Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 83/2021-T
Data da decisão: 2022-04-26  IRS  
Valor do pedido: € 21.317,59
Tema: IRS – Crédito por Dupla Tributação Jurídica Internacional – Restrição Probatória - Valor em moeda sem curso legal em Portugal – Juros Indemnizatórios.
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SUMÁRIO:

  1. Inexistindo uma restrição probatória do imposto suportado no estrangeiro e não contestando a AT a veracidade dos documentos apresentados, não pode aquela simplesmente negar a dedução de crédito por dupla tributação jurídica internacional com fundamento na falta de apresentação de uma declaração emitida ou autenticada pelas autoridades fiscais do outro Estado e sem considerar ou valorar os documentos comprovativos apresentados pelo sujeito passivo.
  2. No caso de rendimentos obtidos e provenientes do exterior obtidos em moeda local sem curso legal em Portugal, bem como do respectivo imposto suportado, aplica-se o câmbio de compra da data em que comprovadamente aqueles foram pagos ou postos à disposição do sujeito passivo em Portugal, para efeitos da tributação desses rendimentos em sede de IRS e dedução de crédito por dupla tributação jurídica internacional do imposto aí suportado na moeda local.

 

DECISÃO ARBITRAL

O árbitro José Almeida Fernandes, designado no Centro de Arbitragem Administrativa para formar o Tribunal Arbitral, decide o seguinte:

 

I. RELATÓRIO

1. A..., titular do número de identificação fiscal ..., com residência fiscal na Rua ..., ..., ..., ...-..., Algés, Portugal, vem requerer a constituição de Tribunal Arbitral, nos termos dos artigos 2.º, n.º 1, alínea a) e 10.º, ambos do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (“RJAT”), com vista à pronúncia deste Tribunal relativamente à declaração de ilegalidade e consequente anulação dos actos de liquidação de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (“IRS”) n.os 2015... e 2021..., relativos ao período de tributação de 2014, à anulação do montante de juros compensatórios indevidamente liquidados, bem como à condenação da Autoridade Tributária e Aduaneira (“AT” ou “Requerida”) no pagamento de juros indemnizatórios.

 

2. O pedido de constituição do Tribunal Arbitral foi aceite em 9 de Fevereiro de 2021 pelo Senhor Presidente do CAAD e automaticamente notificado à Requerida.

 

3. A Requerida apresentou requerimento informando que o acto objecto de impugnação havia sido revogado parcialmente pela Subdirectora-geral do Rendimento por despacho proferido em 23 de Março de 2021, conforme Despacho no processo n.º 163/2021 da Direcção de Serviços do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares junta aos autos.

 

O Presidente do CAAD notificou em 1 de Abril de 2021 a Requerente para se pronunciar sobre se pretendia o prosseguimento da presente acção arbitral atenta a revogação parcial do acto objecto de impugnação.

 

A Requerente pronunciou-se em 18 de Maio de 2021 no sentido de pretender o prosseguimento da acção arbitral no que diz respeito ao pedido de condenação da Requerida no pagamento de juros indemnizatórios e quanto ao facto do novo acto de liquidação notificado ao Requerente para execução da revogação parcial determinar indevidamente a alteração do seu rendimento tributável, imposto suportado e a liquidação de juros compensatórios.

 

4. A Requerente não exerceu o direito à designação de árbitro pelo que, ao abrigo do disposto no artigo 6.º, n.º 1 e do artigo 11.º, n.º 1, alínea a), ambos do RJAT, o Senhor Presidente do Conselho Deontológico do CAAD designou o signatário como árbitro, que comunicou a aceitação do encargo no prazo aplicável.

 

Em 21 de Maio de 2021, foram as partes devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de a recusar, nos termos conjugados do artigo 11.º, n.º 1, alínea b), do RJAT, e dos artigos 6.º e 7.º, do Código Deontológico do CAAD.

 

5. Em conformidade com o disposto no artigo 11.º, n.º 1, alínea c), do RJAT o Tribunal Arbitral singular ficou constituído em 9 de Junho de 2021.

