Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 404/2017-T
Data da decisão: 2018-04-11  IRC  
Valor do pedido: € 104.196,72
Tema: IRC - Regime Especial de Tributação dos Grupos de Sociedades (RETGS); aplicação retroativa.
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Acórdão Arbitral

 

Os árbitros Conselheira Fernanda Maçãs (árbitro-presidente), Prof. Doutor Jónatas Machado e Dr. João Menezes Leitão (árbitros-vogais), designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa para formarem o presente Tribunal Arbitral, constituído em 19.9.2017, acordam no seguinte:

 

I. Relatório[1]

 

1. A… (a seguir, Requerente ou A…), Pessoa Coletiva nº …, com sede na …, … …, apresentou um pedido de constituição de tribunal arbitral e subsequente pronúncia arbitral, ao abrigo do disposto nos artigos 2.º, n.º 1, al. a) e 10.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro, com as alterações posteriores (Regime Jurídico da Arbitragem Tributária, a seguir RJAT), em que é requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira (a seguir, Requerida ou AT), relativamente ao Despacho do Chefe de Divisão da Direção de Finanças de …, por delegação, datado de 2017/05/08, que indeferiu a Reclamação da Autoliquidação do Imposto sobre o Rendimento de Pessoas Coletivas (IRC) de 2013, peticionando a respetiva anulação e a condenação da AT à correção da autoliquidação do IRC de 2013, de modo a que, no apuramento do lucro tributável da Requerente como sociedade dominante do grupo, sejam incluídas no Regime Especial de Tributação de Grupo de Sociedades (RETGS) todas as sociedades residentes para efeitos fiscais em Portugal detidas, direta e indiretamente, pela sociedade dominante B… SA (a seguir B…), a saber, as sociedades C…, S.A. (a seguir C…), NIPC…, e D…, Lda. (a seguir D…), NIPC…, determinando, em consequência, que a AT reembolse a Requerente do montante total de €104.196,72, a título de IRC e Tributação Autónoma por efeito das correções que indica.

 

2. Em conformidade com os artigos 5.º, n.º 3, al. a), 6.º, n.º 2, al. a) e 11.º, n.º 1, al. a) do RJAT, o Conselho Deontológico deste Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD) designou como árbitros do tribunal arbitral coletivo a Conselheira Doutora Fernanda Maçãs, como árbitro-presidente, o Professor Doutor Jónatas Machado e o Dr. João Menezes Leitão como árbitros-vogais, que aceitaram o encargo.

 

3. As partes foram devidamente notificadas dessa designação, à qual não opuseram recusa nos termos conjugados dos artigos 11.º, n.º 1, alíneas b) e c) e 8.º do RJAT e 6.º e 7.º do Código Deontológico do CAAD.

 

4. Por força do preceituado na al. c) do n.º 1 e do n.º 8 do artigo 11.º do RJAT, conforme comunicação do Senhor Presidente do Conselho Deontológico do CAAD, o Tribunal Arbitral ficou constituído em 19.9.2017.

 

5. No requerimento de pronúncia arbitral (a seguir petição inicial ou PI), a Requerente, invocando a desconformidade do disposto à data dos factos no n.º 4 do art. 69.º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (CIRC) com a liberdade de estabelecimento garantida pelo art. 49.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE), peticionou que seja “considerada a inclusão no RETGS liderado pela A…, relativamente ao período de tributação de 2013, da B… como sociedade dominante e de todas as participações detidas direta e indiretamente pelo menos em 90% há mais de um ano pela sociedade dominante B… nas sociedades residentes em Portugal, a saber a sociedade D…” (art. 70 da PI), devendo aplicar-se, nos termos que apresenta no art. 71 da PI, a nova declaração de rendimentos deste RETGS, onde se determina um valor a recuperar de €104.196.72.

Por conseguinte, como acima se referiu (n.º 1), a Requerente peticionou a condenação da AT à correção da autoliquidação do IRC de 2013, de modo a que, no apuramento do lucro tributável da Requerente como sociedade dominante do grupo, sejam incluídas no RETGS todas as sociedades residentes para efeitos fiscais em Portugal detidas, direta e indiretamente, pela sociedade dominante B…, a saber, as sociedades C…, S.A., NIPC …, e D…, Lda., NIPC…, determinando-se que a AT reembolse a Requerente do montante total de €104.196,72, a título de IRC e Tributação Autónoma por efeito das correções referidas, acrescido de juros indemnizatórios vencidos e vincendos até pagamento integral da quantia indevidamente suportada.

 

6. A AT, ao abrigo do disposto no art. 17.º do RJAT, apresentou, em 26.10.2017, resposta, na qual se defendeu por exceção e por impugnação, peticionando a final o seguinte:

“a) Julgar-se verificada a existência da exceção dilatória, consubstanciada na incompetência material do tribunal arbitral e/ ou a exceção da ilegitimidade, as quais obstam ao conhecimento do pedido, e determinam a absolvição da Entidade Requerida da instância, atento o disposto nos artigos 576.º, n.º 1 e 577.º, alínea a) e e) do CPC, aplicáveis ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e) do RJAT,

 caso assim não se entenda,

b) deve ser julgado improcedente o presente pedido de pronuncia arbitral, por não provado, mantendo-se na ordem jurídica os atos tributários impugnados e absolvendo-se, em conformidade, a entidade requerida do pedido”.

 

7. Por despacho da Presidente do Tribunal Arbitral de 27.10.2017, foi a Requerente notificada para exercer, querendo, o contraditório em relação à matéria excetiva alegada pela Requerida, o que foi realizado pelo requerimento de resposta às exceções de 6.11.2017 (muito embora com referência a elementos (v. g.: revisão oficiosa, sociedade dominante E…) que não estão presentes nos autos), no qual a Requerente concluiu:

“pela manifesta improcedência das exceções invocadas pela Autoridade Tributária.

Sem prejuízo, e no que respeita à questão da ilegitimidade caso o Tribunal Arbitral conclua pela sua procedência, então deverá o mesmo convidar a aqui Requerente a fazer o chamamento à intervenção principal da(s) pessoa(s) em falta”.

 

8. Por despacho de 7.11.2017, dada a inexistência de prova a produzir em audiência e a pronúncia já realizada por escrito pela Requerente à matéria de exceção, foi dispensada a realização da reunião a que se reporta o art. 18.º do RJAT e determinada a produção de alegações escritas sucessivas, o que foi concretizado pela Requerente em 24.11.2017 e pela Requerida em 13.12.2017, tendo as partes, relativamente ao que cabe considerar relevante (já que, incompreensivelmente, nestas suas alegações as partes reportam-se a uma revisão oficiosa e até a uma sociedade dominante E… e ao período de tributação de 2012, tudo fenomenologias com que não se depara nos autos), reiterado as posições assumidas nas suas anteriores peças processuais.

O Tribunal Arbitral fixou, por último, por despacho de 15.3.2018, como prazo limite para a prolação da decisão arbitral o dia 19.5.2018.

 

9. O Tribunal Arbitral encontra-se regularmente constituído (arts. 5.º, n.ºs 1 e 3, al. a), 6.º, n.º 2, al. a) e 11.º do RJAT), as partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias e mostram-se devidamente representadas.

As demais matérias atinentes a pressupostos processuais, por contenderem com as exceções de incompetência material do Tribunal e de ilegitimidade invocadas pela Requerida, serão apreciadas de modo específico e autónomo na sequência da fixação da matéria de facto relevante, sem prejuízo de a solução conferida a certa matéria poder prejudicar a apreciação das restantes questões suscitadas pelas partes (cfr. art. 608.º, n.º 2 do Código de Processo Civil, a seguir CPC, aplicável ex vi art. 29.º, n.º 1, al. e) do RJAT).

