Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 486/2017-T
Data da decisão: 2018-02-01  IRC  
Valor do pedido: € 11.740,35
Tema: IRC – 42. n.º1 al) e) do CIRS – Encargos não Dedutíveis cujo risco seja segurável.
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Decisão Arbitral

RELATÓRIO

A -PARTES

A…, S.A. com o NIPC…, e com sede sítio em …, …-… Porto, doravante designada de Requerente ou sujeito passivo.

Autoridade Tributaria e Aduaneira, doravante designada por Requerida ou AT.

O pedido de constituição do Tribunal Arbitral, foi aceite pelo Presidente do CAAD, e desse modo o Tribunal Arbitral foi regularmente constituído, no dia 31-08-2017, para apreciar e decidir o objeto do presente litígio, e automaticamente notificada a Autoridade Tributaria e Aduaneira, no dia 31-08-2017, conforme consta da respetiva ata.

O Requerente não procedeu à nomeação de árbitro, pelo que, ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro, com a redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro, o Conselho Deontológico, designou o Árbitro Paulo Ferreira Alves, cuja nomeação foi aceite nos termos legalmente previstos.

Em 03-11-2017, as partes foram devidamente notificadas dessa designação, nos termos do artigo 11.º n.º 1, alínea a) e b), do RJAT e dos Artigos 6.º e 7º do Código Deontológico, e não manifestaram vontade de recusar a designação do Árbitro.

Em conformidade, com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro, com a redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66­B/2012, de 31 de dezembro, o Tribunal Arbitral singular, quedou regularmente constituído, em data de 23-11-2017.

Ambas as partes, concordam com a dispensa da realização da reunião, prevista no disposto no artigo 18.º do RJAT, e a apresentação de alegações escritas.

O Tribunal Arbitral encontra-se regularmente constituído, e é materialmente competente, nos termos dos art.ºs 2.º, n.º 1, alínea a), e 30.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro.

As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e encontram-se legalmente representadas (art.ºs 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e art.º 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março).

O processo não enferma de vícios que o invalidem.

 

B – PEDIDO

  1. O ora Requerente, peticiona a declaração de ilegalidade do ato tributário de liquidação adicional em sede de Imposto Sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas n.º 2012…, referente ao exercício de 2008, no valor de 11.740,35 € (onze mil setecentos e quarenta euros e trinta e cinco cêntimos).

 

