Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 89/2019-T
Data da decisão: 2019-06-14  IRC IVA  
Valor do pedido: € 25.970,19
Tema: IRC e IVA – Aplicação Métodos Indiretos – Exceção Competência Tribunal.
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DECISÃO ARBITRAL

 

RELATÓRIO

A -PARTES

A..., LDA., titular do número de contribuinte..., com sede na Rua ..., n.º..., ...-... ..., doravante designado como Requerente ou Sujeito Passivo.

AUTORIDADE TRIBUTARIA E ADUANEIRA, doravante designada como Requerida ou AT.

No dia 12-02-2019, o pedido de constituição do Tribunal Arbitral foi aceite pelo Exmo. Senhor Presidente do CAAD, e automaticamente notificada a Autoridade Tributaria e Aduaneira, conforme consta da respetiva ata.

A Requerente não procedeu à nomeação de árbitro, pelo que, ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro, com a redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro, o Conselho Deontológico, designou como arbitro o Exmo. Sr. Dr. Paulo Ferreira Alves, que comunicou a sua aceitação, nos termos legalmente previstos.

Em 02-04-2019 as partes foram devidamente notificadas dessa designação, e não manifestaram vontade de a recusar, nos termos do artigo 11.º n.º 1, alínea a) e b), do RJAT e dos Artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.

Deste modo, em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro, com a redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66­B/2012, de 31 de dezembro, o Tribunal Arbitral Singular foi regularmente constituído em 25-03-2019.

Ambas as partes, concordaram com a dispensa da realização da reunião prevista no artigo 18.º do RJAT.

Foram apresentadas resposta às exceções suscitadas e alegações escritas sucessivas.

O Tribunal Arbitral foi regularmente constituído em 23-04-2019 é materialmente competente, nos termos dos art.ºs 2.º, n.º 1, alínea a), e 30.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro.

As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão legalmente representadas (art.ºs 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e art.º 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março).

O processo não enferma de vícios que o invalidem.

B – PEDIDO       

1.            A Requerente, peticiona a declaração de ilegalidade parcial do ato tributário de liquidação, em sede de Imposto Sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas, referente ao ano de 2014, n.º 2018..., de 15.10.2018, e em sede de Imposto sobre o Valor Acrescentado, referente ao ano de 2014, n.º 2018..., 2018..., 2018..., 2018..., 2018..., 2018..., 2018... e 2018..., todos de 13.10.2018, no valor global de € 25.970,19 (vinte e cinco mil euros e novecentos e setenta euros e dezanove cêntimos).

C – CAUSA DE PEDIR

2.            A Requerente alegou em síntese, com vista a fundamentar o seu pedido de pronúncia arbitral de declaração de ilegalidade dos atos tributários de liquidação, o seguinte:

2.1.        Não se encontram reunidos os pressupostos para aplicação de métodos indiretos.

2.2.        Refuta veementemente a aventada omissão de rendimentos que, jamais ocorreu.

2.3.        A ocorrência de prejuízos sucessivos radica tão-só na incontornável exploração deficitária do estabelecimento comercial aqui em causa e a evidencia disso mesmo resulta do facto levado ao Relatório inspetivo no seu ponto II.3.2, a fls. 7, onde se refere que “No início de 2017, houve cedência de exploração do estabelecimento, a favor do sujeito passivo B..., NIF ..., pagando inicialmente o valor mensal de 900,00 € e em finais de 2007, passou para € 350,00.”

2.4.        Defende, uma manifesta errónea quantificação do lucro tributável proposto com recurso à avaliação indireta, ou seja, se a aqui A. retirasse da exploração que vinha empreendendo do estabelecimento aqui em causa um resultado contabilístico anual da ordem dos 80.000,00 € (que é, grosso modo, o lucro tributável proposto com recurso à avaliação indireta, Cfr. fls. 3 do e 6 Relatório), a decisão de cessão de exploração com contraprestação de 4.200,00 €/ano não poderia deixar de ser configurada como efetiva decisão que raiava a gestão danosa, porquanto estava a prescindir de rendimento superior a 75.000,00 €/ano.

2.5.        As verdadeiras razões da exploração deficitária e da incorrência sucessiva de prejuízos fiscais relevantes, radicam em tudo quanto se esclareceu na missiva datada de 15 de Março de 2018 e que integra o Anexo 6 do Relatório e está a fls. 12 a 14 (ab initio) daquela peça e já não na inverosímil tese da omissão de rendimentos. Este singelo exercício demonstra bem a inadequação do resultado do procedimento inspetivo que estava na base das propostas de correção e nos atos tributários de liquidação que nelas estão estribados e que aqui se sindicam.

2.6.        Já antes aventámos e aqui se renova que consideramos não se encontrarem reunidos, in casu, os pressupostos para a aplicação de métodos indiretos, por recurso a presunções ou estimativas, tendentes à fixação do IVA; como também consideramos o recurso à aplicação de métodos indiretos para a determinação do lucro tributável em sede de IRC, não está igualmente legitimado.

2.7.        A faculdade que a Administração tem de alterar os valores declarados só pode ser utilizada em situações excecionais, nomeadamente quando seja de todo impossível comprovar e quantificar direta e exatamente os elementos indispensáveis à determinação dos mesmos.

2.8.        Termina invocando que toda a ação inspetiva se encontra inquinada de base, quer por inexistência dos pressupostos de aplicabilidade de métodos indiretos ou por inadequação dos critérios usados para determinação da matéria coletável ou do imposto presumido; quer por vício de fundamentação na sua aplicabilidade ; pelo que as correções propostas não podiam deixar de ser reconsideradas sob pena dos atos tributários de liquidação subsequentes virem a enfermar de grosseira ilegalidade, o que ora se constata e nessa decorrência aqui se sindicam.

 

D- DA RESPOSTA DA REQUERIDA

3.            A Requerida, devidamente notificada para o efeito, apresentou tempestivamente a sua resposta, alegando em síntese abreviada, o seguinte:

3.1.        De acordo com os factos apurados no relatório de inspeção e objeto de sindicância em sede do procedimento de revisão a que alude o disposto no Art.º 91.º da LGT, constatou-se existirem irregularidades na contabilidade da Requerente que inviabilizaram o apuramento e quantificação da matéria tributável com recurso à avaliação direta, tendo por esse motivo sido legitimado o recurso à avaliação indireta, nos termos dos Art.º 57° do CIRC, bem como das alíneas b) e e) do Art.º 87° e alínea a) do Art.º 88º, todos da LGT.

3.2.        Em sede de aplicação de métodos indiretos, as questões referentes aos pressupostos justificam-se, essencialmente, através da suficiência, ou não, dos elementos existentes para determinar com exatidão da matéria coletável.

3.3.        Ora, da análise aprofundada da contabilidade da Requerente, relativamente ao ano de 2014, ficou comprovado que esta, assim como os valores constantes das declarações fiscais entregues, não traduzem o verdadeiro resultado fiscal obtido pelo sujeito passivo, não sendo possível a quantificação direta e exata da matéria tributável/ Imposto (IRC e IVA).

3.4.        Perante a verificação dos prejuízos fiscais sucessivos, cabia à Requerente o ónus de demonstrar as correspondentes razões justificativas para a sua existência, o que, de harmonia com o vertido no Relatório de Inspeção Tributária, corroborado pelo perito da Administração Tributária, não foi demonstrado.

3.5.        Sendo que, os custos com pessoal têm assumido valores praticamente constantes entre 2012 e 2014, mantendo-se inalterado o quadro de pessoal, a existência de gastos com indemnizações não estão refletidas no ano em análise, o valor das amortizações/depreciações, de 2011 a 2014 relativas a investimentos, têm diminuído e os saldos credores da conta de fornecedores foram regularizados por contrapartida das contas de sócios.

3.6.        Para além da Requerente não ter procedido à justificação dos sucessivos prejuízos fiscais nos anos de 2012, 2013 e 2014, ficou patente a existência de omissões, erros e inexatidões na contabilidade, nomeadamente a persistência do saldo credor na conta caixa, com a sua anulação efetuada tendo por base um documento interno, bem como o não cumprimento do previsto no Art.º 63.º -C da LGT, uma vez que nem todos os movimentos relativos a suprimentos, ou outras formas de empréstimos, passaram pela respetiva conta bancária.

3.7.        Encontrando-se justificada a determinação da matéria tributável por aplicação de métodos de avaliação indireta, os Serviços de Inspeção Tributária procederam à determinação da matéria tributável e imposto, tendo sido presumido o volume de negócios através da aplicação do rácio R18 (média da unidade orgânica da Requerente).

3.8.        Por outro lado, da análise da declaração de remunerações constante da base da entidade requerida, verifica-se que em 2010 existiam 4 funcionários a exercer funções na sociedade e, partir desse ano, passaram a ser 3 funcionários pelo menos até ao ano de 2014, sendo que, no ano de 2010, a Requerente, com 4 funcionários, tinha um volume de  negócios total de € 102.884,08, com um volume de negócios por funcionário de € 25.721,00, e para o ano de 2011, com 3 funcionários, com um volume de negócios total de € 95.282.39, é de € 31.760,00 para cada funcionário, e no ano de 2014 esse valor passou a ser de € 12.048,00.

3.9.        Quanto à justificação de que foram pagas indemnizações por despedimento e forte investimento inicial versus amortizações/depreciações, cumpre referir que esta justificação não poderá ter acolhimento, uma vez que os custos com pessoal têm assumido valores praticamente constantes desde 2012 a 2014, e, como já se referiu, o quadro de pessoal manteve-se inalterado, sendo certo que, a existir algum custo com indemnizações, isso já estaria refletido antes do ano de 2010.

3.10.      Quanto aos investimentos e amortizações/depreciações, desde o ano de 2011 ao ano de 2014, os valores têm diminuído, o que também não pode justificar a ocorrência de prejuízos; ademais, a alegação de que os prejuízos são o reflexo de numa atividade deficitária e não da omissão de proveitos/rendimentos, não tem sustentação, uma vez  que, desde o início da atividade, a Requerente declarou sempre prejuízos, in casu entre os anos de 2007 e 2017, apresentando um valor acumulado elevadíssimo, e sendo o fim último de qualquer sociedade o lucro, é legítimo questionar se durante dez anos os sócios tiveram a financiar uma exploração deficitária.

3.11.      Relativamente à manutenção de saldos credores da conta caixa durante todo ano de 2014, o que viola todas as regras contabilísticas ínsitas no SNC, tendo sido o saldo credor da conta anulado com um documento interno, no montante de € 6.171 ,73, cuja contrapartida foi a conta de empréstimos de sócios, sem qualquer documento que atestasse o fluxo financeiro, o que é manifestamente indiciador que a contabilidade não refletia todas as suas operações.

3.12.      Com efeito, a conta de sócios não poderá ser transformada numa conta de meios financeiros, ficando mais uma vez dilucidado que a contabilização de operações nas contas de sócios tem subjacente as falhas/faltas de entrada de fluxos financeiros na Requerente, por omissão da contabilização de prestações de serviços, provocando a existência de saldos credores na conta caixa em todos os meses do ano em causa.

3.13.      Em abono da verdade, e não tendo essa obrigação sido cumprida pela sociedade, as situações supra descritas evidenciam que a contabilidade não reflete todos os movimentos de cada período, evidenciando inexatidões e omissões na sua execução, o que originou a existência de saldos de caixa credores, e indicia a omissão de prestação de serviços.

3.14.      Em suma, face às anomalias, omissões e insuficiências encontradas na contabilidade da Requerente, não restava outro caminho à entidade Requerida lançar mão de tais presunções ou estimativas, para calcular e apurar o imposto em falta, tendo procedido à respetiva alteração, nos termos explanados no relatório de inspeção, de molde a apurar o lucro tributável da real atividade da Requerente no exercício de 2014.

 

E-            FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

4.            Com relevo para a apreciação e decisão das questões suscitadas, prévias, e de mérito, dão–se como assentes por provados, os seguintes factos:

5.            Foi realizada uma ação inspetiva externa à Requerente, ao exercício de 2014 e de âmbito parcial em sede de IRC e IVA, de acordo com a Ordem de Serviço n.º OI2017..., emitida pelo despacho de 01.03.2017.

6.            Dessa ação inspetiva constata-se no relatório de inspeção tributaria, que a AT, recorreu à aplicação dos métodos de avaliação indireta, conforme o demonstra o teor da notificação efetuada à Requerente:

 

7.            A Requerente em 12.06.2018 apresentou um pedido de revisão oficiosa ao Relatório de Inspeção, nos termos e para os efeitos no disposto no Art.º 91.º da LGT.

8.            O pedido de revisão oficiosa, foi indeferido, e a Requerente notificada dos seguintes atos tributários de liquidação, conforme relatório de inspeção tributaria, por aplicação dos métodos indiretos em sede de IVA e IRC:

8.1.        Ato tributário de liquidação de IRC n.º 2018..., de 15.10.2018, referente ao exercício de 2014;

8.2.        Ato de liquidação de juros compensatórios n.º 2018...;

8.3.        Em resultado do estorno de anterior liquidação n.º 2015... que materializam a liquidação de IRC e juros compensatórios atinentes ao exercício de 2014, no montante de € 10.019,40 e € 1.173,77,00;

8.4.        Ato de liquidação de IVA n.º 2018..., de 13.10.2018, que, em resultado de estorno da liquidação anterior n.º 2014..., materializou a liquidação adicional de IVA 201403-T, no montante de € 4.519,56;

8.5.        Ato de liquidação de IVA n.º 2018..., de 13.10.2018, que, em resultado de estorno da liquidação anterior n.º 2014..., materializou a liquidação de juros compensatórios de 201403-T, no montante de € 717,67;

8.6.        Ato de liquidação de IVA n.º 2018..., de 13.10.2018, que, em resultado de estorno da liquidação anterior n.º 2014..., materializou a liquidação adicional de IVA 201406-T, no montante de € 3.666,76;

8.7.        Ato de liquidação de IVA n.º 2018..., de 13.10.2018, que, em resultado de estorno da liquidação anterior n.º 2014..., materializou a liquidação de juros compensatórios de 201406-T, no montante de € 544,48;

8.8.        Ato de liquidação de IVA n.º 2018..., de 13.10.2018, que, em resultado de estorno da liquidação anterior n.º 2014..., materializou a liquidação adicional de IVA 201409-T, no montante de € 2.891,57:

8.9.        Ato de liquidação de IVA n.º 2018..., de 13.10.2018, que, em resultado de estorno da liquidação anterior n.º 2014..., materializou a liquidação de juros compensatórios de 201409-T, no montante de € 400,54;

8.10.      Ato de liquidação de IVA n.º 2018..., de 13.10.2018, que, em resultado de estorno da liquidação anterior n.º 2014..., materializou a liquidação adicional de IVA 201412-T, no montante de € 1.804,48;

8.11.      Ato de liquidação de IVA n.º 2018..., de 13.10.2018, que, em resultado de estorno da liquidação anterior n.º 2014..., materializou a liquidação de juros compensatórios de 201412-T, no montante de € 231,96.

F-            FACTOS NÃO PROVADOS

9.            Dos factos com interesse para a decisão da causa, objeto de análise concreta, inexistem outros factos com relevo para apreciação do mérito da causa que não se tenham provado.

G-           QUESTÕES DECIDENDAS

10.          Atenta a posição das partes, assumidas nos argumentos apresentados, constituem questões centrais dirimendas as seguintes, as quais cumpre, pois, apreciar e decidir:

a.            A alegada pela Requerente:

(i)           declaração de ilegalidade parcial do ato tributário de liquidação em sede de Imposto Sobre o Rendimento das Pessoas Coletivo e de IVA

(ii)          Condenação no pagamento de juros indemnizatórios.

b.            A alegada pela Requerida:

(i)           Exceção por incompetência material do tribunal arbitral relativamente à matéria de aplicação de métodos indiretos;

(ii)          Exceção da cumulação ilegal de pedidos;

(iii)         Exceção da intempestividade do pedido.

G- EXCEÇÃO POR INCOMPETÊNCIA DO TRIBUNAL ARBITRAL EM RAZÃO DA MATERIA

11.          É suscitado pela Requerida a incompetência do Tribunal Arbitral em razão da matéria,  designadamente para apreciar e decidir o pedido objeto do litígio sub Júdice, nos termos dos artigos 2.º, n.º 1, alínea a) e 4.º, n.º 1, ambos do RJAT e dos artigos 1.º e 2.º, alínea a) ambos da Portaria n.º 112-A/2011, o que consubstancia uma exceção dilatória impeditiva do conhecimento do mérito da causa, nos termos do disposto no artigo 576.º, n. 1 e 2 do CPC ex vi artigo 2.º alínea e) do CPPT e artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e e) do RJAT, o qual obsta ao conhecimento do pedido e à absolvição da instância da AT nos termos dos artigos 576.º, n.º 2 e 577.º, alínea a) do CPC, ex vi artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e e) do RJAT.

