Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 368/2017-T
Data da decisão: 2018-04-12  IRC  
Valor do pedido: € 205.616,91
Tema: IRC – Pagamentos a entidade sujeita a regime fiscal mais favorável.
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 Acordam os Árbitros José Pedro Carvalho (Árbitro Presidente), Carla Castelo Trindade e Elísio Brandão, designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa para formarem Tribunal Arbitral, na seguinte

 

 

DECISÃO ARBITRAL (CONSULTAR VERSÃO COMPLETA NO PDF)

 

I – RELATÓRIO

 

  1. No dia 09 de Junho de 2017, A…, S.A., NIPC…, com sede na …,  … …, …-… …, apresentou pedido de constituição de tribunal arbitral, ao abrigo das disposições conjugadas dos artigos 2.º e 10.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, que aprovou o Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, com a redacção introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro (doravante, abreviadamente designado RJAT), visando a declaração de ilegalidade dos actos tributários consubstanciados na demostração de liquidação de IRC n.º 2017…, referente ao exercício de 2013, e respectiva liquidação de juros compensatórios n.º 2017…, assim como da demonstração de acerto de contas n.º 2017…, no valor total de €205.616,91.
  2. Para fundamentar o seu pedido alega a Requerente, em síntese:
  1. O cumprimento do ónus da prova que sobre si recaía, afastando assim a presunção do artigo 65.º, n.º1 do Código do IRC com a redação em vigor à data dos factos;
  2. A ilegalidade do acto tributário, uma vez que a descoberta da verdade material e a tributação conforme à lei, exige que a AT justifique a consideração da prova como insuficiente e indique que elementos considerava serem suficientes para se considerar a prova produzida;
  3. O vício de violação de lei por erro nos pressupostos de facto e de direito, uma vez que considera resultar demonstrada a importância real das vantagens auferidas pelos contratos por si celebrados com as sociedades residentes em Hong Kong e que os encargos estabelecidos constituem a justa remuneração dessas vantagens;
  4. Violação de lei, por inobservância do artigo 23.º, n,º 1 do Código do IRC pelo facto de a AT não ter considerado os gastos com as sociedades com sede em Hong Kong e com a cessão de créditos, indispensáveis à obtenção do rendimento;
  5. O incumprimento do ónus da prova que cabia à AT por força do artigo 74º, n.º1 LGT;
  6. A violação do artigo 77.º, n.º 2 da LGT pelo facto de a argumentação da AT ser obscura, insuficiente, incongruente e carente de argumentação e demonstração relevantes;
  7. A ilegalidade da liquidação dos juros compensatórios;

 

  1. No dia 12 de Junho de 2017, o pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite e automaticamente notificado à AT.

 

  1. A Requerente não procedeu à nomeação de árbitro, pelo que, ao abrigo do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea a) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, o Senhor Presidente do Conselho Deontológico do CAAD designou os signatários como árbitros do tribunal arbitral colectivo, que comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável.

 

  1. Em 03-08-2017, as partes foram notificadas dessas designações, não tendo manifestado vontade de recusar qualquer delas.

 

  1. Em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, o Tribunal Arbitral colectivo foi constituído em 21-08-2017.

 

  1. No dia 03-10-2017, a Requerida, devidamente notificada para o efeito, apresentou a sua resposta defendendo-se unicamente por impugnação.

 

  1. No dia 21-12-2017, realizou-se a reunião a que alude o artigo 18.º do RJAT, onde foram inquiridas as testemunhas, no acto, apresentadas pela Requerente / Ao abrigo do disposto nas als. c) e e) do art.º 16.º, e n.º 2 do art.º 29.º, ambos do RJAT, foi dispensada a realização da reunião a que alude o art.º 18.º do RJAT.

 

  1. Tendo sido concedido prazo para a apresentação de alegações escritas, foram as mesmas apresentadas pelas partes, pronunciando-se sobre a prova produzida e reiterando e desenvolvendo as respectivas posições jurídicas.

 

  1. Foi prorrogado por 60 dias o prazo a que alude o artigo 21.º/1 do RJAT.

 

  1. O Tribunal Arbitral é materialmente competente e encontra-se regularmente constituído, nos termos dos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), 5.º. e 6.º, n.º 1, do RJAT.

 

As partes têm personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão legalmente representadas, nos termos dos artigos 4.º e 10.º do RJAT e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março.

 

O processo não enferma de nulidades.

 

Assim, não há qualquer obstáculo à apreciação da causa.

 

Tudo visto, cumpre proferir

 

II. DECISÃO

A. MATÉRIA DE FACTO

A.1. Factos dados como provados

 

  1. A Requerente é, e era em 2013, uma sociedade anónima inscrita na actividade de compra e venda de bens imobiliários à qual corresponde o CAE – 68100, cujo objecto integra a compra e venda de imóveis e a gerência de activos, consubstanciada quer na actividade de subarrendamento, quer na actividade de alojamento local mobilado para turistas.
  2. Em 2013 a Requerente esteve enquadrada no regime geral de tributação em IRC e no regime de isenção do artigo 9.º do CIVA.
  3. Em 10-05-2016, a Requerente foi alvo de um procedimento de inspecção externa, de âmbito geral e com incidência nos exercícios de 2013 e 2014, através da Ordem de Serviço nºs OI2016… e OI2016…, que teve origem na Proposta de Inspecção PIP 2016…, efectuada no âmbito do projecto de 2016 – Controlo do Sector de Promoção e Mediação Imobiliária.
  4. O prazo do procedimento de inspecção foi prorrogado por três meses, tendo a Requerente sido notificada desse facto através do Ofício … de 21-10-2016.
  5. A Requerente foi notificada em 18-11-2016 da nota de diligência de conclusão dos procedimentos inspectivos e do Projecto de Relatório de Inspecção Tributária, no qual era proposta a seguinte correcção:

