Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 118/2016-T
Data da decisão: 2016-10-28  Selo  
Valor do pedido: € 19.093,15
Tema: IS – Verba 28 da TGIS; caducidade do direito de ação
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DECISÃO ARBITRAL

 

I – RELATÓRIO

 

1        A…, SA, anteriormente denominada B… SA, CF[1]…, com sede na …, … …-… - …, apresentou um pedido de pronúncia arbitral, ao abrigo do disposto na alínea a) do nº1 do artigo 2º,do nº 1 do artigo 3º e da alínea a) do nº 1 do artigo 10º, todos do RJAT[2], sendo requerida a AT[3], com vista à apreciação da legalidade do ato tributário de liquidação de imposto do selo, no montante de € 18 021,40 referente ao ano de 2014, incidente sobre um terreno para construção denominado lote … do alvará de loteamento nº …/88, inscrito na matriz sob o artigo urbano nº … da União de freguesias de … e … área do Serviço de Finanças de …,

2        Que foi feito sem exercer a opção de designação de árbitro, vindo a ser aceite pelo Exmo Senhor Presidente do CAAD[4] e automaticamente notificado à AT em 02/03/2016.

3        Nos termos e para efeitos do disposto no nº2 do artigo 6º do RJAT por decisão do Exmo Senhor Presidente do Conselho Deontológico, devidamente comunicado às partes, nos prazos legalmente aplicáveis, foi, em 27/04/2016, designado árbitro do tribunal Arlindo José Francisco, que comunicou a aceitação do encargo, no prazo legalmente estipulado.

4        O tribunal foi constituído em 12/05/2016 de harmonia com as disposições contidas na alínea c) do nº 1 do artigo 11º do RJAT, na redação introduzida pelo artigo 228º da Lei nº 66-B/2012, de 31 de Dezembro.

5        Com o seu pedido, visa a requerente, a anulação de imposto do selo, no montante € 18 021,40 referente ao ano de 2014 respeitante ao imóvel já identificado cujo VPT[5] é de € 1 802 140,00, por isso superior ao montante de € 1 000 000,00 previsto na verba 28 da TGIS[6]

6        Suporta o seu ponto de vista, em síntese, no entendimento de que a liquidação é ilegal por inexistência de fundamento, uma vez que o já mencionado lote é destinado a Aldeamento turístico, denominado Hípico e não a construção habitacional.

7        Entende que o conceito de “afetação habitacional” não pode ter um sentido tão amplo que abranja “unidades de alojamento turísticos” e o facto da AT ter atribuído a afetação habitacional quando da reavaliação sem qualquer reclamação da requerente, não valida a liquidação, uma vez que não está fundamentado tal ato praticado pela AT.

8        Ora, não estando implantada qualquer construção no aludido lote e por força do alvará de loteamento se verifica que o destino a dar ao mesmo não é a construção habitacional, forçoso é concluir que a liquidação é manifestamente ilegal.

9        Requer ainda a condenação da AT ao pagamento de € 1 072,14, referentes a custos em que incorreu com todo o processo por força de liquidação ilegal.

10    Na resposta, a requerida, em síntese, invoca a exceção de caducidade do direito à ação, uma vez que a requerente peticiona unicamente a declaração de ilegalidade do ato tributário de liquidação do IS[7], referente a 2014 no montante de € 18 021,40, emitido pela AT em 20/03/2015, com data limite de pagamento em 30/04/2015.   

11    Tendo em conta que o pedido de constituição do TA[8], foi apresentado em 29/02/2016 e que o artigo 10º do RJAT, estabelece o prazo de 90 dias para os factos previstos nos nºs 1 e 2 do artigo 102º do CPPT[9], contados a partir do dia seguinte ao término do prazo de pagamento voluntário, artigo 102 nº1 alínea a) do CPPT, forçoso é concluir pela intempestividade do pedido, não podendo o tribunal dele conhecer.

12    Ultrapassado que foi o prazo de impugnação, a tempestividade do pedido só poderia fundar-se na existência de um qualquer meio de impugnação gracioso do ato de liquidação onde tivesse sido prolatada decisão a indeferir total ou parcialmente as pretensões aí formuladas, o que de facto aconteceu nos presentes autos, só que a requerente, apesar de ter identificado essas circunstâncias não concretizou ao tribunal qualquer pedido tendente à anulação do que nessa sede se decidiu.

13    Resultando do pedido a impugnação direta do ato de liquidação terá o pedido ser declarado improcedente por intempestivo.