C – CAUSA DE PEDIR

  1. A fundamentar o seu pedido de pronúncia arbitral, o Requerente alegou, com vista à declaração de ilegalidade do ato tributário de liquidação em sede de Imposto Sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas, já descritos no ponto 1 deste Acórdão, em síntese, o seguinte:
    1. A Requerente foi pelo ofício no 2017…, de 2017-04-17, notificado da decisão de 2017-03-231, da Subdiretora Geral (por subdelegação) da Direção de Serviços do Imposto Sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas, de indeferimento de pedido de revisão oficiosa referente a autoliquidação de IRC do exercício de 2008.
    2. Tal como revela o processo instrutor, o presente pedido de revisão oficiosa de ato tributário resultou de pedido de convolação de anterior reclamação graciosa, convolação esta que a AT não aceitara, mas que foi determinada a aceitar por sentença de 03.03.2016, do TAF do Porto, no Processo …15… BEPRT.
    3. A Requerente, desenvolve a atividade de prestamista, regulada pelo Decreto-Lei n.º 365/99, de 17 de setembro, atividade que consiste, de acordo com o disposto no nº 2 do art.º 1º do DL n.º 365/99, no exercício por pessoa singular ou coletiva da atividade de mútuo garantido por penhor.
    4. O art.º 32º n.º 1º do DL 365/99 determina a obrigatoriedade de o prestamista indemnizar o mutuário «[e]m caso de perda, extravio, furto, roubo ou incendo das coisas dadas em penhor».
    5. Nos termos do art. 33.º n.º 1, a responsabilidade de indemnizar «é obrigatoriamente transferida para uma companhia seguradora».
    6. Alega a Requerente que face a natureza da atividade prestamista, que implica uma elevada velocidade de circulação dos bens, e impossível determinar com exatidão o valor dos montantes a segurar, isto e, em cada momenta o valor dos bens segurados pode ser superior ou inferior ao valor dos bens na posse do prestamista a título de garantia dos mútuos concedidos.
    7. Pode, portanto, suceder que, no momento em que ocorra um evento cujo risco se encontre segurado, o valor do seguro seja inferior ao valor dos bens perdidos, extraviados, furtados, roubados ou destruídos. E essa discrepância pode não ser previsível no momenta em que e feito o seguro.
    8. Tenda essa situação em mente a lei determinou (art. 33°/2, do DL 365/99) a obrigatoriedade de um valor mínimo de seguro, cujo critério e o que resultar da media das avaliações feitas no ano anterior, critério que taberna esta estabelecido na Apólice Uniforme do Segura Obrigatório de Responsabilidade Civil do Prestamista.
    9. No ano de 2008, Requerente foi vítima de dois furtos, devidamente comprovados - em 14/4/2008 (na sede) e em 29/12/2008. Foi ainda vítima de novo furto em 7/5/2009 (na filial 6), fatos incontestados pela AT.
    10. O valor total das indemnizações a pagar aos mutuários, relativamente aos furtos ocorridos em 2008 eram de € 19.273.585,43. O valor coberto pelo seguro era de € 14.132.588,05. A Requerente assumiu parte do valor seguro a título de franquia, no total de€ 1.623.217,52.
    11. A seguradora pagou a indemnização no valor de € 12.509.370,53. A Requerente pagou a diferença em falta, ou seja, € 5.141.001,38 acrescido da franquia, o que resultou num encargo de € 6.764.218,9.
    12. Na declaração modelo 22, no campo 7, n° 213, relativa ao exercício de 2008, a Requerente inscreveu a verba de €5.084.036, 47.
    13. Na sequência de inspeção tributaria foi pela AT comunicada a ora Requerente a falta de liquidação e pagamento de imposto de IRC relativo ao exercício de 2008.
    14. Feitas as correções respetivas (foram corrigidos os impostos declarando-se em falta EUR 3.926,05), bem como as demonstrações de acerto de contas, liquidação de juros e demonstração de liquidação, resultou a final um valor de IRC a suportar pela Requerente de EUR 11.740,35.
    15. Na verdade, a liquidação do imposto teve por base um preenchimento equivocado da parte da Requerente do modelo 22, campo 7. n.º 213.
    16. O equivoco esteve em ter a Requerente assinalado como «custos não dedutíveis» as verbas pagas aos clientes a titulo de indemnização, para efeitos do art.42°/1, al. e, do CIRC, quando tal entendimento e contrario a lei e a sua correta interpretação.
    17. No entanto a Requerente pagou os impostos indevidamente liquidados.
    18. Uma vez que o pagamento do imposto não significa qualquer aceitação do ato, porque estamos perante o direito indisponível a impugnação.
    19. Alega a Requerente que a questão em apreciação consiste em Saber se o montante da indemnização a cargo da requerente a favor dos mutuários, pode ser considerada coma decorrente de evento cujo «risco não é segurável» I para efeito de enquadramento coma «gastos dedutíveis» no art. 420.º n.º 1, al. e, do CIRC, conjugado com o art. 23°/1, al. j, do CIRC, nas versões em vigor à data dos factos.
    20. A concluir, não existe nenhuma norma que obrigue a contratar um seguro na totalidade. No caso a parte segurável e a obrigatória: «o que resultar da média das avaliações efetuadas no ano anterior». Isso foi respeitado.
    21. Defende a Requerente, que os valores pagos pela Requerente aos mutuários lesados a título de "reposição" dos objetos roubados por eles dados em penhor são "custos/gastos" quer na nomenclatura do POC e SNC. E esses custos devem ser aceites fiscalmente.

 

D- DA RESPOSTA DA REQUERIDA

  1. A Requerida, devidamente notificada para o efeito, apresentou tempestivamente a sua resposta na qual, em síntese abreviada, alegou o seguinte:
    1. As liquidações de IRC e de juros compensatórios em causa na presente ação arbitral resultam das conclusões alcançadas no procedimento interno de inspeção tributária, credenciado pela Ordem de Serviço nº OI2011…, dos Serviços de Inspeção Tributária da Direção de Finanças do Porto, cujo relatório se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais, no âmbito da qual foram efetuadas correções técnicas à Declaração Periódica de Rendimentos de IRC (MODELO 22) submetida pela Requerente, para o período fiscal de 2008.
    2. A atividade desenvolvida pela requerente consiste essencialmente na concessão de empréstimos garantidos por penhor, no caso, artigos em ouro, prata e relógios. Como consequência da atividade principal de prestamista, dedica-se à venda de ouro em segunda mão adjudicado em 'leilão' promovido pelo próprio, quando os mutuários não resgatam os artigos e deixam de pagar os juros.
    3. A Requerente sendo uma sociedade que exerce a atividade de prestamista, dispõe de um regime jurídico específico - Decreto-Lei n° 365/99, de 17 de Setembro, que regula o acesso, o exercício e a fiscalização da atividade prestamista.
    4. É tributada em IRC pelo respetivo lucro nos termos dos artigos 2.° n° 1 alínea a) e 3.° n°1 alínea a) do Código do IRC. Nos termos do n.° 2 do artigo 3.° do CIRC, o lucro corresponde à diferença entre os valores do património líquido no fim e no início do período de tributação, com as correções estabelecidas no CIRC.
    5. A atividade da Requerente é particularmente regulada pelo Decreto-Lei n.° 365/99, de 17 de Setembro que, relativamente a seguros, dispõe de um capítulo exclusivo (Capitulo IV — Dos seguros) respeitante à obrigação específica do prestamista indemnizar os mutuários em "caso de perda, extravio, furto, roubo ou incêndio das coisas dadas em penhor".
    6. Esta responsabilidade é, obrigatoriamente, transferida para uma seguradora conforme o disposto pelo n.° 1 do art.° 33.° do referido diploma, mediante a celebração de contratos de seguro obrigatórios.
    7. Tal como a Requerente refere decorre do referido Regime Jurídico da Atividade de Prestamista (RJAP) que o valor seguro "é no mínimo o que resultar da média das avaliações efetuadas no ano anterior" (n.° 2 do art.° 33.° do RJAP).
    8. E ainda, as condições gerais uniformes deste seguro obrigatório de responsabilidade civil do prestamista, aprovadas pelo Instituto de Seguros de Portugal, previstas na Norma Regulamentar n.° 005/2000 de 24/05, são de aplicação obrigatória pelas seguradoras e prevêem este valor mínimo.
    9. Assim, nos termos do n.°1 do art.° 11.° da Apólice Uniforme do Seguro Obrigatório de Responsabilidade Civil do Prestamista, a responsabilidade da seguradora "é, no mínimo, seja qual for o número de lesados por um sinistro, igual ao valor que resultar da média das avaliações efetuadas no ano anterior."
    10. No entanto, e tal como a requerente reconhece, este é o valor mínimo seguro sendo sempre possível aumentar este valor ajustando-o ao risco incorrido e atendendo às responsabilidades assumidas pelo prestamista.
    11. Ou seja, contrariamente ao defendido quer pela requerente quer no parecer que refere, não existem dúvidas quanto ao facto de estarmos perante "eventos cujo risco seja segurável” dependendo da requerente a atualização do valor seguro junto da empresa de seguros e consequentemente, contabilizar como custo, aceite fiscalmente, os respetivos prémios de seguro.
    12. Tal como a requerente reconhece, era do seu conhecimento, a ocorrência em 2008 de um incremento notável do valor das coisas dadas em penhor pelos mutuários quando comparado com o valor que estava seguro.
    13. Tendo o valor total a indemnizar aos mutuários, da responsabilidade da requerente, expurgando o valor da fiança que foi considerada como custo fiscal, ascendido ao montante de €5.084.036,47, valor que corresponde a 24% e 31% do ativo líquido da requerente a 31 de dezembro de 2008 e 31 de dezembro de 2007.
    14. Ou seja, um quarto do seu balanço não estava coberto por seguro.
    15. Este custo relativo a indemnizações a cargo da requerente resultante de eventos cujo risco era segurável além de não cumprir com os requisitos que o art.° 23.° do CIRC - porquanto tal custo não foi indispensável para a realização dos rendimentos sujeitos a imposto ou sequer para a manutenção da fonte produtora, pois a atividade da requerente manteve-se nos mesmo moldes, - à luz da letra e do espírito da lei nomeadamente do disposto pela alínea e) do n° 1 do art.° 42° do CIRC, os encargos mesmo quando contabilizados como custos ou perdas do exercício relativas a indemnizações pela verificação de eventos cujo risco seja segurável não são dedutíveis para efeito de determinação do lucro tributável.
    16. E este risco era segurável bastando para tanto que, face ao incremento ocorrido no volume de negócios e consequentemente do valor das coisas dadas em penhor pelos mutuários, a requerente tivesse procedido à atualização da apólice de seguros nomeadamente do valor a segurar junto da seguradora.
    17. Afigura-se, estar suficientemente demonstrada a possibilidade, inclusivamente decorrente de exigência legal (artigos 32.° e 33.° do Regime Jurídico da Atividade de Prestamista) de segurar o risco de furto das coisas dadas em penhor pelos mutuários pelo que o montante das indemnizações a cargo da requerente na qualidade de prestamista por falta de seguro relativamente a uma parte substancial desses bens não é dedutível para efeitos de determinação do lucro tributável nos termos da al. e) do n° 1 do art.° 42° do. CIRC.
    18. No entanto, e tal como a requerente também reconhece, este é o valor mínimo seguro sendo sempre possível aumentar este valor ajustando-o ao risco incorrido e atendendo às responsabilidades assumidas pelo prestamista.
    19. Em suma, contrariamente ao defendido pela Requerente e no parecer que menciona, não existem dúvidas quanto ao facto de estarmos perante "eventos cujo risco seja segurável” dependendo da requerente a atualização do valor seguro junto da empresa de seguros e consequentemente, contabilizar como custo, aceite fiscalmente, os respetivos prémios de seguro.
    20. Face ao exposto, o ato de liquidação adicional, em crise nestes autos, não enferma de qualquer vício que ponha em causa a sua legalidade e validade.

