Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 53/2023-T
Data da decisão: 2024-02-05  IMT Selo IMI  
Valor do pedido: € 70.271,93
Tema: IMT; IS; IMI; Regime Fiscal dos Fundos de Investimento Imobiliário para Arrendamento Habitacional (FIIAH).
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SUMÁRIO: As isenções fiscais dos n.ºs 6 (IMI), 7 (IMT) e 8 (IS) do artigo 8.º do regime jurídico dos FIIAH, na sua redação original, derivada da Lei n.º 64-A/2008, de 31 de Dezembro (LOE 2009), devem ser interpretadas no sentido de que estão sujeitas à condição resolutiva de efectiva destinação do imóvel a arrendamento para habitação permanente, ficando aqueles benefícios fiscais sem efeito se o imóvel vier a ser alienado sem ter sido arrendado ou sem que o Ministro das Finanças autorize a sua alienação.

 

***

DECISÃO ARBITRAL

 

1. Relatório

A...- SGOIC, S.A., sociedade com sede na Rua ..., no ..., ...- ... Lisboa, com o número único de matrícula e de pessoa coletiva ..., que incorporou por fusão a sociedade B...- SGOIC, S.A entidade gestora do C...– FUNDO DE INVESTIMENTO IMOBILIÁRIO FECHADO PARA ARRENDAMENTO HABITACIONAL (LIQUIDADO), titular do número de identificação fiscal ..., apresentou pedido de pronúncia arbitral ao abrigo do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, doravante “RJAT”), tendo em vista a declaração de ilegalidade dos atos tributários consubstanciados nos atos de liquidação de Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis (IMT) e juros compensatórios, referentes à propriedade dos prédios urbanos no montante total de € 53.122,44, referente aos anos de 2012 e 2013, nos atos tributários de liquidação do Imposto do Selo (IS) e juros compensatórios no montante total de € 8.900,23, relativo ao ano de 2012 e 2013, e a declaração de ilegalidade do ato tributário consubstanciado na liquidação adicional de Imposto Municipal sobre Imóveis (IMI) n.º 2013..., datada de 16.09.2021, referente ao ano de 2013, no montante total a pagar de € 8.249,26.

 

É Requerida a AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA, (AT):

 

1.1. Do objeto do Processo e valor do processo

Nos presentes autos as liquidações oficiosas contestadas pela Requerente são as seguintes:

- A liquidação de IMI com 2013... de 16-09-2021 relativa aos imóveis situados no Município de Albufeira no montante de 8.249,15, com data limite de pagamento: novembro de 2022;

- As liquidações de IMT e IS notificadas:

Pelo ofício n.º..., 29-09-2022, do SF de Lagos:

- Liquidação de IMT e respetivos juros compensatórios n.º..., de 19-10-2022, no valor total de € 9.802,89 (sendo de imposto € 8.426,88 e de juros € 1.376,01);

- Liquidação de IS e respetivos juros compensatórios n.º ..., de 19-10-2022, no valor total de € 2.205,59 (sendo de imposto € 1.896,00 e de juros € 309,59);

referentes à aquisição pelo “Fundo”, em 14-11-2012, da fração autónoma designada pela letra “AH” do prédio urbano inscrito na respetiva matriz sob o n.º U-... da freguesia de ..., concelho de Lagos.

Pelo ofício n.º..., 29-09-2022, do SF de Lagos:

- Liquidação de IMT e respetivos juros compensatórios n.º..., de 19-10-2022, no valor total de € 38.681,27 (sendo de imposto € 34.080,00 e de juros € 4.601,27);

- Liquidação de IS e respetivos juros compensatórios n.º ..., de 19-10-2022, no valor total de € 5.157,50 (sendo de imposto € 4.544,00 e de juros € 613,50), referente à Declaração/Modelo 1, com o Reg. n.º 2022/..., de 19-10-2022, referentes à aquisição pelo “Fundo”, em 23-12-2013, do prédio urbano inscrito na respetiva matriz sob o n.º U-... da freguesia da..., concelho de Lagos.

- Pelo ofício n.º..., 29-09-2022, do SF de Lagos:

- Liquidação de IMT e respetivos juros compensatórios n.º ..., de 19-10-2022, no valor total de € 4.638,28 (sendo de imposto € 4.296,88 e de juros € 341,40);

- Liquidação de IS e respetivos juros compensatórios n.º ..., de 19-10-2022, no valor total de € 1.537,14 (sendo de imposto € 1.424,00 e de juros € 113,14); referentes à aquisição pelo “Fundo”, em 20-09-2013, da fração autónoma designada pela letra “A” do prédio urbano inscrito na respetiva matriz sob o n.º U-... da freguesia de ..., concelho de Lagos.

 

1.2. Da legitimidade processual

O pedido de pronúncia arbitral sub judice respeita a atos tributários de IMT, IS e IMI, acima melhor identificados, nos termos dos quais figura como sujeito passivo o C...– Fundo de Investimento Imobiliários Fechado para Arrendamento Habitacional (doravante designado por “Fundo C...”), o qual foi constituído a 06-06-2012 e era representado e gerido pela sociedade B...– Sociedade Gestora de Fundos de Investimento, SGOIC, S.A. (doravante designada por “B...”).

Por escritura pública lavrada a 06-04-2017, o Fundo C... foi dissolvido e liquidado.

A B... foi incorporada, por fusão, na sociedade A..., SGOIC, S.A. no decurso do ano de 2020 (cf. doc. n.º 1).

O Fundo encontrava-se extinto à data da emissão dos atos tributários.

Assim, na qualidade de sucessora universal nos direitos e obrigações da sociedade incorporada, a Requerente assume a posição processual da B... deduzindo, para o efeito, o presente pedido de pronúncia arbitral.

 

1.3. Da cumulação de pedidos

Nos presentes autos estão em causa a legalidade dos atos tributários de IMT, IS e IMI referentes a 2012 e 2013 resultantes da ação de inspeção tributária interna, sob a ordens de serviço n.ºs OI 2018..., 2018..., 2018... e 2018..., à esfera do Fundo C..., por caducidade das isenções de IMT, IS e IMI aplicadas por força do Regime Jurídico aplicável aos Fundos de Investimento Imobiliários para Arrendamento Habitacional (FIIAH) e sociedades de investimento imobiliário para arrendamento habitacional (SIIAH), previsto e aprovado pela Lei n.º 64-A/2008, de 31 de dezembro (Lei do Orçamento do Estado para 2009).

Nos termos do artigo 3.º, nº 1 do RJAT, é admissível a cumulação de pedidos quando “(...) a procedência dos pedidos dependa essencialmente da apreciação das mesmas circunstâncias de facto e da interpretação e aplicação dos mesmos princípios ou regras de direito”.

No caso sub judice, verificam-se os pressupostos exigidos no supracitado preceito legal para a cumulação de pedidos por os atos tributários de IMT, IS e IMI em questão têm como suporte a mesma base factual e de direito estão.

 

1.4. Tramitação Processual

O pedido de constituição do Tribunal Arbitral, apresentado em 27-01-2023, foi aceite pelo Presidente do CAAD e automaticamente notificado à Requerente e à Requerida Autoridade Tributária e Aduaneira.

A Requerente não procedeu à nomeação de árbitro, pelo que, ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 6.º e na alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, o Conselho Deontológico designou os ora signatários como árbitros do Tribunal Arbitral Coletivo, que comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável.

Em 15-03-2023, as partes foram devidamente notificadas dessa designação, e não manifestaram vontade de a recusar, nos termos do artigo 11.º, n.º 1, alíneas a) e b), do RJAT, e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.

O Tribunal Arbitral Coletivo foi constituído em 03-04-2023, à face do preceituado nos artigos 2.º, n.º 1, alíneas a), e 10.º, n.º 1, do RJAT, para apreciar e decidir o objeto do presente litígio.

A 10-05-2023 a Requerida apresentou a sua resposta, com defesa por impugnação, e juntou o processo administrativo.

 

2. Saneamento

O Tribunal arbitral foi regularmente constituído e é materialmente competente, como se dispõe no artigo 2.º, n.º 1, al. a) e 4.º, ambos do RJAT.

As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão representadas (artigos. 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e artigo 1.º a 3.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março).

O processo não enferma de nulidades.

Assim, não há qualquer obstáculo à apreciação da causa

 

3. Matéria de Facto

3.1. Factos provados

Com relevância para a apreciação das questões suscitadas, o Tribunal dá como provado os seguintes factos:

  1. O Fundo C... era um fundo de investimento imobiliário fechado para arrendamento habitacional, de subscrição particular, o qual foi constituído a 06-06-2012 e era representado e gerido pela sociedade B...– Sociedade Gestora de Fundos de Investimento, incorporada por fusão na esfera da Requerente.
  2. Em 2012 e 2013, o “Fundo C...” adquiriu os imóveis a seguir identificados, tendo beneficiado das isenções de IMT e IS consagradas no REFIIAH para as aquisições de prédios urbanos ou de frações autónomas de prédios urbanos destinados exclusivamente a arrendamento para habitação permanente, ao abrigo dos n.os 7 e 8 do artigo 8.º do Regime Especial aplicável aos FIIAH/SIIAH:

- a fração autónoma designada pela letra “AH” do prédio urbano inscrito na respetiva matriz da freguesia de ..., concelho de Lagos sob o art.º ... (atual artigo n.º U-... da freguesia de ..., concelho de Lagos), destinada a habitação, adquirida em 14-11-2012, ao Banco D..., SA.

- o prédio urbano inscrito na respetiva matriz da freguesia da ..., concelho de Lagos, sob o artigo n.º ... (atual artigo n.º U-... da freguesia da ..., concelho de Lagos), destinado a habitação, adquirido em 23-12-2013, ao Banco D..., SA.

