Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 839/2019-T
Data da decisão: 2020-08-04   
Valor do pedido: € 4.728,12
Tema: IRS – Rendimentos Categoria G; Comunicabilidade de perdas entre cônjuges.
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DECISÃO ARBITRAL

 

I - Relatório

1. A..., titular do número de identificação fiscal ..., e B..., titular do número de identificação fiscal..., casados ambos residentes na Rua ..., n.º..., ..., ...-... Amora (doravante designados por “Requerentes”) apresentaram, em 06-12-2019, um pedido de pronúncia arbitral, ao abrigo do artigo 2.º n.º 1, alínea a) e do artigo 10.º, n.ºs 1 e 2 do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária, previsto no Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, com a redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66- B/2012, de 31 de Dezembro (doravante abreviadamente designado “RJAT”) e dos artigos 1.º e 2.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março.

2. Os Requerentes pretendem a pronúncia do Tribunal Arbitral com vista a anular parcialmente o ato de liquidação de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS), n.º 2019..., relativo ao ano de 2018, na parte correspondente ao imposto relativo a tributações autónomas, no valor de € 4.728,12 (quatro mil setecentos e vinte e oito euros e doze cêntimos), ordenando-se o reembolso aos Requerentes da quantia indevidamente paga, acrescida de juros indemnizatórios vencidos e vincendos, calculados à taxa máxima legal, até ao efetivo e integral pagamento.

3. É Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) (adiante designada por “Requerida”).

4. O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Senhor Presidente do CAAD e automaticamente notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira, em 09-12-2019.

5. Nos termos da alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, com a redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro, o Conselho Deontológico do CAAD designou como árbitro do tribunal arbitral singular o Exmo. Senhor Dr. Olívio Mota Amador que, no prazo aplicável, comunicou a aceitação do encargo.

6. Os Requerentes foram notificados, em 27-01-2020, da designação do árbitro, não tendo manifestado vontade de recusar a designação, nos termos conjugados do artigo 11.º, n.º 1, alíneas a) e b) do RJAT e dos artigos 6.º e 7.º do Código Deontológico.

7. De acordo com o disposto na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do RJAT, com a redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro, o Tribunal Arbitral foi constituído em 26-02-2020.

8. A Requerida foi notificada através do despacho arbitral, de 26-02-2020, para os efeitos previstos no artigo 17.º da RJAT.

9. A Requerida, em 03-06-2020, apresentou a Resposta e juntou o Processo Administrativo.

10. O Tribunal Arbitral por despacho, de 07-06-2020, determinou: (i) dispensar a realização da reunião prevista no artigo 18.º do RJAT, ao abrigo do princípio da autonomia do Tribunal na condução do processo e em ordem a promover a celeridade, a simplificação e a informalidade processuais, de acordo com o disposto nos artigos 19.º e 29.º, n.º 2, do RJAT, tendo em conta que não foi invocada matéria de exceção, não foi requerida a produção de prova testemunhal nem de outras diligências probatórias; (ii) caso as partes pretendam proferir alegações escritas, estas deverão ser produzidas no prazo de 10 dias, com caracter sucessivo, a partir da notificação do presente despacho; (iii) indicar o dia 10 de julho de 2020 como prazo limite para a prolação da decisão arbitral; (iv) os Requerentes deveriam proceder ao pagamento da taxa arbitral subsequente até à data indicada na alínea anterior.

11. Só os Requerentes apresentaram, em 23-06-2020, as alegações. 

12. A data para a prolação da decisão arbitral estabelecida no despacho de despacho, de 07-06-2020 foi posteriormente adiada, através do despacho do Tribunal Arbitral, de 13-07-2020.

13. A posição dos Requerentes, de harmonia com o disposto no pedido de constituição do Tribunal Arbitral e nas alegações, é, em síntese, a seguinte:

13.1. Os Requerente consideram que os ganhos resultantes da alienação de bens mobiliários consideram-se obtidos no momento da “alienação onerosa” desses bens, de acordo com o disposto nos n.ºs 1 e 3 do artigo 10.º do Código do IRS, sendo o ganho sujeito a IRS constituído “pela diferença entre o valor de realização e o valor de aquisição”. Nos termos do n.º 1 do artigo 43.º do Código do IRS “o valor dos rendimentos qualificados como mais-valias é o correspondente ao saldo apurado entre as mais-valias e as menos-valias realizadas no mesmo ano”. Logo a alínea b) do n.º 1 do artigo 10.º do Código do IRS constitui uma norma de incidência dos ganhos com a venda de valores mobiliários, tais como aqueles que os Requerentes transacionaram no ano de 2018, prevendo a sujeição a tributação das mais-valias consubstanciadas nos ganhos que, não sendo considerados rendimentos empresariais e profissionais, de capitais ou prediais, resultem da “alienação onerosa de partes sociais e de outros valores mobiliários”;

