Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 868/2019-T
Data da decisão: 2020-09-04   Outros 
Valor do pedido: € 583.822,86
Tema: Contribuição sobre o sector bancário - Contribuição financeira; Incompetência do tribunal arbitral.
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DECISÃO ARBITRAL

 

SUMÁRIO:

O tribunal arbitral é incompetente ratione materiae para a apreciação do litígio que tenha  como objecto a contribuição sobre o sector bancário por se tratar de tributo que reveste a natureza jurídica de contribuição financeira.

 

Acordam em tribunal arbitral

 

I – Relatório

               

1. A...– SUCURSAL EM PORTUGAL, com o número único de pessoa coletiva ... e sede na Rua ..., n.º..., ... e ..., ...-..., Lisboa, sucursal em Portugal do B..., S.A., vem requerer a constituição de tribunal arbitral, ao abrigo do disposto nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), e 10.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, para apreciar a legalidade do indeferimento da reclamação graciosa deduzida contra a autoliquidação da contribuição sobre o sector bancário, referente ao ano de 2018, requerendo ainda a condenação da Autoridade Tributária no pagamento de juros indemnizatórios.

Fundamenta o pedido nos seguintes termos.

 

                               A decisão de indeferimento da reclamação graciosa deduzida contra o acto de autoliquidação da contribuição sobre o sector bancário ignorou praticamente todos os factos e argumentos aduzidos pela Requerente para sinalizar a ilegalidade e inconstitucionalidade da autoliquidação, limitando-se a afirmar a sua discordância genérica sem qualquer justificação plausível, incorrendo no vício de forma por falta de fundamentação e fundamentação incongruente.

A contribuição sobre o sector bancário, com a alteração constante da Lei n.º 7-A/2016, de 31 de Março de 2016, que tornou aplicável a contribuição às sucursais de instituições bancárias residentes na União Europeia, é inconstitucional por violação do princípio da legalidade, na vertente da reserva de lei, uma vez que a taxa e a base tributável foram determinadas por um mero acto do Governo de natureza regulamentar - a Portaria n.º 165-A/2016, de 14 de Junho.

A contribuição sobre o sector bancário é também ilegal por violação do princípio da igualdade tributária, na vertente do princípio da equivalência, uma vez que a receita está consignada ao Fundo de Resolução Português, que financia exclusivamente medidas de resolução de instituições de crédito residentes em Portugal ou entidades sujeitas às medidas de resolução do Banco de Portugal, o que não é o caso de sucursais residentes na União Europeia.

 

Por outro lado, a aplicação da contribuição a uma sucursal de uma instituição bancária residente noutro Estado Membro da União Europeia viola o princípio da proibição de discriminação e a liberdade de estabelecimento, uma vez que as regras de incidência da contribuição preveem a tributação das sucursais sobre o seu passivo «bruto», sem qualquer dedução, enquanto que em relação às entidades com sede em território português a tributação incide sobre o seu passivo «líquido», permitindo a dedução, designadamente relacionada com os seus capitais próprios.

 

Além de que a contribuição sobre o sector bancário não se enquadra em qualquer dos tipos previstos na Directiva 2014/59/UE, que criou um regime harmonizado para a recuperação e resolução de instituições de crédito e estabeleceu critérios legais para a fixação e cálculo das contribuições, o que significa que o regime legal português cria uma contribuição sui generis, não prevista no âmbito da Directiva, criando situações de dupla tributação internacional e de violação da livre concorrência.

 

A Autoridade Tributária, na sua resposta, suscita a excepção da incompetência do tribunal arbitral para conhecer do pedido, porquanto, nos termos do disposto no artigo 2.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março, a Administração Tributária vinculou-se à jurisdição dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD no que se refere à apreciação de pretensões relativas a impostos cuja administração lhes esteja cometida que se encontrem referidas no n.º 1 do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, com excepção de pretensões elencadas nas diversas alíneas desse artigo, não abrangendo os tributos que devam ser qualificados como contribuição e não imposto.

Em sede de impugnação, a Administração alega que o indeferimento da reclamação graciosa se encontra devidamente justificado, à luz do princípio da legalidade, e que os Requerentes entenderam perfeitamente o sentido e alcance da liquidação, como resulta do próprio exercício jurídico-argumentativo que serve de base ao pedido de pronúncia arbitral.

E no que se refere à questão de fundo, sustenta que foi a Lei n.º 55-A/2010, de 31 de Dezembro, que determinou os elementos essenciais da contribuição, nomeadamente no tocante à incidência subjectiva e objectiva e às taxas aplicáveis, deixando para a Portaria n.º 121/2011, de 30 de Março, a densificação dos conceitos relevantes para a determinação da base de incidência. Dessa forma, foi dado cumprimento ao estatuído no artigo 103.º, n.º 2, da Constituição, não se verificando a alegada violação da reserva de lei parlamentar.

Acrescenta a Autoridade Tributária e Aduaneira que importa ainda reter que o objectivo que presidiu à criação da contribuição para o sector bancário foi o de criar um tributo com o duplo propósito de reforçar o esforço fiscal feito pelo sector financeiro e de mitigar de modo mais eficaz os riscos sistémicos que lhe estão associados, assim se evitando que sejam os contribuintes a suportar as perdas e os encargos gerados pelo sector bancário, não havendo motivo para considerar verificada a violação do princípio da equivalência, entendido como um meio de impedir que se introduzam nos tributos comutativos diferenciações alheias ao custo ou ao benefício.

 

Deve ainda ser considerado que o cálculo da base de incidência da contribuição sobre o sector bancário não toma como ponto de partida o valor total do passivo deduzido do valor dos capitais próprios - como se pretende fazer crer - , mas antes o valor do passivo deduzido do valor dos elementos que, embora fazendo parte integrante do passivo que figura no balanço, têm características de capital próprio, sendo assim de refutar a ideia de que há um alargamento da base tributável das sucursais.

 

Termina a Autoridade Tributária e Aduaneira defendendo que, nestes termos, não se detecta nos normativos que constituem o regime jurídico da contribuição sobre o sector bancário qualquer tratamento desfavorável das sucursais de instituições de crédito com sede em Estados Membros da União Europeia susceptível de violar a liberdade de estabelecimento consagrada no artigo 49.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia.

 

2. No seguimento do processo foi determinada a audição da Requerente sobre a matéria de excepção, que veio a pronunciar-se, em síntese, nos seguintes termos.

 

O artigo 2.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março, deve ser interpretado no sentido de que o âmbito da jurisdição arbitral abrange a apreciação das pretensões relativas a tributos cuja administração esteja cometida à Autoridade Tributária, com excepção dos casos enunciados nas alíneas do referido artigo 2.º, abrangendo, portanto, também as pretensões relativas a "contribuições" por ela administradas, como sucede com a contribuição em causa nos presentes autos.

 

 A interpretação do artigo 2.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março, que pretendesse restringir o âmbito da jurisdição arbitral às pretensões relativas a impostos, mesmo que estejam em causa outros tributos cuja administração seja conferida por lei à Autoridade Tributária, seria inconstitucional, por violação do princípio da igualdade, conjugado com o princípio da tutela jurisdicional efectiva, com assento nos artigos 13.º  e 20.º da Constituição.

