Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 12/2016-T
Data da decisão: 2016-06-27  Selo  
Valor do pedido: € 14.534,80
Tema: IS - Verba 28.1 TGIS.
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Decisão Arbitral

 

 

I.              RELATÓRIO

 

A…, S.A., NIPC…, com sede na Rua…, n.º…, …, …-… Aveiro (doravante apenas designada por Requerente), apresentou, em 14-01-2016, um pedido de constituição do tribunal arbitral singular, nos termos dos artigos 2.º e 10.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, doravante apenas designado por RJAT), em conjugação com as alíneas a) do art. 99.º do CPPT, em que é Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira (doravante designada apenas por Requerida).

A Requerente pede a declaração de ilegalidade (i) do despacho de deferimento parcial da reclamação graciosa deduzida contra os actos de liquidação de Imposto do Selo da verba 28.1 da Tabela Geral do Imposto do Selo (“TGIS”) do ano de 2014, com referência aos terrenos para construção inscritos na matriz predial urbana da união das freguesias de … e …, concelho de Aveiro, sob os artigos … e…, bem como (ii) dos actos de liquidação reclamados.

O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Exmo. Presidente do CAAD em 15-01-2016 e notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira nessa mesma data.

Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, o Conselho Deontológico designou como árbitro do tribunal arbitral singular a ora signatária, que comunicou a aceitação do encargo no prazo aplicável.

Em 11-03-2016 foram as Partes devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a designação dos árbitros, nos termos conjugados do artigo 11.º n.º 1, alíneas a) e b) do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.

Em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, o tribunal arbitral singular foi constituído em 29-03-2016.

Notificada para se pronunciar, a Requerida apresentou requerimento em que sustenta a legalidade dos actos impugnados, pugnando, assim, pela improcedência do pedido deduzido pela Requerente.

Por despacho de 05-05-2016 foi dispensada a reunião prevista no artigo 18.º do RJAT, tendo sido concedido às partes prazo para apresentação de alegações escritas sucessivas, tendo ambas as partes optado por não o fazer.

 

II.          DO PEDIDO DE PRONÚNCIA ARBITRAL

 

A Requerente sustenta o seu pedido alegando que as liquidações efectuadas são ilegais por violação da verba 28.1 da TGIS uma vez que a Autoridade Tributária desconsiderou a qualidade de comproprietária da Requerente e o facto de a quota parte por si detida, em cada um dos prédios em causa, ter um valor inferior ao limite mínimo de incidência, ou seja, a €1.000.000. 

No entender da Requerente, em situações de compropriedade, para efeitos de determinação de sujeição à verba 28 da TGIS, o limite mínimo aí referido deve ser aferido, concretamente, em função da quota-parte do direito do comproprietário (e não apenas e só com base no valor patrimonial tributário do prédio) porque é através desta que se revelará a acrescida capacidade contributiva que o legislador pretendeu atingir ao instituir este imposto. Nessa medida, independentemente do valor patrimonial tributário do prédio, só haverá lugar a tributação relativamente aos comproprietários cuja quota parte tenha um valor superior a € 1.000.000.

Esta é a interpretação e aplicação da verba 28.1 da TGIS que permite o cabal cumprimento dos princípios constitucionais da igualdade e da capacidade contributiva porquanto, “Na verdade, o princípio da igualdade impõe a chamada discriminação positiva, i.e., obriga a tratar de forma idêntica os cidadãos / contribuintes que estejam em situações semelhantes e a aplicar tratamento diferente aos que se encontrem em situação substancialmente distinta” – cfr. art. 24.º da p.i.

Ora, nas situações de compropriedade dos prédios tipificados na verba 28 da TGIS, “a exteriorização da capacidade contributiva acrescida e que corresponde à intenção subjacente à tributação, fica dependente da concreta quota-parte do direito do comproprietário, sob pena de manifesta desigualdade dos comproprietários em relação aos proprietários singulares” – cfr. art.s 26.º e 27.º da p.i.

A capacidade contributiva da Requerente é equivalente à de um proprietário singular de um terreno para construção nas mesmas condições e com o mesmo valor patrimonial tributário, motivo por que não pode a Requerente deixar de ser objecto de tributação nos mesmos moldes, sob pena de violação do princípio da igualdade e da capacidade contributiva” – cfr. art. 23.º da p.i.