13.2. Aquando da Reforma do IRS efetuada em 2014, o legislador pretendeu alterar o paradigma fiscal, transformando a tributação separada dos cônjuges na regra, pelo que, a partir daí, os contribuintes casados passaram a poder optar pela tributação conjunta, sem procurar penalizar os contribuintes casados, quer pela alteração das normas de incidência, quer pela alteração das normas de apuramento do imposto. Uma das alterações promovidas pelo legislador, nesse domínio, respeitou ao regime de perdas estabelecido no artigo 55.º do Código do IRS, que passou a refletir aquela tendência, ou seja, que o regime de tributação separada passasse a constituir a regra naquele âmbito;

13.3. Nunca esteve subjacente à Reforma do IRS de 2014 a penalização dos contribuintes casados, quer pela alteração das normas de incidência, quer pela alteração das normas de apuramento do imposto;

13.4. Assim, o artigo 55.º do Código do IRS não é uma norma de incidência, nem interfere com o apuramento dos saldos e ganhos sujeitos a imposto, tratando-se, antes, de uma mera norma de reporte de perdas e nunca poderia justificar uma eventual incomunicabilidade entre os saldos das mais e menos-valias apuradas pelos Requerentes, no ano de 2018, quando os mesmos optaram pela tributação conjunta;

13.5. Uma vez que os Requerentes optaram pela tributação conjunta dos seus rendimentos por via do seu casamento, como se verifica pela declaração de rendimentos Modelo 3 de IRS entregue, nenhuma outra opção se coloca, que não a da tributação conjunta dos rendimentos apurados pelo casal o que necessariamente pressupõe a comunicação dos saldos - positivos e negativos - apurados em 2018 por qualquer um ou por ambos os membros que compõem o agregado familiar;

13.6. A alteração legislativa vigente a partir de 1 de janeiro de 2015 não veio alterar a forma de apuramento do ganho sujeito a imposto - que, no caso de valores mobiliários, continua a fazer-se nos termos dos artigos 43.º e 48.º do Código do IRS, normas que não preveem qualquer distinção entre contribuintes casados e contribuintes solteiros ou divorciados;

                13.7. Caso fizesse vencimento a tese da AT estaríamos perante uma violação dos princípios da segurança jurídica e da proteção da confiança, decorrentes do princípio do Estado de Direito democrático, plasmado no artigo 2.º da Constituição da República Portuguesa, porquanto os Requerentes tinham a expetativa legítima de que as decisões por eles tomadas, no que concerne à gestão de bens e economia familiar do agregado, seriam relevadas de forma agregada, em respeito pela sua opção pela tributação conjunta;

 

13.8. Os Requerentes invocam a inconstitucionalidade do artigo 55.º do Código do IRS, quando interpretado no sentido de que o apuramento é feito por titular (ao invés de agregado familiar) e que no caso de haver resultados líquidos negativos, estes apenas serão dedutíveis nos resultados líquidos positivos da mesma categoria e titular (ao invés de agregado familiar), porquanto tal interpretação viola os princípios da segurança jurídica e da proteção da confiança, decorrentes do princípio do Estado de Direito democrático, plasmados no artigo 2.º da Constituição da República Portuguesa. A suscitação da inconstitucionalidade, referida no n.º anterior, é efetuada de modo processualmente adequado, nos termos e para os efeitos do n.º 2 do artigo 72.º da Lei do Tribunal Constitucional.

13.9. O Fisco ao não ter em consideração a menos-valia que a Requerente (sujeito passivo B) manifestamente suportou, não está a atender à capacidade contributiva dos Requerentes, considerando que estes tinham uma capacidade contributiva ficcionada, sendo forçoso concluir que, assim, se ofende o princípio da capacidade contributiva, porque “a incidência dos impostos deve ter como critério o património ou o rendimento dos contribuintes” e, neste caso, o IRS incidiu sobre um rendimento manifestamente superior ao auferido pelos Requerentes, enquanto agregado familiar fiscalmente relevante, sendo forçoso concluir que, assim, se ofende os mais estruturantes e basilares princípios que norteiam o IRS, mas também, e sobretudo, os mais antigos e consolidados ditames constitucionais respeitantes à tributação das pessoas singulares.

13.10. Deste modo, o ato de liquidação em causa é da inteira responsabilidade da Autoridade Tributária, tendo conduzido ao pagamento de IRS em montante superior ao legalmente devido, estando inquinado por vício de violação de lei e, ademais, tendo sido praticado em manifesto erro imputável aos serviços, havendo lugar ao pagamento de juros indemnizatórios, na parte indevidamente paga pelos Requerentes, a calcular desde a data do pagamento até ao efetivo e integral reembolso por parte da Autoridade Tributária e Aduaneira, à taxa máxima em vigor (atualmente de 4% ao ano).