14    Suscita ainda a incompetência material do tribunal para se pronunciar quanto ao pretendido pela requerente relativamente à avaliação do prédio, o que constitui uma exceção dilatória que impede o tribunal de conhecer do mérito da causa.

15    Quanto à alegada inexistência dos pressupostos de facto e de direito da liquidação, considera não assistir qualquer razão à requerente, uma vez que aquando da reavaliação que estipulou a afetação, a requerente dela não reclamou, pelo que a liquidação posta em crise, consubstancia uma correta interpretação e aplicação do direito aos factos.

16     Quanto aos juros indemnizatórios pedidos os mesmos não serão devidos uma vez que não há erros imputáveis aos serviços.

 

II - SANEAMENTO

O tribunal foi regularmente constituído, as partes têm personalidade e capacidade judiciárias, mostram-se legítimas e encontram-se regularmente representadas de harmonia com os artigos 4º e 10º, nº2 do RJAT e artigo 1º da Portaria nº 112-A/2011, de 22 de Março.

Apresentada a resposta da requerida, por exceção invoca a caducidade do direito de ação tendo em conta o pedido em concreto e ainda a incompetência material do tribunal para sindicar a avaliação do prédio como pretende a requerente.

Por despacho de 14/06/2016 foi marcada a reunião a que alude o artigo 18º do RJAT para o dia 12/07/2016, vindo a requerida em 06/07/2016 considerar dispensável a referida reunião e prescindir de alegações orais ou escritas.

Na mesma data o tribunal proferiu despacho a notificar a requerente para, no caso de não se opor e o formalizasse até 11/07/2016, o tribunal acolheria a proposta da requerida. Veio a requerente em tempo útil declarar que pretendia a realização da reunião, vindo a mesma a ter lugar na data e hora aprazada, sem a presença da requerida.

Na reunião do artigo 18º do RJAT foi acordada a produção de alegações escritas, sendo concedido o prazo de 15 dias, com trato sucessivo, para a sua produção, vindo as mesmas a ser juntas no respetivo prazo. 

Deste modo, não enfermando o processo de nulidades, vão as exceções ser apreciadas em primeira linha.

 

III- FUNDAMENTAÇÃO

 

1 – As questões a dirimir, com interesse para os autos, são as seguintes:

 

a)      Conhecer da eventual caducidade do direito de ação da Requerente, em face do pedido constante do requerimento de constituição do tribunal.

b)      Conhecer da eventual incompetência do tribunal para apreciar atos de avaliação e inscrição matricial do prédio que originou a liquidação do IS aqui posta em crise.

c)      Caso as exceções aduzidas sejam declaradas improcedentes, decidir se a liquidação do IS em crise foi ou não corretamente emitida em face da afetação do prédio em questão.

d)     Em caso de procedência do pedido deverá ou não a AT ser condenada ao pagamento dos custos e juros indemnizatórios, conforme pedido.

 

2 – Matéria de Facto

A matéria de facto considerada relevante e provada com base nos elementos juntos aos autos é a seguinte:

a)      A requerente é proprietária de um prédio urbano, sito na …, em…, denominado lote …, originado pelo alvará nº …/… da Câmara Municipal de …, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo … da União de Freguesias … e … como terreno para construção;

b)      O referido lote, de acordo com o citado alvará, destina-se à construção de aldeamento turístico, mas no qual não se encontra edificada qualquer construção;

c)      O seu VPT é de € 1 802 140,00, fixado em avaliação geral, na qual foi estabelecida a afetação habitacional que não foi objeto de contestação pela requerente;

d)     O IS no montante de € 18 021,40, respeita ao ano de 2014 e a sua liquidação foi notificada à requerente pela AT em 20/03/2015, com data limite de pagamento em 30/04/2015;

e)      A requerente apresentou reclamação graciosa contra a referida liquidação que veio a ser indeferida por despacho notificado à requerente em 30/11/2015;

f)       A requerente não procedeu ao pagamento do imposto em causa e com vista à suspensão do processo executivo, constituiu hipoteca a favor da AT.

Os factos dados como provados, fundou-se na prova documental e não contestada pelas partes

Não existe factualidade dada como não provada que seja relevante para a decisão.

 

3        – Matéria de Direito

Vem a AT, na sua resposta, em primeira linha invocar a caducidade do direito de ação da Requerente, em face do pedido constante do requerimento de constituição do tribunal. É evidente que se considerarmos que o pedido que delimita os presentes autos se reporta ao ato de primeiro grau (liquidação do IS) e não ao indeferimento da reclamação graciosa (ato de segundo grau) teremos que concluir que houve caducidade do direito de ação.