No caso em apreço, não tendo as liquidações contestadas sido efectuadas com base na ponderação em concreto da quota parte da Requerente - que é inferior ao limite mínimo de incidência fixado pelo legislador em € 1.000.000 - serão as mesmas ilegais por assentarem numa interpretação da verba 28.1 da TGIS desconforme à Constituição.

Por esta mesma razão, é também ilegal o despacho de deferimento parcial da reclamação graciosa deduzida contra tais actos de liquidação.

 

III.         DA RESPOSTA DA REQUERIDA

 

Na resposta apresentada, a título prévio, a Requerida solicita a correcção do valor económico do pedido, que deverá ser reduzido para € 14.589,28, uma vez que a reclamação graciosa deduzida pela Requerente foi parcialmente deferida. Nessa medida, foi anulado, por ilegal, o imposto liquidado com base no valor patrimonial tributário dos prédios correspondente à área afecta a serviços, tendo sido mantidos os actos de liquidação reclamados apenas pelo valor remanescente, referente à área afecta a habitação.

No que se refere em concreto às alegações da Requerente, a Requerida pugna pela conformidade constitucional da interpretação e aplicação da verba 28 da TGIS feita aquando da liquidação do imposto contestado, com consequente indeferimento do pedido deduzido pela Requerente.

Na óptica da Requerida, “o facto de o legislador estabelecer um valor como critério delimitativo da incidência do imposto, abaixo do qual não se preenche a previsão da norma tributária, constituiu uma legítima escolha do legislador quanto à fixação do âmbito material dos “imóveis habitacionais de luxo” que se pretende tributar de modo mais gravoso, até porque qualquer outro valor de grandeza análoga assumiria, do mesmo modo, um carácter artificial que é conatural a qualquer fixação quantitativa de um nível ou limite” (cfr. ponto 32 da Resposta).

Se a afectação do imóvel e a respectiva função são diferentes pode e deve a situação ser tratada de forma diferente como impõe o próprio princípio da igualdade. Desta forma, havendo justificação material bastante para o tratamento diferenciado, mostra-se respeitado o princípio da igualdade, da mesma forma que se encontra respeitado o princípio da capacidade contributiva e, até, o princípio da protecção da confiança.

Nessa medida, deve improceder o pedido da Requerente, mantendo-se as liquidações contestadas.

 

IV.         SANEADOR

 

O Tribunal Arbitral foi regularmente constituído e é competente.

As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias e são legítimas (arts. 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e art. 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março).

O processo não enferma de nulidades e não se suscita qualquer obstáculo à apreciação do mérito da causa.

 

V.          MATÉRIA DE FACTO

 

                        A. Factos provados

 

Consideram-se provados os seguintes factos:

1.             A Requerente é comproprietária de metade do prédio urbano sito no …, da união das freguesias de … e …, concelho de Aveiro, inscrito na matriz predial urbana da referida freguesia sob o artigo…, com valor patrimonial tributário de € 1.870.420,00.

2.             O prédio vem descrito na matriz como “terreno para construção”.

3.             A avaliação efectuada pela Autoridade Tributária teve em conta dois tipos de afectação, tendo sido atribuído à área afecta a habitação o valor de € 1.453.480,64, e à área de afecta a serviços o valor de € 416.938,93.

4.             A Requerente é comproprietária de metade do prédio urbano sito no …, da união das freguesias de … e …, concelho de Aveiro, inscrito na matriz predial urbana da referida freguesia sob o artigo…, com valor patrimonial tributário de € 1.870.420,00.

5.             O prédio vem descrito na matriz como “terreno para construção”.

6.             A avaliação efectuada pela Autoridade Tributária teve em conta dois tipos de afectação, tendo sido atribuído à área afecta a habitação o valor de € 1.453.480,64, e à área de serviços o valor de € 416.938,93.

7.             A 20-03-2015 a Autoridade Tributária procedeu à liquidação do Imposto do Selo pela verba 28.1 da TGIS do ano de 2014, com referência aos prédios indicados (sobre a quota parte detida pela Requerente), num total de € 18.704,20, correspondendo a € 9.352,10 por prédio.

8.             A Requerente apresentou reclamação graciosa das liquidações de Imposto do Selo referidas.

9.             Por despacho de 21-10-2015, da Direcção de Finanças de …, a reclamação graciosa deduzida foi parcialmente deferida, tendo sido reduzido o valor do imposto devido, por prédio, de € 9.352,10 para € 7.267,40, correspondendo, assim, a um total de € 14.453,80.

 

B. Factos não provados

 

Não se provaram outros factos com relevância para a decisão arbitral.

 

C. Fundamentação da matéria de facto

 

A matéria de facto dada como provada assenta na prova documental apresentada e não contestada.

 

VI.         MATÉRIA DE DIREITO

 

A)    Do valor do pedido de pronúncia arbitral

 

Em Março de 2015, a Requerida procedeu à liquidação de Imposto do Selo da verba 28 da TGIS, do ano de 2014, em nome da Requerente, relativamente aos dois prédios identificados nos pontos 1 e 4 dos Factos Provados, no valor individual de € 9.352,10 (num total de € 18.704,20).

O imposto fora calculado com base no valor patrimonial tributário de cada prédio (€ 1.870.420,00), sendo que à quota parte da Requerente corresponde o valor de € 935.210,00.

Em sede de reclamação graciosa, a Requerida deferiu o pedido de anulação das liquidações na parte do imposto fixado com base no valor patrimonial tributário correspondente à área afecta a serviços, pelo que reduziu a base de incidência para os € 1.453.480,64, por prédio, correspondendo a metade da Requerente a € 726.740,32. Após a redução da base de incidência, o imposto devido pela Requerente e não anulado em sede de reclamação graciosa, na proporção da respectiva quota parte de cada prédio, ascende ao montante de € 7.267,40, por prédio.

Face ao exposto, e considerando que parte da pretensão da Requerente foi já deferida em sede de reclamação graciosa, o valor económico do presente pedido deverá ser reduzido para o montante total das liquidações não anuladas: € 14.534,80.

 

B)    Do pedido de declaração de ilegalidade

 

A questão em apreço nos presentes autos é, assim, a de saber se a incidência da verba 28.1 da TGIS é delimitada apenas pelo valor patrimonial tributário do prédio ou se, em situações de compropriedade, a base de incidência deverá ser fixada em função do valor patrimonial da quota parte que cada comproprietário detém nesse mesmo prédio, sob pena de inconstitucionalidade da mesma por violação dos princípios da igualdade e da capacidade contributiva.

A prevalecer a segunda interpretação, os actos tributários contestados pela Requerente serão ilegais, devendo, em consequência, ser anulados com os demais efeitos legais.

***

À data dos factos, a verba 28.1 da TGIS tinha a seguinte redacção:

 

28. Propriedade, usufruto ou direito de superfície de prédios urbanos cujo valor patrimonial tributário constante da matriz, nos termos do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (CIMI), seja igual ou superior a (euro) 1 000 000 - sobre o valor patrimonial tributário utilizado para efeito de IMI:

28.1 Por prédio habitacional ou por terreno para construção cuja edificação, autorizada ou prevista, seja para habitação, nos termos do disposto no Código do IMI: 1%

28.2 Por prédio, quando os sujeitos passivos que não sejam pessoas singulares sejam residentes em país, território ou região sujeito a um regime fiscal claramente mais favorável, constante da lista aprovada por portaria do Ministro das Finanças: 7,5%.

 

Nos termos do n.º 4 do art. 3.º do Código do Imposto do Selo, conjugado com o art. 8.º do Código do IMI, serão sujeitos passivos do imposto os proprietários, os usufrutuários ou os superficiários de prédios que preencham as condições objectivas descritas na referida verba 28.1 da TGIS, ou seja, de prédios edificados com afectação habitacional ou de terrenos para construção cuja edificação autorizada ou prevista se destine a habitação, desde que com valor patrimonial tributário superior a € 1.000.000.

Em termos de incidência objectiva, a delimitação é, assim, feita em função de determinada afectação do prédio e do respetivo valor patrimonial tributário inscrito na matriz e utilizado para efeitos de IMI.

Ora, resulta do art. 82.º do Código do IMI – aplicável por remissão do n.º 2 do art. 67.º do Código do Imposto do Selo - que a compropriedade não implica qualquer decomposição do valor patrimonial tributário do prédio que continua, assim, a ser uno, sem qualquer individualização por comproprietário. Nestas situações, a lei determina apenas que a matriz inclua a identidade de todos os comproprietários e a respectiva fracção do valor patrimonial tributário, como se verifica no presente caso (conforme cadernetas matriciais juntas pela Requerente).

