriamente se cifram (…) em € 2.500,00”.

 

2.13.  Nestes termos, concluem os Requerentes o seu pedido requerendo que seja “(…) declarada a ilegalidade e a anulação dos actos de liquidação em crise, com todas as consequências legais, designadamente o reembolso da quantia paga acrescida de juros indemnizatórios, bem como das taxas de justiça e dos honorários suportados pelos Requerentes com o respectivo mandatário”.

 

3.       RESPOSTA DA REQUERIDA

 

3.1.    A Requerida respondeu, defendendo-se por impugnação e sustentando que “em causa está a liquidação adicional de IRS (…) referente ao ano de 2012 e a tributação de mais-valias imobiliárias, decorrentes da alineação, em 2012, de duas fracções (…) sitas na Rua … (…)”, sendo que “a respectiva correcção fundamentou-se no facto dos Rs. não reunirem os requisitos previstos no nº 5 do art. 10º do CIRS para exclusão da tributação de mais-valias imobiliárias”.

 

3.2.      Com efeito, segundo a Requerida, “o processo de divergências, que incidiu sobre a declaração de rendimentos Modelo 3/IRS, referente ao ano de 2012, foi aberto porquanto o reinvestimento declarado excedia o prazo de 24 meses previsto na alínea b) do nº 5 do art. 10º do CIRS”.

 

3.3.    Na verdade, a Requerida refere que os Requerentes “vieram (…) afirmar que o reinvestimento declarado se destinava a obras de melhoramento num imóvel que haviam adquirido em 2009”.

 

3.4.    Mas, segundo a Requerida “o facto tributário que está na génese do direito ao imposto é a existência de mais-valias por ocasião da alienação onerosa, consagrando o nº 5 do art. 10º do CIRS uma delimitação negativa da incidência, designadamente desde que estejam em causa ganhos provenientes da transmissão onerosa de imóveis destinados a habitação própria e permanente do sujeito passivo e/ou do seu agregado familiar”.

 

3.5.    Nestes termos, “como o valor de realização foi obtido pela alienação de um imóvel que não constituía habitação própria e permanente dos Rs. desde 2009”, conclui a Requerida que, no caso em análise, nenhum vício de lei pode ser imputado à liquidação adicional em causa, defendendo assim que “(…) deve ser declarada a total improcedência do pedido, por total falta de apoio legal”.

 

3.6.    Por último, peticionou a Requerida a dispensa da produção de prova testemunhal “dado que a questão controvertida é exclusivamente de direito (…)”.

 

4.       SANEADOR

 

4.1.    O pedido de pronúncia arbitral é tempestivo uma vez que foi apresentado no prazo previsto na alínea a) do nº 1 do artigo 10º do RJAT.[3]

 

4.2.    As partes gozam de personalidade e capacidade judiciária, são legítimas quanto ao pedido de pronúncia arbitral e estão devidamente representadas, nos termos do disposto nos artigos 4º e 10º do RJAT e do artigo 1º da Portaria nº 112-A/2011, de 22 de Março.

 

4.3.    No que diz respeito à competência deste Tribunal para apreciar o pedido de pronúncia arbitral formulado pelos Requerentes será necessário analisar, individualmente, a natureza dos diversos pedidos que dele fazem parte.

 

4.4.    Com efeito, conforme referido no ponto 1.2., supra, os Requerentes apresentaram o presente pedido de pronúncia arbitral tendo em vista a declaração da (…) ilegalidade e anulação dos actos tributários em crise, com todas as consequências legais, designadamente o reembolso da quantia paga acrescida de juros indemnizatórios, bem como das taxas de justiça e dos honorários suportados pelos Requerentes com o respectivo mandatário” (sublinhado nosso).

 

4.5.    Em termos gerais, de acordo com o disposto no artigo 2º do RJAT, “a competência dos tribunais arbitrais compreende a apreciação das seguintes pretensões”:

 

a)  A declaração de ilegalidade de actos de liquidação de tributos, de autoliquidação, de retenção na fonte e de pagamento por conta;

b)    A declaração de ilegalidade de actos de fixação da matéria tributável quando não dê origem à liquidação de qualquer tributo, de actos de determinação da matéria colectável e de actos de fixação de valores patrimoniais;

c)    (Revogada)” (sublinhado nosso).

 

4.6.    Assim, no que diz respeito ao pedido de anulação dos actos tributários em crise, não há qualquer dúvida de que este Tribunal é competente para apreciar a pretensão dos Requerentes.

 

4.7.    No que diz respeito pedido de pagamento de juros indemnizatórios (a incidir sobre o imposto pago pelos Requerentes), de acordo com o disposto no nº 5, do artigo 24º do RJAT “é devido o pagamento de juros, independentemente da sua natureza, nos termos previsto na lei geral tributária e no Código de Procedimento e de Processo Tributário”, daqui resultando que uma decisão arbitral não se limita à apreciação da legalidade do acto tributário.

 

4.8.    De igual modo, de acordo com o disposto no artigo 24º, nº 1, alínea b) do RJAT, deverá ser entendido que o pedido de juros indemnizatórios é uma pretensão relativa a actos tributários (v.g. de liquidação), que visa explicitar/concretizar o conteúdo do dever de “restabelecer a situação que existiria se o acto tributário objecto da decisão arbitral não tivesse sido praticado, adoptando os actos e operações necessários para o efeito”.

 

4.9.    Como refere Jorge Lopes de Sousa “insere-se nas competências dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD a fixação dos efeitos da decisão arbitral que podem ser definidos em processo de impugnação judicial, designadamente, a anulação dos actos cuja declaração de ilegalidade é pedida, a condenação da Autoridade Tributária e Aduaneira no pagamento de juros indemnizatórios (…)” (sublinhado nosso).[4] [5]

 

4.10.  Nestes termos, nos processos arbitrais tributários pode haver lugar ao pagamento de juros indemnizatórios, nos termos do disposto nos artigos 43º, nºs 1 e 2, e 100º da Lei Geral Tributária (LGT), quando se determine que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido, sendo que o direito a juros indemnizatórios dependerá sempre da verificação de um erro imputável aos serviços da Requerida, do qual tenha resultado esse pagamento de dívida tributária em montante superior ao legalmente devido.