 

E-    FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

  1. Previamente a entrar na apreciação da questão submetida a pronuncia, cumpre apresentar a matéria factual relevante para a respetiva compreensão e decisão, baseada na prova documental e nos factos alegados.
  2. Assim, de acordo com o princípio da livre apreciação da prova, atendendo à prova efetuada por documentos e por não ter sido suscitado pelas partes a elisão da autenticidade ou da força probatória dos documentos juntos, o presente Tribunal, dá os documentos juntos, como verdadeiros, idóneos, e autênticos de acordo com o artigo 75.º n.º 1 da LGT.
  3. Em matéria de facto relevante, dá o presente Tribunal, por assente, os seguintes factos:
    1. A Requerente, desenvolve a atividade de prestamista, regulada pelo Decreto-Lei n.º 365/99, de 17 de setembro.
    2. Os mutuários e lesados, são por lei obrigatoriamente indemnizados em caso de furto, sendo que o valor das indemnizações é calculado nos termos do artigo 32.º n.º 2 do Decreto-Lei n.º 365/99 de 17 de Setembro, e corresponde valor da avaliação do objeto, deduzida do valor em dívida à data da ocorrência e acrescida de metade do valor da avaliação.
    3. No ano de 2008, Requerente foi vítima de dois furtos, em 14/4/2008 (na sede) e em 29/12/2008.
    4. Como consequência desses dois furtos, resultou valor total de indemnizações a pagar aos mutuários, relativamente aos furtos ocorridos em 2008 de €19.273.585,43.
    5. O valor coberto pelo seguro obrigatório era de € 14.132.588,05.
    6. A Requerente assumiu parte do valor seguro a título de franquia, no total de €1.623.217,52.
    7. A seguradora pagou a indemnização diretamente aos lesados no valor de € 12.509.370,53€.
    8. A Requerente pagou a diferença em falta, de € 5.141.001,38 acrescido da franquia, o que resultou num encargo para a requerente de € 6.764.218,9.
    9. O valor da franquia foi declarado como um encargo fiscalmente aceite.
    10. Na declaração modelo 22 do ano de 2008, no campo 7, n° 213, relativa ao exercício de 2008, a Requerente inscreveu a verba de €5.084.036,47, a título de indemnizações por eventos seguráveis como um encargo não dedutível.
    11. Da declaração modelo 22 entregue pela Requerente, resultou a liquidação n.º 2012…, no valor de 11.740,35 € (onze mil setecentos e quarenta euros e trinta e cinco cêntimos).
    12. A Requerente apresentou o pedido de revisão oficiosa n.º …2016…, sobre o ato de liquidação n.º 2012… .
    13. A Requerente foi pelo ofício no 2017…, de 2017-04-17, notificada da decisão de 2017-03-231, da Subdiretora Geral (por subdelegação) da Direção de Serviços do Imposto Sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas, de indeferimento de pedido de revisão oficiosa referente a autoliquidação de IRC do exercício de 2008.