 

Por despacho arbitral de 1 de Agosto de 2020, e em aplicação dos princípios da autonomia do tribunal arbitral na condução do processo, e da celeridade, simplificação e informalidade processuais, foi dispensada a reunião do tribunal arbitral a que se refere o artigo 18.º do RJAT, bem como a apresentação de alegações escritas.

 

3. O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Presidente do CAAD e notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira nos termos regulamentares.

 

Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redação introduzida pelo artigo 228.° da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, o Conselho Deontológico designou como árbitros do tribunal arbitral colectivo os signatários, que comunicaram a aceitação do encargo no prazo aplicável.

 

As partes foram oportuna e devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de a recusar, nos termos conjugados do artigo 11.º, n.º 1, alíneas a) e b), do RJAT e dos artigos 6.° e 7.º do Código Deontológico.

 

Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redação introduzida pelo artigo 228.° da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, o tribunal arbitral colectivo foi constituído em 12 de Março de 2020.

 

O tribunal arbitral foi regularmente constituído e é materialmente competente à face do preceituado nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), e 30.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro.

 

As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão representadas (artigos 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março).

 

O processo não enferma de nulidades e foi invocada a excepção da incompetência do tribunal que será analisada adiante.

 

Cabe apreciar e decidir.

 

II - Fundamentação

 

Matéria de facto

 

4. Os factos relevantes para a decisão da causa que poderão ser tidos como assentes são os seguintes.

 

A)           A Requerente é a sucursal em Portugal do B..., S.A., instituição de crédito de direito luxemburguês, que tem sede e administração efetiva no Luxemburgo;

 

B)           Em 18 de Junho de 2019 procedeu à autoliquidação da Contribuição sobre o Sector Bancário (CSB) referente ao ano de 2018, mediante a submissão da declaração Modelo 26, em que foi apurado um montante a pagar no valor de € 583.822,26;

 

C)           A Requerente procedeu ao pagamento da contribuição devida;

 

D)           Em 31 de julho de 2019, a Requerente deduziu reclamação graciosa contra a autoliquidação da contribuição sobre o sector bancário;

 

E)            Por despacho do Chefe de Divisão do Serviço Central, de 18 de Setembro de 2019, praticado com subdelegação de competência, a reclamação graciosa foi indeferida;

 

F)            Na decisão de indeferimento da reclamação graciosa, o autor do acto manifestou expressa concordância com a informação dos serviços n.º ...-AIR1/2019, que na parte mais relevante se transcreve:

 

G)           Na decisão de indeferimento da reclamação graciosa, o autor do acto manifestou expressa concordância com a informação dos serviços n.º ...-AIR1/2019, que na parte mais relevante se transcreve:

 

21.          Comece-se por referir que não cabe no elenco das atribuições e competências da Administração Tributária ("AT") aferir da conformidade de uma qualquer norma face ao disposto na nossa Lei Fundamental, bem como ao Direito da União Europeia.

Senão vejamos:

22.          A subordinação da AT à Constituição da República Portuguesa ("CRP") significa, desde logo, em geral, o dever de conformação da atividade administrativa, quer tenha ou não conteúdo normativo, pelas normas constitucionais, procurando conferir a máxima efetividade possível aos direitos fundamentais, significando isto, assim, em especial, nomeadamente, que são nulos e não anuláveis todos os atos administrativos ofensivos do conteúdo essencial dos direitos, liberdades e garantias.

23.          Diante desta dimensão do princípio da constitucionalidade imediata impõe-se que a AT esteja ab initio vinculada às normas consagradoras no âmbito de direitos, liberdades e garantias.

24.          Ao invés do que sucede com os tribunais, que têm constitucionalmente o direito e o dever de fiscalização da constitucionalidade das leis, desaplicando-as, caso estejam em contradição com as normas constitucionais, à AT, porém, não é reconhecido este direito de fiscalização prévia, impondo-se antes, como princípio geral, a observância da lei por força do denominado princípio da legalidade.

25.          A AT não é um órgão de fiscalização da constitucionalidade e a submissão desta à lei não visa apenas a proteção dos direitos dos particulares, mas também a defesa e prossecução de interesses públicos.

26.          A concessão ao poder administrativo de ilimitados ou vastos poderes para o controlo da constitucionalidade das leis a aplicar levaria a urna anarquia administrativa, invertendo a relação entre a Lei e a Administração, atentando frontalmente contra o princípio da divisão dos poderes, tal como está consagrado na CRP.

27.          É este o entendimento que, aliás, se encontra maioritariamente firmado, quer na doutrina quer na jurisprudência, no sentido de se recusar, como regra geral, à Administração a competência para desaplicar normas que considere inconstitucionais.

28.          Para Gomes Canotilho, "(...) o princípio básico é o de recusar à administração em geral e aos agentes administrativos em particular qualquer poder de controlo da constitucionalidade das leis, mesmo se dessa aplicação resultar a violação dos direitos fundamentais".

29.          A este propósito, também Jorge Miranda sustenta não ser possível reconhecer à Administração um poder geral de controlo — necessariamente concreto — análogo ao dos tribunais, admitindo, apenas em determinadas situações, deixar àquela uma margem de não aplicação. A razão básica deste entendimento — justifica o autor — repousa na diferença de natureza das duas funções, a jurisdicional e administrativa, e na diversa estrutura dos respetivos órgãos, na necessidade de evitar a concentração do poder no Governo que adviria se se admitisse o reconhecimento aos órgãos da Administração da faculdade de fiscalização da constitucionalidade, e por imperativos de certeza e de segurança jurídica.

30.          Se a nossa Lei Fundamental aponta no sentido da necessária conformação da atividade Administrativa pelos preceitos e princípios constitucionais e se são nulos, e não anuláveis (por conseguinte, não sanáveis) os atos administrativos ofensivos de direitos, liberdades e garantias, têm de ser os tribunais a decidir sobre essa conformação; e têm de ser os tribunais administrativos, e não os órgãos da Administração dita ativa, a apreciar e a não aplicar leis inconstitucionais e a declarar a nulidade ou a anular atos administrativos inconstitucionais.

31.          No mesmo sentido, considera Marcelo Rebelo de Sousa, a propósito do regime jurídico da nulidade no Direito Constitucional português, que tal vício tem de ser apreciado e declarado por um órgão jurisdicional, não existindo a possibilidade de a Administração Pública dita ativa apreciar e não aplicar leis inconstitucionais e declarar a nulidade ou a anular atos administrativos inconstitucionais.

32.          Gomes Canotilho e Vital Moreira consideram que tem constituído solução tradicional e mais conforme ao sistema constitucional aquela segundo a qual, em princípio, a Administração está imediatamente subordinada à lei, não podendo deixar de cumpri-la a pretexto da sua inconstitucionalidade, não dispondo, portanto, de um poder de não aplicação de leis por tal motivo.