  14. A posição da Requerida, expressa na resposta, pode ser sintetizada no seguinte:

14.1. Até 2014 inclusive, estabelecia-se que era dedutível ao conjunto dos rendimentos líquidos sujeitos a tributação o resultado líquido negativo apurado em qualquer categoria de rendimentos, prevendo-se regras específicas para, que em algumas categorias de rendimentos, o resultado líquido negativo pudesse ser deduzido para um ou mais anos seguintes;

 

14.2. Com a reforma da tributação das pessoas singulares, concretizada pela Lei n.º 82-E/2014, de 31 de dezembro, que entrou em vigor em 01/01/2015, passou a prever-se que, relativamente a cada titular de rendimentos, o resultado liquido negativo apurado em qualquer categoria só é dedutível aos seus resultados líquidos positivos da mesma categoria, nos termos do estabelecido nas alíneas a) a d) do n.º 1 do artigo 55.º do Código do IRS;

14.3. No respeitante aos rendimentos qualificados como mais-valias, o resultado líquido é o correspondente ao saldo apurado entre as mais-valias e as menos-valias realizadas no mesmo ano, de acordo com as regras de determinação previstas nos artigos 43.º e ss. do Código do IRS, pelo que a dedução de perdas do próprio ano faz-se na própria operação de apuramento do resultado liquido, ao considerar como rendimento a tributar o saldo apurado entre as mais valias e as menos-valias, ou seja, o resultado liquido já engloba as perdas desse ano;

14.4. Assim, o resultado líquido negativo apurado numa categoria só pode ser dedutível aos resultados líquidos positivos da mesma categoria, relativamente a cada titular, decorre deste princípio que o apuramento do resultado líquido se faça por referência a cada titular dos bens geradores de rendimentos dessa categoria;

14.5. Na determinação do sentido das normas fiscais, devem ser observadas as regras e princípios gerais da interpretação e aplicação das leis, não devendo cingir-se à letra da lei, mas reconstituir a partir dos textos o pensamento legislativo, tendo sobretudo em conta a unidade do sistema jurídico, as circunstâncias em que a lei foi elaborada e as condições específicas do tempo em que é aplicada (vd., artigo 9.º do Código Civil, aplicável por força do n.º 1 do artigo 11.º da LGT);

14.6. Caso existissem duvidas quanto à interpretação dada ao n.º 1 do artigo 55.º do Código do IRS, estas serias dissipadas pela consideração do espirito do legislador que esteve subjacente à alteração legislativa deste normativo.

14.7. Efetivamente, a redação do n.º 1 do artigo 55.º do Código do IRS advém da proposta de alteração legislativa apresentada pela comissão para a reforma sobre o rendimento das pessoas singulares, podendo extrair-se do projeto da reforma apresentada a ratio legis daquela proposta de alteração legislativa através do seguinte excerto:

“ 5.PRINCIPAIS ALTERAÇÕES LEGISLATIVAS (…)

5.3 No âmbito das questões associadas à família (…)

5.3.4 Comunicabilidade de perdas entre cônjuges

O código do IRS acolhe um modelo de limitação de dedução de perdas entre as várias categorias de rendimentos, ou seja, comunicabilidade horizontal mitigada. A Comissão propõe também que de modo a viabilizar um regime regra de tributação separada, se estabeleça a dedução de perdas vertical, isto é, relativamente a cada sujeito passivo; não se comuniquem perdas horizontalmente. Assim, o resultado negativo da categoria de um dos conjugues, não é absorvido nos rendimentos da mesma categoria do outro, no caso de tributação conjunta. “

14.8. Verifica-se que o legislador pretendeu inequivocamente que o resultado negativo da categoria de um dos conjugues, não seja absorvido nos rendimentos da mesma categoria do outro, no caso de tributação conjunta;

14.9. Em conclusão, não pode proceder a interpretação dos Requerentes no sentido da forma do apuramento do saldo entre mais e menos valias depender do regime de tributação que os contribuintes tenham optado: tributação conjunta ou separada.

II – Saneamento

15. O Tribunal Arbitral é materialmente competente e encontra-se regularmente constituído, nos termos dos artigos 2.º, n.ºs 1, alínea a), 5.º e 6.º, n.º 1, do RJAT.

16. As partes têm personalidade e capacidade judiciárias, mostram-se legítimas e encontram-se regularmente representadas, de acordo com o disposto nos artigos 4.º e 10.º, n.º 2, do RJAT e artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de março.

17. Não foram suscitadas exceções de que cumpra conhecer. Não se verificam nulidades nem quaisquer outras circunstâncias que obstem ao conhecimento do mérito da causa.

Nestes termos, o Tribunal Arbitral encontra-se regularmente constituído para apreciar e decidir o objeto do processo.