- a fração autónoma designada pela letra “A” do prédio urbano inscrito na respetiva matriz da freguesia de ..., concelho de Lagos sob o artigo n.º ... (atual artigo n.º U-... da freguesia de ..., concelho de Lagos), destinada a habitação, adquirida em 20- 09-2013, ao Banco D..., SA.

  1. As referidas aquisições beneficiaram de isenção de IMT e de Imposto do Selo (Verba 1.1 da TGIS) nos termos do n.º 8 do artigo 114.º da Lei 64-A/2008, de 31/12, alterada pela Lei 83.º-C/2013, de 31/12.
  2. No decurso do ano de 2018, teve lugar uma ação inspetiva interna, efetuada em cumprimento das ordens de serviço OI 2018..., 2018..., 2018..., 2018... e 2018..., realizada pelos serviços de inspeção da Direção de Finanças de Lisboa.
  3. O objetivo da ação inspetiva consistiu no controlo interno, de âmbito parcial, relativamente aos exercícios de 2012 a 2016, da isenção do IMT, IS e IMI, das aquisições de prédios urbanos ou de frações autónomas de prédios urbanos destinados exclusivamente a arrendamento para habitação permanente e da isenção de IMI desses imóveis, propriedade dos fundos de investimento imobiliário para arrendamento habitacional (FIIAH), nos termos da Lei nº 64- A/2008, de 31 de dezembro, alterada pelos artigos 235.° e 236.° da Lei n° 83-C/2013, de 31 de dezembro, nomeadamente nos termos dos nos. 14, 15 e 16 do artigo 8º do Regime especial aplicável aos FIIAH, aprovado pelos artigos 102.° a 104.° da Lei nº 64-A/2008, assim como da regulamentação dos termos e critérios a que estão sujeitas as transmissões dos imóveis ao fundo, a determinação do valor da renda, a atualização do preço do imóvel e o direito de opção de compra, constantes da Portaria nº 1553-A/2008, de 31 de dezembro;
  4. Em 7 de janeiro de 2019, os serviços de inspeção notificaram a Requerente do relatório de inspeção tributária.
  5. A Requerente foi notificada dos atos tributários consubstanciados nas liquidações de IMT, IS e IMI referentes à propriedade dos prédios urbanos:

Pelo ofício n.º ..., 29-09-2022, do SF de Lagos:

- Liquidação de IMT e respetivos juros compensatórios n.º ..., de 19-10-2022, no valor total de € 9.802,89 (sendo de imposto € 8.426,88 e de juros € 1.376,01);

- Liquidação de IS e respetivos juros compensatórios n.º..., de 19-10-2022, no valor total de € 2.205,59 (sendo de imposto € 1.896,00 e de juros € 309,59);

 referentes à aquisição pelo “Fundo”, em 14-11-2012, da fração autónoma designada pela letra “AH” do prédio urbano inscrito na respetiva matriz sob o n.º U-... da freguesia de..., concelho de Lagos.

Por oficio n.º..., 29-09-2022, do SF de Lagos:

- Liquidação de IMT e respetivos juros compensatórios n.º..., de 19-10-2022, no valor total de € 38.681,27 (sendo de imposto € 34.080,00 e de juros € 4.601,27);

- Liquidação de IS e respetivos juros compensatórios n.º..., de 19-10-2022, no valor total de € 5.157,50 (sendo de imposto € 4.544,00 e de juros € 613,50), referente à Declaração/Modelo 1, com o Reg. n.º 2022/..., de 19-10-2022, referentes à aquisição pelo “Fundo”, em 23-12-2013, do prédio urbano inscrito na respetiva matriz sob o n.º U-... da freguesia da ..., concelho de Lagos.

Por oficio n.º ..., 29-09-2022, do SF de Lagos:

- Liquidação de IMT e respetivos juros compensatórios n.º..., de 19-10-2022, no valor total de € 4.638,28 (sendo de imposto € 4.296,88 e de juros € 341,40);

- Liquidação de IS e respetivos juros compensatórios n.º ..., de 19-10-2022, no valor total de € 1.537,14 (sendo de imposto € 1.424,00 e de juros € 113,14); referentes à aquisição pelo “Fundo”, em 20-09-2013, da fração autónoma designada pela letra “A” do prédio urbano inscrito na respetiva matriz sob o n.º U-... da freguesia de ..., concelho de Lagos.

  1. Em 19-10-2022 a Requerente procedeu ao pagamento voluntário do imposto no valor de € 31 590,66; (cfr. docs. 8, 9 e 10 juntos com o PPA).

 

3.2. Factos não provados

Não há factos relevantes para esta Decisão Arbitral que não se tenham provado.

 

3.3. Fundamentação da matéria de facto

O Tribunal não tem o dever de se pronunciar sobre toda a matéria de facto alegada, mas antes selecionar a que interessa à decisão, tendo em conta a causa de pedir que suporta o pedido formulado pelo autor, e decidir se a considera provada ou não provada, conforme artigos 123.º, n.º 2, do CPPT e artigo 607.º, n.º 3 do CPC, aplicáveis por força do artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e), do RJAT.

Tendo em conta o princípio da livre apreciação da prova, o Tribunal deve basear a sua decisão em relação às provas produzidas, na sua íntima convicção, formada a partir do exame e avaliação que faz dos meios de prova trazidos ao processo e de acordo com a sua experiência de vida e de conhecimento das pessoas e da envolvência.

Assim, e tendo em consideração as posições assumidas pelas Partes, como prevê o artigo 110.º

do CPPT, relativa à prova documental produzida, consideraram-se provados, com relevo para

a decisão, os factos supra elencados.

 

4. Posição das Partes

4.1. Posição da Requerente

Sobre a incoerência de fundamentação dos atos face ao relatório de inspeção tributária no PPA a Requerente alega que:

Por referência aos atos de liquidação do IMT e do IS emitidos por Ofícios do Serviço de Finanças de Lagos datados de 29.09.2022, a fundamentação de facto e de direito não é coincidente com a fundamentação de facto e de direito expressa no Relatório de Inspeção Tributária.

A este título, recorde-se que, as correções ao IMT, IS e IMI efetuadas pelo Relatório de Inspeção Tributária têm como fundamento o facto o Fundo ter beneficiado indevidamente das isenções de IMT, IS e IMI, ao abrigo do Regime Jurídico do FIIAH, uma vez que esse Fundo havia adquirido todos os seus imóveis a uma única entidade – o Banco D..., S.A. – não cumprindo, alegadamente, o pressuposto primordial da lei referente ao desagravamento dos encargos das famílias no contexto dos mercados financeiros nos anos da crise.

A este argumento acresce o facto de os serviços de inspeção tributária entenderam que a mera intenção de destinar os prédios a arrendamento, sem a sua efetivação, não era suficiente para manter em vigor a isenção do IMT, IS e IMI.

Assim, com base na interpretação do preâmbulo da Portaria n.º 1553-A/2008, de 31 de dezembro, do Relatório do Orçamento do Estado para 2009 e do artigo 5ºº do Regime jurídico dos FIIAH, entendeu a administração tributária que não estariam, alegadamente, reunidos os pressupostos para o Fundo beneficiar das aludidas isenção.

Ora, se é verdade que os atos de liquidação, supra identificados, remetem para o Relatório de Inspeção Tributária, não menos verdade é o facto de comportarem uma fundamentação, de direito, acrescida e distinta da fundamentação aduzida no aludido relatório.

Aliás, a fundamentação, de direito, invocada pelo serviço de finanças nos supra identificados Ofícios é precisamente aquela que os serviços de inspeção tributária pretendem afastar, na medida em que os serviços defendem que, anteriormente à alteração legislativa, decorria do regime jurídico a obrigação de arrendamento (sem necessidade de ser observado um determinado prazo legal para o efeito.

Ora, a contradição de fundamentação equivale a falta de fundamentação do ato tributário que determina a sua anulação.

Do vício da fundamentação da liquidação do IMI de 2013 por falta de identificação dos imóveis

A Requerente alega que: “Da análise do teor à liquidação de IMI, melhor identificada no introito, não são identificados os imóvel em causa, apenas o código do município a que respeita o imóvel, assim como também não é identificado o valor patrimonial, a taxa ou qualquer outro tipo de informação que permita ao sujeito passivo avaliar a liquidação e a forma de cálculo.

Contudo, o ato de tributação ora contestado, corporizado no ato de liquidação em crise, é claramente insuficiente quanto à necessária fundamentação, de facto, pois não permite conhecer na íntegra a relação entre a incidência adicional do IMI e os imóveis em causa ou os seus valores patrimoniais tributárias e taxas aplicáveis.

Aliás, não é possível à Requerente apurar, sequer, qual o valor da coleta que serviu de base à quantificação do imposto em causa, não sendo explicitados os cálculos que conduzem ao apuramento do valor de imposto devido.

E não se diga que o facto de a administração tributária no próprio ato de liquidação indicar que a relação completa dos imóveis segue em documento separado é suficiente para considerar cumprido o dever de fundamentação do ato, porquanto as informações relativas à quantificação do IMI para cada prédio deverão ser expressas no próprio ato, dele devendo ser contemporâneas.

Mas mesmo que assim se considerasse, cumpre salientar que, no caso em apreço, essa relação completa de imóveis nunca foi remetida ao contribuinte.

Assim, da doutrina e jurisprudência supra citada e das considerações tecidas, conclui-se que os ato tributário aqui em apreço está inquinado de vício de forma, nos termos do disposto no artigo 268.º, n.º 3, da Constituição da República Portuguesa e artigo 77.º da LGT, razão pela qual deve ser anulado em conformidade, de acordo com o artigo 163.º do Código de Procedimento Administrativo”.

