Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 303/2019-T
Data da decisão: 2019-12-23  IRC  
Valor do pedido: € 171.440,73
Tema: IRC – Perdas por imparidade – Perdão de dívida – Notas de crédito – Princípio da especialização dos exercícios.
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Decisão Arbitral

 

                Os árbitros Cons. Jorge Lopes de Sousa (árbitro-presidente), Dr. Jorge Carita e Prof.ª Doutora Maria do Rosário Anjos (árbitros vogais) designados pelo Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa para formarem o Tribunal Arbitral, constituído em 08-07-2019, acordam no seguinte:

 

 

1. Relatório

 

A..., S.A., sociedade com o número único de matrícula e de pessoa coletiva ..., com sede na ..., n.º..., ..., ... (...-...), (doravante, “Requerente "), veio, nos termos do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (doravante “RJAT”), requerer a constituição de Tribunal Arbitral.

A Requerente pretende a declaração de ilegalidade do acto tributário consubstanciado na liquidação adicional de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (IRC) n.º 2018..., datada de 10-12-2018, na demonstração de liquidação de juros compensatórios n.º 2018... e na demonstração de acerto de contas n.º 2018..., datadas de 12-12-2018, referentes ao exercício de 2015.

A Requerente pode anda reembolso do imposto que considera indevidamente pago, com juros indemnizatórios.

                É Requerida a AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA.

O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD e automaticamente notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira em 24-04-2019.

Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redacção introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, o Conselho Deontológico designou como árbitros do tribunal arbitral colectivo os signatários, que comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável.

Em 17-06-2019 foram as partes devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a designação dos árbitros, nos termos conjugados do artigo 11.º n.º 1 alíneas a) e b) do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.

Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redacção introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, o tribunal arbitral colectivo foi constituído em 08-07-2019.

A Administração Tributária e Aduaneira apresentou resposta, defendendo que o pedido de pronúncia arbitral deverá ser julgado improcedente.

Em 20-11-2019, foi realizada a reunião prevista no artigo 18.º do RJAT, ouvidas as testemunhas e decidido que o processo prosseguisse com alegações escritas sucessivas.

                               O tribunal arbitral foi regularmente constituído, à face do preceituado nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), e 10.º, n.º 1, do DL n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, e é competente.

As Partes estão devidamente representadas gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão representadas (artigos 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março).

O processo não enferma de nulidades.

 

2. Matéria de facto

2.1. Factos provados

 

Consideram-se provados os seguintes factos:

 

A)           A Requerente é uma sociedade registada sob o CAE principal 36002 - distribuição de água e com o CAE secundário 37001 - recolha e drenagem de águas residuais, que tem como objeto a exploração em regime de concessão do sistema de captação, tratamento e distribuição de água e do sistema de recolha e rejeição dos efluentes do concelho de ...;

B)           A Autoridade Tributária e Aduaneira efectuou uma acção inspectiva à Requerente, relativa ao exercício de 2015, em que foi elaborado o Relatório da Inspecção Tributária que consta do documento n.º 23 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido, em que se refere, além do mais, o seguinte:

III.1. CORREÇÕES EM SEDE DE IRC - MATÉRIA COLETÁVEL

 

III.1.1. PERDAS POR IMPARIDADE DE DÍVIDAS A RECEBER DE CLIENTES

Descrição dos factos

Resultante da apreciação do Documento de Acompanhamento Permanente respeitante ao sujeito passivo em análise, com referência ao período de 2015, verificou-se que a rubrica de "Imparidade de dívidas a receber", inscrita na Demonstração de Resultados constante na IES, apresenta o montante de € 914.875,93.

Da análise à declaração Modelo 22 enviada pela A... do ano inspecionado, constatou-se ainda o acréscimo, no campo 718, respeitante a perdas por imparidade em inventários e em créditos não fiscalmente dedutíveis, da importância de € 97.099,20.

Questionado o sujeito passivo acerca desta matéria, foi informado o seguinte:

"O acréscimo no campo 718 do Quadro 07 da declaração Modelo 22 da importância de € 97.099,20 corresponde à diferença entre a imparidade económica e a imparidade legal, deduzida do valor da diferença que vem de 2014. O número de clientes da A... é superior a 100 mil, e ao longo de 2015 foi acima dos 113 mil. Face ao elevado número de clientes e ao valor reduzido da generalidade das faturas, o cálculo das perdas por imparidade, embora efetuado a partir do valor das faturas em dívida, não é feito documento a documento, mas com os seguintes pressupostos:

a. Apenas se consideram os clientes do tipo doméstico e do tipo comércio e indústria, sendo excluídos o Estado e o Município de ...;

b. Apenas os rendimentos da A... são considerados. Excluem-se os RSU que são rendimentos do Município de ..., e o IVA não recuperável de faturas anteriores a Ide janeiro de 2013, e a taxa de recursos hídricos;

c. São excluídos os documentos com acordo de pagamento;

d. São excluídos os documentos em processo de contencioso."

Foi disponibilizado um ficheiro em excel com o apuramento das perdas por imparidade de clientes contabilizadas em 2015, onde se encontra calculada a imparidade gerada no período, os valores acumulados de anos anteriores dos clientes do tipo "doméstico", "comércio" e "instituições", bem como o cálculo do diferencial de € 97.099,20, apurado pelo sujeito passivo resultante da aplicação do critério económico/fiscal.

Verificou-se ainda que a conta 219 - Perdas por imparidade acumuladas, registou um acréscimo de € 569.095,35 face ao ano anterior, conforme a seguir se apresenta:

 

 

Atendendo a que a perda por imparidade contabilizada como gasto, na conta 6511 (€ 914.875,93), excede a variação registada na conta 219 em € 569.095,35, questionou-se novamente o sujeito passivo.

Em resposta, foram apresentados os seguintes documentos

- Mapa de Provisões e Perdas por Imparidade (Modelo 30), onde consta a discriminação do montante de constituição ou reforço da imparidade de € 914.875,93, bem como o valor de "utilização" que se cifrou em € 345.780,58.

- Ficheiro em excel denominado por "Registo_NC_Anos_Anteriores que apresenta um resumo das Notas de Crédito emitidas pela A... no período inspecionado e que foram contabilizadas nas contas 219 -Perdas por imparidade acumuladas e 6881 - Correções relativas a períodos anteriores.

Na sequência da análise efetuada aos elementos apresentados pelo sujeito passivo, verificou-se que o montante contabilizado como perda por imparidade na conta 6511 (€ 914.875,93), é composto pelas seguintes parcelas:

 

- € 569.095,35 - Corresponde ao aumento verificado na conta 219 face ao período anterior, no que concerne à imparidade registada pelo sujeito passivo respeitante aos clientes do tipo "doméstico", "comércio" e "instituições";

- € 345.780,58 - Corresponde a notas de crédito emitidas pela A... em 2015 com o intuito de anular faturas anteriores a 2013 e que se encontram contabilizadas na conta 219, por débito da conta 6511.

Tendo sido solicitado ao sujeito passivo o envio de fotocópia de algumas notas de crédito contabilizadas na conta 219, bem como esclarecimento relativo ao procedimento adotado, foi informado o seguinte:

"As NC de faturas de anos anteriores têm registo:

• Na conta "2190000000 Clientes gerais c/c Perdas p imparidade acumuladas" para as faturas com data anterior a 2013. Como se pode verificar no ficheiro "B. Mapa de Perdas por imparidade", a dívida até 2012, inclusive, tem imparidade a 100%.

«Na conta "6881000000 Corr Relat Per. Ant." para as faturas com data de 2013 e 2014, porque nestes anos a imparidade não era de 100% da dívida."

Verificou-se ainda, da amostragem efetuada às notas de crédito emitidas pela A... contabilizadas na conta 6511, que as mesmas se destinam a corrigir faturação emitida pela A... em 2010 e 2012.

 

Enquadramento contabilístico e fiscal

O Código do IRC consagra o modelo de dependência parcial entre a fiscalidade e a contabilidade para efeitos de apuramento do resultado fiscal e o regime do acréscimo (periodização económica). Assim, para efeitos do apuramento do resultado contabilístico os factos patrimoniais devem ser relevados em obediência às NCRF, submetendo-se posteriormente à análise das normas contidas no CIRC e legislação complementar.

Mais concretamente, de acordo com a estrutura concetual do SNC, uma das características qualitativas a que as demonstrações financeiras devem obedecer é a da prudência, segundo a qual as perdas por imparidade ou, se for o caso, a consideração de créditos incobráveis, devem ser reconhecidos contabilisticamente quando se verifiquem os eventos de perda previstos nos parágrafos 24 e 25 da NCRF 27 - Instrumentos Financeiros integrante do SNC aprovado pelo Decreto-lei n.º 158/2009, de 13 de julho pelo que, para efeitos, do apuramento do resultado contabilístico, este reconhecimento deve seguir as regras contabilísticas.

Numa fase posterior, para a determinação do resultado fiscal, essas perdas deverão ser analisadas face às normas fiscais e objeto de regularização extracontabilística, se for caso disso.

Assim, em termos contabilísticos, a norma que enquadra os procedimentos e os princípios relacionados com a mensuração de clientes é a Norma Contabilística e de Relato Financeiro (NCRF) 27- Instrumentos financeiros, que dispõe que, no final de cada ano, à data do balanço, devem ser avaliadas todas as dívidas a receber no sentido de avaliar a existência de evidências objetivas de imparidade, considerando-se como tal, de acordo com o seu parágrafo 24:

• Significativa dificuldade financeira do cliente/devedor;

• Quebra contratual, tal como incumprimento no pagamento ou amortização da dívida;

• Oferta pelo credor ao devedor, por razões económicas ou legais relacionadas com dificuldades financeiras do devedor, de concessões que, de outro modo, não consideraria;

• A probabilidade do devedor entrar em falência ou outra reorganização financeira;

• Desaparecimento de um mercado ativo para o devedor devido às suas dificuldades financeiras.

A normalização contabilística dá igualmente ênfase ao cumprimento do princípio da periodização económica (cfr. parágrafo 22 da Estrutura Concetual do SNC), relevado na ótica fiscal no artigo 18.º do CIRC, já mencionado.

Deste modo, sempre que o contribuinte constate haver forte probabilidade de que uma dívida a receber se torne de duvidoso recebimento, deverá reconhecer em gastos dos respetivos períodos de tributação a provável perda pelo não recebimento (trata-se da conjugação do princípio da prudência com o princípio da periodização).

Em termos fiscais, dispõe a alínea h) do n.º 1 do artigo 23.º do CIRC, que são dedutíveis os gastos e perdas incorridos ou suportados pelo sujeito passivo para obter ou garantir os rendimentos sujeitos a IRC, designadamente, as perdas por imparidade.

De acordo com o disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 28.º-A do CIRC, podem ser deduzidas para efeitos fiscais as imparidades, quando contabilizadas no mesmo período de tributação ou em períodos de tributação anteriores "(...) relacionadas com créditos resultantes da atividade normal, incluindo os juros pelo atraso no cumprimento de obrigação que, no fim do período de tributação, possam ser considerados de cobrança duvidosa e sejam evidenciados como tal na contabilidade".

No entanto, o n.º 1 do artigo 28.º-B do CIRC estabelece um conjunto de requisitos, a saber:

"Para efeitos da determinação das perdas por imparidade previstas na alínea a) do n.º 1 do artigo anterior, consideram-se créditos de cobrança duvidosa aqueles em que o risco de incobrabilidade esteja devidamente justificado, o que se verifica nos seguintes casos:

a) O devedor tenha pendente processo de execução, processo de insolvência, processo especial de revitalização ou procedimento de recuperação de empresas por via extrajudicial ao abrigo do Sistema de Recuperação de Empresas por Via Extrajudicial (SIREVE), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 178/2012, de 3 de agosto;

b) Os créditos tenham sido reclamados judicialmente ou em tribunal arbitral;

c) Os créditos estejam em mora há mais de seis meses desde a data do respetivo vencimento e existam provas objetivas de imparidade e de terem sido efetuadas diligências para o seu recebimento."

 

No n.º 2 do mesmo artigo vem determinado que:

"O montante anual acumulado da perda por imparidade de créditos referidos na alínea c) do número anterior não pode ser superior às seguintes percentagens dos créditos em mora:

a) 25% para créditos em mora há mais de 6 meses e até 12 meses;

b) 50% para créditos em mora há mais de 12 meses e até 18 meses;

c) 75% para créditos em mora há mais de 18 meses e até 24 meses;

d) 100% para créditos em mora há mais de 24 meses."

 

Importa referir que a lei fiscal faz depender a aceitação do montante anual acumulado da perda por imparidade de determinadas percentagens dos créditos em mora em função de um escalonamento temporal de acordo com a antiguidade dos respetivos saldos, permitindo que o reconhecimento da perda se faça no exercício em que o crédito for considerado como de cobrança duvidosa e pelo valor percentual do escalão em que se enquadra a respetiva mora, sem contudo, exigir que lenha sido reconhecido em exercício anterior, quando a mora do crédito ultrapassou os seis meses.

Assim, por exemplo, se a avaliação do risco de incobrabilidade identificar que determinado crédito deva ser reconhecido como de cobrança duvidosa apenas ao fim de 19 meses, deverá ser registado como tal na contabilidade e constituída a perda por imparidade a 75%, sendo a mesma aceite como gasto fiscal, na estrita observância do disposto na alínea c) do n.º 1 do artigo 28.º-B do CIRC ou seja, no que concerne à exigência de provas efetivas de imparidade e de terem sido efetuadas diligências para o recebimento dos créditos.