  1. A Requerente foi, ainda, notificada, nos termos do artigo 60.º do RCPITA e artigo 60.º da LGT para, querendo, exercer o seu direito de audição, o que fez, nos termos referidos infra, em 06-12-2016.
  2. Em 21-11-2013 a Requerente adquiriu por escritura pública, à sociedade B… S.A. – em liquidação, 213 bens imóveis localizados na freguesia do … (actuais artigos matriciais …, …e … da freguesia …), pelo montante de €18.412.564,93, destinados a posterior revenda.
  3. O montante de €18.412.564,93 relativo à compra dos imóveis, foi registado nas contas de Mercadorias, da seguinte forma: …-Lote …, …-Lote … e …-Lote ….
  4. A aquisição dos referidos imóveis foi financiada pelo Banco C…, S.A., que era credor no processo de insolvência da sociedade B… S.A., detendo uma posição que lhe permitia inviabilizar qualquer aquisição do património daquela sociedade.
  5. Como condição fundamental à celebração do contrato de financiamento, o Banco C…, S.A. impôs a cessão à Requerente dos créditos, no valor de €5.530.118,00, que o mesmo detinha sobre as sociedades “D… S.A.”, no montante de €4.102.520,00 e “E…, S.A.”, no montante de €1.427.598,00.
  6. Na data da celebração do contrato de mútuo, foi celebrado entre a Requerente e o Banco C…, S.A. um contrato de cessão de créditos N.º …_2012 no valor total de €5.530.118,00 que tinha por objecto os créditos que o Banco C…, S.A. detinha sobre as sociedades, ambas declaradas insolventes, “D…S.A.” e “E…, S.A”, no valor de €4.102.520,00 e €1.427.598,00, respectivamente.
  7. O contrato de cessão de créditos entre a Requente e o Banco C… S.A. foi celebrado nos seguintes termos:
  1. O Banco C… é legítimo titular dos seguintes créditos (Item A):
  1. Crédito de 1.427.597,50€ sobre a sociedade “E…S.A.”, com o NIF …;
  2. Crédito de 4.102.520,05€ sobre a sociedade D… S.A., com o NIF…;
  1. Os referidos créditos foram reclamados pelo Banco C… nos processos de insolvência das sociedades devedoras, processo …/12… TYLSB no qual é Insolvente a sociedade “E… S.A”. e processo …/12… TYLSB no qual é insolvente a sociedade “D… S.A.”, ambos no … Juízo do Tribunal do Comércio de …, tendo os referidos créditos sido reclamados na sua totalidade (Item B);
  2. O Banco C… vende à A… os dois créditos de que é titular referidos em 1, nos montantes de 1.427.597,50€ e 4.102.520,05€, sobre as sociedades E… S.A”. e “D… S.A.”, respectivamente no valor total de 5.530.117,55€ (cláusula primeira)
  3. A cessão é efectuada pelo preço global igual ao valor total dos créditos referidos na cláusula primeira, que a A… pagou ao Banco C… na presente data (cláusula segunda)
  4. O Banco C… garante expressamente à A… a existência e a exigibilidade dos créditos objecto de cessão, mas não garante a solvabilidade dos respectivos devedores, nem o pagamento do crédito cedido (cláusula terceira)
  5. Compete à A… notificar os devedores da cessão nos termos e para os efeitos de que dispõe o artigo 583.º do Código Civil (cláusula quarta)
  6. O Banco C… entregará à A…, após solicitação escrita, os documentos que se encontrem em sua posse que sejam necessários para titular os créditos objecto da presente cessão (cláusula sexta)
  1. A declaração de insolvência da sociedade “D… S.A.” data de 14-06-2012.
  2. A declaração de insolvência da sociedade “E…, S.A.” data de 17-10-2012.
  3. No que diz respeito ao processo de insolvência da sociedade “D…, S.A.”:
  1. O Banco C… reclamou créditos no valor de €5.755.886,30;
  2. O crédito foi reconhecido como comum e sob condição;
  3. O Banco C… cedeu parte dos créditos que detinha à Requerente, no valor de €4.102.520,05, tendo sido feita a habilitação no processo;
  4. Foi aprovado e homologado o plano de insolvência, o qual prevê a liquidação controlada do ativo;
  5. À data da propositura da presente acção arbitral ainda não havia sido proferida sentença de verificação e graduação de créditos;
  1. No que se refere à insolvência da “E…, S.A.”:
  1. O Banco C… reclamou créditos no valor de €6.776.193,06;
  2. O crédito foi reconhecido comum e sob condição;
  3. O Banco C… cedeu parte dos créditos que detinha à Requerente no valor de €1.427.597,50;
  4. Foi proferida sentença que julgou a Requerente devidamente habilitada no processo;
  5. Foi aprovado e homologado o plano de insolvência, de acordo com o qual nos dois primeiros anos de vigência houve carência de pagamento do capital pelo que eram apenas devidos juros, iniciando-se a partir dessa data pagamento do capital em dívida;
  6. Foi proferida sentença a julgar extinto o apenso de verificação e graduação de créditos em virtude de ter sido aprovado e homologado o plano;
  7. À data da propositura da presente acção arbitral o processo já estava encerrado, mas a Requerente não tinha recebido qualquer pagamento no âmbito do plano aprovado;
  1. Sem a aquisição, pela Requerente, dos créditos detidos sobre estas sociedades pelo Banco C…, S.A., o financiamento não teria sido concedido e a Requerente não teria adquirido os 213 imóveis para revenda.
  2. Nos exercícios de 2013 e 2014 foram reconhecidos como gastos na rubrica “Custos das Mercadorias Vendidas e Consumidas”, conta 6111, os montantes de €852.706,65 e €10.158.139,01, respectivamente.
  3. O montante de €5.530.117,55, relativo ao contrato de cessão de créditos, foi considerado como despesa de compra e, consequentemente, registado na rubrica Inventários, conta 3211, através do documento de Operações Diversas 110.002 e imputado aos 213 imóveis adquiridos, de forma proporcional ao valor de aquisição de cada imóvel.
  4. No decurso da acção inspectiva a Requerente foi notificada para:
  1. Indicar o motivo subjacente à realização do contrato, ou seja, indicar as vantagens obtidas ou a obter (ponto 1.1 da notificação)
  2. Apresentar a notificação aos devedores D…, S.A. da existência da cessão de créditos (ponto 1.2 da notificação)
  3. Justificar a cessão de créditos em inventários e não em contas a receber (ponto 1.4 da notificação)
  1.  Relativamente ao ponto 1.1 da notificação, a Requerente referiu o seguinte: “Conforme ficou consignado na Ata nº1 do Conselho de Administração de 17-09-2013 e na Ata nº4 da Assembleia Geral de 17-09-2013, foi entendido que, apesar de os créditos serem de difícil cobrança, era expectável que, num cenário de venda livre e de exploração do nicho de mercado Golden Visa, o valor dos ativos dos bens a adquirir viesse a ser superior ao seu valor de aquisição acrescido dos créditos.

Perspectivou-se, por isso que a operação trouxesse uma boa rentabilidade à sociedade, mesmo contabilizando os riscos inerentes à cobrança dos respetivos créditos. Acresce que constitui pressuposto do negócio que o Banco concedesse financiamento à sociedade para aquisição de todos os ativos. Ou seja, a Cessão de Créditos foi uma imposição da instituição financeira (Banco C…), sem os quais não poderia realizar-se a aquisição dos imóveis”.

  1. Relativamente ao ponto 1.2 da notificação, a sociedade apresentou as notificações enviadas com carta registada e AR em 13-02.2014 e 10-04-2014, respectivamente para o Administrador de Insolvência de D… e para a Administração de E… Quanto ao ponto 1.4 da notificação, e no que respeita à justificação da contabilização da cessão de créditos em inventários, a Requerente referiu que a cessão de créditos foi uma imposição do Banco C… sem a qual não poderia realizar-se a aquisição dos imóveis tendo ainda referido que desde o início era conhecido que eles nunca seriam realizáveis tratando-se por isso de um custo adicional do negócio principal que era a aquisição dos imóveis.
  2. A Requerente notificou as sociedades devedoras de que deviam reconhecê-la como credora e de que faria a apresentação do incidente de habilitação do cessionário, por apenso aos processos de insolvência;
  3. Do Projecto de Relatório de Inspecção emitido pela Direcção de Finanças de … consta o seguinte:

 


 

  1. A Requerente, notificada para exercer o seu direito de audição, invocou o seguinte:

 