Sobre a ilegalidade das correções do IMT e IS efetuadas pelos serviços de inspeção tributária

- Da errónea interpretação do Regime Jurídico dos FIIAH e a violação do princípio da legalidade e da confiança jurídica

A Requerente defende, em suma, que:

Em face da fundamentação aduzida no relatório de inspeção tributária, as correções ao IMT, IS e IMI efetuadas pelos serviços de inspeção tributária são ilegais, devendo, por tal, serem anulados os atos de liquidação sub judice

Os serviços de inspeção tributária, após análise das amostras das escrituras públicas de compra e venda dos imóveis celebradas pelo Fundo C..., concluem que todos os imóveis foram alienados por uma única sociedade – o Banco D..., S.A..

Na ótica dos serviços de inspeção tributária “Este facto revela que existiu a consciência e a vontade própria de as aquisições estarem a ser efetuadas não a famílias oneradas com as prestações dos empréstimos à habitação, mas sim ao BANCO D..., S A, que também é o depositário dos ativos do FUNDO e a entidade comercializadora responsável pela colocação das unidades de participação do FUNDO junto dos investidores Partindo desta observação e baseados no Relatório do Orçamento do Estado de 2009, na Portaria n.º 1553-A/2008, de 31 de dezembro e no artigo 5.º do Regime Jurídico dos FIIAH, os serviços de inspeção tributária defendem que as isenções ao IMT, IS e IMI, aplicadas aquando da aquisição e manutenção dos imóveis pelo Fundo, caducaram uma vez que não foram observados os pressupostos primordiais da lei, nomeadamente a aquisição dos imóveis às famílias oneradas com prestações dos empréstimos à habitação.

De acordo com a aludida alínea a), do n.º 7, do artigo 8.º deste regime, o Fundo pode beneficiar da isenção do IMT na condição de o prédio urbano ou fração autónoma do prédio urbano se destinar exclusivamente ao arrendamento para habitação permanente.

De igual modo, quanto à isenção de IS prevista no artigo 7.º, n.º 8 do mesmo diploma, o legislador exige que os atos praticados têm de estar conexos com a transmissão dos prédios urbanos destinados a habitação permanente que ocorra por força da conversão do direito de propriedade desses imóveis num direito de arrendamento sobre os mesmos, bem como com o exercício da opção de compra previsto no n.º 3, do artigo 5.º do aludido regime, não sendo, de todo, imperativo que se observe a prorrogativa do exercício da opção de compra.

Por outro lado, e analisado o regime jurídico dos FIIAH, nomeadamente o artigo 8.º, não se logra atingir a conclusão que a administração tributária pretende alcançar, porquanto a lei não exige que, para beneficiar das isenções de IMT e IS, o Fundo tenha de adquirir os imóveis a famílias oneradas com prestações dos empréstimos à habitação.

Na verdade, não se observa no Regime jurídico dos FIIAH qualquer evidência de que o legislador pretendeu estabelecer a regra segundo a qual, para beneficiarem das isenções de IMT, IS e IMI, os Fundos deverão adquirir os imóveis a pessoas singulares excluindo quaisquer outras entidades alienantes.

Mais ainda, o facto de os contratos de arrendamento para habitação celebrados entre o Fundo e os arrendatários preverem uma cláusula segundo a qual não é aplicado o disposto no artigo 5.º do regime jurídico dos FIIAH, em nada influi com a observância dos requisitos previstos na lei para o benefício da isenção de IMT, IS e IMI.

Com efeito, o artigo 5.º do aludido regime consagra a possibilidade aos mutuários de contratos de crédito à habitação de celebrarem com a entidade gestora do fundo um contrato de arrendamento com direito a opção de compra do imóvel, ao fundo, suscetível de ser exercido até 31 de dezembro de 2020 (cf. artigo 5.º, n.º 3 do regime jurídico dos FIIAH).

a interpretação da administração tributária assente no relatório de inspeção tributária, e que justifica os atos tributários em apreço, é violadora dos princípios da legalidade, na vertente da tipicidade, ínsito nos artigos 103.º, n.º 2 e 3 e 165.º, n.º 1, alínea a) da CRP.

Em face do exposto, não existe o mínimo suporte na letra da lei para o entendimento da administração tributária, com base no qual foram emitidos os atos tributários contestados, de que o Fundo C..., ao ter adquirido a totalidade de imóveis ao Banco D..., não se encontrava a cumprir com o pressuposto primordial da lei de concorrer para o desagravamento dos encargos das famílias no contesto dos mercados financeiros nos anos da crise.

Em primeiro lugar, cumpre sublinhar que, ao contrário do que pretendem os serviços de inspeção tributária demonstrar, houve, efetivamente, a celebração de contratos de arrendamento sobre alguns imóveis destinados à habitação permanente.

Nos restantes casos em que não foi possível arrendar os imóveis, também não colhe o argumento dos serviços de inspeção tributária, não se justificando, assim, a consideração da caducidade das isenções do IMT, IS e IMI e por consequência a emissão dos atos de liquidação sub judice.

Conforme já analisado no capítulo anterior, o disposto nos n.os 6 a 8 do regime jurídico dos FIIAH isenta de IMT, IS e IMI as operações e atos associados à aquisição de imóveis “destinados exclusivamente a arrendamento para habitação permanente”.

Ora, também no caso em apreço, os imóveis detidos pelo Fundo C... estavam disponíveis para arrendamento habitacional, não tendo a entidade geradora do Fundo, à data da sua aquisição (2012 e 2013), ponderado outro destino que não fosse a celebração de contratos de arrendamento.

Aliás, o objeto do Fundo era precisamente a aquisição dos imóveis com a única finalidade de celebrar contratos de arrendamento habitacional.

Contudo, e por impossibilidades alheias à entidade gestora do Fundo, não foi possível arrendar os imóveis em apreço, não obstante os deliberados esforços nesse sentido.

Efetivamente, o facto de a entidade gestora do Fundo C... não conseguir celebrar contratos de arrendamento levou a que este tivesse de alienar os mesmos, por forma a conseguir rentabilizar e até recuperar o investimento – algo que, nos anos de 2012 e 2013 não era, de todo, o objetivo.

Assim, a alienação dos imóveis nos anos de 2014 e 2015 apenas ocorreu por estrita necessidade de recuperar o investimento realizado nos anos de 2012 e 2013, e cujas intenções acabaram por se frustrar.

Na verdade, a consequência jurídica e sanção pela falta de efetivação do arrendamento destes imóveis passou a estar prevista após a entrada em vigor do artigo 236.º da Lei n.º 83-C/2013, de 31 de dezembro, conforme n.os 14, 15 e 16 do artigo 8.º do aludido regime, nos termos da qual consagrou, expressamente, a fixação de um prazo de três anos para a efetivação do arrendamento, com a cominação que, caso tal não sucedesse, as isenções em sede de IMI, IMT e IS ficariam sem efeito.

Neste contexto, só após a entrada em vigor da Lei n.º 83-C/2013, de 31 de dezembro – que se diga, tem um cunho inovador uma vez que impõe consequências ao incumprimento dos requisitos num determinado hiato temporal que não se encontravam estabelecidas na redação original do artigo 8.º do aludido regime – é possível considerar que o legislador introduziu um requisito que obrigava à necessidade de efetivar o arrendamento do imóvel.

Apenas e só com a introdução dos n.os 14, 15 e 16 do artigo 8.º do regime, aditado pelo artigo 236.º da Lei n.º 83-C/2013, de 31 de dezembro, passou a existir, expressamente, uma cominação para a falta de efetivação do arrendamento dos imóveis por parte dos Fundos, mas que, ainda assim, não comporta qualquer obrigação de apresentação de pedido de autorização ao Ministro das Finanças antes de ser conferido outro destino ao imóvel.

Por outro lado, cumpre salientar que, se é notório que a interpretação do artigo 8.º efetuada pelos serviços inspeção tributária não teve por base a nova redação conferida pelo artigo 236.º da Lei n.º 83-C/2013, de 31 de dezembro, não menos notório é o facto de tal interpretação conduzir à mesma interpretação julgada inconstitucional pelo Tribunal Constitucional, por violação do princípio da tutela da confiança jurídica.

No caso em apreço é manifesta a violação do princípio da proteção da confiança jurídica, ínsito no artigo 2.º da CRP, quando a interpretação do artigo 8.º, n.º 6 a 8 do regime jurídico dos FIIAH, na redação original e vigente à data dos factos, conduz ao entendimento segundo o qual para beneficiar das isenções de IMT, IS e IMI é necessário verificar a efetivação do arrendamento habitacional próprio e permanente dos imóveis adquiridos pelo Fundo, não bastando a sua disponibilização no mercado para o seu arrendamento, e têm de ter em conta as normais circunstâncias do mercado, considerando o risco normal da atividade económica.

De facto, a interpretação geradora das caducidades das isenções de IMT e IS em causa, baseada na aplicação de novos pressupostos legais não contemplados na lei vigente à data da adquisição dos imóveis e que apenas foram expressamente consagrados em lei posterior (Lei n.º 83-C/2013, de 31 de dezembro), frustra as expectativas legitimamente incutidas nos fundos pelo regime fiscal à data dos factos.

Em face de todo o que fica exposto, conclui-se que as decisões de indeferimento da reclamação graciosa e os atos tributários consubstanciados nas liquidações de IMT e IS e em causa carecem de base legal, sendo ilegais, o que tem como consequência a anulação das mesmas.”

Da ilegalidade das liquidações de juros compensatórios

Sem prejuízo do acima exposto, e sem conceder quanto aos vícios acima invocados, enferma também a liquidação de juros compensatórios, de manifesta ilegalidade.

Com efeito, não estão verificados os pressupostos para a sua liquidação previstos no artigo 35.º da LGT.