III - Matéria de facto

18. Factos dados como provados

Com relevo para a apreciação e decisão das questões suscitadas dão-se como assentes e provados os seguintes factos:

A)           Os Requerentes casaram, em 7 de fevereiro de 1971, no regime de comunhão de adquiridos (vd., n.º 5 do pedido de pronuncia arbitral);

 

B)           Os Requerentes geriram a sua vida patrimonial de acordo com o regime fiscal de tributação conjunta dos cônjuges, previsto no Código do IRS desde a sua entrada em vigor, em 1 de janeiro de 1989 (vd., n.ºs 6 e 7 do pedido de pronuncia arbitral);

 

C)           Relativamente ao ano de 2018, os Requerentes entregaram, em 02-05-2019, a declaração de rendimentos Modelo 3-IRS, identificada com o n.º ... (vd., Documento n.º 2 anexo ao pedido de pronuncia arbitral);

 

D)           Na declaração de rendimentos Modelo 3-IRS, identificada na alínea anterior, verifica-se que os Requerentes são casados e que optaram pela tributação conjunta dos rendimentos (vd., Declaração Modelo 3 – rosto - Quadros 4 e 5A, que consta do Documento n.º 2 anexo ao pedido de pronuncia arbitral);

 

E)            No ano de 2018, os Requerentes realizaram diversas transações de valores mobiliários, as quais geraram ganhos e perdas inscritos no Anexo G da declaração anual de rendimentos Modelo 3 – IRS (vd., Documento n.º 2 anexo ao pedido de pronuncia arbitral);

 

F)            Relativamente ao Requerente A... (Titular A), no ano de 2018, apurou-se a realização de uma mais-valia no montante total de € 43 210,40 decorrente de nove alienações onerosas de valores mobiliários, ocorridas entre 28-06-2018 e 25-09-2018, identificadas nas linhas 9001 a 9009 do Anexo G da declaração anual de rendimentos Modelo 3 – IRS (vd., Documentos n.ºs 2 e 3 anexos ao pedido de pronuncia arbitral);

 

G)           Relativamente à Requerente B... (Titular B), no ano de 2018, apurou-se a realização de uma menos-valia no montante total de € 16.886,16 decorrente de três alienações onerosas de valores mobiliários realizadas, em 25-09-2018, identificadas nas linhas 9010 a 9012 do Anexo G da declaração anual de rendimentos Modelo 3 – IRS (vd., Documentos n.ºs 2 e 4 anexos ao pedido de pronuncia arbitral);

 

H)           Os Requerentes optaram pela tributação autónoma dos rendimentos da categoria G, uma vez que não exerceram a opção pelo englobamento dos eventuais rendimentos (vd., Quadro 15 do Anexo G, da Declaração Modelo 3-IRS, que consta do Documento n.º 2 anexo ao pedido de pronuncia arbitral);

 

I)             Os Requerentes foram notificados da demonstração de liquidação de IRS n.º 2019..., referente ao ano de 2018, nos termos da qual foi apurado um montante de imposto a pagar de € 11.715,77, (vd., Documentos n.º 1 anexo ao pedido de pronuncia arbitral);

 

J)            A liquidação, identificada na alínea anterior, desconsiderou, a menos-valia realizada pela Requerente B...(Titular B) no âmbito da tributação conjunta dos Requerentes (vd., n.ºs 15 e 16 do pedido de pronuncia arbitral e alínea G) supra);

 

K)           Os Requerentes, em 28-08-2019, procederam ao pagamento da importância proveniente da liquidação de IRS, identificada na alínea I), no montante de € 11.715,77, (vd., Documento n.º 5, anexo ao pedido de pronuncia arbitral);

 

L)            Os Requerentes apresentaram, em 03-07-2019, reclamação graciosa dirigida ao Diretor de Finanças de ..., identificada sob o n.º ...2019..., (vd., Processo Administrativo fls.5);

 

M)          Os Requerentes foram notificados, em 14-08-2019, do projeto de indeferimento da reclamação graciosa para poderem exercer o direito de audição, previsto no artigo 60.º da LGT (vd., Processo Administrativo fls.11);

 

N)           Os Requerentes exerceram o direito de audição, em 28-08-2019, (vd., Processo Administrativo fls.12 e 13);

 

O)           A reclamação graciosa, identificado na alínea L), foi indeferida, por despacho do Chefe de Divisão da Justiça Tributária da Direção de Finanças de ..., proferido ao abrigo de delegação de competências, em 02-09-2019, e notificado à Requerente, em 10-09-2019, através do ofício n.º..., de 02-09-2019 (vd., Processo Administrativo fls.14 e 15);

19. Factos dados como não provados

Inexistem outros factos com relevo para apreciação do mérito da causa que não se tenham provado.

20. Fundamentação da matéria de facto

Relativamente à matéria de facto, atendendo ao disposto no artigo 123.º, n.º 2, do CPPT e no artigo 607.º, n.º 3, do Código do Processo Civil (CPC), aplicáveis ex vi artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e), do RJAT, o Tribunal não tem que se pronunciar sobre tudo o que foi alegado pelas partes, cabendo-lhe, o dever de selecionar os factos que importam para a decisão e discriminar a matéria provada da matéria não provada.

Assim, de acordo com o disposto no artigo 596.º do Código do Processo Civil (CPC), aplicável ex vi do artigo 29.º, n.º 1, alínea e), do RJAT, os factos pertinentes para o julgamento da causa foram escolhidos e recortados em função da sua relevância jurídica, a qual foi estabelecida tendo em conta as questões de Direito suscitadas.

Tendo em consideração as posições assumidas pelas partes, à luz do artigo 110.º, n.º 7, do CPPT e a prova documental, junta aos autos, consideraram-se provados, com relevo para a decisão, os factos acima elencados.

