Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 321/2021-T
Data da decisão: 2022-03-02  IRC  
Valor do pedido: € 80.808,30
Tema: IRC – Benefício Fiscal do RFAI – Exclusão de atividades agrícolas.
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SUMÁRIO:

 

Tema: IRC – Contesta a liquidação adicional de IRC, relativa ao exercício de 2016, n.º 2020..., e ao Benefício Fiscal do RFAI, invocando a existência de ilegalidade.

 

 

DECISÃO ARBITRAL

 

I – Relatório

 

  1. Da introdução aos factos

 

A... S.A, doravante A... ou SP, com o NIPC..., veio impugnar a liquidação de IRC relativa ao exercício de 2016, n.º 2020..., no valor de € 80.808,30, sendo Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira.

 

A Requerente foi objeto de uma ação Inspetiva da Autoridade Tributária, cf. Ordens de Serviço Internas n.ºs OI2020.../.../..., todas datadas de 27/01/2020, da Direção de Finanças de ..., relativas aos períodos de tributação de 2016, 2017 e 2018.

 

As referidas Ordens de Serviço foram abertas para verificação de Benefícios Fiscais, nomeadamente, do Regime Fiscal de Apoio ao Investimento (RFAI).

 

Segundo respetivo Relatório de Inspeção, os procedimentos têm natureza interna e o seu âmbito é parcial, circunscrito ao IRC, IMI, IMT e I. do Selo.

 

A A... tem por objeto “todas as atividades pecuárias, agrícolas e cinegéticas, bem como todas as atividades conexas”, tendo iniciado a atividade em 04/09/1989.

 

O SP encontra-se registado nos seguintes CAE’s:

 

- Principal – 01470 – Avicultura

- Secundário 1 – 001210 – Viticultura

- Secundário 2 – 001420 – Criação de Outros Bivinos (Exc. P/Produção de Leite) e Búfalos

- Secundário 3 – 001460 – Suinicultura

- Secundário 4 – 001702 – Ativ. Serv. Relacionados c/Caça e Repovoamento cinegético;

- Secundário 5 – 002100 – Silvicultura e Outras Atividades Florestais

- Secundário 6 – 010120 – Abate de Aves (Produção de carne)

- Secundário 7 – 046320- Comércio por Grosso de Carne e Produtos à base de Carne

- Secundário 8 – 035113 – Produção eletricidade de origem Eólica, Geotérmica, Solar e N.E.

- Secundário 9 – 032996 – Outras Indústrias Transformadoras Diversas, N.E.

 

A A... tem como atividade principal a criação intensiva de aves para posterior abate e comercialização. Para além disso, na sua Herdade B..., procede ainda ao tratamento de penas, transformação de subprodutos de origem animal e possui também uma unidade de fertilizantes orgânicos e corretivos orgânicos do solo.

 

Para além das atividades referidas, possui também, na Herdade C..., em ..., ..., um núcleo de reprodução e na Herdade da C... e E..., ...,  ..., onde é efetuada a engorda de Porco Preto Alentejano ou Cruzado de Alentejano, em regime intensivo e Gado Bovino.

 

-Valias de não residentes – Revogação do ato – Extinção da instância

  1. Dos factos em concreto

 

  1. A A... é um sujeito passivo de IRC, que liquida IVA, à taxa de 23% pela venda de alguns produtos processados.

 

  1. No período em causa, utilizou o Benefício Fiscal designado por RFAI – Regime Fiscal de Apoio ao Investimento previsto no Decreto-Lei n.º 162/2014, de 31 de outubro, que permite às empresas deduzir à coleta uma percentagem do investimento realizado em ativos não correntes (tangíveis e intangíveis), bem como o SIFIDE II – Sistema de Incentivos Fiscais à Investigação e Desenvolvimento Empresarial, ambos regulados no Código Fiscal ao Investimento.

 

  1. Assim, segundo Relatório de Inspeção, a A... utilizou os seguintes benefícios fiscais, que constituem o objeto de verificação da Inspeção para conhecerem da sua correta dedutibilidade, e, consequentemente, em se saber se, tendo em conta os setores de atividade económica desenvolvida e em que os benefícios abaixo referidos foram aplicados, têm fundamento legal.

 

  1. Exercício de 2016: - Em sede de Benefícios Fiscais em IRC

 

- No campo 355 do Quadro 10 da Declaração Mod. 22, referente a benefícios fiscais, declarou o valor de € 133.978,13, que respeita ao RFAI e Dedução por Lucros Retidos e Reinvestidos (DLRR), nos seguintes montantes:

 

  • No Quadro 074 do Anexo D da Decl. Mod. 22, referente ao RFAI, declarou o montante de € 71.891,95[1];
  •  No Quadro 075 do Anexo D da Decl. Mod. 22, referente ao DLRR, declarou o montante de € 62.086,18;

 

  1. Exercício de 2017: - Em sede de Benefícios Fiscais em IRC

 

- No campo 355 do Quadro 10 da Declaração Mod. 22, referente a benefícios fiscais, declarou o valor de € 252.577,95, que respeita ao RFAI e Dedução por Lucros Retidos e Reinvestidos (DLRR), nos seguintes montantes:

 

  • No Quadro 074 do Anexo D da Decl. Mod. 22, referente ao RFAI, declarou o montante de € 168.385,30, tendo transitado para o período seguinte o montante de € 73.994,77;
  •  No Quadro 075 do Anexo D da Decl. Mod. 22, referente ao DLRR, declarou o montante de € 84.192,65;

 

  1. Exercício de 2018: - Em sede de Benefícios Fiscais em IRC

 

- No campo 355 do Quadro 10 da Declaração Mod. 22, referente a benefícios fiscais, declarou o valor de € 415.249,54, que respeita ao SIFIDE II – Sistema de Incentivos Fiscais em Investimento e RFAI – Regime Fiscal de Apoio ao Investimento, nos seguintes montantes:

 

  • No Quadro 073 do Anexo D da Decl. Mod. 22, referente ao benefício fiscal SIFIDE II, no montante de € 239.286,11, tendo transitado para o período seguinte o montante de € 90.713,89;
  •  No Quadro 074 do Anexo D da Decl. Mod. 22, referente ao benefício fiscal RFAI, no montante de € 175.963,43, sendo que € 102.018,86 respeita a dotação do período e € 73.944,77 respeita a saldo não deduzido no período anterior, como é anteriormente referido no respeitante ao ano de 2017.

 

  1. Quanto ao IVA, a Inspeção Tributária concluiu que o controlo realizado não relevou quaisquer situações de consubstanciem a prática de omissões ou inexatidões.

 

  1. Do que é facto é que da análise efetuada pelos Serviços de Inspeção, decorreram correções aos benefícios fiscais obtidos nos exercícios referidos de 2016, 2017 e 2018, no que respeita ao RFAI e com reflexo no correspondente IRC.

 

  1. Em concreto, resultaram correções, para mais, em sede de IRC nos montantes de:

 

- 2016 no montante de € 71.891,95

- 2017 no montante de € 168.839,94 (sendo € 168.385,30 do RFAI e € 454,54 de Tributação Autónoma relativa a Encargos com Ajudas de Custo)

- 2018 no montante de € 175.963,43

 

  1. Estas Conclusões foram notificadas à A..., pelo ofício n.º ..., de 08/09/2020, dando-lhe a conhecer os correspondentes fundamentos de facto e de direito das correções efetuadas, para exercer o seu direito de audição, o que não fez.

 

  1. Dado que a liquidação adicional controvertida, objeto de reclamação e de Impugnação, é apenas a relativa ao ano de 2016, com o n.º 2020...[2], que deu lugar ao acerto de contas de 21.09.2020, conforme Demonstração de Acerto de Contas e respetiva Nota de Cobrança, devidamente notificadas.

 

  1. Da respetiva Nota de Cobrança resultou um saldo a pagar de IRC e de juros compensatórios no valor total de € 80.808,30, com prazo limite de pagamento até 9.11.2020, que não foi realizado, mas prestada a garantia bancária fixada pela AT. 

 

  1. A Requerente, por não concordar com os pressupostos de facto e de direito constantes do Relatório de Inspeção, que determinaram a referida liquidação adicional de IRC do referido ano de 2016, que considerou ininteligíveis, apresentou reclamação graciosa, que deu origem ao processo n.º ...2021... .

 

  1. A Requerente foi notificada para exercer o direito de audição sobre o Projeto de Decisão da Reclamação, nos termos previstos nos artigos 60.º da LGT e 60.º do CPPT, em 15-02-2021, tendo reagido tempestivamente em 18 do mesmo mês a exercer o seu direito, relativamente às Conclusões e respetivas correções.

 

  1. A então Reclamante, ora Requerente, alegou “autónomos vícios de violação de lei e de fundamentação, a par da violação dos princípios estruturantes da atuação da Autoridade Tributária…que contaminam o ato decisório que venha a ser proferido”.