 

II. Questões a decidir

 

10. Em face das alegações constantes da PI e das exceções deduzidas pela Requerida na sua resposta (cfr. acima n.ºs 5 e 6), as questões sujeitas, no quadro do litígio formulado, à cognição do Tribunal Arbitral, as quais são definidas pelos factos alegados e pelas pretensões processualmente formuladas que exijam decisão específica, incluindo as matérias atinentes aos pressupostos processuais suscitadas pelas partes ou de conhecimento oficioso, são as seguintes (sem prejuízo, como se mencionou, de a decisão de certa questão poder prejudicar a apreciação de outras):

- incompetência material do tribunal arbitral;

- ilegitimidade da Requerente por falta de litisconsórcio necessário;

-ilegalidade da decisão de indeferimento da reclamação graciosa relativa à autoliquidação de IRC de 2013 em causa nos autos por violação pelo disposto no art. 69.º, n.º 4, al. f) do CIRC, na redação aplicável à data dos factos, da liberdade de estabelecimento prevista nos arts. 49.º e 54.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE) ao excluir do RETGS as sociedades residentes em Portugal cuja detenção é feita através de sociedades não residentes em território português residentes na União Europeia;

- consideração da inclusão no RETGS liderado pela A…, relativamente ao período de tributação de 2013, da B… como sociedade dominante e de todas as participações detidas direta e indiretamente pelo menos em 90% há mais de um ano pela sociedade dominante B… nas sociedades residentes em Portugal, a saber, a sociedade D…, Lda, NIPC …;

- correção da liquidação do IRC de 2013 do RETGS em causa no processo, donde resulta, pela inclusão de D…, Lda., NIPC…, um valor consolidado a ser reembolsado de 104.196,72€;

- direito ao reembolso da quantia indevidamente paga acrescido de juros indemnizatórios.

 

III. Decisão da matéria de facto e sua motivação

 

11. Examinadas as alegações constantes das peças processuais apresentadas e a prova documental produzida, incluindo o procedimento de reclamação graciosa com o n.º …2016… junto pela AT (a seguir PA), o Tribunal julga provados, com relevo para a decisão da causa, os seguintes factos:

 

I. A Requerente é uma sociedade de direito português que, no período de tributação de 2013 em referência, era a sociedade dominante de um Grupo de Sociedades tributado conforme o RETGS, composto apenas por si e pela sociedade sua subsidiária C…, S.A, NIPC…, com sede em …, cujo capital social detinha a 100% (Declaração de Rendimentos Modelo 22 junta como doc. n.º 1 à PI e Relatório e Contas de 2013 da Requerente, ponto 1.3.4., e respetivo Anexo às Demonstrações Financeiras, pontos 3.11, 8.1., 9,  junto como documento 4 à PI, e factos alegados nos n.ºs 6 e 7 da PI, não refutados pela Requerida).

II. A Requerente, no ano de 2013, era diretamente detida em cerca de 99,99% do seu capital social pela F… (a seguir F…), sociedade comercial residente para efeitos fiscais em França (conforme informação no Relatório e Contas de 2013 da Requerente, p. 12 e respetivo Anexo às Demonstrações Financeiras, ponto 30, junto como documento 4 à PI), sociedade esta que nunca foi e nem é neste momento detida, direta ou indiretamente, por sociedade residente para efeitos fiscais em Portugal (Anexo às Demonstrações Financeiras do Relatório e Contas de 2013 da Requerente, ponto 30, junto como documento 4 à PI e facto alegado no n.º 9 da PI, não questionado pela Requerida).

III. A F… era por referência a 2013 – e ainda o é – detida indiretamente pela B… SA, (a seguir B…), com sede em França (Anexo às Demonstrações Financeiras do Relatório e Contas de 2013 da Requerente, ponto 30, junto como documento 4 à PI e facto alegado no n.º 10 da PI, não refutado pela Requerida).

IV. A B… detinha indiretamente durante o período de tributação de 2013 – e ainda detém – a sociedade D…, Lda (a seguir D…), NIPC…, residente para efeitos fiscais em Portugal, por intermédio, designadamente, da sociedade G…, SA, com sede em França, a qual detém na sua totalidade o capital social da D…, SA, com sede em Espanha, por seu turno detentora das duas quotas de €190.790 e €183.308 representativas da totalidade do capital social da D… (Anexo às Demonstrações Financeiras do Relatório e Contas de 2013 da D…, Lda, pontos 1, 12 e 26 junto como documento 5 à PI, e factos alegados no n.ºs 11 e 12 da PI, não refutados pela Requerida).

V. A B… não formalizou em 2013 como sociedade dominante um perímetro de RETGS com a Requerente e as sociedades C…, S.A e D…, Lda (facto reconhecido no n.º 26 da Reclamação Graciosa junta como doc. 2 à PI; cfr. igualmente factualidade alegada nos arts. 68, 87 e 94 da resposta da Requerida e reconhecida nos n.ºs 13 e 14 quer da resposta às exceções quer das alegações apresentadas pela Requerente).

VI. Em 05/06/2014, a Requerente apresentou declaração de rendimentos Modelo 22 (de substituição), relativa ao exercício de 2013, onde declarou como soma algébrica dos resultados fiscais do grupo o montante de prejuízos fiscais de €1.245.658,19, apurando um imposto a pagar de €225.623,27 referente a tributação autónoma, que foi tempestivamente pago (documento 1 junto à PI e facto alegado no n.º 1 da PI, não questionado pela Requerida).

VII. A Requerente apresentou em 11/05/2016 a Reclamação Graciosa da Autoliquidação de IRC relativa a 2013, que se mostra junta como documento 2 junto à PI e de fls. 1 e segs. do PA, a qual foi instaurada sob o n.º …2016…, na qual solicitou que:

“declare a ilegalidade do ato de autoliquidação de IRC relativo ao período de tributação de 2013:

i) Considere o apuramento do lucro tributável da ora Reclamante como sociedade do grupo designada para assumir a responsabilidade pelo cumprimento de todas as obrigações que incumbem à sociedade dominante por inclusão no RETGS, de todas as sociedades residentes para efeitos fiscais em Portugal detidas indiretamente pela sociedade dominante B…, a saber:

- C…, S.A., NIPC…, e

- D…, Lda., NIPC …

e em consequência,

ii) Seja reembolsado à ora Reclamante o montante total de € 94.780,11 (noventa e quatro mil, setecentos e oitenta euros e onze cêntimos), a título de IRC por efeito dos ajustamentos acima referidos”.

VIII. A referida Reclamação Graciosa foi indeferida por Despacho do Chefe de Divisão da Direção de Finanças de …, por delegação, datado de 08/05/2017 (documento 3 junto à PI), o qual se sustentou nos seguintes fundamentos essenciais:

“11. O regime que possibilita que uma sociedade dominante com sede ou direção efetiva noutro estado membro da UE possa optar pelo RETGS foi introduzido no CIRC, através do aditamento do artigo 69.º-A, pela Lei n.º 82-C/2014, de 31.12.2014.

12. Essa alteração permitiu adequar o RETGS à jurisprudência do TJUE citada pela reclamante na sua petição, jurisprudência que fundamenta as suas decisões no cumprimento do princípio da liberdade de estabelecimento vertido nos artigos 49º e segs. do TFUE (Tratado de Funcionamento da União Europeia).

