Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 556/2022-T
Data da decisão: 2023-03-22  IRS  
Valor do pedido: € 17.197,95
Tema: IRS-Extinção da instância-Inutilidade superveniente da lide.
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SUMÁRIO:

 

Determina a inutilidade superveniente da lide a revogação/anulação integral pela Autoridade Tributária e Aduaneira do acto de liquidação de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares, impugnado em sede de processo arbitral tributário, o que constitui causa de extinção da instância, de conformidade ao estatuído no artigo 271º, alínea e) do Código de Processo Civil, ex vi artigo 29º, nº1, alínea e) do RJAT.

 

DECISÃO ARBITRAL

 

I-RELATÓRIO

1- A..., com o NIF..., residente na Reino Unido, em ..., (doravante designada por Requerente ou Sujeito  Passivo), apresentou em 2022-09-19 pedido de constituição de tribunal arbitral tributário, ao abrigo do disposto n alínea a) do nº 2 dos artigos 2º,5º nº 2, alínea a), 6º, nº 1 e 10º, nºs 1 e 2, todos do Decreto Lei nº 10/2011, de 20 de Janeiro (doravante referido por RJAT),e dos artigos 1º e 2º da Portaria nº 112-A, de 2 de Março, em que é requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira (doravante designada por AT ou Requerida) com vista à declaração de ilegalidade e consequente anulação do acto de indeferimento parcial da reclamação graciosa  nº ...2020..., bem como a declaração de nulidade do acto de liquidação adicional  de IRS nº 2022 ..., referente ao ano de 2018, no montante de 17.197,95 €.

 

2- O     pedido de constituição do tribunal arbitral tributário, foi aceite pelo Exmo. Senhor Presidente do CAAD, em 2022-09-21 e notificado à Requerida nos termos legais, nessa  mesma data.

3- Nos termos e para os efeitos do disposto na alínea a) do artigo 6º do RJAT, por decisão do Exmo. Senhor Presidente do Conselho Deontológico do CAAD, e devidamente notificado às partes, nos prazos previstos, foi designado como árbitro o signatário, que comunicou àquele Conselho a aceitação do encargo, no prazo previsto no artigo 4º do Código Deontológico do Centro de Arbitragem Administrativa.

4-Em 2022-11-10 foram as partes notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de a recusar, nos termos conjugados dos artigos 11º, nº 3, alíneas a) e b)w RJAT, na redacção que lhes foi conferida pela Lei nº 66-B/2012, de 31 de Dezembro.

5- O tribunal arbitral singular ficou constituído em 2022-10-28 de acordo com a prescrição da alínea c) do artigo11º do RJAT, na redacção que lhe foi conferida pelo artigo 228º da Lei nº 66-B/2012, de 31 de Dezembro.

 

6-Com data de 2022-11-28, foi proferido despacho nos termos e para os efeitos do disposto no artigo do artigo 17º do RJAT.

 

7-Para o que aqui releva, e em brevíssima síntese. a Requerente pretende a “anulação do deferimento parcial do procedimento tributário de reclamação graciosa que correu termos na Direção de Finanças de Lisboa, sob o nº ...2020..., bem como em termos mediatos, a anulação, por ilegal, da liquidação de imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS)nº 2022..., no valor de € 17.197,95 €.”.

 

7-1. Em defesa da sua pretensão argumenta que a AT procedeu a uma incorrecta interpretação do disposto no artigo 51º do CIRS no que concerne à determinação de despesas e encargos para efeitos do cálculo  das mais-valias,

 

8- O tribunal arbitral singular é materialmente competente, e encontra-se regularmente constituído nos termos do disposto nos artigo 2º, nº 1, alínea a), 5º e 6º do RJAT

 

9-As partes têm personalidade e capacidade judiciária, e estão devida e legalmente representadas (artigos 3º e 15º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, ex vi artigo 29º, nº 1, alínea a) do RJAT).

 

10-A acção é tempestiva, tendo o pedido de pronúncia arbitral sido apresentado no prazo de noventa dias previsto no artigo 10º, nº1 do RJTA, de acordo com a remissão para o artigo 102º do Código de Procedimento e de Processo Tributária.

 

11- Não foram suscitadas quaisquer excepções de que deva conhecer-se.

 

12- O processo não enferma de nulidades.

 

13- Inexiste, deste modo, qualquer obstáculo à apreciação do mérito da causa.