Da análise do pedido e, embora a requerente, muito vagamente, se refira à reclamação graciosa e ao seu indeferimento, em parte alguma, formula o pedido de anulação da decisão de indeferimento da reclamação graciosa, sendo perentória, na identificação do pedido dizendo” A requerente pretende que seja declarada a ilegalidade do ato de liquidação do IS de 2014…”. Da mesma forma perentória conclui o pedido dizendo: “Seja julgado procedente o pedido de declaração de ilegalidade do ato tributário de liquidação do IS referente a 2014, no valor de 18 021,40”.

Embora agora, na fase de alegações, e estribando-se em decisão recente do tribunal arbitral, diga, que “resulta manifesto que a requerente sustentou o seu pedido identificando todo um processo de reclamação, juntando inclusivamente os documentos pertinentes para demonstrar os factos por si alegados”, concede que o pedido poderia ter sido menos equívoco e afirma “ não deixa de resultar de toda a economia da impugnação que a requerente impugna a posição da requerida sobre a reclamação do ato de liquidação”.

O tribunal não considera o pedido equívoco, antes pelo contrário, como já se deixou expresso, ele é bem claro, a requerente pretende a declaração de ilegalidade do ato tributário de liquidação do IS referente a 2014, no valor de € 18 021,40 e, sendo assim, o prazo para a apresentação da impugnação teve o seu início no dia seguinte ao termo do prazo (30/04/2014) para pagamento voluntário.

Diferente seria se o pedido se tivesse dirigido ao ato de indeferimento da reclamação graciosa, nesse caso seria aberto um novo prazo para apresentação da impugnação, e o tribunal estaria habilitado a apreciar o ato de liquidação primário, mas, como já se referiu, em parte alguma da petição, consta o pedido de anulação da decisão proferido no processo de reclamação.

Deste modo o objeto imediato e único do pedido, nos termos em que foi delimitado pela requerente, é a ilegalidade do ato de liquidação e não o indeferimento da reclamação graciosa.

Delimitado que foi com precisão o objeto de pedido de pronúncia arbitral pela requerente que o circunscreveu ao ato de liquidação do imposto, ficam os poderes cognitivos do tribunal delimitados ao pedido, não podendo o tribunal tomar decisões sobre questões que não tenham sido suscitadas pelas partes, nem condenar em objeto diferente do pedido, tendo em vista as disposições contidas nos artigos 608 e 609º do CPC[10], aplicáveis ex vi artigo 29º nº 1 alínea e) do RJAT.

Nestes termos, considera-se procedente a exceção invocada, ficando prejudicada a apreciação das restantes questões suscitadas.

 

IV DECISÃO

 

Face ao exposto, o tribunal decide o seguinte:

a)      Declarar procedente a exceção de caducidade do direito de ação;

b)      Declarar improcedente o pedido de pronúncia arbitral, dele se absolvendo a requerida;

c)      Fixar o valor do processo em € 19 093.15 de harmonia com as disposições contidas no artigo 299, nº 1 do CPC, aplicável ex vi artigo 29º nº 1 alínea e) do RJAT.

d)     Fixar as custas ao abrigo do nº 4 do artigo 22º do RJAT, no montante de € 1 224,00 de acordo com o disposto na tabela I referida no artigo 4º do RCPAT[11], que ficam a cargo da requerente.

 

Notifique

Lisboa, 28 de Outubro de 2016

 

Texto elaborado em computador, nos termos, nos termos do artigo 131º, nº 5 do CPC, aplicável por remissão do artigo 29º,nº1, alínea e) do RJAT, com versos em branco e revisto pelo tribunal.

 

 

O árbitro

 

Arlindo José Francisco

 



[1] Acrónimo de Contribuinte Fiscal

[2] Acrónimo de Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária

[3] Acrónimo de Autoridade Tributária e Aduaneira

[4] Acrónimo de Centro de Arbitragem Administrativa

[5] Acrónimo de Valor Patrimonial tributário

[6] Acrónimo de Tabela Geral de Imposto do Selo

[7] Acrónimo de Imposto do Selo

[8] Acrónimo de Tribunal Arbitral

[9] Acrónimo de Código de Procedimento e de Processo Tributário

[10] Acrónimo de Código de Processo Civil

[11] Acrónimo de Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária