Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 492/2015-T
Data da decisão: 2016-04-13  Selo  
Valor do pedido: € 21.612,96
Tema: Imposto do Selo - Verba 28 da TGIS; propriedade total/vertical
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 Decisão Arbitral

 

 

I – Relatório

 

1. No dia 28 de Julho de 2015, A…, Lda, contribuinte nº…, com sede na …, nº…, veio, invocando o disposto no artigo 99º, alíneas a) e c) do CPPT, por remissão do artigo 10º, nº 2, alínea c) do artigo 2º do Decreto-Lei nº 10/2011, de 20 de Janeiro, requerer Pedido de Pronúncia Arbitral sobre a legalidade da liquidação de Imposto do Selo (IS) referente ao ano de 2014 incidente sobre o prédio sito na mesma morada, no montante total de €21.612,96 (vinte e um mil seiscentos e doze euros e noventa e seis cêntimos).

2. A Requerente optou por não designar árbitro, tendo sido, nos termos do n.º 1 do artigo 6.º do RJAT, por decisão do Presidente do Conselho Deontológico, designada como árbitro único a signatária, que aceitou o cargo no prazo legalmente estipulado.

3. O tribunal arbitral ficou constituído em 13 de Outubro de 2015.

4. Em 9 de Novembro de 2015, a Administração Tributária e Aduaneira (AT ou Requerida) veio apresentar Resposta e juntar processo administrativo, suscitando excepção e questões prévias.

5. Notificadas as Partes para se pronunciarem sobre a dispensa de realização da reunião prevista no artigo 18º do RJAT assim como da apresentação de alegações escritas, apenas a Requerida respondeu anuindo à dispensa da reunião e alegações.

6.  Não tendo havido resposta, posteriormente, a despachos do tribunal arbitral no sentido de eventual aperfeiçoamento do Pedido e, ainda depois, para alegações facultativas, fixou-se o dia 13 de Abril de 2016 para prolação de decisão final.

 

7. O Pedido de Pronúncia

A Requerente sustenta, em síntese:

·         Enquanto sociedade civil, sob a forma de sociedade por quotas que, de acordo com os respectivos estatutos, tem por objecto “possuir prédios urbanos para, em princípio, satisfazer as necessidades de habitação dos sócios e praticar todos os actos concernentes ao exercício do seu direito de propriedade”, é proprietária do prédio urbano sito na…, nº…, em Lisboa.

·         Actualmente o prédio em causa já se encontra constituído em propriedade horizontal mas, ao tempo da liquidação em causa nos autos, era, segundo a respectiva caderneta predial, um “prédio em propriedade total, com andares ou divisões susceptíveis de utilização independente”, tendo cada sócio direito de habitação relativamente a cada um dos 20 apartamentos de utilização independente que integram o prédio.

·         Em 20 de Março de 2015, a AT procedeu à liquidação da verba 28.1. da TGIS, à taxa de 1% com referência ao ano de 2014, tendo emitido até à data 40 documentos de cobrança correspondentes à 1ª e 2ª prestações, individualizando cada um dos apartamentos de utilização independente, com valores patrimoniais entre €53.788,03 e €112.958,07 mas tendo em conta o valor global do prédio no montante de € 2.137.555,08.

·         A primeira e a segunda prestações, com pagamento respectivamente em Abril e Julho de 2015, já foram pagas, e a terceira sê-lo-á oportunamente.

·         As unidades económicas autónomas em causa nos autos, com VPT entre € 53.788,03 e € 112.958,07 não se enquadram nos objectivos da Lei nº 55-A/2012 que, ao introduzir a verba 28 da TGIS aplicando a taxa de 1% a casas de valor igual ou superior a €1.000.000,00, pretendeu tributar uma manifestação de riqueza, bens de luxo.

·         Pelo contrário, as famílias que habitam o prédio tiveram enorme dificuldade em pagar o esforço fiscal que lhes foi pedido ao longo dos anos de 2012, 2013 e 2014.

·         Tendo em conta o artigo 67º, nº 2, do CIS e o artigo 2º, nº 1 e 4, do CIMI, é abusiva e violadora da capacidade contributiva a aplicação às fracções da taxa prevista na verba 28 da TGIS para prédios de afectação habitacional de VPT superior a €1.000.000,00, porque cada um dos andares ou partes de utilização independente é caracterizado como tendo o seu valor económico próprio, e apesar de forma jurídica diferente da propriedade horizontal as realidades económicas são semelhantes, não sendo possível, para efeitos de tributação, distinguir onde a lei não distingue.

·         Por outro lado, quanto ao valor patrimonial, será de ter em conta o art. 67º, nº 2 do Código do Imposto do Selo e o art. 12º do CIMI, artigo este que prevê que cada andar ou parte de prédio susceptível de utilização independente é considerado separadamente na inscrição matricial, sendo o cálculo feito para cada andar ou parte de prédio susceptível de utilização independente, como resulta da análise da caderneta predial.

·         A aplicação que foi feita do artigo 28º da TGIS viola os princípios da igualdade e da capacidade contributiva (artigos 13º e 104º da CRP), não podendo uma pessoa ser tratada de forma diferente de acordo com a forma jurídica que regula o prédio onde se insere a sua propriedade, nem pessoas com situações iguais serem tributadas de forma diferente.