Em matéria de créditos incobráveis, refira-se o disposto no n.º 1 do artigo 41.º do CIRC, que dispõe expressamente que os créditos incobráveis podem ser diretamente considerados gastos ou perdas do período de tributação desde que não tenha sido admitida perda por Imparidade ou. sendo-o, esta se mostre insuficiente, em qualquer uma das seguintes condições:

- Em processo de execução, após o registo a que se refere a alínea b) do n.º 2 do artigo 717.º do Código de Processo Civil;

- Em processo de insolvência, quando a mesma for decretada de caráter limitado ou quando for determinado o encerramento do processo por insuficiência de bens, ou após a realização do rateio final, do qual resulte o não pagamento definitivo do crédito;

- Em processo de insolvência ou em processo especial de revitalização, quando seja proferida sentença de homologação do plano de insolvência ou do plano de recuperação que preveja o não pagamento definitivo do crédito;

- No âmbito de litígios emergentes da prestação de serviços públicos essenciais, após decisão arbitrai;

- Nos termos do regime jurídico da prestação de serviços públicos essenciais, os créditos se encontrem prescritos e o seu valor não ultrapasse o montante de € 750,00;

- Quando for celebrado e depositado na Conservatória do Registo Comercial acordo sujeito ao Regime Extrajudicial de Recuperação de Empresas (RERE) que cumpra com o disposto no n.º 3 do artigo 27.º do RERE e do qual resulte o não pagamento definitivo do crédito.

Atente-se ainda, ao pressuposto contabilístico do regime do acréscimo, também previsto fiscalmente no n.º 1 do artigo 18.º do CIRC, que estipula que as regras para a determinação dos créditos incobráveis têm que ser conjugadas com o regime de periodização económica.

Assim, para efeitos de aferição da obediência aos requisitos estabelecidos no CIRC para a aceitação fiscal da perda por imparidade em análise, importa verificar então se se encontram preenchidos os requisitos anteriormente especificados.

Ora como vimos, foram emitidas pelo sujeito passivo no período em apreciação, diversas notas de crédito, destinadas a corrigir faturas de anos anteriores, sem qualquer evidência do enquadramento legal de tal procedimento nas normas emanadas pelo CIRC no que concerne à aceitação fiscal de perdas por imparidade.

Não se encontra devidamente evidenciado um conjunto de procedimentos que o sujeito passivo deve adotar no sentido da aceitação fiscal das perdas por imparidade, nomeadamente:

- comprovar que as mesmas estejam relacionadas com créditos resultantes da atividade normal da empresa, porquanto não foram apresentados os documentos que lhes deram origem;

- demonstrar, inequivocamente, que se encontra verificado o respetivo risco de incobrabilidade, na aceção das várias alíneas do n.º 1 do artigo 28.º-B do CIRC;

- justificar se alguma das situações se enquadram no artigo 41.º do CIRC, no que aos créditos incobráveis diz respeito;

- observar o cumprimento do princípio da periodização económica.

Assim, não logrou o sujeito passivo produzir prova do cumprimento da legislação fiscal uma vez que não se encontra evidenciado qualquer facto, situação ou circunstância suscetível de enquadrar a situação em análise em matéria de perdas por imparidade.

Com efeito, verifica-se que os elementos apresentados consubstanciam-se em notas de crédito emitidas pelo sujeito passivo destinadas a corrigir/regularizar saldos oriundos de anos anteriores e, portanto, não suscetíveis de beneficiar do tratamento fiscal em sede de perdas por imparidade.

Também o sujeito passivo não veio demonstrar, de forma concisa, o cumprimento dos requisitos previstos no normativo contabilístico nacional, no que às evidências objetivas de imparidade de dívidas a receber diz respeito.

Face ao exposto, conclui-se que o sujeito passivo não cumpriu com os requisitos exigidos para que a perda por imparidade no montante de € 345.780,58 possa ser aceite fiscalmente, nos termos do disposto nos artigos 23.º, 28.º-A e 28.º-B do CIRC.

 

III.1.2. OUTROS GASTOS E PERDAS - CORREÇÕES RELATIVAS A PERÍODOS ANTERIORES

 

III.1.2.1. PERDÃO DE DÍVIDA

 

Descrição dos factos

No decurso do procedimento inspetivo verificou-se que a conta 6881 - Correções relativas a períodos anteriores, apresenta o montante de €229.372,58.

Da análise à declaração Modelo 22 enviada pelo sujeito passivo com referência ao período inspecionado, constatou-se que não foi acrescida qualquer importância no campo correspondente para o efeito, designadamente o campo 710 - correções relativas a períodos de tributação anteriores.

Neste sentido, notificou-se o sujeito passivo para apresentar os extratos contabilísticos, bem como os documentos de suporte de montante mais significativo.

•Atentos os documentos enviados pelo sujeito passivo na sequência da notificação enviada, verificou-se a contabilização da importância de € 100.412,96, conforme a seguir se indica:

 

 

O documento de suporte subjacente ao lançamento contabilístico identificado anteriormente "", contém a seguinte informação:

"Reformulação da informação anterior, ao Conselho de Administração de 16-12-2015:

- os valores a favor da A... € 234.570,43 são anteriores a 2004, com exceção de uma verba de € 5.931,42 referente a 2008 e foram já submetidos à CM... em 2004 e 2008. Não houve reclamação por parte da CM... e, como se refere na Informação 1663/12/1, nunca foram referidos nas circularizações anuais de saldos;

- os valores a favor da A... foram tratados da mesma forma (descrita anteriormente).

O Conselho de Administração, tendo em conta a antiguidade dos valores em questão, aprovou, na reunido de 16-12-2015, a proposta de prescindir da cobrança à ..., do saldo a favor da A... de € 100.412,96."

Como suporte às informações prestadas pelo sujeito passivo, foi calculado o montante a favor da A...  resultante do acerto de contas efetuado, da seguinte forma:

-2781020000-Outros devedores-CM... (despesas SMAS): €234.570,43 (a) - 2782030000 - Outros credores – CM... (receitas SMAS): - € 134.157,47 (b)

Saldo €100.412,96 (a) + (b)

Indagado o sujeito passivo acerca desta matéria, foram enviados os seguintes elementos:

- Fotocópia da Ata n.º 13/2015 do Conselho de Administração (CA) da A..., de 2015/12/16, onde se encontra deliberado, na alínea g) do ponto 6, o seguinte:

"O CA tomou conhecimento da atualização da informação 1863/12/1 apresentada na reunião do CA de 19/12/12 tendo aprovado, tendo em conta a antiguidade dos valores em questão (mais de 10 anos), prescindir da cobrança à CM... do saldo a favor da A... de € 100.412,36."

- Fotocópia da Informação n.º 1863/12/1, elaborada pela Direção Administrativa e Financeira da A... em 2012/12/17. com o assunto: "Valores de encontros de contas com a concedente", tendo sido apurado à data um saldo a favor da A... de € 111.911,64, conforme a seguir se transcreve:

"O Contrato de Concessão refere na cláusula 80.B.

"RECEBIMENTOS E PAGAMENTOS

1. Todos os recebimentos e pagamentos correspondentes a fornecimentos e aquisições realizados anteriormente à data de início de Período de Funcionamento deverão ser remetidos pela Concessionária à Concedente em encontro de contas trimestral.

2. A Concessionária desenvolverá todas as ações e tomará todas as medidas de boa gestão para promover a boa cobrança da faturação relativa aos fornecimentos referidos no número anterior, assumindo igualmente todos os encargos que daí advenham.

3. Doze meses após a data de início do Período de Funcionamento, termina a obrigação de transferência referida no número um deste artigo, devolvendo a Concessionária ao Concedente todos os documentos de cobrança referentes à faturação mencionada no número dois que se encontrem por liquidar."

No âmbito desta cláusula foram efetuados até 2004 vários encontros de contas com a Concedente, tendo, inclusive, havido uma auditoria externa, por conta da Concedente, aos valores de alguns destes encontros de contas.

Porém, foram recebidos e pagos valores não incluídos nos encontros de contas realizados, que se encontram refletidos nas contas da A...:

2781020000 Outros devedores – CM... (despesas SMAS): 234,570,43

2782030000 Outros credores – CM... (receitas SMAS): -64.690,13

Os quadros em anexo apresentam o detalhe destes valores, sendo que cópias dos documentos do quadro, que apresenta um saldo a favor da A... de €111.911,64, foram enviadas à CAF (Comissão de acompanhamento e fiscalização), e posteriormente ao Departamento Financeiro da Câmara Municipal de ... .

A Câmara Municipal de ... tem sido objeto de circularização de saldos, por parte do Revisor Oficial de Contas, e nunca fez qualquer referência a estes valores."

 

- Extratos de conta corrente respeitantes à Câmara Municipal de ..., enquanto devedora e credora, tendo sido informado pelo sujeito passivo o seguinte:

"Os pagamentos que a A... efetuou pela Concedente foram registados, com o POC na conta 26816 ENCONTRO DE CONTAS C/ OS SMAS ..., e com o SNC na conta 2781020000 Outros devedores – CM... (despesas SMAS).

Os recebimentos que a A... efetuou pela Concedente, principalmente faturas de clientes emitidas antes de l de janeiro de 2001, foram registados, com o POC na conta 26883 ENCONTRO DE CONTAS C/ OS SMA ..., e com o SNC na conta 2782030000 Outros credores

- CM... (receitas SMAS)."

Assim sendo, importa aferir se o respetivo gasto cumpre os requisitos para que seja aceite a sua dedutibilidade para efeitos fiscais.

 

Enquadramento contabilístico e fiscal

A Norma Contabilística e de Relato Financeiro (NCRF) n.º 27 - Instrumentos financeiros, estabelece os conceitos e regras de reconhecimento e mensuração dos ativos financeiros, passivos financeiros e instrumentos de capital próprio de outra entidade.

De acordo com o parágrafo 5 da referida Norma, ativo financeiro será qualquer ativo que seja dinheiro (caixa, depósitos), um instrumento de capital próprio de uma outra entidade {ações, quotas), um direito contratual de receber dinheiro ou outro ativo financeiro (clientes), para além de outras situações aí previstas.

Em termos de desreconhecimento, os parágrafos 30 a 32 da NCRF 27 estabelecem que os ativos financeiros, tais como as dívidas de terceiros, deverão ser desreconhecidos quando os direitos contratuais respeitantes aos fluxos de caixa resultantes do ativo financeiro se extingam, isto é, quando a obrigação estabelecida no contrato seja liquidada, cancelada ou expire.

Todavia, também poderão acontecer outras situações mais atípicas que levem ao desreconhecimento das dívidas de clientes/terceiros como, por exemplo, quando através de algum tipo de acordo de perdão de dívida estas sejam canceladas ou expirem.

Em termos contabilísticos, o perdão de uma importância a receber deverá resultar no desreconhecimento do ativo financeiro por contrapartida do reconhecimento de um gasto na demonstração de resultados, conforme previsto no parágrafo 92 da estrutura conceptual do ... .

Acrescenta-se ainda que, para se proceder ao desreconhecimento de um ativo nas demonstrações financeiras de uma entidade têm de existir documentos que comprovem ou a liquidação desse mesmo ativo ou o perdão de dívida por parte do credor.

Em termos fiscais, o artigo 23.º do CIRC estabelece as condições gerais a que terão que obedecer os gastos para serem fiscalmente dedutíveis:

"Artigo 23.º Gastos e perdas

1 - Para a determinação do lucro tributável, são dedutíveis todos os gastos e perdas incorridos ou suportados pelo sujeito passivo para obter ou garantir os rendimentos sujeitos a IRC.

O n.º 3 da mesma disposição legal, dispõe o seguinte:

"Os gastos dedutíveis nos termos dos números anteriores devem estar comprovados documentalmente, independentemente da natureza ou suporte dos documentos utilizados para esse efeito."

Da análise ao normativo fiscal anteriormente mencionado, resulta que são necessários três requisitos essenciais para que os gastos sejam dedutíveis para efeitos fiscais: a comprovação documental, o caráter de indispensabilidade e o da ligação aos rendimentos sujeitos a imposto.

O primeiro requisito reporta à efetividade da realização dos gastos o qual consiste em várias formas de apoio escriturai aos lançamentos contabilísticos, ou seja, à sua prova documental.

O segundo faz depender a dedutibilidade fiscal do gasto de uma relação justificada com a atividade produtiva do sujeito passivo e esta indispensabilidade ocorre quando esses gastos se relacionem com a obtenção de lucro.

Quanto ao terceiro requisito, que compõe a cláusula geral de dedutibilidade em matéria de gastos, na formulação legal introduzida pelo Código do IRC, é o da exigência de ligação aos rendimentos sujeitos a imposto, de forma a obter ou garantir os mesmos. Os gastos têm de estar relacionados com a atividade da empresa e têm de contribuir para a obtenção de ganhos.

Ou seja, nos termos do n.º 1 do artigo 23.º daquele normativo, são dedutíveis os gastos e perdas que foram contraídos no âmbito da atividade da empresa, isto é, todos aqueles que potenciem o bom desenvolvimento da empresa e claro, o seu objetivo último, o lucro.

O gasto tem de estar devidamente comprovado e tem de se encontrar adstrito à obtenção de rendimentos sujeitos a IRC, ou garantir, de forma clara, a obtenção desses mesmos rendimentos, em conjugação com as obrigações contabilísticas formais do artigo 123.º do CIRC, por forma a assegurar a legitimidade e consistência dos gastos da atividade empresarial e a sua congruência com a atividade da empresa, com o seu escopo social e, com o seu fim último que é o lucro.

Ora, no caso em apreciação e de acordo com a informação recolhida no âmbito do procedimento interno de inspeção, verificou-se que foi efetuado na contabilidade um "encontro de contas" correspondente à Câmara Municipal de..., enquanto entidade devedora e credora, resultando o valor em dívida que remonta a anos anteriores, de € 100.412,96.

O sujeito passivo, na ata realizada em 2015/12/16, deliberou "prescindir da cobrança à CM... do saldo a favor da A... de € 100.412,96", em virtude da "antiguidade dos valores em questão" o qual afetou negativamente o resultado do exercício em análise e que importa aferir a sua dedutibilidade fiscal.

Sem deixar de ter presente que não compete à AT sindicar a bondade das opções da gestão empresarial ou políticas contabilísticas que o sujeito passivo entende prosseguir assiste-lhe, no entanto, a prerrogativa de se pronunciar sobre as consequências das mesmas face às leis tributárias.

Com efeito, o perdão de dívida entre entidades distintas, ou seja a renúncia do credor quanto à obrigação que poderia exigir do devedor, é considerado:

- Rédito tributável para a empresa que viu a sua dívida perdoada;

- Gasto não dedutível para a empresa credora, que decidiu praticar uma liberalidade consubstanciada no ato de prescindir de exercer o seu direito à cobrança do crédito que detinha sobre uma entidade terceira.