13. No entanto, essa jurisprudência esbarra na soberania dos vários Estados Membros em matéria de impostos diretos, sua competência exclusiva.

14. A Lei n.º 82-C/2014, de 31.12.2014, prevê, no artigo 5º (produção de efeitos) a sua aplicação apenas para períodos de tributação que se iniciem em ou após 1 de Janeiro de 2015.

15. Exclui-se a aplicação retroativa da norma, de acordo com a citada disposição legal.

16. A AT está vinculada ao princípio da legalidade, logo, terá que aplicar a lei fiscal vigente à data do facto tributário, a qual não permite o alargamento do RETGS a sociedades residentes em Portugal, mas participadas por empresas não residentes.

17. No caso em análise, a lei em vigor em 2013 não permite o alargamento do RETGS à sociedade D… por a mesma ser detida pela dominante B… sediada em França.

18. Essa possibilidade está limitada aos exercícios 2015 e seguintes”.

 

12. Não foi alegada qualquer outra factualidade relevante para a decisão do litígio em apreciação.

 

13. A convicção do Tribunal sobre os factos dados como provados resultou dos documentos juntos aos autos pela Requerente e constantes do procedimento de reclamação graciosa junto pela Requerida, bem como do reconhecimento de factos efetuado pelas partes, tudo conforme se especifica em cada um dos pontos do probatório acima enunciado.

 

IV. Do Direito

 

a) Da competência do Tribunal Arbitral

 

14. Cabe apreciar, em primeiro lugar, a matéria da competência do Tribunal Arbitral, cujo conhecimento, que é oficioso, precede o de qualquer outra questão (cfr. os artigos 13.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA) e 278.º, n.º 1, al. a) do CPC, aplicáveis ex vi art. 29.º, n.º 1, al. d) e e) do RJAT do RJAT), pelo que, com ressalva, precisamente, da sua própria competência, o tribunal que seja incompetente está impedido de apreciar os demais pressupostos processuais e o mérito da causa.

 

15. Como acima se indicou, a Requerida, na sua resposta (arts. 9 e segs.), o que reiterou nas suas alegações, invocou a exceção dilatória de incompetência material do tribunal arbitral, que obstaria ao conhecimento do pedido formulado pela Requerente, fundando-se nos seguintes motivos fulcrais que se transcrevem:

- A “requerente peticiona que a AT seja condenada “à correção da autoliquidação do IRC de 2013, de modo a que no apuramento do lucro tributável da Requerente como sociedade dominante do grupo, sejam incluídas no RETGS todas as sociedades residentes para efeitos fiscais em Portugal detidas, direta e indiretamente, pela sociedade dominante B…””;

- “Mais, chega ao cúmulo de apresentar a nova declaração de rendimentos Mod. 22 após o alargamento do RETGS com o apuramento do IRC a reembolsar”;

 - “Sendo certo que a condenação peticionada, porque implica sempre o prévio reconhecimento do alargamento do perímetro do grupo de sociedades que integram o RETGS, sempre se configurará como prévia a uma qualquer anulação do ato tributário de liquidação”;

- “admitir-se que o Tribunal Arbitral tem competência para a apreciação deste pedido representaria, salvo o devido respeito, a substituição do presente Tribunal Arbitral nas competências próprias da AT”, sendo que “Nem em sede de ação administrativa especial, meio processual no qual se prevê a condenação da administração à prática de um ato devido, cfr. arts. 66º e segs. do CPTA, se permite ao Tribunal Judicial ir tão longe” e “estamos a referir-nos, neste caso, à ação administrativa especial e não ao processo de impugnação judicial, onde o processo é meramente de cariz anulatório, sendo certo que o recurso à via arbitral não constitui um meio alternativo àquele tipo de ações”;

- “a pretensão jurídica formulada pela requerente se reconduz ao reconhecimento de um direito ou ao pedido de condenação à prática de um ato devido, que não poderão ser obtidos por esta via” e, por isso, “o pedido de pronúncia arbitral não consubstancia o meio próprio, o que, no caso, redunda na própria incompetência do Tribunal Arbitral, para reconhecer o direito que a requerente pretende obter, ou para, em alternativa, à ação administrativa especial, condenar a AT à prática de um ato devido”;

- “não está aqui em causa a apreciação de um qualquer ato de liquidação, mas antes, de um pretenso e hipotético direito que é sempre prévio a tal liquidação, não sendo o Tribunal arbitral competente para apreciar o indeferimento do pedido de revisão oficiosa [sic] que nega o reconhecimento de tal direito”.

 

16. No requerimento de resposta às exceções de 6.11.2017 apresentado pela Requente, sustenta esta, no que concerne à questão da incompetência material do Tribunal (n.ºs 5 a 20), o seguinte:

- “5. (...) a AT procura fundamentar a incompetência do tribunal arbitral com base numa suposta pretensão da Requerente, que não tem qualquer correspondência aquilo que foi alegado e peticionado, na petição inicial.

6. (...) em momento algum a Requerente apresentou um pedido à AT no sentido de esta aplicar retroativamente o regime do artigo 69º e 69º-A do CIRC que resulta da Lei nº 82º-C/2014, de 31 de Dezembro.

7. O que a Requerente alega [é] que a autoliquidação do IRC do exercício em causa é manifestamente ilegal (e consequentemente o Despacho de Indeferimento) porque foi efetuada com base numa disposição legal – entenda-se artigo 69º do CIRC – que era ilegal por violar o Direito Comunitário.

8. Ou seja, que aqui está em causa não é um simples pedido de aplicação retroativa de um regime jurídico fiscal.

9. O que aqui está em causa é a de saber se o artigo 69º do CIRC, em vigor à data dos factos, violava, ou não, o Direito Comunitário.

10. Naturalmente, se se verificar que existe violação – tal como foi claramente demonstrado na petição inicial – então outra conclusão não se poderá retirar que não seja a da ilegalidade do disposto no artigo 69º e de todos os atos tributários que foram emitidos em cumprimento do que aí estava estipulado.

11. Assim, e ao contrário do que alega a AT o que aqui está em causa é a ilegalidade do ato de autoliquidação e do Despacho de Indeferimento, já que ambos resultam da aplicação e da interpretação de uma disposição legal que é claramente violadora do Direito Comunitário”;

- “(...) importa esclarecer que a Requerente não fez o pedido de alteração do perímetro, não foi porque não quis, ou porque se esqueceu”; “A Requerente não fez esse pedido, porque pura e simplesmente o artigo 69º do CIRC não permitia que esse pedido fosse efetuado nos termos expostos”;

- “18. A AT, em sede de análise da Revisão Oficiosa [sic] já teve a oportunidade de se pronunciar sobre a legalidade do ato tributário, tendo a mesma decidido que o mesmo não padecia de qualquer ilegalidade, conquanto o artigo 69º do CIRC à data em vigor apenas permitir a inclusão do RETGS de sociedades residentes em Portugal.

19. (...) o que a Requerente pretende é que o TA se pronuncie sobre a legalidade do entendimento da AT constante no Despacho de Indeferimento, e consequente sobre a legalidade do ato de autoliquidação”.

20. E tal, não há dúvidas nenhuma, que faz parte da competência dos Tribunais Arbitrais”.

 

17. A arbitragem tributária foi criada pelo Governo através do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro (RJAT), emitido ao abrigo da autorização legislativa que lhe foi concedida pelo artigo 124.º da Lei n.º 3-B/2010, de 28 de abril.