·         Não podem prédios independentes com valores entre € 53.788,03 e € 112.958,07 serem tributadas como propriedades luxuosas, como de resto já foi decidido em relação a este prédio nos processos 165/2014T e 752/2014T e, em relação a situações análogas, noutros processos.

·         Verificando-se a não existência de pressuposto legal de incidência de Imposto do Selo por errónea qualificação e quantificação dos factos tributários, está-se perante situação susceptível de impugnação do acto tributário, devendo ser a impugnação considerada procedente e provada e condenada a AT a reembolsar as quantias já pagas (1ª e 2ª prestações) e a pagar (3ª prestação), assim como juros indemnizatórios.

 

8. A Resposta

A Requerida respondeu, em síntese:

Por excepção:

-          O tribunal é materialmente incompetente porque a Requerente impugna apenas as notas de cobrança da 1ª e 2ª prestação do imposto relativo ao imóvel, pelo que o tribunal arbitral deve-se considerar incompetente para apreciar a legalidade de apenas uma prestação do acto de liquidação, tal como decidido já em vários processos no CAAD.

Questões prévias:

-          A Requerente não identificou as notas de cobrança relativas à 1ª prestação, mas apenas as referentes à 2ª prestação, o que limita o Pedido a estas, nem provou ter efectuado o pagamento das prestações, pelo que nunca poderá ser a AT condenada a pagar juros indemnizatórios.

Por impugnação:

-          A Requerente enquanto proprietária plena de um imóvel de VPT superior a €1.000.000,00 foi notificada para pagar Imposto do Selo previsto na verba 28 da TGIS, aditada pela Lei nº 55-/A/2012, de 29/10, com a alteração efectuada pela Lei nº 83-C/2013, de 31/12, em 3 prestações, nos termos dos artigos 44º, nº 5, do CIS e 120º do CIMI. 

a)     O conceito de prédio encontra-se definido no artigo 2.º do CIMI, cujo nº 4 considera prédio as fracções autónomas em regime de propriedade horizontal, situação diferente da de um prédio em propriedade total com andares ou divisões susceptíveis de utilização independente, caso em que o VP a considerar é o valor global do prédio.

b)     O art. 12º do CIMI estatui o conceito de matriz predial, e o seu nº 3 respeita exclusivamente ao registo de dados matriciais.

c)      A liquidação de IS processa-se de acordo com o CIMI mas, atentas as necessárias adaptações, o que resulta da letra da verba 28.1 em discussão é que o legislador quis tributar os prédios enquanto única realidade jurídico-tributária, tendo em conta a afectação habitacional e o valor patrimonial do prédio urbano inscrito na matriz ser igual ou superior a € 1.000.000,00.

d)     Tendo em conta a inscrição matricial - prédio em propriedade total, composto de partes susceptíveis de utilização independente – a AT liquidou imposto de acordo com o art. 23º, nº 7 do CIS e aplicou, com as necessárias adaptações, as regras do CIMI, tendo em conta, concretamente e de acordo com o art. 113º, nº 1, os valores patrimoniais dos prédios em relação aos sujeitos passivos constantes das matrizes, sem violação da lei.

e)     Não foram violados os princípios da legalidade, igualdade tributária e capacidade contributiva porque não há discriminação na tributação das diferentes realidades – a propriedade horizontal e a propriedade vertical são institutos diferenciados, justificando-se o benefício do instituto jurídico, mais evoluído, da propriedade horizontal, sem que essa discriminação seja arbitrária.

f)       A inscrição matricial de cada parte susceptível de utilização independente não é autónoma, por matriz, antes consta de uma descrição na matriz do prédio na sua totalidade pelo que a liquidação do imposto da verba 28 da TGIS incide sobre o valor patrimonial total do prédio urbano e não de cada uma das partes que o compõem.

g)     Só a constituição em propriedade horizontal determina a cisão/divisão da propriedade total e a independência ou autonomia de cada uma das fracções que a constituem para todos os efeitos legais (art. 4º, nº 2, do CIMI e 1414º e seguintes do CC), enquanto um prédio em propriedade total constitui, para todos os efeitos, uma única realidade jurídico-tributária.

h)    A tributação em sede de IS obedece ao critério de adequação, na medida em que visa a tributação da riqueza consubstanciada na propriedade de imóveis de elevado valor, surgindo num contexto de crise económica que não pode ser ignorado, e procurando um máximo de eficácia quanto ao objectivo a atingir, com o mínimo de lesão para outros interesses considerados relevantes.

i)       Este mecanismo de obtenção de receita apenas seria censurável face ao princípio da proporcionalidade se resultasse manifestamente indefensável, e isso não se verifica porque se aplica indistintamente a todos os titulares de imóveis com afectação habitacional de valor superior a €1.000.000,00.

j)       As notificações efectuadas para pagamento de imposto não violam qualquer princípio legal ou constitucional, as notas de cobrança são legais e válidas e o Pedido de pronúncia arbitral deve ser considerado improcedente sendo a Requerida absolvida do Pedido, no caso de não ser considerada procedente a excepção.

 

9. Questões a decidir 

O objecto do Pedido consiste em saber se o âmbito da incidência do Imposto do Selo previsto na Verba 28 da TGIS inclui os prédios urbanos não constituídos em propriedade horizontal mas integrados por andares ou divisões susceptíveis de utilização independente com afectação habitacional, quando o valor patrimonial tributário atribuído a cada uma dessas partes distintas é inferior ao valor de € 1.000.000,00, embora o conjunto das unidades independentes afectas a habitação atinja um total de VPT igual ou superior a esse montante.

 

A Requerida suscitou ainda a questão da incompetência do tribunal e da insuficiência dos elementos quanto à identificação das notas de cobrança, questões a apreciar e decidir logo após fixação da factualidade, de acordo com o disposto no art. 608º, nº 1 do CPC aplicável ex vi art. 29º, nº1, e) do RJAT.

 

10. Saneamento

As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias e têm legitimidade nos termos dos artigos 4.º e 10.º, n.º 2, do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (RJAT) e do artigo 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março, e o processo não sofre de qualquer nulidade, pelo que o Tribunal passa a decidir.

 

II Fundamentação

 

11. Factos provados

Considera-se provado que:  

11.1. A Requerente, A…, Lda., é uma sociedade civil sob a forma de sociedade por quotas de responsabilidade limitada, cujos estatutos prevêem como seu objecto “possuir prédios urbanos para, em princípio, satisfazer as necessidades de habitação dos sócios e praticar todos os actos concernentes ao exercício do seu direito de propriedade” (Estatutos, Doc. 1 juntos com o Pedido, cujo teor se dá como reproduzido).

11.2. Em 2014, a Requerente era proprietária do prédio urbano situado na…, nº…, em Lisboa, inscrito na matriz predial sob o número … da freguesia de Alvalade e descrito na caderneta predial como “prédio de rendas limitadas, composto de rés do chão e 10 andares, destinando-se o rés do chão frente a casa da porteira com 3 divisões” (artigo 2º do Pedido de pronúncia, artigo 8º da Resposta e informação da AT, datada de 5 de Janeiro de 2014, documento nº 2 junto com o Pedido, cujo teor se dá como reproduzido).

11.3. O prédio objecto dos autos compõe-se de vinte (20) divisões ou partes susceptíveis de utilização independente (artigo 3º do Pedido e caderneta predial, doc. nº 11 junto com o Pedido).

11.4. A soma dos valores patrimoniais das vinte divisões referidas no número anterior é de € 2.137.555,08 (artigos 3º e 4º do Pedido e informação prestada na reclamação graciosa, p. 4, e caderneta predial, doc. nº 11 junto com o Pedido).

11.5. Os valores patrimoniais tributários de cada uma das divisões com utilização independente e afectas a habitação, determinados no ano de 2012 segundo o CIMI, são: €53.788,03 (U-…-10ºDto); €53.788,03 (U-…-10ºEsq); €112.958,07 (U-…-1ºDto.); € 112.958,07 (U-…-1ºEsq.); € 112.141,51 (U-…-2Dto); €112.141,51 (U-…-2Esq); €112.958,07 (U-…-3Dto); €112.958,07 (U-…-3Esq); € 112.141,51 (U-…-4Dto) e €112.141,51 (U-…-4Esq); €112.958,07 (U-…-5ºDto.); €112.958,07 (U-…-5ºEsq.); €112.958,07 (U-…-6Dto); €112.958,07 (U-…-6ºEsq.); €112.958,07 (U-…-7ºDto.); €112.958,07 (U-…-7ºEsq.); €112.958,07 (U-…-8ºDto.); €112.958,07 (U-…-8ºEsq.); €112.958,07 (U-…-9ºDto.); €112.958,07 (U-…-9ºEsq.) (caderneta predial e documentos de cobrança, juntos com o Pedido, e PA, fls. 22 a 24).

11.6. As divisões referidas no número anterior foram objecto das liquidações de Imposto do Selo referentes ao ano de 2014, números 2014…, 2014…, 2014…, 2014…, 2014…, 2014…, 2014…, 2014…, 2014…, 2014…, 2014…, 2014…, 2014…, 2014…, 2014…, 2014…, 2014…, 2014…, 2014…, 2014…, incidentes sobre 10ºDto, 10ºEsq, 1ºDto, 1ºEsq., 2Dto; 2Esq; 3Dto; 3Esq; 4Dto, 4Esq, 5ºDto, 5ºEsq, 6Dto, 6ºEsq, 7ºDto, 7ºEsq, 8ºDto, 8ºEsq, 9ºDto, 9ºEsq, respectivamente (PA, fls. 22 e 23).

11.7. As liquidações do Imposto do Selo foram efectuadas em 20 de Março de 2015, de Imposto do Selo, para pagar em três prestações, segundo o art. 120º do CIMI, e continham a indicação, como fundamento, da verba 28.1 da Tabela Geral do Imposto do Selo, assim como da aplicação da taxa de 1% ao valor do VPT de cada uma das divisões, do que resultava as colectas de imposto nos montantes, respectivamente, de € 537,88 (U-… -10ºDto e 10ºDto); € 1.129,58 (U-…1ºDto e 1º Esq.), € 1.121,42 (U-…2ºDto e 2º Esq.); € 1.129,58 (U-… 3ºDto e 3º Esq.), € 1.121,42 (U-… 4ºDto); € 1.129,58 (U-…-4ºEsq); € 1.129,58 (U-… 5ºDto e 5º Esq.), € 1.121,42 (U-… 6ºDto); € 1.129,58 (U-…-6ºEsq); € 1.129,58 (U-… 7ºDto e 7ºEsq), € 1.129,58 (U-…8ºDto e 8ºEsq), €1.129,58 (U-… 9ºDto e 9ºEsq) (Documentos de cobrança juntos com o Pedido e PA, fls. 22 e 23).