Relativamente a este assunto, salienta-se o referido no Acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo Sul n.º 01576/07, de 2007/03/13:

"(...) as pessoas coletivas em geral e as sociedades em particular, têm a capacidade de exercício de direitos limitada aos fins que visam prosseguir, não podendo perdoar dívidas e dal retirar efeitos fiscais, como seja o de constituir um custo fora do âmbito em que a lei permite a constituição de provisões para créditos de cobrança duvidosa ou do regime dos custos por créditos incobráveis".

Como corolário do exposto nos parágrafos anteriores, podemos afirmar que o reconhecimento do gasto, no montante de € 100.412,96, não preenche os requisitos estabelecidos na legislação fiscal, nomeadamente no artigo 23.º do CIRC, para que se aceite a sua dedutibilidade para efeitos fiscais, pelo que se acresce ao lucro tributável aquele montante.

 

III.1.2.2. NOTAS DE CRÉDITO

Descrição dos factos

No decurso do presente procedimento de inspeção, detetou-se a contabilização, na conta 6881 -Correções relativas a períodos anteriores, de diversas notas de crédito, emitidas pela A..., que somam a importância de €128.959,04.

Indagado o sujeito passivo acerca desta matéria e no âmbito da análise efetuada no âmbito das perdas por imparidade, a qual se encontra descrita anteriormente, foi informado o seguinte 6:

"As NC de faturas de anos anteriores têm registo: (...)

• Na conta "6881000000 Corr. Relat. Per. Ant." para as faturas com data de 2013 e 2014, porque nestes anos a imparidade não era de 100% da dívida."

Verificou-se ainda, da amostragem efetuada às notas de crédito enviadas pelo sujeito passivo e contabilizadas na conta 6881, que as mesmas se destinaram a corrigir faturação emitida pela A... em 2014.

 

Enquadramento fiscal e contabilístico

Conforme já referido, a NCRF 27 - Instrumentos financeiros dispõe que, no final de cada ano, à data do balanço, devem ser avaliadas todas as dívidas a receber no sentido de avaliar a existência de evidências objetivas de imparidade, previstas no parágrafo 24 da referida Norma.

Para efeitos fiscais e de acordo com o que se expôs anteriormente, são dedutíveis, para a determinação do lucro tributável, nos termos do n.º 1 do artigo 23.º do CIRC, todos os gastos e perdas incorridos ou suportados pelo sujeito passivo para obter ou garantir os rendimentos sujeitos a IRC.

A cláusula geral de dedutibilidade fiscal dos gastos, ínsita no normativo fiscal referenciado, prevê o cumprimento de três requisitos essenciais, designadamente, a comprovação documental, o caráter de indispensabilidade e o da ligação aos rendimentos sujeitos a imposto.

Por outro lado, no âmbito da legislação fiscal já referenciada no presente relatório e que aqui se dá por reproduzida, as perdas por imparidade relativas a créditos apenas podem ser aceites fiscalmente nos termos previstos na alínea a) do n.º 1 do artigo 28.º-A e no artigo 28.º-B, ambos do CIRC, quando se encontrarem verificadas, cumulativamente, as seguintes condições:

1 - Estejam relacionadas com créditos resultantes da atividade normal;

2 - Sejam evidenciados na contabilidade como sendo de cobrança duvidosa;

3- O risco de incobrabilidade seja devidamente comprovado o que acontece nas seguintes condições:

a) O devedor tenha pendente processo de execução, insolvência, revitalização, recuperação de empresas ou processo de execução;

b) Os créditos tenham sido reclamados judicialmente ou em tribunal arbitral;

c) Os créditos estejam em mora há mais de seis meses desde a data do respetivo vencimento, existam provas objetivas da imparidade e de terem sido efetuadas diligências para o seu recebimento. Para estes créditos apenas são aceites como perdas para efeitos fiscais as percentagens previstas no n.º 2 do artigo 28.º-B do mesmo diploma, que são estabelecidas em função da mora do crédito.

No caso em apreciação, as notas de crédito vêm anular faturas emitidas pelo sujeito passivo em 2013 e 2014, com o argumento, segundo a A..., de "(...) nestes anos a imparidade não era de 100% da dívida."

Ora, como vimos, a imparidade de créditos obedece a todo um conjunto de procedimentos expressamente previstos na legislação fiscal.

Contudo, no caso em apreciação não foi disponibilizada qualquer evidência do cumprimento das normas emanadas pelo CIRC, relativamente aos clientes que foram objeto da correspondente anulação das faturas, uma vez que o sujeito passivo não logrou demonstrar o cumprimento das condições de caráter cumulativo anteriormente descritas.

Assim:

- Não foi demonstrado, de forma inequívoca, que se verificou o respetivo risco de incobrabilidade, de acordo com as várias alíneas do n.º 1 do artigo 28.º-B do CIRC;

- Não foi demonstrado a aplicação das percentagens previstas no n.º 2 do mesmo normativo;

- Não foram comprovadas documentalmente quaisquer eventuais diligências adotadas pela A... no sentido da recuperação de tais créditos;

- Não foi justificado documentalmente se estamos perante situações de dívidas incobráveis, nos termos do disposto no artigo 41.º do CIRC;

- Não se vislumbra o motivo para a correção de faturas emitidas em anos anteriores (2013 e 2014), sendo que tal procedimento teria observar o princípio da periodização económica plasmado no artigo 18.º do CIRC.

Em conclusão, não se encontram verificados os pressupostos subjacentes á dedutibilidade fiscal dos gastos, conforme dispõe o artigo 23.º do CIRC, uma vez que não se encontra justificada a natureza do gasto em apreciação.

Face ao exposto, deve ser acrescido ao resultado líquido do período o montante de € 128.959,04, nos termos da legislação anteriormente citada.

 

III.2. CORREÇÕES EM SEDE DE IRC -IMPOSTO

III.2.1. DERRAMA

Na sequência das correções anteriormente propostas ao resultado fiscal do sujeito passivo, no montante de € 575.152,58, identificadas nos pontos III.1.1. e III.1.2., os valores apurados relativos à Derrama Municipal e à Derrama Estadual são alterados em conformidade, conforme cálculos que se apresentam de seguida.

 

III.2.1.1. DERRAMA MUNICIPAL

As taxas da derrama municipal, nos termos do disposto nos artigos 14.º e 18.º da Lei n.º 73/2013, de 03/09, são lançadas anualmente até ao limite máximo de 1,5%, incidindo sobre o lucro tributável, sujeito e não isento de IRC, dos sujeitos passivos de IRC residentes em território português que exerçam, a título principal, uma atividade de natureza comercial, industrial ou agrícola. Por deliberação da assembleia municipal, sob proposta da câmara municipal, pode ser lançada uma taxa reduzida de derrama para os sujeitos passivos com um volume de negócios no ano anterior que não ultrapasse € 150.000,00, bem como, em situações especiais, a isenção de derrama.

Assim, temos:

 

 

III.2.2.2. DERRAMA ESTADUAL

Sobre esta matéria, o artigo 87.º-A do CIRC, dispõe que:

"1 - Sobre a parte do lucro tributável superior a (euro) 1 500 000 sujeito e não isento de imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas apurado por sujeitos passivos residentes em território português que exerçam, a título principal, uma atividade de natureza comercial, industrial ou agrícola e por não residentes com estabelecimento estável em território português, incidem as taxas adicionais constantes da tabela seguinte:

 

2- O quantitativo da parte do lucro tributável que exceda (euro) 1.500.000:

a) Quando superiora (euro) 7.500.000 e até (euro) 35.000.000, é dividido em duas partes: uma, igual a (euro) 6.000.000, à qual se aplica a taxa de 3%; outra, igual ao lucro tributável que exceda (euro) 7.500.000, à qual se aplica a taxa de 5%;

b) Quando superiora (euro) 35.000.000, é dividido em três partes: uma, igual a (euro) 6.000.000, à qual se aplica a taxa de 3%; outra, igual a (euro) 27.500.000, à qual se aplica a taxa de 5%, e outra igual ao lucro tributável que exceda (euro) 35.000.000, à qual se aplica a taxa de 7%."

Pelo que, da aplicação do normativo ao caso concreto:

• O lucro tributável apurado pelo sujeito passivo no período em apreciação foi de € 7.845.248,22;

• Face à correção proposta nos pontos III.1.1 e III.1.2., no montante de € 575.152,58, o montante do lucro tributável alterado é de € 8.420.400,80;

A Atendendo a que a empresa, pelo valor do lucro tributável corrigido se enquadra no 2.º escalão do quadro supra, ao qual corresponde a taxa de 5%, o montante da derrama estadual corrigido será de:

 

 

III.3. Resumo das correções

III.3.1. Em sede de IRC - Matéria Coletável e Imposto

Tendo em conta o referido anteriormente, a correção a efetuar ao resultado fiscal apurado pelo sujeito passivo em 2015 é a que de seguida se resume:

 

Por último refira-se que, o adicional de imposto que resultar das correções agora propostas, encontra-se sujeito à liquidação de juros compensatórios, nos termos previstos no artigo 35.º da Lei Geral Tributária, à taxa legal em vigor.

(...)

 

IX. DIREITO DE AUDIÇÃO - FUNDAMENTAÇÃO

IX. 1. - Notificação Prevista no artigo 60.º da Lei Geral Tributária

Em cumprimento do disposto no artigo 60.º da Lei Geral Tributária (LGT) aprovada pelo Decreto Lei n.º 398/98, de 17 de dezembro e no artigo 60.º do RCPITA, notificou-se o sujeito passivo, através do nosso ofício n.º..., de 2018/10/26, para exercer, no prazo de 15 dias, o direito de audição sobre as correções vertidas no projeto de relatório de inspeção tributária.

 

IX.2. - Audição Prévia

Mediante documento rececionado nestes Serviços no dia 2018/11/14, com o n.º de entrada 2018..., o sujeito passivo veio exercer o direito de audição prévia, sobre o projeto de relatório de inspeção tributária, dentro do prazo concedido para o efeito.

Na petição enviada, a A... vem manifestar a sua discordância relativamente às correções propostas e fundamentadas nos pontos III.1.1. e III.1.2.2. do presente relatório, elaborado no âmbito do procedimento de inspeção interno com incidência no período de 2015, com os factos e argumentos que analisaremos nos pontos seguintes. No tocante à correção descrita no ponto III.1.2.1. (perdão de dívida), o sujeito passivo optou por não contestar a mesma, declarando que "(...) sem prejuízo de o poder vir a fazer no momento e pelo meio processual que considere mais adequado."

 

IX.2.1. Análise do exercício de audição prévia

Não obstante o dever de pronúncia que recai sobre a Administração Fiscal, em sede específica de direito de audição, não tem a mesma de se pronunciar "ponto por ponto", quanto a cada um dos argumentos invocados peio sujeito passivo, dado que, como refere o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 2011/03/10 no processo n.º 027/11," (...) não obriga a administração a responder ponto por ponto a todas as objeções dos administrados, pois não vigoram ai as regras adjetivas relacionadas com ónus de impugnação ou omissão de pronúncia (...)".

Iremos pois, de seguida, analisar de forma sumária, as pretensões expostas pelo sujeito passivo.

 

IX.2.1.1. Argumentação aduzida pelo contribuinte

Os argumentos aduzidos pelo sujeito passivo na petição enviada no âmbito do exercício do direito de audição prévia, são os que a seguir se expõem:

- Perdas por imparidade de dívidas a receber de clientes

O sujeito passivo inicia a sua explanação referindo que: "(...) a atividade desenvolvida pela Exponente consiste na exploração da concessão do sistema municipal de distribuição de água e drenagem das águas residuais do Município de ...", acrescentando que "tendo em conta a natureza da atividade da Exponente, a qual consiste num bem essencial, como é a água, e o elevado número de clientes, é frequente a dificuldade do apuramento exato do consumo mensal individual de cada um dos seus clientes."

No que se refere à cobrança efetuada aos clientes, a A... vem informar que a mesma (...) é realizada segundo o detalhe provido por um contador que apenas evidencia os montantes utilizados de água à medida que o sistema é acionado, sendo sujeito a avarias ou mesmo a incorreções de leitura por motivos externos, nomeadamente roturas de condutas, alterações fraudulentas por parte do cliente, erros de contagem por parte dos funcionários da A... e ou dos próprios clientes, entre outros" e que "(...) a correção das operações ativas registadas em momento anterior é feita através da emissão de notas de crédito, que visam corrigir os montantes que, por motivos diversos, se encontram incorretamente faturados aos clientes e registados como rendimento na esfera da Exponente."

Em termos contabilísticos, o sujeito passivo vem informar que "(...) a Exponente tem como procedimento o registo contabilístico das referidas notas de crédito tendo por base as datas das faturas a estas associadas i. e. as notas de crédito de faturas emitidas no próprio exercício são registadas como redução ao rendimento do ano, as notas de crédito referentes a faturas emitidas nos dois exercícios anteriores (2013 e 2014) são registadas como gasto de exercícios anteriores e as notas de crédito referentes a faturas de períodos anteriores a 2013 suportam a anulação direta da conta de ativo referente a clientes de cobrança duvidosa com a conta de imparidades acumuladas."

A A... vem argumentar que os erros e omissões associados ao sistema de contagem de consumo de água se prendem com diversos fatores, nomeadamente: correções de consumos, correções de tarifa, ilícitos, processos em contencioso, totalizadores (contadores em nome de prédio ou condomínio), correções de contrato, roturas, prescrições e outros.

Com o intuito de fundamentar as suas alegações, o sujeito passivo vem apresentar alguma documentação exemplificativa (documentos n.ºs 3 a 7) das situações respeitantes a processos em contencioso, ilícitos. Salienta o sujeito passivo que cumpre todos os requisitos previstos nos artigos 28.º-A e 28.º-B do CIRC e que "(...) o montante total de € 345.780,58, referente ao desreconhecimento de uma parte do ativo registado como crédito de cobrança duvidosa, respeita a dívidas de clientes sobre as quais havia sido reconhecida e aceite para efeitos fiscais uma perda por imparidade total, encontrando-se as mesmas em mora há mais de 24 meses."

Para suportar esta afirmação, a A... menciona o entendimento da AT vertido na Ficha Doutrinária n.º 2014..., através do qual, se permite que "(...) (i) quando haja sido reconhecida uma imparidade com referência à totalidade de um crédito de cobrança duvidosa, e o mesmo (si) esteja em mora há mais de 24 meses, o crédito seja removido do balanço e, portanto, desreconhecido (...)", considerando o sujeito passivo que "o referido entendimento encontra-se justificado uma vez que o gasto com os créditos de cobrança duvidosa já foi aceite para efeitos fiscais anteriormente, através do registo da respetiva imparidade."

Conclui o sujeito passivo a sua explanação nesta matéria que, "em face do exposto, e atendendo a que o procedimento seguido pela Exponente reflete o cumprimento dos requisitos vertidos pela AT na referida Ficha Doutrinária, será de concluir que o desreconhecimento dos créditos de cobrança duvidosa resultante da emissão das referidas notas de crédito não deverá dar origem a qualquer correção em sede de IRC"

- Outros gastos e perdas - correções relativas a períodos anteriores.

Neste âmbito, a A... refere que "de acordo com os argumentos já apresentados pela Exponente, a respeito da correção anterior, encontramo-nos perante o registo de notas de crédito decorrentes da sua atividade e as quais visam corrigir faturas emitidas em períodos anteriores a clientes e reconhecidas como rendimentos da Exponente", acrescentando ainda que "de notar que os motivos associados à emissão das referidas notas de crédito assumem a natureza dos identificados pela Exponente a respeito da correção anterior, sendo o procedimento de registo contabilístico das referidas notas de crédito diferenciado apenas tendo por base as datas das faturas que estão na origem das notas de crédito."

No sentido de fundamentar as suas alegações, o sujeito passivo vem apresentar alguma documentação exemplificativa (documentos n.ºs 9 a 11) das situações respeitantes a processos em contencioso, ilícitos e totalizadores, para concluir que, "(...) a Exponente considera que se encontra demonstrada a aceitação como gasto fiscal, nos termos do artigo 23.º do Código do IRC, do montante total de € 131.385,67, referente à emissão de notas de crédito para correção de operações ativas da Exponente, decorrentes da sua atividade operacional."

 

IX.2.1.2. Apreciação da argumentação aduzida pelo contribuinte

Analisados os argumentos vertidos na petição apresentada pelo sujeito passivo no âmbito do exercício do direito de audição, a AT considera que, à exceção dos documentos n.ºs 10 e 11 em anexo à mesma, os mesmos não permitem alterar as conclusões plasmadas no projeto de relatório da Inspeção Tributária, pelos motivos que serão a seguir expostos.

Em cumprimento do disposto no artigo 29.º do RCPITA, no que às prerrogativas da Inspeção Tributária diz respeito, pautada pelos princípios consagrados quer na LGT, quer no RCPITA, na prossecução do interesse público e na descoberta da verdade material e no âmbito do presente procedimento de inspeção interno, foi analisada a atividade exercida pelo sujeito passivo, tendo sido selecionadas, com recurso a técnicas de auditoria tributária e, ao encontro da metodologia adotada pelo Acompanhamento Permanente desta Direção de Finanças, as situações com maior relevo e impacto em termos fiscais, onde se incluiu a análise dos gastos de montante mais significativo contabilizados no período inspecionado, nomeadamente as perdas por imparidade.

No caso em apreciação e conforme anteriormente se analisou, verificou-se que o sujeito passivo contabilizou, na conta 6511 - Perdas por imparidade, a importância de € 914.875,93, que resulta do somatório das seguintes parcelas:

- € 569.095.35 - Corresponde ao reforço da imparidade (económica) de clientes registada no período em análise, face ao ano anterior. A diferença entre a imparidade económica e a imparidade fiscal, deduzida da diferença do ano anterior, cifrou-se em € 97.099,20 e foi acrescida no campo 718 da declaração Modelo 22;

- € 345.780,58 - Diz respeito a notas de crédito emitidas pela A... no decurso do período analisado, que visam anular faturas anteriores a 2013 e que se encontram contabilizadas na conta 219, por débito da conta 6511.

Verificou-se, no decurso dos atos de inspeção, que as notas de crédito relativas a faturas emitidas em anos anteriores, têm registo:

- na conta 6511 - Perdas por imparidade de dívidas a receber de clientes, para as faturas com data anterior a 2013, por contrapartida da conta 219 - Perdas por imparidade acumuladas;

- na conta 6881 - Correções relativas a períodos anteriores, para as faturas emitidas em 2013 e 2014.

Iremos de seguida analisar cada uma das situações anteriormente identificadas:

 

- Perdas por Imparidade de dívidas a receber de clientes

Na sua explanação, o sujeito passivo vem informar que a contabilização das notas de crédito varia consoante a data da fatura associada, isto é, "as notas de crédito de faturas emitidas no próprio exercício são registadas como redução ao rendimento do ano, as notas de crédito referentes a faturas emitidas nos dois exercícios anteriores (2013 e 2014) são registadas como gasto de exercícios anteriores e as notas de crédito referentes a faturas de períodos anteriores a 2013 suportam a anulação direta da conta de ativo referente a clientes de cobrança duvidosa com a conta de imparidade acumuladas."

Contudo, importa referir que as notas de crédito respeitantes a faturas anteriores a 2013, para além de suportar a anulação direta da rubrica de clientes de cobrança duvidosa e imparidades acumuladas, também influenciou negativamente o resultado líquido da empresa, por via de uma conta de gastos, designadamente a conta 6511 - Perdas por imparidade em dívidas a receber de clientes.

Assim, importa aferir a dedutibilidade fiscal daquele gasto, à luz dos critérios consagrados no CIRC, nomeadamente nos artigos 23.º, 28.º-A e 28.º-B.

Conforme vimos, foram emitidas pelo sujeito passivo no período em apreciação, diversas notas de crédito, destinadas a corrigir faturas de anos anteriores a 2013, sem qualquer evidência do enquadramento legal de tal procedimento nas normas emanadas pelo CIRC no que concerne à aceitação fiscal de perdas por imparidade.

Reiterando o que se encontra já refletido no presente relatório, para efeitos contabilísticos, as dívidas a receber, nomeadamente as dívidas de clientes, têm o seu tratamento previsto na NCRF 27 - Instrumentos Financeiros, estando definidas, de acordo com o parágrafo 5, como ativos financeiros

Em termos de mensuração, os ativos financeiros com maturidade definida, ou seja, com um prazo de vencimento definido à partida, devem ser registados ao custo (ou ao custo amortizado) menos perdas por imparidade, conforme se prevê nos parágrafos 12 e 16 a) da referida Norma. A título de exemplo de ativos financeiros com maturidade definida, a referida Norma refere as dívidas a receber de clientes, que deverão ser mensuradas ao custo (ou custo amortizado) menos perdas por imparidade.

O reconhecimento das perdas por imparidade destas dívidas a receber de clientes deve ser avaliada em cada data de relato, ou seja, no final de cada período contabilístico. No entanto, este reconhecimento de perdas por imparidade apenas deve ser efetuado se existir uma evidência objetiva de um evento de perda, conforme referido no parágrafo 24 da NCRF 27.

Quando existam dúvidas na cobrabilidade de uma dívida a receber de clientes deve ser reconhecida uma perda por imparidade, nos termos referidos de seguida.

O parágrafo 25 da Norma estabelece alguns tipos de evidências objetivas de eventos de perda para se verificar se existe a necessidade, ou não do reconhecimento da perda de imparidade, como por exemplo:

- Significativa dificuldade financeira do cliente/devedor;

- Não pagamento ou incumprimento no pagamento do juro ou amortização da dívida no prazo estabelecido contratualmente;

- Probabilidade do devedor entrar em falência (Insolvência);

- Desaparecimento de um mercado ativo para o devedor devido às suas dificuldades financeiras

Com a verificação de evidências objetivas da existência destes eventos de perda, a entidade passa a reconhecer a perda por imparidade, reduzindo, ou anulando na totalidade, o valor do ativo.

No SNC, estes ajustamentos, relativos a perdas por imparidade, passam a ser efetuados diretamente na conta de ativo (na conta 219 - "Clientes - Perdas por imparidade acumuladas") por contrapartida de gastos (conta 65 - "Perdas por imparidade"), passando esta conta de ativo a estar valorizada pela respetiva quantia escriturada (custo menos qualquer perda por imparidade acumulada).

Quando, e se, deixarem de existir esses eventos de perda, deve ser desreconhecida a referida imparidade, procedendo-se à reversão da perda por imparidade, conforme previsto no parágrafo 29 da NCRF 27 (o que sucede, por exemplo, quando o cliente inicia o pagamento).

Por outro lado, de referir, que os montantes de dívidas de clientes (ativo financeiro) apenas devem ser desreconhecidos, quando se receberem os referidos montantes ou se de alguma forma se extinguir o direito a receber os valores, como por exemplo, por declaração de créditos incobráveis por extinção do processo de execução, devido a não existirem bens penhoráveis do devedor, ou por outro ato administrativo, legal ou judicial, conforme dispõe o parágrafo 31 da NCRF 27.

Em termos fiscais, o CIRC estabelece que as perdas por imparidade em dívidas a receber de clientes apenas podem ser deduzidas ao lucro tributável nos termos previstos na alínea a) do n.º 1 do artigo 28.º-A e no artigo 28.º-B, ambos do CIRC.

Em primeiro lugar, o CIRC estabelece que as perdas por imparidade em dívidas a receber de clientes apenas podem ser aceites fiscalmente, quando se referirem a créditos resultantes da atividade normal da empresa (por exemplo de créditos de clientes), e que estejam evidenciados na contabilidade como sendo considerados de cobrança duvidosa, nomeadamente, pela transferência das contas correntes (subcontas 211) para a conta 217 -"Clientes de cobrança duvidosa".

A seguir, o CIRC estabelece que essas perdas por imparidade em dívidas a receber de clientes apenas podem ser aceites fiscalmente quando o risco de incobrabilidade seja devidamente comprovado, o que acontece nas seguintes condições:

- O devedor tenha pendente processo de execução, processo de insolvência, processo especial de revitalização ou procedimento de recuperação de empresas por via extrajudicial ao abrigo do Sistema de Recuperação de Empresas por Via Extrajudicial (SIREVE), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 178/2012. de 3 de agosto;

- Os créditos tenham sido reclamados judicialmente ou em tribunal arbitrai;

- Os créditos estejam em mora há mais de seis meses desde a data do respetivo vencimento e existam provas de terem sido efetuadas diligências para o seu recebimento.

Sendo, que no último caso, em que os créditos estejam em mora, apenas são aceites como perdas para efeitos fiscais as percentagens previstas no n.º 2 do artigo 28.º-B do CIRC, que são estabelecidas em função do tempo da mora do crédito.

Por outro lado, o artigo 41.º do CIRC estabelece que, se não tiver reconhecido qualquer perda por imparidade, por não existirem evidências objetivas, ou esta perda por imparidade se mostrar insuficiente, isto é, seja apenas parcial ao total da dívida, existindo a determinação de incobrabilidade definitiva da dívida a receber, a respetiva perda pode ser aceite como gasto fiscal, desde que essa incobrabilidade resulte de:

- De processo de insolvência e de recuperação de empresas;

- De processo de execução,

- De procedimento extrajudicial de conciliação para viabilização de empresas em situação de insolvência ou em situação económica difícil mediado pelo ...,

- De decisão de tribunal arbitrai no âmbito de litígios emergentes da prestação de serviços públicos essenciais;

- Ou, de créditos que se encontrem prescritos de acordo com o respetivo regime jurídico da prestação de serviços públicos essenciais e, neste caso, o seu valor não ultrapasse o montante de €750.

Há, no entanto, que ter em conta, que todos estes gastos relativos às perdas por imparidade em dívidas a receber de clientes, devem ser tomados em consideração para efeitos fiscais na determinação do lucro tributável do período de tributação em que tais factos ocorreram, de acordo com o regime do acréscimo previsto no artigo 18.º do CIRC.

Se não existiu tal procedimento, nos períodos corrente e seguintes, não é possível efetuar qualquer dedução fiscal de perdas de imparidade das dívidas a receber de clientes, nem é possível deduzir a perda resultante de ser considerado incobrável em processo judicial, por incumprimento do referido regime do acréscimo previsto no artigo 18.º do CIRC, ou seja, por não ter sido contabilizada o valor total da perda por imparidade (ou perda definitiva) no respetivo período.

Tal procedimento constitui um erro contabilístico que deve ser objeto de correção. Tal erro contabilístico afeta os resultados de períodos anteriores, pois constitui o não reconhecimento de uma perda por imparidade da dívida a receber de um cliente, cujo risco surgiu nesses períodos anteriores. Tal erro contabilístico que afeta resultados anteriores, deve ser objeto de correção nos termos da NCRF 4 -"Políticas contabilísticas. alterações nas estimativas contabilísticas e erros".

Em termos de IRC, a correção de um erro relativo a factos de anos anteriores, não deve afetar o lucro tributável do período corrente, conforme dispõe o n.º 1 e 2 do artigo 18.º do CIRC.

Por definição da NCRF 4, um erro é uma situação em que, apesar existirem informações disponíveis para contabilizar de certa forma, por engano, negligência ou outra situação, não se tiveram em conta essas informações, dando origem a um erro na preparação e apresentação das demonstrações financeiras.

Ora, de acordo com esta definição de erro, nestes casos nunca se pode verificar o pressuposto de imprevisibilidade ou manifesto desconhecimento das operações, não podendo portanto tal situação influenciar a determinação do lucro tributável do exercício em que se efetua a correção.

Mas passemos pois, a analisar os documentos apresentados, no âmbito do direito de audição apresentado pelo sujeito passivo (documentos n.ºs 3 a 7).

 

Documento n.º 3 - Corresponde à Nota de Crédito n.º..., emitida em 2015/05/26 ao cliente "B..., SA", NIF..., no valor de € 88.241,05 (valor sem IVA), com a descrição "correção de faturação".

A referida nota de crédito visa anular a fatura n.º..., emitida pela A... em 2008/10/22 no mesmo valor, referente ao período de faturação de 2008/09/01 a 2008/10/03.

Relativamente a este cliente, o sujeito passivo apresentou, em 2009/10/06, o requerimento de injunção n.º .../09...YIPRT, peticionado o pagamento da importância do valor em dívida, acrescido de juros de mora.

Na sentença proferida pelo Tribunal de Família e Menores e de Comarca de Cascais em 2011/09/26, foi decidido que o prazo de 6 meses a que alude o n.º 1 do artigo 10.º da Lei n.º 23/96, de 26 de julho (diploma que regula a prestação de serviços públicos essenciais) se encontrava prescrito no momento em que deu entrada o requerimento de injunção apresentado pelo sujeito passivo.

O sujeito passivo não logrou justificar o motivo pelo qual, somente em 2015, foi reconhecido um gasto na conta 6511 - Perdas por imparidade de dívidas a receber de clientes, consubstanciado na emissão de uma nota de crédito ao cliente em causa, que visa anular uma fatura de 2008.

Com efeito, a A... teria de adotar um conjunto de procedimentos contabilísticos aquando da verificação de incobrabilidade do cliente, bem como aferir o cumprimento dos requisitos de caráter fiscal no que à aceitação da perda por imparidade de clientes/dívidas incobráveis diz respeito.

Face ao exposto e, atendendo a toda a fundamentação referida no presente relatório, nomeadamente o disposto nos artigos 28.º-A, 28.º-B e 18.º do CIRC, não pode a AT aceitar a dedutibilidade fiscal do gasto em apreciação.

 

Documento n.º 4 - Corresponde à Nota de Crédito n.º..., emitida em 2015/11/16 ao cliente "C..., Lda.", NIF..., no valor global de € 30.286,61.

A referida nota de crédito visa anular a fatura n.º ..., emitida pela A... em 2010/04/27, no montante total de € 37.998,91.

Nesta matéria, o sujeito passivo vem juntar um documento interno, por si elaborado e que contém a seguinte informação:

"Apresentada proposta de devolução de metade do valor liquidado, o cliente não se mostrou disponível, motivo pelo qual se avançou com proposta à luz dos atuais critérios aplicáveis (no caso em apreço 1m3/dia), o que implica que o valor a cobrar seria de 7.712,30 €. Tendo esta proposta sido aceite pelo cliente, propõe-se a emissão de NC no valor de 30.286,61 € (valor inicialmente faturado em 2010, 37.998,91 € integralmente liquidado)."

Também neste caso o sujeito passivo não demonstrou a aplicação dos critérios e requisitos contabilístico-fiscais no que às perdas por imparidade diz respeito, atendendo ao regime da periodização económica previsto no CIRC e no SNC.

Refira-se que, da leitura ao conteúdo do documento interno apresentado pela A... na sua petição, afigura-se-nos que estamos perante uma situação de perdão de dívida ao cliente, com as consequências fiscais já expostas no presente relatório (ver ponto III.1.2.1.), que aqui se dão por reproduzidas.

 

Documento n.º 5 - Corresponde à Nota de Crédito n.º..., emitida em 2015/11/10 ao cliente "D...", NIF..., no valor global de € 11.095,91, com a descrição "correção de faturação".

Relativamente ao cliente em causa, o sujeito passivo veio apresentar diversas faturas emitidas nos períodos de 2010, 2011, 2012, 2013 e 2014, extratos de conta do cliente, bem como um documento interno que contém a seguinte informação:

"Assim e face ao solicitado pelo cliente no que diz respeito aos ensaios dos contadores e ao meu encaminhamento de 27/02/2015, proponho a isenção das tarifas fixas e devolução da faturação emitida desde 2010, que atualmente é de 14.052,00 €."

Mais uma vez, o sujeito passivo não logrou demonstrar a aplicação dos critérios e requisitos contabilísticos e fiscais do reconhecimento e dedutibilidade fiscal das perdas por imparidade. Também esta situação configura um perdão de dívida ao cliente (aplicação de isenção ao valor das tarifas), que não é aceite fiscalmente, de acordo com fundamentação expressa no ponto III.1.2.1. do presente relatório de inspeção, que se dá aqui por reproduzida.

 

Documento n.º 6 - Diz respeito à Nota de Crédito n.º..., emitida em 2015/09/29 ao cliente "E...", NIF..., no valor global de € 1.413,10, com a descrição "correção de faturação".

Relativamente ao cliente em causa, o sujeito passivo veio apresentar fotocópia de algumas faturas emitidas em 2010, extratos de conta do respetivo cliente e documento interno onde consta a seguinte informação:

"Conforme solicitado, foi emitida a nota de crédito 2015..., no montante de € 1.413,10. As faturas 201010309858, 201010547798, 201010643389 e remanescente da fatura 201010442965, encontram-se cobradas."

No caso em apreciação, o sujeito passivo não demonstrou a aplicabilidade dos requisitos de caráter contabilístico e fiscal, respeitantes ao reconhecimento e dedutibilidade das perdas por imparidade de dívidas a receber, já expostos anteriormente.

 

Documento n.º 7 - Corresponde à Nota de Crédito n.º 2015..., emitida em 2015/10/30 ao cliente "F...", NIF..., no valor global de € 72.005,17, com a descrição "correção de faturação".

Relativamente ao cliente em causa, o sujeito passivo veio apresentar diversas faturas emitidas nos períodos de 2010 e 2011, extratos de conta do cliente, bem como documentos internos com a seguinte indicação:

"Retirando os processos em contencioso não findos (2 em distribuição e 1 com força executiva) o saldo do cliente é de 81.096,47 €. Proponho emissão de NC para o valor referido."

(...)

"Na sequência do despacho do DGE de 4/9/2015, o que se pretende é o crédito de todos os documentos em dívida exceto os que ainda se encontram em contencioso."

Verifica-se que, uma vez mais, o sujeito passivo não veio logrou demonstrar a aplicação dos critérios e requisitos contabilísticos e fiscais do reconhecimento e dedutibilidade fiscal das perdas por imparidade.

Refira-se que também esta situação configura um perdão de dívida ao cliente (crédito de todos os documentos exceto os que se encontram em contencioso), com as consequências fiscais já referidas anteriormente no ponto III.1.2.1. do presente relatório de inspeção e que aqui se dão por integralmente reproduzidas.

Assim, da análise aos argumentos aduzidos pelo sujeito passivo, bem como os documentos apresentados em sede de direito de audição, conclui-se que não foram cumpridos os requisitos para a aceitação da dedutibilidade fiscal das perdas por imparidade contabilizadas na conta 6511, no montante de € 345.780,58, suportadas por notas de crédito que visam anular faturas anteriores a 2013.

Refira-se ainda que o sujeito passivo vem invocar o conteúdo da Ficha Doutrinária n.º 2014..., no âmbito do Processo n.º 2013..., a qual dispõe o seguinte:

"(...) Permite-se, também para efeitos fiscais que, num cenário de imparidade total, seja removido do balanço e, portanto, desreconhecido, um crédito de cobrança duvidosa que, por estar em mora há mais de dois anos e por ter sido já reconhecida (e aceite fiscalmente) uma perda por imparidade de valor igual ao do crédito, tem uma quantia monetária de zero.

2. Verifica-se um cenário de imparidade total "quando uma entidade, depois de ter efetuado as diligências de cobrança consideradas adequadas e reunir as provas disponíveis, concluir que já não existem expetativas razoáveis de recuperação de crédito".

3. Para que possa ser (i) preservada a informação histórica dos créditos que deixaram de figurar no balanço, porque tidos como incobráveis, (ii) salvaguardada a eventual recuperação, total ou parcial, que resulte em rendimento tributável e (iii) feita a prova, se solicitada pela AT, do desfecho da transação, o sujeito passivo deve integrar no processo de documentação fiscal a que se refere o artigo 130º do CIRC (dossier fiscal), informação individualizada relativa aos créditos desreconhecidos, a qual deve conter, nomeadamente, os seguintes elementos:

a. Identificação do cliente (nome, local da sede e NIF);

b. Identificação da fatura relativa a cada crédito de cobrança duvidosa (número, data e respetivo montante em dívida o qual não pode incluir o IVA liquidado quando o sujeito passivo tenha acionado o procedimento de regularização a seu favor previsto nos artigos 78.º-A e 78.º-B do Código do IVA);

c. Montante das perdas por imparidade contabilizadas, aceites e não aceites fiscalmente;

d. Indicação dos seguintes factos, quando e se ocorrerem:

i. Liquidação

ii. Perdão de dívida

iii. Sentença judicial

iv. Cessão a título definitivo de créditos vencidos

v. Outros.

Para além desta informação, o sujeito passivo deve dispor dos comprovativos das diligências de cobrança efetuadas e dos respetivos resultados e de quaisquer outros elementos que atestem que já não existem expetativas razoáveis de recuperação do crédito."

Assim, de acordo com o entendimento sufragado na referida Informação Vinculativa, entende-se que, poderá ser desreconhecido da contabilidade um crédito de cobrança duvidosa que esteja em mora há mais de 24 meses e relativamente ao qual tenha sido já reconhecida e aceite fiscalmente uma perda por imparidade de valor igual ao do crédito, num cenário de imparidade total, ou seja, quando a empresa concluir que, tendo por base documentação comprovativa para o efeito, não existem expetativas razoáveis para a recuperação dos valores em dívida.

Permite-se desta forma, o desreconhecimento do crédito considerado incobrável não enquadrável no artigo 41.º do CIRC, desde que esse crédito, já não obedeça ao conceito e critérios do seu reconhecimento como "ativo", permitindo-se também para efeitos fiscais que, numa situação de imparidade total, seja removido do balanço e, portanto, desreconhecido um crédito de cobrança duvidosa em mora há mais de 2 anos e por ter sido já reconhecido (e aceite fiscalmente) uma perda por imparidade de valor igual ao crédito, tem uma quantia monetária de zero. Depreende-se assim, que este desreconhecimento é efetuado em rubricas de balanço, sem afetar o resultado líquido da empresa.

Contabilisticamente, um crédito sobre um cliente representa um ativo financeiro que só poderá ser desreconhecido - removido no balanço - quando os direitos contratuais aos recebimentos dele resultantes se realizem, extingam ou são transferidos para outra entidade.

São causas de extinção dos créditos, nomeadamente, o pagamento, dação em cumprimento, consignação em depósito, compensação, remissão, confusão, prescrição ou caducidade.

Ora, no caso em apreciação, o sujeito passivo vem alegar que "(...) o montante de € 345.780,58, referente ao desreconhecimento de uma parte do ativo registado como crédito de cobrança duvidosa, respeita a dívidas de clientes sobre as quais havia sido reconhecida e aceite para efeitos fiscais uma perda por imparidade total, encontrando-se as mesmas em mora há mais de 24 meses."

Contudo, não foi demonstrado que a imparidade de tais créditos já havia sido reconhecida como gasto para efeitos fiscais em anos anteriores, conforme preconizado na Ficha Doutrinária. Aliás, o sujeito passivo alega que "o referido entendimento encontra-se justificado uma vez que o gasto com os créditos de cobrança duvidosa já foi aceite para efeitos fiscais anteriormente, através do registo da respetiva imparidade."

No entanto, o sujeito passivo não logrou comprovar se, relativamente às perdas por imparidade objeto de análise, foi acrescido algum montante para efeitos fiscais e em que período tal ocorreu. Também ficou por esclarecer o motivo pelo qual considera que tais perdas por imparidade foram já reconhecidas como gasto anteriormente e aceites para efeitos fiscais e por que razão foram consideradas novamente como gasto por via da emissão das notas de crédito.

Em conclusão, não tendo o sujeito passivo apresentado argumentos que permitam contrariar as correções inicialmente propostas, as mesmas são de manter.

 

- Correções relativas a períodos anteriores

Nesta matéria, o sujeito passivo remete os motivos da contabilização das notas de crédito para os expostos anteriormente, no que concerne às perdas por imparidade em dívidas a receber de clientes. A diferença reside, essencialmente, na data das faturas que estas notas de crédito visam anular (2013 e 2014).

Com o intuito de justificar a contabilização das referidas notas de crédito e a aceitação da sua dedutibilidade para efeitos fiscais, a A... vem apresentar os Documentos n.ºs 9 a 11, que analisaremos de seguida.

 

Documento n.º 9 - Corresponde à Nota de Crédito n.º 2015..., emitida em 2015/09/22 ao cliente "G...", NIF..., no valor global de € 15.260,50, com a descrição "correção de faturação". Segundo o resumo enviado pelo sujeito passivo no âmbito do exercício do direito de audição (documento n.º 2), o montante considerado na conta 6881 - Correções de exercícios anteriores, foi de € 9.426,75.

Neste âmbito, o sujeito passivo veio apresentar diversas faturas emitidas nos períodos de 2011, 2012, 2013 e 2014, extratos de conta do cliente, bem como fotocópia da Ata de Audiência de Julgamento, realizada em 2015/09/11 na Comarca de Lisboa Oeste (Cascais) no âmbito do processo n.º .../14...YIPRT, tendo sido proferida sentença homologatória respeitante ao acordo do pagamento da quantia em dívida de € 28.847,64 em 72 prestações mensais, iguais e sucessivas, vencendo-se a primeira no último dia do mês de setembro de 2015.

Segundo informação da A... na petição apresentada, a nota de crédito emitida ao cliente "G..." que se encontrava em contencioso, confirma que a mesma "(...) respeita a um acordo de pagamento com o cliente, o qual levou à emissão de uma nota de crédito pelo montante não recuperável pela A... (...)".

Da análise aos elementos apresentados pela A..., não se vislumbra como foi calculado o "montante não recuperável" e sobre que fatura(s) o mesmo incidiu. Também esta situação poderá indicar que estamos perante um perdão de dívida do cliente, relativamente ao "montante não recuperável" considerado pelo sujeito passivo, e que, a ser assim, também não preenche os requisitos estabelecidos na legislação fiscal, nomeadamente no artigo 23.º do CIRC, para que se aceite a sua dedutibilidade para efeitos fiscais.

 

Documento n.º 10 - Corresponde à Nota de Crédito n.º 2015..., emitida em 2015/02/13 ao cliente "H...", NIF..., no valor global de € 2.027,43, com a descrição "correção de faturação". Segundo o resumo enviado pelo sujeito passivo no âmbito do exercício do direito de audição (documento n.º 2), o montante considerado na conta 6881 - Correções de exercícios anteriores, foi de €1.862,90.

Segundo informação contida na referida nota de crédito, a mesma visa efetuar "acertos" na fatura n.º 201420013294, emitida pela A... em 2014/06/30, no valor total de € 18.141,41.

Neste âmbito, o sujeito passivo veio apresentar extratos de conta do cliente dos períodos de 2014 e 2015, bem como um documento interno, onde consta a seguinte informação:

"Em sessão de Julgado de Paz, a cliente alega que a casa só foi ocupada em pleno em Junho de 2009, pelo que considera que para o período deveria ser aplicada metade da estimativa ora apurada. Seguindo esta tese, os consumos faturados anteriores a Junho de 2009 são superiores a metade da estimativa ora aplicada pelo que se consideraria que apenas houve consumo ilícito após 5/6/2009, o que implicaria a emissão de uma nova NC de 2.027,43 € (valor ilícito a pagar 1.554,48 €, IVA incluído). Uma vez que a cliente referiu aceitar esta tese, proponho diferimento em sede de acordo."

Da análise aos elementos apresentados, conclui-se que a nota de crédito emitida visou corrigir uma situação de consumos incorretamente faturados, devidamente justificada e comprovada pelo sujeito passivo, pelo que se aceita a dedutibilidade do montante contabilizado na conta 6881, ou seja, € 1.862,90.

 

Documento n.º 11 - Corresponde à Nota de Crédito n.º 2015..., emitida em 2015/07/14 ao cliente "I...", NIF..., no valor global de € 1.534,48, com a descrição "correção de faturação". Segundo o resumo enviado pelo sujeito passivo no âmbito do exercício do direito de audição (documento n.º 2), o montante considerado na conta 6881 - Correções de exercícios anteriores, foi de € 1.258,40.

O sujeito passivo apresentou fotocópia de 2 faturas emitidas em 2014 (fatura n.º 20140525532, de 2014/07/09 e fatura n.º 20140606689, de 2014/08/07), no valor global de € 1.779,03, extratos de conta do cliente, bem como mail interno (proveniente do Departamento de Gestão de Faturação da A...), datado de 2015/07/14, com a seguinte indicação:

Este cliente padrão não apresenta consumo diferencial, pelo que solicito autorização para emitir uma nota de crédito no montante de € 1.534,49, referente a valores de água e respetivas tarifas variáveis."

Assim, conclui-se que a nota de crédito emitida visou corrigir consumos, conforme comprovado pelo sujeito passivo, pelo que se aceita a dedutibilidade da importância de € 1.258,40, contabilizada na rubrica de correções de exercícios anteriores (6881).

Em resultado de tudo o que se encontra anteriormente exposto, as correções a efetuar são as que a seguir se apresentam:

 

 

 

X. PROPOSTAS

Face ao aludido nos capítulos anteriores, e não tendo o sujeito passivo logrado apresentar elementos que contrariem as correções inicialmente propostas (à exceção do montante relevado na rubrica de correções de exercícios anteriores, de € 3.121,30), cujo resumo se apresenta nas primeiras páginas do presente relatório, propõe-se converter as mesmas em definitivas.

Será ainda elaborado o respetivo Documento de Correção Único (DCU) em sede de IRC e levantado o respetivo Auto de Notícia por contraordenação fiscal, nos termos dos artigos 51.º e 57.º do RGIT.

 

C)           Na sequência da inspecção, a Autoridade Tributária e Aduaneira emitiu a liquidação adicional de IRC n. º 2018..., de 10-12-2018, relativa ao ano de 2015 que apurou um valor de imposto e juros compensatórios a pagar de € 171.440,73 (documento n.º 24 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);

D)           Em 02-11-2000, foi celebrada a escritura pública do Contrato de Concessão da Requerente com o Município de ... (documento n.º 1 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);

E)            Tal Concessão tem por objeto a exploração e gestão conjunta da manutenção do sistema de águas pluviais e a exploração e gestão conjunta dos serviços públicos municipais de captação, tratamento e distribuição de água para consumo público e da recolha e rejeição de efluentes domésticos, incluindo a construção, extensão, reparação, renovação, manutenção e melhoria de todas as instalações, infraestruturas e equipamentos que compõem os Sistemas de Abastecimento de Água e Drenagem de Águas Residuais e, bem assim, todas as obras necessárias à execução do Plano de Investimentos (Cláusula 1.ª do documento n.º 1);

F)            Posteriormente foram efectuados os aditamentos ao contrato de concessão que constam dos documentos n.ºs 2 a 8 juntos com o pedido de pronúncia arbitral, cujos teores se dão como reproduzidos;

G)           No âmbito da sua actividade, a Requerente regista como rendimento do exercício os valores facturados a clientes a título de venda da água e prestação de serviços públicos essenciais;

H)           Tendo em conta a natureza da actividade da Requerente de fornecimento de água, bem como o elevado número de clientes, é frequente a dificuldade do apuramento exacto do consumo mensal individual de cada um dos seus clientes (depoimento da testemunha J...);

I)             A cobrança dos montantes devidos por cada cliente é realizada segundo o detalhe provido por um contador que não fornece necessariamente indicação da quantidade de água consumida por cada um dos clientes, nomeadamente roturas de condutas, alterações fraudulentas por parte dos clientes (depoimento da testemunha J...);

J)            A correcção das operações activas (proveitos) é efectuada através da emissão de notas de crédito, que visam corrigir os montantes que se encontram incorretamente facturados aos clientes (depoimento da testemunha J...);

K)           A Requerente tem como procedimento o registo das referidas notas de crédito tendo por base as datas das facturas a estas associadas (depoimentos das testemunhas J... e K...);

L)            As notas de crédito anulam facturação da actividade normal da A... (depoimentos das testemunhas J... e K...);

M)          Grande parte das notas de crédito reportam-se a situações em que é feita inicialmente facturação de consumos por estimativa e, posteriormente, se conclui que é necessário efectuar correcções, com base nas quantidades efectivamente consumidas, ou em cumprimento de decisões de tribunais ou prescrição (depoimentos das testemunhas J... e K...);

N)           Nas correções devidas a situações em que ocorreram ilícitos (furto de água), a Requerente emite uma fatura relativa a estimativa do volume de água furtado, com base em critérios gerais definidos (depoimento da testemunha J...);

O)           São efectuadas ainda correcções nos casos em que se apuram erros de leitura de contadores (depoimento da testemunha J...);

P)           Estas correcções ocorrem por vezes muito tempo depois da facturação por estimativa, nomeadamente em casos de habitações que apenas são utilizadas em períodos curtos do ano (depoimento da testemunha J...);

Q)           As notas de crédito das facturas emitidas no próprio exercício são registadas como redução ao rendimento do ano;

R)           As notas de crédito referentes a facturas emitidas nos dois exercícios anteriores (no caso, 2013 e 2014) são registadas como gastos de exercícios anteriores, por contrapartida da conta 211 Clientes;

S)            As notas de crédito referentes a facturas emitidas há mais de dois anos (no caso, anteriores a 2013) suportam a anulação directa da conta de activo referente a clientes de cobrança duvidosa com a conta de imparidades acumuladas (depoimento da testemunha K...);

T)            No ano de 2015, a Requerente emitiu notas de crédito para corrigir faturas anteriores a 2013, no valor de € 345.780,58, as quais contabilizou na conta 219 – Clientes Gerais c/c Perdas por Imparidade Acumuladas, por contrapartida da conta 211 - Clientes (Relatório da Inspecção Tributária, documentos n.ºs 9 e 10 juntos com o pedido de pronúncia arbitral, cujos teores se dão como reproduzidos, e depoimento da testemunha K...);

U)           No exercício de 2015 a perda contabilizada como gasto na conta 6511 ascendeu a um total de € 914.875,93 (Relatório da Inspecção Tributária e documento n.º 12 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);

V)           A variação das imparidades no exercício ascendeu, a final, a € 569.095,35, montante que resulta da diferença entre € 914.875,93 e € 345.780,58 (documentos n.ºs 1e 12 juntos com o pedido de pronúncia arbitral, cujos teores se dão como reproduzidos);

W)          A imparidade constituída ou reforçada com referência a 2015 ascendeu a € 914.875,93, tendo sido reposta/utilizada uma imparidade no valor de € 345.780,58 (documento n.º 13 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);

X)           A diferença entre o saldo de perdas por imparidade para o período seguinte (€ 6.045.693,22) e o saldo do período anterior considerado para efeitos fiscais (€ 5.476.597,87) ascende a € 569.095,35 (documento n.º 13 junto com o pedido de pronúncia arbitral);

Y)            A Requerente acresceu no campo 718 do Quadro 07 da declaração periódica de rendimentos modelo 22 referente ao exercício de 2015 a importância de € 97.099,20, correspondente à diferença entre a imparidade contabilística e a imparidade aceite para efeitos fiscais (documentos n.ºs 14 e 15 juntos com o pedido de pronúncia arbitral, cujos teores se dão como reproduzidos, e depoimento da testemunha K...);

Z)            Do montante de € 569.095,35 que transitou adicionalmente para o exercício seguinte como imparidade económica, a Requerente considerou para efeitos fiscais a quantia de € 471.996,15) (€ 569.095,35 - € 97.099,20);

AA)        As imparidades são calculadas com base numa percentagem dos rendimentos do ano havendo uma validação trimestral para apurar se a imparidade é razoável ou não (depoimento da testemunha K...);

BB)         Essa forma de cálculo das imparidades é utilizada porque a quantidade de dívidas é muito grande, não sendo praticável determinar as imparidades uma a uma (depoimento da testemunha K...);

CC)         Em 2015 todas as facturas em dívida tinham imparidades determinadas a 100% (depoimento da testemunha K...);

DD)        No ano de 2015, a Requerente emitiu notas de crédito para corrigir facturas dos anos de 2013 e 2014, no valor de € 125.837,74, contabilizadas na conta 6881 – Correções relativas a exercícios anteriores, por contrapartida da conta 211 - Clientes (Relatório da Inspecção Tributária e documentos n.ºs 9 e 16 juntos com o pedido de pronúncia arbitral, cujos teores se dão como reproduzidos);

EE)         Na conta 6881, encontra-se também contabilizada a quantia de € 100.412,96, referente a “Encontro contas CM... conforme GESCOR .../12/EM” (documento n.º 16);

FF)         O referido montante respeita a um saldo credor da Requerente face à Câmara Municipal de ...(depoimento da testemunha K...);

GG)       Em 2015, a Requerente anulou o referido saldo (documentos n.ºs 17, 18, 19 e 20 juntos com o pedido de pronúncia arbitral e depoimento da testemunha K...);

HH)        O referido valor € 100.412,96 não foi incluído nos encontros de contas com a Concedente Câmara Municipal que foram sendo realizados até ao ano de 2004, ao abrigo da cláusula 80.ª do Contrato de Concessão e Câmara Municipal de ... e não consta das circularizações de saldos efetuadas por parte do Revisor Oficial de Contas da Câmara Municipal de ... (depoimento da testemunha K...);

II)           Em face da incerteza quanto à circunstância de tal saldo ser efectivamente devido pela Câmara Municipal de ...– uma vez que o mesmo não havia sido incluído em qualquer encontro de contas anterior com a Câmara Municipal de ... nem, ao contrário de outros, alguma vez ter sido possível a sua reconciliação - e de a sua manutenção e eventual exigência poder causar constrangimentos aos novos termos do reequilíbrio económico-financeiro contratualizado com a Câmara Municipal de ..., que veio a ser assinado no primeiro trimestre de 2015, a Requerente não exigiu o pagamento quando ocorreram as negociações (depoimento da testemunha K...);

JJ)           Posteriormente, a Requerente optou por anular o referido saldo, reconhecendo aquele montante como gasto (depoimento da testemunha K...);

KK)         A deliberação no sentido da anulação foi tomada em reunião do Conselho de Administração da Requerente, realizada em 16-12-2015, cuja acta n.º 13/2015 consta do documento n.º 18 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido, em que se refere, além do mais, o seguinte:

g) Encontro de Contas

«O CA tomou conhecimento da atualização da informação 1863/12/I apresentada na reunião do CA de 19/12/12 tendo aprovado, tendo em conta a antiguidade dos valores em questão (mais de 10 anos), prescindir da cobrança à CM... do saldo favor da A... de 100.412,96€»;

LL)          O referido valor € 100.412,96 refere-se maioritariamente ao pagamento de pensões provisórias de aposentação, relativas aos anos de 2003 e 2004, quando os colaboradores da A... têm vínculo laboral à Câmara Municipal de ... e prestaram serviço à Requerente no âmbito de requisições (depoimento da testemunha K...);

MM)     Em casos anteriores a Câmara Municipal de ... reembolsou a Requerente dos valores que pagou, mas, nos casos referidos, não se pronunciou, em qualquer sentido, quanto aos pagamentos referidos, apesar de ter sido enviada pela Requerente toda a documentação relevante e terem ocorrido acertos de contas, no âmbito do contrato de concessão (depoimento da testemunha K...);

NN)       Em 2015 uma revisão do contrato de concessão em que não foi colocada esta questão, pois a Requerente não considerou o valor como relevante e preferiu não arriscar, com a sua colocação, eventual prejuízo para os termos da revisão (depoimento da testemunha K...);

OO)       No ano de 2015, na sequência da deliberação do Conselho de Administração de prescindir da cobrança referida na alínea KK), a Requerente entendeu que não se justificava que o valor de € 100.412,96 se mantivesse indefinidamente no balanço;

PP)         O contrato de concessão previa o pagamento pela Requerente do salário dos trabalhadores requisitados, mas não as referidas pensões provisórias (depoimento da testemunha K...);

QQ)       Por despacho de 23-08-2019 foi decidida favoravelmente à Requerente uma revisão oficiosa, relativamente à correcção de € 125.837,74, respeitante a facturas emitidas em 2015, para correcção de erros de facturas do ano de 2014, sendo reconhecido aquele montante como gasto do exercício de 2014 (artigo 100.º da Resposta confirmado na página 27 das alegações da Requerente);

RR)         Em 18-01-2019, a Requerente efectuou o pagamento da quantia liquidada (documento n.º 25 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido);

SS)         Em 23-04-2019, a Requerente apresentou o pedido de constituição do tribunal arbitral que deu origem ao presente processo.