 

4.11.  Assim, no que diz respeito ao pedido de pagamento de juros indemnizatórios também não há qualquer dúvida de que este Tribunal é competente para apreciar esta pretensão dos Requerentes.

 

4.12.  Em matéria de taxas de justiça, interpretando este Tribunal este pedido formulado pelos Requerentes como sendo relativo à responsabilidade pelo pagamento das custas arbitrais, de harmonia com o disposto no artigo 22º, nº 4, do RJAT, “da decisão arbitral proferida pelo tribunal arbitral consta a fixação do montante e a repartição pelas partes das custas directamente resultantes do processo arbitral”, pelo que é também competente este Tribunal para determinação da parte(s) que possa(m) vir a ser responsabilizada(s) pelas mesmas, aqui se remetendo para a análise, nesta matéria, a efectuar no Capítulo 6 desta Decisão.

 

4.13.  Por último, os Requerentes pedem ainda que a Requerida seja condenada a suportar os montantes das despesas resultantes do presente processo judicial, nomeadamente “(…) despesa equivalente às despesas e honorários do seu mandatário”, as quais entendem que “(…) por ter sido a Administração Tributária que aos mesmos deu causa, deve ser condenada a pagar, por serem considerados danos emergentes da ilicitude dos actos anulados, logo, indemnizáveis pela parte vencida (…)”, “e que provisoriamente se cifram (…) em € 2.500,00”.

 

4.14.  Ora, neste âmbito, reitera-se que a competência dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD está limitada, nos termos do disposto no artigo 2º do RJAT (acima transcrito no ponto 4.5.), à declaração da ilegalidade de actos dos tipos aí indicados e actos que conheçam da legalidade de actos desses tipos.

 

4.15.  Para além disso, e conforme acima referido nos pontos 4.7. a 4.11., é possível reconhecer o direito e proferir condenações em matéria de juros indemnizatórios, bem como reconhecer (com suporte no artigo disposto no artigo 171º do CPPT) que o processo arbitral é também o meio adequado para proferir condenações em indemnização por garantia indevida.

 

4.16.    Contudo, não há qualquer suporte legal para incluir nas competências dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD condenações por dívidas de honorários de mandatários, conforme já analisado e concluído em diversas Decisões Arbitrais, pelo que não se toma aqui conhecimento desta parte do pedido.[6]

 

4.17.  Não foram suscitadas excepções de que cumpra conhecer.

 

4.18.  Não se verificam nulidades pelo que se impõe, agora, conhecer do mérito do pedido.

 

5.       MATÉRIA DE FACTO

 

5.1.    Dos factos provados

 

5.2.    Consideram-se como provados os seguintes factos (com base nos documentos a seguir identificados, anexados pelos Requerentes, bem como nos documentos que fazem parte do processo administrativo anexado pela Requerida):

 

5.2.1.     Os Requerente adquiriram, em 10 de Dezembro de 2003, por escritura pública de compra e venda, com mútuo e hipoteca, duas fracções (“EV” e “AI”), pelo preço, respectivamente, de EUR 139.663,41 e EUR 9.975,96, de um prédio urbano sito na Rua … nºs … e …, em Matosinhos (prédio descrito na CRP de Matosinhos sob o nº … e inscrito na matriz predial sob o artigo … da União de Freguesias de … e …) (conforme cópia da escritura pública de compra e venda, anexada aos autos com o pedido – doc. nº 7).

5.2.2.     Os Requerentes adquiriram, em 17 de Julho de 2009, por escritura pública de compra e venda, com mútuo e hipoteca, pelo preço de EUR 725.000,00, um prédio urbano sito na Rua do …, nº…, no Porto (prédio descrito na … CRP do Porto sob o nº … e inscrito na matriz predial sob o artigo … da União das Freguesias de…, … e …) (conforme cópia da escritura pública de compra e venda, anexada aos autos com o pedido – doc. nº 9).

5.2.3.     Os Requerentes apresentaram requerimento no sentido de beneficiar de isenção de Imposto Municipal sobre Imóveis (IMI) relativamente ao prédio urbano sito na Rua do … no Porto, tendo-lhes sido concedida a isenção para os anos de 2009 a 2012 (conforme cópia da respectiva isenção, anexada aos autos com o pedido – doc. nº 18).

5.2.4.     Os Requerentes alteraram, em 5 de Agosto de 2009, o seu domicílio fiscal para a morada referida no ponto anterior (conforme consta do processo administrativo anexado pela Requerida)

5.2.5.     Os Requerente alienaram, em 27 de Fevereiro de 2012, por escritura pública de compra e venda, pelo preço de EUR 241.900,00 e EUR 8.100,00, respectivamente, as fracções “EV” (apartamento) e “AI” (garagem), relativas ao imóvel acima descrito no ponto 5.2.1. (conforme cópia da escritura pública de compra e venda, anexada aos autos com o pedido – doc. nº 12).

5.2.6.     Os Requerentes apresentaram, em 26 de Agosto de 2013, uma declaração de rendimentos de substituição Modelo 3 de IRS, relativa aos rendimentos do ano de 2012, na qual declararam a alienação do imóvel descrito no ponto 5.2.1., supra, bem como:

 

5.2.6.1.       No campo 506, do Quadro 5, do Anexo G, a intenção de reinvestir parte do valor de realização da fracção “EV” (no montante de EUR 241.900,00) e,

5.2.6.2.       No campo 508, do Quadro 5, do Anexo G, ter concretizado, em 2012, parte daquele reinvestimento, no montante de
EUR 6.950,00,

(conforme cópia da respectiva declaração de rendimentos anexada aos autos com o pedido – doc. nº 14).

5.2.7.     Em 29 de Agosto de 2013, a declaração de IRS referida no ponto anterior deu lugar a um processo de divergências com fundamento em “alienação de imóveis não declarada ou necessidade de comprovação dos valores das despesas, do valor de alienação, da data de aquisição dos imóveis ou da afectação e actividade profissional” (conforme cópia do documento constante do processo administrativo anexado pela Requerida).