 

  1. Posteriormente, foi notificada da decisão final proferida e respetiva fundamentação sobre a Reclamação Graciosa com o número já antes referido na alínea M. pelo Ofício n.º..., de 24-02-2021, dos Serviços de Justiça Tributária da Direção de Finanças de ..., dando-lhe ainda a conhecer que do despacho definito que lhe indefere a Reclamação Graciosa, por não ter trazido factos novos suscetíveis  de alterar a decisão, poderia recorrer hierarquicamente, no prazo de 30 dias, nos termos dos n.ºs 1 e 2 do art.º 66.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) ou interpor impugnação judicial no prazo de 3 meses, nos termos do art.º 97.º e 102.º, ambos do mesmo Código, com aplicação do disposto no n.º 1 do art.º 39.º da Lei Geral Tributária (LGT).

 

  1. A Requerente vem, então, apresentar pedido de Constituição de Tribunal Arbitral em 26-05-2021, com vista a demonstrar a ilegalidade e consequente anulação da liquidação do IRC do exercício de 2016, com os fundamentos nele expressos.

 

 

  1. Da constituição do Tribunal Arbitral e do Saneamento

 

  1. O pedido de pronúncia arbitral foi oportunamente apresentado em 26/05/2021 e foi aceite pelo CAAD e notificado em 31 do mesmo mês à Autoridade Tributária, nos termos regulamentares.

 

  1. Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro, o Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem, designou como árbitros do Tribunal Arbitral Coletivo a Dr.ª Alexandra Coelho Martins, como Presidente, o signatário, Dr. José Rodrigo de Castro, como árbitro auxiliar e o Dr. Rui Ferreira Rodrigues, também como árbitro auxiliar, encargos que aceitaram.

 

  1. As partes foram oportuna e devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado, qualquer delas, vontade de a recusar, nos termos conjugados do artigo 11.º, n.º 1, alíneas a) e b) do RJAT e artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.

 

  1. Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, na redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66.B/2012, de 31 de dezembro, o tribunal arbitral coletivo ficou constituído em 3 de agosto de 2021.

 

  1. Donde, o tribunal arbitral tenha sido regularmente constituído e, por consequência, é materialmente competente, face ao preceituado nos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), e 30.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro.
  2. Por sua vez, as Partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão devidamente representadas, conf. artigos, 4.º, 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e n.º 1.º da Portaria n.º 112.º-A/112-A/2011, de 22 de março.

 

  1. E não enfermando o processo de quaisquer nulidades ou exceções que tenham sido invocadas,

 

 

III - Matéria de facto

 

A – Factos não provados

 

 Não se encontraram factos não provados.

 

B – Factos provados

 

A matéria factual relevante para a compreensão e decisão da causa, após exame crítico da prova documental e do processo administrativo (PA) juntos aos autos, fixa-se como se segue:

 

  1. A A... S.A, com o NIPC..., é um sujeito passivo de IRC, que liquida IVA, à taxa de 23%, pela venda dos produtos processados.

 

  1. A Requerente dedica-se “à atividade de produção agrícola, à indústria de transformação de produtos agrícolas e à comercialização, por grosso, de uns e outros, tendo por base a sua própria produção e a de terceiros”.

 

  1. Ou seja, consiste na criação intensiva de aves e aquisição a terceiros, para posterior abate e comercialização.

 

  1. A Requerente “também adquire produção (animais) a produtores terceiros, para proceder posteriormente à transformação desses produtos e à comercialização subsequente dos produtos transformados”.

 

  1. Realça que tem “relevantíssimas atividades de transformação, incluindo bens da produção de terceiros que não a da requerente, e dessas atividades de transformação resultam inúmeros produtos que são, posteriormente, comercializados, por grosso, pela Requerente”.

 

  1. E que “esses produtos transformados, incluem, nomeadamente, carnes e produtos derivados de carnes”.

 

  1. E que “no âmbito da sua atividade, o CAE  (código de atividades económicas) principal da Requerente corresponde ao 01470 (avicultura)”.

 

  1. E que também “se incluem ainda na atividade da Requerente como CAE secundários os seguintes: 001210 (viticultura), 00142 (criação de outros bovinos e búfalos, com exclusão da produção de leite), 001460 (suinicultura), 001702 (atividades e serviços relacionados com caça e repovoamento cinegético), 002100 (silvicultura e outras atividades florestais)”;

 

  1. Mais refere o seguinte: “E ainda o abate de aves (produção de carne) – CAE 010120”;

 

  1. E também “o comércio por grosso de carne e produtos à base de carne (046320), bem assim como processados à base de carne”;

 

  1. Assim como “outras industrias transformadoras diversas não especificadas (03996), incluindo penas”;

 

  1. Mais refere “E, finalmente, a produção elétrica de origem eólica, geotérmica, solar e outras não especificadas (035113) – tudo elementos constantes da fundamentação, pág.s 5 e 7 – sublinhados nossos”;

 

  1. Esclarece que “resulta do que antecede que a Requerente produz (para venda) quer bens (produtos) agrícolas, quer industriais (decorrentes da transformação daqueles bem como dos que adquiriu a terceiros), os quais são por si comercializados…”

 

  1. E termina, nesta parte, por realçar que na fundamentação se reconhece expressamente que “a Requerente, tem como «atividade principal a criação intensiva de aves, e posterior abate para comercialização das mesmas… procede ainda ao tratamento de penas, transformação de subprodutos de origem animal e possui uma unidade técnica de produção de fertilizantes orgânicos e corretivos do solo … possui um núcleo de reprodução …. E na freguesia do ... …é efetuada a engorda de Porco …e Gado Bovino”

 

  1. A A... foi objeto de uma ação de Inspetiva, de natureza interna, pela Autoridade Tributária, cf. Ordens de Serviço Internas n.ºs OI2020.../.../..., todas datadas de 27/01/2020, da Direção de Finanças de ..., relativas aos períodos de tributação de 2016, 2017 e 2018.

 

  1. A Requerida procedeu, conforme Relatório da Inspeção Tributária da Direção de Finanças de ..., a correções em IRC, relativamente aos exercícios de 2016, 2017 e 2018, no âmbito do Regime Fiscal de Apoio ao Investimento (RFAI), tendo em conta os setores de atividade económica em que esse benefício é aplicado e à atividade desenvolvida pela Requerente, que se encontra registada em dez códigos de atividade, como anteriormente se especifica.

 

  1. Referem-se os três anos em que se verificaram correções, 2016, 2017 e 2018, mas a Requerente somente impugna as correções relativas ao exercício de 2016 e relativamente ao benefício fiscal do RFAI[3]. E, por isso, este Tribunal cingir-se-á, obviamente, à matéria contestada.

 

  1. Questionada a Requerente sobre quais as atividades objeto das aplicações relevantes, inerentes aos investimentos efetuados no âmbito do benefício fiscal em causa (RFAI), a AT foi informada de que:

 

            “ (…)

“A atividade exercida, objeto das aplicações relevantes inerentes aos investimentos efetuados no âmbito destes benefícios fiscais, foi no âmbito dos investimentos associados ao CAE 10120, mais precisamente com base no aumento da capacidade das linhas de abate, com o aumento de uma terceira nave no centro de abate, embalagem e de frio.”

 

  1. Face à resposta dada, a ora Requerida concluiu que o CAE 10120 se refere ao Abate de Aves para produção de carne.

 

  1. E que, quer face ao Tratado sobre o Funcionamento da EU, designadamente no seu Anexo I, quer face aos Regulamentos Comunitários, em particular o Regulamento (CEE) n.º 2658/87, do Conselho, de 23/07, bem como ao Regulamento de Execução (UE)2017/1925, da Comissão, de 12/10/2017, relativos à nomenclatura pautal e estatística e à pauta aduaneira comum e, ainda, aos documentos do INE publicados anualmente e às Portarias que regulamentam o RFAI, designadamente, o n.º 1º da Portaria n.º 282/2014, de 30 de dezembro, aplicável ao RFAI por remissão do n.º 1 do artigo 22.º do CFI, que adiante se explanará, as atividades económicas da “produção agrícola primária e comercialização de produtos agrícolas, não são elegíveis para a concessão do RFAI”[4].

 

  1. Ou seja, segundo a Requerida, “Da leitura destes conceitos e da conjugação dos diversos diplomas supra referidos, resulta que, quando está em causa a atividade de «transformação de produtos agrícolas», apenas podem beneficiar do RFAI as atividades de transformação desses produtos, desde que o produto final dela resultante não seja um produto agrícola, de acordo com a definição prevista no art.º 38.º do TFUE e, como tal, não integra a lista constante do Anexo I deste Tratado”.

 

Ora, continua a Requerida,

 

  1. O produto final que resulta do abate das aves continua a ser um produto agrícola enumerado no anexo I do Tratado, uma vez que este anexo correspondente à Lista prevista no seu artigo 38.º, e (na parte que importa), integra os seguintes capítulos: «Capítulo 2 – Carnes e miudezas, comestíveis», «Capítulo 16 – Preparados de carne, de peixe, de crustáceos e de moluscos».