11.8. O pagamento em três prestações derivava da importância das colectas, sendo cada prestação no montante de € 53,788,03 (U-…-10ºDto e 10ºDto); € 376,52 (U-… 1ºDto e 1º Esq.), € 373,80 (U-… 2ºDto e 2º Esq.); € 376,52 (U-…3ºDto e 3º Esq.), € 373,80 (U-… 4ºDto); € 376,52 (U-…-4ºEsq.); € 376,52 (U-… 5ºDto e 5º Esq.), € 373,80 (U-…6ºDto.); € 376,52 (U-…-6ºEsq); € 376,52 (U-… 7ºDto e 7ºEsq), € 376,52 (U-…8ºDto e 8ºEsq), € 376,52 (U-… 9ºDto e 9ºEsq) (Documentos de cobrança juntos aos autos com o Pedido).

11.9. Os documentos de cobrança indicam como valor patrimonial do prédio sujeito a imposto € 2.137.555,08 correspondente ao valor total das vinte divisões susceptíveis de utilização independente afectas a habitação (Documentos de cobrança juntos com o Pedido).

11.10. O pedido de pronúncia arbitral foi apresentado no CAAD em 28 de Julho de 2015.

11.11. Em 1 de Setembro de 2015, as notas de cobrança relativas à 1ª prestação e 2ª prestação tinham sido, com excepção de duas (2015… e 2015…), pagas dentro do prazo de pagamento voluntário, em 24 de Abril e 30 de Julho de 2015, respectivamente (PA, fls. 24).

 

12. Factos não provados

Não há factos não provados relevantes para a decisão do caso dos autos. 

 

13. Fundamentação da prova

A prova fixada baseou-se nas peças juntas pelas Partes - Pedido de pronúncia arbitral e Resposta - assim como nos documentos juntos com o Pedido e no Processo administrativo junto pela Requerida.

 

14. Apreciação de direito

14.1. Excepção e questões prévias

A Requerida sustenta que, tendo em conta o valor do processo e todos os documentos a ele juntos, a Requerente impugna exclusivamente as notas de cobrança que constituem as 1.ªs e 2.ªs prestações do imposto relativo ao imóvel, pelo que o Tribunal Arbitral é materialmente incompetente para conhecer do Pedido já que o art. 2º do RJAT apenas lhe atribui competência para apreciar a legalidade de um acto tributário e não de uma prestação deste.

 

De resto, a Requerida considera que o Pedido até teria que ser restringido à 2.ª prestação do imposto porque a Requerente apenas junta notas de cobrança relativas a esta e não à 1ª prestação. Assim como não teria direito a pagamento de juros indemnizatórios por não ter juntado prova de ter efectuado pagamento das 1.ªs e 2.ªs prestações do imposto.

 

Vejamos, e até começando pelas questões ditas prévias porque caracterizam a matéria de facto.


Recorde-se que do Pedido e da factualidade fixada resulta que a Requerente invoca a liquidação de imposto do selo efectuada pela AT com data de 20 de Março de 2015, ao abrigo da verba 28.1. da TGIS, à taxa de 1% e com referência ao ano de 2014, relativamente a um valor global de prédio no montante de € 2.137.555,08. Referiu que haviam sido já emitidos 40 documentos de cobrança correspondentes à 1ª e 2ª prestações, individualizando cada um dos apartamentos de utilização independente, com valores patrimoniais entre €53.788,03 e € 112.958,07. E, invocando a inexistência de pressuposto legal de incidência de Imposto do Selo por errónea qualificação e quantificação dos factos tributários, acabava a pedir que a impugnação fosse considerada procedente e provada e, em consequência, a AT condenada a reembolsar as quantias já pagas (1ª e 2ª prestações) e a pagar (3ª prestação), assim como juros indemnizatórios. Quanto ao valor da causa, é indicado o montante de €21.612,96 (vinte e um mil seiscentos e doze euros e noventa e seis cêntimos), que não corresponde apenas à soma da 1ª e 2ª prestação mas sim ao total de todas as prestações.

 

Quanto aos pagamento, apesar de a Requerente não ter apresentado comprovativos afirmou tê-lo realizado e a própria Requerida no processo administrativo enviado aos autos, de acordo com o previsto no RJAT, comprovava que fora efectuado, quase na totalidade, até Setembro de 2015, indicando-se que as notas de cobrança relativas à 1ª prestação e 2ª prestação tinham sido, com excepção de duas (2015… e 2015…), pagas dentro do prazo de pagamento voluntário, em 24 de Abril e 30 de Julho de 2015, respectivamente (PA, fls. 24). Quanto à 3ª prestação só estaria em pagamento em Novembro.

 

De qualquer forma, a ser reconhecida a ilegalidade de uma liquidação o contribuinte tem direito, para além do reembolso das importâncias indevidamente pagas (e cujo montante a AT não pode desconhecer...), a juros indemnizatórios nos termos legais.