Prosseguindo:

33.          Quanto à posição que sobre este assunto tem sido acolhida pela Jurisprudência, veja-se, a título de exemplo, o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo ("STA"), proferido no âmbito do processo n.º  0860/10, de 12 de outubro de 2011, onde a propósito de saber se os mesmos motivos que levaram o legislador à dispensa da reclamação graciosa prévia quando existam orientações genéricas emitidas pela AT, justifica também a dispensa quando o interessado pretenda impugnar a autoliquidação com exclusivo fundamento na inconstitucionalidade da norma, se referiu que "nesse caso, e a menos que esteja em causa o desrespeito por normas constitucionais directamente aplicáveis e vinculativas, como as que se referem a direitos, liberdades e garantias (cfr. art. 18.º, n.º 1, da CRP (Diz o art. 18.º da CRP no seu n.º 1. «Os preceitos constitucionais respeitantes aos direitos, liberdades e garantias são directamente aplicáveis e vinculam as entidades públicas e privadas»), a AT não pode recusar-se a aplicar a norma com fundamento em inconstitucionalidade".

34.          Fundamentando esta posição, refere-se ainda no douto Acórdão que "A nosso ver, a AT deverá aguardar a declaração de inconstitucionalidade com força obrigatória geral, a emitir pelo Tribunal Constitucional (TC), nos termos do art. 281.º da CRP. Ê que, como diz Vieira de Andrade, «Este conflito [entre a constitucionalidade e o princípio da legalidade] não pode resolver-se através da prevalência automática do direito constitucional sobre o direito legal. Não é disso que se trata, porque o que está em causa é não a constitucionalidade da lei, mas o juízo que sobre essa constitucionalidade possam fazer os órgãos administrativos. Por um lado, a Administração não é um órgão de fiscalização da constitucionalidade; por outro lado, a submissão da Administração à lei não visa apenas a proteção dos direitos dos particulares, mas também a defesa e prossecução de interesses públicos […]. A concessão ao poder administrativo de limitados poderes para controlo da inconstitucionalidade das leis a aplicar levaria a uma anarquia administrativa, inverteria a relação Lei-Administração e atentaria frontalmente contra o princípio da divisão dos poderes, tal como está consagrado na nossa Constituição» (Direito Constitucional, Almedina, 1977, pág. 270.).No mesmo sentido, João Caupers afirma que «a Administração não tem, em princípio, competência para decidir a não aplicação de normas cuja constitucionalidade lhe ofereça dúvidas, contrariamente aos tribunais, a quem incumbe a fiscalização difusa e concreta da conformidade constitucional, demonstram-no as diferenças entre os artigos 207.º  [hoje, 204.º] e 266.º, n.º 2, da Constituição. Enquanto o primeiro impede os tribunais de aplicar normas inconstitucionais, o segundo estipula a subordinação dos órgãos e agentes administrativos à Constituição e à lei. Afigura-se claro que a diferença essencial entre os dois preceitos decorre exatamente da circunstância de se não ter pretendido cometer à Administração a tarefa da fiscalização da constitucionalidade das leis. O desempenho de tal função, por parte daquela tem de ser visto como excecional» (Os Direitos Fundamentais dos Trabalhadores e a Constituição, Almedina, 1985, pág. 157.). Concluímos, assim, que no Direito Constitucional Português não existe a possibilidade de a Administração se recusar a obedecer a uma norma que considera inconstitucional, substituindo-se aos órgãos de fiscalização da constitucionalidade, a menos que esteja em causa a violação de direitos, liberdades e garantias constitucionalmente consagrados (…).

Destarte,

35.          Fazendo a ponte entre estas considerações, que devem abranger qualquer análise relativa ao Direito da União Europeia, e o caso concreto, parece-nos então de concluir que uma qualquer nossa análise acerca desta questão, tal como nos é suscitada fica desde logo prejudicada.

36.          De referir ainda que, através do Acórdão proferido no âmbito do Processo n o 02340/13.0BELRS 0683/17, de 19-06-2019, o Supremo Tribunal Administrativo se pronunciou sobre a não inconstitucionalidade do regime jurídico da CSB, nos seguintes termos:

"Tendo a Contribuição sobre o Sector Bancário natureza jurídica de contribuição financeira, não ocorre inconstitucionalidade orgânica e material das normas do seu regime jurídico, por violação dos princípios constitucionais da não retroatividade, da tutela da confiança e da segurança jurídica, da igualdade, capacidade contributiva e equivalência, pelo que também a respetiva autoliquidação, ainda que referente ao ano de 2011, não enferma de ilegalidade por alegada violação desses mesmos princípios”;

 

H)           No âmbito do procedimento, a Requerente foi notificada do projecto de decisão para efeito do exercício do exercício do direito de audição;

I)             Na informação dos serviços n.º ...-AIR1/2019, a que se refere a anterior alínea G), faz-se referência aos argumentos invocados pela Requerente no exercício do direito de audição (ponto 43.) e é feita a correspondente apreciação nos pontos 44. A 54., que aqui se dão como reproduzidos, concluindo-se no sentido do indeferimento da reclamação graciosa.

 

O Tribunal formou a sua convicção quanto à factualidade provada com base nos documentos juntos à petição e no processo administrativo junto pela Autoridade Tributária.

 

Matéria de direito

 

Incompetência do tribunal arbitral

 

5. A Autoridade Tributária suscitou a excepção da incompetência do tribunal arbitral para conhecer do presente pedido, tendo como objecto a Contribuição sobre o Sector Bancário (CSB), baseando-se no sentido interpretativo a atribuir ao artigo 2.º da Portaria n.º 112/2011, de 22 de Março - que estabelece a vinculação da Autoridade Tributária à jurisdição do CAAD -, fazendo notar que, nos termos desse preceito, o objecto da vinculação se cinge à apreciação de pretensões relativas a impostos, com a necessária exclusão das contribuições financeiras.

Em sentido oposto, a Requerente defende que uma interpretação sistemática, teleológica e histórica do citado artigo 2.º da Portaria de vinculação aponta no sentido de que os tribunais arbitrais dispõem de competência material para a apreciação das contribuições financeiras administradas pela Autoridade Tributária, e faz apelo às disposições do artigo 3.º, n.º 2, da Lei Geral Tributária, que enquadra na figura jurídica dos “tributos” os impostos e outras espécies tributárias criadas por lei, designadamente as taxas e demais contribuições financeiras a favor de entidades públicas, e do subsequente artigo 4.º, n.º 3, que integra as contribuições especiais com certas características na categoria de impostos. Alega a Requerente, na linha das decisões arbitrais proferidas nos Processos n.ºs 312/2015-T, 139/2017-T e 437/2017-T, que uma interpretação sistemática, teleológica e histórica do artigo 2.º da Portaria n.º 112-A/2011 revela que não houve qualquer intenção de restringir o âmbito de competência definido no artigo 2.º do RJAT, em que se faz referência à declaração de ilegalidade de actos de liquidação de tributos, e que a limitação do âmbito de vinculação que se pretendeu estabelecer diz apenas respeito à titularidade dos poderes para administrar os tributos.