  1. Nos períodos de tributação de 2013 e 2014, a Requerente teve vários clientes de nacionalidade chinesa a quem vendeu os seus imóveis no âmbito do regime “Golden Visa”.
  2. Tais clientes estrangeiros foram agenciados por empresas do seu país de origem chegando a Portugal por intermédio daquelas.
  3. A Requerente contratou os serviços das sociedades “F…” e “G…” com sede em Hong Kong e da sociedade “H…, Lda.”, com sede em Macau.
  4. A “G…” e a “F…” eram sociedades de direito chinês, que se dedicavam, para além do mais, à prestação de serviços a cidadãos chineses com vista à obtenção, por estes, da autorização de residência em países da União Europeia, como é o caso de Portugal, Irlanda, Chipre, Malta, Espanha, Grécia, Reino Unido, Alemanha e Itália, através do investimento em imóveis.
  5. A “G…” era uma sociedade que contava com escritórios em Hong Kong, Pequim, Chengdu, Guangzhou, Chipre (I… Chipre), Itália, Coreia, Malta, Portugal, Shenzhen, Xangai, Espanha, Tailândia, Estados Unidos da América, e Vietname, dispunha de cerca de 750 parcerias com empresas espalhadas por todo o mundo, de mais de 600 colaboradores e de um vasto portefólio de imobiliário e de projectos de investimento em Portugal, Irlanda, Chipre, Malta, Espanha, Grécia, Reino Unido, Alemanha, Itália, St. Kitts e Estados Unidos da América.
  6. A sociedade “G…” foi distinguida pela Câmara de Comércio e Indústria Luso-Chinesa para o Prémio de Mérito Empresarial.
  7.  A “G…” e a “F…” eram sociedades que constituíam uma plataforma de promoção global de imóveis e de serviços de investimento diversos.
  8. A Requerente não é sócia, accionista nem titular de qualquer cargo na sociedade “G…”, nem sequer tem qualquer relação com os seus accionistas, administradores ou procuradores.
  9. No ano de 2012, as vendas de imóveis efectuadas pela Requente registaram um valor de €220,00.
  10. A Requerente teve, através daquelas empresas, pela primeira vez, a oportunidade de vender os seus imóveis a cidadãos chineses.
  11. Nos anos de 2013 e 2014, a Requerente alienou 78 imóveis pelo montante total de € 27.034.546,00, sendo €1.544.500,00 relativo a 5 imóveis vendidos no ano de 2013 e €25.490.046,00 relativos a 73 imóveis vendidos no ano de 2014.
  12. Da totalidade dos imóveis vendidos, 76 imóveis foram adquiridos por cidadãos não residentes em Portugal, provenientes da República Popular da China, e os restantes dois imóveis foram adquiridos por sociedades nacionais.
  13. Com a colaboração e a prestação de serviços das referidas sociedades sediadas em Hong Kong, a Requerente vendeu 4 das 5 unidades vendidas em 2013 no valor de €1.534.900, e 51 das 73 unidades vendidas em 2014 no valor de €17.237.778,01.
  14. Os contratos celebrados entre a Requerente e as sociedades “F…” e “G…” vigoraram apenas nos anos de 2013 e 2014, já que a partir do ano de 2015 tais sociedades se fixaram em território nacional, constituindo as suas próprias empresas imobiliárias em Portugal, as quais passaram a exercer a actividade de compra e venda de imóveis directamente aos investidores chineses.
  15. Quando terminou a prestação de serviços entre a Requerente e a “G…”, a Requerente procurou, sem sucesso, explorar o mercado chinês sozinha.
  16. Desde a abertura dos escritórios da “G…” em Portugal, a Requerente não realizou qualquer venda a cidadãos chineses.
  17. As referidas sociedades de direito chinês mantiveram o domínio de todo o processo de venda e ofereceram bastante resistência em partilhar informação e know-how com os portugueses, para evitar que o modelo pudesse ser replicado pelos promotores nacionais na China.
  18. Nos anos em análise, foram emitidas à Requerente, pelas sociedades “G…” e “F…”, ambas residentes em Hong Kong, facturas referentes aos serviços prestados relacionados coma venda de imóveis.
  19. A sociedade “F…” emitiu uma factura no ano 2014, no montante de €44.160,00, sendo as restantes facturas emitidas pela sociedade “G…”, no total de €3.695.072,76.
  20. Nas facturas emitidas pela sociedade “G…” constam as seguintes descrições:
  21. Os encargos debitados nas facturas referidas foram reconhecidos pela Requerente como gastos na rúbrica Fornecimentos e Serviços Externos, conta 622101 – Marketing, no ano de 2013, e conta 62253 – Comissões a não residentes no ano de 2014.
  22. A Requerente procedeu à liquidação e entrega nos cofres do Estado do IVA, à taxa em vigor de 23%, relativamente às facturas referidas, nos anos de 2013 e 2014, pelos montantes de €52.954,05 e de €807.069,48, respectivamente.
  23. O IVA liquidado foi reconhecido como gasto nas contas 622101-Marketing e 62253- Comissões a não residentes, contas onde também foram registadas as facturas associadas.
  24. No ano de 2013, o montante debitado nas referidas facturas corresponde a 15% do valor da venda da fracção associada à mesma.
  25. No ano de 2014 deu-se que:
    1.  em 10 fracções não foi debitado qualquer encargo pelas sociedades em causa;
    2. em 62 fracções o montante debitado pela sociedade “G…” varia entre 19,25% e 22% do valor da venda da fracção associada;
  26. O montante debitado pela sociedade “F…” relativamente a uma fracção, corresponde a 12% do valor da venda associada
  27. A comissão devida pela Requerente à “G…” como contrapartida dos serviços de angariação de clientes era, inicialmente, em 2013, de 15%, passando para 20%, em 2014.
  28. A Requerente procurou resistir ao aumento da comissão cobrada pela “G…” de 15% para 20%.
  29. Durante o período em que a Requerente procurou resistir ao aumento da comissão, concretamente, entre Dezembro de 2013 e Fevereiro de 2014, a “G…” não angariou clientes chineses para adquirir imóveis detidos pela Requerente e a Requerente não vendeu quaisquer imóveis.
  30. A comissão apenas era devida à “G…” nos casos em que se concretiza a venda de imóveis aos clientes por aquela angariados.
  31. As comissões pagas pela Requerente pelos serviços prestados pelas referidas sociedades com sede em Hong Kong, foram por aquela aceites pelo facto de ser a primeira vez que tinha contacto com o mercado chinês e pelo facto de o sector imobiliário ter estado durante bastante tempo estagnado, o que levou a que a oportunidade de vender imóveis a clientes chineses no âmbito do regime dos “Golden visa” representasse uma possibilidade de recuperação,
  32. As comissões pagas pela Requerente às sociedades com sede em Hong Kong no ano de 2013 – 15% do preço de venda – é inferior às comissões pagas pela Requerente à sociedade “H…, Lda.”, com sede em Macau, à qual adquiriu serviços idênticos, pagando uma comissão de 18%, que não foi objecto de qualquer correcção.
  33. Não existiam, no mercado imobiliário, alternativas aos serviços prestados pela “G…”, em termos de oportunidade de venda do mesmo número de imóveis aos preços que foram praticados.
  34. As agências chinesas prestavam um serviço bastante mais completo do que aquele que era prestado pelas agências imobiliárias em Portugal, uma vez que:
    1.  divulgavam e promoviam imóveis na China;
    2. estabeleciam e mantinham uma rede de parcerias com agências de emigração na China;
    3. promoviam a angariação de clientes, tratavam de toda a documentação exigida pelo Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF), bem como das autorizações e diligências necessárias à transferência do dinheiro, deslocavam para a China técnicos portugueses, designadamente juristas para explicar o programa dos Vistos Gold e elaborar contratos-promessa de compra  e venda, bem como tradutores, tratavam e suportavam os custos da deslocação do potencial comprador e respectiva família, acompanhados de um intérprete, e acompanhavam todo o processo destinado à obtenção de autorização de residência em Portugal
    4. faziam o serviço pós venda de acompanhamento do investidor
    5.  convenciam o investidor chinês a aderir a este regime e a adquirir imóveis em Portugal.
  35. Os preços de venda dos imóveis detidos pela Requerente foram fixados de modo a incluir as comissões devidas à “G…” pelos serviços de angariação dos clientes chineses.
  36. O montante de compras declarado pela Requerente no exercício de 2013, de €24.013.184,48, corresponde ao somatório do valor de aquisição dos imóveis e dos valores considerados como despesas de compra, como mostra o quadro seguinte:

 

  1. Nos exercícios de 2013 e 2014 foram reconhecidos como gastos na rúbrica Custo das Mercadorias Vendidas e Consumidas, conta 6111, os montantes de €852.706,65 e €10.158.139,01, respectivamente, os quais foram assim determinados:

  1. No decurso da inspecção tributária, os serviços de inspecção tributária notificaram a Requerente, na pessoa do seu procurador J…, para, no dia 20-07-2016, indicar quais os serviços prestados à Requerente pelas sociedades “G…” e “F…”, bem como apresentar elementos que pudessem ser considerados como prova da realização efectiva dos serviços facturados, de modo que permitissem concluir que os serviços influenciaram a venda dos imóveis e que não são de montantes exagerados.
  2.  Em resposta, a Requerente referiu o seguinte:

“As sociedades G… e F… são sociedades de direito chinês que se dedicam à prestação de serviços a cidadãos chineses tendo em vista a obtenção, por estes, da autorização de residência em países da União Europeia, como é o caso de Portugal. Estas sociedades têm desenvolvido actividades de promoção do programa “Golden Visa” Português por todo o território chinês, através de seminários, conferências, anúncios televisivos e outros materiais publicitários, onde evidenciam as vantagens e benefícios de investir/viver em Portugal e prestam informação detalhada sobre os imóveis em Portugal. Para além desta actividade de promoção, estas sociedades organizam toda a logística associada à deslocação de potenciais investidores a Portugal, como seja o transporte da China para Portugal, o alojamento em Portugal, as deslocações aos imóveis e a obtenção do visto de turismo para entrada e estada em Portugal junto da Embaixada e Consulados Portugueses na China. Já em território português, estas sociedades assistem os clientes em praticamente todo o processo de investimento arranjando-lhes tradutores, advogados e motoristas, acompanhando-os e auxiliando-os junto do SEF, das finanças e na abertura de contas nos bancos, bem como no processo de procura, escolha e aquisição de imóveis em Portugal. Estes serviços não só permitiram à expoente o acesso a estes clientes, que de outro modo seria impossível, dadas as diferenças linguísticas e culturais e a ausência de know-how relativamente a este tipo de clientes e de mercado, como foram decisivos para a venda de imóveis da expoente. Só para se ter uma ideia da importância da colaboração destas sociedades e da influência dos serviços por elas prestados para a conclusão dos negócios realizados, desde que a Expoente deixou de colaborar com estas sociedades (e isto aconteceu porque estas sociedades passaram a criar as suas próprias empresas em Portugal que compram imóveis e vendem diretamente aos investidores chineses) não realizou mais vendas a cidadãos oriundos da República Popular da China. Quanto aos montantes praticados por estas sociedades, recorde-se que o sector imobiliário nacional esteve durante bastante tempo estagnado e que as empresas que se dedicavam a este sector, como é o caso da Expoente, estavam numa situação bastante difícil, pelo que quando este mercado chinês surgiu, a Expoente não estava em condições de ditar as regras e como se compreenderá, quis aproveitar essa oportunidade.

Acresce que, como se disse, a Expoente jamais conseguiria penetrar neste mercado chinês, sem a ajuda destas sociedades. Notamos que estas sociedades gostam de dominar todo o processo e oferecem uma grande resistência em partilhar informação e know-how aos portugueses para evitar que o modelo possa ser replicado pelos promotores nacionais na China, o que os torna, naturalmente ainda mais indispensáveis. Acresce que a política de comissionamento praticada por estas sociedades devido à especificidade do mercado chinês, ao esforço empregue, ao tempo perdido com cada cliente, aos recursos utilizados, aos investimentos em feiras e seminários, à logística necessária, aos custos com a promoção e marketing, não poderia ser a mesma do que a praticada no mercado nacional como por exemplo pela “K…” que, para além do investimento e do esforço ser muito menor, na maioria das vezes só tem que levar o investidor/cliente da sua loja até ao promotor.

Em suma, este foi o custo imposto por estas sociedades, que sabiam que eram indispensáveis aos promotores portugueses, e o certo é que estes serviços foram decisivos para as vendas efectuadas pela Expoente”

  1.  A Requerente colocou à disposição da AT os seguintes elementos, relativamente a cada um dos imóveis vendidos:
  • cópias certificadas por notária dos contratos de compra e venda, onde figuram como procuradores dos clientes/adquirentes chineses, advogados das sociedades de advogados portuguesas que prestavam serviços à “G…” e à “F…”, a saber: L… e a M…;
  • cópia dos contratos promessa de compra e venda traduzidos por tradutor (que assina os documentos);
  • recibos/declaração a atestar o recebimento do valor do sinal com informação bancária do cliente/adquirente chinês;
  • formulários de confirmação da compra dos imóveis, em Português, em mandarim e em inglês (o que revela a intervenção do tradutor), com toda a informação sobre a compra (ex: preço, IMT, imposto selo, IMI, valor de manutenção, preço de reserva, data da assinatura do contrato), assinados pela Requerente e pelos adquirentes/chineses.
  • e-mails trocados entre a “G…”, a Requerente e os advogados da “G…” e a “F…” sobre as transacções
  1. A Requerente também disponibilizou à AT:
  • Listagem dos colaboradores da “G…” com quem a Requerente trocou e-mails, estabeleceu contactos telefónicos e que intervieram na venda dos imóveis aos investidores chineses por eles angariados
  • Listagem dos promotores/empreendimentos que recorreram aos serviços da “G…”.
  • Listagem das mediadoras imobiliárias que trabalharam com o mercado asiático e com comissões internacionais.
  1.  Do Projecto de Relatório de Inspecção, consta o seguinte:

 

 

 

 

 

 

 

 

  1. Notificada para exercer o direito de audição, a Requerente veio, nessa sede, alegar o seguinte:

 

 

 


 

 

 

 

 

  1. Os Serviços de Inspecção Tributária emitiram o Relatório Final de Inspecção Tributária, concluindo ser de manter todas as correcções projectadas nos termos inicialmente propostos. 
  2. Na sequência dos actos inspectivos, foram determinadas as seguintes correcções à matéria colectável em sede de IRC:

 

  1. A Requerente foi notificada da liquidação de IRC n.º 2017… relativa ao exercício de 2013, e respectiva liquidação de juros compensatórios n.º 2017 … tendo sido apurado um montante a pagar, no valor global de
  2. € 205.616,91.

 

A.2. Factos dados como não provados

Com relevo para a decisão, não existem factos que devam considerar-se como não provados.

 

A.3. Fundamentação da matéria de facto provada e não provada

Relativamente à matéria de facto o Tribunal não tem que se pronunciar sobre tudo o que foi alegado pelas partes, cabendo-lhe, sim, o dever de selecionar os factos que importam para a decisão e discriminar a matéria provada da não provada (cfr. art.º 123.º, n.º 2, do CPPT e artigo 607.º, n.º 3 do CPC, aplicáveis ex vi artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e e), do RJAT).