5.2.8.     Os Serviços de Finanças do Porto …, emitiram parecer, em 16 de Setembro de 2013, após apreciação dos elementos remetidos pelos Requerentes (cópias das escrituras de compra e venda e factura de mediação imobiliária), no sentido de que “ao caso em apreço não se verifica o reinvestimento em virtude de ter sido ultrapassado o prazo previsto na al. b) nº 5 artº 10º, dado a escritura ter sido efectuada em …/2009” (conforme cópia do documento constante do processo administrativo anexado pela Requerida).

5.2.9.     Por ofício de 10 de Janeiro de 2014, os Serviços de Finanças do Porto …, notificaram os Requerentes para efeitos de exercício do direito de audição prévia, porquanto “conforme (…) informados em Setembro/2013, preencheram erradamente o Quadro 5/Anexo G pelo que devem enviar uma declaração de rendimentos de Substituição (…)” sob pena de procederem “(…) oficiosamente (…)”, indicando a intenção de corrigir os valores declarados nos campos 506 (EUR 241.900,00) e 508
(EUR 6.950,00) do Quadro 5, do referido Anexo G da modelo 3 do ano de 2012 (conforme cópia do documento constante do processo administrativo anexado pela Requerida).

5.2.10.   Em 19 de Janeiro de 2014, os Requerentes exerceram o direito de audição prévia referido no ponto anterior, tendo afirmado que o reinvestimento se destinava à “construção, ampliação e melhoramento de outro imóvel, exclusivamente destinado à sua habitação própria e permanente (…) que para os mesmos fins havia sido adquirido em 17 de Julho de 2009” (conforme cópia do documento constante do processo administrativo anexado pela Requerida).

5.2.11.   O Serviço de Finanças do Porto … notificou os Requerentes, através de carta registada, datada de 7 de Fevereiro de 2014, para apresentarem os “documentos comprovativos do valor indicado no campo 508 do quadro 5 do Anexo G – Mais Valias (6.950,00€)” (conforme cópia do documento constante do processo administrativo anexado pela Requerida).

5.2.12.   Em 29 de Fevereiro de 2014, os Requerentes apresentaram cópia dos documentos comprovativos do valor indicado no campo 508, do Quadro 5 do Anexo G da declaração de rendimento do ano 2012 (recibo verde de arquitecto, no montante de EUR 2.152,50, factura e respectivo recibo da empresa de engenharia C…, S.A., no montante de EUR 2.706,00 e factura de uma sociedade unipessoal de serviços de engenharia, no montante de EUR 3.690,00, conforme cópias constantes do processo administrativo anexado pela Requerida).

5.2.13.   Os Requerentes apresentaram, em 22 de Julho de 2014, uma declaração de rendimentos de substituição Modelo 3 de IRS, relativa aos rendimentos do ano de 2013, na qual declararam no campo 509, do Quadro 5, do Anexo G (Concretização do reinvestimento após a alienação) o montante de
EUR 118.998,41, relativo ao “valor reinvestido no primeiro ano seguinte (sem recurso ao crédito” (conforme cópia da respectiva declaração de rendimentos anexada aos autos com o pedido – doc. nº 16).

5.2.14.   Em 26 de Maio de 2015, o Serviço de Finanças do Porto … emitiu o Ofício nº …/…-…, dirigido ao Director de Finanças do Porto, no sentido de tentar esclarecer se “os documentos apresentados para justificar o valor de 6.950,00 euros declarado no Campo 508 do Quadro 5 do Anexo G que integra a (…) declaração possam enquadrar-se no conceito de reinvestimento (…)” (conforme cópia do respectivo Ofício constante do processo administrativo anexado aos autos pela Requerida).

5.2.15.   Os Requerentes apresentaram, em 29 de Maio de 2015, uma declaração de rendimentos de substituição Modelo 3 de IRS, relativa aos rendimentos do ano de 2014, na qual declararam no campo 510, do Quadro 5, do Anexo G (Concretização do reinvestimento após a alienação) o montante de EUR 341.830,90, relativo ao “valor reinvestido no segundo ano seguinte (sem recurso ao crédito” (conforme cópia da respectiva declaração de rendimentos anexada aos autos com o pedido – doc. nº 17).

5.2.16.   Despacho interno da Direcção de Finanças do Porto, datado de 20 de Julho de 2015, no sentido de defender que o reinvestimento declarado pelos Requerentes não tinha enquadramento legal no nº 5 do art. 10º do CIRS (conforme cópia do respectivo despacho constante do processo administrativo anexado pela Requerida).

5.2.17.   Os Requerentes foram notificados, através do Ofício nº 2016…, de 26 de Agosto de 2016, emitido pelo Serviço de Finanças do Porto…, para no prazo de 15 dias apresentarem uma declaração de rendimentos de substituição para os anos de 2012, 2013 e 2014, tendo em consideração o processo de divergência identificado relativamente à declaração de rendimentos do ano 2012, “(…) no sentido de que o reinvestimento declarado não se enquadra no nº 5 do artigo 10º do Código do IRS porque o imóvel vencido em 2012 (…) não era a (…) Habitação Permanente desde Agosto de 2009” (conforme cópia do documento nº 4 anexado com o pedido e processo administrativo anexado pela Requerida).

5.2.18.   Os Requerentes foram ainda pelo mesmo Ofício notificados para, no prazo de 15 dias, exercerem o direito de audição sobre o projecto de decisão referido no ponto anterior, tendo exercido esse direito audição em 9 de Setembro de 2016, alegando que “(…) não conseguiram vender o imóvel sito na Rua de …, Matosinhos, antes da aquisição do novo imóvel na Rua do …, Porto, e que tiveram de (…) afectar este último à sua Habitação Própria Permanente para efeitos de isenção de IMI e, daí, a alteração do domicilio fiscal”, reiterando pois a exclusão da tributação das mais-valias geradas com a alienação do imóvel sito em Matosinhos (descrito no ponto 5.2.1., supra), conforme cópia constante do processo administrativo anexado pela Requerida.