No n.º 4 desse artigo 124.º estabeleceu-se que o âmbito da autorização prevista no presente artigo compreende, nomeadamente, as seguintes matérias:

a) A delimitação do objecto do processo arbitral tributário, nele podendo incluir-se os actos de liquidação de tributos, incluindo os de autoliquidação, de retenção na fonte e os pagamentos por conta, de fixação da matéria tributável, quando não dêem lugar a liquidação, de indeferimento total ou parcial de reclamações graciosas ou de pedidos de revisão de actos tributários, os actos administrativos que comportem a apreciação da legalidade de actos de liquidação, os actos de fixação de valores patrimoniais e os direitos ou interesses legítimos em matéria tributária;

A autorização legislativa era indispensável para o Governo legislar validamente sobre esta matéria, uma vez que se está perante matéria atinente às garantias dos contribuintes, inserida na reserva relativa de competência legislativa da Assembleia da República, nos termos dos artigos 103.º, n.º 2, e 165.º, n.º 1, alínea i), da CRP, e, por isso, o Governo não tem competência legislativa própria, como decorre dos artigos 198.º, n.º 1, alíneas a) e b), da CRP.

 Utilizando essa autorização legislativa, o Governo estabeleceu no artigo 2.º, n.º 1, alínea a), do RJAT que «a competência dos tribunais arbitrais compreende a apreciação das seguintes pretensões: a) a declaração de ilegalidade de actos de liquidação de tributos, de autoliquidação, de retenção na fonte e de pagamento por conta».

É, assim, inequívoco que o Governo, no exercício dos poderes legislativos que lhe foram concedidos pela autorização legislativa, atribuiu aos tribunais arbitrais competência para a declaração de ilegalidade de actos de liquidação e de autoliquidação, sem qualquer restrição.

            Como ficou consignado na Decisão Arbitral  proferida no processo n.º 101/2017-T “(…)  a fórmula «declaração de ilegalidade de actos de liquidação de tributos, de autoliquidação, de retenção na fonte e de pagamento por conta», utilizada na alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º do RJAT não restringe, numa mera interpretação declarativa, o âmbito da jurisdição arbitral aos casos em que é impugnado directamente um acto de um daqueles tipos, e a ilegalidade de actos de liquidação ou autoliquidação pode ser declarada jurisdicionalmente como corolário da ilegalidade de um acto de segundo grau, que confirme um acto de autoliquidação, incorporando a sua ilegalidade.

“A inclusão nas competências dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD dos casos em que a declaração de ilegalidade dos actos aí indicados é efectuada através da declaração de ilegalidade de actos de segundo grau, que são o objecto imediato da pretensão impugnatória, resulta com segurança da referência que naquela norma é feita aos actos de autoliquidação, de retenção na fonte e de pagamento por conta, que expressamente se referem como incluídos entre as competências dos tribunais arbitrais. Com efeito, relativamente a estes actos é imposta, como regra, a reclamação graciosa necessária, nos artigos 131.º a 133.º do CPPT, pelo que, nestes casos, o objecto imediato do processo impugnatório é, em regra, o acto de segundo grau que aprecia a legalidade do acto de liquidação, acto aquele que, se o confirma, tem de ser anulado para se obter a declaração de ilegalidade do acto de liquidação. A referência que na alínea a) do n.º 1 do artigo 10.º do RJAT se faz ao n.º 2 do art. 102.º do CPPT, em que se prevê a impugnação de actos de indeferimento de reclamações graciosas, desfaz quaisquer dúvidas de que se abrangem nas competências dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD os casos em que a declaração de ilegalidade dos actos referidos na alínea a) daquele artigo 2.º do RJAT tem de ser obtida na sequência da declaração da ilegalidade de actos de segundo grau.

“Aliás, foi precisamente neste sentido que o Governo, na Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março, interpretou estas competências dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD, ao afastar do âmbito dessas competências as «pretensões relativas à declaração de ilegalidade de actos de autoliquidação, de retenção na fonte e de pagamento por conta que não tenham sido precedidos de recurso à via administrativa nos termos dos artigos 131.º a 133.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário», o que tem como alcance restringir a sua vinculação os casos em que esse recurso à via administrativa foi utilizado, em sintonia com o preceituado nestas normas do CPPT.

“É à face do pedido ou conjunto de pedidos formulados pelo interessado que se afere a adequação das formas de processo especiais, como é o processo arbitral, de que decorre também a competência dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD, que está limitada aos meios processuais previstos no RJAT.”

            Mais concretamente, a competência material do tribunal afere-se em função do modo como o Autor configura a ação, mais especificamente pelos termos em que se mostra estruturado o pedido (ou pedidos), ou seja, a pretensão concreta deduzida em juízo, e os seus fundamentos/causa de pedir, portanto, a factualidade que serve de fundamento ao efeito jurídico pretendido. Como se observa, por exemplo, no Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 25-03-2015, proc. n.º 01951/13: “é em face do pedido formulado pelo autor e pelos fundamentos (causa petendi) em que o mesmo se apoia, tal como a relação jurídica é delineada pelo autor na petição (quid disputatum ou quid decidendum), que cabe determinar a competência do tribunal para conhecer da ação”.

Desta forma, como regra, é em atenção ao modo como, no específico processo em que o Tribunal Arbitral é chamado a desenvolver a sua atividade jurisdicional, o requerente formula a sua concreta pretensão de tutela jurídica (quid disputatum ou quid decidendum), para a obtenção de um certo efeito jurídico na base de determinados factos constitutivos essenciais (cfr. art. 10.º, als. b) e c) do RJAT), que cabe apreciar o âmbito de admissibilidade da intervenção jurisdicional do Tribunal, independentemente de qualquer indagação, em juízo de prognose, sobre a respetiva procedência (quid decisum).

Também como ensina ALBERTO DOS REIS, Código de Processo Civil Anotado, (volume II, páginas 288-289), o que releva para apreciação do uso de meio processual é o fim a que o processo se destina, revelado pelo pedido.

 Apreciando, então, a presença do pressuposto processual positivo da competência, cuja ocorrência é indispensável para a pronúncia de mérito deste Tribunal, cabe examinar, de modo mais particular, a configuração da solicitação de tutela jurisdicional que foi apresentada pela Requerente no pedido de pronúncia arbitral e a consequente conformação da instância daí adveniente.

18. A este respeito, como acima se foi dando conta (n.ºs 1 e 5), a Requerente peticionou a final o seguinte na PI:

a) “o presente pedido de pronúncia arbitral ser considerado procedente, anulando-se em consequência o Despacho de Indeferimento;

b) “e condenando a AT à correção da autoliquidação do IRC de 2013, de modo a que no apuramento do lucro tributável da Requerente como sociedade dominante do grupo, sejam incluídas no RETGS todas as sociedades residentes para efeitos fiscais em Portugal detidas, direta e indiretamente, pela sociedade dominante B…, a saber as sociedades:

“o C…, S.A., NIPC …, e,

“o D…, Lda., NIPC ….

c) “Determinando em consequência que a AT reembolse a Requerente do montante total de € 104.196,72, a título de IRC e Tributação Autónoma por efeito das correções supra referidas”.