F-        FACTOS NÃO PROVADOS

  1. Dos factos com interesse para a decisão da causa, constantes da impugnação, todos objeto de análise concreta, não se provaram os que não constam da factualidade supra descrita.

 

G-       QUESTÕES DECIDENDAS

  1. Atenta as posições assumidas pelas partes nos argumentos apresentados, constituem questões centrais dirimendas as seguintes, as quais cumpre, pois, apreciar e decidir:
    1. A alegada pelo Requerente:
  1. Declaração de ilegalidade ato tributário de liquidação adicional em sede de Imposto Sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas n.º 2012…, no valor de 11.740,35 € (onze mil setecentos e quarenta euros e trinta e cinco cêntimos).
  2. Condenação no pagamento de juros indemnizatórios.

H -Matéria de Direito

  1. Atendendo às posições assumidas pelas partes nos articulados e alegações apresentados, o pedido de pronúncia arbitral a dirimir pelo presente Tribunal Arbitral consiste em apreciar a legalidade do ato liquidação adicional em sede de Imposto Sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas n.º 2012… .
  2. A pretensão da Requerente, em síntese, subsume-se à não consideração e dedutibilidade fiscal de gastos/encargos dos valores pagos a título de complemento do valor em falta nas indemnizações legalmente devidas a clientes por furto de bens com penhor, no âmbito da sua atividade de prestamista.
  3. A Requerida, sinteticamente, contra-argumenta, invocando no âmbito da atividade de prestamista desenvolvida pela Requerente, os bens com penhor, tem de ser assegurados pela totalidade do seu valor, e que a responsabilidade do seguro é por lei transferida por uma companhia de seguros. E sendo os bens assegurados por uma companhia de seguros na sua totalidade, no caso de indemnização por furto, qualquer indemnização paga pela Requerente para compensar o valor da indemnização em falta, não é um custo fiscalmente dedutível, pois esse custo/indemnização insere-se no âmbito do artigo 42. n.º 1 al) e) uma vez que o risco é por lei obrigatoriamente segurável na sua totalidade.
  4. Face às posição das partes, elabora-se o seguinte resumo dos fatos mais relevantes:
    1. A requerente solicitou a revisão oficiosa dos atos tributários de autoliquidação de IRC relativo ao período de tributação de 2008, decorrente da indevida desconsideração como custo fiscal do montante de €5.084.036,47, encargos que substanciam indemnizações pagas em virtude de furtos de bens com penhor na sua posse, e requereu a restituição do imposto pago em excesso e o reconhecimento do direito a juros indemnizatórios.
    2. A requerente foi vítima de dois furtos, em 14/4/2008 e em 29/12/2008, em duas instalações distintas.
    3. Os mutuários e lesados, são por lei obrigatoriamente indemnizados em caso de furto, sendo que o valor das indemnizações é calculado nos termos do artigo 32.º n.º 2 do Decreto-Lei n.º 365/99 de 17 de Setembro, e corresponde valor da avaliação do objeto, deduzida do valor em dívida à data da ocorrência e acrescida de metade do valor da avaliação.
    4. O valor total das indemnizações a pagar aos mutuários, relativamente aos furtos ocorridos em 2008 ascendeu a €19.273.58543.
    5. O valor coberto pelo seguro é de € 14.132.588,05.
    6. A Requerente pagou uma franquia de € 1.623.217,52.
    7. A seguradora pagou a indemnização no valor de 14.132.588,05 €, aos mutuários e lesados, dos quais 12.509.370,53€ correspondem ao valor efetivamente pago pela seguradora e o remanescente 1.623.217,52€ corresponde a Franquia.
    8. A requerente pagou aos mutuários e lesados, a título de indemnização, o valor de €5.084.036,47, que corresponde a diferença do valor total das indemnizações, €19.273.58543 deduzido do valor coberto pelo seguro (que inclui a franquia) € 14.132.588,05, perfazendo os €5.084.036,47.
    9. O valor da franquia é aceite pelas partes como fiscalmente dedutível.
  5. Perante o exposto cabe ao presente tribunal analisar, com base na matéria de direito e de fato, se o montantes pagos pela Requerente a titulo de complemento da indemnização legalmente devida a favor dos mutuários, por a Requerente não possuir a data dos furtos um seguro pelo valor total da indemnização legalmente devida, deve ser este custo fiscalmente aceite e dedutível nos termos do art.° 23° n.º 1 al. j), do CIRC, por se considerar um risco não segurável, ou o custo decorre da verificação de evento cujo risco seja segurável sendo este encargo não dedutível para efeitos fiscais, nos termos do art.° 42.° n.° 1 al. e) do CIRC
  6.  Nestes termos, debruçarmos sobre as seguintes questões, na seguinte ordem,

a)       Análise do regime jurídico, doutrina e jurisprudência de indemnização como encargo fiscalmente dedutível ou não dedutível.

b)       Analise conceito de risco segurável ou não segurável, a luz do art.° 23° n.º 1 al. j), e do CIRC artigo 42. n.º1 al) e) do CIRC, em vigor no ano de 2008.

c)       A responsabilidade de assegurar e transferir o risco de indemnização, no âmbito da atividade exercida da Requerente e a relação contratual com o Mutuários e Seguradora;

d)       Interpretação e aplicação do artigo 42. n.º1 al) e) CIRC a luz da atividade desenvolvida pela Requerente;

  1. Perante o exposto, e entrando na fundamentação de direito da presente decisão arbitral, compete em primeiro lugar efetuar uma prévia análise do regime jurídico, doutrina e jurisprudência de indemnização por virtude de furtos como gastos.

Diz-nos o artigo 23.º do CIRC (versão 2008), que “Consideram-se custos ou perdas os que comprovadamente forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora, nomeadamente os seguintes: (…) .

  1. Conforme se irá demonstrar, para análise da necessidade e dedutibilidade dos  custos invocados pela Requerente, é primeiro necessário julgar se as operações elencadas respeitam os preceitos legais que a tributação do rendimento societário deve obedecer.
  2. A conjugação da moldura jurídico-fiscal supra referida, e em resultado da própria letra da lei, e em harmonia com princípio da praticabilidade (os custos têm de estar devidamente documentados) surgem dois requisitos necessários para que os gastos das empresas sejam dedutíveis do ponto de vista fiscal.
  3. Requisitos esses:

a) que sejam comprovados com documentos emitidos nos termos legais;

b)e que sejam indispensáveis para a realização dos proveitos.

  1. Relativamente às indemnizações por motivo de furtos, a jurisprudência já se pronunciou a este respeito, entendendo que constituem gastos fiscalmente dedutíveis, desde que o risco não seja obrigatoriamente por lei segurável.
  2. Relevamos o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, processo 01138/06 de 06/20/2006, o qual citamos o seu sumario “IX).- As indemnizações a terceiros por danos cujo risco seja segurável, como acontece no caso concreto, não são dedutiveis como decorre da al. e) do nº 1 do artº 41º do CIRC em vigor ao tempo dos factos, e, para o caso de a contribuinte decidir não participar junto da entidade seguradora a ocorrência dos sinistros porque os montantes das indemnizações se situam abaixo da franquia, para evitar o agravamento dos prémios dos respectivos contratos de seguros, para os valores que haja pago a esse título serem aceites como custos fiscais do exercício que estiver envolvido, implica a constituição de provisão.
    X).- A atender a tese da recorrente, teríamos a subversão do sistema que obriga a segurar os riscos quando é certo que só os custos efectivos podem ser considerados como tal e não os que só sejam meramente hipotéticos. A recorrente participaria os sinistros e pagaria as indemnizações cujo valor se contivesse na franquia mas ficava sub-rogada e com direito de regresso contra o autor do dano, tornando-se assim o valor deste um custo meramente potencial.”.
  3. E neste mesmo sentido decidiu o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, processo 00400/97 de, decidiu no seguinte sentido “Decorre do estipulado que é consagrado um critério definidor face ao qual se considerarão como custos ou perdas aqueles que devidamente comprovados, sejam indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto e para a manutenção da respectiva fonte produtora. Após a fixação desse critério, enuncia o preceito, a título exemplificativo, volta-se a dizê-lo, os custos ou perdas de maior projecção.