Deste modo, os factos pertinentes para o julgamento da causa são escolhidos e recortados em função da sua relevância jurídica, a qual é estabelecida em atenção às várias soluções plausíveis da(s) questão(ões) de Direito (cfr. anterior artigo 511.º, n.º 1, do CPC, correspondente ao actual artigo 596.º, aplicável ex vi do artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT), incluindo-se os factos instrumentais que resultaram da discussão da causa (artigo 5.º n.º 2 alínea a) do CPC).

Assim, tendo em consideração as posições assumidas pelas partes, à luz do artigo 110.º, n.º 7 do CPPT, a prova documental e testemunhal, e o PA junto aos autos, consideraram-se provados, com relevo para a decisão, os factos acima elencados, tendo em conta que, como se escreveu no Ac. do TCA-Sul de 26-06-2014, proferido no processo 07148/13[1], “o valor probatório do relatório da inspecção tributária (...) poderá ter força probatória se as asserções que do mesmo constem não forem impugnadas”.

Em especial, os factos constantes dos pontos 9, 10, 17, 28, 30, 31, 33, 34, 36, 40 a 46, 55 a 57, 59 a 61, tiveram em consideração os depoimentos prestados na reunião a que alude o artigo 18.º do RJAT, que corroborou e complementou a prova documental disponível, tendo sido de especial relevância as declarações de J…, que demonstrou conhecimento directo da totalidade da matéria constante dos referidos pontos, relatando os factos de forma coerente e objectiva, em termos que, na parte em que incidiram, foram confirmados pelos restantes depoimentos, não quedando a este Tribunal qualquer dúvida razoável acerca da verificação dos factos em questão, tal como foram tidos como provados.

Não se deram como provadas nem não provadas alegações feitas pelas partes, e apresentadas como factos, consistentes em afirmações estritamente conclusivas, insusceptíveis de prova e cuja veracidade se terá de aferir em relação à concreta matéria de facto acima consolidada.

Não se deram como não provados factos alegados pelas partes, incompatíveis com os factos dados como provados.

 

B. DO DIREITO

 

Na presente acção arbitral estão em causa duas correcções de natureza e fundamentos distintos, a saber:

  1. correcção relativa ao contrato de cessão de créditos, considerado pela Requerente como despesa de compra e, consequentemente, registado na rubrica Inventários, conta 3211, através do documento de Operações Diversas 110.002 e imputado aos 213 imóveis adquiridos, de forma proporcional ao valor de aquisição de cada imóvel;
  2. correcção e tributação autónoma relativas aos gastos com pagamentos às sociedades “G…” e a “F…”.

Vejamos então, separadamente cada uma delas.

 

*

i.

            A primeira questão a resolver reconduz-se, fundamentalmente, a apurar se um gasto com a aquisição de um crédito, incorrido por um sujeito passivo apenas porque tal foi condição essencial para que fosse possível adquirir um bem para o respectivo inventário, deve ser, ou não, considerado um gasto desse inventário, ou seja, e, em concreto, se o montante dos créditos adquiridos pela Requerente poderia ser contabilizado como um gasto inicial dos inventários.

            A AT considerou, em suma, não existir qualquer fundamento para que a aquisição dos créditos tenha sido considerada como um custo de compra, tendo em conta que:

  • A A… notificou as sociedades devedoras de que deviam reconhecê-la como credora e de que faria a apresentação de incidente de habilitação do cessionário, por apenso aos processos de insolvência;
  • Os processos de insolvência estavam em curso, e em ambos foi aprovado plano de insolvência.

Mais se considerou no RIT, em sede de apreciação do direito de audição, que:

- Não foi apresentada qualquer prova de que houve imposição do Banco C… para aquisição dos créditos;

- Não foi demonstrado que no início era conhecido o desenlace final dos créditos, que eles nunca seriam realizáveis, nem é conhecido na data actual, dado que os planos de insolvência se encontram em curso;

- A contabilização na rúbrica Inventários não está enquadrada no artigo 26.º n.º 2 do CIRC na redacção em vigor à data da contabilização.

Em sede arbitral, a Requerida alegou não ser verdade que a aquisição dos créditos tenha sido uma imposição do Banco C… e que, desde o início, era conhecido o desenlace final dos créditos, ou seja, que estes nunca seriam realizáveis e não sendo recuperáveis.

Mais alega a Requerida que a contabilização na rúbrica inventários não pode ser enquadrada no n.º 2 do artigo 26.º do Código do IRC, uma vez que “esta norma não tem aplicação no caso em análise, porquanto se refere a custos de empréstimos obtidos, que podem ser incluídos no custo de aquisição ou de produção no caso de os inventários requererem um período superior a um ano para atingirem a sua condição de venda.”.

Nota ainda a Requerida que “caso a sociedade venha a receber total ou parcialmente os créditos, dado que a contabilidade não reflete qualquer dívida a receber (uma vez que ela foi registada em Inventários), deixa de haver qualquer controle por parte da AT, existindo a possibilidade de o montante recebido não ser refletido na contabilidade, quer o Rendimento, quer o Fluxo Financeiro.”.

Refere ainda a Resposta da Requerida que “a aceitação das perdas por imparidade referentes a créditos de cobrança duvidosa, como fiscalmente dedutíveis, depende que essas perdas sejam derivadas da atividade normal da entidade”, ou seja que “apenas os créditos que são originados por vendas de bens e prestações de serviços que sejam próprios dos objetivos principais da empresa são admitidos, estando afastados os créditos que resultem de meras operações de caráter financeiro, como é o caso em apreciação (aquisição de créditos de cobrança duvidosa)”.

A questão decidenda em apreço, desdobra-se, como se viu, em dois planos, colocando-se, em primeiro lugar, a nível factual e, subsequentemente, a nível do direito.

No que diz ao plano factual, entendeu a AT, como também se viu, que não foi apresentada qualquer prova de que houve imposição do Banco C… para aquisição dos créditos e que não foi demonstrado que no início era conhecido o desenlace final dos créditos, que eles nunca seriam realizáveis.

Ressalvado o respeito devido não é isso que resulta dos autos.

Com efeito, apura-se que o Banco C… era credor com posição de dominância no processo de insolvência onde os imóveis adquiridos pela Requerente foram vendidos, pelo que estava em posição de inviabilizar o negócio, se não fossem cumpridas as suas condições.

Por outro lado, é notório que a Requerente não teve qualquer vantagem, nem se indicia que tivesse qualquer interesse, na aquisição dos referidos créditos, a não ser para, justamente, assegurar a aquisição dos imóveis, sendo que, à falta de indícios noutro sentido o único interessado na parte do negócio relativa à transmissão dos créditos, seria o Banco, no contexto consabido de eliminação de activos “tóxicos” do balanço.

Acresce ainda que se apura que o preço contratualizado para a aquisição dos imóveis, acrescido do valor da cessão de créditos, está dentro do preço de mercado daqueles, como se denota da circunstância de o preço de venda daqueles ter acomodado uma margem de lucro razoável, reforçando assim a ideia de que a cessão de créditos terá sido parte do “preço” a pagar pela Requerente para adquirir os imóveis.

Por fim toda a prova testemunhal produzida, em termos coerentes com a prova documental disponível, foi no sentido de, justamente, a cessão de créditos ter sido uma condição essencial para o negócio, imposta pelo Banco.