Percorrendo o articulado da PI, verifica-se ainda que a Requerente consigna, entre o mais, o seguinte:

- “(…) pelas razões de facto e de direito” que invoca, a autoliquidação em causa nos autos “não se encontra correta, razão pela qual a Requerente apresentou a Reclamação da Autoliquidação” (A-3.), que foi indeferida por despacho do Chefe de divisão da Direcção de Finanças de…, por delegação (...);

- Não concordando com “tal decisão, por a mesma ser ilegal, vem a Requerente apresentar o pedido de pronúncia arbitral” (….);

- Segundo a Requerente a composição do perímetro do RETGS para efeitos de apuramento do IRC do exercício de 2013, não deveria apenas incluir as empresas referidas no ponto 6 supra, mas também a outra empresa fiscalmente residente em Portugal e que é detida a 100% pela B…”(B- 13.);

- “o dever de correção da autoliquidação não decorre, da necessidade de aplicação retroativa da alteração legislativa introduzida pela Lei n.º 82-C/2014, de 31 de Dezembro, tal como parece alegar a AT, mas sim do reconhecimento expresso por parte do TJUE do carácter ilegal do regime fiscal em vigor até à referida data” (C- 50.);

Por sua vez, na resposta à matéria de exceção reitera a Requerente, entre o mais, que:

- “assim, e ao contrário do que alega a AT o que aqui está em causa é a ilegalidade do acto de autoliquidação e do despacho de indeferimento, já que ambos resultam da aplicação e da interpretação de uma disposição legal que é claramente violadora do Direito Comunitário” (ponto 11.).

Em suma, no fundo, o que a Requerente pretende é que o Tribunal Arbitral se pronuncie “sobre a legalidade do entendimento da AT constante no Despacho de indeferimento da reclamação, e “consequente” [sic] sobre a legalidade do acto de autoliquidação” (ponto 19.). 

   

19. Em face do que se vem de expor, tem que se concluir, de acordo com os termos da estruturação da PI e os pedidos formulados pela Requerente, que o fim a que o processo se destina, o efeito útil pretendido, se restringe à decisão do indeferimento da reclamação graciosa que aprecia a legalidade da autoliquidação, decisão aquela que, se a confirma, tem de ser anulada para se obter a declaração de ilegalidade da autoliquidação de IRC relativa ao exercício de 2013. Neste contexto, configuram-se os demais pedidos como meramente instrumentais em relação àqueles, pois nenhum deles tem utilidade para a Requerente dissociado da anulação da autoliquidação e da decisão da reclamação graciosa que, ao manter aquela na ordem jurídica, a Requerente reputa de ilegal.

Por isso, é apenas sobre o pedido formulado na alínea a) do n.º 18 supra que deverá recair a decisão arbitral, que tem como objeto, em última análise, saber se a autoliquidação é ilegal por não ter sido efetuada com aplicação do regime especial de tributação dos grupos de sociedades.

Sempre se acrescentará que está fora das competências deste Tribunal Arbitral definir, em caso de eventual declaração da ilegalidade daquela liquidação e da decisão da reclamação graciosa, quais os termos em que poderão ou não ser praticados novos atos tributários, pois trata-se de matéria que se insere nos deveres da Autoridade Tributária e Aduaneira, em execução de julgado, nos termos do artigo 24.º, n.º 1, do RJAT.

De igual modo, também os pedidos que não sejam atinentes à validade do ato em si mesmo considerado, mas que se destinem antes ao reconhecimento de um direito resultante da relação jurídica tributária ou à obtenção da condenação da entidade competente à prática de um ato que tenha sido ilegalmente omitido ou recusado, escapam à competência dos tribunais arbitrais tributários.

Em face do exposto, no âmbito do litígio configurado pela Requerente, atento o disposto no art. 2.º, n.º 1, al. a) do RJAT, tem este Tribunal competência para apreciar a pretensão atinente à declaração de ilegalidade do despacho de indeferimento da reclamação graciosa e da autoliquidação, na medida em que foi objeto de confirmação pelo indeferimento da reclamação, incorporando a sua ilegalidade.

Sendo manifesta a competência deste Tribunal Arbitral para apreciar o pedido formulado na alínea a) do n.º 18 supra, tem de se concluir que improcede, assim, a exceção de incompetência invocada pela Autoridade Tributária e Aduaneira.

 

b) Da ilegitimidade

 

20. Antes, porém, de apreciar o mérito dessa pretensão anulatória, cabe encarar a outra exceção suscitada pela Requerida, a saber, a ilegitimidade da Requerente por falta de litisconsórcio necessário (cfr. supra n.º 10).

Alega, a este propósito, a AT na sua resposta (arts. 39 e segs.) o seguinte:

- o pedido de pronúncia arbitral foi deduzido pela sociedade de direito nacional, A…, pretendendo esta sociedade que lhe seja reconhecido o direito a ser tributada segundo o RETGS em que a sociedade dominante do grupo seria uma outra sociedade, de direito francês, a B… SA;

- sendo essa sociedade não residente, a requerente não refere, sequer, ser sua representante para efeitos de aplicação de tal regime, sendo que é a sociedade mãe ou a sua representante que deve entregar a Mod. 22 consolidada do grupo;

- não figurando a B… no presente p.p.a. como Autora ou requerente, qualquer decisão a proferir no presente processo sempre careceria de qualquer efeito útil, uma vez que tratando-se do pedido de reconhecimento de um grupo a ser tributado de acordo com o RETGS e sendo certo que é a sociedade mãe que apresenta a declaração Mod. 22 do grupo, a lei exige a intervenção de todas para que a decisão judicial tenha efeito útil e vincule todas as partes;

- por falta de litisconsórcio necessário, a requerente é parte ilegítima o que determina, também por esta via, a absolvição da R. da instância, cfr. art. 33.º n.º 1 do CPC, artigos 576.º, n.º 1 e 577.º, alínea e) do CPC, aplicáveis ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea e) do RJAT.

No requerimento de resposta às exceções de 6.11.2017, sustenta a Requente, no que concerne à questão da ilegitimidade (n.ºs 21 e segs.), o seguinte:

- “não tendo a AT alegado a ilegitimidade da Requerente, em sede de revisão oficiosa [sic], nem sendo essa alegada ilegitimidade fundamento para o indeferimento do pedido de revisão oficiosa [sic], outra conclusão não se poderá retirar que não seja a da improcedência dessa exceção”;

- “a questão aqui em causa é precisamente a ilegalidade do disposto no artigo 69.º do CIRC, à data em vigor, por não admitir a possibilidade de constituição de um grupo de sociedades em que a sociedade-mãe (dominante) fosse uma sociedade residente num Estado-Membro da União Europeia”; “conforme resulta expresso no pedido de pronúncia arbitral, a Requerente e a E... [sic], não optaram pela aplicação do RETGS nos períodos de tributação anteriores a 2015 porquanto, à data dos factos, a norma constante do artigo 69.º do Código do IRC não lhes permitia optar pela aplicação do regime especial de tributação dos grupos de sociedades, pelo que não tiveram oportunidade de exercer tal opção nos exercícios fiscais anteriores a 2011 [sic]”, “[s]endo certo que, como a AT bem sabe, até porque consta do Despacho de Indeferimento a partir de Janeiro de 2015, a sociedade dominante passou a ser a E... [sic], e a aqui Requerente a sociedade dominada designada, nos termos previstos no n.º 3 do artigo 69º-A do CIRC”;

- “é manifesto o interesse da Requerente na aplicação do RETGS no período fiscal de 2011 [sic], porque pretende retirar para a sua esfera jurídica (interesse próprio) um resultado específico (Interesse direto! - o de ser tributada no âmbito do lucro consolidado fiscal, nos termos expostos) - que não é contrário à lei (interesse legítimo)”; “Logo que detetada a possibilidade de aplicação do RETGS, relativamente a este período, apenas a Requerente poderia reagir contra a nota de liquidação em apreço, por apenas ela figurar como sujeito passivo do imposto, consubstanciando-se este o único ato jurídico suscetível de reclamação e sendo a Requerente a única parte legitima para o suscitar”.