IV. Matéria de Direito

21. A principal questão decidenda nos presentes autos diz respeito a saber se os Requerentes podem efetuar a comunicação de saldos – positivos e negativos - apurados por qualquer um ou por ambos os membros que compõe o agregado familiar. Tendo em conta que os Requerentes optaram pela tributação conjunta dos seus rendimentos por via do casamento e realizaram, no ano de 2018, diversas transações de valores mobiliários, as quais geraram ganhos e perdas inscritos no Anexo G da declaração anual de rendimentos Modelo 3 – IRS.

Os Requerentes suscitam também a violação dos princípios constitucionais da segurança jurídica e da proteção da confiança e do princípio da capacidade contributiva no caso de  prevalecer a posição adotada pela AT, ou seja, se existir a incomunicabilidade dos ganhos e perdas nas categorias de rendimento entre os elementos do agregado familiar. 

Por fim, os Requerentes formulam o pedido de juros indemnizatórios.

Cumpre apreciar

22. Da factualidade dos presentes autos arbitrais resulta que, no ano de 2018, os Requerentes: (i) optaram pelo regime fiscal de tributação conjunta dos cônjuges; (ii) realizaram diversas transações de valores mobiliários, as quais geraram uma mais-valia para o Requerente A... e uma menos-valia para a Requerente B...; (iii) optaram pela tributação autónoma dos rendimentos da categoria G, (Vd., alíneas D), E), F), G) e H) do n.º 18 supra).

23. Importa agora estabelecer o enquadramento legal, vigente em 2018, da questão suscitada nos presentes autos arbitrais.

23.1. Nos termos do disposto no artigo 13.º, n.º 1, do Código do IRS, “ficam sujeitas a IRS as pessoas singulares que residam em território português e as que, nele não residindo, aqui obtenham rendimentos”.

23.2. De acordo com o disposto no artigo 13.º, n.º 2, do Código do IRS “quando exista agregado familiar, o imposto é apurado individualmente em relação a cada cônjuge (…), a não ser que seja exercida a opção pela tributação conjunta”. Quando se opta pela tributação conjunta “(…) o imposto é devido pela soma dos rendimentos das pessoas que constituem o agregado familiar, considerando-se como sujeitos passivos aquelas a quem incumbe a sua direção”, nos termos do n.º 3 do mesmo artigo.

 O agregado familiar é constituído, segundo o artigo 13.º, n.º 4, alínea a), do Código do IRS pelos “cônjuges não separados judicialmente de pessoas e bens (…) e os respetivos dependentes (…)”

23.3. O IRS “(…) incide sobre o valor anual dos rendimentos das categorias seguintes (…), depois de efetuadas as correspondentes deduções e abatimentos”, de acordo com o  disposto no artigo 1.º, n.º 1, do Código do IRS.

As mais-valias constituem rendimentos que integram a Categoria G respeitante aos “Incrementos patrimoniais”, segundo o disposto no artigo 9.º, n.º 1, alínea a), do Código do IRS.

23.4. O artigo 10.º, n.º 1, alínea b), do Código do IRS prevê a tributação das mais-valias consubstanciadas nos ganhos que, não sendo considerados rendimentos empresariais e profissionais, de capitais ou prediais, resultem da alienação onerosa de “partes sociais e de outros valores mobiliários”. Nos termos do n.º 4, alínea a), do mesmo artigo o ganho sujeito a IRS é constituído pela “(…) diferença entre o valor de realização e o valor de aquisição, líquidos da parte qualificada como rendimento de capitais (…)”

23.5. A consideração dos ganhos, referidos no n.º anterior, para efeitos de determinação do rendimento tributável é feita nos termos do n.º 1 do artigo 43.º do Código do IRS, que tem o seguinte teor:

“Artigo 43.º

Mais-valias

1 - O valor dos rendimentos qualificados como mais-valias é o correspondente ao saldo apurado entre as mais-valias e as menos-valias realizadas no mesmo ano, determinadas nos termos dos artigos seguintes(…)”

 

23.6. Relativamente à dedução de perdas o artigo 55.º do Código do IRS estabelece o seguinte:

“Artigo 55.º

Dedução de perdas

1 - Relativamente a cada titular de rendimentos, o resultado líquido negativo apurado em qualquer categoria só é dedutível aos seus resultados líquidos positivos da mesma categoria, nos seguintes termos:

(…)

d) O saldo negativo apurado num determinado ano, relativo às operações previstas nas alíneas b), c), e), f), g) e h) do n.º 1 do artigo 10.º, pode ser reportado para os cinco anos seguintes quando o sujeito passivo opte pelo englobamento.”