 

Quanto à “incompetência do tribunal” suscitada pela Requerida, improcede: para além de quaisquer outras considerações que pudessem ser feitas sobre a possibilidade de impugnação de apenas parte das prestações, verifica-se, atento o teor do Pedido (cf. Pedido, artigos 8º, 10º e 11º e ponto 2º das conclusões), que a Requerente pede a apreciação da impugnação da liquidação e não apenas das primeiras duas prestações, referindo sim que as notas de cobrança destas já foram emitidas e pagas.

 

14.2. A verba 28 da Tabela Geral do Imposto do Selo (TGIS)

14.2.1.Regime aprovado pela Lei nº 55-A/2012, de 29 de Outubro

A questão fundamental de direito, controvertida nos presentes autos, consiste em saber se no caso de prédios em propriedade total, com andares ou divisões de utilização independente mas não constituídos em regime de propriedade horizontal, o VPT a considerar para efeitos de incidência de Imposto do Selo previsto na verba 28.1 da TGIS deve corresponder ao VPT de cada andar ou divisão com afectação habitacional e utilização independente ou à soma dos VPT correspondentes aos andares ou divisões de utilização independente com afectação habitacional.

 

Ou seja, há que decidir se o VPT relevante como critério de incidência do imposto é o correspondente ao somatório do valor patrimonial tributário atribuído às diferentes partes ou andares (VPT global) ou, antes, o VPT atribuído a cada uma das partes ou andares habitacionais. 

 

Esta questão já foi apreciada em muitos processos no âmbito da Arbitragem Tributária[1], com registo de grande coincidência quanto à conclusão resultante das decisões proferidas[2].

 

A verba 28 da Tabela Geral do Imposto do Selo, anexa ao Código do Imposto do Selo (CIS), foi aditada pelo artigo 4º da Lei nº 55-A/2012, de 29 de Outubro, com o seguinte conteúdo:

«28 – Propriedade, usufruto ou direito de superfície de prédios urbanos cujo valor patrimonial tributário constante da matriz, nos termos do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (CIMI), seja igual ou superior a € 1.000.000 – sobre o valor patrimonial tributário para efeito de IMI:

28-1 – Por prédio com afectação habitacional – 1%;

28.2 – Por prédio, quando os sujeitos passivos que não sejam pessoas singulares sejam residentes em país, território ou região sujeito a um regime fiscal claramente mais favorável, constante da lista aprovada por portaria do Ministro das Finanças – 7,5%.»

 

Segundo resulta das alterações ao Código do Imposto do Selo introduzidas pelo artigo 3º da Lei nº 55-A/2012, de 29/10, o Imposto do Selo previsto na verba 28 da TGIS incide sobre uma situação jurídica (nº 1 do artigo 1º e nº 4 do artigo 2º do CIS), em que os respectivos sujeitos passivos são os referidos no artigo 8.º do CIMI (nº 4 do art. 2º do CIS), aos quais cabe o encargo do imposto (alínea u) do nº 3 do artigo 3º do CIS). 

 

O CIS, na redacção dada pela Lei nº 55-A/2012, quer no artigo 4º, nº 6 (“Nas situações previstas na verba 28 da Tabela Geral, o imposto é devido sempre que os prédios estejam situados em território português”), quer no artigo 23º, nº 7 (“Tratando-se do imposto devido pelas situações previstas na verba n.º 28 da Tabela Geral, o imposto é liquidado anualmente, em relação a cada prédio urbano, pelos serviços centrais da Autoridade Tributária e Aduaneira, aplicando-se, com as necessárias adaptações, as regras contidas no CIMI”), em conjugação com o art. 1º do CIMI, considera o prédio em si como o facto tributário, desde que atinja o valor previsto na verba 28 da Tabela Geral do Selo.

 

O disposto na Lei nº 55-A/2012, de 29 de Outubro, quanto à nova verba 28 da Tabela Geral de Imposto de Selo, entrou em vigor no dia seguinte à publicação da lei, ou seja, 30 de Outubro de 2012 [3].

 

14.2.2. O conceito de prédio utilizado na verba 28 da TGIS

O conceito de “prédio com afectação habitacional” utilizado na verba 28.1 não se encontra expressamente definido em qualquer disposição do CIS nem no CIMI, diploma para que remete o n.º 2 do art.º 67.º do CIS.

 

No caso dos autos, o prédio em propriedade total (edifício com o … da … em Lisboa) é constituído por vinte (20) divisões ou partes susceptíveis de utilização independente destinadas a habitação. Os valores patrimoniais tributários destas vinte divisões afectas a habitação oscilam entre € 53.788,03 e € 112.958,07, totalizando o montante de € 2.137.555,08.

 

Está em causa o exacto sentido do segmento "valor patrimonial considerado para efeitos de IMI", constante da norma de incidência do imposto do selo no corpo da verba 28 da TGIS: no caso de prédios em propriedade total mas com andares ou divisões susceptíveis de utilização independente, com afectação habitacional, o VPT relevante corresponde à soma do VPT das diversas divisões/andares com afectação habitacional, considerado um único prédio, como pretende a AT, ou o que há que ter em conta é o VPT de cada um dos respectivos andares ou divisões autónomas com afectação habitacional, como defende a Requerente?

