Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 109/2014-T
Data da decisão: 2014-12-14  IMT  
Valor do pedido: € 27.686,49
Tema: IMT – Isenção DL 423/83 | Empreendimentos turísticos
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Processo n.º 109/2014-T

 

Requerente: A e B

Requerida : Autoridade Tributária e Aduaneira

 

 

DECISÃO ARBITRAL

 

I. Relatório

 

1.    A e B, inscritos sob os NIF ... e ..., com domicílio na ... (doravante, “Requerentes”), abrangidos pelo âmbito territorial do Serviço de Finanças de …, interpuseram, a 11/02/2014, ao abrigo da alínea a) do n.º 1 do artigo 2º e dos artigos 10º e seguintes do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, em conjugação com a alínea a) do artigo 99º e a alínea d) do n.º 1 do artigo 102º, ambos do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), aplicável por força da alínea a) do n.º 1 do artigo 10º daquele Decreto-Lei, pedido de constituição de tribunal arbitral.

2.    O pedido visa a declaração de ilegalidade da liquidação adicional de IMT, no valor de € 27.686,49, emitida pelo Serviço de Finanças de … – doravante, apenas, “SF” –, por referência ao imóvel identificado infra.

3.    A liquidação em apreço incide sobre a compra que os Requerentes efectuaram à sociedade C – inscrita sob o NIPC ... –, em 28/12/2005, por escritura lavrada no Cartório Notarial a cargo da Licenciada … (livro 28 – fl. 105) da fracção ... do prédio urbano, inscrito na matriz predial urbana da freguesia de ... sob o n.° ..., integrado no …, sito na …, freguesia de ... do concelho de ….

4.    A liquidação foi efectuada com base no preço atribuído ao direito adquirido, no montante de € 425.946,00 à taxa de 6,5% (cfr. alínea d) do artigo 17.° do Código do IMT).

5.    A liquidação em apreço tem por base as conclusões apuradas no decurso da inspecção tributária, levada a curso pelos serviços da Direcção de Finanças de Faro, entre 19/07/2013 e 12/09/2013, com base na Ordem de Serviço OI....

6.    Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do art.º 6.º e da alínea b) do n.º 1 do art.º 11.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, na redacção que lhe foi dada pelo art.º 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, o Conselho Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa designou como árbitro Ana Teixeira de Sousa não tendo as partes, depois de devidamente notificadas, manifestado oposição a essa designação.

7.    Assim, em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do art.º 11.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, na redacção que lhe foi dada pelo art.º 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de Dezembro, o tribunal arbitral singular foi constituído a 14/04/2014.

8.    Notificado o dirigente máximo do serviço da Administração Tributária e Aduaneira (de ora em diante designada “Requerida”) para, querendo, no prazo de 30 dias, apresentar resposta e solicitar produção de prova adicional, foi apresentada resposta em 29.05.2014, subscrita pelas juristas … e … em nome e representação da Requerida.

9.    Em 23/09/2014 o tribunal emitiu despacho propondo a dispensa da reunião prevista no artigo 18º do RJAT bem como da audição de testemunhas por considerar que a questão a decidir se trata de uma questão de direito, estabelecendo prazo para alegações escritas sucessivas.

10.    As partes concordaram com a dispensa da reunião e apresentaram alegações escritas, os Requerentes em 22/10 e a Requerida em 18/11.

11.    Os Requerente interpuseram em 23/09 requerimento solicitando, dada a identidade dos factos, que se aproveitasse para os autos a prova testemunhal produzida no processo nº 102/2014-T e no processo 110/2014-T, requerimento que foi aceite pelo tribunal.

12.    O tribunal propôs a prolação da decisão para o dia 14 de Outubro tendo a mesma sido posteriormente prorrogada até dia 14 de Dezembro.

 

II. O pedido de Pronúncia arbitral

 

13.    Sintetizando, os fundamentos apresentados pela Requerente são os seguintes:

O conceito de “instalação”

- Os Requerentes adquiriram, em 28/12/2005, a fracção acima indicada (fracção ... do prédio urbano, inscrito na matriz predial urbana da freguesia de ... sob o n.° ..., integrado no ..., sito na ..., em Vilamoura, freguesia de ... e concelho de ...).

- A escritura pública foi celebrada fazendo menção expressa à isenção de IMT pelo notário que a celebrou.

- O Conservador do Registo Predial aceitou a isenção de IMT na referida aquisição.

- A fracção dos Requerentes é uma das unidades de alojamento individualizadas e autónomas que integram o conjunto turístico ..., e de cuja instalação definitiva dependeu a completa instalação do próprio empreendimento turístico em toda a sua plenitude.

- Tendo em vista a exploração comercial da fracção os requerentes celebraram com a D, um contrato de exploração turística nos termos do qual cediam a esta o direito exclusivo de exploração da fracção.

- Por força do referido contrato, os Requerentes, na qualidade de cedente, assumiu perante a D um conjunto de deveres que condicionam a livre fruição do bem.

- Deveres que começam por entregar a fracção autónoma à D com todas as condições de utilização turística, incluindo mobilar o imóvel, assegurar determinados tipos de seguros, comunicar uma eventual intenção de venda à D e manter permanentemente a fracção autónoma em condições de ser utilizada como unidade turística de um empreendimento de 5 estrelas, recebendo uma parcela do rendimento total resultante da exploração turística do apartamento.

- Os Requerentes fundamentam a isenção de IMT nos termos do nº 1 do artigo 20º do Decreto-Lei n.º 423/83, que dispõe: “São isentas de sisa e do imposto sobre sucessões e doações, sendo o imposto do selo reduzido a um quinto, as aquisições de prédios ou de fracções autónomas com destino a instalação de empreendimentos qualificados de utilidade turística, ainda que tal qualificação seja atribuída a título prévio, desde que esta se mantenha válida e seja observado o prazo fixado para a abertura ao público do empreendimento.”.

- Os Requerentes tomam de perto a doutrina defendida no voto de vencido da Ilustre Conselheira Dulce Neto no Acórdão do STA invocado pela AT (Acórdão no Processo 968/2012) que defende que: “A correcta interpretação do n.º 1 do artigo 20.º do citado Decreto-Lei n.º 423/83 dita que se incluam no seu âmbito as transmissões efectuadas para os adquirentes das fracções, beneficiando estes do mesmo estatuto que o legislador quis conferir ao promotor imobiliário – dita a coerência do sistema que tal benefício não se cinja àquele.

- Sendo a intenção do legislador fomentar a actividade turística, em prol de tal desiderato, só se entende o dito benefício como aplicável, quer ao promotor, quer aos adquirentes das fracções, os quais, aliás, suportam o ónus do investimento.

No caso em apreço, estando em causa um conjunto turístico em que cada fracção autónoma constitui um elemento funcional (unidade de alojamento) integrante da unidade organizacional erigida para a prestação de serviços de exploração turística (o empreendimento turístico) –, é de concluir que a primeira aquisição de cada um desses elementos funcionais, porque destinada a viabilizar a entrada em funcionamento de cada um deles e, concomitantemente, do empreendimento no seu todo, se enquadrava ainda no processo de instalação do empreendimento, englobando, por conseguinte, o âmbito de aplicação do artigo 20º do Decreto-Lei n.º 423/83, dada a utilidade turística reconhecida e atribuída ao empreendimento em causa e que abrange todas os elementos funcionais que o compõem.”

- Este benefício fiscal, previsto no artigo 20º do Decreto-Lei nº 423/83, mantém-se em vigor – embora actualmente reportado ao IMT e ao Imposto do Selo, nos termos e para os efeitos previstos no artigo 28.º do Decreto-Lei nº 287/2003, de 12 de Novembro.

- O benefício fiscal em causa visa beneficiar aqueles que promovem o processo de instalação de empreendimentos de utilidade pública face à importância vital desta actividade na economia portuguesa, ou seja, aqueles que investem na instalação da referida oferta turística portuguesa de qualidade, não sendo dirigido aos que se limitam a desenvolver a actividade de exploração dos mesmos.

- Trata-se, efectivamente, de uma isenção objectiva, dirigida a beneficiar a concretização do processo de instalação de empreendimentos de utilidade pública.

- O referido artigo 20.º não concede a isenção ao construtor do empreendimento, ao promotor imobiliário ou à entidade que licencia e/ou explora o empreendimento.

- Razão por que é fundamental saber o que significa “instalar” um empreendimento de utilidade turística e, sobretudo, quando se deve considerar concluído esse processo de instalação numa situação, como a dos autos, em que está em causa um conjunto turístico, composto por unidades de alojamento autónomas e cujo paradigma de funcionamento e exploração, bem diferente do previsto para os estabelecimentos hoteleiros, poderá reflectir-se nas operações necessárias ao respectivo processo de instalação.

- Ora, nos empreendimentos compostos por unidades de alojamento em propriedade plural – como sucede in casu – não existe um único direito de propriedade, mas uma pluralidade de propriedades, tantas quantas as unidades de alojamento individualizadas e autónomas que, no seu todo, constituem o empreendimento.

- Sendo forçosa a afectação à exploração turística permanente de todas as unidades de alojamento que compõem e integram o estabelecimento – o que passa, desde logo, pelo dever de assegurar que elas se encontrem sempre em condições de serem locadas para alojamento a turistas e de nela serem prestados os serviços obrigatórios da categoria atribuída ao empreendimento turístico.

- O que significa, desde logo, que a primeira fase (construção e instalação) só pode considerar-se terminada quando se inicia ou possa iniciar a fase seguinte, isto é, quando o empreendimento fica apto a funcionar e a ser explorado para finalidade turística.

- O RJIEFET (regime Jurídico da Instalação, Exploração e Funcionamento de Empreendimentos Turistícos), aprovado pelo Decreto-Lei 39/2008, de 7 de Março, não apresenta uma noção de “instalação” distinguindo no entanto a fase da “instalação” (cap. IV) e a fase da “exploração e funcionamento” (cap.VI).

- A instalação só termina quando está concluído não só procedimento relativo ao licenciamento e autorização para a realização de operações urbanísticas relativas à construção como, também, o procedimento destinado a permitir ou viabilizar o funcionamento do empreendimento, tomando-o apto à realização da exploração turística

-O que implica, inevitavelmente, que tenham sido comercializadas pelo promotor imobiliário, pois só o seu proprietário/adquirente tem o poder-dever de celebrar o obrigatório contrato de exploração turística (artigo 45º e seguintes do RJIEFET) para viabilizar abertura da unidade de alojamento à actividade turística a que se destina como parte do empreendimento em que se integra.

- Deste modo, e visto que quem adquire uma unidade de alojamento num empreendimento turístico constituído ao abrigo do regime de propriedade plural previsto no RJIEFET não tem como objectivo a habitação mas sim a prestação de serviços de exploração turística, ou seja, tal aquisição não representa um negócio imobiliário ou um investimento num produto residencial,

- Concluem os Requerentes que a primeira aquisição de cada fracção autónoma, enquanto unidade de alojamento do ... se integra ainda no processo de instalação deste empreendimento, reunindo as condições legais para beneficiar da redução de imposto de selo e da isenção de IMT previstas no artigo 20º do Decreto-Lei n.º 423/83, de 5 de Dezembro, dada a utilidade turística reconhecida a este empreendimento pelo Senhor Secretário de Estado do Turismo e que abrange todas as unidades que o compõem.

 

A dedução da Sisa suportada pelos promotores

- Os Requerentes fazem notar que, em sede de tributação em SISA, os promotores já podiam deduzir o imposto suportado, pelo que, deve entender-se que esta norma tem um âmbito mais inovador e extenso do que a norma que historicamente a precede.

-Assim, na lógica do sistema, o referido artigo 20.º do Decreto-Lei n.º 423/83 existe como complemento àquela norma do CIMSISSD, sendo o seu âmbito, por maioria de razão, extensível aos adquirentes das fracções que, por essa via, participassem no na instalação do empreendimento e, assim, no fomento da actividade turística.

A isenção de IMI para os proprietários

- Os Requerentes entendem que, existindo no EBF uma isenção de IMI para os prédios integrados em empreendimentos a que tenha sido atribuída utilidade turística, e sendo a ratio desse benefício idêntica à da isenção de IMT na aquisição de fracções autónomas, a coerência do sistema impõe que seja interpretado de forma ampla o benefício do nº 1 do artigo 20º do Decreto-Lei nº 423/83.

 

Princípio da segurança e certeza jurídicas e duplo controlo da legalidade pelo Notário e pelo Conservador

- Nos termos previstos no n.º 1 do artigo 49.º do CIMT, “Quando seja devido IMT, os notários e outros funcionários ou entidades que desempenhem funções notariais, bem como as entidades e profissionais com competência para autenticar documentos particulares que titulem actos ou contratos sujeitos a registo predial, não podem lavrar as escrituras, quaisquer outros instrumentos notariais ou documentos particulares ou autenticar documentos particulares que operem transmissões de bens imóveis nem proceder ao reconhecimento de assinaturas nos contratos previstos nas alíneas a) e b) do nº 3 do artigo 2º, sem que lhes seja apresentado o extracto da declaração referida no artigo 19º [declaração de modelo oficial, de iniciativa dos interessados] acompanhada do correspondente comprovativo da cobrança, que arquivarão, disso fazendo menção no documento a que respeitam, sempre que a liquidação deva preceder a transmissão [os destaques são nossos]”.

Complementa o n.º 3 da mesma norma que, “Havendo lugar a isenção, as entidades referidas no nº 1 devem averbar a isenção e exigir o documento comprovativo que arquivam.”

-Sustentam os Requerentes que, a não ser a liquidação em apreço considerada ilegal, estão manifestamente violados os princípios da certeza e segurança juídica, dado no caso em apreço ser manifesto que ambos os referidos controlos de legalidade foram validamente efectuados e que, não obstante, a transmissão foi efectuada com o reconhecimento da isenção prevista no artigo 20.º do Decreto-Lei n.º 423/83.

 

A revogação ilegal de um acto válido

- Os Requerentes entendem que, nos termos previsto no artigo 140.º do CPA, atinente à revogação de actos válidos, a contrario, a revogação do benefício concedido aos Requerentes não é permitida, porque, nos termos expostos, estamos diante de um acto constitutivos de direitos ou de interesses legalmente protegidos que se consolidou na sua esfera jurídica.

 

14.    A resposta da AT

A Requerida alegou, em suma, o seguinte:

- O normativo em apreço dispõe o seguinte:

“1- São isentas de sisa e do imposto sobre sucessões e doações, sendo o imposto do selo reduzido a um quinto, as aquisições de prédios ou de fracções autónomas com destino à instalação de empreendimentos qualificados de utilidade turística ainda que tal qualificação seja atribuída a título prévio, desde que esta se mantenha válida e seja observado o prazo fixado para a abertura ao público do empreendimento.

2- A isenção e a redução estabelecidas no número anterior verificar-se-ão também na transmissão a favor da empresa exploradora, no caso de a proprietária ser uma sociedade de locação financeira e a transmissão se operar ao abrigo e nos termos do contrato de locação financeira que determinou a aquisição do empreendimento pela sociedade transmitente.”

- A questão nos autos consiste em saber se daquela norma apenas beneficiam as aquisições de prédios ou de fracções autónomas por promotores com vista a construir e instalar os empreendimentos turísticos, ou também as aquisições de fracções autónomas (unidades de alojamento) pertencentes ou integradas em empreendimentos já construídos e instalados, com vista à sua exploração.

- Recorrendo ao Decreto-lei nº 39/2008, de 7 de Março (RJIEFET – Regime Jurídico da Instalação, Exploração e Funcionamento dos Empreendimentos Turísticos), a Requerida considera que o conceito de “instalação” fica patente na legislação, que distingue esta, por um lado e “funcionamento “ e “exploração” por outro.

- Para efeito desta distinção a Requerida recorre à fundamentação e enquadramento jurídico estribados nos Acórdãos do STA de 30/01/2013, no processo 01193/12 e de 11/09/2013 no processo 01409/13.

- No que respeita ao conceito de “instalação” por contraponto com o conceito de “exploração, e no que respeita à figura do promotor, transcreve-se o seguinte do sumário do acórdão 23/01/2013, no processo nº 0968/12 :

- “III - Quando o legislador utiliza a expressão aquisição de prédios ou de fracções autónomas com destino à «instalação», para efeitos do benefício a que se reporta o nº 1 do art. 20º, do Decreto-Lei nº 423/83, de 5 de Dezembro, não pode deixar de entender-se como referindo-se precisamente à aquisição de prédios (ou de fracções autónomas) para construção de empreendimentos turísticos, depois de devidamente licenciadas as respectivas operações urbanísticas, visando beneficiar as empresas que se dedicam à actividade de promoção/criação dos mesmos.

Este conceito de «instalação» é o que se mostra adequado a todo o tipo de empreendimentos turísticos e não é posto em causa pelo facto de os empreendimentos poderem ser construídos/instalados em regime de propriedade plural, uma vez que esta tem a ver com a «exploração» e não com a «instalação».

Nos empreendimentos turístico constituídos em propriedade plural (que compreendem lotes e ou fracções autónomas de um ou mais edifícios, nos termos do disposto no art. 52º, nº 1, do Decreto-Lei nº 39/2008, de 7 de Março), destacam-se dois procedimentos distintos, ainda que possam ocorrer em simultâneo: um relativo à prática das operações necessárias a instalar o empreendimento; outro, relativo às operações necessária a pô-lo em funcionamento e a explorá-lo, sendo que a venda das unidades projectadas ou construídas faz necessariamente parte do segundo.

O legislador pretendeu impulsionar a actividade turística prevendo a isenção /redução de pagamento de Sisa /Selo, para os promotores que pretendam construir/criar estabelecimentos (ou readaptar e remodelar fracções existentes) e não quando se trate da mera a aquisição de fracções (ou unidades de alojamento) integradas nos empreendimentos e destinadas à exploração, ainda que sejam adquiridas em data anterior à própria instalação/licenciamento do empreendimento.

VII - Quem adquire as fracções não se torna um co-financiador do empreendimento, com a responsabilidade da respectiva instalação, uma vez que está a adquirir um produto turístico que foi posto no mercado pelo promotor, seja a aquisição feita em planta ou depois de instalado o empreendimento, como um qualquer consumidor final, tanto mais que as fracções podem ser adquiridas para seu uso exclusivo e sem qualquer limite temporal (no caso de empreendimentos turísticos constituídos em propriedade plural).”

- Justamente, a aquisição efectuada pelos Requerentes, já em momento posterior ao da licença de utilização e, por conseguinte, depois da fase de instalação do empreendimento turístico, destina-se à exploração comercial.

- As restrições e obrigações associadas à aquisição da fracção autónoma, a que os Requerentes fazem referência correspondem pois a um novo paradigma de exploração dos empreendimentos turísticos em propriedade plural, com consagração expressa na lei.

- Assim, de acordo com este novo paradigma de exploração, e não de instalação como pretendem os Requerentes, embora as unidades de alojamento que compõe o empreendimento turístico se possam constituir como fracções autónomas, essas unidades de alojamento consideram-se sempre em exploração turística, donde a sua aquisição se destina à exploração e não à implantação.

A isenção de IMI

- Entende a Requerida que a interpretação sistemática pugnada pelos Requerentes nos art. 121º a 128º da PI falece de qualquer sustentação legal uma vez que o IMI e o IMT são impostos que visam tributar realidades distintas.

.      A intervenção dos proprietários como promotores do empreendimento

- A Requerida considera não ter sido provada esta intervenção tanto mais que a aquisição da aludida fracção veio a ocorrer em momento posterior ao da concessão da licença de utilização turística nº 17/05 de 30/09/2005, pela CM de ....

Princípios da segurança e certeza jurídica

- A AT, Requerida entende que os Requerentes poderiam ter vinculado a AT ao entendimento sustentado, e seguido pelo Notário e Registo, através do mecanismo do pedido de informação vinculativa.

- E não através do entendimento do Notário ou Registo acerca da aplicação de uma isenção uma vez que estas entidades estão sujeitas a um dever de fiscalização em geral mas não ao dever de concessão ou reconhecimento de benefícios fiscais pelo que o cumprimento do dever de fiscalização não cria, para os contribuintes, um direito ou uma legítima expectativa a uma isenção fiscal.

Revogação da concessão do benefício fiscal

- A Requerida alega que o benefício fiscal de isenção de IMT previsto no nº 1 do artigo 20º do Decreto-Lei nº 423/83 é um benefício de natureza automática e não concedido através de qualquer acto administrativo pelo que o disposto nos artigos 140º e 141º do CPA não é minimamente aplicável à situação em apreço.

 

15.    Os Requerentes apresentaram alegações escritas, em 22/10 através das quais sustentaram:

- que a situação objecto do presente processo é única e distinta da situação objecto de do Acórdão do STJ de 23/01/2013

- anexando cópia do acórdão do CAAD no processo 122/2014-T onde o tribunal, numa situação similar à dos autos, decidiu pela procedência da acção da Requerente por considerar que ficou demonstrado que a aquisição em causa contribuiu de forma decisiva para a instalação do ...

16.    A Requerida apresentou alegações escritas em 18/11.

- Dando por integralmente reproduzidos todos os argumentos de facto e de direito constantes da resposta.

- Cita os processos nº 102/2014-T, 103/2014-T, 104/2014-T e 110/2014-T, onde se discute a mesma questão e onde o tribunal aplicou o mesmo entendimento que consta do Acórdão de Uniformização de Jurisprudência de 23/01/2013, do STA, tendo sido sistematicamente indeferido o pedido dos Requerentes.

17.    Objecto do pedido

As  questões a decidir nos autos consistem no seguinte:

·      saber se a primeira aquisição de fracção autónoma destinada a exploração turística e integrada em empreendimento turístico de propriedade plural a que foi atribuído o estatuto de utilidade turística integra, ou não, a fase de instalação desse empreendimento, o que se traduz, na determinação do campo de aplicação do beneficio fiscal previsto no artigo 20º do Decreto-Lei 423/83 de 05.12

·       decidir se o acto de liquidação adicional de IMT, no valor de € 27.686,49, emitida pelo Serviço de Finanças de ... 2 (...) sobre o imóvel identificado infra é ilegal por se tratar de um acto que revoga um benefício fiscal em desconformidade com os preceitos legais aplicáveis, nomeadamente os artigos 140º e 141º do CPA.

 

18.     Saneamento

O tribunal arbitral é materialmente competente, nos termos do disposto nos artigos 2.º, n.º 1, al. a) do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária.

As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias e têm legitimidade nos termos do art.º 4.º e do n.º 2 do art.º 10.º do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (RJAT), e art.º 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março.

O processo não padece de qualquer nulidade nem foram suscitadas pelas partes quaisquer excepções que obstem à apreciação do mérito da causa, pelo que se mostram reunidas as condições para a prolação da decisão arbitral.

 

II. FUNDAMENTAÇÃO

 

19.    Factos provados

Com base nas peças juntas pelos Requerente (pedido de pronúncia arbitral, ; Resposta da A.T.), fixa-se a seguinte factualidade:

- Em 2005/12/28 o s.p. A NIF ... interveio na escritura de compra e venda celebrada no Cartório Notarial de ... (escritura 28/…), na qualidade de comprador da fracção autónoma designada pela letra ..., do prédio urbano inscrito na matriz predial sob o artigo ..., situado no ... sito na Avenida de Cerro da Vila, freguesia da ... e conselho de ..., para a qual foi reconhecida pelo notário, a isenção de Imposto Municipal sobre Transmissões Onerosas (IMT), ao abrigo do art.º 20.º do DL 423/83 de 5 de Dezembro (Utilidade Turística).

- O vendedor do referido aldeamento foi o s.p. C NIPC ….

- Por despacho de 02 de Junho de 2005, do Secretário de Estado do Turismo publicado no Diário da República, 3ª série n.º135 de 15 de Junho de 2005, foi atribuído o estatuto de utilidade turística a título prévio e por despacho de 07 de maio de 2007, do Secretário de Estado publicado no Diário da República, 2ª série n.º111 de 11 de Junho de 2007, foi confirmado o estatuto de utilidade turística ao conjunto turístico ... nos termos do disposto no n.º1 do art.º 2.º e no n.º3 do art.º7.º do decreto-lei n.º423/83.

- Nos termos do n.º1 do art.º 11.º do DL 423/83 de 5 de Dezembro, a utilidade turística valerá pelo prazo e nos termos fixados no respectivo despacho de atribuição.

- No âmbito da acção inspectiva efectuada ao abrigo da OI... os Requerentes foram notificados para exercer o seu direito de audição prévia sobre o projecto de relatório, o que os Requerentes exerceram, invocando, um entendimento sobre o direito que serve de fundamento ao seu pedido de pronúncia arbitral;

-A inspecção tributária manteve o seu entendimento sobre o direito, convolando o projecto de relatório em definitivo.

- As correcções sancionadas pela inspecção tributária e notificadas aos Requerentes originaram a liquidação de IMT controvertida.

- A licença de utilização turística foi emitida pela CM de ... a 30/09/2005, conforme consta do relatório final da inspecção tributária bem como da escritura de aquisição do imóvel.

 

20.    Factos não provados

O tribunal não considera existirem factos relevantes que não se considerem provados nos autos.

 

O Direito aplicável

21.    Resulta das posições das Partes que a questão essencial nos presentes autos consiste em saber se da isenção de IMT prevista no artigo 20º do Decreto-Lei nº 423/83 apenas beneficiam as aquisições de prédios ou de fracções autónomas com vista a construir e instalar os empreendimentos turísticos, ou também as aquisições de fracções autónomas (unidades de alojamento) pertencentes ou integradas em empreendimentos já construídos, com vista à sua exploração, compreendendo-se ainda estas últimas no conceito de “instalação” utlizado no referido diploma legal.

22.    Efectivamente, ambas as partes acordam que o benefício fiscal atribuído pelo nº1 do artigo 20º do Decreto-Lei nº423/83 se aplica à instalação de empreendimentos declarados de utilidade turística, sendo que no entanto discordam acerca da abrangência desse conceito de “instalação”.

23.    Segundo os Requerentes, compreende-se ainda nesse conceito a primeira aquisição de prédios ou fracções autónomas em regime de propriedade plural; a posição da Requerida é a de que essa aquisição, já após a construção e licenciamento, se compreende dentro do conceito de “exploração” e não de “instalação”.

24.    Sobre esta questão, a Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, decidiu recentemente, em julgamento ampliado, com uma posição maioritariamente sufragada (6 votos a favor, 4 contra) no acórdão de 23 de Janeiro de 2013 - processo n.º 969/12 que a primeira aquisição de fracção destinada a exploração turística não integra já a fase de instalação do empreendimento.

25.    Também no mesmo sentido, o STA decidiu nos proc. nºs 969/12, 1001/12 e 1005/12 proferidos na mesma sessão e nºs 971/12, 972/12, 999/12, 1003/12 e 1193/12, proferidos na sessão seguinte, em 30 de Janeiro de 2013 e ainda no processo nº 01909/13, de 26/02/2014.

26.    A mesma questão foi igualmente apreciada em vários processos, nº 102/2014-T, 103/2014-T, 104/2014-T e 110/2014-T, no âmbito da Arbitragem Tributária, tendo-se verificado uma quase unanimidade (à excepção do processo nº 122/2014-T) alcançada nas decisões proferidas.

 

A ratio legis do artigo 20º do Decreto-Lei nº 423/83 

27.    O Decreto-Lei n.º 423/83, de 5 de Dezembro, veio actualizar o instituto da utilidade turística que, de acordo com o seu preâmbulo, se havia revelado “um dos instrumentos mais eficazes para o desenvolvimento do sector, em particular no que respeita a equipamento hoteleiro e similar, a que foi inicialmente dirigido”, mas que, após 30 anos de vigência, não correspondia já às necessidades efectivas do sector do turismo.

28.    Segundo o seu artigo 1.º “A utilidade turística consiste na qualificação atribuída aos empreendimentos de carácter turístico que satisfaçam os princípios e requisitos definidos no presente diploma e suas disposições regulamentares”, sendo atribuída - artigo 2º, n.º 1 - “por despacho do membro do governo com tutela sobre o sector do turismo”.

29.    Por regra - artigo 3.º, n.º 5 -, “A utilidade turística abrange a totalidade dos elementos componentes ou integrantes dos empreendimentos”, podendo - artigo 7.º - “ser atribuída a título prévio ou definitivo”, sendo (n.º 2) “a título prévio quando for atribuída antes da entrada em funcionamento dos empreendimentos novos e nos casos previstos nas alíneas b) e c) do n.º 1 do artigo 5º ” e (n.° 3) “a título definitivo quando for atribuída a empreendimentos já em funcionamento ou resultar da confirmação da utilização turística concedida a título prévio”.

30.    Nos termos do artigo 20.º do mesmo Diploma:

1- São isentas de sisa e do imposto sobre sucessões e doações, sendo o imposto do selo reduzido a um quinto, as aquisições de prédios ou de fracções autónomas com destino à instalação de empreendimentos qualificados de utilidade turística, ainda que tal qualificação seja atribuída a título prévio, desde que se mantenha válida e seja observado o prazo fixado para a abertura ao público do empreendimento.

2 - A isenção e a redução estabelecidas no número anterior verificar-se-ão também na transmissão a favor da empresa exploradora, no caso de a proprietária ser uma sociedade de locação financeira e a transmissão se operar ao abrigo e nos termos do contrato de locação financeira que determinou a aquisição do empreendimento pela sociedade transmitente.”

31.    O Decreto-Lei n.º 423/83 constituiu um instrumento jurídico de fomento e incentivo ao investimento no sector do turismo, que se quer de qualidade. Este impulso que se pretendeu dar ao sector do turismo está bem patente desde logo no artigo 5.º. Com efeito, a lei apenas reconhece a possibilidade de ser atribuída a utilidade turística a empreendimentos que resultem de um directo investimento, traduzido quer na construção de empreendimentos novos, quer na remodelação, beneficiação ou reequipamento totais ou parciais, quer na realização de obras conducentes ao aumento da capacidade em, pelo menos, 50%.

32.    Por esse motivo, o legislador entendeu atribuir benefícios fiscais em sede de imposto de sisa e do selo, às empresas proprietárias que realizam o esforço do investimento.

33.    Pretendeu o legislador impulsionar este sector de actividade, prevendo isenção/redução de pagamento de sisa/selo, mediante determinadas condições, a quem vai criar estabelecimentos turísticos, e, segundo se entende, não a quem se limita a adquirir fracções pertencentes a empreendimentos já instalados.

34.    Efectivamente, são os promotores que são responsáveis pelo investimento imobiliário, sob os quais impede o risco de criação e instalação do empreendimento turístico, responsáveis pelo planeamento, concepção e licenciamento do mesmo.

35.    A venda das unidades do empreendimento turístico, acompanhada de um contrato de exploração com uma entidade gestora ou administradora, está vocacionada para a exploração comercial da fracção, pretendendo-se retirar deste contrato um rendimento mas sem assumir riscos ou contribuir para o licenciamento.

36.    O entendimento defendido pelos Requerentes no sentido de que esta aquisição, seguida da celebração do contrato de exploração integra a “instalação”  e é por isso merecedora de benefícios fiscais, especificamente o previsto no nº 1 do artigo 20º do Decreto-Lei nº 423/83 não tem cabimento na letra ou no espírito da lei.

37.    Aliás, se assim fosse, porque não considerar que esse benefício se aplicaria igualmente a posteriores aquisições de fracções autónomas integradas em empreendimentos turísticos em propriedade plural, por exemplo, enquanto não fosse atribuída a utilidade turística a título definitivo, uma vez que os posteriores adquirentes ficam sujeitos às mesmas obrigações dos adquirentes originários?

38.    O entendimento de que este benefício visa incentivar aqueles que procedem à instalação do empreendimento turístico e o colocam no mercado para ser explorado, após essa instalação, corresponde à interpretação perfilhada e que decorre do elemento histórico, racional/teleológico, mas também literal das normas jurídicas em apreço e afirmado na jurisprudência do STA oportunamente citada.

 

O conceito de “instalação” previsto no artigo 20º do Decreto-Lei nº 423/83

39.    O conceito de “instalação” utilizado pelo nº 1 do artigo 20º do Decreto-lei nº 423/83 não se encontra expressamente definido no âmbito desse mesmo diploma ou em legislação fiscal específica.

40.    Os requisitos da isenção de IMT, e da redução do Imposto de Selo, são os seguintes:

1 - O prédio ou a fracção autónoma adquirida tem que se integrar na fase de instalação de empreendimento qualificado como de utilidade turística;

2 - O estatuto de utilidade turística tem que estar válido;

3 - O prazo fixado para a abertura ao público do empreendimento tem que ser observado.

41.    Quanto ao primeiro requisito, o citado acórdão do STA de 23/01/2013 refere que:  

I - Na determinação do sentido e alcance das normas fiscais e na qualificação dos factos a que as mesmas se aplicam são observadas as regras e princípios gerais de interpretação e aplicação das leis sendo que “Sempre que, nas normas fiscais, se empreguem termos próprios de outros ramos de direito, devem os mesmos ser interpretados no mesmo sentido daquele que aí têm, salvo se outro decorrer directamente da lei” (art. 11º nºs 1 e 2, da LGT).

42.    O regime jurídico da instalação, exploração e funcionamento dos empreendimentos turísticos foi estabelecido no Decreto-Lei nº 167/97 de 04/07.

43.    Este diploma, vigente à data da aquisição da fracção autónoma pelos Requerentes, incluía um capítulo III sob a epígrafe “Instalação”.

44.    Nos termos do artigo 9º do Decreto-Lei nº 167/97 “Para efeitos do presente diploma, considera-se instalação de empreendimentos turísticos o licenciamento da construção e ou da utilização de edifícios destinados ao funcionamento daqueles empreendimentos”.

45.    Os artigos 11ºa 40º, incluídos no capítulo da “Instalação” regulam as matérias relacionadas com o licenciamento de construção, licenciamento de utilização, obtenção do alvará de utilização turística, obtenção de classificação para o empreendimento.

46.    O capítulo IV refere-se à “Exploração e Funcionamento”, envolvendo actividades e operações relativas à exploração, conservação, fruição, administração, uso e partes comuns.

47.    O Decreto-Lei nº 55/2002, que altera o Decreto-Lei nº167/97 mantém uma noção de “instalação” diferenciada da de “exploração” considerando “instalação de empreendimentos turísticos o processo de licenciamento, ou de autorização para a realização de operações urbanísticas relativos à construção de edifícios ou suas fracções, destinados ao funcionamento daqueles empreendimentos”.

48.    Parece desde logo ficar clarificado, no âmbito da legislação aplicável à altura da aquisição da fracção autónoma, a existência de uma diferenciação funcional e operacional entre a “instalação” e a “exploração”, bem como as actividades que integram cada uma destas fases.

49.    Bem como que as operações de “instalação” precedem as de “exploração”.

50.    O Decreto-Lei nº 39/2008, de 7 de Março, que revogou o Decreto-Lei nº 167/97, não veio alterar a substância desta matéria, nomeadamente introduzindo alterações ou inovações naquilo que se considera “instalação” e “exploração”, criando sim a obrigação (anteriormente faculdade) de permanente afectação à exploração turística de todas as unidades de alojamento que compõem o empreendimento, independentemente do regime de propriedade em que assentam.

51.    O conceito de “instalação” foi amplamente analisado e delimitado pelo acórdão uniformizador de jurisprudência do STA de 23/01/2013, definição à qual o tribunal adere e que se cita resumidamente.

Dito por outras palavras, a «instalação» emerge como um procedimento que compreende os actos jurídicos e os trâmites tendentes ao licenciamento (em sentido amplo, compreendendo comunicações prévias ou autorizações, conforme o caso) das operações urbanísticas necessárias à construção de um empreendimento turístico, bem como a obtenção dos títulos que o tornem apto a funcionar e a ser explorado para finalidade turística.

Depois de construído e obtidas pelos promotores do investimento as licenças necessárias a tornarem o empreendimento apto ao exercício da actividade turística, cada empreendimento turístico “deve ser explorado por uma única entidade, responsável pelo seu integral funcionamento e nível de serviço e pelo cumprimento das disposições legais e regulamentares aplicáveis” (nº 1 do art. 44º do Decreto-Lei nº 39/2008), sendo tal entidade designada pelo titular do respectivo alvará de autorização de utilização para fins turísticos (nº 2 do art. 44º), ou seja, pelo promotor (cfr. o Capítulo VII e arts. 41º e ss. do Decreto-Lei nº 39/2008, que estabelece as regras relativas à exploração em funcionamento.

E ainda que as unidades de alojamento estejam ocupadas pelos respectivos proprietários, cabe à entidade exploradora assumir a exploração continuada das mesmas, devendo mantê-las permanentemente em regime de exploração turística (art. 45º do Decreto-Lei nº 39/2008).

Conclui o citado acórdão, “Em suma, da leitura do regime constante dos arts. 5º a 6º e 23º a 40º do Decreto-Lei nº 39/2008 verifica-se que o conceito de «instalação» nada tem que ver com o «funcionamento» e a «exploração» e que naquele cabem apenas, como refere a Fazenda Pública, os actos, as operações e os procedimentos tendentes à construção/criação de empreendimentos turísticos.”

De todo o modo, ainda que se considerasse que a aquisição em causa ocorrera ainda durante a fase de construção/instalação do empreendimento, o que não é de todo o caso, seria forçoso considerar, como o faz aquele acórdão, que “eventuais vendas das unidades de alojamento realizadas ainda durante a fase de construção/instalação do empreendimento já fazem parte da exploração do mesmo.”

Prosseguindo com a transcrição:

Destacam-se, assim dois procedimentos distintos, ainda que possam ocorrer em simultâneo: um relativo à prática das operações necessárias a instalar o empreendimento; outro, relativo às operações necessárias a pô-lo em funcionamento e a explorá-lo, sendo que a venda das unidades projectadas ou construídas faz necessariamente parte do segundo momento.

Embora se reconheça que há no caso dos empreendimentos turísticos em propriedade plural uma evidente compressão do conteúdo do direito de propriedade (uma vez que ainda que a habitem a título permanente a unidade de alojamento não se destina a habitação), a verdade é que tais restrições são estabelecidas em função da forma de exploração e funcionamento do empreendimento e não em virtude da sua instalação.”

Mais, a razão se ser e finalidade do nº 1 do art. 20º do citado Decreto-Lei nº 423/83 de 05/01 é a de beneficiar com a isenção de IMT os promotores que pretendam construir/criar estabelecimentos ou readaptar e remodelar fracções existentes, “e não quando se trate da mera a aquisição de fracções (ou unidades de alojamento) integradas nos empreendimentos e destinadas à exploração, ainda que sejam adquiridas em data anterior à própria instalação/licenciamento do empreendimento (Como vimos, na verdade, nada impede que o promotor do investimento comece por vender as futuras fracções ou unidades antes mesmo da construção do empreendimento e da sua instalação.) “, conforme se transcreve daquele acórdão.

Prossegue o acórdão, “Na verdade, quando os particulares adquirem as fracções fazem-no, como se afigura óbvio, como consumidores de um produto turístico que foi posto no mercado pelo promotor tendo em vista a exploração, pois, como vimos, a celebração dos contratos promessa de compra e venda é acompanhada da celebração do contrato de exploração”.

52.    Igualmente o tribunal arbitral, no processo n 102/2014-T, acrescenta o seguinte:

Relativamente ao outro dos requisitos para beneficiar isenção a requerente teria de desenvolver a função de promotora ou criadora de actividade urbanísticas e turísticas.

Quanto a este requisito, a ora requerente alega que abdicou deliberadamente da livre fruição do seu imóvel em benefício da exploração turística e comercial do mesmo, através da celebração de um contrato de exploração turística nos termos do qual cedia o direito exclusivo de exploração da fracção através da celebração de contrato de exploração celebrado com a entidade exploradora do empreendimento turístico, em troca de uma remuneração, e nesses termos teria direito a referida isenção.

Sobre esta importância deste argumento invocado, e da prova testemunhal, para a questão em causa, sobre o mesmo se diz que a escolha da Requerente de livremente transmitir a fruição do seu imóvel em troca de uma remuneração, mesmo que a mesma seja para a entidade exploradora do empreendimento turístico onde está inserido o imóvel, não efeito para o benéfico da isenção, porque não se insere no conceito de instalação, que é um requisito necessário para beneficiar da isenção.

Tendo a Requerente adquirido o imóvel já devidamente instalado num empreendimento turístico, não exerceu a requerente uma função que estivesse abrangida pelo conceito de instalação, conforme já se verificou, inclusive nas situações em que existe por parte da requerente, alterações ou melhorias à propriedade quer no seu interior quer exterior, as mesmas não se consubstancias no âmbito do conceito de instalação, no sentido da interpretação conferida.

Mesmo que tais alterações ou melhorias sejam efectuadas pela requerente ou por terceiro no âmbito de um contrato de exploração.

Face ao exposto, a transferência do direito de fruição através de um contrato de exploração, não altera a situação sub judice no âmbito de aplicação da isenção e de acordo.

53.    Em tudo o mais se remete para a doutrina pugnada no referido acórdão de 23 de Janeiro de 2013, especificamente para as respectivas conclusões supra citadas, doutrina à qual se adere.

54.    Com efeito, não parece possível descortinar no Decreto-Lei nº423/83, contextualizado e enquadrado por ampla jurisprudência, quaisquer elementos de interpretação que permitam identificar e legitimar uma finalidade (extra-fiscal) de incentivo à aquisição de fracções autónomas integradas em empreendimentos turísticos pelos proprietários que não assumem nem financiam as diversas actividades e operações que, nos termos da legislação aplicável, integram a “instalação” desses empreendimentos.

55.    Tem vindo a ser afirmado pelo Supremo Tribunal Administrativo em ulteriores acórdãos em que a mesma questão se colocou, «tendo em conta a suprema importância da uniformidade da jurisprudência no âmbito interno dos tribunais, sobretudo em face da segurança e da estabilidade das relações jurídicas a que o direito deve ambicionar e aceder, e que encontra consagração no art. 8.º, n.º 3 do Código Civil - ao impor ao julgador o dever de considerar todos os casos que mereçam tratamento análogo, a fim de obter uma interpretação e aplicação uniformes do direito - cumpre-nos aderir a essa orientação jurisprudencial e aos fundamentos em que se estriba o referido acórdão, vertidos, de forma abreviada mas elucidativa, no respectivo sumário».

56.    Os Requerentes não aportam novas razões, distintas daquelas que foram já apresentadas em diversos processos decididos pelo STA ou pelos tribunais arbitrais alegando, em síntese, por um lado, que o julgador devia ter seguido os objectivos constantes da introdução do Decreto-Lei n.º 423/83 e fazer uma interpretação mais actualizada dos princípios dele constantes, o que conduziria a uma decisão de sentido oposto àquela a que chegou e, por outro lado, alegando “confusão” conceptual entre os conceitos de exploração e instalação, por os decisores não terem tido o cuidado e a preocupação de entender a realidade económica subjacente à instalação de um empreendimento turístico. O essencial da tese que defendem coincide com a tese que consta dos votos de vencido lavrados no referido acórdão.

57.    Sendo que, ao invés, se afigura a este tribunal não convincente, a decisão no acórdão apresentado pelos Requerentes nas suas alegações –processo nº122/2014-T –, ao começar por ignorar expressamente o conceito de “instalação” vertido nos diplomas legais aplicáveis (Decreto-Lei nº 167/97 e Decreto-Lei nº 39/2008), pegando depois no mesmo sem retirar as devidas consequências e não apresentando fundamentação que possa contrariar, em termos consistentes ou inovadores, a ampla jurisprudência do STA e dos tribunais arbitrais sobre esta matéria.

58.    Assim, em face do artigo 8.º, n.º 3, do Código Civil, e tendo em conta que, desde a prolação daquele acórdão, a questão tem vindo a ser apreciada e decidida de forma praticamente uniforme e com o mesmo sentido decisório, em vários outros acórdãos dos tribunais judiciais e arbitrais, impõe-se-nos, em respeito pela citada orientação jurisprudencial, julgar improcedente o pedido dos Requerentes.

59.    Alegam ainda os Requerentes ser ilegal o acto de liquidação porquanto o mesmo pressupõe a revogação de um acto administrativo de concessão de um benefício fiscal, violando o disposto nos artigos 140º e 141º do CPA.

60.    Também neste argumento não se poderá dar razão aos Requerentes. Com efeito, é pacífico na jurisprudência e doutrina que o benefício em causa tem carácter automático, decorrendo directa e automaticamente da lei, sem necessidade de qualquer reconhecimento administrativo.

61.    E sendo susceptível de ser sindicado e revogado pela AT nos termos e prazos previstos na lei, nomeadamente artigo 35º nº 1 do Código do IMT conjugado com o artigo 45º da LGT.

62.    Face a tudo o que foi dito, conclui-se que a aquisição da fracção autónoma no empreendimento turístico, “...”, ainda que integrado no empreendimento em causa e mesmo que afecta à exploração turística, e inclusive que tal exploração turística seja levada a cabo pela entidade exploradora do restante empreendimento turistíco, a aquisição pelos Requerentes não cumpre um dos requisitos fundamentais do conceito de instalação, pelo que não pode beneficiar das isenções consagradas no art.20º, nº 1, do Decreto-Lei nº423/83.

 

DECISÃO

Nestes termos e nos demais de direito, decide-se pela legalidade do ato tributário de liquidação em sede de Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imoveis, no valor de 27.686,49 € (vinte e sete mil e vinte e quatros euros e setenta e nove euros).

 

Valor do processo

De harmonia com o disposto no n.º 2 do art.º 315.º do CPC, na alínea a) do n.º1 do art.º 97.º-A do CPPT e ainda do n.º 2 do art.º 3.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária fixa-se ao processo o valor de 27.686,49 € (vinte e sete mil e vinte e quatros euros e setenta e nove euros).).

 

Custas

Para os efeitos do disposto no n.º 2 do art.º 12 e no n.º 4 do art.º 22.º do RJAT e do n.º 4 do art.º 4.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se o montante das custas em € 1.224,00, nos termos da Tabela I anexa ao dito Regulamento, a suportar integralmente pelos Requerentes.

Notifique-se.

 

Lisboa, 14 de Dezembro de 2014

 

O Árbitro

 

 

 

 (Ana Teixeira de Sousa)

 

[Texto elaborado em computador, nos termos do artigo 131.º, número 5 do Código de Processo Civil (CPC), aplicável por remissão do artigo 29.º, n.º 1, alínea e) do Regime de Arbitragem Tributária. A redacção da presente decisão rege-se pela ortografia antiga.]