 

Importa reconhecer que também não existe uniformidade quanto a esta matéria na jurisprudência arbitral.

 

No acórdão proferido no Processo n.º 312/2015-T, respeitante à contribuição extraordinária sobre o sector energético - depois seguido pelas decisões arbitrais tiradas nos Processos n.ºs 139/2017-T e 437/2017-T, estes referentes à contribuição sobre o sector bancário – entendeu-se que se “algum sentido se pode atribuir à interpretação literal-sistemática dos preceitos é o de que a referência a «impostos» em vez de «tributos» no artigo 2.º da Portaria n.º 112-A/2011, seguida da remissão expressa para o n.º 1 do artigo 2.º do RJAT e da enunciação expressa de um conjunto de excepções, indicia que o autor da Portaria não teve a intencionalidade restritiva quanto ao âmbito de vinculação e, se assim fosse, teria feito alusão expressa a essa restrição no leque das alíneas que contemplam as excepções”. “E mesmo que consideremos a contribuição sobre o sector bancário inserida na categoria jurídica de “contribuições” em nada se distingue, na sua natureza e estrutura, da dos “impostos”, já que a Administração Tributária actua como se de impostos se tratasse”.

 

Ao contrário, o acórdão proferido no Processo n.º 347/2017-T, seguido pelos acórdãos tirados nos Processos n.ºs 138/2019-T, 182/2019-T e 280/2019-T, considera que o teor verbal do artigo 2.º da Portaria de vinculação, mediante a referência específica a impostos, sendo um elemento irremovível de toda a interpretação, afasta qualquer interpretação extensiva que permita enquadrar nesse conceito qualquer outra figura (taxa ou contribuição) que pertença à categoria mais ampla de tributos, sendo que um tal entendimento, não tendo o mínimo apoio na letra da lei, esvaziaria de conteúdo o enunciado restritivo e a intenção delimitativa da Portaria.

É esta pois a questão que primeiramente cabe analisar.

 

A competência contenciosa dos tribunais arbitrais em matéria de arbitragem tributária, tal como resulta do artigo 2.º do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (RJAT), compreende a apreciação de pretensões que visem a “declaração de ilegalidade de actos de liquidação de tributos, de autoliquidação, de retenção na fonte e de pagamento por conta” e a “declaração de ilegalidade de actos de fixação da matéria tributável quando não dê origem à liquidação de qualquer tributo, de actos de determinação da matéria colectável e de actos de fixação de valores patrimoniais”.

 

O artigo 4.º, n.º 1, do RJAT faz ainda depender a vinculação da Administração Tributária à jurisdição dos tribunais arbitrais de portaria dos membros do Governo responsáveis pelas áreas das finanças e da justiça, que deverá estabelecer, designadamente, o tipo e o valor máximo dos litígios abrangidos.

 

E o diploma que, em execução desse preceito, define o âmbito e os termos da vinculação da Autoridade Tributária à jurisdição dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD é a Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março, que no seu n.º 2, sob a epígrafe “Objecto de vinculação”, e com a alteração resultante da Portaria n.º 287/2019, de 3 de Setembro, dispõe o seguinte:

 

“Os serviços e organismos referidos no artigo anterior vinculam-se à jurisdição dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD que tenham por objecto a apreciação das pretensões relativas a impostos cuja administração lhes esteja cometida referidas no n.º 1 do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, com excepção das seguintes:

a) Pretensões relativas à declaração de ilegalidade de actos de autoliquidação, de retenção na fonte e de pagamento por conta que não tenham sido precedidos de recurso à via administrativa nos termos dos artigos 131.º a 133.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário;

b) Pretensões relativas a actos de determinação da matéria colectável e actos de determinação da matéria tributável, ambos por métodos indirectos, incluindo a decisão do procedimento de revisão;

c) Pretensões relativas a direitos aduaneiros sobre a importação e demais impostos indirectos que incidam sobre mercadorias sujeitas a direitos de importação;

 d) Pretensões relativas à classificação pautal, origem e valor aduaneiro das mercadorias e a contingentes pautais, ou cuja resolução dependa de análise laboratorial ou de diligências a efectuar por outro Estado membro no âmbito da cooperação administrativa em matéria aduaneira;

e) Pretensões relativas à declaração de ilegalidade da liquidação de tributos com base na disposição antiabuso referida no n.º 1 do artigo 63.º do CPPT, que não tenham sido precedidos de recurso à via administrativa nos termos do n.º 11 do mesmo artigo.”

A referência a serviços e organismos que se vinculavam à jurisdição arbitral era feita para a Direcção-Geral dos Impostos e a Direcção-Geral das Alfândegas e dos Impostos Especiais sobre o Consumo, que foram, entretanto, extintas, tendo-lhes sucedido a Autoridade Tributária e Aduaneira.

 A Portaria n.º 112-A/2011, também chamada Portaria de vinculação, fixa, por conseguinte, um segundo nível de delimitação das pretensões que poderão ser sujeitas à jurisdição arbitral. Tratando-se de um mero regulamento de execução, a Portaria não poderia ir além do estabelecido na lei quanto ao âmbito de competência material dos tribunais arbitrais, mas poderia estabelecer restrições quanto ao âmbito da vinculação à arbitragem tributária, mormente por referência ao tipo de litígios e ao valor do processo.

Nesse sentido, a Portaria de vinculação tem uma finalidade semelhante à que decorre do n.º 2 do artigo 187.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, para a arbitragem administrativa. Nos termos dessa disposição, a partir do momento em que cada ministério assume, por portaria, a sua vinculação à jurisdição dos centros de arbitragem, ele fica vinculado a submeter-se a uma decisão arbitral, relativamente aos tipos de litígios compreendidos no âmbito da portaria. Trata-se de um instrumento colocado na livre disponibilidade dos ministérios, que são livres de assumirem, por portaria, a sua vontade de se submeterem à arbitragem dos centros institucionalizados relativamente a certos tipos de litígios e dentro de certos limites, sendo essa opção da Administração que confere aos interessados o direito potestativo de se dirigirem a um centro de arbitragem para dirimirem litígios que possam ser submetidos aos tribunais arbitrais.

Ainda a este propósito, o acórdão proferido no Processo n.º 48/2012-T, depois seguido por diversos outros arestos, consignou o seguinte:

 

“A competência dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD é, em primeiro lugar, limitada às matérias indicadas no artigo 2.º, n.º 1, do [RJAT].

Numa segunda linha, a competência dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD é também limitada pelos termos em que Administração Tributária se vinculou àquela jurisdição, concretizados na Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março, pois o artigo 4.º do RJAT estabelece que «a vinculação da administração tributária à jurisdição dos tribunais constituídos nos termos da presente lei depende de portaria dos membros do Governo responsáveis pelas áreas das finanças e da justiça, que estabelece, designadamente, o tipo e o valor máximo dos litígios abrangidos».

Em face desta segunda limitação da competência dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD, a resolução da questão da competência depende essencialmente dos termos desta vinculação, pois, mesmo que se esteja perante uma situação enquadrável naquele artigo 2.º do RJAT, se ela não estiver abrangida pela vinculação estará afastada a possibilidade de o litígio ser jurisdicionalmente decidido por este tribunal arbitral”.