23.7. A redação do artigo 55.º do Código do IRS vigente em 2008 resultou das alterações operadas pela Lei n.º 82-E/2014, de 31 de dezembro, que procedeu à reforma do IRS. O Anteprojeto da Reforma do IRS elaborado pela Comissão para a Reforma do IRS, presidida pelo Prof. Doutor Rui Duarte Morais, foi apresentado em setembro de 2014. O referido Anteprojeto trata expressamente no ponto 4.3.4. da “Comunicabilidade de perdas entre cônjuges” onde afirma o seguinte:

“O Código do IRS acolhe um modelo de limitação de dedução de perdas entre as várias categorias de rendimentos, ou seja comunicabilidade horizontal mitigada. A Comissão propõe também que de modo a viabilizar um regime regra de tributação separada, se estabeleça a dedução de perdas vertical, isto é, relativamente a cada sujeito passivo; não se comuniquem perdas horizontalmente. Assim, o resultado negativo da categoria de um dos cônjuges, não é absorvido nos rendimentos da mesma categoria do outro, no caso de tributação conjunta”  .

 

23.8. O artigo 55.º na redação anterior à reforma do IRS de 2014 estabelecia o seguinte:

 “Sem prejuízo do disposto nos números seguintes, é dedutível ao conjunto dos rendimentos líquidos sujeitos a tributação o resultado líquido negativo apurado em qualquer categoria de rendimentos”.

Esta redação vigorou desde a aprovação do Código do IRS pelo Decreto-Lei n.º 442-A/88, de 30 de novembro, até à reforma de 2014, primeiro no artigo 54.º e, após a revisão do articulado efetuada pelo Decreto-Lei n.º 198/2001, de 3 de Julho, no artigo 55.º.

24. A norma de incidência de ganhos gerados com a venda de valores mobiliários pelos Requerentes, no ano de 2018, é a alínea b), do n.º 1, do artigo 10.º do Código do IRS (vd. n.º 23. 4. supra). A consideração de tais ganhos para efeitos de determinação do rendimento tributável do ano é feita nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 43.º do Código do IRS (vd. n.º 23. 5. supra). No caso do apuramento de resultados líquidos negativos aplica-se o disposto no n.º 1 do artigo 55.º do Código do IRS, ou seja, “relativamente a cada titular de rendimentos, o resultado líquido negativo apurado em qualquer categoria só é dedutível aos seus resultados líquidos positivos da mesma categoria.” (vd. n.º 23. 6. supra).

O teor do n.º 1 do artigo 55.º do Código do IRS é claro ao estabelecer que o apuramento é feito por titular e caso haja resultados líquidos negativos apenas serão dedutíveis nos resultados líquidos positivos da mesma categoria e do mesmo titular.

A alínea d) do n.º 1 do artigo 55.º prevê a possibilidade de reporte de prejuízos nos cinco anos seguintes quando o sujeito passivo opte pelo englobamento, mas também esse reporte é feito por titular e categoria.

A interpretação literal da norma não suscita dúvidas. Acresce que os trabalhos da Comissão de Reforma do IRS de 2014 supra referenciados (vd., n.º 23.7. supra) corroboram o sentido resultante dessa interpretação literal.

A doutrina também não suscita dúvidas relativamente a este entendimento. Por exemplo, PAULA ROSADO PEREIRA afirma:

“Verifica-se, portanto, no contexto do IRS, uma impossibilidade de compensação entre ganhos e perdas apurados pelo sujeito passivo num mesmo ano, mas em diferentes categorias de rendimento. Significa isto que não existe uma comunicabilidade horizontal de perdas entre as categorias de rendimento do IRS. Deste modo, as perdas apuradas numa categoria de rendimentos apenas podem ser reportadas para os anos seguintes, nos termos legalmente previstos, para serem deduzidas aos rendimentos líquidos positivos da mesma categoria.

A dedução de perdas é efetuada relativamente a cada titular de rendimentos. Tal significa que as perdas também não são comunicáveis entre sujeitos passivos. As perdas apuradas por um titular de rendimentos não são dedutíveis aos rendimentos positivos de outro titular, mesmo que se trate de rendimentos da mesma categoria e ainda que estejamos perante sujeitos passivos casados ou unidos de facto que tenham optado pelo regime da tributação conjunta.” 

Convém salientar que os cônjuges podem exercer na declaração anual de rendimentos a opção de tributação conjunta. Essa opção tem relevância no apuramento do quociente familiar e nas deduções à coleta, observando-se, dessa forma, a situação do agregado familiar. Por isso, a opção pela tributação conjunta não tem de implicar necessariamente que o rendimento líquido deixe de ser apurado por categoria e por titular, atendendo a que o IRS é um imposto sobre pessoas singulares que assenta no apuramento individual e por categoria sem comunicabilidade entre elas.

25. Em face do exposto, entende este Tribunal Arbitral que o ato de liquidação de IRS objeto do pedido de pronúncia arbitral não padece de qualquer vício de violação de lei sendo, por isso, legal, de acordo com a legislação à data aplicável.

26. Relativamente à alegada violação dos princípios da segurança jurídica e da proteção da confiança, decorrentes do princípio do Estado de Direito democrático, consagrados no artigo 2.º da CRP, os Requerentes afirmam que tomaram decisões com base no quadro fiscal à data existente e nele fundaram legítimas expetativas de que a tributação de eventuais ganhos seguiria o regime vigente. Verificou-se, segundo os Requerentes, que da reforma fiscal de 2014 resultou a alteração do regime legal aplicável às perdas obtidas por cada membro do casal, eliminando-se o regime de comunicabilidade ou compensação vigente desde 1989 e passando a existir um regime de mero reporte individual de perdas.