5.2.19.   Os Requerentes foram notificados do Ofício nº 2016…, de 14 de Setembro de 2016, emitido pelo Serviço de Finanças do Porto…, no sentido de manter a notificação constante do Ofício nº 2016…, acima identificado no ponto 5.2.17. (conforme cópia do Ofício constante do processo administrativo anexado pela Requerida).

5.2.20.   Os Requerentes foram notificados da decisão de proceder à alteração do rendimento colectável do ano 2012, datada de 27 de Setembro de 2016, emitida pelo Serviço de Finanças do Porto … (conforme cópia de documento constante do processo administrativo anexado pela Requerida).

5.2.21.   Na mesma data, foi instruído o auto de notícia relativo à correcção oficiosa efectuada, em sede de IRS, na declaração respeitante ao ano de 2012 (conforme cópia de documento constante do processo administrativo anexado pela Requerida).

5.2.22.   Os Requerentes foram notificados do Ofício nº 2016…, de 29 de Setembro de 2016, emitido pelo Serviço de Finanças do Porto…, no sentido de ter sido alterada a matéria colectável da declaração de rendimentos de IRS do ano de 2012 e de que a respectiva liquidação de IRS seria em breve efectuada e notificada (conforme cópia do documento nº 5, anexado com o pedido e processo administrativo anexado pela Requerida).

5.2.23.   Em 14 de Outubro de 2016 foi emitida a liquidação adicional de IRS nº 2016…, bem como a liquidação de juros nº 2016…, no montante de, respectivamente, EUR 17.48,65 e EUR 2.362,59, cuja data limite para pagamento voluntário era “23/11/2016” (conforme cópia do documento nº 1, anexado com o pedido).

5.2.24.   Os Requerentes pagaram o valor total liquidado nos termos do ponto anterior (EUR 19.843,24) em 21 de Novembro de 2016 (conforme cópia do documento nº 6, anexado com o pedido).

 

5.3.    Não se provaram quaisquer outros factos passíveis de afectar a decisão de mérito do pedido.

 

5.4.      Dos factos não provados

 

5.5.    Não se verificaram quaisquer factos como não provados com relevância para a decisão arbitral.

 

6.       FUNDAMENTOS DE DIREITO

 

6.1.    Nos autos, para efeitos de dar ou não provimento ao pedido, formulado pelos Requerentes, de declaração de ilegalidade e de anulação dos actos de liquidação em crise, com todas as consequências legais, importa analisar e decidir se estão verificados os pressupostos que legitimavam, no ano de 2012, o direito à exclusão de tributação das mais-valias realizadas com a alienação do imóvel urbano sito em Matosinhos, por se considerarem reunidos, à data do facto gerador do imposto (2012), os requisitos associados com o reinvestimento dos valores de realização gerados com a venda daquele imóvel sito em Matosinhos.

 

6.2.    Nesta matéria, segundo os Requerentes, tendo sido manifestado “(…) nas respectivas declarações de IRS (…)” “(…) o propósito de proceder ao reinvestimento do valor de realização da venda do imóvel de Matosinhos no melhoramento do imóvel do Porto (…)e pelo facto de terem efectuado este reinvestimento “(…) no prazo que a lei lhes concede, não há lugar a tributação das mais valias geradas e, como tal, são ilegais as liquidações em crise” (sublinhado nosso).

 

6.3.    Por outro lado, no entender da Requerida, “o processo de divergências, que incidiu sobre a declaração de rendimentos Modelo 3/IRS, referente ao ano de 2012, foi aberto porquanto o reinvestimento declarado excedia o prazo de 24 meses previsto na alínea b) do nº 5 do art. 10º do CIRS”, porquanto os Requerentes “vieram (…) afirmar que o reinvestimento declarado se destinava a obras de melhoramento num imóvel que haviam adquirido em 2009” mas, “no caso concreto, o valor de realização foi obtido pela alienação de um imóvel que não constituía habitação própria e permanente dos Rs. desde 2009” (sublinhado nosso).

 

6.4.    Nestes termos, de modo a decidir a questão controvertida, importa analisar desde logo o dipositivo legal, à data a que se reporta o facto gerador do imposto (2012), de modo a proceder ao enquadramento legal do pedido arbitral e aferir se assiste razão aos Requerentes ou, se pelo contrário, assiste razão à Requerida, quanto à ilegalidade/legalidade das liquidações em crise (imposto e juros).

 

6.5.    Neste âmbito, de acordo com o disposto no artigo 10º, nº 1, alínea a) do Código do IRS, “constituem mais-valias os ganhos obtidos que, não sendo considerados rendimentos empresariais e profissionais, de capitais ou prediais, resultem de (…) alienação onerosa de direitos reais sobre bens imóveis (…)” sendo que, de acordo com o disposto no nº 3 do mesmo artigo 10º, “os ganhos consideram-se obtidos no momento da prática (…)” desse acto de alienação onerosa (sublinhado nosso).

 

6.6.    Nos termos do disposto na alínea a), do nº 4, do referido artigo 10º do Código do IRS, “o ganho sujeito a IRS é constituído (…) pela diferença entre o valor de realização e o valor de aquisição, líquidos da parte qualificada como rendimento de capitais (…)”.

 

6.7.    Em conformidade com o disposto no nº 5 do referido artigo 10º do Código do IRS, na redacção dada pela Lei nº 109-B/2001, de 27/12, “são excluídos da tributação os ganhos provenientes da transmissão onerosa de imóveis destinados a habitação própria e permanente do sujeito passivo ou do seu agregado familiar, nas seguintes condições (…)”:

 

a)        “Se, no prazo de 36 meses contados da data de realização, o valor de realização, deduzido da amortização de eventual empréstimo contraído para a aquisição do imóvel, for reinvestido na aquisição da propriedade de outro imóvel, de terreno para construção de imóvel, ou na construção, ampliação ou melhoramento de outro imóvel exclusivamente com o mesmo destino situado em território português ou no território de outro Estado membro da União Europeia ou do espaço económico europeu, desde que, neste último caso, exista intercâmbio de informações em matéria fiscal” (redacção dada pela Lei nº 66-A/2008, de 31 de Dezembro, em vigor desde 1 de Janeiro de 2009) (sublinhado nosso);

b)        Se o valor de realização, deduzido da amortização de eventual empréstimo contraído para a aquisição do imóvel, for utilizado no pagamento da aquisição a que se refere a alínea anterior desde que efectuada nos 24 meses anteriores” (redacção dada pela Lei nº 66-A/2008, de 31 de Dezembro, em vigor desde 1 de Janeiro de 2009) (sublinhado nosso).