- “A Requerente, formalmente desde 2015, apresenta-se como sociedade designada pela sociedade E… [sic] para assumir todas as responsabilidades pelo cumprimento de todas as obrigações, i.e., desempenhar o papel de sociedade dominante, tal como é expressamente referido no pedido de revisão oficiosa, e que não foi negado pela AT no Despacho de Indeferimento da Revisão Oficiosa” [sic] e “A Requerente é o sujeito passivo do imposto aqui em causa, e é a única destinatária dos efeitos da decisão do indeferimento da revisão oficiosa [sic]. Estes atos lesaram a sua esfera jurídica, pois ser-lhe-ia favorável a aplicação do regime especial de tributação dos grupos de sociedades, nos termos requeridos”;

- atento o disposto no art. 261.º do Código de Processo Civil (CPC), “caso o Tribunal Arbitral conclua pela ilegitimidade por falta de litisconsórcio necessário, o que só por mera hipótese se aceita, então deverá o mesmo convidar a aqui Requerente a fazer o chamamento à intervenção principal da(s) pessoa(s) em falta”;

 

21. É sabido que o pressuposto processual da legitimidade diz respeito à relação das partes com a concreta pretensão deduzida. Segundo o art. 30.º do CPC o “autor é parte legítima quando tem interesse direto em demandar; o réu é parte legítima quando tem interesse direto em contradizer” (n.º 1), sendo que o “interesse em demandar exprime-se pela utilidade derivada da procedência da ação e o interesse em contradizer pelo prejuízo que dessa procedência advenha” (n.º 2), considerando-se, na falta de indicação da lei em contrário, “titulares do interesse relevante para o efeito da legitimidade os sujeitos da relação controvertida, tal como é configurada pelo autor”.

Em termos processuais tributários, resulta dos n.ºs 1 e 4 do artigo 9.º do CPPT (aplicável ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea a), do RJAT), que têm legitimidade no processo tributário os contribuintes, incluindo substitutos e responsáveis, outros obrigados tributários, as partes dos contratos fiscais e quaisquer outras pessoas que provem interesse legalmente protegido.  Recorde-se, ainda, que o artigo 95.º, n.º 1, da LGT prevê que “o interessado tem o direito de impugnar ou recorrer de todo o ato lesivo dos seus direitos e interesses legalmente protegidos, segundo as formas de processo prescritas na lei”.

No caso, a ilegitimidade invocada prende-se com a ilegitimidade ativa plural, na qual a mesma situação jurídica controvertida concerne uma pluralidade de pessoas, a implicar a necessidade de a pretensão ser deduzida por várias pessoas, em termos de litisconsórcio necessário. Recorde-se que, segundo o n.º 1 do art. 33.º do CPC, se a lei “exigir a intervenção dos vários interessados na relação controvertida, a falta de qualquer deles é motivo de ilegitimidade”; depois, segundo o n.º 2 do mesmo art. 33.º, é igualmente necessária a “intervenção de todos os interessados quando, pela própria natureza da relação jurídica, ela seja necessária para que a decisão a obter produza o seu efeito útil normal”, sendo que, nos termos do n.º 3 deste artigo, a “decisão produz o seu efeito útil normal sempre que, não vinculando embora os restantes interessados, possa regular definitivamente a situação concreta das partes relativamente ao pedido formulado”.

 

22. Cumpre salientar que a resolução da questão suscitada da ilegitimidade coloca-se unicamente, atento o que se decidiu no ponto anterior sobre a competência deste Tribunal, em função do pedido em causa nestes autos de declaração de ilegalidade do despacho de indeferimento da reclamação graciosa e da autoliquidação objeto de confirmação por aquele despacho. Assim sendo, é manifesta a legitimidade singular da Requerente, dada à existência, no que lhe concerne, relativamente à autoliquidação de 2013 de IRC, de um interesse direto, pessoal e legítimo na anulação dos atos sindicados, dada a vantagem ou utilidade que a anulação do ato, eventualmente conjugada com execução do julgado, lhe proporciona.

Com efeito, a Requerente foi a única destinatária do indeferimento da reclamação graciosa e consequente confirmação da autoliquidação e, à face da tese que defende, estes atos lesaram a sua esfera jurídica, pois ser-lhe-ia favorável a aplicação do regime especial de tributação dos grupos de sociedades.

Em síntese, no caso em apreço, entendendo-se que os pedidos a apreciar são apenas o de anulação da liquidação e da decisão da reclamação graciosa, afigura-se que a Requerente terá legitimidade, pois a validade ou não destes atos ficará definitivamente decidida.

Assim, improcede esta exceção.

 

c) Da ilegalidade da decisão de indeferimento da reclamação graciosa e da autoliquidação

 

A questão central a decidir gira em torno de saber se a autoliquidação e o despacho de indeferimento, que a manteve, são ilegais por aplicarem o artigo 69.º do CIRC em vigor à data dos factos. O que pressupõe a análise, ainda que sumária, da evolução do referido regime do RETGS, para salientar que a sua aplicação pressupõe a verificação de condições e pressupostos prévios, incluindo um ato declarativo dirigido em tempo oportuno à AT no sentido da opção pelo referido regime. Como será demonstrado, apenas depois da verificação deste pressuposto formal prévio se pode avançar para a análise da verificação dos requisitos materiais do RETGS.

 

Cumpre apreciar e decidir.

 

23. No ano de 2013, estava em vigor o artigo 69.º do CIRC na redação do DL n.º 159/2009, de 13 de julho, em que se estabelece, além do mais, o seguinte sobre o âmbito e condições de aplicação do RETGS:

1 – Existindo um grupo de sociedades, a sociedade dominante pode optar pela aplicação do regime especial de determinação da matéria colectável em relação a todas as sociedades do grupo.

2 – Existe um grupo de sociedades quando uma sociedade, dita dominante, detém, directa ou indirectamente, pelo menos 90 % do capital de outra ou outras sociedades ditas dominadas, desde que tal participação lhe confira mais de 50 % dos direitos de voto.

3 – A opção pela aplicação do regime especial de tributação dos grupos de sociedades pode ser formulada quando se verifiquem cumulativamente os seguintes requisitos:

a) As sociedades pertencentes ao grupo têm todas sede e direcção efectiva em território português e a totalidade dos seus rendimentos está sujeita ao regime geral de tributação em IRC, à taxa normal mais elevada;

b) A sociedade dominante detém a participação na sociedade dominada mais de um ano, com referência à data em que se inicia a aplicação do regime;

c) A sociedade dominante não é considerada dominada de nenhuma outra sociedade residente em território português que reúna os requisitos para ser qualificada como dominante.

d) A sociedade dominante não tenha renunciado à aplicação do regime nos três anos anteriores, com referência à data em que se inicia a aplicação do regime.