 

  1. E, portanto, conclui a Inspeção Tributária, que «quer a produção agrícola primária quer a transformação de produtos agrícolas de que resulte um produto agrícola enumerado no Anexo I do Tratado, encontra-se excluída do âmbito do RFAI».

 

  1. E que, assim sendo, a Requerente A... não pode beneficiar do RFAI, pois a atividade exercida, inserida no CAE 10 120, integra o conceito de “produção agrícola primária” e “transformação de produtos agrícolas em que o produto final continua a ser um produto agrícola”, enumerado no Anexo I do Tratado.

 

  1. Donde resulta que, segundo a Inspeção Tributária, “deve ser retirado do campo 355 do Quadro 10 da Declarações de Rendimentos Modelo 22 de IRC, dos períodos de 2016, a seguinte dedução à coleta ali declarada e respeitante ao benefício fiscal RFAI, o montante de € 71.891,95, no período de 2016”;

 

  1. O que a Requerida confirma, esplanada e fundamentadamente, em sede de Resposta.

 

  1.  Já em sede do presente processo arbitral, a Requerente, na sua PI, refere que à liquidação controvertida, respeitante ao exercício de 2016, corresponde o n.º 2020..., que deu lugar ao acerto de contas de 21.9.2020 e, em consequência desta, foram emitidas a Demonstração de Acerto de Contas e a Nota de Cobrança, na importância total de € 80.808,30, devidamente notificadas, as quais tendo sido recebidas em separado, fazem parte integrante da referida notificação do acerto de contas do IRC de 2016.

 

  1. A Requerente, por sua vez, invocou como fundamentos da sua não concordância, os seguintes argumentos:

 

  1. Em relação à Reclamação Graciosa oportunamente apresentada, alega que o ato de indeferimento da mesma enferma de nova omissão que assume um grau de censurabilidade ainda maior, por ignorar a matéria de facto por si aduzida, que conduz à ausência de descoberta da verdade material, com vista à tributação do lucro real, de modo compatível com a capacidade contributiva.

 

  1. Segundo a Requerente, os atos de 1.º e 2.º grau controvertidos que enfermam os vícios que fundamentam o pedido de pronúncia arbitral – PI – são os seguintes:

 

  1. Violação de lei por erro de facto e de direito;
  2. Incluindo a inexistência parcial de facto tributário;
  3. Em virtude da violação das normas de incidência tributária e do conteúdo dos benefícios fiscais concretamente aplicáveis;
  4. A inconstitucionalidade das normas aplicadas;
  5. Ou, pelo menos, da interpretação que delas foi feita;
  6. Bem ainda como vício da fundamentação legalmente exigida,
  7. Também por erro, omissão, obscuridade e contradição;
  8. Quer do ato de liquidação, quer do ato de indeferimento da reclamação graciosa tempestivamente apresentada.

 

Esta matéria dos alegados vícios será apreciada em sede do Direito aplicável

 

  1. Volta a realçar-se que a Impugnação Arbitral contesta apenas a liquidação adicional de IRC do ano de 2016 n.º 2020..., que deu lugar ao acerto de contas de 21.9.2020, que tem a ver com correções respeitantes ao RFAI.

 

  1. E fundamenta da seguinte forma o que considera os invocados vícios:

 

  1. A Requerente, reportando-se ao ato tributário, sua produção, notificação e outros pedidos conexos IRC 2016 – Liquidação 2020..., refere-se às ordens de serviço OI2020.../.../..., datadas de 27.01.20, de que resultaram correções, para mais, dos valores de IRC nos montantes de € 71.891,95 relativos a 2016, conforme referido anteriormente.

 

  1. Ou seja, a Liquidação de IRC n.º 2020 ..., relativa ao exercício de 2016, com data de 17.09.2020, apresenta como resultado um valor a reembolsar de € 121.422,15, em que se incluem indevidamente juros compensatórios no valor de € 8.916,35, sendo, portanto, o IRC de € 112.505,80.                                                                                                                  

 

  1. Porém, na Demonstração de Acerto de Contas, da mesma data, Doc. 2020..., constata-se que, foram feitos acertos de contas à Liquidação n.º 2020..., no valor a reembolsar de € 121.422,15, face às correções efetuadas:

 

  1. Assim,
    1. Liquid. 2017... -        (+)  € 202.230,45  - 1.ª liquidação
    2. Liquid.2020...-           (-)  € 130.338,50[5]-   Liq. contestada
    3. Acerto contas              (=) (+) €   71.891,95
    4. Liquidação 2020 157297  -    (+) €     8.916,35 - j.c. receb. indev.te

Valor a pagar, cf. Notificação, de  €  80.808,30

 

  1. Ou seja, as correções fiscais aos benefícios do RFAI na liquidação n.º 2020..., de 17/09/2020, antes referida, demonstram-se da seguinte forma:

 

 

                                                            Liquid. Anterior               Liquid. em causa 

 

            Coleta total…………………. (+) 250.098,64               (+)250.098,64

(-) Benefícios Fiscais………   (-)  133.978,13 ---à          (-)   6 2.086,18

                                              = (+) 116.120,51               (+)188.012,46

 

(-) Pagam. P/c Autón. ……...   (-)  339.978,13              (-)  339.978,13

(-) Pagam. Adic. P/C………    (-)      8.325,57              (-)     8.325,57

                             Soma P/C     (-)  347.457,99______  (-) 347.457,99

 

     IRC a recuperar[6]………….  (-)  231.337,48             (-)  159.445,53

(+) Derrama Municipal …        (+)   17.907,05             (+)   17.907,05

      1.º Resultado parcial………(-)  213.430,43             (-)  141.538,48    

(+) Tributaç. Autónomas            (+)   11.199,98              (+)   11.199,98

       2.º Resultado parcial             (-)  202. 230,45             (-)  130.338,50

 (+) Juros compensatórios por recebimento indevido    (+)     8.916,35                                                           

                                                                                        (-) 121.422,15

 

Donde, dada a redução do valor de IRC a receber, por correção dos benefícios

fiscais respeitantes ao RFAI (de € 133.978,13 para € 62.086,18), resulta um

pagamento de € 80.808,10, tendo em atenção que a AT considerou, e bem, o

lançamento de juros compensatórios no valor de € 8.916,35 por recebimento

de reembolso de IRC superior ao devido, como consta da Demonstração de

Acerto de Contas de 21/09/2020, com a Ref.ª ID, Documento 2020 ... .

 

                      Assim,

 

O valor a pagar, conf. notificação é da importância de € 80.808,30

 

  1. E cujos fundamentos das correções constantes do Relatório de Inspeção foram notificados à Requerente.

 

IV -  DO DIREITO APLICÁVEL

 

  1. A Requerente não concorda com a liquidação efetuada n.º 2020..., atrás explicitada, por considerá-la controvertida por indevida, e que deu lugar ao acerto de contas de 21.9.2020 e à Demonstração de Acerto de Contas e respetiva Nota de Cobrança no valor a pagar de IRC para o exercício de 2016 e ainda juros compensatórios no valor € 8.916,35, com prazo limite de pagamento até 9.11.2020, pelo que prestou a correspondente garantia bancária que lhe foi fixado pela AT.

 

  1. Vem referir que por não lhe ter sido comunicada a realização da inspeção interna, requereu o teor da mesma.

 

  1. Por outro lado, requereu esclarecimento quanto à conclusão do relatório de inspeção em 26.8.20 ou apenas mera suspensão e, ainda, que que lhe fossem notificados todos os despachos de delegação ou de subdelegação que habilitaram o autor do ato (que diz estar em crise), tendo em atenção o valor máximo dos montantes objeto de delegação e de subdelegação.

 

  1. Porque não obteve resposta, ficou a Requerente a aguardar tais esclarecimentos com o processo administrativo, sob pena de dever ser anulado o processo por via formal do mesmo e incompetência do autor do ato tributário.

 

  1. Esclarece-se, desde já, que o procedimento de inspeção interna em apreço, aberto pelas OI2020.../.../..., datadas de 27.01.20, e devidamente qualificado como tal, nos termos do artigo 13.º do RCPIT, sem que essa classificação tenha sido posta em causa, não tem que ser notificada previamente à Requerente, apenas tendo conhecimento de que está a ser inspecionada, caso seja notificada já na fase dos atos inspetivos, para prestar qualquer esclarecimento, como foi o caso e, no final, do Projeto de Relatório, para efeitos do exercício do direito de audição, nos termos do n.º 1, alínea d) ou alínea e), do artigo 60.º da LGT o artigo 60.º do RCPITA.

 

  1.  Quanto às delegações ou subdelegações de competência para determinar a realização  da inspeção interna, constata-se do Relatório junto com o processo administrativo, no seu Ponto II.1 que as Ordens de Serviço OI2020.../OI2020.../OI2020..., todas datadas de 27/01/2020, do Diretor de Finanças de ..., que é a entidade máxima no distrito, que tem competência territorial originária, conforme art.º 16.º, n.º 1, al. c) do RCPITA – Regime Complementar de inspeção Tributária, onde se ordena por competência própria, aos Inspetores Tributários e Aduaneiros F... e G..., a realização da Inspeção Tributária.

 

  1. Não havendo, portanto, lugar à indicação de despachos de delegação ou subdelegação.

 

  1. Para além das questões antes referidas, a Requerente aponta ainda um conjunto de vícios de que enfermam os atos – de indeferimento da reclamação graciosa e da liquidação adicional, que se traduziu em correções para mais no valor de € 71.891,95 (€ 133.978,13 - € 62.086,18), por redução dos benefícios do RFAI, como antes se pormenoriza.

 

  1. Quanto ao de indeferimento da reclamação graciosa, remete o Tribunal para a informação prestada sobre a mesma e incorporada nos autos.

 

  1. Assim, relativamente a estes alegados vícios, importa referir que a AT – Autoridade Tributária, depois de fazer uma descrição sumária das alegações da Reclamante no processo de reclamação, de seguida descreve os factos, procede à sua análise,

 

  1. Fazendo, designadamente, um enquadramento legal do RFAI, remetendo para o que se encontra previsto nos artigos 22.º a 26.º do novo Código Fiscal do Investimento (CFI), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 162/2014, de 31 de outubro, aplicável aos períodos iniciados após 1 de janeiro de 2014, encontrando-se regulamentado na Portaria n.º 297/2015, de 21 de setembro e na Portaria n.º 282/2014, de 30 de dezembro.

 

  1. Mais refere a AT na apreciação da reclamação que o n.º 2 do artigo 1.º do CFI estabelece que “O regime de benefícios contratuais ao investimento produtivo e o RFAI constituem regimes de auxílio com finalidade regional aprovados nos termos do Regulamento (EU) n.º 651/2014, da Comissão, de 16/6/2014, que declara certas categorias de auxílio compatíveis com o mercado interno, em aplicação dos artigos 107.º e 108.º do Tratado, publicado no Jornal Oficial da União Europeia n.º L 187, de 26/6/2014 (adiante Regulamento Geral de Isenção por Categoria ou RGIC)”.

 

  1. E a AT continua a sua fundamentação, realçando também que “para se analisar se o (ora) Reclamante pode beneficiar do RFAI, no âmbito do CAE de atividade 10120 – Abate de aves (Produção de carne), tem de se analisar não só à luz do CFI e da regulamentação constante das portarias referentes ao RFAI, como também do Regulamento Comunitário (RGIC) ao abrigo do qual o regime foi criado”.

 

  1. Assim, mais refere a AT que “de acordo com o n.º 1 do artigo 22.º do CFI, «O RFAI é aplicável aos sujeitos passivos de IRC que exerçam uma atividade nos setores especificamente previstos no n.º 2 do artigo 2.º, tendo em consideração os códigos de atividade definidos na Portaria prevista no n.º 3 do referido artigo, com exceção das atividades excluídas do âmbito setorial de aplicação das OAR (Orientações relativas aos auxílios estatais com finalidade regional para 2014-2020) e do RGIC (Regulamento Geral de Isenção por Categoria)”».

 

  1. Refere ainda que “A Portaria n.º 282/2014, de 30 de dezembro, que definiu os códigos da CAE (Rev. 3) relativos aos setores de atividade elegíveis para efeitos da concessão de benefícios fiscais, é, também, aplicável ao RFAI, por força da remissão prevista no n.º 1 do artigo 22.º do CFI”.

 

  1. Porém, diz a AT, “o artigo 1.º da Portaria n.º 282/2014 determina que, em conformidade com as OAR e com o RGIC, não são elegíveis para a concessão de benefícios fiscais os projetos de investimento que tenham por objeto as atividades económicas dos setores (entre outros) da produção agrícola primária e da transformação e comercialização de produtos agrícolas enumerados no Anexo I do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (doravante TFUE ou Tratado)”.

 

  1.  E que, “embora a alínea b) do artigo 2.º da mesma portaria refira que as atividades económicas correspondentes a indústrias transformadoras com o código da CAE compreendido nas divisões 10 a 33 podem beneficiar do RFAI, o corpo deste artigo é bem explícito quando refere “Sem Informação prejuízo das restrições previstas no artigo anterior”.

 

  1. E que “Por outro lado, o n.º 1 do artigo 2.º da Portaria n. º 297/2015 de 21 de setembro, que regulamenta o RFAI, refere que “Para efeitos da determinação do âmbito setorial estabelecido na Portaria n.º 282/2014 (…) aplicam-se as definições relativas a atividades económicas estabelecidas no artigo 2.º do RGIC”.

 

  1.  E que “O artigo 2.º do Regulamento (UE) n. ° 651/2014 (RGIC) dispõe, nos seus pontos 10) e 11), que, para efeitos do referido regulamento, entende-se por «Transformação de produtos agrícolas», qualquer operação realizada sobre um produto agrícola de que resulte um produto que continua a ser um produto agrícola e por «Produto agrícola» um produto enumerado no anexo I do Tratado”.

 

  1. E concluindo: “Logo, face ao disposto no artigo 1.º da Portaria n.º 282/2014, de 30 de dezembro, não são elegíveis para a concessão do RFAI os projetos de investimento que tenham por objeto, entre outras, as atividades económicas da produção agrícola primária e da transformação e comercialização de produtos agrícolas, enumerados no Anexo I do Tratado”.

 

  1. Donde, “Da leitura destes conceitos e da conjugação dos diversos diplomas suprarreferidos, resulta que, quando está em causa a atividade de “transformação de produtos agrícolas", apenas pode beneficiar do RFAI as atividades de transformação destes produtos desde que o produto final dela resultante não seja um produto agrícola, de acordo com a definição prevista no art.º 38.º do TFUE e, como tal, não integre a lista constante do Anexo I deste Tratado”.

 

  1. Finalmente, “Cabe agora verificar se a atividade exercida pela A..., se identifica com a produção agrícola primária e com a transformação e comercialização de produtos agrícolas enumerados no anexo I do Tratado. Conforme já se referiu, a atividade desenvolvida pelo sujeito passivo que foi objeto das aplicações relevantes inerentes aos investimentos efetuados no âmbito do RFAI, foi no CAE 10120 - Abate de Aves (Produção de Carne)”.

 

  1. E que “Neste caso, o produto final que resulta do abate das aves continua a ser um produto agrícola enumerado no anexo I do Tratado, uma vez que este anexo, correspondente à Lista prevista no seu artigo 38.º, e na parte que nos interessa, integra os seguintes capítulos: «Capítulo 2 - Carnes e miudezas, comestíveis», «Capítulo 16 - Preparados de carne, de peixe, de crustáceos e de moluscos».

 

  1.  Diz a AT que “Para esta análise recorreu-se ao Regulamento (CEE) n.º 2658/87 do Conselho, de 23/07, e ao Regulamento de Execução (UE) 2017/1925 da Comissão, de 12 de outubro de 2017, relativos à nomenclatura pautal e estatística e à pauta aduaneira comum (Nomenclatura Combinada), e também aos documentos (respeitantes a 2016, 2017 e 2018), que são publicados anualmente pelo Instituto Nacional de Estatística (INE) sobre o mesmo tema”.

 

  1. E que, “conforme já referido, quer a produção agrícola primária quer a transformação de produtos agrícolas de que resulte um produto agrícola enumerado no Anexo I do Tratado, encontra-se excluída do âmbito do RFAI, por força do disposto no art.º 1.º da Portaria n.º 282/2014, de 30 de dezembro, aplicável ao RFAI por remissão do n.º 1 do art.º 22.º do CFI, e do próprio n.º 1 do art.º 22.º deste diploma, que na sua parte final, exceciona do âmbito de aplicação do referido regime as atividades excluídas do âmbito setorial de aplicação das OAR e do RGIC”.

 

  1. E ainda que: “Em face do exposto, conclui-se que, a A... não pode beneficiar do RFAI, pois a atividade exercida, inserida no CAE 10 120, integra o conceito de “produção agrícola primária” e “transformação de produtos agrícolas em que o produto final continua a ser um produto agrícola”, enumerado no Anexo I do Tratado”.

 

  1. Assim, “Deste modo, andaram bem os serviços de inspeção ao retirar ao campo 355 do Quadro 10 da Declaração de Rendimentos Modelo 22 de IRC, do período analisado (ano 2016), a dedução à coleta declarada e referente ao benefício fiscal RFAI, no montante de € 71.891,95”.