A este respeito é útil referir o disposto no acórdão do Tribunal Constitucional n.º 287/90, de 30 de outubro de 1999, que se debruçou com profundidade sobre o princípio da proteção da confiança. No citado acórdão o Tribunal Constitucional considerou que se verifica a inconstitucionalidade da lei, com fundamento em violação do princípio da proteção da confiança, quando são afetadas expetativas legitimamente fundadas dos cidadãos, sendo que a afetação terá de ser inadmissível, arbitrária e demasiado onerosa. Assim, o Tribunal Constitucional entende o seguinte:

“Em que se traduz esta «inadmissibilidade, arbitrariedade ou onerosidade excessiva»-

A ideia geral de inadmissibilidade poderá ser aferida, nomeadamente, pelos dois seguintes critérios:

                a)            afectação de expectativas, em sentido desfavorável, será inadmissível, quando constitua uma mutação da ordem jurídica com que, razoavelmente, os destinatários das normas dela constantes não possam contar; e ainda

                b)           quando não for ditada pela necessidade de salvaguardar direitos ou interesses constitucionalmente protegidos que devam considerar-se prevalecentes (deve recorrer-se, aqui, ao princípio da proporcionalidade, explicitamente consagrado, a propósito dos direitos, liberdades e garantias, no n.º 2 do artigo 18.º da Constituição, desde a 1.ª revisão).

Pelo primeiro critério, a afectação de expectativas será extraordinariamente onerosa.  Pelo segundo, que deve acrescer ao primeiro, essa onerosidade torna-se excessiva, inadmissível ou intolerável, porque injustificada ou arbitrária.

Os dois critérios completam-se, como é, de resto, sugerido pelo regime dos n.os 2 e 3 do artigo 18.º da Constituição. Para julgar da existência de excesso na «onerosidade», isto é, na frustração forçada de expectativas, é necessário averiguar se o interesse geral que presidia à mudança do regime legal deve prevalecer sobre o interesse individual sacrificado, na hipótese reforçado pelo interesse na previsibilidade de vida jurídica, também necessariamente sacrificado pela mudança. Na falta de tal interesse do legislador ou da sua suficiente relevância segundo a Constituição, deve considerar-se arbitrário o sacrifício e excessiva a frustração de expectativas.

Não há, com efeito, um direito à não-frustração de expectativas jurídicas ou a manutenção do regime legal em relações jurídicas duradoiras ou relativamente a factos complexos já parcialmente realizados. Ao legislador não está vedado alterar o regime do casamento, do arrendamento, do funcionalismo público ou das pensões, por exemplo, ou a lei por que se regem processos pendentes. Cabe saber se se justifica ou não na hipótese da parte dos sujeitos de direito ou dos agentes, um «investimento na confiança» na manutenção do regime legal — para usar uma expressão da jurisprudência constitucional alemã atrás referida. Valem aqui, por maioria de razão, as considerações que a jurisprudência deste Tribunal, atrás referida, tem feito ao negar uma proibição genérica de retroactividade. Tal é particularmente claro quando o sacrifício das expectativas anteriores resulta de uma imprevisível alteração das circunstâncias: como na doutrina privatística da base negocial, não há então lugar à manutenção das expectativas. Assim, por exemplo, medidas legislativas de política económica conjuntural poderão ser alteradas, com frustração de expectativas, se a conjuntura económica mudar ou se, mesmo sem essa mudança, mudar a orientação geral da política económica em consequência de mudança de governo, constitucionalmente previsível. Nada dispensa a ponderação na hipótese do interesse público na alteração da lei em confronto com as expectativas sacrificadas.” 

 

Ora, o legislador através da Reforma fiscal de 2014, operada pela Lei n.º 82-E/2014, de 31 de dezembro, pretendeu obstar que, no caso de tributação conjunta, o resultado negativo da categoria de rendimentos de um dos cônjuges seja absorvido nos rendimentos da mesma categoria do outro. Esta opção do legislador não é em si algo intolerável à luz do princípio da confiança na medida em que é legítimo ao Estado, com observância dos requisitos legais, adotar, no âmbito de uma reforma fiscal sobre o imposto de rendimento das pessoas singulares, uma solução legislativa diferente da que vigora na altura. Acresce ainda que, como salientou CASALTA NABAIS, as soluções adotadas na Reforma do IRS de 2014 beneficiaram fortemente a família. Efetivamente, foi introduzida a regra da tributação separada, embora com a possibilidade de opção pela tributação conjunta por parte dos cônjuges e unidos de facto, que pôs termo à situação discriminatória relativamente aos casados, as deduções pessoais foram aumentadas em função do número dos descendentes e ascendentes e foi reconhecida uma dedução por “despesas gerais e familiares” .

Assim, sem necessidade de outras considerações, conclui-se pela improcedência da invocada violação destes princípios constitucionais por parte dos Requerentes.