4 – Não podem fazer parte do grupo as sociedades que, no início ou durante a aplicação do regime, se encontrem nas situações seguintes:

a) Estejam inactivas mais de um ano ou tenham sido dissolvidas;

b) Tenha sido contra elas instaurado processo especial de recuperação ou de falência em que haja sido proferido despacho de prosseguimento da acção;

c) Registem prejuízos fiscais nos três exercícios anteriores ao do início da aplicação do regime, salvo, no caso das sociedades dominadas, se a participação for detida pela sociedade dominante mais de dois anos;

d) Estejam sujeitas a uma taxa de IRC inferior à taxa normal mais elevada e não renunciem à sua aplicação;

e) Adoptem um período de tributação não coincidente com o da sociedade dominante;

f) O nível de participação exigido de, pelo menos, 90 % seja obtido indirectamente através de uma entidade que não reúna os requisitos legalmente exigidos para fazer parte do grupo;

g) Não assumam a forma jurídica de sociedade por quotas, sociedade anónima ou sociedade em comandita por acções, salvo o disposto no n.º 12.

 

De harmonia com o disposto na alínea a) do n.º 3 e da alínea f) do n.º 4, a Requerente e sociedade dominante do grupo em que se inseria não podiam ser incluídas no REGTS todas as sociedades residentes para efeitos fiscais em Portugal detidas direta e indiretamente, pela sociedade dominante B… SA., por esta não ter para efeitos fiscais sede nem direção efetiva em território português.

O TJUE, em Acórdão de 12-06-2014, proferido nos processos apensos n.ºs C-39/13,

C-40/13 e C-41/13, decidiu o seguinte:

1) Nos processos C‑39/13 e C‑41/13, os artigos 49.º TFUE e 54.º TFUE devem ser interpretados no sentido de que se opõem à legislação de um Estado‑Membro por força da qual uma sociedade‑mãe residente pode constituir uma unidade fiscal com uma subfilial residente quando a detém por intermédio de uma ou várias sociedades residentes, mas não pode constituir essa unidade fiscal quando detém a subfilial por intermédio de sociedades não residentes que não dispõem de um estabelecimento estável nesse Estado‑Membro.

2) No processo C‑40/13, os artigos 49.º TFUE e 54.º TFUE devem ser interpretados no sentido de que se opõem à legislação de um Estado‑Membro por força da qual o regime da unidade fiscal pode ser concedido a uma sociedade‑mãe residente que detenha filiais residentes, mas não a sociedades‑irmã residentes cuja sociedade‑mãe comum não tem a sua sede nesse Estado‑Membro, nem dispõe aí de um estabelecimento estável.

 

Com a redação dada ao CIRC pela Lei n.º 82-C/2014, de 31 de Dezembro, as normas do artigo 69.º do CIRC passaram a ter as seguintes redações:

 

1 - Existindo um grupo de sociedades, a sociedade dominante pode optar pela aplicação do regime especial de determinação da matéria coletável em relação a todas as sociedades do grupo.

2 - Existe um grupo de sociedades quando uma sociedade, dita dominante, detém, direta ou indiretamente, pelo menos, 75 % do capital de outra ou outras sociedades ditas dominadas, desde que tal participação lhe confira mais de 50 % dos direitos de voto.

3 - A opção pela aplicação do regime especial de tributação dos grupos de sociedades só pode ser formulada quando se verifiquem cumulativamente os seguintes requisitos:

a) As sociedades pertencentes ao grupo têm todas sede e direção efetiva em território português e a totalidade dos seus rendimentos está sujeita ao regime geral de tributação em IRC, à taxa normal mais elevada;

b) A sociedade dominante detém a participação na sociedade dominada há mais de um ano, com referência à data em que se inicia a aplicação do regime;

c) A sociedade dominante não é considerada dominada de nenhuma outra sociedade residente em território português que reúna os requisitos para ser qualificada como dominante;

d) A sociedade dominante não tenha renunciado à aplicação do regime nos três anos anteriores, com referência à data em que se inicia a aplicação do regime.

4 - Não podem fazer parte do grupo as sociedades que, no início ou durante a aplicação do regime, se encontrem nas situações seguintes:

a) Estejam inativas há mais de um ano ou tenham sido dissolvidas;

b) Tenha sido contra elas instaurado processo especial de recuperação ou de falência em que haja sido proferido despacho de prosseguimento da ação;

c) Registem prejuízos fiscais nos três exercícios anteriores ao do início da aplicação do regime, salvo, no caso das sociedades dominadas, se a participação já for detida pela sociedade dominante há mais de dois anos;

d) Estejam sujeitas a uma taxa de IRC inferior à taxa normal mais elevada e não renunciem à sua aplicação;

e) Adotem um período de tributação não coincidente com o da sociedade dominante;

f) (Revogada.)

g) Não assumam a forma jurídica de sociedade por quotas, sociedade anónima ou sociedade em comandita por ações, salvo o disposto no n.º 11. (Rectificada pela Declaração de Rectificação 18/2014, de 13 de Março)

 

             Para além disso, a mesma Lei n.º 82-C/2014, aditou ao CIRC o artigo 69.º-A, com a seguinte redação:

                                                         Artigo 69.º -A

Sociedade dominante com sede ou direção efetiva noutro Estado membro da União Europeia ou do Espaço Económico Europeu

1 – Pode igualmente optar pela aplicação do regime especial de tributação dos grupos de sociedades previsto na presente subsecção a sociedade dominante, como tal qualificada nos termos do n.º 2 do artigo anterior que, não tendo sede ou direção efetiva em território português, preencha cumulativamente as seguintes condições:

a) Seja residente de um Estado membro da União Europeia ou do Espaço Económico Europeu que esteja vinculado a cooperação administrativa no domínio da fiscalidade equivalente à estabelecida no âmbito da União Europeia;

b) Detenha a participação nas sociedades dominadas há mais de um ano, com referência à data em que se inicia a aplicação do regime;

c) Não seja detida, direta ou indiretamente, pelo menos, em 75 % do capital, por uma sociedade residente em território português que reúna os requisitos previstos no artigo anterior para ser qualificada como dominante, desde que tal participação lhe confira mais de 50 % dos direitos de voto, nos termos do n.º 6 do artigo anterior;

d) Não tenha renunciado à aplicação do regime nos três anos anteriores, com referência à data em que se inicia a aplicação do regime;

e) Esteja sujeita e não isenta de um imposto referido no artigo 2.º da Diretiva n.º 2011/96/UE, do Conselho, de 30 de novembro, ou de um imposto de natureza idêntica ou similar ao IRC;

f) Revista a forma de sociedade de responsabilidade limitada;

g) Quando detenha um estabelecimento estável em território português através do qual sejam detidas as participações nas sociedades dominadas e não se verifique relativamente a este qualquer das situações previstas nas alíneas a), c), d) ou e) do n.º 4 do artigo anterior, com as necessárias adaptações.

2 – A opção prevista no número anterior determina a aplicação do regime especial de tributação dos grupos de sociedades relativamente a todas as sociedades dominadas com sede e direção efetiva em território português relativamente às quais se verifiquem as condições estabelecidas nos n.ºs 3 e 4 do artigo anterior, bem como ao estabelecimento estável da sociedade dominante situado neste território através do qual sejam detidas as participações.

3 – A opção pelo regime nos termos do presente artigo depende da comunicação à Autoridade Tributária e Aduaneira, na declaração a que se refere o n.º 7 do artigo anterior, de qual a sociedade com sede e direção efetiva neste território pertencente ao grupo designada para assumir a responsabilidade pelo cumprimento de todas as obrigações que incumbem à sociedade dominante nos termos do presente Código, sem prejuízo da responsabilidade solidária da sociedade dominante e das demais sociedades pertencentes ao grupo pelo pagamento do imposto, nos termos do artigo 115.º.

4 – Nos casos em que a sociedade dominante possua um estabelecimento estável em território português através do qual sejam detidas as participações nas sociedades dominadas, o disposto no número anterior é obrigatoriamente observado por este.