 

6. Para fundamentar o seu pedido alegou a Requerente, sumariamente, que o acto de liquidação ora impugnado, ao desconsiderar a dedução de um crédito por dupla tributação jurídica internacional, era ilegal, padecendo de erro sobre os pressupostos de facto. Isto porque a Requerida entendeu que não foi apresentada prova bastante do imposto pago no Botsuana por não ter sido apresentada uma declaração emitida ou autenticada pelas autoridades fiscais do Botsuana, contendo a natureza e os montantes dos rendimentos obtidos nessa jurisdição no ano de 2014, bem como o imposto aí suportado sobre esses rendimentos pelo Requerente. O Requerente requereu ainda a condenação da Requerida no pagamento de juros indemnizatórios pelo imposto pago indevidamente em virtude da não dedução à colecta de IRS do imposto pago no Botsuana. Subsequentemente, contestou a alteração do seu rendimento tributável, imposto suportado e a liquidação de juros compensatórios na novo acto de liquidação notificado para execução da revogação parcial do primeiro acto de liquidação impugnado.

 

7. Em 9 de Junho de 2021 foi proferido despacho tendo em vista a notificação do dirigente máximo do serviço da AT para, no prazo de 30 dias, apresentar resposta e, querendo, solicitar a produção de prova adicional.

 

8. Em 14 de Julho de 2021, mediante requerimento, veio a Requerida apresentar Resposta alegando que os elementos apresentados pelo Requerente até à apresentação da presente acção arbitral não permitiam a «comprovação do imposto suportado no estrangeiro, nos termos do artigo 128.º do CIRS» e, por isso, não serem devidos juros indemnizatórios. Adicionalmente que defendia a correcção ao montante de rendimento e imposto suportado considerado novo acto de liquidação notificado ao Requerente para execução da revogação parcial e a consequente liquidação de juros compensatórios.

 

II. SANEAMENTO

9. O Tribunal Arbitral foi regularmente constituído e é materialmente competente, nos termos dos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), 4.º, e 5.º, todos do RJAT.

 

As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão regularmente representadas, nos termos dos artigos 4.º e 10.º, n.º 2, ambos do RJAT, e dos artigos 1.º a 3.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março.

 

A Requerente ao pretender que este Tribunal se pronuncie sobre o novo acto de liquidação notificado ao Requerente para execução da revogação parcial do acto de liquidação originalmente objecto de impugnação procedeu, em termos materiais, a um pedido de ampliação do pedido e causa de pedir, ao qual a Requerida não só não se pronunciou contra na Resposta apresentada como apresentou a sua defesa por impugnação das correcções determinadas nesse novo acto de liquidação.

 

Na medida em que é admissível, em processo de impugnação judicial, «a ampliação do pedido e da causa de pedir, nos termos do disposto no artigo 63.º do CPTA, ex vi do artigo 2.º, alínea e) do CPPT, sempre que se verifiquem factos supervenientes» e, segundo o Supremo Tribunal Administrativo «é o que sucede quando a AT, já na pendência da impugnação, emitiu demonstração de acerto de contas e nova liquidação, na sequência de reclamação graciosa apresentada pelo impugnante»[1], admite-se a ampliação do pedido e da causa de pedir no sentido de ser objecto de pronúncia sobre o novo acto de liquidação nos termos previstos nos artigos 2.º, n.º 4, 3.º e 20.º do RJAT. Aliás, em linha com o propósito expresso do legislador de que «o processo arbitral deve constituir um meio processual alternativo ao processo de impugnação judicial».

 

A Requerida, devidamente notificada para o efeito, apresentou a sua resposta defendendo-se por impugnação.

 

Tendo sido concedido prazo para a apresentação de alegações escritas, foram as mesmas apresentadas pela Requerida, pronunciando-se sobre a prova produzida e reiterando e desenvolvendo as respectivas posições jurídicas. A Requerente não apresentou alegações escritas.

 

Foi indicado que a decisão final seria notificada até ao termo do prazo previsto no art.º 21.º/1 do RJAT, com as prorrogações determinadas nos termos legais.

 

O processo não enferma de nulidades.

 

Assim, não há qualquer obstáculo à apreciação da causa.