 

 

2.2. Factos não provados e fundamentação da fixação da matéria de facto

 

Não há factos relevantes para a decisão da causa que não se tenham provado.

Os factos foram dados como provados com base na prova testemunhal e nos documentos juntos pela Requerente e os que constam do processo administrativo.

As testemunhas aparentaram depor com isenção e com conhecimento dos factos que relataram.

Nos processos arbitrais tributários são admitidos todos os meios de prova, como decorre do artigo 115.º, n.º 1, do CPPT, aplicável aos processos arbitrais tributários por força do disposto no artigo 29.º, n.º 1, alínea c), do RJAT.

Por isso, não tem fundamento a pretensão da Autoridade Tributária e Aduaneira sobre a inadmissibilidade de prova testemunhal.

 

 

3. Matéria de direito

 

Foram efectuadas correcção à matéria tributável da Requerente relativa ao exercício de 2015 relativamente às questões:

 

•             Perdas por imparidade de dívidas a receber de clientes: € 345.780,58;

•             Outros gastos e perdas – correções relativas a exercícios anteriores – perdão de dívida: € 100.412,96;

•             Outros gastos e perdas – correções relativas a exercícios anteriores – notas de crédito: € 125.837,74.

 

 

3.1. Questão das perdas por imparidade de dívidas a receber de clientes (€ 345.780,58)

No ano de 2015, a Requerente emitiu notas de crédito para corrigir facturas anteriores a 2013, no valor de € 345.780,58, as quais contabilizou na conta 219 – Clientes Gerais c/c Perdas por Imparidade Acumuladas, por contrapartida da conta 211 – Clientes.

A Autoridade Tributária e Aduaneira entendeu, em suma, que

–             «foram emitidas pelo sujeito passivo no período em apreciação, diversas notas de crédito, destinadas a corrigir faturas de anos anteriores, sem qualquer evidência do enquadramento legal de tal procedimento nas normas emanadas pelo CIRC no que concerne à aceitação fiscal de perdas por imparidade»;

–             «não se encontra devidamente evidenciado um conjunto de procedimentos que o sujeito passivo deve adotar no sentido da aceitação fiscal das perdas por imparidade, nomeadamente:

- comprovar que as mesmas estejam relacionadas com créditos resultantes da atividade normal da empresa, porquanto não foram apresentados os documentos que lhes deram origem;

- demonstrar, inequivocamente, que se encontra verificado o respetivo risco de incobrabilidade, na aceção das várias alíneas do n.º 1 do artigo 28.º-B do CIRC;

- justificar se alguma das situações se enquadram no artigo 41.º do CIRC, no que aos créditos incobráveis diz respeito;

- observar o cumprimento do princípio da periodização económica»;

–             «conclui-se que o sujeito passivo não cumpriu com os requisitos exigidos para que a perda por imparidade no montante de € 345.780,58 possa ser aceite fiscalmente, nos termos do disposto nos artigos 23.º, 28.º-A e 28.º-B do CIRC».

 

No presente processo, a Requerente defende, além do mais, que o referido montante de € 345.780,58 não foi «fiscalmente relevado como gasto no exercício de 2015, nem tendo qualquer influência negativa no lucro tributável do exercício, na medida em que subtraído ao montante contabilizado como perda por imparidade na conta 6511, no valor de € 914.875,83, para efeitos de apuramento da variação na conta de perdas por imparidade acumuladas».

A testemunha K... confirmou essa afirmação da Requerente, que é corroborada pelos documentos que juntou e pelo próprio Relatório da Inspecção Tributária.

Com efeito, pelo extrato da conta 219 - Perdas por imparidade acumuladas que consta do documento n.º 10 verifica-se que nela é indicado o valor global de € 569.095,35.

 É este também o valor que corresponde à diferença entre o saldo de perdas por imparidade do período anterior € 5.476.597,87 e o saldo para o período seguinte, que é de € 6.045.6983,22, que consta do documento n.º 13, que é cópia do Modelo 30 de IRC, relativo ao MAPA DE PROVISÕES, PERDAS POR IMPARIDADE EM CRÉDITOS E AJUSTAMENTOS EM INVENTÁRIOS.

A Autoridade Tributária e Aduaneira também reconhece no presente processo que «conforme resulta da análise do extrato da conta 219, a variação das imparidades no exercício ascendeu, a final, a € 569.095,35, montante que resulta da diferença entre € 914.875,93 e € 345.780,58» (artigo 10.º da Resposta.).

No Relatório da Inspecção Tributária refere-se também que o valor de «€ 569.095.35 - corresponde ao reforço da imparidade (económica) de clientes registada no período em análise, face ao ano anterior. A diferença entre a imparidade económica e a imparidade fiscal, deduzida da diferença do ano anterior, cifrou-se em € 97.099,20 e foi acrescida no campo 718 da declaração Modelo 22».

Isto significa que não foi o valor de € 914.875,93, contabilizado na conta 6511 - Perdas por imparidade, que foi considerado para efeitos fiscais no exercício desde 2015, mas sim o valor de € 569.095,35, correspondente à diferença entre aquele valor e o de € 345.780,58, relativo a perdas por imparidade relativas a períodos anteriores a 2013. E ao referido valor de € 569.095,35, foi ainda abatido o valor de € 97.099,20, indicado no campo 718 da declaração modelo 22 como perdas não fiscalmente dedutíveis.

O que releva como perdas por imparidade imputáveis ao exercício de 2015 é o saldo apurado no mapa Modelo 30.

Neste contexto, não é relevante para efeitos da determinação da matéria tributável do exercício de 2015 saber se em relação ao referido valor de € 345.780,58 estavam ou não reunidas as condições para a relevância como perdas por imparidade, pois ele não foi considerado como tal para efeitos fiscais pela Requerente no exercício de 2015, que é o que está em causa. Por outro lado, como diz a Requerente, a correcção ou não da relevância fiscal do referido valor nos anos anteriores a 2013, não pode ser posta em causa, em face do decurso do prazo de caducidade do direito de liquidação relativamente a esses exercícios, previsto no artigo 45.º, n.º 1, da LGT.

Pelo exposto, conclui-se que a correcção efectuada relativamente a facturas de períodos anteriores a 2013 enferma de vício de violação de lei, por erro sobre os pressupostos de facto, ao considerar que foi o valor de € 914.875,93 e não o de € 569.095,35 que foi considerado pela Requerente para efeitos de perdas por imparidade relevantes em 2015.

Este erro justifica a anulação da correcção efectuada e a anulação da liquidação, na parte correspondente, nos termos artigo 163.º, n.º 1, do Código do Procedimento Administrativo subsidiariamente aplicável nos termos do artigo 2.º, alínea c), da LGT.

 

 

3.2. Questão do perdão de dívida (€ 100.412,96)

 

A Requerente tinha contabilizado um saldo credor de € 100.412,96 sobre a Câmara Municipal de ..., que foi anulado no exercício de 2015.

O referido saldo reportava-se a valores anteriores a 2004, pagos pela Requerente, mas que esta entendia deverem ser pagos pela Câmara Municipal de ..., a maior parte dos quais era constituída por montante pagos pela Requerente a título de pensões provisórias de aposentação, devidas a trabalhadores da Câmara Municipal de ... que terminaram as suas funções quando estavam a prestar serviço à Requerente em regime de requisição.

A Requerente justifica a anulação daquele saldo credor, em suma, pelo facto de a Câmara Municipal de ... desde 2004 a 2015 não ter mostrado disponibilidade para reembolsar a Requerente dos valores referidos, nem sequer se tendo pronunciado e, no ano de 2015, estar a negociar com a Câmara Municipal de ... alterações ao contrato de concessão e entender que o montante em causa não era consideravelmente relevante para arriscar que a sua manutenção e exigência pudessem «causar constrangimentos aos novos termos do reequilíbrio económico-financeiro contratualizado com a Concedente».

A Requerente defende que entendeu advieram vantagens desta sua opção pela anulação do saldo, pelo que «não foi tomada com qualquer tipo de animus donandi, revelando uma conexão inequívoca com o nível da manutenção da relação contratual da Requerente com a Câmara Municipal de ..., particularmente no quadro do reequilíbrio económico-financeiro da Concessão, alcançado em 2015».

No entanto, para além de a testemunha K... apenas exprimir a sua opinião pessoal sobre o que terá motivado o Conselho de Administração da Requerente a tomar a decisão de anular o referido saldo, o certo é que o único elemento de prova directa da motivação deste é a deliberação que foi tomada apenas em 16-12-2015, depois de estar assinado há vários meses o acordo relativo ao reequilíbrio económico-financeiro a que alude a Requerente.

Nessa deliberação justifica-se a anulação dizendo que «tendo em conta a antiguidade dos valores em questão (mais de 10 anos), prescindir da cobrança à CM... do saldo favor da A... de 100.412,96».

Assim, não se pode considerar como provado que a referida deliberação, quando foi tomada, estivesse conexionada com os interesses da Requerente em não prejudicar as negociações, há muito terminadas.

O artigo 23.º, n.º 1, do CIRC estabelece o seguinte:

 

Para a determinação do lucro tributável, são dedutíveis todos os gastos e perdas incorridos ou suportados pelo sujeito passivo para obter ou garantir os rendimentos sujeitos a IRC.

 

                Na redacção anterior deste n.º 1 do artigo 23.º estabelecia-se que «consideram-se gastos os que comprovadamente sejam indispensáveis para a realização dos rendimentos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora».

                À face desta anterior redacção do n.º 1 do artigo 23.º do CIRC, foi-se estabilizando o entendimento doutrinal e jurisprudencial no sentido de para ser permitida a dedutibilidade de gastos e sua indispensabilidade para obtenção de rendimentos sujeitos a imposto não era necessária uma relação de causalidade entre os gastos e a obtenção de rendimentos, bastando que aqueles fossem suportados no interesse da empresa, como foi reconhecido nos acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo de 21-09-2016, processo n.º 0571/13 e de 15-11-2017, processo n.º 0372/16:

I – No entendimento que a doutrina e a jurisprudência têm vindo a adoptar quanto à indispensabilidade como requisito para que um custo seja dedutível na determinação da matéria tributável para efeitos de IRC (cfr. art. 23.º do CIRC na redacção anterior a 2009), está completamente arredada a visão finalística, segundo a qual se exigiria uma relação de causa efeito, do tipo conditio sine qua non, entre custos e proveitos.

II – No mesmo entendimento, um custo será aceite fiscalmente desde que, num juízo reportado ao momento em que foi efectuado, seja adequado à estrutura produtiva da empresa e à obtenção de lucros e a AT apenas pode desconsiderar como custos fiscais os que não se inscrevem no âmbito da actividade do contribuinte e foram contraídos, não no interesse deste, mas para a prossecução de objectivos alheios.

 

                A nova redacção do artigo 23.º inclui uma referência à relação entre os gastos e os rendimentos sujeitos a IRC que não constava da proposta de Comissão, mas a nova fórmula não é, neste ponto, substancialmente diferente da utilizada na redacção anterior do artigo 23.º, n.º 1, do CIRC, pois nela já se incluía uma referência ao referir que a realização de gastos «para a realização dos rendimentos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora», que era generalizadamente interpretada, inclusivamente pelo Supremo Tribunal Administrativo, como não exigindo uma relação de causalidade entre gastos e rendimentos.

                Mas, como se refere naquele acórdão do Supremo Tribunal Administrativo a dedutibilidade de gastos depende de estes «num juízo reportado ao momento em que foi efectuado, seja adequado à estrutura produtiva da empresa e à obtenção de lucros» e podem ser desconsiderados como gastos fiscais «os que não se inscrevem no âmbito da actividade do contribuinte e foram contraídos, não no interesse deste, mas para a prossecução de objectivos alheios».

Afigura-se que, à face desta jurisprudência, o gasto em causa, consubstanciado em prescindir da cobrança de uma dívida de que a Requerente se considerava credora, não pode ser considerado dedutível, à face do preceituado no artigo 23.º, n.º 1, do CIRC, pois, no momento em que foi tomada a deliberação do Conselho de Administração, não era adequado à obtenção de lucros nem à satisfação dos interesses da Requerente, mas apenas dos interesses da Câmara Municipal de ... .

Pelo exposto, tem razão a Autoridade Tributária e Aduaneira ao efectuar esta correcção, pelo que improcede o pedido de pronúncia arbitral, nesta parte.

 

3.3. Questão das notas de crédito relativas a dívidas de 2013 e 2014 (€ 125.837,74)

 

A Requerente emitiu várias notas de crédito no exercício de 2015, relativas a correcções de valores de facturas emitidas nos anos de 2013 e 2014, que a Requerente veio a apurar que estavam incorrectos.

Estão em causa, nomeadamente, correcção com base nos valores reais de consumo relativamente a facturas cujo valor foi determinado por estimativa, ou houve erros de leitura de contadores, ou se veio a apurar que os consumos facturados não foram efectivamente fornecidos aos respectivos consumidores por rutura ou outros motivos, ou foram proferidas decisões judiciais ou ocorreu prescrição.

As notas de crédito das facturas emitidas no próprio exercício são registadas pela Requerente como redução ao rendimento do ano, como gastos de exercícios anteriores, por contrapartida da conta 211 Clientes.