5 – Em tudo o que não estiver previsto no presente artigo é aplicável, com as necessárias adaptações, o disposto no artigo anterior.

 

24. Alega a Requerente que, à face da jurisprudência citada do TJUE, já reunia, em 2013, os requisitos para ser tributada segundo o RETGS de acordo com um perímetro de grupo que compreendesse a D… considerando como sociedade dominante a B… .

A questão essencial que a Requerente coloca é a de saber se a autoliquidação, bem como a decisão da reclamação graciosa que a manteve devem ser declaradas ilegais, por não terem aplicado e interpretado o artigo 69.º do CIRC, às situações tributárias relativas ao exercício de 2013 em conformidade com o Direito europeu e a jurisprudência do TJUE .

          Esta questão já foi decidida na Decisão Arbitral proferida no Processo n.º 101/2017-T, cujos pressupostos factuais e jurídicos são idênticos ao caso em apreço.

           Por concordarmos com a jurisprudência aí consignada, passamos a seguir a segui-la de perto, reproduzindo-a, como se segue:

          “(…) a aplicação do RETGS ao exercício de 2013 não depende apenas da verificação dos requisitos legais a sua aplicação, pois é um regime facultativo, só aplicável na sequência de uma opção da sociedade dominante, formulada com antecedência em relação ao termo do primeiro exercício em que se pretende a sua aplicação.

          “A admissibilidade de opção dos sujeitos passivos de IRC pela aplicação do RETGS, com a possibilidade de obtenção de vantagens fiscais por estes e consequente perda de receitas tributárias, justifica-se por fins extrafiscais, designadamente facilitar «a reestruturação do tecido empresarial e a recuperação dos grupos económicos, através da promoção das sinergias entre empresas integradas num grupo, reforçando e consolidando o tecido empresarial, para assim alcançar maior competitividade e favorecer a concorrência», não sendo justificável para obtenção de «finalidades exclusivamente fiscais» (acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 29-12-2012, processo n.º 021/12).

          “A esta luz, a imposição da obrigação de optar pela aplicação deste regime antes de serem conhecidos os resultados da sua aplicação, harmoniza-se com este desígnio legislativo de dificultar a utilização do regime para finalidades exclusivamente fiscais, que seria viável com a possibilidade de aplicação retroactiva, com apuramento primeiro dos resultados fiscais e só posterior escolha do regime fiscal mais vantajoso.

          “Por isso, a imposição daquele prazo para formulação da opção tem fundamento que não se compagina com o entendimento da Requerente de que «o não exercício do direito, até ao final do 3.º mês no período de tributação a que se pretende iniciar a aplicação, não invalida o reconhecimento posterior do referido direito e a, consequente, aplicação retroativa».

          “Na verdade, essa opção no prazo previsto tem de ser manifestada pela sociedade dominante (e não por alguma ou algumas ou todas as sociedades dominadas), sendo essa manifestação imprescindível por, além do mais, implicar para aquela a assunção de responsabilidades fiscais (artigo 115.º do CIRC), para além de obrigações declarativas.”

          No caso em apreço, como resulta da factualidade provada (vd. acima n.º V do probatório) não foi apresentado, em 2013, requerimento de opção pela tributação segundo o RETGS com o perímetro pretendido nem pela Requerente nem pela sociedade dominante do grupo.

          Não sendo a aplicação do RETGS automática e não tendo sido efetuada opção no sentido da sua aplicação nos termos em causa nestes autos, a autoliquidação individual efetuada pela Requerente não enferma de ilegalidade, por não ter feito aplicação do regime especial de tributação dos grupos de sociedades nos termos de um RETGS com a B… como sociedade dominante e com inclusão da D…, pois não estavam reunidos os pressupostos para sua aplicação, designadamente uma opção tempestivamente apresentada.

          Por outro lado, como também consignado na Decisão Arbitral atrás referenciada, não podia a Autoridade Tributária e Aduaneira na sequência dos pedidos de reclamação do ato tributário, como também não pode este Tribunal Arbitral, ficcionar que tinha sido feita pela sociedade dominante, no prazo legalmente previsto, opção pela aplicação do regime especial de tributação dos grupos de sociedades relativamente ao exercício de 2013.

          Finalmente, sempre se acrescentará que se a Requerente pretendia, com o perímetro indicado, a aplicação do regime especial de tributação dos grupos de sociedades previsto no artigo 69.º do CIRC, interpretado segundo a Jurisprudência do TJUE, ao exercício de IRC de 2013, deveria ter começado por formular, em tempo oportuno, o pedido de opção por aquele regime à AT. Não constitui argumento válido a alegação da Requerente de que o artigo 69.º do CIRC o não permitia. Com efeito, no seguimento da resposta da AT, se fosse negativa, abrir-se-ia então para a Requerente o direito a enveredar pela interposição de ação de reconhecimento de direitos ou de ação especial de condenação à prática de ato devido nos tribunais tributários estaduais. Acresce salientar que a questão da eventual discriminação entre sociedades residentes e não residentes apenas se pode colocar quando as mesmas se encontram na mesma situação, isto é, depois de feita a opção declarativa pelo regime e verificados os pressupostos formais prévios. Antes disso não se pode falar, sem mais, em desigualdade ou de qualquer discriminação na aplicação do direito europeu, porquanto as situações são materialmente diferentes.  

          Pelo exposto, conclui-se que a autoliquidação, seguida da decisão de indeferimento da reclamação graciosa n.º …2016…, não enfermam de ilegalidade por não terem feito aplicação do regime especial de tributação dos grupos de sociedades com a inclusão da sociedade D…, Lda.

         

          d) Questões de conhecimento prejudicado

 

          Verificando-se um obstáculo à procedência do pedido, fica prejudicada a apreciação das demais questões de legalidade colocadas pela Requerente e pela Autoridade Tributária e Aduaneira.

 

V. Decisão

 

Nestes termos, acordam neste Tribunal Arbitral em:

 

  • Julgar improcedentes as exceções suscitadas pela Autoridade Tributária e Aduaneira;
  • Julgar improcedente o pedido de pronúncia arbitral;
  • Absolver a Autoridade Tributária e Aduaneira dos pedidos.

 

 

VI. Valor do processo

 

De harmonia com o disposto no art. 306.º, n.ºs 1 e 2 do Código de Processo Civil (CPC), no artigo 97.º-A, n.º 1, al. a) do CPPT, aplicáveis por força das alíneas c) e e) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT e do n.º 2 do artigo 3.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária (RCPAT), fixa-se ao processo o valor de €104.196,72 (cento e quatro mil cento e noventa e seis e setenta e dois cêntimos).

 

VII. Custas

 

De harmonia com o disposto nos artigos 12.º, n.º 2, e 22.º, n.º 4, ambos do RJAT, e no artigo 4.º, n.º 4 do RCPAT, fixa-se o valor da taxa de arbitragem em €3.060,00, nos termos da Tabela I do mencionado RCPAT, a cargo das Requerentes (art. 527.º, n.ºs 1 e 2 do CPC ex vi art. 29.º, n.º 1, al. e) do RJAT).

 

 Notifique-se.

 

Lisboa, 11 de abril de 2018.

 

Conselheira Fernanda Maçãs (árbitro-presidente),

 

 

Prof. Doutor Jónatas Machado

 

 

Dr. João Menezes Leitão

 

 



[1] Adota-se a ortografia resultante do Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa de 1990, tendo sido atualizada, em conformidade, a grafia constante das citações efetuadas.