 

  1. Pelo que a AT “conclui a sua análise referindo que quer a produção agrícola quer a transformação de produtos agrícolas, de que resulte um produto agrícola enumerado no Anexo I do Tratado, encontram-se excluídas do âmbito do RFAI, por força do n.º 1 da Portaria n.º 282/2014, de 30 de dezembro, aplicável ao RFAI por remissão do n.º 1º do artigo 22.º do CFI, e do próprio n.º 1 do art.º 22.º desse diploma, que na sua parte final, exceciona do âmbito de aplicação do referido regime as atividades do âmbito setorial de aplicação das OAR Orientações Relativas aos Auxílios com Finalidade Regional para o período de 2014-2020, publicadas no Jornal Oficial da EU, n.º C 209, de 23/7/2013 e do Regulamento (EU) n.º 651/2014, da Comissão, de 16/06/2014, que declara certas categorias de auxílio compatíveis com o mercado interno, em aplicação dos artigos 107.º e 108.º do Tratado (RGIC)”.

 

  1. Este Tribunal assume que a fundamentação do Relatório de Inspeção e da informação que subjaz ao indeferimento da Reclamação é suficiente e esclarecedora para justificar o indeferimento da reclamação graciosa e a prática do ato tributário de liquidação com o n.º 2020..., atrás explicitada, que deu lugar ao acerto de contas de 21.9.2020 e à Demonstração de Acerto de Contas e respetiva Nota de Cobrança no valor a pagar de IRC para o exercício de 2016 e ainda juros compensatórios no valor € 8.916,35, no total a pagar de € 80.808,30, com prazo limite de pagamento até 9.11.2020, o que a Requerente não fez, pelo que prestou a correspondente garantia bancária que lhe foi fixado pela AT.

 

  1. Acerca da alegação de que o artigo 1.º da Portaria n.º 282/2014, de 30/12, introduz uma limitação adicional de âmbito ao artigo 22.º, n.º 1 do CFI, a mesma não tem fundamento no caso, uma vez que é o próprio artigo 22.º, n.º 1 do CFI que excetua de forma expressa do benefício do RFAI as atividades excluídas do âmbito sectorial de aplicação do RGIC e das OAR. De referir que estes últimos excluem a produção agrícola primária e a transformação e comercialização de produtos agrícolas (sendo que produto agrícola também é aquele que resulta de transformação e continua a constituir um produto agrícola), pelo que não se verifica a alegada inconstitucionalidade por violação do princípio da legalidade/reserva de lei, dado que os elementos essenciais do imposto estão fixados na lei e não na(s) Portaria(s);

 

  1. A exclusão de um segmento da atividade produtiva (a agrícola) do acesso ao benefício fiscal, que fica restrito a uma parte da atividade (a industrial), não desrespeita o princípio da igualdade porquanto estamos perante atividades distintas, que não reclamam idêntico tratamento. Nem se trata de uma distinção arbitrária, pois deriva de escolhas legítimas do legislador – europeu e nacional – que por razões de política económica pretendeu incentivar o desenvolvimento de determinados setores e não outros. Por razões similares, também não é arbitrária a seletividade de certas atividades industriais para o benefício, deixando outras de fora. Aliás, cabe aos Estados-Membros, dentro do leque de auxílios permitidos (com dispensa de notificação prévia) previstos pelo RGIC, escolher aqueles que entenda deverem beneficiar desses auxílios (neste caso fiscais), não existindo qualquer obrigação de o fazer, nem de o fazer com uma extensão ou latitude pré-determinada;

 

  1. Não se compreende a alegação de que resultam falseadas as trocas comerciais com outros Estados-Membros, ou de que ocorre violação da livre circulação de bens e prestação de serviços prevista no TFUE, pois a questão não se suscita especificamente em relação a transações transfronteiriças, nem a Requerente concretiza de que forma e em que medida tal violação teria lugar;

 

  1. Tratando-se de um benefício fiscal, e tendo a AT enquadrado corretamente a atividade da Requerente nas exclusões previstas no regime do RFAI (CFI, RGIC e OAR), cabia à Requerente, o ónus de demonstração dos pressupostos de acessibilidade ao benefício, nomeadamente a sua conexão à sua atividade secundária e ainda que os produtos agrícolas transformados já não eram produtos agrícolas, ou que tinham sido adquiridos (e em que medida) a terceiros, ou que não eram subsidiados.

 

  1. Não se identifica qualquer ininteligibilidade na argumentação da AT, tendo a Requerente percecionado o seu teor, como revela a extensa e prolixa oposição que, quer em sede de procedimento gracioso, quer na presente ação arbitral, deduziu contra o ato de liquidação;

 

  1. Por fim sobre a questão de a não aplicação do RFAI implicar a dedução (à coleta) de outros incentivos que não foram deduzidos porque a coleta tinha sido inicialmente absorvida pelo RFAI, trata-se de uma alegação que não põe em crise a correção do RFAI, não tendo o sujeito passivo feito prova dos incentivos que alega, nem do seu montante;

 

  1. Sobre os princípios da verdade material e de tributação pelo lucro real a Requerente não explicita as concretas razões da sua invocação e em que medida foram infringidos;

 

Daqui se conclui que a Requerente não pode beneficiar do RFAI porque a atividade exercida integra o conceito de “produção agrícola primária” e de “transformação de produtos agrícolas em que o produto final continua a ser um produto agrícola”, em linha com a fundamentação da Requerida.

 

  1. Donde, não tem fundamento qualquer os vícios invocados pela Requerente.

 

  1. Os restantes vícios invocados pela Requerente são os seguintes:

 

  1. Violação de lei por erro de facto e de direito, incluindo a inexistência de facto tributário;
  2. Violação das normas de incidência tributária e do conteúdo dos benefícios fiscais concretamente aplicáveis;
  3. Inconstitucionalidade das normas aplicáveis, ou, pelo menos, da interpretação que delas foi deito;
  4. Vício da fundamentação legalmente exigida, por erro, omissão, obscuridade e contradição.

   

  1. Tal como também foi antes referido, a questão essencial e contestada tem a ver com a aplicação do Regime Fiscal de Apoio ao Investimento (RFAI), que a Requerente, de forma confusa, expressa o entendimento segundo o qual o seu âmbito de aplicação abrange todas as atividades das indústrias transformadoras, por conjugação do artigo 2.º do CFI e artigo 2.º, alínea b) da Portaria n.º 383/2014, concluindo então que as atividades com os códigos CAE 010120 e 032996 podem ter acesso a este benefício fiscal.

 

  1. De realçar, portanto, que a questão a dirimir consiste em saber se os investimentos relacionados com a atividade da Requerente, no setor da transformação e comercialização de produtos de carne, em concreto no abate de aves, para produção de carnes correspondente ao código 10120 da CAE-Ver.3, se enquadram ou não no âmbito de aplicação do RFAI e, consequentemente, se poderão beneficiar da redução à coleta de IRC do exercício de 2016, em face da interpretação do artigo 2.º e 22.º do CFI e artigos 1.º e 2.º da Portaria n.º 282/2014 e demais legislação aplicável, bem como do quadro legislativo europeu relevante.

 

  1. Para demonstrar que a argumentação da Requerente não tem, no entendimento do Tribunal, qualquer fundamento, remete-se, desde já, para a Resposta apresentada pela Requerida, elaborada pela Direção de Serviços Jurídicos e do Contencioso, constante dos autos, e relevante para a situação em apreciação e que se resume, cf. Art.ºs 30.º e seguintes da sua Resposta:

 

(…)

 

  1. Que “O objeto social é descrito como consistindo em atividades pecuárias, agrícolas, cinegéticas, bem como todas as atividades conexas, mas o código CAE 01470 (avicultura) indicado como referente à atividade principal integrado na divisão 01 – agricultura, produção animal, caça e atividades dos serviços mencionados”.

 

  1. E ainda que “Os 9 códigos CAE das atividades secundárias integram a Divisão 01, 02 (silvicultura e exploração florestal), 10 (indústrias alimentares), divisão 35 (produção de energia), divisão 46 (comércio por grosso)”.

 

  1. “Mais refere que os investimentos que justificam o RFAI destinam-se à produção de inúmeros produtos de comércio da Requerente resultantes da transformação de produção própria e alheia, consistindo em ativos adquiridos para melhoria de atividade industrial e posterior embalagem e frio de carnes, incluindo cozinha industrial, atividades com os códigos CAE 010120, 032996 e 046320, concluindo (a Requerente) que são inequivocamente abrangidos pelo RFAI (art.º 22.º do CFI)”.

 

  1. “(…) como se demonstrará os investimentos realizados pela Requerente não são manifestamente elegíveis para a concessão do benefício fiscal do RFAI e a liquidação adicional resultante da correção promovida pelos SIL não enferma dos vícios que lhe são acometidos pela Requerente”.

 

  1. “Tanto no RIT como na decisão sobre na reclamação graciosa é defendido que a actividade desenvolvida pelo sujeito passivo que foi objeto das aplicações relevantes inerentes aos investimentos efetuados no âmbito do RFAI, foi no CAE 10120 - Abate de Aves (Produção de Carne), sendo que o produto final que resulta do abate das aves continua a ser um produto agrícola enumerado no anexo I do Tratado, integrado nos capítulos: «Capítulo 2 - Carnes e miudezas, comestíveis» e «Capítulo 16 - Preparados de carne, de peixe, de crustáceos e de moluscos»”.