27. Quanto à alegada violação do princípio da capacidade contributiva, estabelecido no artigo 104.º, n.º 1, da CRP, os Requerentes afirmam que o preceito da lei fundamental prevê que a tributação deve ser efetuada “tendo em conta as necessidades e os rendimentos do agregado familiar”, em manifesto apelo ao conceito de capacidade contributiva tomado como conjunto, e não individualmente.

Importa salientar que o princípio da capacidade contributiva é uma concretização, ao nível dos impostos, do princípio da igualdade e tem um papel estruturante ao nível da tributação do rendimento. Este princípio marca a estrutura e a substância do IRS e concretiza-se em vários aspetos, nomeadamente: (i) na incidência do imposto sobre as manifestações de força económica do contribuinte; (ii) na consagração de uma base de incidência tão ampla quanto possível; (iii) na adoção do “rendimento-acréscimo”; (iv) na repartição do encargo tributário segundo o critério da força económica efetiva do contribuinte; (v) na personalização do imposto; (vi) na consagração de um mínimo de existência; (vii) na assunção de limites máximos de tributação e da proibição do confisco .

No âmbito da reforma fiscal de 2014 o legislador adotou mecanismos que favorecem a personalização do imposto e respeitam a capacidade contributiva através da opção pela tributação conjunta de casados ou unidos de facto, do regime do quociente conjugal, das deduções à coleta que têm a ver com a composição do agregado familiar e com despesas de natureza pessoal ou familiar. Neste contexto a proibição da comunicabilidade de perdas no âmbito da tributação conjunta do agregado familiar não constitui só por si uma violação do princípio da capacidade contributiva que fundamente a inconstitucionalidade.

Também aqui não assiste razão aos Requerentes e, nesta parte, deve improceder a alegada violação deste princípio constitucional.

28. Assim, face ao exposto, o Tribunal considera que a liquidação em causa nos presentes autos arbitrais não sofre dos vícios apontados pelos Requerentes, nem os pressupostos de direito adotados pela AT violam as normas constitucionais invocadas e, em consequência, a liquidação deverá ser mantida na ordem jurídica. Resulta, também que é legal o ato de indeferimento da reclamação graciosa, interposta pelos Requerentes contra a referida liquidação de imposto.

29. Os Requerentes procederam ao pagamento da liquidação em causa nos presentes autos arbitrais (vd., alínea K) do n.º 18 supra) e solicitam que lhes seja restituído o montante pago e que também que lhe seja reconhecido o direito a juros indemnizatórios, ao abrigo do artigo 43.º da LGT.

Nos termos do n.º 1 do artigo 43.º da LGT, são devidos juros indemnizatórios "quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido.” Conforme decorre do artigo 24.º, n.º 5, do RJAT, o direito aos mencionados juros pode também ser reconhecido no processo arbitral.

A condição necessária para a atribuição dos juros indemnizatórios consiste na demonstração da existência de erro sobre os pressupostos de facto ou de direito imputável aos serviços da Administração Fiscal.

Tendo este Tribunal concluído que o ato de liquidação contestado não enferma de qualquer vício, consequentemente, nos termos do disposto no artigo 43.º da LGT, não têm os Requerentes direito a juros indemnizatórios.

 

V – Decisão

Termos em que se decide neste Tribunal Arbitral:

a)            Julgar improcedente o pedido de pronúncia arbitral de anulação da liquidação de IRS n.º 2009..., referente ao ano de 2018, na parte correspondente ao imposto relativo a tributações autónomas, que a AT desconsiderou para efeitos do cálculo do imposto no valor de € 4.728,12;

b)           Manter a decisão de indeferimento da reclamação graciosa n.º ...2019..., constante do despacho do Chefe de Divisão da Direção de Finanças de..., proferido ao abrigo de delegação de competências, em 02-09-2019;

c)            Julgar improcedente o pedido de reembolso do montante pago pelos Requerentes acrescido de juros indemnizatórios;

d)           Condenar os Requerentes no pagamento das custas do presente processo no montante abaixo indicado.

 

VI - Valor do Processo

Atendendo ao disposto nos artigos 32.º do CPTA, 306.º, n.º 2, do Código do Processo Civil e 97.º-A do CPPT, aplicáveis por força do disposto no artigo 29.º, n.º 1, alíneas a) e b), do RJAT, e no artigo 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária (RCPAT) fixa-se o valor do processo em € 4.728,12 (quatro mil setecentos e vinte e oito euros e doze cêntimos).

 

VII - Custas

O montante das custas é fixado em € 612,00 (seiscentos e doze euros) a cargo dos Requerentes, nos termos da Tabela I do RCPAT, em cumprimento do disposto nos artigos 12.º, n.º 2, e 22.º, n.º 4, ambos do RJAT, bem como do disposto no artigo 4.º, n.º 4, do RCPAT.

 

Notifique-se.

 

Lisboa, Centro de Arbitragem Administrativa, 4 de agosto de 2020

 

O Árbitro

(Olívio Mota Amador)