Quanto à circunstância de ser conhecido, ou não, o destino dos créditos adquiridos, tendo em conta que se tratam de créditos comuns e sob condição e que os devedores já tinha sido declarados insolventes, nada indiciando que os mesmos seriam pagos, e verificando-se que mais de 5 anos passados da declaração de insolvência nada foi pago, julga-se que apenas por cartesiana e metódica dúvida se poderá questionar se os mesmos serão ou não pagos.

Não obsta a nenhuma das conclusões tiradas, as circunstâncias, relevadas pela AT, de a Requerente ter notificado as sociedades devedoras de que deviam reconhecê-la como credora e de que faria a apresentação de incidente de habilitação do cessionário, por apenso aos processos de insolvência, bem como de os processos de insolvência estavam em curso, e em ambos foi aprovado plano de insolvência.

Efectivamente, e quanto à primeira das referidas circunstâncias, estão em causa procedimentos normais da operação de cessão de créditos, a que a Requerente se obrigou contratualmente, não decorrendo daí nenhum indício relativamente à eventual recuperabilidade dos créditos, o mesmo ocorrendo, de resto, no que diz respeito à segunda das circunstâncias referidas, já que estando em causa, como se indicou, créditos comuns e condicionais, nada aponta no sentido de os mesmos terem qualquer possibilidade prática de recuperação.

Assentes, deste modo, os dados de facto, cumpre aferir então dos restantes argumentos onde a AT fundou a correcção ora em crise.

Tendo em conta a factualidade apurada, crê-se que a qualificação operada pela Requerente, não deverá ser censurada.

Com efeito, e desde logo, o artigo 11.º n.º 3 da LGT, impõe que:

Persistindo a dúvida sobre o sentido das normas de incidência a aplicar, deve atender-se à substância económica dos factos tributários”.

            Esta norma constitui, como se sabe, um afloramento do princípio da prevalência da substância sobre a forma, vigente na Contabilidade e acolhido no direito Fiscal.

            A este propósito, o §35 da Estrutura Conceptual do SNS menciona que:

“Se a informação deve representar fidedignamente as transacções e outros acontecimentos que tenha por fim representar, é necessário que eles sejam contabilizados e apresentados de acordo com a sua substância e realidade económica e não meramente com a sua forma legal. A substância das transacções ou de outros acontecimentos nem sempre é consistente com a que é mostrada pela sua forma legal ou idealizada.”.

Também a NCRF 18, relativa a “Inventários”, refere que:

“§9 Os inventários devem ser mensurados pelo custo ou valor realizável líquido, dos dois o mais baixo.

§10  O custo dos inventários deve incluir todos os custos de compra (...)

§11 Os custos de compra de inventários incluem o preço de compra, direitos de importação e outros impostos (que não sejam os subsequentemente recuperáveis das entidades fiscais pela entidade) e custos de transporte, manuseamento e outros custos directamente atribuíveis à aquisição de bens”

            Por sua vez a NCRF 29, relativa a “Activos Financeiros”, menciona que “§10 Quando um ativo financeiro ou um passivo financeiro é inicialmente reconhecido, uma entidade deve mensurá-lo pelo seu justo valor.”, sendo que “Justo valor: é a quantia pela qual um ativo pode ser trocado ou um passivo liquidado, entre partes conhecedoras e dispostas a isso, numa transação em que não exista relacionamento entre elas.”.

            No caso, como se referiu já, tudo indica que a aquisição dos créditos dos devedores insolventes está sinalagmaticamente ligada à aquisição dos 213 imóveis que a Requerente adquiriu para o seu inventário, pelo que, em substância, o custo de aquisição daqueles integrou, também, o preço de aquisição destes.

            Rigorosamente, a Requerente pelo preço de €18.412.564,93 + €5.530.118,00 adquiriu os 213 imóveis mais os créditos do Banco C… sobre as sociedades “D…S.A.”, no valor nominal de €4.102.520,00, e “E…, S.A.”, no valor nominal de €1.427.598,00.

            Sendo notório que o justo valor dos créditos - ou seja, a quantia pela qual os mesmos poderiam ser trocados entre partes conhecedoras e dispostas a isso, numa transação em que não existisse relacionamento entre elas - não correspondia, nem corresponde, ao seu valor nominal, a Requerente optou por considerar a totalidade do valor contratualizado como preço da cessão de créditos, como custo directamente atribuível à aquisição de bens, o que equivale a ter atribuído um valor de 0 aos créditos (activos financeiros) adquiridos.

            Ora, embora se possam ter dúvidas se o justo valor de tais activos será, efectivamente, 0, dúvidas essas que perpassam pelos articulados da Requerente (quando refere, por exemplo, que “a hipótese de recuperabilidade desses créditos mantém-se residual”), o certo é que:

  • Nada indicia que o seu justo valor corresponda minimamente ao seu valor nominal, como está subjacente às correcções operadas pela AT;
  • Nos termos do artigo 100.º, n.º 1 do CPPT, “Sempre que da prova produzida resulte a fundada dúvida sobre a existência e quantificação do facto tributário, deverá o acto impugnado ser anulado.

Conclui-se, deste modo, que a correcção ora em apreço enferma de erro nos pressupostos de facto, e consequente erro de direito, devendo por isso ser anulada, procedendo nesta parte o pedido arbitral.

Não obsta a tal conclusão o quanto alega a Requerida, a propósito do n.º 2 do artigo 26.º do Código do IRC, uma vez que o que está em causa, na sequência do que se viu, é a aplicação do n.º 1, alínea a), de tal norma.

Quanto aos reparos da Requerida a propósito das putativas dificuldades de controle por parte da AT, note-se, desde logo, que tal circunstância não é por si só um facto tributário nem tão pouco realidade que justifique sujeição a imposto, por um lado, e que, em todo o caso, essa dificuldade só se colocará se a Requerente não cumprir devidamente as suas obrigações contabilísticas e fiscais e, nesse caso, as dificuldades da AT serão equivalentes a muitos outros casos em que os contribuintes não cumprem aqueles deveres, sendo por isso que a Lei coloca à sua disposição vastos e diversos poderes de fiscalização, e sanciona pesadamente o incumprimento dos referidos deveres.

No mais, e aqui tratar-se-á de um equívoco de enquadramento da Requerida não está, em momento algum em causa, na presente situação, a “a aceitação das perdas por imparidade” (ou, como se refere no RIT, “desreconhecimento de créditos”), mas a mensuração dos valores de aquisição dos imóveis e dos créditos (ou seja, do seu reconhecimento) que, substancialmente, integram um negócio unitário, e cujo custo de aquisição dos dois elementos de natureza distinta não corresponde, manifestamente, às quantias que, contratualmente, lhe foram atribuídas, pelo que está em causa a aplicação da parte da NCRF 27 aplicável ao reconhecimento (§6 e ss) e, em especial, à mensuração inicial (§10) não a parte relativa às imparidades (§24 e ss.) ou desreconhecimentos (§34 e ss.).

 

*

ii.