Resulta da citada norma que haverá lugar à liquidação de juros compensatórios quando exista um retardamento da liquidação do imposto ou da entrega de imposto a reter no âmbito de substituição tributária e, para além disso, esse retardamento for imputável ao sujeito passivo, isto é, carece de culpa por parte do contribuinte.

Com efeito, não existiu retardamento de IMT, de IS e de IMI porquanto a respetiva liquidação emitida pela administração tributária é ilegal, não se podendo considerar a existência da isenção daquele imposto (como demonstrado supra).

E também não existiu culpa, pois não merece qualquer censurabilidade a conduta da entidade gestora do Fundo ou da Requerente.

Neste contexto e em face de todo o exposto, deve ser declarada a ilegalidade da respetiva liquidação de juros compensatórios, com a consequente anulação da mesma.

Do pagamento voluntário e dos juros indemnizatórios

Relativamente aos juros indemnizatórios defende a Requerente que:

“Não obstante a plena convicção da ilegalidade das liquidações de IMT, IS e IMI sub judice, a Requerente procedeu ao seu pagamento.

Deste modo, procedendo a presente reclamação graciosa, como não poderá deixar de ser decidido, deve a Requerente ser reembolsada dos montantes indevidamente pagos.

 

4.2. Posição da Requerida

A Autoridade Tributária, na Resposta, defende a legalidade dos atos tributários praticados, alegando, em síntese, o seguinte:

Sobre a incoerência de fundamentação dos atos face ao relatório de inspeção tributária no PPA

“Alega relativamente aos atos de liquidação do IMT, emitidos por Ofícios do Serviço de Finanças de Lagos com os n.os ..., ... e ..., datados de 29.09.2022, que a fundamentação de facto e de direito não é coincidente com a fundamentação de facto e de direito expressa no Relatório de Inspeção Tributária, facto esse que equivale a falta de fundamentação do ato tributário que determina a sua anulação.

A contradição a que a Requerente alude sempre seria uma inexactidão suprível em face daquela que é, efectivamente, a fundamentação do ato em crise.

Atenta a exigência legal de fundamentação, e em face da situação concreta ora em análise, entende-se que basta atentar à fundamentação constante do relatório de inspeção tributária, para a qual a notificação efetivamente remete, para se perceber que a mesma é congruente com a correção efetuada e se mostra suficientemente clara e percetível a qualquer administrado, normalmente diligente, que com ela se confronte.

In casu, é manifesto que foi dado à Requerente um conhecimento claro da motivação da liquidação, de modo a permitir que fizesse uma opção consciente entre a aceitação da legalidade do ato ou a sua impugnação, como se constata através do presente pedido de pronúncia do tribunal arbitral.

Assim, deverá concluir-se pela inexistência de violação do dever de fundamentação relativamente aos atos especificamente impugnados”.

Falta de fundamentação da liquidação do IMI de 2013 por falta de identificação dos imóveis

Por outro lado, quanto à falta de fundamentação que a Requerente imputa à liquidação do IMI de 2013 (vide art.os 63º e 78º do ppa), por falta de identificação do valor patrimonial tributário, da taxa ou qualquer outro elemento que lhe permita avaliar a liquidação e a fórmula de cálculo, ressalta-se que o doc 4 refere expressamente que “a relação completa [dos imóveis] segue em envelope separado”, pelo que, não tem o requerente razão na invocada falta de fundamentação”.

Sobre a ilegalidade das correções do IMT e IS efetuadas pelos serviços de inspeção tributária

Defende a Requerida que : “O legislador, entre outras medidas que lhe sucederam, instituiu através da Lei n.º 64-A/2008, de 31.12 (LOE 2009), nos art.os 102.º a 104.º, o regime jurídico aplicável dos FIIAH e das SIIAH tendo em vista não só a sua criação, mas também definir um regime tributário especialmente favorável que lhes permitisse cumprir a função de apoio às famílias e ao sistema bancário face a problemas emergentes de contratos de crédito à habitação, designadamente, o incumprimento contratual decorrente de vicissitudes económicas (situação económica difícil dos agregados familiares, sobre- endividamento e do aumento de taxas de juro), e também como forma de evitar o aumento do crédito “mal parado”.

No essencial, o legislador pretendeu com este regime, não só criar as condições necessárias à colocação de imóveis no mercado de arrendamento, mas acima de tudo permitir às famílias oneradas com prestações dos empréstimos à sua habitação própria e permanente, alienar o imóvel ao Fundo (e de aí permanecerem), assim vendo reduzidos os seus encargos por contrapartida de uma renda de valor inferior à prestação que antes tinham, com a possibilidade de mais tarde exercerem a opção (re)compra do mesmo.

No que se refere ao regime fiscal aplicável, os Fundos constituídos segundo os artigos 2.º a 6.º desse regime, beneficiavam, em contrapartida, de um desagravamento fiscal através do reconhecimento de “enquanto se mantiverem na carteira do FIIAH, os prédios urbanos destinados ao arrendamento para habitação permanente que integrem o património dos fundos de investimentos referidos no n.º 1” (artigo 8.º n.º 6 do regime jurídico dos FIIAH), redação que se manteve inalterada com a LOE 2014.

O propósito da norma não era só́ fomentar o mercado de arrendamento (à saída), mas sim ajudar as famílias em dificuldades sem que entrassem em incumprimento (à entrada). O princípio base daquele n.º 8 seria fomentar operações com prestações entre as partes em tudo semelhantes ao leaseback, ou seja, uma sucessão de venda/arrendamento/recompra, ao FIAHH/SIAHH, com benefícios fiscais na venda e na recompra.

O n.º 8 do art.º 8.º do RJFIIAH estabelecia expressamente que “Ficam isentos de imposto do selo todos os atos praticados, desde que conexos com a transmissão dos prédios urbanos destinados a habitação permanente QUE OCORRA POR FORÇA DA CONVERSÃO DO DIREITO DE PROPRIEDADE DESSES IMÓVEIS NUM DIREITO DE ARRENDAMENTO sobre os mesmos”.

Assim sendo, o fundamento, apresentado pelos serviços de inspeção, na defesa da caducidade das isenções, que aponta para a necessidade do Fundo adquirir os imóveis às famílias oneradas com prestações dos empréstimos à habitação, está de acordo com o propósito que presidiu à criação do regime aplicável dos FIIAH e das SIIAH.

Com a aprovação e entrada em vigor da LOE 2014, o legislador manteve a parte enunciativa desse regime, concretizando, no entanto, sob inovação, o conceito do destino efetivo dos prédios, o prazo em que os Fundos deveriam comprovar esse destino e que prédios é que se deveriam considerar abrangidos pelas normas aditadas.

Em bom rigor, o que o legislador veio fazer com a introdução das citadas alterações foi concretizar em Lei, o entendimento e os procedimentos que a AT já adotava para a concessão da isenção do IMT, aplicando, de acordo com o n.º 2 do art.º 236.º da LOE 2014, o mesmo prazo de comprovação dos pressupostos também aos prédios adquiridos antes de 1 de janeiro de 2014.

No caso concreto a cessação do benefício ocorreu, não pela necessidade de manutenção dos prédios no património dos FIIAH durante certo prazo ou sobre a necessidade de celebração efetiva do contrato de arrendamento, mas porque, na sequência de uma ação fiscalizadora, se verificou que não estavam reunidos os pressupostos de que a lei faz depender a sua concessão.

Os prédios adquiridos pelo Fundo e destinados a arrendamento habitacional, beneficiariam da isenção do IMT mesmo que, por exemplo, por dificuldades de mercado, não conseguisse concretizar o arrendamento durante certo prazo ou que por isso viesse a alienar o imóvel.

Tal interpretação está conforme ao entendimento expresso no Acórdão n.º 175/2018, do Tribunal Constitucional, que em parte a seguir se transcreve:

“... no que toca aos benefícios fiscais consagrados na alínea a) do n.º 7 e no n.º 8 do artigo 8.o do Regime jurídico aplicável aos FIIAH, na versão aprovada pela Lei n.º 64-A/2008, de 31 de dezembro isenções de IMT e Imposto de selo, a causa do benefício só pode residir na efetiva disponibilização do imóvel adquirido para arrendamento habitacional.

A atividade fomentada, isto é, a atividade cuja realização aquelas isenções se propõem incentivar não é a mera aquisição do imóvel, ainda que acompanhada da declaração do propósito de o afetar ao arrendamento habitacional; é sim a colocação no mercado de arrendamento habitacional do imóvel adquirido, sendo essa, em definitivo, a atividade cujo exercício se pretendeu estimular através da concessão dos referidos benefícios.”

O que releva, pois, é o facto de, em virtude da retroatividade imposta pelo n.º 2 do artigo 236.º da Lei n.º 83-C/2013, as isenções concedidas ao abrigo da versão originária da Lei que aprovou o regime jurídico especialmente aplicável aos FIIAH e às SIIAH caducarem, não apenas se o imóvel adquirido não for disponibilizado para arrendamento habitacional em momento posterior ao da respetiva aquisição, mas também se, não obstante aquela disponibilização, nenhum contrato de arrendamento vier a ser efetivamente celebrado por razões não imputáveis ao fundo e/ou o imóvel adquirido acabar por ser alienado na sequência dessa impossibilidade, dentro dos três anos subsequentes à entrada em vigor da nova lei.