 

  1. Com efeito, quer a produção agrícola primária quer a transformação de produtos agrícolas de que resulte um produto agrícola enumerado no Anexo I do Tratado, encontram-se excluídas do âmbito do RFAI, por força do disposto no art.º 1.º da Portaria n.º 282/2014, de 30 de dezembro, aplicável ao RFAI por remissão do n.º 1 do art.º 22.º do CFI, e do próprio n.º 1 do art.º 22.º do CFI, que na sua parte final, exceciona do âmbito de aplicação do referido regime as atividades excluídas do âmbito sectorial de aplicação das Orientações Relativas aos Auxílios com Finalidade Regional para o período 2014-2020, publicadas no Jornal Oficial da União Europeia, nº C 209, de 23 de Julho de 2013 (OAR) e do Regulamento (UE) n.º 651/2014, da Comissão, de 16 de Junho 2014 que declara certas categorias de auxílio compatíveis com o mercado interno, em aplicação dos artigos 107.o e 108.o do Tratado (RGIC).

 

  1. Consequentemente, concluem correta e cristalinamente que a Requerente não pode beneficiar do RFAI, pois a atividade exercida, inserida no CAE 10 120, integra o conceito de “produção agrícola primária” e “transformação de produtos agrícolas em que o produto final continua a ser um produto agrícola”, enumerado no Anexo I do Tratado.

 

  1. Assim a questão a dirimir prende-se em saber se os investimentos relacionados com a atividade da Requerente no sector da transformação e comercialização de produtos de carne, em concreto no abate de aves (produção de carne) correspondente ao código 10120 da CAE-Rev3, se enquadram no âmbito de aplicação do RFAI, podendo beneficiar da dedução à coleta de IRC do exercício de 2016, em face da interpretação do artigo 2º e 22º do CFI, artigos 1.º e 2.º da Portaria n.º 282/2014 e demais legislação aplicável, bem como do quadro legislativo europeu relevante.

 

  1. O que está, portanto, em causa é o direito ou não a benefícios fiscais, no caso em apreço os denominados benefícios do RFAI, que decorrem do Capítulo III, artigos 2.º, 22.º e segs do Código Fiscal ao Investimento, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 162/2014, de 31 de Outubro, que revogou o referido Código, a partir de 05.11.2014 e republicado pelo Decreto-Lei n.º 82/2013, de 17 de junho, aplicável aos períodos de tributação iniciados a partir de 1 de janeiro de 2014 e artigos 1.º e 2.º da Portaria n.º 282/2014 e demais legislação aplicação, bem como do quadro legislativo europeu relevante.

 

  1. É neste Código Fiscal ao Investimento, no seu artigo 1.º, alínea b), que se regulamenta o RFAI – Regime Fiscal ao Investimento e nos seus artigos 1.º, 4.º  e 22.º se define:

 

“CAPÍTULO I
Objeto

Artigo 1.º
Objeto

1 - O Código Fiscal do Investimento, doravante designado por Código, estabelece:

a) O regime de benefícios fiscais contratuais ao investimento produtivo;

b) O Regime Fiscal de Apoio ao Investimento (RFAI);

c) O sistema de incentivos fiscais em investigação e desenvolvimento empresarial II (SIFIDE II); e

d) O regime de dedução por lucros retidos e reinvestidos (DLRR).

2 - O regime de benefícios fiscais contratuais ao investimento produtivo e o RFAI constituem regimes de auxílios com finalidade regional aprovados nos termos do Regulamento (UE) n.º 651/2014 da Comissão, de 16 de junho de 2014, que declara certas categorias de auxílio compatíveis com o mercado interno, em aplicação dos artigos 107.º e 108.º do Tratado, publicado no Jornal Oficial da União Europeia, n.º L 187, de 26 de junho de 2014 (adiante Regulamento Geral de Isenção por Categoria ou RGIC).

3 - O DLRR constitui um regime de incentivos fiscais ao investimento em favor de micro, pequenas e médias empresas aprovado nos termos do RGIC.

 

CAPÍTULO II
Benefícios fiscais contratuais ao investimento produtivo

SECÇÃO I
Âmbito de aplicação

Artigo 2.º
Âmbito objetivo

1 - Até 31 de dezembro de 2021, podem ser concedidos benefícios fiscais, em regime contratual, com um período de vigência até 10 anos a contar da conclusão do projeto de investimento, aos projetos de investimento, tal como são caracterizados no presente capítulo, cujas aplicações relevantes sejam de montante igual ou superior a 3 000 000 €€. (Redação da Lei n.º 21/2021, de 20 de abril) (*) (*) - A presente lei produz efeitos desde 1 de janeiro de 2021.

2 - Os projetos de investimento referidos no número anterior devem ter o seu objeto compreendido, nomeadamente, nas seguintes atividades económicas, respeitando o âmbito sectorial de aplicação das orientações relativas aos auxílios com finalidade regional para o período 2014-2020, publicadas no Jornal Oficial da União Europeia, n.º C 209, de 23 de julho de 2013 (OAR) e do RGIC:

a) Indústria extrativa e indústria transformadora;

b) Turismo, incluindo as atividades com interesse para o turismo;

c) Atividades e serviços informáticos e conexos;

d) Atividades agrícolas, aquícolas, piscícolas, agropecuárias e florestais;

e) Atividades de investigação e desenvolvimento e de alta intensidade tecnológica;

f) Tecnologias da informação e produção de audiovisual e multimédia;

g) Defesa, ambiente, energia e telecomunicações;

h) Atividades de centros de serviços partilhados.

3 - Por portaria dos membros do Governo responsáveis pelas áreas das finanças e da economia são definidos os códigos de atividade económica (CAE) correspondentes às atividades referidas no número anterior.

 

CAPÍTULO III
Regime fiscal de apoio ao investimento

Artigo 22.º
Âmbito de aplicação e definições

1 - O RFAI é aplicável aos sujeitos passivos de IRC que exerçam uma atividade nos setores especificamente previstos no n.º 2 do artigo 2.º, tendo em consideração os códigos de atividade definidos na portaria prevista no n.º 3 do referido artigo, com exceção das atividades excluídas do âmbito sectorial de aplicação das OAR e do RGIC.

(…)

 

  1. E, ainda, a Portaria n.º 282/2014, de 30 de dezembro sobre esta matéria:

 

Resumo: Define os códigos de atividade económica (CAE) correspondentes a várias atividades.

Publicação: Diário da República n.º 251/2014, Série I, de 30/12.

Legislação associada: Decreto-Lei n.º 162/2014 – 31/10 Histórico de alterações:

 

Através do Decreto-Lei n.º 162/2014, de 31 de outubro, o Governo aprovou o novo Código Fiscal do Investimento.

 

O regime de benefícios fiscais aprovado pelo Código Fiscal do Investimento aplica-se a projetos de investimento produtivo cujo objeto esteja compreendido nas atividades económicas previstas no n.º 2 do artigo 2.º

 

O n.º 3 do mesmo artigo estabelece que, por portaria conjunta dos membros do Governo responsáveis pelas áreas da economia e das finanças, são definidos os códigos de atividade económica (CAE) correspondentes a essas atividades.

 

Atendendo à necessidade de observar as normas e demais atos emanados das instituições, órgãos e organismos da União Europeia em matéria de auxílios estatais, nomeadamente as Orientações relativas aos auxílios estatais com finalidade regional para 2014-2020, publicadas no Jornal Oficial da União Europeia n.º C 209/1, de 27 de julho de 2013 e o Regulamento (UE) n.º 651/2014, de 16 de junho de 2014, que aprovou o Regulamento Geral de Isenção por Categoria, publicado no Jornal Oficial da União Europeia n.º C 187/1, de 26 de junho de 2014, são também definidos na presente portaria os setores de atividade excluídos da concessão de benefícios fiscais. Assim:

 

Manda o Governo, pelos Ministros de Estado e das Finanças e da Economia, ao abrigo do n.º 3 do artigo 2.º do Código Fiscal do Investimento, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 162/2014, de 31 de outubro, e nos termos e para os efeitos previstos no n.º 2 do artigo 2.º do mesmo Código, o seguinte:

 

Artigo 1.º - Enquadramento comunitário

 

Em conformidade com as Orientações relativas aos auxílios estatais com finalidade regional para 2014- 2020, publicadas no Jornal Oficial da União Europeia n.º C 209, de 27 de julho de 2013 e com o Regulamento (UE) n.º 651/2014, de 16 de junho de 2014, publicado no Jornal Oficial da União Europeia n.º C 187, de 26 de junho de 2014 (Regulamento Geral de Isenção por Categoria), não são elegíveis para a concessão de benefícios fiscais os projetos de investimento que tenham por objeto as atividades económicas dos setores siderúrgico, do carvão, da pesca e da aquicultura, da produção agrícola primária, da transformação e comercialização de produtos agrícolas enumerados no anexo i do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, da silvicultura, da construção naval, das fibras sintéticas, dos transportes e das infraestruturas conexas e da produção, distribuição e infraestruturas energéticas.