12.          Ao Tribunal cabe em primeiro lugar, conhecer da exceção invocada, nos termos do art.º 608.º, n.º 1 do CPC “(...) a sentença conhece, em primeiro lugar, das questões processuais que possam determinar a absolvição da instância, segundo a ordem imposta pela sua precedência lógica.”.

13.          Deste modo, passamos de imediato ao seu conhecimento.

14.          O Tribunal Arbitral, refira-se, tem competência para decidir sobre a sua própria competência. É o “princípio da competência da competência do Tribunal Arbitral” (na sua vertente positiva), desde há muito reconhecido como regra em matéria de arbitragem. Diferentemente do Centro de arbitragem institucionalizada, que não tem interferência nas decisões dos casos submetidos a cada Tribunal Arbitral.

15.          Estabelece o art.º 13.º do ETAF, quanto ao conhecimento da competência e do âmbito da jurisdição, que “O âmbito da jurisdição administrativa e a competência dos tribunais administrativos em qualquer das suas espécies, é de ordem pública e o seu conhecimento precede o de qualquer outra matéria”.

16.          Nestes termos, a competência do Tribunal Arbitral, compreende a apreciação das pretensões elencadas no art. 2.º, do DL n.º 10/2011, de 20 de Janeiro (RJAT).

17.          A AT, na sua resposta, suscitou a questão prévia da competência da jurisdição do Tribunal Arbitral constituído no CAAD, para apreciar as questões colocadas no presente pleito, uma vez que o pedido controvertido respeita à aplicação dos métodos indiretos, que no seu entender, esta matéria, não se encontra abrangida na competência dos Tribunais Arbitrais,

18.          A Requerente devidamente notificada veio pronunciar-se sobre a dita exceção pedindo a sua improcedência, defendendo que atos de liquidação subsequentes a um ato de determinação da matéria tributável por recurso à aplicação de métodos indiretos, em que é invocado como causa de pedir a respetiva ilegalidade, cabe julgar o Tribunal Arbitral como competente.

19.          Ora, a competência dos Tribunais Arbitrais, em concreto a competência do Tribunal Arbitral que funciona no CAAD é limitada nos termos em que Administração Tributária se vinculou àquela jurisdição, concretizados na Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março. Desta forma o art.º 4.º do RJAT, estabelece que “a vinculação da administração tributária à jurisdição dos tribunais constituídos nos termos da presente lei, depende de portaria dos membros do Governo responsáveis pelas áreas das finanças e da justiça, que estabelece, designadamente, o tipo e o valor máximo dos litígios abrangidos”, onde se postula a vinculação à jurisdição arbitral pelos serviços - DGCI e DGAIEC - entidades fundidas na atual Autoridade Tributária e Aduaneira, com efeitos a 1.º de Janeiro de 2012.

20.          Assim sendo, a competência dos Tribunais Arbitrais que funcionam no CAAD, depende essencialmente dos termos desta vinculação, pois, mesmo que se esteja perante uma situação enquadrável naquele art. 2.º do RJAT, se ela não estiver abrangida pela dita vinculação, estará afastada a possibilidade de o litígio ser jurisdicionalmente decidido por este Tribunal Arbitral.

21.          Por sua vez, a Portaria n.º 112-A/2011 de 22 de Março, no seu artigo 2.º, refere que: “Os serviços e organismos referidos no artigo anterior vinculam-se à jurisdição dos tribunais arbitrais que funcionam no CAAD que tenham por objecto a apreciação das pretensões relativas a impostos cuja administração lhes esteja cometida referidas no n.º 1 do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, com excepção das seguintes: (...) b) Pretensões relativas a atos de determinação da matéria coletável e atos de determinação da matéria tributável, ambos por métodos indiretos, incluindo a decisão do procedimento de revisão;”.

22.          No presente caso, a Requerente, peticiona a declaração de ilegalidade parcial do ato tributário de liquidação, em sede de Imposto Sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas, referente ao ano de 2014, n.º 2018..., de 15.10.2018, e em sede de Imposto sobre o Valor Acrescentado, referente ao ano de 2014, n.º 2018..., 2018..., 2018..., 2018..., 2018..., 2018..., 2018... e 2018..., todos de 13.10.2018, no valor global de € 25.970,19 (vinte e cinco mil euros e novecentos e setenta euros e dezanove cêntimos), por entender que não se encontram reunidos os pressupostos para aplicação dos métodos indiretos.