Desta forma, decidiu o TC, no Acórdão no 175/2018, “julgar inconstitucional, por violação do princípio da proteção da confiança, decorrente do artigo 2.º da Constituição, a norma decorrente do n.º 2 do artigo 236.º da Lei n.º 83-C/2013, de 31 de dezembro, em conjugação com o n.º 16 do artigo 8.º do Regime jurídico aplicável aos FIIAH e às SIIAH, na versão decorrente das alterações levadas a cabo pela aludida Lei, de acordo com a qual as isenções em sede de IMT e de Imposto de Selo previstas nos n.os 7, alínea a), e 8, daquele artigo 8.º caducam se o imóvel adquirido for alienado no prazo de três anos, contados de 1 de janeiro de 2014”.

Quanto às aquisições anteriores a 01.01.2014, onde se incluem os casos em apreço, a mera alienação do imóvel antes de decorrido o prazo de três anos contados a partir de 1 de janeiro de 2014 não faz caducar a isenção.

Todavia, para estes casos, a consolidação do benefício fiscal continua a depender do preenchimento das condições previstas, nos termos do disposto no artigo 8.º, n.º 7, alínea a), e n.º 8, do Regime jurídico aplicável aos FIIAH, na versão aprovada pela Lei n.º 64-A/2008.

Em suma, o que está em causa, é, a não verificação “ab initio”, dos pressupostos de que dependia a isenção, na redação original da Lei n.º 64-a/2008, de 31 de dezembro, que a requerente não logrou provar.

Pelo que os atos de liquidação de IMT e de IS em apreço não merecem qualquer censura, visto que foram emitidos de acordo com as normas vigentes, ora invocadas, e aplicáveis ao caso concreto.

Assim, não tendo sido demonstrada a afetação dos prédios em causa ao arrendamento habitacional e que a alienação foi a única alternativa financeiramente viável para a respetiva rentabilização, não se vê como poderia a aquisição dos prédios pelo “Fundo”, em 2012 e 2013, beneficiar da isenção de IMT e IS, previstas no disposto nos n.os 7 e 8 do artigo 8.º do Regime Jurídico dos FIIAH, pelo que os atos de liquidação de IMT e de IS em apreço não merecem qualquer censura, visto que foram emitidos de acordo com as normas vigentes, ora invocadas, e aplicáveis ao caso concreto.

Assim sendo, não se vislumbra qualquer violação do princípio da certeza e segurança jurídica, nem que a interpretação das normas constantes no artigo 8.º do regime jurídico dos FIIAH na sua versão original (Lei n.º 64-A/2008), no sentido de ser condição necessária e suficiente para atribuição das isenções concedidas no âmbito do IMT e do Imposto do Selo a destinação do imóvel adquirido ao arrendamento habitacional, através da sua efetiva disponibilização para o efeito, possa ser materialmente inconstitucional, por violação dos princípios referentes à liberdade de gestão, propriedade e iniciativa privada, previstos nos artigos 61.º, 62.º e 86.º, da CRP.

Quanto à necessidade de autorização do Ministro das Finanças, nos termos do n.º 3 do art.º 14.º do EBF, se os bens forem alienados ou lhes for dado outro destino, sob pena do benefício fiscal ficar sem efeito, é de referir que no relatório da inspeção tributária em apreço apenas se transcreveu o teor do artigo, não havendo nenhuma alegação no sentido de que no caso concreto a ausência de tal autorização constituiria fundamento do ato tributário de liquidação.

Da ilegalidade das liquidações de juros compensatórios

Alega a Requerente que não existiu retardamento de IMT e de IS, nem merece qualquer censurabilidade a conduta da entidade gestora do Fundo ou da Requerente, pelo que deverá ser declarada a ilegalidade da respetiva liquidação de juros compensatórios.

Ora, no caso sub judice, os factos descritos permitem-nos igualmente concluir que a conduta é- censurável e que não se verifica qualquer causa de exclusão da ilicitude ou da culpa. É de referir que o relatório identifica claramente as correções efetuadas, bem como a conduta que o sujeito passivo deveria ter e não teve. Importa, no entanto, salientar que, como vem sendo entendido pelo STA, a liquidação de juros compensatórios não tem carácter sancionatório (ao contrário das coimas aplicadas em processo de contra ordenação) dado que “O fim dos juros compensatórios é reparar os prejuízos sofridos pelo Estado com o atraso da liquidação do imposto” (vide Ac. STA de 29-01-1992, Ap. ao DR de 30-12-1993 citado por Diogo Leite Campos, Benjamim Rodrigues e Jorge Lopes de Sousa, in Lei Geral Tributária anotada, 3ª ed.,Set. 2003, Vislis, pág. 168).

Fica assim demonstrada a improcedência da argumentação referente à fundamentação quanto à censurabilidade da conduta, e bem assim a legalidade dos juros compensatórios.

Do pagamento voluntário e dos juros indemnizatórios

A Requerida alega que:

“Por tudo quanto supra se disse, entende- se não enfermarem os atos de liquidação de qualquer vício que deva ditar a sua anulação.

O citado n.º 14 do art.º 8.º do Regime Tributário dos FIIAH não alterou a ratio das isenções consagradas. Limitou-se a densificar o conceito, em termos não inovadores e estabelecendo um prazo adequadamente largo para que não ficassem feridos os princípios da segurança jurídica e da proteção da confiança.

 

5. Matéria de Direito

A Requerente alega para pedir a anulação das liquidações referidas em 1.1. do Relatório da presente decisão arbitral:

- a incoerência de fundamentação dos atos de liquidação de IMT e IS face ao relatório de inspeção tributária;

- a falta de fundamentação da liquidação do IMI de 2013 por falta de identificação dos imóveis;

- a ilegalidade das correções ao IMT, IS e IMI efetuadas pelos serviços de inspeção tributária

Da errónea interpretação do Regime Jurídico dos FIIAH e a violação do princípio da legalidade e da confiança jurídica;

 

5.1 Da incoerência de fundamentação dos atos de liquidação de IMT e IS face ao relatório de inspeção tributária

A Requerente alega relativamente aos atos de liquidação do IMT, emitidos por Ofícios do Serviço de Finanças de Lagos com os n.os..., ... e ..., datados de 29.09.2022, que a fundamentação de facto e de direito não é coincidente com a fundamentação de facto e de direito expressa no Relatório de Inspeção Tributária, facto esse que equivale a falta de fundamentação do ato tributário que determina a sua anulação.

Considerando o disposto entre outros, no artigo 77.º, n.º 2, da LGT há um dever de fundamentação dos atos tributários.

Aderimos à posição defendida pela AT, nos artigos 40.º a 48.º da Resposta, uma vez que foi dado à Requerente um conhecimento claro da motivação da liquidação, de modo a permitir que fizesse uma opção consciente entre a aceitação da legalidade do ato ou a sua impugnação, como se constata através do presente pedido de pronúncia do tribunal arbitral.

Por outro lado, a Requerente sempre poderia requerer, nos termos do artigo 37.º do CPPT,

a notificação dos requisitos que tenham sido omitidos ou a passagem de certidão que os contenha.

 

Assim, entende este Tribunal Arbitral que não há razão para anular as liquidações de IMI com o fundamento invocado pela Requerente.

 

5.2. Da alegada falta de fundamentação da liquidação do IMI de 2013 por falta de identificação dos imóveis

A Requerente peticionou a anulação do ato de liquidação de IMI n.º 2013... de 16-09-2021 relativa aos imóveis situados no Município de Albufeira no montante de 8.249,15, alegando que este está inquinado de vício de forma, nos termos do disposto no artigo 268.º, n.º 3, da Constituição da República Portuguesa e artigo 77.º da LGT, razão pela qual deve ser anulado em conformidade, de acordo com o artigo 163.º do Código de Procedimento Administrativo.

O cumprimento do dever de fundamentação dos actos tributários a que a AT se encontra vinculada visa permitir aos sujeitos passivos a aferição da legalidade desses mesmos actos, de forma que estes consigam decidir-se entre a sua aceitação ou a sua impugnação pela via administrativa ou judicial, conforme referem Diogo Leite de Campos, Benjamim Silva Rodrigues e Jorge Lopes de Sousa, in Lei Geral Tributária - Anotada e Comentada, 2012, Encontro da Escrita, pp. 675 e seguintes.

O cumprimento do dever de fundamentação pela AT e a análise dos requisitos mínimos que o devem conformar tem sido concretizado pela jurisprudência referindo-se, por exemplo, no acórdão do STA de 12 de Março de 2014, proferido no âmbito do processo n.º 01674/1, que:

“ (…) como é consensual na jurisprudência, as exigências de fundamentação não são rígidas, variando de acordo com o tipo de acto e as circunstâncias concretas em que este foi proferido: o acto estará suficientemente fundamentado quando o administrado, colocado na posição de destinatário normal - o bonus pater familiae de que fala o art. 487º nº 2 do C.Civil – possa ficar a conhecer as razões factuais e jurídicas que estão na sua génese, de modo a permitir-lhe optar, de forma esclarecida, entre a aceitação do acto ou o accionamento dos meios legais de impugnação, e de molde a que, nesta última circunstância, o tribunal possa também exercer o efectivo controle da legalidade do acto, aferindo do seu acerto jurídico em face da sua fundamentação contextual”.

Significa isto que a fundamentação, ainda que feita por remissão ou de forma sucinta, não pode deixar de ser clara, congruente e encerrar os aspectos de facto e de direito que permitam conhecer o itinerário cognoscitivo e valorativo prosseguido pela Administração na determinação do acto. E, por isso, a insuficiência, a obscuridade e a contradição da motivação equivalem a falta de fundamentação (art. 125º nº 2 do CPA), por impedirem uma cabal apreensão do iter volitivo e cognoscitivo que determinou a Administração a praticar o acto com o sentido decisório que lhe conferiu.

No que se refere à fundamentação de direito, a jurisprudência deste Tribunal tem decidido que para que a mesma se considere suficiente não é sempre necessária a indicação dos preceitos legais aplicáveis, bastando a referência aos princípios pertinentes, ao regime jurídico ou a um quadro legal bem determinado, devendo considerar-se o acto fundamentado de direito quando ele se insira num quadro jurídico. Como se dá nota no acórdão do Pleno desta Secção de 25/03/93, no proc. nº 27387, o dever de fundamentação fica assegurado sempre que, mau grado a inexistência de referência expressa a qualquer preceito legal ou princípio jurídico, a decisão se situe num determinado e inequívoco quadro legal, perfeitamente cognoscível do ponto de vista de um destinatário normal, concluindo-se, assim, que haverá fundamentação de direito sempre que, face ao texto do acto, forem perfeitamente inteligíveis as razões jurídicas que o determinaram”.

Quanto ao desvalor jurídico associado aos eventuais vícios de forma gerados pelo incumprimento daqueles requisitos de fundamentação, afirmam Diogo Leite de Campos, Benjamim Silva Rodrigues e Jorge Lopes de Sousa, in Lei Geral Tributária comentada e anotada, 3.ª ed., Vislis, 2003, pp. 381-382, que “deverá ter-se em conta que os vícios poderão considerar-se sanados quando se demonstrar que, apesar da imprecisão ou omissão ou irregularidade do conteúdo do acto, foi atingido o objectivo que se visava atingir com a imposição deste conteúdo, designadamente que o seu destinatário se apercebeu correctamente do seu exacto alcance. O STA tem vindo a entender uniformemente, no que concerne a vícios de forma de actos administrativos, que as irregularidades devem considerar-se como não essenciais desde que seja atingido o objectivo visado pela lei com a sua imposição”.

No presente processo, os atos de liquidação foram emitidos na sequência de um procedimento de inspeção e a Requerente foi notificada para exercer o seu direito de audição quanto ao projeto de correções resultantes da ação de inspeção, e foi indicado expressamente no ato de notificação das correções resultantes da ação de inspeção que: “A liquidação deve-se ao facto de não terem sido cumpridos os requisitos de enquadramento no disposto no nº 14 do artigo 8º do artigo 104° da Lei supra referida, nomeadamente, o arrendamento habitacional, tendo o imóvel sido alienado em 2015-06-29. Caducou assim, naquela data, a isenção concedida, sem que tenha sido requerida a liquidação no prazo de 30 dias contados dessa data, conforme preceitua o n° 15 d o art° 8° d a Lei 64-A/2008. A presente notificação teve origem no relatório de inspeção tributária, realizada pela Direção de Finanças de Lisboa, concluído em 2018/12/11, do qual foi essa entidade notificada, nos termos dos artigos 60° da Lei Gerai tributária (LGT) e do Regime Complementar do Procedimento de Inspeção Tributária e Aduaneira (RCPITA), para o exercício de audição prévia, em 2018/11/07(Reg. CTT n° RC...PT), não o tendo exercido, nem solicitado, no decurso da ação inspetiva, a respetiva liquidação de IMT/Selo em falta, com vista à sua regularização voluntária”.

Assim, o cumprimento do dever de fundamentação sempre terá de ter em consideração o contexto no qual os atos foram praticados, cabendo efetuar a devida articulação entre os actos de liquidação de IMI e o relatório de inspeção tributária do qual consta a análise dos factos e do seu enquadramento legal subjacente às correções meramente aritméticas efetuadas à matéria tributável pela AT e que estão na base da emissão daqueles actos.

No Relatório de Inspeção Tributária, relativamente ao apuramento do IMI em falta, é mencionado para cada um dos imóveis a freguesia, o respetivo artigo, o valor patrimonial tributário, o valor isento, a taxa aplicável, a coleta já calculada e a coleta a efetuar. Assim, a Requerente teve a possibilidade de conhecer quais os imóveis em questão, o valor da coleta subjacente, dado que a relação e descrição completa dos imóveis que integravam cada município constava do relatório de Inspeção Tributária que já era do seu conhecimento.

Assim, os atos de liquidação de IMI não são como a Requerente alega “claramente insuficientes quanto à necessária fundamentação”.

 

Conclui assim, Tribunal Arbitral pela inexistência de violação do dever de fundamentação relativamente aos atos especificamente impugnados, pelo que improcede o pedido da Requerente em relação à alegada falta de fundamentação da liquidação do IMI de 2013 por falta de identificação dos imóveis.

 

5.3. Da ilegalidade das correções ao IMT, IS e IMI efetuadas pelos serviços de inspeção tributária

5.3.1. A legislação

A Lei n.º 64-A/2008, de 31 de dezembro, nos artigos 102.º a 104, aprovou o regime especial aplicável aos FIIAH. O artigo 8.º desse regime especial estabeleceu o respetivo regime tributário, sendo o n.º 7 e o n.º 8 dessa disposição dedicados ao IMT e ao IS, respetivamente:

7 - Ficam isentos do IMT:

a) As aquisições de prédios urbanos ou de fracções autónomas de prédios urbanos destinados exclusivamente a arrendamento para habitação permanente, pelos fundos de investimento referidos no n.º 1;

b) As aquisições de prédios urbanos ou de fracções autónomas de prédios urbanos destinados a habitação própria e permanente, em resultado do exercício da opção de compra a que se refere o n.º 3 do artigo 5.º pelos arrendatários dos imóveis que integram o património dos fundos de investimento referidos no n.º 1.

8 - Ficam isentos de imposto do selo todos os actos praticados, desde que conexos com a transmissão dos prédios urbanos destinados a habitação permanente que ocorra por força da conversão do direito de propriedade desses imóveis num direito de arrendamento sobre os mesmos, bem como com o exercício da opção de compra previsto no n.º 3 do artigo 5.º.”

O artigo 235.º da Lei n.º 83-C/2013, de 31 de dezembro, aditou ao Regime Tributário dos FIIAH (artigo 8.º) os números 14 a 16:

14 - Para efeitos do disposto nos n.os 6 a 8, considera-se que os prédios urbanos são destinados ao arrendamento para habitação permanente sempre que sejam objeto de contrato de arrendamento para habitação permanente no prazo de três anos contados do momento em que passaram a integrar o património do fundo, devendo o sujeito passivo comunicar e fazer prova junto da AT do respetivo arrendamento efetivo, nos 30 dias subsequentes ao termo do referido prazo.

15 - Quando os prédios não tenham sido objeto de contrato de arrendamento no prazo de três anos previsto no número anterior, as isenções previstas nos n.os 6 a 8 ficam sem efeito, devendo nesse caso o sujeito passivo solicitar à AT, nos 30 dias subsequentes ao termo do referido prazo, a liquidação do respetivo imposto.

16 - Caso os prédios sejam alienados, com exceção dos casos previstos no artigo 5.º, ou caso o FIIAH seja objeto de liquidação, antes de decorrido o prazo previsto no n.º 14, deve o sujeito passivo solicitar igualmente à AT, antes da alienação do prédio ou da liquidação do FIIAH, a liquidação do imposto devido nos termos do número anterior. »

Por sua vez, o art.º 236.º da Lei n.º 83-C/2013, de 31 de dezembro estabeleceu o seguinte regime transitório no âmbito do regime especial aplicável aos FIIAH:

O artigo 236.º da Lei n.º 83-C/2013, de 31 de dezembro estabeleceu o seguinte regime transitório no âmbito do regime especial aplicável aos FIIAH:

1 - O disposto nos n.os 14 a 16 do artigo 8.º do regime especial aplicável aos FIIAH e SIIAH, aprovado pelos artigos 102.º a 104.º da Lei n.º 64-A/2008, de 31 de dezembro, é aplicável aos prédios que tenham sido adquiridos por FIIAH a partir de 1 de janeiro de 2014.

2 - Sem prejuízo do previsto no número anterior, o disposto nos n.os 14 a 16 do artigo 8.º do regime especial aplicável aos FIIAH e SIIAH, aprovado pelos artigos 102.º a 104.º da Lei n.º 64-A/2008, de 31 de dezembro, é igualmente aplicável aos prédios que tenham sido adquiridos por FIIAH antes de 1 de janeiro de 2014, contando-se, nesses casos, o prazo de três anos previsto no n.º 14 a partir de 1 de janeiro de 2014.

 

Vejamos

 

1. O legislador determinou, através da Lei n.º 64-A/2008, de 31.12 (LOE 2009), nos art.os 102.º a 104.º, o regime jurídico aplicável dos FIIAH e das SIIAH o qual tinha por objetivo não só a sua criação, mas também a definição de um regime tributário especialmente favorável que lhes permitisse cumprir a função de apoio às famílias e ao sistema bancário face a problemas emergentes de contratos de crédito à habitação, designadamente, o incumprimento contratual decorrente de vicissitudes económicas (situação económica difícil dos agregados familiares, sobre-endividamento e do aumento de taxas de juro), e também como forma de evitar o aumento do crédito “mal parado”.

2. Com este regime, o legislador visou a criação das condições necessárias à colocação de imóveis no mercado de arrendamento, e permitir às famílias oneradas com prestações dos empréstimos à sua habitação própria e permanente, alienar o imóvel ao Fundo (e de aí permanecerem), assim vendo reduzidos os seus encargos por contrapartida de uma renda de valor inferior à prestação que antes tinham, com a possibilidade de mais tarde exercerem a opção (re)compra do mesmo.

Os Fundos constituídos segundo os art.os 2.º a 6.º desse regime, beneficiavam, em contrapartida, de um desagravamento fiscal através do reconhecimento de “enquanto se mantiverem na carteira do FIIAH, os prédios urbanos destinados ao arrendamento para habitação permanente que integrem o património dos fundos de investimentos referidos no n.º 1” (artigo 8.º n.º 6 do regime jurídico dos FIIAH), redação que se manteve inalterada com a LOE 2014.

O princípio base daquele n.º 8 seria fomentar operações com prestações entre as partes em tudo semelhantes ao leaseback, ou seja, uma sucessão de venda/arrendamento/recompra, ao FIAHH/SIAHH, com benefícios fiscais na venda e na recompra.

3. O n.º 7 do regime tributário dos FIIAH determinou que ficam isentos do IMT as aquisições de prédios urbanos ou de frações autónomas de prédios urbanos destinados exclusivamente a arrendamento para habitação permanente.

A isenção da aquisição de imóveis pelos FIIAH está subordinada à condição de os prédios urbanos ou a frações autónomas de prédios urbanos adquiridos sejam “destinados exclusivamente a arrendamento para habitação permanente”. E, o destino a dar aos imóveis adquiridos pelos FIIAH tem de ser um destino efetivo não bastando a simples declaração de que o prédio se destina a arrendamento.

4. E, a AT na Resposta menciona ainda que “tal interpretação está conforme ao entendimento expresso no Acórdão n.º 175/2018, do Tribunal Constitucional, que em parte a seguir se transcreve:

“... no que toca aos benefícios fiscais consagrados na alínea a) do n.º 7 e no n.º 8 do artigo 8.º do Regime jurídico aplicável aos FIIAH, na versão aprovada pela Lei n.º 64-A/2008, de 31 de dezembro isenções de IMT e Imposto de selo, a causa do benefício só́ pode residir na efetiva disponibilização do imóvel adquirido para arrendamento habitacional.

A atividade fomentada, isto é, a atividade cuja realização aquelas isenções se propõem incentivar não é a mera aquisição do imóvel, ainda que acompanhada da declaração do propósito de o afetar ao arrendamento habitacional; é sim a colocação no mercado de arrendamento habitacional do imóvel adquirido, sendo essa, em definitivo, a atividade cujo exercício se pretendeu estimular através da concessão dos referidos benefícios.”

5. O n.º 2 do artigo 236.º da Lei n.º 83-C/2013, de 31 de dezembro, foi objeto de apreciação pelo Tribunal Constitucional nos acórdãos n.º 175/2018, de 5 de abril de 2018, Processo n.º 175/2017 e 246/2017; no acórdão n.º 489/2018, de 9 de outubro de 2018, Processo n.º 1014/16; e no acórdão n.º 622/2019, de 23 de outubro de 2019, Processo n.º 915/2018, e declarou:

“julgar inconstitucional, por violação do princípio da proteção da confiança, decorrente do artigo 2.º da Constituição, a norma decorrente do n.º 2 do artigo 236.º da Lei n.º 83-C/2013, de 31 de dezembro, em conjugação com o n.º 16 do artigo 8.º do Regime jurídico aplicável aos FIIAH e às SIIAH, na versão decorrente das alterações levadas a cabo pela aludida Lei, de acordo com a qual as isenções em sede de IMT e de Imposto de Selo previstas nos n.os 7, alínea a), e 8, daquele artigo 8.º caducam se o imóvel adquirido for alienado no prazo de três anos, contados de 1 de janeiro de 2014”.

6. E, refere a AT na Resposta: “Atento ao juízo de inconstitucionalidade e aos fundamentos do mencionado acórdão do TC, a tributação assente neste aditamento (Lei n.º 83-C/2013, de 31.12) e neste regime transitório (art.º 236.º, n.º 2 da aludida Lei), é violadora do Art.º 103.o n.º 3 da CRP e do princípio da tutela da confiança jurídica, uma vez que os n.os 14 a 16.º do Art.º 8.º do Regime dos FIIAH vem alargar o espectro da incidência do IMT e IS, já que impõe novos requisitos necessários à concessão das isenções, pelo que só deverão ter reflexo nas aquisições de imóveis a partir de 01.01.2014.

Quanto às aquisições anteriores a 01.01.2014, onde se incluem os casos em apreço, a mera alienação do imóvel antes de decorrido o prazo de três anos contados a partir de 1 de janeiro de 2014 não faz caducar a isenção.

7. Todavia, para estes casos, a consolidação do benefício fiscal continua a depender do preenchimento das condições previstas, nos termos do disposto no artigo 8.º, n.º 7, alínea a), e n.º 8, do Regime jurídico aplicável aos FIIAH, na versão aprovada pela Lei n.º 64-A/2008.

Aliás, tal exigência consta do entendimento do TC, supra exposto, como se lê no ponto 17 do Acórdão do TC no 175/2018 diz que “...os fundos imobiliários realizaram um conjunto de investimentos na aquisição de imóveis, na legítima convicção de que os benefícios fiscais associados a tais aquisições apenas caducariam se:1. o imóvel adquirido não viesse a ser disponibilizado para arrendamento habitacional após a respetiva aquisição (...) e/ou 2. a fração adquirida acabasse por ser alienada por ausência de qualquer outra alternativa financeiramente viável para a respetiva rentabilização”.

8. O TC considerou que a simples aplicação aos prédios adquiridos antes de 01.01.2014 dos nºs. 14 a 16 do artigo 8.º do regime dos FIIAH era inconstitucional por violação do princípio da confiança, sendo que o prazo máximo de 3 anos não podia sem mais ser aplicado.

Porém não pode, como pretende a Requerente, concluir-se que não seja necessário existir efetivamente qualquer arrendamento até alienação dos imóveis em causa, já que o Tribunal Constitucional apenas afastou a aplicação do prazo e dos seus efeitos.

9. O Tribunal Administrativo, por acórdão proferido pelo Pleno da Secção do Contencioso Tributário, em 24-11-2021, no Processo n.º 023/21.6BALSB decidiu:

“A questão que cumpre apreciar é, afinal, a de saber se é ou não correcta a interpretação formulada pela AT e acolhida pela decisão arbitral recorrida, de que dos n.ºs 6, 7 e 8 do artigo 8.º do regime jurídico do FIIAH (ou seja, na sua redacção original deste artigo 8.º dos FIIAH) já resulta a caducidade dos benefícios fiscais aí previstos (isenção de IMT, IMI e IS) caso os imóveis adquiridos ao abrigo daquele regime jurídico venham a ser alienados sem nunca terem sido arrendados.

No essencial, o que há a interpretar é a expressão “destinados ao arrendamento para habitação permanente”, que é aquela que se repete nas três normas e que assegura a isenção de IMT e de IS no momento do facto tributário aquisitivo, bem como a isenção de IMI pelo período em que estes imóveis “se mantiverem na carteira do FIIAH”.

Para a AT “destinados” significa neste caso que esse tem de ser um fim alcançado por aqueles imóveis antes da respectiva alienação, sob pena de caducidade do benefício. A AT defende desde o RIT, com fundamento no n.º 3 do artigo 14.º do EBF, que a alienação dos imóveis sem que os mesmos tenham sido objecto de arrendamento determina a caducidade do benefício fiscal. E os FIIAH entendem que o disposto neste artigo do EBF só poderia aplicar-se ao caso se expressamente se tivesse previsto essa condição no regime jurídico em causa, em especial no referido artigo 8.º aqui em análise.

Porém, carece de fundamento jurídico a tese de que estamos perante um “benefício fiscal incondicionado”, pois tudo aponta para que este seja um benefício fiscal condicionado, do tipo previsto no n.º 2 do artigo 14.º do EBF (i. e., condicionado ao cumprimento do fim para o qual este benefício fiscal foi criado e que, segundo o relatório do OE/2009, era o de apoiar as famílias oneradas com as prestações dos empréstimos à habitação) e que sem a verificação dessa condição, que tem natureza resolutiva, o benefício fiscal caduque, impondo-se a recuperação dos montantes da despesa fiscal indevidamente suportada pelo Estado.

Para os Representantes dos FIIAH aquele benefício fiscal tinha aposta uma condição que teria de reconduzir-se a uma obrigação de meios e não de resultados, ou seja, para cumprir a condição bastaria que os imóveis do Fundo fossem disponibilizados para arrendamento, mas não podia exigir-se que fossem efectivamente arrendados, pois a condição nesse caso deixaria de depender apenas de obrigações que pudessem ser impostas ao beneficiário e ficaria na dependência de condições de mercado, o que não tem sentido no âmbito da construção de um benefício fiscal. E por essa razão, esse nunca poderia ter sido o sentido original da norma, pois ela nunca poderia ser interpretada assim por um “destinatário normal”.

E acrescentam ainda que a imposição de uma autorização prévia do Ministro das Finanças para a alienação, sob cominação de caducidade do benefício fiscal constitui um “aditamento ao tipo normativo legal”, por via interpretativa administrativa que viola o princípio da legalidade fiscal, na dimensão do princípio da tipicidade, ou seja, a AT impôs uma condição que só o legislador poderia exigir, atento o facto de este ser um domínio de reserva de competência legislativa (artigo 103.º, n.º 2 e 165.º, n.º 1, al. i da CRP).

Vejamos o sentido que se pode extrair da norma a partir dos elementos da interpretação jurídica. 2.2. O elemento literal diz-nos que estamos efectivamente perante um benefício fiscal condicionado. É isso que se infere, claramente, dos pressupostos normativos em causa:

2.3. E o elemento histórico aponta no mesmo sentido, como resulta do texto que serve de base à proposta do Orçamento do Estado para 2009

(…) Daqui resulta que a finalidade deste benefício fiscal não era a criação de fundos de investimento imobiliário e sim a colocação de imóveis no mercado de arrendamento, bem como o apoio transitório às famílias oneradas com os empréstimos, permitindo-lhes “converter” o crédito à habitação em arrendamento para habitação permanente com condições mais favoráveis.