 

6.8.    Ou seja, o Código do IRS prevê, nas alíneas a) e b), do nº 5, do seu artigo 10º (acima transcrito), uma exclusão da tributação nos ganhos resultantes da transmissão onerosa de imóveis destinados a habitação própria e permanente do sujeito passivo ou do seu agregado familiar, desde que os valores recebidos na transmissão sejam utilizados ou para a aquisição, ou para a construção, ou para a ampliação ou ainda para a beneficiação de outro imóvel com o mesmo fim (desde que localizado em território nacional, no território de outro Estado membro da União Europeia ou do Espaço Económico Europeu).

 

6.9.    De acordo com o disposto na alínea c), do nº 5 do artigo 10º do Código do IRS, “para os efeitos do disposto na alínea a), o sujeito passivo deverá manifestar a intenção de proceder ao reinvestimento, ainda que parcial, mencionado, na declaração de rendimentos respeitante ao ano da alienação, o valor que tenciona reinvestir” (sublinhado nosso).

 

6.10.    Nos termos do previsto no nº 6 do mesmo artigo 10º, não haverá exclusão da tributação nos casos em que:

 

a)    “Tratando-se de reinvestimento na aquisição de outro imóvel, o adquirente o não afecte à sua habitação ou do seu agregado familiar, até decorridos seis meses após o termo do prazo em que o reinvestimento deva ser efectuado” (sublinhado nosso);

b)    “Tratando-se de reinvestimento na aquisição de terreno para construção, o adquirente não inicie, excepto por motivo imputável a entidades públicas, a construção até decorridos seis meses após o termo do prazo em que o reinvestimento deva ser efectuado ou não requeira a inscrição do imóvel na matriz até decorridos 24 meses sobre a data de início das obras, devendo, em qualquer caso, afectar o imóvel à sua habitação ou do seu agregado familiar até ao fim do quinto ano seguinte ao da realização”;

c)    “Tratando-se de reinvestimento na construção, ampliação ou melhoramento de imóvel, não sejam iniciadas as obras até decorridos seis meses após o termo do prazo em que o reinvestimento deva ser efectuado ou não seja requerida a inscrição do imóvel ou das alterações na matriz até decorridos 24 meses sobre a data de início das obras, devendo, em qualquer caso, afectar o imóvel à sua habitação ou do seu agregado familiar até ao fim do quinto ano seguinte ao da realização” (sublinhado nosso).

 

6.11.  Assim, face ao acima exposto, verifica-se que a primeira (e essencial), condição para que se considere, numa dada situação, que pode haver reinvestimento, será a de que se trate, efectivamente, da alienação da habitação própria do sujeito passivo ou do seu agregado familiar, não sendo esta exclusão tributária aplicável a nenhum outro imóvel alienado que não o que cumpra este requisito.

 

6.12.  No entanto, apesar de esta ser a condição essencial do reinvestimento, não é a única condição que a lei prevê para que o regime de exclusão de tributação acima referido seja aplicado.

 

6.13.  Com efeito, existem na Lei outras condições que necessitam ser cumpridas, para que se verifique a mencionada exclusão de tributação das mais-valias obtidas com a alienação onerosa de imóveis destinados a habitação própria e permanente do sujeito passivo ou do seu agregado familiar, condições estas que analisamos de seguida.

 

6.14.  Desde logo, para que exista a possibilidade de não tributar (ou de tributar parcialmente) a mais-valia obtida na venda da habitação própria e permanente será necessário proceder ao reinvestimento do valor de realização (ou de parte dele), o que significa que o valor obtido na venda (ou parte dele) deve ser utilizado para o mesmo fim, ou seja, deve ser utilizado ou para a aquisição, ou para a construção, ou para a ampliação ou ainda para a beneficiação de um imóvel afecto à habitação própria e permanente do sujeito passivo (ou do seu agregado familiar).[7]

 

6.15.  Uma outra das condições para que se considere existir reinvestimento do valor de realização diz respeito ao prazo para poder reinvestir aquele valor e poder beneficiar da exclusão da tributação prevista no Código do IRS (acima já transcrita no ponto 6.7.).

 

6.16.  Neste âmbito, no que diz respeito ao prazo para poder ser efectuado o reinvestimento, face ao texto legal (nº 5 do artigo 10º do Código do IRS), haverá que ponderar qual das situações ocorreu primeiro, se a aquisição da nova habitação ou se a venda da habitação anterior.

 

6.17.  No caso de a aquisição da nova habitação ocorrer após a venda da habitação antiga, o prazo aplicável para efectuar o reinvestimento será de 36 meses a contar [conforme referido na alínea a) do nº 5 do artigo 10º do Código do IRS)], da data de realização, ou seja, a partir da data da venda da habitação antiga (facto gerador da mais valia eventualmente tributável), para que se possa, legitimamente, declarar que se pretende efectuar o reinvestimento numa nova habitação, seja através da aquisição da propriedade de outro imóvel, seja através da aquisição de terreno para a construção de um novo imóvel, seja através da ampliação ou melhoramento de outro imóvel exclusivamente com o mesmo destino (e desde que localizado em território nacional, no território de outro Estado membro da União Europeia ou do Espaço Económico Europeu).

 

6.18.  Como se infere do texto da Lei, a alínea a), do nº 5 do artigo 10º do Código do IRS estabelece condições de reinvestimento futuro, delimitado temporalmente (no prazo de 36 meses), a efectuar numa habitação própria e permanente (a efectivar nas formas previstas na lei) e a afectar a esse fim, em momento posterior ao do facto gerador do imposto (alienação da antiga habitação, também ela habitação própria permanente, até à data em que é alienada).