No que diz respeito à correcção e tributação autónoma relativas aos gastos com pagamentos às sociedades “G…” e a “F…”, considerou a AT, em suma, que a Requerente não demonstrou, como lhe competia, a efectividade das operações nem a razoabilidade do valor correspondente aos gastos que contabilizou, considerando, resumidamente, que:

  1. a prova reunida não permite, concretamente, por referência ao descritivo das facturas em causa, identificar a concreta prestação de serviços aí identificada;
  2. não há igualmente prova que, concretamente, permita aferir da importância real das vantagens auferidas pela celebração do contrato com as duas entidades sedeadas em Hong Kong;
  3. a Requerente, relativamente à operação em causa não tem prova para demonstrar o carácter normal da mesma, atenta a existência de 10 imóveis vendidos em que não foi debitado qualquer encargo pelas sociedades localizadas em Hong Kong e, cujos preços de venda se apresentam elevados comparados com os valores de venda desse período, bem como o facto de existirem contratos celebrados com duas sociedades que praticam percentagens significativamente mais baixas às praticadas pela sociedade G…, entre 8% e 12%, sendo uma delas sedeada em Hong Kong.

Em causa, está a aplicação dos artigos 65.º do CIRC, na redacção da Lei n.º 64-B/2011, de 30 de Dezembro (vigente em 2013) e 88.º, n.º 8 do mesmo Código, que estabelecem o seguinte, no que ao caso interessa:

“Artigo 65.º

Pagamentos a entidades não residentes sujeitas a um regime fiscal privilegiado

1 – Não são dedutíveis para efeitos de determinação do lucro tributável as importâncias pagas ou devidas, a qualquer título, a pessoas singulares ou colectivas residentes fora do território português e aí submetidas a um regime fiscal claramente mais favorável, salvo se o sujeito passivo puder provar que tais encargos correspondem a operações efectivamente realizadas e não têm um carácter anormal ou um montante exagerado.

2 – Considera-se que uma pessoa singular ou colectiva está submetida a um regime fiscal claramente mais favorável quando o território de residência da mesma constar da lista aprovada por portaria do Ministro das Finanças ou quando aquela aí não for tributada em imposto sobre o rendimento idêntico ou análogo ao IRS ou ao IRC, ou quando, relativamente às importâncias pagas ou devidas mencionadas no número anterior, o montante de imposto pago for igual ou inferior a 60 % do imposto que seria devido se a referida entidade fosse considerada residente em território português.

3 – Para efeitos do disposto no número anterior, os sujeitos passivos devem possuir e, quando solicitado pela Direcção-Geral dos Impostos, fornecer os elementos comprovativos do imposto pago pela entidade não residente e dos cálculos efectuados para o apuramento do imposto que seria devido se a entidade fosse residente em território português, nos casos em que o território de residência da mesma não conste da lista aprovada por portaria do Ministro das Finanças.

4 – A prova a que se refere o n.º 1 deve ter lugar após notificação do sujeito passivo, efectuada com a antecedência mínima de 30 dias.”

“Artigo 88º

Taxas de tributação autónoma

(...)

8 - São sujeitas ao regime do n.º 1 ou do n.º 2, consoante os casos, sendo as taxas aplicáveis, respetivamente, 35 % ou 55 %, as despesas correspondentes a importâncias pagas ou devidas, a qualquer título, a pessoas singulares ou coletivas residentes fora do território português e aí submetidas a um regime fiscal claramente mais favorável, tal como definido nos termos do Código, salvo se o sujeito passivo puder provar que correspondem a operações efetivamente realizadas e não têm um caráter anormal ou um montante exagerado. (...)

14 - As taxas de tributação autónoma previstas no presente artigo são elevadas em 10 pontos percentuais quanto aos sujeitos passivos que apresentem prejuízo fiscal no período a que respeitem quaisquer dos factos tributários referidos nos números anteriores relacionados com o exercício de uma atividade de natureza comercial, industrial ou agrícola não isenta de IRC.”

            O território de Hong Kong estava incluído, em 2013, na «lista dos países, territórios e regiões com regimes de tributação privilegiada, claramente mais favoráveis», que consta da Portaria n.º 292/2011, de 8 de Novembro, que alterou a Portaria n.º 150/2004, de 13 de Fevereiro.

            Como se referiu, em causa no caso sub iudice está a prova, imposta por ambas as supra-citadas normas, relativamente à efectividade das operações e ao carácter normal ou não exagerado das operações.

a.

            Relativamente ao primeiro dos pontos referidos, não se tem por justificada qualquer dúvida, relativamente à ocorrência das operações e questão.

            Com efeito, como resulta da matéria provada, a Requerente teve vendas de apenas €200,00 no ano de 2012 e passou para um valor de €1.544.500,00 relativo a 5 imóveis vendidos no ano de 2013 sendo que 4 dessas 5 unidades, no valor de €1.534.900, foram vendidos a clientes chineses, residentes na China.

            Para além disso foi junta documentação comercial e correspondência trocada entre a Requerente e as empresas de Hong Kong relativa a essas actividades, e foi nesse sentido a prova produzida em audiência, por quem teve em Portugal contacto directo com essas actividades.

            Acresce ainda que não é colocado em causa o efectivo pagamento dos valores facturados e contabilizados como gasto, e que se verifica que a Requerente liquidou e entregou ao Estado IVA sobre aqueles valores.

            Por fim, e como se escreveu no processo arbitral 198/2017T, que se debruçou sobre situação análoga à dos presentes autos:

“Aliás, o facto, que não é controvertido, de a Requerente ter vendido grande quantidade de imóveis a cidadãos chineses é uma prova indirecta, mas convincente, de que houve uma eficiente actividade de angariação, pois sem esta não se vislumbra como poderiam ter conhecimento de que a Requerente dispunha de imóveis para venda. Por outro lado, o facto de que a remuneração da B… só era paga precisamente se fosse se tivesse como resultado a concretização das vendas, assegura que não houve pagamentos que não tivessem subjacente actividade de angariação.

            Por isso, não se justifica que não se considere provado que os gastos suportados pela Requerente com pagamentos à B… correspondem a operações efectivamente realizadas.

            Neste contexto, afigura-se manifestamente injustificado exigir, para prova da efectividade da actividade desenvolvida pela B…, a «identificação dos recursos humanos envolvidos, horas aplicadas e taxas horárias por consultor», a «evidência de reuniões, "surveys"; «saber se quem executou tem experiência profissional», pois, para além de serem informações que normalmente não serão acessíveis a quem contrata a uma empresa estrangeira serviços de angariação, não haverá grande preocupação do adquirente quando se trata de pagamentos que são efectuados apenas em função dos resultados.

            Deve dizer-se mesmo que a exigência de «identificação dos recursos humanos envolvidos» e o apuramento da respectiva experiência profissional numa actividade com a dimensão da descrita está para além dos limites da razoabilidade, pois, na sua literalidade, abrangerá a identificação de todos os que prestaram os serviços de transporte por avião, de serviços em restaurantes e hotéis, motoristas de táxis, etc.”

 

            Assim, é de considerar provado que os pagamentos correspondem a operações efectivamente realizadas.

            Relativamente às considerações da Requerida, assentes no descritivo das facturas em causa, que fazem, no período ora em causa, a serviços de “Marketing”, para lá de ter sido devidamente explicada pela prova testemunhal produzida, notar-se-á apenas que é hoje pacífico que “Em sede de IRC, o documento comprovativo e justificativo dos custos para efeitos do disposto nos arts. 23º, nº1, e 42º, nº 1, alínea g), do CIRC, não tem de assumir as formalidades essenciais exigidas para as facturas em sede de IVA, uma vez que a exigência de prova documental não se confunde nem se esgota na exigência de factura, bastando tão-só um documento escrito, em princípio externo e com menção das características fundamentais da operação, uma vez que ao contrário do que se passa com o IVA, em sede de IRC, a justificação do custo consubstancia uma formalidade probatória e, por isso, substituível por qualquer outro género de prova.”[2].