 

II-FUNDAMENTAÇÃO

A. MATÉRIA DE FACTO

A.1. Factos dados como provados

Perante os documentos aportados ao processo, da factualidade aceite pelas partes, do processo administrativo anexo, a com relevo para a decisão, consideram-se provados os seguintes factos:

 

a- A Requerente foi notificada do acto tributário de liquidação de IRS nº 2020..., respeitante ao ano de 2018, no montante de 17.197,95 €;

b- Em 2022-09-19 a Requerente apresentou junto do CAAD, pedido de pronúncia arbitral que deu origem ao presente processo;

c-Por despacho de 2022-12-20, proferido pela Exma. Subdiretora Geral, a AT determinou que se procedesse á revogação total do acto impugnado;

d-Com data de 2022-12-27, a Requerida deu conhecimento a este tribunal do teor do referido despacho;

e- notificada do mesmo, por despacho arbitral nessa mesma data, veio a Requerente, em 2023-01-04 dizer que “não pretende prosseguir com o processo nº 556/2022-T”

 

A.2. Factos dados como não provados

Com relevo para a decisão, inexistem factos que devam considerar-se como não provados.

 

A.3. Fundamentação da matéria de facto dada como provada e não provada.

Relativamente à matéria de facto, o tribunal não tem que se pronunciar sobre tudo o que foi alegado pelas partes, cabendo-lhe sim, o dever de seleccionar os factos que importam para a decisão e discriminar a matéria provada da não provada (cfr., artº 123º, nº 2 do CPPT, e artgo 670º, nº 3 do CPCivil, ex vi artigo 29º, alíneas a) e e) do RJAT).

 

Deste modo, os factos pertinentes para o julgamento da causa, são escolhidos e recortado em função da sua relevância jurídica, a qual é estabelecida em atenção às vários soluções plausíveis da (s) questão (ões)   de Direito (cfr., artigo 596º do CPCivil ex vi artigo 29º, nº 1, alínea e) do RJAT).

 

Por outro lado, segundo o princípio da livre apreciação da prova, o tribunal baseia a sua decisão em relação às provas produzidas na sua íntima convicção, formando a partir do exame e avaliação que faz dos meios de prova aportados ao processo e de acordo com a sua experiência de vida e conhecimento das pessoas (cfr., artº 607º, nº 3 do CPCivil, na redacção que lhe foi conferida pela Lei nº 43/2013, de 26 de Junho).

 

Somente quando a força probatória de certos meios de prova se encontra pré -estabelecida por lei (vg, força probatória dos documentos autênticos (cfr., artigo 371º, nº 3 do Código Civil) é que não domina na apreciação das provas produzidas o princípio da livre apreciação.

 

Deste modo, tendo em consideração as posições assumidas pelas partes à luz do artigo 110º, nº 7 do CPPT, a prova documental carreada para os autos   e o processo administrativo anexo, consideram-se provados, com relevo para a decisão os factos supra elencados.

 

B. DO DIREITO

A questão dirimenda

Não obstante a menção a outras liquidações e actos de revogação parciais, o que aqui está em causa é o acto tributário de liquidação de IRS de 2018, nº 2022 ... de 2022-08-26, no valor de 17.197,95 €, objecto de revogação/anulação conforme probatório.

Reconduzindo-se a questão dirimenda em apreciar e decidir da extinção da instância, por impossibilidade superveniente da lide, e consequente repercussão em sede responsabilidade pelo pagamento das custas processuais.

Assim;                                                                                                  

Resulta dos factos provados, supra elencados, que a AT teve conhecimento do pedido de pronúncia arbitral apresentado pela Requerente em 2022-09-21 tendo sido notificada nos termos e para os efeitos do disposto no nº 1 do artigo 13ºde RJAT.

Determina o normativo em causa que “nos pedidos de constituição de tribunais arbitrais que tenham por objecto, a apreciação da legalidade dos actos tributários previstos no artigo 2º, o dirigente do serviço da administração tributária pode, no prazo de 30 dias a contar do conhecimento do pedido de constituição do tribunal arbitral, proceder à revogação, ratificação, reforma ou conversão do acto tributário cuja ilegalidade foi suscitada, praticando, quando necessário ,acto tributário substitutivo, devendo notificar o presidente do Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD) da sua decisão, iniciando-se então a contagem do prazo referido na alínea c) do nº 1 do artigo 11º”.

 

Ora,

A Requerida, como já referido, remeteu ao CAAD em 2022-12-27, já após a constituição do tribunal arbitral e, obviamente  decorridos mais de trinta após o conhecimento do pedido de constituição, requerimento emanado da Diretora -Geral da Autoridade Tributária e Aduaneira onde “vem informar que por despacho  da Sra. Subdiretora Geral  datado de 2022-12-20, foi revogado o ato impugnado , conforme consta da informação que se anexa.”

 

Notificada a Requerente através de despacho arbitral de 2022-12-27, em observância ao disposto na alínea a) do artigo 16º do RJAT, e nº 1 do artigo 3º do Código de Processo Civil, ex vi, alínea e) do artigo 29º do RJAT, veio esta afirmar, em comunicação dirigida ao CAAD em 04 de Janeiro de 2023, que “(…) não pretende prosseguir com o processo nº 556/2022-T”

 

Em resultado da sinalizada revogação do acto de liquidação impugnado nos presentes autos, torna-se absolutamente inútil a apreciação da sua legalidade, concluindo estar-se perante uma situação de inutilidade supervenientes da lide.

 

Com efeito, por via do acto revogatório promovido pela AT, a Requerente viu satisfeita a sua pretensão quanto aos actos impugnados

 

“De acordo com a doutrina e a jurisprudência a impossibilidade ou inutilidade superveniente da lide verifica-se quando, por facto ocorrido na pendência da instância, a pretensão do autor não se pode manter, por virtude do desaparecimento dos sujeitos ou do objecto do processo ou, por outro lado, porque encontra satisfação fora do esquema da providência pretendida. Num e noutro caso deixa de interessar -além por impossibilidade da atingir o resultado visado; aqui, por ele já ter sido atingido por outros meios,

 

Só se verifica a inutilidade superveniente da lide, quando essa inutilidade for uma inutilidade jurídica. A utilidade da lide correlaciona-se, assim, com a possibilidade da obtenção de efeitos úteis da mesma pelo que a sua extinção só deve ser declarada quando se conclua que o seu prosseguimento não poderá trazer quaisquer consequências vantajosas para o autor recorrente”.[1]

 

Acresce que, a inutilidade superveniente da lide, constitui causa de extinção da instância, de conformidade ao previsto no artigo 227º, alínea e) do Código Civil, ex vi, artigo 29º, nº 1, alínea e) do RJAT.

 

III.DECISÃO

Em face do que vem de expor-se, decide este Tribunal Arbitral Singular em;

 

(i)  julgar extinta a instância por inutilidade superveniente da lide por falta de objecto, de conformidade ao disposto no artigo 277º, alínea e) do Código de Processo Civil, ex vi artigo 29º, nº 1, alínea e) do RJAT;

(ii) absolver da instância a Autoridade Tributária e Aduaneira;

(iii) condenar a Autoridade Tributária e Aduaneira ao pagamento das custas arbitrais, nos termos do disposto no artigo 563 º, nºs 3 e 4 do Código de Processo Civil, ex vi artigo 29º, nº 1, alínea e) do RJAT.

 

IV. VALOR DO PROCESSO

De conformidade ao estabelecido nos artigos 296º, nºs  1 e 2 do Código de Processo Civil, aprovado pela Lei 46/2013, de 26 de Junho, 97º-A do Código de Procedimento e de Processo Tributário, e artigo 3º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se ao processo o valor de  17.197,95 € (dezassete mil cento noventa e sete euros e noventa e cinco cêntimos).

 

V.CUSTAS

Nos termos do disposto nos artigos 12º, nº 1, 22º, nº 4 do RJAT, e artigos 3º e 4º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem, e Tabela I a este anexa, fixa-se o montante de custas em 1.224,00 € (mil duzentos e vinte e quatro euros)

 

NOTIFIQUE

Texto elaborado em computador, nos termos do disposto no artigo 131º do Código de Processo Civil, aplicável por remissão do artigo 29º, nº 1, alínea e) do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária, com versos em branco e revisto pela árbitro.

 

[A redacção da presente decisão rege-se pela grafia anterior ao Acordo Ortográfico de 1990, excepto no que respeita às transcrições efectuadas]

 

 

Vinte e um de  Março de dois mil e vinte e três

 

O árbitro

 

j. coutinho pires



[1] Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 08/06/2022, relatado pelo Exmo. Senhor Conselheiro Joaquim Condesso, no âmbito do processo nº 02321/17.4BEPRT.