Artigo 2.º Âmbito setorial

 

Sem prejuízo das restrições previstas no artigo anterior, as atividades económicas previstas no n.º 2 do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 162/2014, de 31 de outubro, correspondem aos seguintes códigos da Classificação Portuguesa de Atividades Económicas, Revisão 3 (CAE-Rev.3), aprovada pelo Decreto-Lei n.º 381/2007, de 14 de novembro:

 

a) Indústrias extrativas - divisões 05 a 09;

 

b) Indústrias transformadoras - divisões 10 a 33;

(…)

 

Artigo 2.o - Definições

Para efeitos do presente regulamento, entende-se por:

1) «Auxílio», qualquer medida que preencha todos os critérios enunciados no artigo 107.o, n.o 1, do Tratado;

2) «Pequenas e médias empresas» ou «PME», as empresas que preenchem os critérios enunciados no anexo I;

3) «Trabalhador com deficiência», qualquer pessoa que:

a) É reconhecida como trabalhador com deficiência ao abrigo do direito nacional; ou

b) Tem uma ou mais incapacidades prolongadas de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, que, em conjugação com diversas barreiras, podem obstar à sua participação plena e efetiva num ambiente laboral, em igualdade de condições com os demais trabalhadores;

4) «Trabalhador desfavorecido», qualquer pessoa que:

a) Não tenha exercido de forma regular, nos últimos seis meses, uma atividade profissional remunerada; ou

b) Tenha entre 15 e 24 anos de idade; ou

c) Não tenha atingido um nível de ensino ou de formação profissional correspondente ao ensino secundário (Classificação Internacional Tipo da Educação 3) ou tenha terminado a sua formação a tempo inteiro no máximo há dois anos e que não tenha obtido anteriormente um primeiro emprego regular e remunerado; ou

d) Tenha mais de 50 anos de idade; ou

e) Seja um adulto que vive só e com uma ou mais pessoas a cargo; ou

f) Trabalhe num setor ou profissão num Estado-Membro caracterizado por um desequilíbrio entre os géneros que é superior em 25 % ou mais ao desequilíbrio médio entre os géneros em todos os setores económicos nesse Estado-Membro, e pertença a esse grupo sub-representado; ou

g) Faça parte de uma minoria étnica num Estado-Membro e necessite de desenvolver o seu perfil linguístico, de formação profissional ou de experiência laboral, a fim de aumentar as suas perspetivas de aceder a um emprego estável;

5) «Transporte», o transporte de passageiros por via aérea, marítima, rodoviária, ferroviária e por vias navegáveis interiores ou serviços de transporte de mercadorias por conta de outrem;

6) «Custos de transporte», os custos de transporte por conta de outrem efetivamente pagos pelos beneficiários, por trajeto, incluindo:

a) Tarifas de frete, custos de manuseamento e custos de armazenagem temporária, na medida em que estes custos se relacionem com o trajeto;

b) Custos dos seguros aplicados à carga;

c) Impostos, direitos ou contribuições aplicados à carga e, se aplicável, ao porte bruto, tanto no ponto de origem como no ponto de destino; e

d) Custos de controlo de segurança e proteção, e sobretaxas para os custos acrescidos do combustível;

7) «Regiões periféricas», as regiões ultraperiféricas, Malta, Chipre, Ceuta e Melilha, as ilhas que fazem parte do território de um Estado-Membro e as zonas escassamente povoadas;

8) «Comercialização de produtos agrícolas», a detenção ou a exposição com vista à venda, a colocação à venda, a entrega ou qualquer outra forma de colocação no mercado, exceto a primeira venda por um produtor primário a revendedores e transformadores e qualquer atividade de preparação de um produto para a primeira venda; a venda por um produtor primário aos consumidores finais deve ser considerada comercialização quando efetuada em instalações específicas reservadas a tal fim;

9) «Produção agrícola primária», a produção de produtos da terra e da criação animal, enumerados no anexo I do Tratado, sem qualquer outra operação que altere a natureza de tais produtos;

10) «Transformação de produtos agrícolas», qualquer operação realizada sobre um produto agrícola de que resulte um produto que continua a ser um produto agrícola, com exceção das atividades realizadas em explorações agrícolas necessárias à preparação de um produto animal ou vegetal para a primeira venda;

11) «Produto agrícola», um produto enumerado no anexo I do Tratado, exceto os produtos da pesca e da aquicultura constantes do anexo I do Regulamento (UE) n.o 1379/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de dezembro de 2013;

12) «Regiões ultraperiféricas», as regiões definidas no artigo 349.o do Tratado. De acordo com a Decisão 2010/718/UE do Conselho Europeu, de 1 de janeiro de 2012, São Bartolomeu deixou de ser uma região ultraperiférica; De acordo com a Decisão 2012/419/UE do Conselho Europeu, de 1 de janeiro de 2014, Maiote passou a ser uma região ultraperiférica.

13) «Carvão», os carvões de nível alto, médio ou baixo das classes A e B, na aceção da classificação estabelecida pela Comissão Económica para a Europa das Nações Unidas no Sistema Internacional de Codificação dos Carvões e clarificada na Decisão do Conselho, de 10 de dezembro de 2010, relativa aos auxílios estatais destinados a facilitar o encerramento de minas de carvão não competitivas ( 3 );

 

  1. Sobre as OAR- Orientações Relativas aos Auxílios com Finalidade Regional para o período de 2014-2020, por relevantes para apreciação da matéria em causa, há a referir o seguinte:

 

As OAR Orientações Relativas aos Auxílios com Finalidade Regional para o período de 2014-2020, tal como já atrás se refere, mostram-se publicadas no Jornal Oficial da EU, n.º C 209, de 23/7/2013 e do Regulamento (EU) n.º 651/2014, da Comissão, de 16/06/2014, que declara certas categorias de auxílio compatíveis com o mercado interno, em aplicação dos artigos 107.º e 108.º do Tratado (RGIC)”.

Sendo relevante o seu § 10) que afasta do seu campo de aplicação, entre outros, os auxílios ao setor da agricultura, com a justificação de que:

“estão sujeitos a regras especiais previstas em instrumentos jurídicos específicos, suscetíveis de derrogar total ou parcialmente as presentes orientações, explicitando em nota de rodapé que os auxílios à agricultura cobrem”:

“Os auxílios estatais à produção primária, transformação e comercialização de produtos agrícolas que deem origem a produtos agrícolas enumerados no anexo I do Tratado e à silvicultura estão sujeitos às regras estabelecidas nas Orientações para os auxílios estatais no setor agrícola”

 

  1. Por relevante, transcreve-se o artigo 56.º da Resposta da Requerida:

“Conforme é explicado na obra State Aid Law of the European Union (pág 242, tradução livre):

“A compatibilidade dos auxílios regionais é avaliada com base nas regras dos auxílios regionais (OAR 2014 ou disposições relativas aos auxílios regionais no RGIC), a menos que existam regras sectoriais específicas, como as aplicáveis à agricultura, silvicultura, aquicultura, pesca, transporte e sector de energia. Essas regras específicas do sector derrogam as regras de compatibilidade consagradas nas OAR 2014 ou no RGIC, estipulando, por exemplo, intensidades de auxílio superiores ou inferiores ou condições de elegibilidade ou compatibilidade mais estritas.

 (...)

 Assim, devido às políticas comuns da UE nos domínios da agricultura, silvicultura, pesca e aquicultura, os auxílios estatais a esses sectores são regidos exclusivamente por regras específicas que são avaliadas pela Comissão à luz das disposições específicas do Tratado. Contudo, para o apoio aos produtos agrícolas [os que constam do Anexo I do Tratado] que não se enquadram no âmbito do artigo 42.º do Tratado12 (como a comercialização e a transformação de produtos agrícolas e as pescas abrangidas por programas de desenvolvimento rural co-financiados pela Comissão), os Estados Membros podem escolher entre as regras dos auxílios regionais e as regras específicas do sector da agricultura (ou seja, orientações relativas aos auxílios estatais à agricultura) ou regulamentos de isenção por categoria agrícola emitidos com base no artigo 107.º do Tratado.”

  1. Por relevante também, extrai-se o seguinte do Proc. N.º 670/2020-T, do CAAD, presidido pelo Senhor Juiz Conselheiro Carlos Cadilha,

         

I -  “Das disposições dos artigos 22.º do Código Fiscal ao Investimento e 1.º da Portaria n.º 282/2014, de 30 de dezembro, resulta que a concessão do RFAI, no âmbito da indústria transformadora, só não se verifica, em relação a projetos de investimento de transformação de produtos agrícolas que continuem a ser produtos agrícolas, com a exceção referida no artigo 1.º, n.º 3, alínea c), do RGIC, que considera não aplicáveis os auxílios nas situações aí especialmente previstas.