Os fundamentos invocados no ponto III.1.2.2. do Relatório da Inspecção Tributária para a não aceitação da dedutibilidade destes gastos são os invocados relativamente às perdas por imparidade de créditos:

- Não foi demonstrado, de forma inequívoca, que se verificou o respetivo risco de incobrabilidade, de acordo com as várias alíneas do n.º 1 do artigo 28.º-B do CIRC;

- Não foi demonstrado a aplicação das percentagens previstas no n.º 2 do mesmo normativo;

- Não foram comprovadas documentalmente quaisquer eventuais diligências adotadas pela A... no sentido da recuperação de tais créditos;

- Não foi justificado documentalmente se estamos perante situações de dívidas incobráveis, nos termos do disposto no artigo 41.º do CIRC;

- Não se vislumbra o motivo para a correção de faturas emitidas em anos anteriores (2013 e 2014), sendo que tal procedimento teria observar o princípio da periodização económica plasmado no artigo 18.º do CIRC.

 

No entanto, posteriormente, a Autoridade Tributária e Aduaneira, numa análise posterior, concluiu «que os valores em causa não resultam de perdas por imparidade em dívidas a receber» (artigo 83.º da Resposta) e numa revisão oficiosa reconheceu o montante de € 125.837,74como gasto do exercício de 2014.

Assim, quanto a esta correcção, o litígio limita-se à aplicação do princípio da especialização dos exercícios, previsto no artigo 18.º do CIRC, invocado no Relatório da Inspecção Tributária.

A Requerente defende que «demonstrou, plenamente, aliás, os motivos que justificam a emissão das notas de crédito, bem como os motivos que presidiram à sua emissão no ano de 2015 e  não anteriormente, os quais se relacionam com dificuldades inerentes ao universo de clientes da  Requerente e à correta identificação dos consumos mensais dos mesmos» e que «não obstante esta necessidade de retificação ser uma questão com que a Requerente se tem vindo a ver confrontada ao longo da sua atividade e a Requerente procurar soluções para a mesma, tal é ainda muito difícil de contornar, por diversas razões, que no entanto nada têm que ver com motivos de procura de vantagem fiscal».

O artigo 18.º do CIRC estabelece o seguinte, no que aqui interessa:

 

Artigo 18.º

 

Periodização do lucro tributável

 

1 - Os rendimentos e os gastos, assim como as outras componentes positivas ou negativas do lucro tributável, são imputáveis ao período de tributação em que sejam obtidos ou suportados, independentemente do seu recebimento ou pagamento, de acordo com o regime de periodização económica.

 

2 - As componentes positivas ou negativas consideradas como respeitando a períodos anteriores só são imputáveis ao período de tributação quando na data de encerramento das contas daquele a que deviam ser imputadas eram imprevisíveis ou manifestamente desconhecidas.

 

A Autoridade Tributária e Aduaneira, nas sua Resposta, defende que as correcções de erros em causa devem ser imputadas ao exercício de 2014, porque só podiam ser imputadas ao exercício de 2015, ao abrigo do n.º 2 do artigo 18.º, e «se a Inspeção Tributária faz qualquer correção aos valores declarados pelo sujeito passivo é porque concluí que as componentes positivas ou negativas eram conhecidas no período de tributação a que respeitavam».

Esta fundamentação, porém, não consta do Relatório da Inspecção Tributária, pelo que se trata de fundamentação a posteriori, que não pode ser considerada relevante.

Na verdade, o regime de contencioso previsto no RJAT é de mera legalidade, visando-se apenas a declaração de ilegalidade de actos dos tipos previstos nas alíneas a) e b) do n.º 1 do seu artigo 2.º. Por isso, tem de se aferir da legalidade dos actos impugnados, tal como foram praticados, com a fundamentação que neles foi utilizada, não sendo relevantes outras possíveis fundamentações que poderiam servir de suporte a outros actos, de conteúdo decisório total ou parcialmente coincidente com o acto praticado. São, assim, irrelevantes fundamentações invocadas a posteriori, após o termo do procedimento tributário em que foi praticado o acto cuja declaração de ilegalidade é pedida, inclusivamente as aventadas no processo jurisdicional.

Por outro lado, a prova produzida conduz à conclusão de que os erros subjacentes às notas de crédito não eram conhecidos antes das datas em que estas foram emitidas, em 2015.

É certo que, apesar de tal não ser aventado pela Autoridade Tributária e Aduaneira, não basta para a imputabilidade das correcções ao exercício em que são detectadas que sejam desconhecidas no período de tributação a que se reportam, pois, o momento relevante para este efeito não é o termo do período de tributação, mas sim a «data de encerramento das contas», que não coincide com o termo do período.

Isto é, os erros de facturação desconhecidos no final do período de tributação, mas conhecidos até à data do encerramento das contas, que não coincidirá com o final do período.

Porém, este possível fundamento para imputação das notas de crédito aos exercícios anteriores, não foi invocado no Relatório da Inspecção Tributária, pelo que não pode ser considerado relevante.

De qualquer modo, não se tendo provado que à data do encerramento das contas, a Requerente tivesse conhecimento de algum ou alguns dos erros de facturação subjacentes à emissão das nota de crédito, não se pode concluir que tenha sido violado o princípio da especialização dos exercícios.

Pelo exposto, não se demonstrando que os gastos a que se referem as notas de crédito não devessem ser imputados ao exercício de 2015 e tendo a dúvida sobre a matéria de facto de ser valorada processualmente a favor da Requerente, em sintonia com a rega do artigo 100.º, n.º 1, do CPPT, subsidiariamente aplicável por força do disposto no artigo 29.º, n.º 1, alínea c), do RJAT, esta correcção deve ser anulada, nos termos artigo 163.º, n.º 1, do Código do Procedimento Administrativo subsidiariamente aplicável nos termos do artigo 2.º, alínea c), da LGT.

Procede, pois o pedido de pronúncia arbitral quanto a esta questão.

 

3.4. Juros compensatórios

 

A liquidação de juros compensatórios tem como pressuposto a liquidação de IRC (artigo 35.º, n.º 8, da LGT), pelo que enferma dos mesmos vícios que a liquidação de IRC, na parte correspondente às questões relativamente às quais o pedido de pronúncia arbitral é precedente.

 

4. Reembolso da quantia paga e juros indemnizatórios

 

A Requerente pagou a quantia liquidada e € 171.440,73 e pede o seu reembolso com juros indemnizatórios.

 Como consequência da anulação parcial da liquidação, a Requerente tem direito ao reembolso da quantia indevidamente paga (artigo 100.º da LGT), correspondente às correcções que são ilegais.

No que concerne a juros indemnizatórios, de harmonia com o disposto na alínea b) do art. 24.º do RJAT, a decisão arbitral sobre o mérito da pretensão de que não caiba recurso ou impugnação vincula a Administração Tributária a partir do termo do prazo previsto para o recurso ou impugnação, devendo esta, nos exactos termos da procedência da decisão arbitral a favor do sujeito passivo e até ao termo do prazo previsto para a execução espontânea das sentenças dos tribunais judiciais tributários, «restabelecer a situação que existiria se o acto tributário objecto da decisão arbitral não tivesse sido praticado, adoptando os actos e operações necessários para o efeito», o que está em sintonia com o preceituado no art. 100.º da LGT [aplicável por força do disposto na alínea a) do n.º 1 do art. 29.º do RJAT] que estabelece, que «a administração tributária está obrigada, em caso de procedência total ou parcial de reclamação, impugnação judicial ou recurso a favor do sujeito passivo, à imediata e plena reconstituição da legalidade do acto ou situação objecto do litígio, compreendendo o pagamento de juros indemnizatórios, se for caso disso, a partir do termo do prazo da execução da decisão».

Embora o art. 2.º, n.º 1, alíneas a) e b), do RJAT utilize a expressão «declaração de ilegalidade» para definir a competência dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD, não fazendo referência a decisões condenatórias, deverá entender-se que se compreendem nas suas competências os poderes que, em processo de impugnação judicial, são atribuídos aos tribunais tributários, sendo essa a interpretação que se sintoniza com o sentido da autorização legislativa em que o Governo se baseou para aprovar o RJAT, em que se proclama, como primeira directriz, que «o processo arbitral tributário deve constituir um meio processual alternativo ao processo de impugnação judicial e à acção para o reconhecimento de um direito ou interesse legítimo em matéria tributária».

O processo de impugnação judicial, apesar de ser essencialmente um processo de anulação de actos tributários, admite a condenação da Administração Tributária no pagamento de juros indemnizatórios, como se depreende do art. 43.º, n.º 1, da LGT, em que se estabelece que «são devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido» e do art. 61.º, n.º 4 do CPPT (na redacção dada pela Lei n.º 55-A/2010, de 31 de Dezembro, a que corresponde o n.º 2 na redacção inicial), que «se a decisão que reconheceu o direito a juros indemnizatórios for judicial, o prazo de pagamento conta-se a partir do início do prazo da sua execução espontânea».

Assim, o n.º 5 do art. 24.º do RJAT, ao dizer que «é devido o pagamento de juros, independentemente da sua natureza, nos termos previsto na lei geral tributária e no Código de Procedimento e de Processo Tributário», deve ser entendido como permitindo o reconhecimento do direito a juros indemnizatórios no processo arbitral.

O regime substantivo do direito a juros indemnizatórios é regulado no artigo 43.º da LGT, que estabelece, no que aqui interessa, o seguinte:

 

Artigo 43.º

Pagamento indevido da prestação tributária

                1 – São devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido.

                2 – Considera-se também haver erro imputável aos serviços nos casos em que, apesar da liquidação ser efectuada com base na declaração do contribuinte, este ter seguido, no seu preenchimento, as orientações genéricas da administração tributária, devidamente publicadas.

 

No caso em apreço, na sequência da ilegalidade da liquidação, na parte correspondente às correcções ilegais, é imputável à Autoridade Tributária e Aduaneira procedente há lugar a reembolso do imposto pago que devia ter sido deduzido, por força dos referidos artigos 24.º, n.º 1, alínea b), do RJAT e 100.º da LGT, pois, os erros são imputáveis à Autoridade Tributária e Aduaneira, já que a prova produzida no procedimento de inspecção lhe permitia adequada percepção da matéria de facto relevante,

Os juros indemnizatórios são devidos, nos termos dos artigos 43.º, n.ºs 1 e 4, e 35.º, n.º 10, da LGT, 61.º, n.º 5, do CPPT, 559.º do Código Civil e Portaria n.º 291/2003, de 8 de Abril, à taxa legal supletiva, e contados desde 18-01-2019 (data do pagamento) até à data do processamento da respectiva nota de crédito.

 

5. Decisão          

De harmonia com o exposto, acordam neste Tribunal Arbitral em:

A)           Julgar parcialmente procedente o pedido de pronúncia arbitral, quanto às questões das perdas por imparidade de dívidas a receber de clientes (€ 345.780,58) e das notas de crédito relativas a dívidas de 2013 e 2014 (€ 125.837,74);

B)           Julgar improcedente o pedido de pronúncia arbitral quanto à questão do perdão de dívida (€ 100.412,96);

C)           Anular a liquidação de IRC n.º 2018..., a liquidação de juros compensatórios n.º 2018... e a demonstração de acerto de contas n.º 2018..., nas partes correspondentes às questões referidas na alínea A);

D)           Julgar procedente o pedido de reembolso, na parte correspondente à anulação das liquidações, e condenar a Autoridade Tributária e Aduaneira a efectuar o pagamento à Requerente do valor que for determinada em execução do presente acórdão;

E)            Julgar procedente o pedido de juros indemnizatórios, na parte correspondente à anulação daa liquidações, e condenar a Autoridade Tributária e Aduaneira a efectuar o seu pagamento, tendo por base de cálculo o valor do reembolso e os termos indicados no ponto 4 deste acórdão.

 

6. Valor do processo

 De harmonia com o disposto no art. 296.º, n.º 1, do CPC e 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária fixa-se ao processo o valor de € 171.440,73

 

7. Custas

                Nos termos do artigo 22.º, n.º 4, do RJAT, fixa-se o montante das custas em € 3.672,00, nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, nas percentagens de 17,55% a cargo da Requerente e de 82,45% a cargo da Autoridade Tributária e Aduaneira.

                A responsabilidade da Autoridade Tributária e Aduaneira tem por base o entendimento de que os documentos que foram juntos no procedimento de inspecção eram suficientes para a Autoridade Tributária e Aduaneira se aperceber da ilegalidade das correcções que efectuou quanto às questões da imparidade de dívidas a receber de clientes e das notas de crédito relativas a dívidas de 2013 e 2014.

 

Lisboa, 23-12-2019

Os Árbitros

 

(Jorge Lopes de Sousa)

 

 

 

(Jorge Carita)

(vencido conforme declaração em anexo)

 

 

 

(Maria do Rosário Anjos)

 

 

Declaração de voto

Não acompanho a presente Decisão apenas no que diz respeito relativamente à terceira correção efetuada pela Autoridade Tributária e que consta do seu ponto 3.3. Questão das notas de crédito relativa a dívidas de 2013 e 2014.

 

Efetivamente, acho que a Requerente tinha todos os elementos para corrigir a sua faturação, antes de 2015, como uma empresa que gere de modo eficiente os seus recursos, e que desse modo o fez tardiamente, não sendo tal gasto admissível em 2015.

 

E se a AT imputou tal valor, reconhecendo os seus efeitos em 2014, admito que estejamos perante uma duplicação se o mesmo for aceite em 2015, como aponta a Decisão.

 

É que não podemos esquecer o que consta do artº. 100º. da Resposta e que é do perfeito conhecimento da Requerente e está por esta confessado (Vd. Pág 27 e 28 das suas alegações):

“Por despacho de 23.08.2019 foi decidida a revisão oficiosa, reduzindo-se em € 125.837,74, o valor do lucro tributável do período de tributação de 2014 e alterando-se, em conformidade, a respetiva liquidação de IRC, despacho que foi notificado à Requerente.”

 

Por outro lado, admito que os erros de faturação detetados eram conhecidos e manifestamente previsíveis, o que não permitira a sua imputação a períodos anteriores (artº. 18º., º. 2 do CIRC).

 

Ou seja, na minha opinião, de facto este gasto já está reconhecido em 2014, pelo que não pode de modo algum ser outra vez reconhecido em 2015.

 

Não vislumbro, por isso, razão, para aplicação do disposto no artº. 100º. do CPPT.

 

O árbitro

(Jorge Carita)