 

6.19.  No caso de a aquisição da nova habitação ocorrer antes da venda da habitação antiga (como sucede na situação subjacente aos autos), o valor a reinvestir, obtido na venda da habitação antiga (facto gerador da mais-valia), terá de ser utilizado no pagamento da aquisição de uma nova habitação, aquisição esta que não pode ter sido efectuada há mais de 24 meses, porquanto, se assim tiver ocorrido, o valor já não será considerado reinvestido para efeitos da exclusão da tributação em sede de IRS.

 

 

6.20.  Neste caso, também se infere do texto da Lei [alínea b), do nº 5 do artigo 10º do Código do IRS] que o mesmo estabelece condições de reinvestimento passado, delimitado temporalmente (nos 24 meses anteriores), a efectuar no pagamento da aquisição de imóvel (habitação própria e permanente), em momento anterior ao do facto gerador do imposto (alienação da antiga habitação, também ela habitação própria permanente, até à data em que é alienada).

 

6.21.  Nestes termos, face ao disposto nos pontos anteriores, atente-se assim nas diferenças que existem na possibilidade de reinvestimento no prazo de 36 meses (prazo que se conta para reinvestimento efectuado após a data da alienação da habitação própria e permanente antiga) e no prazo de 24 meses (prazo que se conta para reinvestimento efectuado antes da data da alienação da habitação própria e permanente antiga).

 

6.22.  Assim, em resumo, quando o reinvestimento ocorre nos 36 meses seguintes à venda da habitação antiga, desde que reunidos todas as demais condições exigíveis, este pode ser concretizado nas diversas situações elencadas na alínea a), do nº 5º do artigo 10º do Código do IRS, sendo que quando o reinvestimento ocorre nos 24 meses antes da alienação da habitação antiga, desde que reunidas todas as demais condições exigíveis, este apenas pode ser concretizado exclusivamente na aquisição de uma nova habitação, conforme disposto na alínea b), do nº 5 do artigo 10º do Código do IRS.

 

6.23.  Ora, de todo o acima transcrito decorre, desde logo, que o primeiro e indispensável pressuposto para a exclusão tributária dos ganhos provenientes da transmissão onerosa de imóveis é o que diz respeito ao facto de ambos os imóveis serem destinados à habitação própria e permanente do sujeito passivo ou do seu agregado familiar porquanto, se este pressuposto não se verificar, deixam de ser relevantes as restantes condições que acima elencamos como necessárias para que se verifique a exclusão tributária.

 

6.24.  Aliás, no caso em análise, é também este requisito (relativo à necessidade de o imóvel alienado ser a “habitação própria permanente do sujeito passivo ou do seu agregado familiar”) que é posto em causa pela Requerida (e que dá origem ao processo de divergências que incidiu sobre a declaração de rendimentos Modelo 3/IRS, referente ao ano de 2012, com as consequências daí decorrentes), porquanto “(…) o reinvestimento declarado excedia o prazo de 24 meses previsto (…)”.

 

6.25.  Ora, na verdade, tendo em consideração, quer a matéria de facto dada como provada (porque documentalmente suportada e/ou aceite pelas Partes), quer o regime legalmente previsto no Código do IRS, dado que a habitação nova foi adquirida (17/07/2009), antes da alienação da habitação antiga (27/02/2012), o reinvestimento só poderia ter sido legitimamente efectuado nos termos da alínea b), do nº 5 do artigo 10º do Código do IRS (ou seja, nos 24 meses anteriores mas, em 2012, ano de alienação da habitação antiga, o prazo de 24 meses já tinha terminado, dado que a nova habitação tinha sido adquirida em 2009) e não nos termos do disposto na alínea a), do nº 5 do referido artigo 10º do Código do IRS (conforme sustentam os Requerentes) porquanto, conforme acima exposto, não estavam reunidas todas as condições necessárias (nomeadamente, o facto da habitação antiga já não ser, à data da alienação em 2012, a habitação própria permanente dos Requerentes desde 2009, dado que estes haviam considerado, como sendo a sua habitação própria e permanente, a habitação adquirida em 17/07/2009, para onde se haviam mudado em Agosto daquele ano).[8]

 

6.26.    Com efeito, a redacção dada ao artigo 10º, nº 5 do Código do IRS, pela Lei nº 109-B/2001, de 27 de Dezembro (em vigor à data a que se reportam os factos, ou seja, no ano de 2012), passou a exigir, para efeitos de exclusão de tributação das mais-valias geradas com a alienação de imóveis que não só o imóvel adquirido fosse afecto à habitação própria permanente (do sujeito passivo ou do seu agregado familiar), até decorridos seis meses após o termo do prazo em que o reinvestimento devesse ser efectuado, como passou a exigir que o prédio alienado tivesse sido, até à data da alienação, a habitação própria permanente do sujeito passivo ou do seu agregado familiar.

 

6.27.  Neste âmbito, o legislador fiscal usou uma técnica conhecida por “rool over” que torna não tributáveis as mais valias enquanto os valores de realização forem reinvestidos em imóveis, também eles destinados à habitação própria e permanente, sendo que essa exclusão só é válida para as mais-valias de imóveis destinados à habitação própria e permanente quando o reinvestimento se opera em imóveis com o mesmo destino.[9]

 

6.28.  Assim, “ressalta do exposto como especialmente relevante que a mais valia cuja exclusão de tributação se pretende tenha de ser, insiste-se, obrigatoriamente gerada no âmbito de transmissões de imóveis sempre destinados a afetação habitacional a título principal e permanente um na data da alienação (…) e outro até seis meses a contar da data da aquisição (…). Ou seja: cumpridos os demais requisitos, o imóvel que se vende e o imóvel que se compra terão de ter como destino a habitação principal e permanente do sujeito passivo” (sublinhado nosso).[10]

 

6.29.  Nestes termos, verifica-se que, no caso em análise, em 2012, não estavam reunidas as condições necessárias para que os Requerentes pudessem beneficiar do regime de exclusão tributária das mais-valias geradas com a alienação do imóvel sito em Matosinhos, porquanto, de acordo com os contornos de toda a situação dada como provada (vide Capítulo 5. desta decisão), o único prazo possível para efectuar o reinvestimento do valor de realização gerado com a alienação já tinha terminado [24 meses de acordo com o disposto na alínea b), do nº 5 do artigo 10º do Código do IRS)] e, mesmo que não tivesse decorrido esse prazo, à data da alienação do imóvel sito em Matosinhos, este já não estava afecto à habitação própria e permanente dos Requerentes.