 

III. DO MÉRITO

III.1. MATÉRIA DE FACTO

III.1.1. Factos provados

10. Com relevo para a decisão da causa consideram-se provados os seguintes factos:

a) Em 15 de Fevereiro de 2021 a AT foi notificada por e-mail da apresentação do pedido de pronúncia arbitral;

b) O Requerente impugnava o acto de liquidação n.º 2015 ... por este desconsiderar a dedução de um crédito por dupla tributação jurídica internacional por imposto suportado relativamente a rendimentos obtidos no estrangeiro e declarados para efeitos da sua tributação em sede de IRS, a saber rendimentos obtidos e imposto suportado no Botsuana;

c) A Requerida notificou o Requerente para apresentar documentos comprovativos do imposto suportado no Botsuana para efeitos da dedução do crédito por dupla tributação jurídica internacional declarado pelo Requerente;

d) O Requerente apresentou documentos para comprovar o imposto suportado, incluindo formulário de retenção na fonte emitidos pela sua entidade patronal no Botsuana e correspondência electrónica trocada com as autoridades fiscais do Botsuana, bem como um extracto bancário comprovando o montante líquido de imposto suportado depositado na sua conta bancária em instituição de crédito nacional no dia 28 de Março de 2014 líquido do imposto retido e suportado pelo Requerente no Botsuana;

e) A Requerida não contestou a veracidade dos documentos apresentados pelo Requerente, mas não considerou os mesmos adequados para comprovar o imposto suportado, em particular porque entendeu que essa comprovação apenas seria possível com a apresentação de um «declaração emitida ou autenticada pelas autoridades fiscais do Botsuana, contendo a natureza e o montante dos rendimentos auferidos, bem como o montante e a natureza e o montante do correspondente imposto pago»;

f) a Requerida emitiu o acto de liquidação de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (“IRS”) n.os 2015..., relativo ao período de tributação de 2014, no qual se negou a dedução crédito por dupla tributação jurídica internacional pelo declarado imposto suportado pelo Requerente no Botsuana;

g) nos documentos juntos ao pedido de pronúncia arbitral, o Requerente juntou entretanto uma declaração emitida pela B..., o qual comprovava o rendimento obtido e o imposto suportado em moeda local (Pula), a saber P504,122.00 e P126,031.00 respectivamente,

h) Em 23 de Março de 2021 o acto de liquidação impugnado, por despacho proferido pela Subdirectora-geral do Rendimento, foi revogado parcialmente, em virtude da junção aos Autos dessa declaração emitida pela B...;

i) Em 1 de Abril de 2021 o Requerente foi notificado de um novo acto de liquidação de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (“IRS”) n.os 2021..., relativo ao período de tributação de 2014;

j) Em 14 de Maio de 2021 o Requerente foi notificado da Demonstração de Acerto de Contas e reembolsado nessa data do montante de €10.975,72;

k) A Requerida não procedeu nesse reembolso ao pagamento de quaisquer juros indemnizatórios ao Requerente por entender não serem esses juros devidos;

l) o novo acto de liquidação corrigiu o montante do rendimento de €40.905,70 e imposto suportado de €10.226,50 declarado pelo Requerente para um montante de €42.827,70 e €10.296,91 respectivamente;

m) no novo acto de liquidação a Requerida manteve a liquidação de €56,47 a título de juros compensatórios em virtude da correção determinada ao montante de rendimento e imposto suportado declarado pelo Requerente se apurar um rendimento tributável superior face ao declarado (ainda que o montante de imposto suportado e respectiva dedução aceite seja igualmente superior ao declarado);

n) Em 9 de Junho de 2021 o Tribunal Arbitral ficou constituído.

 

III.1.2. Factos não provados

11. Com relevo para a decisão da causa, não existem factos que devam considerar-se como não provados.

 

 

III.1.3. Fundamentação da fixação da matéria de facto

12. Ao Tribunal incumbe o dever de seleccionar os factos que interessam à decisão e discriminar a matéria que julga provada e declarar a que considera não provada, não tendo de se pronunciar sobre todos os elementos da matéria de facto alegados pelas partes, tal como decorre da aplicação conjugada do artigo 123.º, n.º 2, do Código de Procedimento e Processo Tributário (“CPPT”) e do artigo 607.º, n.º 3, do CPC, aplicáveis por força do artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e e), do RJAT.

 

Assim sendo, os factos pertinentes para o julgamento da causa foram seleccionados e conformados em função da sua relevância jurídica, a qual é determinada tendo em conta as várias soluções plausíveis das questões de direito para o objecto do litígio, conforme decorre da aplicação conjugada do artigo 596.º, n.º 1, do CPC, aplicável por força do artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT. Nestes termos, tendo em conta as posições assumidas pelas partes e a prova documental junta aos autos, consideraram se provados, com relevo para a decisão, os factos acima elencados.

 

 

III.2. MATÉRIA DE DIREITO

III.2.1. Da correcção do rendimento e imposto suportado e consequente imposto e juros compensatórios liquidados na liquidação n.º 2021 ...