23.          Ou seja, o que está aqui em causa, é a determinação da matéria coletável por métodos indiretos em sede de IRC e IVA do ano de 2014, que geraram as liquidações respetivas e que agora estão aqui submetidas à apreciação.

24.          Assim sendo como o pedido da Requerente de declaração de ilegalidade dos atos de liquidação de tributos  têm por base um procedimento inspetivo do qual resultou a fixação da matéria tributável por métodos indiretos, e por isso, os atos de liquidação em crise, foram  diretamente determinados pela decisão de fixação da matéria tributável por métodos indiretos, então a apreciação da pretensão  apresentada ao presente Tribunal Arbitral extravasa - nos termos conjugados dos art.ºs 2.º, n.º 1 do RJAT e 2.º, al. b) da Portaria - o âmbito da competência material do Tribunal Arbitral.

25.          Ora, considerando que a AT não se vinculou à jurisdição arbitral, em matéria de métodos indiretos, tal facto impossibilita o Tribunal Arbitral de conhecer o pedido em virtude da incompetência material do Tribunal Arbitral.

26.          Este, de resto, tem sido o entendimento unânime da jurisprudência dos Tribunais Arbitrais a funcionar no CAAD, nesse sentido, pode querendo consultar as decisões proferidas nos processos: 17-2012T, 52-2012T, 70-2012T, 175/2013-T, 310/2014-T, 354/2014-T; 600/2014-T, 359/2017-T, 460/2018-T.

27.          O Tribunal decide pela procedência da exceção dilatória de incompetência absoluta do Tribunal Arbitral, a qual obsta ao conhecimento do mérito e conduz à absolvição da Requerida da instância (tudo cfr. dispositivos normativos percorridos supra), improcedendo dessa forma o pedido da Requerente.

I - QUESTÕES DE CONHECIMENTO PREJUDICADO

28.          Na sentença a proferir deve o juiz pronunciar-se sobre todas as questões que deva apreciar, abstendo-se de se pronunciar sobre questões de que não deva conhecer (segmento final do n.º 1 do artigo 125.º, do CPPT). Contudo as questões sobre que recaem os poderes de cognição do Tribunal, são, de acordo com o n.º 2 do artigo 608.º, do CPC, aplicável subsidiariamente ao processo arbitral tributário, por remissão do artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT, “as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras (…)”.

29.          O Tribunal Arbitral, os termos dos arts. 608º, n.º 2, 663º, n.º 2 e 679º do Código de Processo Civil por aplicação do artigo 29.º do RJAMT, não se encontra obrigado a apreciar todos os argumentos alegados pela Requerente ou pela Requerida, quando a decisão fique prejudicada pela solução já proferida, como é o caso dos autos, motivo pelo qual ficam prejudicadas para a apreciação as restantes questões submetidas a pedido de pronúncia.

 

                L - DECISÃO

Destarte, atento a todo o exposto, o presente Tribunal Arbitral, decide:

Julgar procedente a exceção de incompetência absoluta do Tribunal Arbitral, em razão da matéria e consequentemente determinar a absolvição da Requerida da instância.

Fixa-se o valor do processo em € 25.970,19 (vinte e cinco mil euros e novecentos e setenta euros e dezanove cêntimos) do valor da liquidação atendendo ao valor económico do processo, aferido pelo valor da liquidação de imposto impugnada, e em conformidade fixam-se as custas, no respetivo montante em 1.530,00 € (mil quinhentos e trinta euros), a cargo da Requerente de acordo com o artigo 12.º, n.º 2 do Regime de Arbitragem Tributária, do artigo 4.º do RCPAT e da Tabela I anexa a este último. – n.º 10 do art.º 35º, e n.º 1, 4 e 5 do art.º 43º da LGT, art.ºs 5.º, n.º, al. a) do RCPT, 97.º-A, n.º 1, al. a) do CPPT e 559.º do CPC).

 

Notifique.

Lisboa, 14 de Junho de 2019

 

O Árbitro

Dr. Paulo Ferreira Alves