 

No caso, a Portaria de vinculação, aparentemente, estabelece duas limitações: refere-se a pretensões “relativas a impostos”, de entre aquelas que se enquadram na competência genérica dos tribunais arbitrais, e a impostos cuja administração esteja cometida à Autoridade Tributária. Haverá de concluir-se, nestes termos, que a vinculação se reporta a qualquer das pretensões mencionadas no artigo 2.º, n.º 1, do RJAT que respeitem a impostos - com a exclusão de outros tributos - e a impostos que sejam geridos pela a Autoridade Tributária - o que conduz ao afastamento dos que sejam administrados pelas Regiões Autónomas ou consignados a outras entidades públicas.

 

6. Como não pode deixar de reconhecer-se - revertendo agora à análise do caso -, a letra da lei é o ponto de partida da interpretação, cabendo-lhe uma função negativa destinada a eliminar aqueles sentidos que não tenham qualquer apoio ou correspondência com o enunciado verbal, e uma função positiva que se traduz em escolher de entre os sentidos possíveis da norma aquele que corresponde ao significado natural das expressões verbais utilizadas, e designadamente ao seu significado técnico jurídico.

 

No entanto, na determinação do sentido e alcance nos textos legais não pode excluir-se outros factores interpretativos. O elemento racional ou teleológico de interpretação consiste em determinar o fim visado pelo legislador, havendo de atender-se às circunstâncias em que a norma foi elaborada e ao peso relativo dos interesses que a norma tem em vista regular. O elemento sistemático compreende a consideração das outras disposições que formam o complexo normativo do instituto em que se integra a norma interpretanda e que regulam a mesma matéria, assim como a consideração de disposições legais que regulam problemas normativos ou institutos paralelos. E tem sobretudo em vista determinar o lugar sistemático que a norma tem no ordenamento global e a sua correspondência com a unidade do sistema jurídico. O elemento histórico envolve todos os materiais relacionados com a história do preceito, incluindo a história evolutiva do instituto, as fontes da lei e os trabalhos preparatórios (sobre todos estes aspectos, BAPTISTA MACHADO, Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador, Coimbra, 1993, págs. 181-185).

 

Baseando-se em todos estes elementos interpretativos, o intérprete pode chegar a uma interpretação extensiva do texto da lei quando a fórmula verbal adoptada diz menos do que se pretendia dizer e se torne necessário dar-lhe um alcance conforme ao pensamento legislativo.

 

No caso, a introdução no ordenamento jurídico português da arbitragem em matéria tributária, como forma alternativa de resolução jurisdicional de conflitos no domínio fiscal, foi implementada pelo Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, no uso de autorização legislativa concedida pelo artigo 124.º da Lei n.º 3-B/2010, de 28 de Abril, que autorizou o Governo “a legislar no sentido de instituir a arbitragem como forma alternativa de resolução jurisdicional de conflitos em matéria tributária” (n.º 1) e  admitiu o processo arbitral tributário como um “meio processual alternativo ao processo de impugnação judicial e à acção para o reconhecimento de um direito ou interesse legítimo em matéria tributária” (n.º 2).

 

O Decreto-Lei n.º 10/2011 (RJAT) concretizou a mencionada autorização legislativa com um âmbito mais restrito do que o inicialmente previsto, não tendo contemplado a competência para a acção para o reconhecimento de um direito ou interesse legítimo em matéria tributária, e limitou a arbitragem tributária às matérias elencadas no seu artigo 2.º, excluindo diversas das competências dos tribunais tributários referidas no artigo 97.º, n.º 1, do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) que são exercidas através do processo de impugnação judicial.

 

Acresce que – como se viu - a vinculação da Administração Tributária aos tribunais arbitrais ficou condicionada à portaria de vinculação que se destinava a determinar, designadamente o tipo e o valor máximo dos litígios abrangidos.

 

Em primeiro lugar, importa ter presente que a remissão para diploma regulamentar da definição do âmbito da vinculação da Administração à arbitragem tributária teve justamente em vista permitir que fossem os departamentos governamentais com competências administrativas na gestão do sistema fiscal que pudessem aferir da viabilidade do regime legal, tendo em consideração o carácter inovador do recurso à arbitragem em matéria tributária e ausência de quaisquer dados experimentais sobre a eficácia do sistema.

 

Por outro lado, um segundo nível de limitação do âmbito da arbitragem tributária por via regulamentar encontra-se justificado por razões de política legislativa e nada obstava que a Portaria de vinculação viesse a estabelecer critérios mais restritivos do que os legalmente previstos, quer quanto ao elenco de pretensões que poderiam ser sujeitas aos tribunais arbitrais, quer quanto ao valor processual dos litígios que pudessem ser submetidos à arbitragem ou à composição do tribunal arbitral.

Neste contexto, não oferece especial dúvida que a entidade com competência regulamentar pudesse optar por restringir a vinculação às pretensões referidas no artigo 2.º, n.º 1, do RJAT que apenas fossem incidentes sobre impostos, e deixasse de fora as questões relacionadas com taxas e contribuições que, além do mais, poderiam gerar uma maior grau de conflitualidade e de incerteza quanto à qualificação jurídica e exigir uma maior especialização por via da especificidade das questões que pudessem suscitar-se.

 

7. A Requerente insiste que não há motivo para interpretar restritivamente a referência a impostos que consta do proémio do artigo 2.º da Portaria de vinculação e nada impede que se inclua nesse conceito as contribuições financeiras como espécie que são de tributos.

Uma tal interpretação não tem, no entanto, a mínima correspondência na letra da lei, e, por outro lado, é a própria Lei Geral Tributária que, ao classificar os tributos, distingue claramente entre os impostos e outras espécies tributárias criadas por lei, aí se incluindo as taxas e as contribuições financeiras (artigo 3.º).

Acresce que a interpretação da lei fiscal se rege pelos critérios hermenêuticos que resultam do artigo 9.º do Código Civil e “sempre que, nas normas fiscais, se empreguem termos próprios de outros ramos de direito, devem os mesmos ser interpretados no mesmo sentido daquele que aí têm, salvo se outro decorrer directamente da lei” (artigo 11.º, n.ºs 1 e 2, da LGT). Ora, dificilmente se poderia compreender que as leis fiscais devessem ser interpretadas, sem qualquer particularismo, segundo os citérios de interpretação consagrados no direito civil, mormente quando estivessem em causa “termos próprios de outros ramos de direito”, e já não houvesse que aplicar esse princípio quando estejam em causa termos próprios do Direito Fiscal.

 

É a todos os títulos evidente que se o legislador recorre ao conceito amplo de tributos na norma legal que define a competência dos tribunais arbitrais (artigo 2.º, n.º 1, do RJAT) e utiliza o conceito mais restrito de impostos na Portaria de vinculação (proémio do artigo 2.º), isso só pode significar que a expressão verbal tem, em qualquer dos casos, o sentido técnico jurídico que lhe corresponde e, por conseguinte, não pode extrair-se a conclusão de que a lei e o diploma regulamentar pretendem referir-se à mesma realidade jurídica quando se referem a tributos ou a impostos.

 

A Requerente argumenta ainda com o elemento histórico e sistemático de interpretação, dizendo que a ausência de referência às contribuições financeiras no artigo 2.º da Portaria de vinculação se fica a dever à circunstância de não existir um tributo com essas características que se encontrasse a ser gerido pela Administração Tributária, e, caso se pretendesse restringir o âmbito de competência dos tribunais arbitrais, a solução seria incluir essa restrição no elenco de excepções que constam das diversas alíneas do artigo 2.º.

 

Deve dizer-se, quanto ao primeiro ponto, que as contribuições financeiras a favor das entidades públicas, como terceira categoria tributária, a par dos impostos e das taxas, foi introduzida com a revisão constitucional de 1997 e já a Lei Geral Tributária fazia menção essas contribuições como uma das espécies de tributos. E a pretensa inexistência de contribuições que estivessem a ser administradas pela Autoridade Tributária não poderia constituir motivo para excluir as contribuições da previsão do artigo 2.º da Portaria, visto que um dos limites à vinculação se traduzia precisamente na apreciação de pretensões relativas a impostos cuja administração esteja cometida à Autoridade Tributária. Ou seja, se a entidade com competência regulamentar pretendesse alargar a arbitragem às contribuições financeiras, não havia obstáculo a que o pudesse fazer mesmo que alguns desses tributos não fossem administrados pela Autoridade Tributária, uma vez que, nesse caso, se manteria a exclusão por força da inverificação de um dos pressupostos da vinculação.

 

O chamado elemento sistemático de interpretação, no sentido que a Requerente lhe atribui, também não tem razão de ser.

 

A referência a pretensões relativas a impostos, no proémio do artigo 2.º da Portaria, não constitui uma excepção, mas o próprio âmbito material da arbitragem tributária. Se se remetesse para o regime excepcional das diversas alíneas desse artigo a referência a pretensões relativas a impostos, o preceito ficava sem conteúdo preceptivo útil e o regime de vinculação ficava apenas delimitado negativamente.

 

Por outro lado, as diversas alíneas desse artigo, ao excepcionarem do regime de vinculação as situações que aí se encontram elencadas tem um sentido e alcance perfeitamente compreensível. As alíneas a) e e) pretendem identificar as situações em que, em matéria de autoliquidação, substituição tributária e pagamentos por conta e ainda na aplicação de normas antiabuso, há lugar à impugnação administrativa necessária e tem o sentido inequívoco de tornar exigível a prévia impugnação administrativa do acto tributário como condição de acesso à via jurisdicional. Não se trata propriamente de um problema de competência contenciosa, mas de uma condição de procedibilidade da acção judicial. A alínea b) visa pretensões relativas a actos de determinação na matéria tributável e da matéria colectável, por métodos indirectos, e que se justifica encontrarem-se excluídas da arbitragem por se tratar de actos preparatórios da liquidação. A exclusão da arbitragem das questões mencionadas nas alíneas c) e d) explicam-se por razões de ordem prática que se relacionam com a própria natureza das matérias em causa.

 

A Requerente alega, no entanto, que o aditamento da alínea e) ao artigo 2.º da Portaria de vinculação, pela Portaria n.º 287/2019, de 3 de Setembro, na qual se utiliza o inciso "liquidação de tributos", clarifica e reforça o entendimento de que a vinculação dos tribunais arbitrais opera relativamente a qualquer espécie de tributos.

 

Deve começar por dizer-se que a alteração introduzida pela Portaria n.º 287/2019, de 3 de Setembro, mediante o aditamento da alínea e), como resulta da nota preambular, foi determinada pela circunstância de a Lei n.º 32/2019, de 3 de Maio, ter passado a prever,  através da alteração do artigo 63.º do CPPT, com  a inclusão de um n.º 11, que “a impugnação da liquidação de tributos com base na disposição antiabuso referida no n.º 1 será obrigatoriamente precedida de reclamação graciosa”. A nova disposição da alínea e) não tem, por conseguinte, outro objectivo que não seja o de assinalar que a impugnação judicial da liquidação de tributos com base na disposição antiabuso carece também de ser precedida de impugnação administrativa, tratando-se, nesse sentido, de uma norma paralela à da alínea a), em que se impõe idêntica exigência no tocante a pretensões relativas a actos autoliquidação, substituição tributária e pagamentos por conta.

 

Por outro lado, a referência na falada alínea e) à “liquidação de tributos” explica-se porque o artigo 63.º do CPPT e o seu novo n.º 11 se referem à “liquidação de tributos com base em disposição antiabuso”, limitando-se a norma regulamentar a reproduzir a expressão que constava do artigo 63.º. Tratando-se de uma excepção à regra de vinculação que consta do proémio do artigo 2.º da Portaria n.º 112-A/2011 – que se traduz numa mera condição de procedibilidade da acção e não um critério de competência -, a norma aditada não poderia ter o efeito de alterar o próprio âmbito aplicativo que resulta desse preceito, permitindo que o inciso “pretensões relativa a impostos” passasse a ser lido como “pretensões relativas a tributos”.

 

Como se impõe concluir, na interpretação sistemática da lei, o intérprete deve dar prevalência ao sentido que permita garantir a concordância material com outras disposições do sistema, e, no contexto significativo da norma que está em causa, essa concordância terá de ser estabelecida em relação ao disposto no artigo 2.º, n.º 1, do RJAT, que define o âmbito de competência dos tribunais por referência a tributos, e no artigo 3.º, n.º 2, da LGT, que inclui no conceito amplo de tributos os impostos, as taxas e as contribuições financeiras. Tendo usado o autor da portaria de vinculação um conceito com um significado jurídico preciso para delimitar o âmbito da vinculação (pretensões relativas a impostos), não faria sentido, mesmo numa interpretação baseada no elemento sistemático, que se atribuísse a esse enunciado linguístico um sentido não consentâneo com a unidade do sistema.

 

E não pode ignorar-se - como já se deixou dito – que o elemento literal constitui o limite da interpretação e condiciona a ulterior actividade do intérprete, pelo que só poderá partir-se para uma interpretação ampla se o preceito não contiver um sentido literal inequívoco que se enquadre com a finalidade que se pretendeu atingir  (sobre estes últimos aspectos, KARL LARENZ, Metodologia da Ciência do Direito, Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa, 7.ª edição, págs. 457-458).

 

Resta considerar que no sentido da incompetência dos tribunais arbitrais para apreciar pretensões relativas a contribuições financeiras também se posiciona vária doutrina, e.g., SÉRGIO VASQUES/CARLA CASTELO TRINDADE, “O âmbito material da arbitragem tributária”, “Cadernos de Justiça Tributária”, n.º 00 (Abril/Junho 2013), págs. 24-25; CARLA CASTELO TRINDADE, Regime Jurídico da Arbitragem Tributária Anotado, Coimbra, 2016, pág. 78; Serena Cabrita Neto/ CARLA CASTELO TRINDADE,  Contencioso tributário, vol. II, Coimbra, 2017, págs. 439 e seguintes.

    

Natureza jurídica da contribuição sobre o sector bancário

 

6. A contribuição sobre o sector bancário (CBS) foi recentemente caracterizada pelo acórdão do STA de 19 de Junho de 2019 (Processo n.º 02340/13), com desenvolvida fundamentação, como uma contribuição financeira.

 

 A CSB foi criada pelo artigo 141.º da Lei nº 55-A/2010, de 31 de Dezembro (Lei do Orçamento do Estado para 2011), entretanto alterada pela Lei n.º 7-A/2016, de 30 de Março, como uma contribuição extraordinária, tendo como sujeitos passivos as instituições de crédito com sede principal e efectiva da administração situada em território português, as filiais em Portugal de instituições de crédito que não tenham a sua sede principal e efectiva da administração em território português e as sucursais em Portugal de instituições de crédito com sede principal e efectiva fora da União Europeia (artigo 2.º). Tem como âmbito de incidência objectiva o passivo apurado e aprovado pelos sujeitos passivos dentro do condicionalismo previsto na alínea a) do artigo 3.º (com a redacção da Lei n.º 7-A/2016, de 30 de Março) e o valor nocional dos instrumentos financeiros derivados fora do balanço apurado pelos sujeitos passivos (alínea b).

 

A liquidação é efectuada pelo próprio sujeito passivo, através de declaração de modelo oficial aprovada por portaria do membro do Governo responsável pela área das finanças, que deve ser enviada anualmente por transmissão electrónica de dados, até ao último dia do mês de Junho (artigo 5.º) e paga até ao último dia do prazo estabelecido para o envio da declaração, sendo o pagamento efectuado nos termos do n.º 1 do artigo 40.º da Lei Geral Tributária (artigo 6.º).

 

À liquidação, cobrança e pagamento da contribuição aplica-se subsidiariamente o disposto na Lei Geral Tributária e no CPPT (artigo 7.º).

 

A base de incidência, as taxas aplicáveis, bem como as regras de liquidação, de cobrança e de pagamento da contribuição foram regulamentadas pela Portaria n.º 121/2011, de 30 de Março.

 

Importa ainda notar que a CSB constitui receita do Fundo de Resolução, criado mediante a alteração introduzida pelo Decreto-Lei n.º 31-A/2012, de 10 de Fevereiro, ao Regime das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras [artigo 153.º-F, alínea a)] e definido como pessoa colectiva de direito público, dotada de autonomia administrativa e financeira, que funciona junto do Banco de Portugal (artigo 153.º-B). O Fundo tem por objecto prestar apoio financeiro à aplicação de medidas de resolução adoptadas pelo Banco de Portugal e desempenhar todas as demais funções que lhe sejam conferidas pela lei no âmbito da execução de tais medidas (artigo 153.º-C) e nele participam obrigatoriamente, entre outras entidades, as instituições de crédito com sede em Portugal (artigo 153.º-D).

 

O próprio Relatório do Orçamento de Estado para 2011 explica a génese da contribuição sobre o sector bancário em termos suficientemente elucidativos quanto aos objectivos que se pretendiam atingir.

 

Aí se afirma (pág. 73):

 

“A Proposta do Orçamento do Estado para 2011 procede ainda à criação de uma contribuição sobre o sector bancário na linha daquelas que foram já́ introduzidas noutros Estados Membros, com o propósito de aproximar a carga fiscal suportada pelo sector financeiro da que onera o resto da economia e de o fazer contribuir de forma mais intensa para o esforço de consolidação das contas públicas e de prevenção de riscos sistémicos, protegendo também, assim, os trabalhadores do sector e os mecanismos de segurança social.

A contribuição incide, assim, sobre as instituições de crédito com sede principal e efectiva da administração situada em território português, sobre as filiais de instituições de crédito que não tenham a sua sede principal e efectiva da administração em território português e sobre as sucursais, instaladas em território português, de instituições de crédito com sede principal e efectiva da administração em Estados terceiros”.

 

Face ao regime jurídico sucintamente descrito, a CSB tem por base uma contraprestação de natureza grupal, na medida em que constitui um preço público a pagar pelo conjunto dos regulados à respectiva entidade ou agência de regulação.

 

Não se reconduz à taxa stricto sensu, visto que não incide sobre uma prestação concreta e individualizada que a Administração dirija aos respectivos sujeitos passivos. Nem se caracteriza como um imposto, pois que não se verifica a respectiva unilateralidade: não tem como finalidade exclusiva a angariação de receita (não se destina a que “as instituições participantes concorram para os gastos da comunidade, em cumprimento de um qualquer dever de solidariedade”), antes se pretendendo que o sector financeiro contribua para a cobertura do risco sistémico que é inerente à sua actividade.

 

E a sua natureza não é afastada pela circunstância de as receitas provenientes da CSB serem consignadas ao Fundo de Resolução, porquanto o Fundo tem por objecto prestar apoio financeiro à aplicação de medidas pelo Banco de Portugal e visa a prevenção dos riscos sistémicos do sector bancário. Esse mesmo objectivo é assinalado na nota preambular da Portaria n.º 121/201, onde se refere que os elementos essenciais da CSB são definidos “em termos semelhantes aos de contribuições já introduzidas por outros Estados membros da União Europeia, com o duplo propósito de reforçar o esforço fiscal feito pelo sector financeiro e de mitigar de modo mais eficaz os riscos sistémicos que lhe estão associados”.

 

Como se conclui no citado acórdão do STA, de 19 de Junho de 2019, a motivação legislativa constante dos diplomas que regularam a contribuição para o sector bancário e o Fundo de Resolução legitima a ilação de a contribuição visou, em primeiro lugar e desde o início, atenuar as consequências resultantes das intervenções públicas no sector financeiro, face à situação de crise financeira então desencadeada no âmbito desse mesmo sector, reconduzindo-se a um instrumento de apoio na prevenção dos inerentes riscos do sistema, não se destinando a colmatar necessidades genéricas de financiamento do Estado.

 

Trata-se, nestes termos, de um tributo que, interessando a um grupo homogéneo de destinatários e visando prevenir riscos a este grupo associados, se efectiva na compensação de eventual intervenção pública na resolução de dificuldades financeiras das entidades desse sector, assumindo assim a natureza jurídica de contribuição financeira.

 

E nesse mesmo sentido se pronunciou o acórdão proferido no Processo n.º 347/2017-T.

 

7. A constitucionalização das contribuições financeiras resultou da alteração introduzida no artigo 165.º, n.º 1, alínea i), da Lei Fundamental, pela revisão constitucional de 1997, que autonomizou as contribuições financeiras a favor das entidades públicas como uma terceira categoria de tributos.

 

A LGT, aprovada em 1998, passou a incluir entre os diversos tipos de tributos, os impostos e outras espécies criadas por lei, designadamente as taxas e as contribuições financeiras a favor das entidades públicas, definindo, em geral, os pressupostos desses diversos tipos de tributos no subsequente artigo 4.º.

 

A doutrina tem caracterizado as contribuições financeiras como um tertium genus de receitas fiscais, que poderão ser qualificadas como taxas colectivas, na medida em que visam retribuir os serviços prestados por uma entidade púbica a um certo conjunto ou categoria de pessoas. Como referem GOMES CANOTILHO/VITAL MOREIRA, “a diferença essencial entre os impostos e estas contribuições bilaterais é que aqueles visam financiar as despesas públicas em geral, não podendo, em princípio, ser consignados a certos serviços públicos ou a certas despesas, enquanto que as segundas, tal como as taxas em sentido estrito, visam financiar certos serviços públicos  e certas despesas públicas (responsáveis pelas prestações públicas de que as contribuições são contrapartida), aos quais ficam consignadas, não podendo, portanto, ser desviadas para outros serviços ou despesas” (Constituição da República Portuguesa Anotada, I vol., 4ª edição, Coimbra, pág. 1095). Neste sentido, as contribuições são tributos com uma estrutura paracomutativa, dirigidos à compensação de prestações presumivelmente provocadas ou aproveitadas pelos contribuintes, distinguindo-se das taxas que são tributos rigorosamente comutativos e que se dirigem à compensação de prestações efectivas (SÉRGIO VASQUES, Manual de Direito Fiscal, Coimbra, 2015, pág. 287).

 

Por outro lado, o Tribunal Constitucional tem também reconhecido a existência dessas diferentes categorias jurídico-tributárias, designadamente para efeito de extrair consequências quanto à competência legislativa, admitindo que as taxas e outras contribuições de carácter bilateral só estão sujeitas a reserva parlamentar quanto ao seu regime geral, mas não quanto à sua criação individual e quanto ao regime concreto, podendo portanto ser criadas por diploma legislativo governamental e reguladas por via regulamentar desde que observada a lei-quadro (cfr., entre outros, o Acórdão n.º 365/2008, de 2 de Julho de 2008, Processo n.º 22/2008).

 

Ou seja, não há dúvida que as contribuições financeiras se distinguem dos impostos.

Em conclusão:

Por força do disposto nos artigos 2.º e 4.º do RJAT e 2.º da Portaria de vinculação, a competência material dos tribunais arbitrais constituídos no âmbito do CAAD abrange apenas as pretensões relativas a impostos que sejam administrados pela Autoridade Tributária.

Tendo o presente pedido arbitral como objecto a contribuição sobre o sector bancário e revestindo-se esta da natureza jurídica de contribuição financeira, o tribunal arbitral é incompetente ratione materiae para a apreciação do litígio.

 

9. Na resposta à excepção da incompetência do tribunal arbitral, a Requerente alega ainda que a interpretação da norma do artigo 2.º da Portaria n.º 112-A/2011, no sentido de que a vinculação da Administração Tributária à jurisdição arbitral se restringe às pretensões relativas a impostos, é inconstitucional por violação do princípio da igualdade, conjugado com o princípio da tutela jurisdicional efetiva.

 

                A violação do princípio da igualdade reconduz-se à desigualdade de tratamento de um grupo de destinatários da norma em relação a outro grupo de destinatários, não obstante a inexistência de qualquer diferença justificativa do tratamento desigual. O problema central traduz-se na escolha e justificação do critério distintivo que há-de servir de base à comparação das situações a tratar pela lei. E, nesta específica vertente, o princípio da igualdade identifica-se com a proibição do arbítrio, ou seja, ao legislador está vedado introduzir discriminações entre contribuintes que sejam desprovidas de fundamento racional ou para a qual se não se encontre um fundamento objectivo evidente ou onde se não detecte um mínimo de coerência entre os objectivos prosseguidos e os resultados previsíveis (cfr. Acórdãos do Tribunal Constitucional n.º 306/2010, de 14 de Julho de 2010, Processo n.º 107/2010 e n.º 695/2014, de 15 de outubro de 2014, Processo n.º 1265/2013 e, na doutrina, e.g., SÉRGIO VASQUES, Manual de Direito Fiscal, Coimbra, 2015, págs. 290-291; REIS NOVAIS, Princípios Constitucionais Estruturantes da República Portuguesa, Coimbra, 2004, pág. 111).

 

                A diferenciação arbitrária é, em suma, a que não possa ser fundamentada à luz de um critério inteligível ou racionalmente apreensível, congruente com valores constitucionalmente relevantes (Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 166/2010, de 28 de Abril de 2010, Processo n.º 1206/2007).

 

Ora, no caso em análise, o legislador remeteu a vinculação da Administração Tributária à jurisdição dos tribunais arbitrais para diploma regulamentar, designadamente para efeito de estabelecer o tipo e o valor máximo dos litígios que ficariam abrangidos pela arbitragem E era, pois, neste diploma que as entidades governamentais competentes poderiam definir o objecto da vinculação, nada obstando que pudessem restringir o elenco de pretensões que poderiam ser sujeitas aos tribunais arbitrais ou estabelecer limites quanto ao valor processual dos litígios que lhes pudessem ser submetidos.

 

Essa era justamente a finalidade da remissão do regime de vinculação para portaria, permitindo que as entidades com competências administrativas na gestão do sistema fiscal pudessem aferir da viabilidade de um sistema de arbitragem tributária, que apresentava um carácter inovador e sobre o qual não existia uma qualquer experiência anterior.

 

A limitação estabelecida no recurso à arbitragem em matéria tributária assenta, por conseguinte, em considerações de praticabilidade e de política legislativa que, por si só, constituem fundamento material bastante para restringir o âmbito da vinculação às pretensões relativas a impostos.

 

Por outro lado, o princípio da tutela jurisdicional efectiva, entendido como um direito de acesso aos tribunais não é postergado pela limitação de recurso à arbitragem em relação aos litígios que envolvam as contribuições financeiras, porquanto nada impede que os interessados recorram aos tribunais tributários, como de resto sucede em relação a todos os restantes tipos de litígios que se encontram excluídos da arbitragem tributária à luz do disposto no artigo 2.º, n.º 1, do RJAT.

 

Não ocorre, por isso, a violação do princípio da igualdade e do princípio da tutela jurisdicional efectiva.

 

III – Decisão

Termos em que se decide declarar a incompetência absoluta do tribunal em razão da matéria e, em consequência, em absolver a Requerida da instância.

 

Valor da causa

 

A Requerente indicou como valor da causa o montante de € 583.822,86, que não foi contestado pela Requerida e corresponde ao valor da liquidação a que se pretendia obstar, pelo que se fixa nesse montante o valor da causa.

 

Custas

 

Nos termos dos artigos 12.º, n.º 2, e 24.º, n.º 4, do RJAT, e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária e Tabela I anexa a esse Regulamento, fixa-se o montante das custas em € 8.874,00, que fica a cargo da Requerente.

 

Notifique.

 

Lisboa, 4 de Setembro de 2020

 

O Presidente do Tribunal Arbitral

Carlos Fernandes Cadilha

 

A Árbitro Vogal

Cristina Aragão Seia

 

O Árbitro Vogal

Paulo Lourenço