13. No novo acto de liquidação a Requerida corrigiu o montante do rendimento de €40.905,70 e imposto suportado de €10.226,50 declarado pelo Requerente para um montante de €42.827,70 e €10.296,91 respectivamente.

 

Conforme comprovado pela declaração emitida pela B..., o rendimento obtido e o imposto suportado em moeda local (Pula) foi de P504,122.00 e P126,031.00 respectivamente.

 

No entanto, a Requerida não fundamentou a correcção dos montantes considerados quer na emissão desse novo acto de liquidação como na sua Resposta em juízo.

 

Ora, conclui-se com facilidade que a Requerida considerou na nova liquidação e correcção determinada o câmbio de 31 de dezembro do ano (2014) a que os rendimentos respeitam nos termos do disposto no n.º 2 do artigo 23.º do Código do IRS. Efectivamente, o câmbio a 31.12.2014 era de 1 Pula corresponder a €0,08496.

 

O Requerente declarou os rendimentos obtidos e o imposto suportado diferentemente tendo em atenção o câmbio à data em que os rendimentos foram pagos em Portugal nos termos do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 23.º do Código do IRS. Efectivamente, o câmbio a 28.03.2014 era de 1 Pula corresponder a €0,08114.

 

No entanto, o Requerente juntou aos Autos comprovativo do crédito na sua conta bancária em Portugal da transferência do Botsuana do montante líquido de imposto de €30.890,73 no dia 28 de Março de 2014. Nessa medida, o câmbio a considerar para efeitos tributários em sede de IRS deveria ser o dessa data, nos termos do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 23.º do Código do IRS («Tratando-se de rendimentos provenientes do exterior, aplica-se o câmbio de compra da data em que aqueles foram pagos ou postos à disposição do sujeito passivo em Portugal»), como declarado pelo Requerente e não o câmbio a 31.12.2014.

 

Assim, deve ser anulada parcialmente a liquidação n.º 2021... na parte em que concretiza, com erro dos pressupostos de facto e de direito, a correcção ao montante declarado pelo Requerente de rendimento obtido e imposto suportado, bem como consequentemente a liquidação de juros compensatórios daí adveniente no montante de €56,47 por erroneamente pressupor um rendimento tributável de IRS superior ao declarado pelo Requerente.

 

 

III.2.2. Dos juros indemnizatórios

14. Tendo sido revogado o acto de liquidação originalmente impugnado pela Requerente nos presentes autos, cumpre apreciar se no reembolso do imposto pago ao Requerente deveria ser a Requerida obrigada ao pagamento juros indemnizatórios.

 

O fundamento da Requerida para negar o direito do Requerente a juros indemnizatórios decorre de se argumentar que, até à apresentação da presente acção arbitral e junção de declaração emitida pela B..., o Requerente não comprovou devidamente o imposto suportado no estrangeiro.

 

Efectivamente, para a Requerida essa comprovação só poderia ser efectuada mediante a apresentação de «declaração emitida ou autenticada pelas autoridades fiscais do Botsuana, contendo a natureza e o montante dos rendimentos auferidos, bem como o montante e a natureza e o montante do correspondente imposto pago».

 

Ora, por exigência constitucional face à exigência de assegurar a tutela judicial efectiva de direitos ou interesses legítimos dos contribuintes, no procedimento administrativo não há limitações probatórias que não sejam as derivadas das proibições gerais relativas a determinados meios de prova.

 

Acresce que o artigo 128.º, n.º 1 do Código do IRS citado pela AT apenas exige aos contribuintes a apresentação de «documentos comprovativos» e não estabelece qualquer restrição probatória.

 

A Requerida também não contestou a veracidade dos documentos comprovativos apresentados pela Requerente, os quais incluíam um formulário apresentado pela entidade patronal do Requerente que identificava explicitamente o imposto retido e entregue às autoridades fiscais do Botsuana. O Requerente apresentou também correspondência electrónica dessas autoridades fiscais comprovando a entrega desse mesmo formulário e do respectivo imposto suportado pelo Requerente e entregue pela entidade patronal a essas autoridades.

 

Acresce que o Requerente apresentou também um extracto bancário com o crédito em conta de um montante correspondente precisamente ao montante transferido pela sua entidade patronal, no qual se conclui que apenas é transferido um montante líquido do imposto suportado no Botsuana pela sua entidade patronal no dia 28 de Março de 2014 e correspondente ao montante de imposto declarado como tendo sido suportado pelo Requerente relativamente a esse rendimento.