Esta forma de inscrição na matriz não altera em nada o valor patrimonial nem o enquadramento tributário do prédio, não tendo qualquer impacto quanto aos procedimentos de cobrança. O imposto será, assim, liquidado em nome de cada comproprietário, na proporção da respectiva quota parte.

Face ao exposto, este tribunal seria levado a concluir que se o valor patrimonial tributário em sede de IMI – um dos elementos essenciais para determinação sujeição da verba 28.1 da TGIS – não sofre qualquer alteração, seja em propriedade singular, seja em compropriedade, então, para efeitos de incidência deste imposto não haveria que ,nas situações de compropriedade, ponderar, em concreto, se a quota parte de cada comproprietário ultrapassa ou não o referido limite mínimo de sujeição de € 1.000.000. Se, na prática, a situação de compropriedade não altera ou afecta o enquadramento tributário e o valor patrimonial do prédio para efeitos de IMI, então não haveria que atribuir qualquer relevância jurídico-tributária ao facto de, no caso concreto, o prédio ser detido pela Requerente em compropriedade.

Numa interpretação literal da verba 28.1 da TGIS, o imposto incidirá, assim, sobre os prédios urbanos aí tipificados com valor patrimonial tributário superior a €1.000.000, independentemente de, em casos de compropriedade, a quota parte correspondente ao concreto comproprietário poder ser inferior ao referido limite mínimo, como se verifica no caso em apreço. A quota parte de cada comproprietário será apenas relevante para determinar, concretamente, a obrigação de pagamento de cada comproprietário (tal como se verifica em sede de IMI), dado que a sujeição à verba 28.1 da TGIS terá já sido fixada em função do valor patrimonial total do prédio.

Este é o entendimento da Requerida e foi a interpretação sufragada na decisão arbitral de 11 de Julho de 2014, proferida no proc. n.º 4/2014-T.

Esta interpretação foi, posteriormente, posta em causa pela decisão arbitral de 17 de Novembro de 2014, proferida no proc. 259/2014-T, em que o árbitro singular titular do processo considerou que “Do exposto resulta claro que uma interpretação meramente literal da norma não seria constitucionalmente aceitável, reclamando portanto uma interpretação conforme à Constituição, de modo a acomodar na concretização da nova verba 28.1 da TGIS o pleno cumprimento dos princípios da igualdade e da capacidade contributiva, aos quais o legislador fiscal está subordinado. (…) Neste caso a capacidade contributiva acrescida vislumbrada pelo legislador corresponde à detenção de património imobiliário, destinado a habitação, de valor particularmente elevado. Ora, o comproprietário, não detém, ou não detém necessariamente, um património imobiliário destinado à habitação de valor particularmente elevado, sempre que seja comproprietário de um imóvel destinado à habitação com VPT igual ou superior a um milhão de euros. Basta, como se viu, que a sua quota parte nesse direito seja tal que o valor patrimonial tributário que proporcionalmente corresponda ao seu direito não atinja esse limiar mínimo de relevância tributária, de exteriorização mínima de uma acrescida capacidade contributiva, tal como previsto pelo legislador”. Pelo que acabou por concluir, no caso concreto, que os actos tributários contestados eram ilegais porquanto a quota parte do aí requerente comproprietário ter um valor patrimonial tributário inferior a €1.000.000.

Em face destas duas posições contrárias, este tribunal decide acompanhar a argumentação da Requerente e validada na referida decisão arbitral proferida no proc. 259/2014-T.

Com efeito, com a introdução da verba 28 da TGIS, o legislador discriminou negativamente os proprietários de bens denominados de luxo e que, em virtude da detenção de prédios de afectação habitacional de valor igual ou superior a €1.000.000, revelavam uma capacidade contributiva acrescida que justificava um contributo superior no esforço de consolidação orçamental. O esforço adicional exigido tinha, assim, por medida, a capacidade contributiva própria e individual revelada pela propriedade de prédios considerados de luxo por terem valor patrimonial tributário superior a €1.000.000.

Ora, nesta sede, a capacidade contributiva própria de cada sujeito passivo deverá aferir-se em função do valor do respectivo património individual. Significa isto que, nas situações de compropriedade, haverá que atender à quota parte do bem de que se é titular, sendo evidente que não é a mesma coisa ser proprietário singular de um prédio com valor patrimonial tributário de valor superior a € 1.000.000 ou ser comproprietário desse mesmo prédio. As capacidades contributivas exteriorizadas nas duas situações são necessariamente diferentes, decorrentes, aliás, das próprias diferenças jurídicas e económicas que regulam o respectivo direito de propriedade sobre o bem.