 

Ora o referido segmento (valor patrimonial considerado para efeitos de IMI) está integrado num texto que define como objecto de incidência do imposto do selo a “Propriedade, usufruto ou direito de superfície de prédios urbanos cujo valor patrimonial tributário constante da matriz, nos termos do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (CIMI), seja igual ou superior a 1.000.000 - (...)” (bold nosso).

 

Como tem sido repetidamente invocado e admitido, o Código do IMI consagra, quer quanto à inscrição matricial e discriminação do respectivo valor patrimonial tributário quer quanto à liquidação do imposto, a autonomização das partes de prédio urbano susceptíveis de utilização independente e a segregação/individualização do VPT relativo a cada andar ou parte de prédio susceptível de utilização independente [4].

 

Assim, a cada prédio corresponde um único artigo na matriz (nº 2 do artigo 82º do CIMI) mas, segundo o nº 3 do art. 12.º do mesmo Código, referente ao conceito de matriz predial (registo do prédio, sua caracterização, localização, VPT e titularidade), "cada andar ou parte de prédio susceptível de utilização independente é considerado separadamente na inscrição matricial, a qual discrimina o respectivo valor patrimonial tributário”, não se tomando como referência o somatório dos valores patrimoniais atribuídos às partes autónomas de um mesmo prédio mas o valor atribuído a cada uma delas individualmente considerado.

 

Quanto à liquidação do IMI - aplicação da taxa à base tributável - o art. 119.º, n.º1, do CIMT dispõe que “o competente documento de cobrança” contém a “discriminação dos prédios, suas partes susceptíveis de utilização independente, respectivo valor patrimonial tributário e da colecta (…)”.

 

Ou seja, a regra é a autonomização, a caracterização como “prédio” de cada parte de um edifício, desde que funcional e economicamente independente, susceptível de utilização independente[5], de acordo com o conceito de prédio definido logo no nº 1 do artigo 2º do CIMI: prédio é toda a fracção (de território, abrangendo águas, plantações, edifícios e construções de qualquer natureza nela incorporados ou assentes, com carácter de permanência) desde que faça parte do património de uma pessoa singular ou colectiva e, em circunstâncias normais, tenha valor económico, bem como as águas, plantações, edifícios ou construções, nas circunstâncias anteriores, dotados de autonomia económica (apresentação e sublinhado nossos). [6]

 

Assim, quando o nº 4 do artigo 2º dispõe que “Para efeitos deste imposto, cada fracção autónoma, no regime de propriedade horizontal, é havida como constituindo um prédio”, não consagra propriamente um regime excepcional ou especial para os prédios em propriedade horizontal.

 

Afinal, cada edifício em propriedade horizontal (artigo 92º) tem apenas uma só inscrição matricial (nº 1), descrevendo-se genericamente o edifício e mencionando-se o facto de ele se encontrar em regime de propriedade horizontal (nº 2) e a autonomia matricial concretiza-se na atribuição a cada uma das fracções autónomas, pormenorizadamente descrita e individualizada, de uma letra maiúscula, segundo a ordem alfabética (nº 3). Esta parece ser a especificidade dos edifícios em propriedade horizontal. Mas nos outros casos, de prédios em propriedade vertical ou total, as divisões ou andares com utilização independente autonomia mas sem o estatuto de propriedade horizontal, a matriz também consagra a autonomia tributária evidenciando as diferentes unidades com indicação do tipo de piso/andar.

 

Assim, a afirmação da Requerida no sentido de no caso dos autos se tratar de “um prédio em propriedade total” cuja “inscrição matricial de cada parte susceptível de utilização independente não é autónoma, por matriz, mas consta de uma descrição do prédio na sua totalidade” (artigos 23º e 35 da Resposta) não é suficiente para tornar irrelevante a autonomia económica e fiscal que acima verificámos encontrar-se consagrada no CIMI no caso de divisões ou andares susceptíveis de utilização independente, sem estatuto de propriedade horizontal, integrados em edifícios em propriedade total.

 

Nem é aceitável a argumentação que tem vindo a ser apresentada pela AT baseada na consagração civilística da propriedade horizontal, vislumbrando na tributação prevista na verba 28 da TGIS uma discriminação imposta pela necessidade de impor coerência ao sistema fiscal (art. 33º da Resposta).

 

Com efeito, não existem, nem no texto normativo nem no processo legislativo que levou à aprovação da Lei nº 55-A/2012, de 29 de Outubro, elementos que permitam identificar e legitimar uma finalidade (fiscal ou extra-fiscal) no sentido defendido pela Requerida. Antes parece que tal discriminação, inesperada, se arriscaria a violar o princípio da confiança jurídica...

 

Tudo dito, não se encontra razão para, em matéria de incidência do Imposto do Selo previsto na verba 28.1 da TGIS, dar às fracções de prédios em “propriedade vertical”, dotadas de autonomia, tratamento diferente do concedido aos prédios em propriedade horizontal, quando em qualquer dessas situações o IMI é aplicado ao valor patrimonial evidenciado na matriz para cada uma das unidades autónomas.

 

14.3. A ratio legis da verba 28 e 28.1 da TGIS

A interpretação acima sustentada, decorrente da análise da letra da lei e sua inserção no conjunto de outras normas tributárias aplicáveis, é a mais consonante com o espírito das alterações legislativas introduzidas pela Lei nº 55-A/2012, de 29 de Outubro.

 

Como já foi evidenciado em outras decisões arbitrais, “o legislador ao introduzir esta inovação legislativa considerou como elemento determinante da capacidade contributiva os prédios urbanos, com afetação habitacional, de elevado valor (de luxo), mais rigorosamente, de valor igual ou superior a €1.000.000,00 sobre os quais passou a incidir uma taxa especial de imposto de selo, pretendendo introduzir um princípio de tributação sobre a riqueza exteriorizada na propriedade, usufruto ou direito de superfície de prédios urbanos de luxo com afetação habitacional. Por isso, o critério foi de aplicação da nova taxa aos prédios urbanos com afetação habitacional, cujo VPT seja igual ou superior a € 1.000.000,00” (...). “A fundamentação da medida designada por “taxa especial sobre os prédios urbanos habitacionais de mais elevado valor” assenta na invocação dos princípios da equidade social e da justiça fiscal, chamando a contribuir de uma forma mais intensa os titulares de propriedades de elevado valor destinadas a habitação, fazendo incidir a nova taxa especial sobre as casas de valor igual ou superior a 1 milhão de euros. Claramente o legislador entendeu que este valor, quando imputado a uma habitação (casa, fração autónoma ou andar com utilização independente) traduz uma capacidade contributiva acima da média e, enquanto tal, suscetível de determinar um contributo especial para garantir a justa repartição do esforço fiscal." [7]

 

Atenta a finalidade legislativa, conclui-se ainda que a detenção de fracções em propriedade total ou vertical não revela uma maior capacidade contributiva do que se se encontrassem constituídas sob a forma de propriedade horizontal.

 

Pelo contrário, na maioria dos casos, como evidenciado pela Decisão Arbitral nº 50/2013, “muitos dos prédios existentes em propriedade vertical são antigos, com uma utilidade social inegável, pois em muitos casos acolhem moradores com rendas módicas e mais acessíveis, fatores que necessariamente devem ser tidos em conta.”

 

Também a análise por este prisma confirma a correcção da interpretação de que a verba 28 da TGIS não abrange cada um dos andares, divisões ou partes susceptíveis de utilização independente quando apenas do respectivo somatório resulta um VPT superior ao que prevê a mesma verba.

 

Tal como decidido em outros processos arbitrais, este tribunal entende que no tocante à data da constituição da obrigação tributária, conexão fiscal, determinação da base tributável, liquidação e pagamento do imposto do selo em causa, são aplicáveis as correspondentes regras do CIMI, por remissão expressa dos artigos. 5.º, n.º1, alínea u), 4.º, n.º 6, 23.º, n.º 7, 44.º, n.º 5, 46.º, n.º 5 e 49.º, n.º 3, do CIS.

 

Afigura-se-nos ilógico sujeitar ao novo imposto do selo partes autónomas sem o estatuto jurídico de propriedade horizontal e não sujeitar nenhuma das fracções habitacionais se o prédio se encontrasse em regime de propriedade horizontal, assim como não se pode desconhecer a incoerência, em termos de tributação de património, do diferente tratamento dado a detentores de fracções concentradas num mesmo prédio ou dispersos por prédios diferentes, tributadas no primeiro caso e não tributadas no segundo, ainda que em qualquer das situações o montante total dos VPT respectivos atingisse o valor de 1 milhão de euros. 

 

Assim, o presente tribunal arbitral conclui que as liquidações de Imposto do Selo, efectuadas com base na verba 28/28.1 da TGIS, relativas a cada um dos andares ou partes susceptíveis de utilização independente, propriedade da Requerente, objecto dos presentes autos, estão feridas de ilegalidade, porque os referidos dispositivos legais não podem ser interpretados no sentido da sua aplicação a andares ou partes susceptíveis de utilização independente de um prédio em propriedade vertical, quando apenas do somatório de cada um desses andares ou partes se logra obter um VPT igual ou superior a € 1.000.000,00 (um milhão de Euros) não atingindo o VPT de cada um dos ditos andares ou partes esse montante.  

 

Como resulta da factualidade fixada, nenhum dos andares destinados a habitação, no prédio em propriedade vertical objecto deste processo, tem valor patrimonial igual ou superior a €1.000.000,00, não estando pois verificado o pressuposto legal de incidência do IS previsto na Verba 28 da TGIS, com consequente ilegalidade dos actos tributários em apreciação.

 

E, como vem sendo pacificamente entendido, por aplicação do artigo 24º, nº 5 do RJAT e estando em causa nos autos, uma errada interpretação e aplicação pela Requerida de norma de incidência tributária, são devidos juros indemnizatórios nos termos dos artigos 43º e 100º da LGT.

 

15. Decisão

Com os fundamentos expostos, o tribunal arbitral decide:

a)      Julgar procedente o pedido de pronúncia arbitral e, em consequência, declarar ilegais os actos tributários de liquidação de Imposto do Selo (verba 28 e 28.1 da Tabela Geral de Imposto Selo) incidentes sobre as fracções do prédio identificado nos autos, e referentes a 2014, ordenando-se a anulação do Imposto do Selo liquidado relativamente ao ano em questão, no montante total de €21.612,96 (vinte e um mil seiscentos e doze euros e noventa e seis cêntimos), o reembolso das importâncias de imposto que se mostrem pagas, assim como o pagamento de juros indemnizatórios.

b)      Condenar a Requerida em custas.