Relativamente à não existência de prova que permita aferir da importância real das vantagens auferidas pela celebração do contrato com as duas entidades sedeadas em Hong Kong, julga-se que a mesma é evidente, quer da evolução do volume de negócios da Requerente antes, durante e depois da existência da relação comercial com aquelas empresas (essencialmente com a G…), quer do peso da clientela residente na China, durante a vigência daquela mesma relação, quer da evolução do preço das fracções transaccionadas pela Requerente, de que a facturação desta dá conta.

 

b.

            Relativamente ao carácter normal e não exagerado das operações em questão, julga-se, também, que está suficientemente produzida prova nesse sentido.

            Com efeito, quer tendo em conta a dimensão da operação de angariar, transportar e acompanhar clientes para imóveis valorizados em centenas de milhar de euros, da China para Portugal, superando o fosso geográfico e cultural notoriamente existente, quer considerando o publicamente conhecido estado do sector imobiliário em Portugal nos anos de 2012 e seguintes, quer considerando a valorização dos imóveis que se verificou, e que a documentação recolhida pela própria AT denota, se compreenderá a ordem de valores das comissões que a Requerente pagou.

            Acresce ainda, no caso ora em causa, relativo ao ano de 2013, as comissões em questão ascenderam a 15%, estando provado que a Requerente pagou uma comissão de 18% a uma empresa sedeada em Macau, tendo a AT aceite o correspondente gasto.

            Daí que não se tenham quaisquer dúvidas que os valores em questão correspondem, no seu contexto, a operações normais e não têm carácter exagerado.

            Repristinando o quanto se escreveu no já referido acórdão arbitral proferido no processo 198/2017T:

“Para decidir se há ou não exagero não pode tomar-se como termos de comparação as percentagens das comissões que a Autoridade Tributária e Aduaneira diz serem cobradas habitualmente pelas empresas imobiliárias, entre 3% e 5%, pois a desenvolvida pela B… não se limita à que normalmente é levada a cabo na mediação imobiliária, que não envolve despesas da ordem das que se provou serem suportadas pela B… (pagamento de viagens, alojamento, alimentação, transportes, intérpretes, etc.).

Por outro lado, a aferição do requisito do não exagero, deverá ser efectuada tendo em conta a situação do sujeito passivo, procurando apurar se o pagamento deve considerar-se excessivo, sob a sua perspectiva, no contexto em que tem de decidir pagar os serviços.

Desta perspectiva, será exagerado o pagamento quando se demonstrar que o sujeito passivo podia obter o que o mesmo serviço por quantia inferior

Resulta da prova produzida que a Requerente pretendia vender o mais rapidamente possível os imóveis, pois estava previsto que o processo de construção e venda dos imóveis estivesse concluído até 2010, cinco anos após o início do processo de construção, e ainda não os tinha conseguido vender até 2013 e 2014, devido à situação de crie económica e financeira que afectava Portugal.

A prova produzida é também no sentido de que a Requerente não conseguia obter a angariação de clientes com pagamento de comissões inferiores, quer à B…, que não as aceitava, nem a outros prestadores de serviços de angariação, pois nenhum lhe proporcionava clientes que pagassem os preços de venda que a Requerente pretendia para si obter.

Nestas condições o pagamento não se pode considerar exagerado, pois está justificado pela necessidade de obtenção dos serviços de angariação e não haver alternativa a preço inferior.

A razoabilidade dos pagamentos efectuados à B… é ainda reforçada pelo facto de a Requerente não ser afectada pelos pagamentos que lhe fazia, pois apenas lhe pagava quando concretizasse a venda dos imóveis e o que pagava à B… acrescia ao preço de venda que a própria Requerente fixava e pretendia obter para si.

Pelo exposto, conclui-se que a Requerente provou que os pagamentos efectuados à B… não foram anormais nem exagerados.”

            Como se refere no aresto transcrito, julga-se que a aferição do carácter normal e não exagerado das operações se deve reportar ao caso concreto, tendo em conta a situação específica em que tais operações se realizaram, não se podendo formular “tabelas” ou fórmulas a priori, que excluam mecanicamente operações do âmbito da razoabilidade, ou as remetam para o plano do exagero.

            No caso, as comissões em questão surgem no cenário de crise económica aguda, em que o mercado estava, praticamente, parado, e em que os serviços remunerados por aquelas aportam um significativo valor acrescentado ao produto vendido.

            Por outro lado, sendo o serviço pago, unicamente, em função do resultado, verifica-se um risco acrescido para o prestador, que tem de suportar – notoriamente – custos avultados para trazer clientes “do outro lado do mundo”, e uma segurança adicional para o adquirente dos serviços, que apenas se constitui na obrigação de pagar, tendo assegurado o retorno decorrente da concretização das suas vendas, sendo de notar, ainda, que a actividade em questão permitia acomodar o custo adicional, assegurando uma margem de lucro para o vendedor.

            Por fim, no caso não se detecta, nem é substanciado pela AT, qualquer indício concreto de fraude ou evasão fiscal.

            Assim, e em face do exposto, julga-se que, na parte ora em causa, enferma o acto tributário objecto da presente acção arbitral de erro nos pressupostos de facto, e consequente erro de direito, devendo por isso anulando, e procedendo nesta parte também o pedido arbitral.

            A liquidação de juros compensatórios, tem por pressuposto a liquidação de imposto cuja anulação determina a consequente anulação daquela.

            Face à procedência integral do pedido arbitral, com base nos fundamentos expostos, fica prejudicado o conhecimento das demais questões colocadas pela Requerente.

 

*

C. DECISÃO

Termos em que se decide neste Tribunal Arbitral julgar integralmente procedente o pedido arbitral formulado e, em consequência:

  1. Anular a liquidação de IRC n.º 2017…, referente ao exercício de 2013, e respectiva liquidação de juros compensatórios n.º 2017…, assim como da demonstração de acerto de contas n.º 2017…, no valor total de € 205.616,91;
  2. Condenar a Requerida nas custas do processo, no montante determinado infra.

 

D. Valor do processo

Fixa-se o valor do processo em € 205.616,91, nos termos do artigo 97.º-A, n.º 1, a), do Código de Procedimento e de Processo Tributário, aplicável por força das alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT e do n.º 2 do artigo 3.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária.

 

E. Custas

Fixa-se o valor da taxa de arbitragem em € 4.284,00, nos termos da Tabela I do Regulamento das Custas dos Processos de Arbitragem Tributária, a pagar pela Requerida, uma vez que o pedido foi totalmente procedente, nos termos dos artigos 12.º, n.º 2, e 22.º, n.º 4, ambos do RJAT, e artigo 4.º, n.º 4, do citado Regulamento.

 

 

Notifique-se.

 

Lisboa 12 de Abril de 2018

 

O Árbitro Presidente

 

 

 

(José Pedro Carvalho)

 

 

 

 

O Árbitro Vogal

 

 

 

(Carla Castelo Trindade)

 

 

 

O Árbitro Vogal

 

 

 

(Elísio Brandão)

 

 

 



[1] Disponível em www.dgsi.pt, tal como a restante jurisprudência citada sem menção de proveniência.

[2] Ac. do STA de 05-07-2012, proferido no processo 0658/11, disponível em www.dgsi.pt.