O comproprietário de metade de um prédio para habitação de valor patrimonial tributário superior a €1.000.000 não revela a mesma capacidade contributiva (nem mesmo em termos proporcionais) para efeitos de sujeição a imposto que o proprietário singular desse mesmo prédio para habitação.

A diferença das situações é, para este tribunal, evidente, devendo, por isso, ser ponderada e atendida na interpretação e aplicação da verba 28 da TGIS.

No entender deste tribunal, a Requerente revela, na qualidade de comproprietária, uma capacidade contributiva individual inferior ao limite mínimo de tributação fixado na lei e equivalente à de qualquer proprietário singular de prédio com valor patrimonial tributário igual ao da quota parte por si detida. Assim sendo, sujeitar a Requerente a um imposto a que o dito proprietário singular não estaria sujeito é, aos olhos deste tribunal, uma flagrante violação do princípio da igualdade e da capacidade contributiva, não tendo sido certamente essa a pretensão do legislador.

 

Como refere José Casalta Nabais[1], “(…) o princípio da igualdade de tributação, assente no princípio da capacidade contributiva, diz-nos que as pessoas são tributadas em conformidade com a respectiva capacidade contributiva, o que significa, de um lado, que ficarão excluídos do campo da incidência dos impostos aquelas pessoas que não disponham dessa capacidade e, de outro lado, que face a detentores de capacidade contributiva, os contribuintes com a mesma capacidade pagarão o(s) mesmo(s) imposto(s) (igualdade horizontal) e os contribuintes com diferentes capacidades pagarão diferentes impostos, seja em termos qualitativos, seja em termos quantitativos (igualdade vertical).

Entende, por isso, este tribunal que uma interpretação estrita e literal da verba 28.1 da TGIS levará a resultados constitucionalmente inadmissíveis, impondo-se, assim, uma interpretação conforme ao texto constitucional, à luz dos referidos princípios, como defendido pela Requerente.

Assim sendo, conclui-se que, para efeitos de determinação do âmbito de incidência da verba 28.1 da TGIS, deverá ser tido em conta, não apenas o valor patrimonial do prédio, mas também a concreta proporção do direito dos seus comproprietários. De outro modo, e como referido supra, teríamos uma manifesta desigualdade dos comproprietários face a proprietários singulares de prédios com valor equivalente ao valor da quota-parte dos comproprietários, caso este fosse inferior ao limite mínimo de sujeição referido.

Assim, tal como no caso em apreço, se o valor patrimonial tributário da quota parte do comproprietário for inferior ao limite mínimo de incidência de € 1.000.000, não haverá sujeição à verba 28 da TGIS, mesmo que o valor patrimonial total do prédio em causa seja superior àquele limite.

Resta, assim, concluir pela ilegalidade dos actos impugnados que deverão, por isso, ser anulados, com as demais consequências legais, como peticionado pela Requerente.

 

VII.       DECISÃO

 

De harmonia com o exposto, decide este Tribunal Arbitral julgar procedente o pedido deduzido pela Requerente e, em consequência, declarar ilegais, por violação da verba 28.1 da TGIS, o despacho de deferimento parcial da reclamação graciosa e os actos de liquidação do Imposto do Selo do ano de 2014, com referência aos prédios supra identificados, com consequente reembolso à Requerente dos montantes que tenha eventualmente pago.

 

Valor do processo: De harmonia com o disposto no artigo 306.º, n.º 2, do CPC e 97.º-A, n.º 1, alínea a), do CPPT e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária fixa-se ao processo o valor de € 14.534,80, correspondente ao valor total das liquidações impugnadas.

 

Custas: Nos termos do n.º 4 do art. 22.º do RJAT, fixa-se o montante das custas em € 918,00, nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, a cargo da Requerida.

 

Registe-se e notifique-se esta decisão arbitral às partes.

 

Lisboa, 27-06-2016

 

O Árbitro Singular

 

 

(Maria Forte Vaz)

 

 

 

 



[1] O Dever Fundamental de Pagar Impostos, Almedina, 2004, pág. 443.