 

 

6.30.  Assim, entende o Tribunal Arbitral que não assiste razão aos Requerentes quanto ao pedido formulado em sede de pronúncia arbitral, de declaração de ilegalidade e de anulação dos actos de liquidação em crise, com todas as consequências legais (identificado no ponto 6.1., supra), pelo que sendo consideradas legais as referidas liquidações adicionais (de IRS e de juros), referentes ao ano de 2012, em consequência, será de manter as mesmas porquanto não enfermam de qualquer vício de ilegalidade.

 

Do reembolso da quantia paga acrescida de juros indemnizatórios

 

6.31.  Tendo em consideração a conclusão referida no ponto anterior, fica prejudicada a análise do pedido de reembolso da quantia paga (imposto e juros), acrescida de juros indemnizatórios, porquanto sendo o direito a juros indemnizatórios dependente da verificação de um erro imputável aos serviços da Requerida (do qual tenha resultado um pagamento de dívida tributária em montante superior ao legalmente devido), concluiu-se, no caso em análise, que as liquidações em crise eram legais e, por isso válidas.

 

Do pedido de reembolso de despesas com honorários do mandatário

 

6.32.  Neste âmbito, tendo em consideração as conclusões da análise efectuada, no Capítulo 4. desta Decisão (e para o qual aqui se remete), em matéria de aferição da competência deste Tribunal Arbitral para analisar este pedido dos Requerentes, não se toma aqui conhecimento deste pedido.

 

Da responsabilidade pelo pagamento das custas arbitrais

 

6.33.  De harmonia com o disposto no artigo 22º, nº 4, do RJAT, “da decisão arbitral proferida pelo tribunal arbitral consta a fixação do montante e a repartição pelas partes das custas directamente resultantes do processo arbitral”.

 

6.34.  Assim, nos termos do disposto no artigo 527º, nº 1 do CPC (ex vi 29º, nº 1, alínea e) do RJAT), deve ser estabelecido que será condenada em custas a parte que a elas houver dado causa ou, não havendo vencimento da acção, quem do processo tirou proveito.

 

6.35.  Neste âmbito, o nº 2 do referido artigo concretiza a expressão “houver dado causa”, segundo o princípio do decaimento, entendendo que dá causa às custas do processo a parte vencida, na proporção em que o for.

 

6.36.  No caso em análise, tendo em consideração o acima exposto, de acordo com o disposto no artigo 12º, nº 2 do RJAT e artigo 4º, nº 4 do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, impõe-se que seja atribuída a responsabilidade integral por custas aos Requerentes.

 

7.         DECISÃO

 

7.1.    Assim, face a todo o supra exposto, decide este Tribunal Arbitral:

 

7.1.1.     Julgar improcedente o pedido de pronúncia arbitral apresentado pelos Requerentes no que diz respeito ao pedido de declaração de ilegalidade e de anulação das liquidações adicionais em crise (IRS e juros do ano de 2012), sendo assim de manter as mesmas por não enfermarem do vício de ilegalidade suscitado;

7.1.2.     Julgar, em consequência, improcedente, o pedido de reembolso das quantias pagas acrescidas de juros indemnizatórios;

7.1.3.     Não tomar conhecimento do pedido de condenação da Requerida no que diz respeito ao ressarcimento dos Requerentes por despesas com honorários de mandatários, porquanto se considerou este Tribunal Arbitral incompetente (em razão da matéria) para conhecer do referido pedido;

7.1.4.     Condenar os Requerentes no pagamento das custas do presente processo.

 

*****

 

Valor do processo:Tendo em consideração o disposto nos artigos 306º, nº 2 do CPC, artigo 97º-A, nº 1 do CPPT e no artigo 3º, nº 2 do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se o valor do processo em EUR 22.343,24.

 

Custas do processo: Nos termos do disposto na Tabela I do Regulamento das Custas dos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se o valor das custas do Processo Arbitral em EUR 1.224,00, a cargo dos Requerentes, de acordo com o artigo 22º, nº 4 do RJAT.

 

*****

 

Notifique-se.

 

Lisboa, 27 de Abril de 2017

 

 

Sílvia Oliveira

 



[1] Texto elaborado em computador, nos termos do artigo 138º, nº 5, do Código de Processo Civil (CPC), aplicável por remissão do artigo 29º, nº 1, alínea e), do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária (RJAT), e respeitando a ortografia anterior ao Acordo Ortográfico de 1990, excepto no que diz respeito às transcrições efectuadas, em que se manteve a ortografia do original.

[2] Entendimento que esteve na origem do processo de divergências, que incidiu sobre a declaração de rendimentos Modelo 3/IRS, referente ao ano de 2012, entregue pelos Requerentes, porquanto entendeu a Requerida que “(…) o reinvestimento declarado excedia o prazo de 24 meses previsto na alínea b) do nº 5 do art. 10º do CIRS”.

[3] Neste âmbito, tendo em consideração o disposto no n° l do artigo 102° do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), o prazo de dedução da impugnação judicial é de três meses contados dos factos enumerados naquele artigo, nomeadamente, do “termo do prazo para pagamento voluntário das prestações tributárias legalmente notificadas ao contribuinte” [alínea a) do nº 1], bem como o previsto no artigo 10º, nº 1, alínea a) do RJAT que estabelece que o pedido de constituição de tribunal arbitral deve ser apresentado “no prazo de 90 dias, contado a partir dos factos previstos nos nºs 1 e 2 do artigo 102º do CPPT, quanto aos actos susceptíveis de impugnação autónoma (...)”, pelo que, tendo em conta que a data limite para pagamento voluntário das liquidações em crise era “23/11/2016” e a data da interposição do pedido de pronúncia arbitral é “16/12/216”, o pedido é tempestivo.