 

III - O processamento de leguminosas secas e concentrado de tomate em alimentos apertizados, entendendo-se como tal os alimentos prontos a consumir, submetido a processo térmico após embalagem em recipiente hermético para garantir a sua conservação e introdução no mercado, que não pode ser tida como uma atividade de transformação de produtos agrícolas na acessão do Capítulo 20 do Anexo I ao TFUE.”

 

 

  1. Tal como é também referido no Douto Acórdão antes referido:

 

“O regime definido através do diploma regulamentar[7] encontra-se justificado, no respetivo preâmbulo, pela “necessidade de observar as normas e demais atos emanados das instituições, órgãos e organismos da União Europeia em matéria de auxílios estatais, nomeadamente as Orientações relativas aos auxílios estatais, com a finalidade regional para 2014-2020, publicadas no Jornal Oficial da União Europeia n.º C 187/1, de 26 de junho de 2014”, tendo em atenção ao direito europeu que “são também definidos na portaria os setores de atividades excluídos da concessão de benefícios fiscais”

 

E mais se refere que:

“O normativo básico para a concessão do benefício fiscal é o artigo 2.º do CFI, que faz referência, como atividade económica elegível, à indústria transformadora. Como se observou no acórdão proferido no Processo n.º 545/2018-T, que abordou esta matéria, importa ter presente que o elenco de atividades constantes daquele preceito legal não é exaustivo, visto que se limite a enunciar o conjunto de atividades económicas abrangidas pelos projetos de investimento a título meramente exemplificativo. Em todo o caso, como resulta do proémio desse artigo 2.º, a atividade económica elegível haverá de respeitar o âmbito setorial de aplicações das orientações relativas aos auxílios com finalidade regional para o período 2014-2020 (OAR) e do Regulamento Geral de Isenção por Categoria (RGIC)”.

 

E ainda que:

 

 “Por outro lado, a elegibilidade dos projetos fica ainda dependente, em concreto, da especificação dos códigos de atividade económica (CAE), que o legislador remeteu para diploma regulamentar, especificação essa que igualmente haverá de ter em conta as restrições enunciadas no artigo 1.º da Portaria n.º 282/2014, entre as quais se conta a não elegibilidade dos projetos de investimento que tenham por objeto as atividades económicas de produção agrícola primária e da transformação e comercialização de produtos agrícolas enumerados no anexo I do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia”[8].

 

E mais se refere no Douto Acórdão que:

 

“ Por outro lado, a elegibilidade dos projetos fica ainda dependente, em concreto, da especificação dos códigos de atividade económica (CAE), que o legislador remeteu para diploma regulamentar, especificação essa que igualmente haverá de ter em conta as restrições enunciadas no artigo 1.º da Portaria n.º 282/2014, entre as quais se conta a não elegibilidade dos projetos de investimento que tenham por objeto as atividades económicas da produção agrícola primária e da transformação e comercialização de produtos agrícolas enumerados no anexo I do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia[9].

 

 

 

  1.  Por todo o exposto, resulta claramente, face à legislação nacional e comunitária, que os restantes vícios invocados pela Requerente, que se voltam a numerar, não têm qualquer fundamento legal.

 

i). Violação de lei por erro de facto e de direito, incluindo a inexistência de facto tributário;

ii). Violação das normas de incidência tributária e do conteúdo dos benefícios fiscais concretamente aplicáveis;

iii). Inconstitucionalidade das normas aplicáveis, ou, pelo menos, da interpretação que delas foi deito;

iv). Vício da fundamentação legalmente exigida, por erro, omissão, obscuridade e contradição.

 

  1. De facto, não existe qualquer violação de lei, por ter sido escrupulosamente cumprida, e, consequentemente, nem erro de facto ou de direito, nem inexistência de facto tributário e muito menos de violação das normas de incidência e do conteúdo dos benefícios fiscais em causa, por inaplicáveis.

 

  1. Também inexiste qualquer inconstitucionalidade das normas aplicáveis, por não terem sido violadas quaisquer normas da CRP, nem errada interpretação das mesmas, até porque não são referidas que tipo de normas terão sido violadas.

 

  1. Finalmente, também não se vê qualquer falta de fundamentação por erro, omissão, obscuridade e contradição, quer da decisão da reclamação graciosa, como anteriormente é referido, nem do ato tributário de liquidação de IRC n.º 2020..., contestado, relativo ao exercício de 2016, com data de 17.09.2020, apresenta como resultado um valor a reembolsar de € 121.422,15, em que se incluem indevidamente juros compensatórios no valor de € 8.916,35, sendo, portanto, o IRC de € 112.505,80.

 

  1. De acrescentar que, das disposições conjugadas das seguintes disposições, antes transcritas, contidas quer no CFI, nos seus art.ºs 1.º, n.º 1, alínea b), 2.º, n.º 2, alínea d) e art.º 22.º, quer no RFAI e na Portaria282/2014, de 30/12, designadamente no seu n.º 1, em que é feito o Enquadramento Comunitário e art.º 2.º, n.º 10, nas OAR-Orientações Relativas aos Auxílios e Fiscalidade Regional, bem como na Jurisprudência também citada,

 

  1. Fica por demais demonstrado que no âmbito da indústria transformadora, só não se verifica o direito ao benefício fiscal do RFAI em causa, em relação a projetos de investimento de transformação de produtos agrícolas, que continuam a ser produtos agrícolas, enumerados no Anexo I do Tratado sobre o Funcionamento da EU, e enquadrados no CAE correspondente ao código 10120 da CAE-Rev3, como é o caso da Requerente.

 

  1. Aliás, de realçar que quer na Informação que é prestada sobre a Reclamação graciosa, que serve de suporte ao seu indeferimento, antes referida, quer da Resposta da Requerida e, ainda da legislação aplicável e devidamente transcrita, tudo se mostra claro, quanto à inexistência do direito à concessão de benefícios fiscais do RFAI, relativamente à atividade abrangida pelo código 10120 da CAE-Rev3, por não se enquadram no âmbito de aplicação do RFAI, não podendo, portanto, beneficiar da dedução à coleta de IRC do exercício de 2016, em face da interpretação do artigo 2º e 22º do CFI, artigos 1.º e 2.º da Portaria n.º 282/2014 e demais legislação aplicável, bem como do quadro legislativo europeu relevante e aplicável, conforme antes explicitado profusamente.

 

  1. Assim, ficando demonstrada a inexistência dos invocados vícios e a falta de fundamento legal para aplicação dos benefícios fiscais em causa, que foram corrigidos, para menos à Requerente, na liquidação de IRC contestada n.º 2020...,  relativa ao exercício de 2016, com data de 17.09.2020, que apresenta como resultado um valor a reembolsar de € 121.422,15, em vez do valor inicial de 202.230,45, acima também explicitada, e em que se incluem indevidamente juros compensatórios no valor de € 8.916,35, sendo, portanto, o IRC a pagar de € 80.808,10, este Tribunal profere a decisão a seguir.

 

 

V – DECISÃO

 

  1. Julgar totalmente improcedente o presente pedido arbitral, com a consequente manutenção do ato de liquidação impugnado e acima identificado (IRC de 2016) e, bem assim, do ato de segundo grau que o confirmou.

 

 

Valor da causa

           

A Requerente indicou como valor da causa o montante de € 80.808,30 (oitenta mil, oitocentos e oito euros e trinta cêntimos), que não foi contestado pela Requerida e corresponde ao valor da liquidação a que se pretendia obstar, pelo que se fixa nesse montante o valor da mesma.

 

 

Custas

 

Nos termos dos artigos 12.º, n.º 2 e 24.º, n.º 4, do RJAT, 4.º, n.ºs 2 e 3 e 4.º, n.º 1, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem e Tabela I anexa a esse Regulamento, fixa-se o montante das custas em € 2.754,00, que fica a cargo da Requerente, por força do decaimento. 

 

            Notifique.

           

Lisboa, 2 de março de 2022

 

                       

                                                           O Árbitro Presidente,

 

                                              

                                               ________________________________

                                                  (Dr.ª Alexandra Coelho Martins)

 

                                  

 

 

O Árbitro Relator,

 

                                              

          _______________________________

                                                   (Dr. José Rodrigo de Castro)

 

 

 

 

O Árbitro auxiliar,

 

   

          _______________________________

                                                   (Dr. Rui Ferreira Rodrigues)

 

 



[1] A bold pelo Tribunal.

[2] A bold pelo Tribunal

[3] A bold pelo Tribunal

[4] A bold pelo Tribunal.

[5] Inclui j.compens.indevidos de € 8.916,35. Logo, IRC € 112.505,80 + j.c. € 8.916,35= € 121.422,15

(+) Juros compensatórios a pagar [5]   (+)     8.916,35 = € 130

 

[6] € 347.457,99 (-) € 116.120,51 = € 231.337,48

[7] Transcrito a partir do artigo 36.º do presente Acórdão.

[8] Sublinhado do Tribunal.

[9] A bold pelo Tribunal.