E tanto assim é que o benefício foi estruturado sob uma “dupla despesa fiscal”: a despesa decorrente das isenções de IMT, IS e IMI em benefício dos fundos e a despesa decorrente da “conversão do empréstimo em arrendamento” em benefício das pessoas singulares que passariam a arrendatárias dos imóveis transmitidos a esses fundos e para, para esse efeito, beneficiariam de isenção de mais-valias no momento da transmissão e de uma dedução à colecta de IRS correspondente a uma parte do valor das rendas.

Trata-se, por conseguinte, de um benefício fiscal complexo, que se tem de interpretar e analisar de forma conjunta e estruturada e não segmentária, como propõe o Recorrente, bem como de um benefício fiscal dinâmico, que pressupõe operações de conversão de empréstimos em arrendamentos e não um benefício fiscal estático a favor dos FIIAH, em razão da sua mera constituição associada a uma atitude passiva no respeitante à afectação dos imóveis ao arrendamento.

O elemento teleológico da interpretação normativa não terá aqui um valor determinante para a fixação do sentido das normas em apreço, mas dele podemos, ainda assim retirar alguns contributos válidos. Com efeito, o enquadramento deste regime jurídico no respectivo contexto socioeconómico de 2008-2009 permite compreender que, tal como resultou do elemento histórico, a finalidade de interesse público a prosseguir com este regime fiscal mais favorável era a de assegurar a continuidade do acesso à habitação das famílias que se viram em situação económica difícil no contexto da crise financeira internacional, originária da crise do subprime, que tinha tido início em 2007, nos EUA.

O objectivo do regime jurídico era – como já explicámos antes – apoiar estas famílias através de um regime de benefícios fiscais por via do IRS e por via da conversão dos empréstimos em arrendamentos graças ao incentivo instituído a favor dos FIIAH. Ora, se estes fundos não chegassem a arrendar os imóveis ficaria frustrado o objectivo desta política económica e fiscal e, mais do que isso, no que no aqui releva em termos jurídicos, tornar-se-ia injustificada a despesa fiscal a favor de certas entidades. Também por essa razão este seria um resultado interpretativo inadmissível à luz do disposto no n.º 3 do artigo 14.º da LGT, que impõe uma definição clara dos objectivos dos benefícios fiscais.
E não podemos deixar de concluir que, a admitir-se que as isenções de IMI, IMT e IS pudessem não caducar nos casos em que os imóveis adquiridos pelos FIIAH viessem a ser alienados sem nunca terem sido arrendados, o mais provável é que se produzisse um resultado inverso àquele que era visado pelo benefício fiscal, permitindo que fundos imobiliários utilizassem a crise e o benefício fiscal para obter rendimentos decorrentes de uma valorização dos imóveis no mercado à custa do sacrifício do direito à habitação dos titulares originários desses bens onerados com os respectivos empréstimos.

É por isso que, teleologicamente, também não se afigura juridicamente razoável a interpretação adoptada no acórdão fundamento.

2.5. Assim, pelos fundamentos antes enunciados, cumpre concluir que as normas dos artigos 8.º, n.ºs 6, 7 e 8 do regime jurídico dos FIIAH, na sua redacção original, devem ser interpretadas no sentido de que instituíram um benefício fiscal cuja finalidade primeira era a garantia do direito à habitação e que visava apoiar os titulares de empréstimos à habitação na conversão destes encargos em regimes de arrendamento, para o que instituiu um benefício fiscal complexo, do qual faziam parte, como estímulo à dinamização daquele mercado de arrendamento, as isenções de IMI, IMT e IS a favor dos FIIAH. Estas isenções fiscais, contudo, estavam condicionadas à destinação dos imóveis integrados naqueles fundos ao regime do arrendamento. Daqui decorria a caducidade daqueles benefícios – leia-se isenções fiscais –, ex vi do disposto no n.º 2 do artigo 14.º do EBF, sempre que os imóveis viessem a ser alienados sem terem sido efectivamente afectos a arrendamento para habitação permanente.

A referência que a AT faz à necessidade de autorização do Ministro das Finanças para efeitos de obstar àquele efeito de caducidade do benefício é apenas uma forma de mostrar um meio ao dispor do sujeito passivo para tentar evitar os efeitos da caducidade do benefício, explicando, por exemplo, a razão pela qual apesar de ter envidado todos os esforços, não foi possível destinar o imóvel ao arrendamento antes da sua alienação.

Esta faculdade/direito de comunicação prévia ao Ministro das Finanças com o intuito de obter uma autorização que obstasse ao efeito da caducidade afigura-se uma faculdade do sujeito passivo e não a criação de um pressuposto normativo novo, como alega o Recorrente. Como já explicámos, o benefício fiscal tinha em si uma natureza condicionada (funcionalizada à realização dos fins do arrendamento) e uma eficácia resolutiva em caso de não cumprimento da condição. É por isso que, como também se explica no acórdão recorrido, a necessidade de cumprimento da condição (i. e., o arrendamento prévio do imóvel) já decorria do disposto no segmento normativo interpretativo resultante da conjugação dos n.ºs 6, 7 e 8 do artigo 8.º do FIIAH com o n.º 2 do artigo 14.º da LGT, porquanto aí se dispõe expressamente que os titulares de benefícios fiscais são sempre obrigados a revelar à AT os pressupostos em que repousa o benefício ou a cumprir as obrigações previstas na lei, sob pena de esses benefícios ficarem sem efeito. Assim, tendo o benefício como pressuposto legal a destinação do imóvel a arrendamento habitacional permanente, o FIIAH teria sempre que fazer prova junto da AT do cumprimento daquele pressuposto (da condição legal) ou, em caso de “justo impedimento” (por exemplo, por não ter tido resposta do mercado, ou seja, por nenhum interessado ter apresentado proposta para arrendar o imóvel), de solicitar uma autorização para promover a alienação do bem apesar de não estar cumprida a condição. Caso contrário, a ter lugar a alienação do imóvel sem se ter preenchido a condição (sem o bem ter sido arrendado) e sem se ter obtido a autorização, os benefícios fiscais (ou seja, as isenções de IMT, IS e IMI) teriam de considerar-se sem efeito, o mesmo é dizer que aqueles benefícios fiscais caducariam”.

Acórdão que decidiu fixar a seguinte jurisprudência: “As isenções fiscais dos n.ºs 6 (IMI), 7 (IMT) e 8 (IS) do artigo 8.º do regime jurídico dos FIIAH, na sua redacção original, derivada da Lei 64-A/2008, de 31/12 (LOE 2009), devem ser interpretadas no sentido de que estão sujeitas à condição resolutiva de efectiva destinação do imóvel a arrendamento para habitação permanente, ficando aqueles benefícios fiscais sem efeito se o imóvel vier a ser alienado sem ter sido arrendado ou sem que o Ministro das Finanças autorize a sua alienação”.

 

Pelo exposto entende este Tribunal Arbitral que deve ser acolhido o argumento da AT constante do RIT no sentido de que o regime de isenção não se aplica à Requerente e que nada se pode censurar às liquidações realizadas pela AT.

 

Assim, improcedem os pedidos formulados pela Requerente.

 

5.4. Da ilegalidade das liquidações de juros compensatórios

Peticionou também a Requerente a declaração de ilegalidade dos actos de liquidação de juros compensatórios, por não se verificarem os respetivos pressupostos legais. Nos termos do artigo 35.º, n.º 1, da LGT, “são devidos juros compensatórios quando, por facto imputável ao sujeito passivo, for retardada a liquidação de parte ou da totalidade do imposto devida ou a entrega de imposto a pagar antecipadamente, ou retido ou a reter no âmbito da substituição tributária.”. Decorre deste artigo, no que importa ao presente caso, que os juros compensatórios serão devidos pelo sujeito passivo em função da verificação cumulativa de dois requisitos. Um primeiro, materializado no atraso ou retardamento da liquidação de imposto e um segundo materializado na imputabilidade de tal atraso por comportamento culposo do sujeito passivo, seja a título de dolo seja a título de negligência.

O atraso na liquidação de impostos verificou-se porque a Requerente não tomou a iniciativa da liquidação do IMT, do IS e do IMI, após se ter verificado a caducidade das isenções daqueles impostos que haviam sido concedidas ao abrigo do regime jurídico dos FIIAH.

 

Improcede a argumentação da Requerente de que as liquidações de juros compensatórios seriam ilegais, uma vez que as mesmas foram efetuadas em estrito cumprimento da respectiva base legal.

 

6. Da restituição da quantia paga a título de impostos e juros indemnizatórios

Quanto à peticionada restituição da quantia total paga a título de impostos, acrescida de juros indemnizatórios, a sua apreciação fica integralmente prejudicada pelo exposto acima.

 

7. Decisão

a) Julgar improcedente o pedido de pronúncia arbitral;

b) Condenar a Requerente nas custas do processo.

 

8. Valor do Processo

Fixa-se o valor do processo em € 70.271,93, nos termos do artigo 97º-A, nº 1, al. a), do Código de Procedimento e de Processo Tributário, aplicável por força das alíneas a) e b) do nº 1 do artigo 29º do RJAT e do nº 3 do artigo 3º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária.

 

9. Custas

Fixa-se o valor da taxa de arbitragem em € 2.448,00, nos termos da Tabela I do Regulamento das Custas dos Processos de Arbitragem Tributaria, a pagar pela Requerente, uma vez que o pedido foi julgado improcedente, nos termos dos artigos 12º, nº 2, e 22º, nº 4, ambos do RJAT.

 

Notifique-se

 

Lisboa, 5 de fevereiro de 2024

 

Os Árbitros

 

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(Prof.ª Regina de Almeida Monteiro - Presidente)

 

 

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(Prof. Doutor Rui Miguel de Sousa Simões Fernandes Marrana - Adjunto)

 

 

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(Prof. Doutor Vasco António Branco Guimarães- Adjunto)