 

Nessa medida, inexistindo uma restrição probatória do imposto suportado no estrangeiro, não contestando a Requerida a veracidade dos documentos apresentados pelo Requerente, deveria esta ab initio valorar primeiro e depois considerar comprovado o montante dos rendimentos obtidos e do imposto suportado no Botsuana pelo Requerente e considerado a dedução do crédito por dupla tributação jurídica internacional na liquidação de IRS relativa ao ano de 2014.

 

Logo, ao considerar ilegalmente que existe uma restrição probatória na comprovação de imposto suportado no estrangeiro para fundamentar a não dedução de um crédito por dupla tributação jurídica internacional, existe um erro sobre os pressupostos de facto e de direito desse crédito pela Requerida.

 

Igualmente, ao considerar ilegalmente que o rendimento obtido e imposto suportado ao câmbio determinado nos termos do disposto no n.º 2 e não da alínea a) do n.º 1 do artigo 23.º do Código do IRS, existe também um erro sobre os pressupostos de facto e de direito desse crédito pela Requerida.

 

No que concerne ao direito a juros indemnizatórios, é regulado no artigo 43.º da LGT, que estabelece, no que aqui interessa, o seguinte:

 

Artigo 43.º

Pagamento indevido da prestação tributária

1 – São devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido.

 

Como resulta do teor expresso do n.º 1 do artigo 43.º da LGT, há direito a juros indemnizatórios em caso de anulação por vício que constitua «erro», entendendo-se como tal os vícios que na dogmática administrativa tem tal designação, que são os vícios de erro sobre os pressupostos de facto e erro sobre os pressupostos de direito.

 

No caso em apreço, as liquidações n.os  2015 ... e 2021 ... enfermam de vícios desses tipos, que são imputáveis à Requerida, a Autoridade Tributária e Aduaneira (AT).

 

Nos termos dos artigos 43.º, n.º 4, e 35.º, n.º 10, da LGT, do artigo 61.º do CPPT, do artigo 559.º do Código Civil e da Portaria n.º 291/2003, de 8 de Abril, os juros indemnizatórios devem ser contados relativamente:

  1. ao montante de €10.975,72 já reembolsado, desde a data em que foi efectuado o respectivo pagamento desse montante até ao dia 14 de Maio de 2021, à taxa legal supletiva; e
  2. ao montante a reembolsar decorrente anulação da correcção e liquidação de juros compensatórios da liquidação n.º 2021 ..., desde a data em que foi efectuado o respectivo pagamento, até ao integral reembolso do montante pago em excesso, à taxa legal supletiva.

 

 

IV. DECISÃO

Termos em que se decide neste Tribunal Arbitral julgar integralmente procedente o pedido arbitral formulado e, em consequência:

  1. Julgar procedente o pedido de pronúncia arbitral quanto às questões de ilegalidade das liquidações n.os 2015 ... e 2021 ...;
  2. Anular a liquidação n.º 2021 ..., no valor indevidamente liquidado de imposto e juros compensatórios, nos termos acima indicados;
  3. Condenar a Requerida na restituição do imposto indevidamente pago ainda por reembolsar e no pagamento de juros indemnizatórios, nos termos acima indicados;
  4. Condenar a Requerida nas custas do processo, no valor de € 1.224,00.

 

 

V. VALOR DO PROCESSO

Atendendo ao disposto no artigo 32.º, do CPTA e no artigo 97.º-A, do CPPT, aplicáveis por força do disposto no artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e b), do RJAT, e do artigo 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se ao processo o valor de € 21.317,59, valor indicado pelo Requerente, sem oposição da Autoridade Tributária e Aduaneira.

 

 

VI. CUSTAS

Nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, as custas são no valor de € 1.224,00 a cargo da Requerida, uma vez que o pedido foi totalmente procedente, conforme ao disposto nos artigos 12.º, n.º 2, e 22.º, n.º 4, ambos do RJAT, e artigo 4.º, n.º 5, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem.

 

Notifique-se.

 

Lisboa, 26 de Abril de 2022.

 

O Árbitro,

 

 

 

José Almeida Fernandes

 



[1] Cf. Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 29.06.2011, Proc. n.º 030/11, no qual foi Relator o Juiz-Conselheiro António Calhau.