[4] Vide Leite de Campos, Diogo, Silva Rodrigues, Benjamim, Sousa, Jorge Lopes, in “Lei Geral Tributária - Anotada e Comentada”, 4.ª Ed., 2012, página 116).

[5] Sobre a temática dos juros indemnizatórios pode ver-se do mesmo autor (Sousa, Jorge Lopes), Juros nas relações tributárias, in “Problemas fundamentais do Direito Tributário”, Lisboa, 1999, página 155 e sgts).

[6] Neste sentido, vide nomeadamente a Decisão Arbitral nº 117/2013-T, de 6 de Dezembro e a Decisão Arbitral nº 406/2016-T, de 28 de Dezembro.

[7] Na verdade, não sendo esse valor de realização utilizado na totalidade (havendo apenas um reinvestimento parcial), a mais-valia gerada será tributada proporcionalmente ao valor reinvestido, conforme previsto no artigo 10º, nº 7 do Código do IRS.

[8] Neste âmbito, refira-se que, de acordo com o disposto no artigo 19º da LGT, “o domicílio fiscal do sujeito passivo é, salvo disposição em contrário, para as pessoas singulares, o local da residência habitual (…)” e que, nos termos do disposto nos nº 3, 4 e 8, do artigo 19º da LGT (na redacção em vigor à data a que se reportam os factos), “é obrigatória (…) a comunicação do domicílio do sujeito passivo à administração tributária”, sendo “ineficaz a mudança de domicílio enquanto não for comunicada à administração tributária” e podendo “a administração tributária (…) rectificar oficiosamente o domicílio fiscal dos sujeitos passivos se tal decorrer dos elementos ao seu dispor” (sublinhado nosso).

Ora, o conceito de “habitação própria permanente” não é objecto de uma definição especial plasmada nas normas tributárias pelo que haverá, nesta matéria, que recorrer a normas subsidiariamente aplicáveis para integração dos respectivos pressupostos.

Com efeito, em sede de tributação de mais-valias imobiliárias o legislador delimitou negativamente, como se viu, o campo de incidência do IRS, através das normas expressas de exclusão tributária consagradas nos números 5 e 6 do artigo 10º do Código do IRS.

No plano conceptual, podemos verificar a divergência entre a residência habitual e a residência própria e permanente, tal como o domicílio fiscal nem sempre coincide com a residência no sentido do local onde a pessoa tem a sua habitação, podendo inclusive tal conclusão inferir-se da redação do artigo 82º do Código Civil, que admite a possibilidade de residência ou domicílio em diferentes locais.

Por outro lado, não existe uma identidade entre “domicílio fiscal” e “residência permanente”, admitindo-se que o contribuinte comprove a sua residência permanente apresentando “factos justificativos” de que aí fixou de forma habitual e permanente o centro da sua vida pessoal.

Neste sentido, vide Acórdão do Tribunal Central Administrativo do Sul (TCAS) (nº 04550/11), nos termos do qual “o conceito de domicílio fiscal estatuído no disposto no artigo 19° da LGT, nomeadamente no seu n°1 é um domicílio especial que se refere a um lugar determinado para o exercício de direitos e o cumprimento dos deveres previstos nas normas tributárias o qual, sendo especial, (…) embora, ideologicamente e na sua essência o disposto naquele primeiro inciso legal se conecte com a necessidade de o sujeito passivo e a AT estarem em contacto sempre que o for necessário para o exercício dos respectivos direitos e deveres, em homenagem ao princípio da colaboração ínsito no artigo 59º da LGT”.

O artigo 46º, nº 9 do Estatuto dos Benefícios Fiscais (EBF) não afasta o entendimento perfilhado no sentido da não necessária correspondência entre residência permanente e domicílio fiscal porquanto, em tal norma, o legislador prescreveu que “(…) para efeitos do disposto no presente artigo, considera-se ter havido afetação dos prédios ou partes de prédios à habitação própria e permanente do sujeito passivo ou do seu agregado familiar se aí se fixar o respetivo domicílio fiscal” (sublinhado nosso).

A circunstância de se verificar um paralelismo entre a norma do artigo 46º, nº 1 do EBF e a do referido artigo 10º, nº5 do Código do IRS, confirma que, na ausência de um preceito análogo ao do nº 9 do artigo 46º do EBF, a referência a “habitação própria e permanente” não exige a identidade desta com o domicílio fiscal, ou seja, se o legislador sentiu necessidade de, face ao disposto no nº 1 do artigo 46º do EBF, introduzir a norma do nº 9, é porque entendeu que a redação daquele, sem esta, não exigia a fixação de domicílio fiscal pelo sujeito passivo, no imóvel adquirido. Conjugada esta circunstância com o facto de a actual redação da norma do EBF em causa (artigo 46º, nº 9), ter sido introduzida pela Lei nº 109-B/2001, de 27 de Dezembro, quando o artigo 10º, nº 5 do Código do IRS já tinha a sua actual redacção reforça, uma vez mais, a ideia de que, efectivamente, o teor do nº 9 do artigo 46º do EBF se limita, como a própria norma o afirma, ao próprio artigo que integra.

[9] Neste sentido, vide Decisão Arbitral nº 146/2015-T, de 16 de Dezembro de 2015.

[10] Neste sentido, vide Decisão Arbitral nº 146/2015-T, de 16 de Dezembro de 2015, quando refere que “(…) os imóveis de "partida" e de "chegada" têm de ser destinados à habitação própria e permanente o primeiro tem que o ser na data da alienação e o segundo até seis meses a contar da aquisição. Qualquer outro destino de ambos, ou de só de um deles (…), destrói as condições de aplicação da exclusão de incidência e a mais valia realizada no imóvel de "partida" será tributável (Cf., neste sentido, José Guilherme Xavier de Basto, IRS, Incidência Real e Determinação dos Rendimentos Líquidos, Coimbra Editora, pags. 413/414) e ainda na Jurisprudência, (…) os Acórdãos do STA de 9-7-2014 – Proc 01146 (Cons Dulce Neto), de 25-3-2015 – Proc 0158/13 (Cons Pedro Delgado) e de 17-9-2014 – Proc 0250/14 (Cons Casimiro Gonçalves)” (sublinhado nosso).