 

16. Valor do processo

De harmonia com o disposto no n.º 2 do artigo 315.º do CPC, na alínea a) do n.º1 do artigo 97.º-A do CPPT e ainda do n.º 2 do artigo 3.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária fixa-se ao processo o valor de €21.612,96 (vinte e um mil seiscentos e doze euros e noventa e seis cêntimos).

 

17. Custas

Para os efeitos do disposto no n.º 2 do artigo 12º e no n.º 4 do artigo 22.º do RJAT e do n.º 4 do artigo 4.º do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se o montante das custas em €1.224,00 (mil duzentos e vinte e quatro euros), nos termos da Tabela I anexa ao dito Regulamento, a suportar integralmente pela Requerida.

 

Lisboa, 13 de Abril de 2016.

 

 

A Árbitro

 

                                            

 

(Maria Manuela Roseiro)

 



[1] Sobre a aplicação da verba 28 da TGIS no caso de prédios em propriedade total/vertical, encontra-se já publicitado um elevadíssimo número de decisões no site de jurisprudência tributária do CAAD.

[2] Reproduz-se, em grande parte, o texto da decisão proferida no âmbito do CAAD, no processo nº 194/2014-T julgado por colectivo com participação da signatária.

[3] O artigo 6º da Lei nº 55-A/2012, prevê disposições transitórias por virtude das quais, nesse primeiro ano de vigência, ou seja, 2012, mas, estando em causa nos autos o ano de 2014, estas disposições não têm aplicação.

[4] “Um outro aspecto que deve ser evidenciado na matriz tem a ver com a necessidade de fazer relevar a autonomia que, dentro do mesmo prédio, pode ser atribuída a cada uma das suas partes, funcional e economicamente independentes. Nestes casos, a inscrição matricial não só deve fazer referência a cada uma das partes como deve fazer referência expressa ao valor patrimonial correspondente a cada uma delas” (Silvério Mateus e Freitas Corvelo, Os Impostos sobre o Património Imobiliário e o Imposto do Selo, Comentados e Anotados", Engifisco, Lisboa 2005, pags.159 e 160). E diziam ainda os mesmos autores (ibidem, p.160): “Esta autonomização das partes autónomas de um prédio, aplicável sobretudo aos prédios urbanos, justificava-se no âmbito da antiga Contribuição Predial em que o rendimento colectável correspondia à renda ou valor locativo de cada uma dessas componentes, continuou a justificar-se no caso da Contribuição Autárquica em que o valor patrimonial tinha subjacente a renda efectiva ou potencial e continua a ser pertinente em sede do IMI, dado que os factores de valorização previstos nos artigos 38º e seguintes podem não ser os mesmos para todas essas componentes (...) o facto de um prédio estar ou não arrendado continua a ter relevância para efeitos de determinação do valor patrimonial tributário quer para efeitos de IMI quer para IMT (vd. Artigo 17º do DL 287/2003)” (referiam-se à redacção original “regime transitório para prédios urbanos arrendados”, norma a rever, segundo o seu nº 5, quando se procedesse a revisão da lei do arrendamento urbano, o que aconteceu com a Lei nº 6/2006, de 27/02).

[5] Sobre este aspecto, e na linha do comentário citado na nota anterior, veja-se a fundamentação contida na decisão do processo nº248/2013-T: “A autonomização na matriz das partes funcional e economicamente independentes de um prédio em propriedade total prende-se com razões de índole fiscal e extrafiscal. No plano fiscal, essa autonomização tem a ver com a própria determinação do valor patrimonial tributário, que constitui a base tributável do IMI, dado que a fórmula de determinação desse valor, prevista no art. 38.º do mesmo Código, comporta índices que variam em função da utilização atribuída a cada uma dessas partes. No plano extrafiscal, essa autonomização continua a encontrar justificação na relevância atribuída ao valor patrimonial tributário de prédios e suas partes autónomas na legislação do arrendamento urbano.” Aí se menciona também o n.º 1 do art. 15.º- O, do Decreto-Lei n.º 287/2003, de 12/11, aditado pela Lei n.º 60-A/2011, de 30/11 (prevendo que a cláusula de salvaguarda relativa ao agravamento da tributação em IMI decorrente da avaliação geral dos prédios urbanos, é aplicável por prédio ou parte de prédio urbano que seja objecto da referida avaliação) como confirmando a individualização, para efeitos tributários, das partes autónomas dos prédios urbanos.     

[6] Como observado na decisão do processo arbitral nº132/2013-T: “As normas (...) elencadas consagram o princípio da autonomização das partes independentes de um prédio urbano, mesmo quando não esteja constituído em propriedade horizontal. Ou seja, cada parte susceptível de utilização independente deve ser, para efeitos de IMI, valorizada em face das suas especificidades e afectação, resultando num VPT autónomo, individualizável e correspondente a cada parte susceptível de utilização independente.”

[7] Excertos da Decisão no processo nº 50/2014-T, referindo também a Decisão Arbitral no processo nº 48/2013-T, quanto à análise da discussão da proposta legislativa na Assembleia da República.