A situação controvertida cabe na previsão do exemplo previsto na alínea j) do mencionado artigo 23º segundo o qual, quando indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora, se consideram custos ou perdas as indemnizações resultantes de eventos cujo risco não seja segurável.

Face ao circunstancialismo individualizado do presente caso, concordamos com a asserção da recorrente quando afirma que demonstrou que o furto em causa imprevisto, acidental, com consequências para a exploração da empresa, para ela constitui um verdadeiro "sinistro económico", devendo aceitar-se como perda o respectivo valor.

Nesse sentido aponta, de resto com racionalidade, o parecer da DGCI constante de fls. 68 e segs. no que tange a furto ou desvio cometidos por pessoas estranhas às empresas, ao doutrinar que, muito embora não se possa inserir de um modo geral no quadro normal da atividade exercida por uma empresa, pode aquele ser aceite desde que tenha sido apresentada participação policial e sejam apresentadas justificações suficientes à ADMINISTRAÇÃO FISCAL. (…) Ora e como salienta a recorrida nas suas contra-alegações, resultou clara e incontornavelmente demonstrado que o evento «in casu» não era segurável, pelo que cai pela base a argumentação da recorrente FAZENDA PÚBLICA que, assim, só logra vencimento na questão do valor do furto que se fixou em 609 157$60, nenhuma outra censura nos merecendo a sentença recorrida que deve no mais ser confirmada.”

  1. O referido acórdão, é claro, as indemnizações a titulo de furto são aceites como custo desde que os de eventos cujo risco não seja segurável, tendo ficado demonstrado no processo que o evento não era segurável.
  2. Assim, entendo que as indemnizações por eventos de furto devem ser fiscalmente aceites, cabe ao presente tribunal determinar se as indemnizações pagas pela Requerente se preenchem o requisito essencial, de resultarem de um evento cujo risco não seja segurável.
  3. Perante o exposto, compete realizar uma interpretação do conceito de risco segurável ou não segurável, previsto no art.° 23° n.º 1 al. j), e do artigo 42. n.º1 al) e) ambos do CIRC, a luz da legislação, jurisprudência e doutrina.
  4. Diz-nos o art.° 23° n.º 1 al. j) “

1 - Consideram-se custos ou perdas os que comprovadamente forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora, nomeadamente os seguintes: (…)

j) Indemnizações resultantes de eventos cujo risco não seja segurável.

  1. Este artigo é complementado pelo artigo 42. n.º1 al) e):

1 - Não são dedutíveis para efeito de determinação do lucro tributável os seguintes encargos, mesmo quando contabilizados como custos ou perdas do exercício: (…)

e) As indemnizações pela verificação de eventos cujo risco seja segurável;

  1. A conjugação de ambos os artigos, pode parecer a primeira vista redundantes, contudo a sua interpretação e análise em conjunto, não deixa qualquer duvida, as indemnização por eventos cujo o risco é segurável não é dedutível.
  2. Se não vejamos, que é essa a intenção do legislador, se fizermos uma interpretação a contrario sensu do art.° 23° n.º 1 al. j) “j) Indemnizações resultantes de eventos cujo risco não seja segurável.”, resulta que as indemnizações por risco segurável não seriam numa primeira analise considerados custos, pois se assim não o fosse, o legislador não faria uma clara alusão ao risco não segurável, sendo apenas necessário referir indeminizações por risco.
  3. A conjugação de ambas as alienas dos artigos supra transcritos, é evidentemente que as indemnizações por riscos seguráveis não é um encargo fiscalmente dedutível.
  4. Face as evidencias, existe uma clara distinção entre os riscos seguráveis e não seguráveis, cabe assim ao presente tribunal analisar a distinção entre ambas e a responsabilidade de assegurar o risco, no âmbito da atividade exercida da Requerente e a relação contratual com o Mutuários e Seguradora.
  5. Sobre a atividade prestamista desenvolvida pela Requerente, e em especial as obrigações legais impostas no âmbito dessa sua atividade, quanto risco segurável, resulta a seguinte análise e inferências:
  6. A atividade prestamista vem regulada no Decreto-Lei n.º 365/99 de 17 de Setembro, a qual estabelece no seu artigo 1. n. 2 Considera-se atividade prestamista o exercício por pessoa singular ou colectiva da atividade de mútuo garantido por penhor.”.
  7. Por outras palavras, a atividade prestamista, consiste em receber um determinado bem, como garantia do contrato de mútuo, o qual fica na posse do prestamista, ao qual é atribuído um valor e é realizado um contrato de mútuo por esse valor.
  8. Cabe assim a Requerente, o dever de guardar o bem/garantia e entrega-lo findo contrato nas mesmas condições que o recebeu.
  9. No âmbito dos artigos 32.º e 33º, relativamente as obrigações relativas a indemnizações ao mutuário e as relações com os seguros, o Decreto-lei impõem o seguinte:

Artigo 32.º

Obrigação específica de indemnizar

1 - Em caso de perda, extravio, furto, roubo ou incêndio das coisas dadas em penhor, fica o prestamista obrigado a indemnizar o mutuário.

2 - A indemnização referida no número anterior é a que resultar do valor da avaliação do objecto, deduzida do valor em dívida à data da ocorrência e acrescida de metade do valor da avaliação.

 Artigo 33.º

Seguro obrigatório

1 - A responsabilidade de indemnizar prevista no artigo anterior é obrigatoriamente transferida para uma companhia seguradora.

2 - O valor do seguro a que se refere o número anterior é no mínimo o que resultar da média das avaliações efetuadas no ano anterior.

3 - O valor a que se refere o número anterior durante o 1.º ano de atividade é fixado por indicação do prestamista.

4 - Anualmente deve ser feita prova da renovação do seguro e do pagamento do respectivo prémio junto da Direcção-Geral do Comércio e da Concorrência.

5 - A entidade seguradora comunica à Direcção-Geral do Comércio e da Concorrência a rescisão do contrato de seguro.”(nosso negrito)

  1. Conforme se pode verificar, dos artigos supra transcritos, resulta evidente o seguinte:
    1. O prestamista tem a obrigação de indemnizar, em caso de furto, e essa obrigação é transferida na totalidade para uma companhia seguradora.
    2. A seguradora tem a responsabilidade de indemnizar, em caso de perda, extravio, furto, roubo ou incêndio das coisas;
    3. A indeminização, corresponde ao valor da avaliação acrescido de metade do valor da avaliação, ao qual se deduz o valor em dividida.
    4. A lei impõe apenas o valor mínimo segurável, cabendo ao prestamista, a decisão de aumentar esse valor face ao volume de negócio espectável.
    5. Assim cabe ao prestamista, definir o valor do seguro para o ano de 2008, de acordo com os seus critérios de gestão.
  2. Perante ao exposto, a legislação em vigor impõem como requisito obrigatório para o exercício da atividade de prestamista, que o prestamista é obrigado a transferir a responsabilidade de indemnizar para uma companhia seguradora, as indemnizações por risco de perda, extravio, furto, roubo ou incêndio das coisas dadas em penhor.
  3. Alias, a própria lei, não contempla o pagamento de qualquer indeminização a título de caso de perda, extravio, furto, roubo ou incêndio das coisas dadas em penhor seja feita pelo prestamista.
  4. Alcançando que existe uma clara distinção fiscal do que é risco segurável e não segurável, compete agora efetuar um enquadramento jurídico-fiscal da interpretação a conferir ao risco e risco segurável no âmbito da atividade desenvolvida pela Requerente.
  5. Analise, que é suportada pelo Regulamento n.° 12/2000 (Norma n.° 5/2000-R, do Instituto de Seguros de Portugal, alterado pelo Regulamento n.° 32/2000 — Norma n.° 11/2000-R, polo Regulamento n,° 3/200 — Norma n.° 1612000-R, e pelo Regulamento n.° 80/2005 — Norma n.° 1312005-R), que aprova a apólice uniforme de responsabilidade civil do prestamista.
  6.  A referida norma regulamentar, estabelece as condições gerais uniformes do seguro obrigatório de responsabilidade civil do prestamista, as quais são de aplicação obrigatória pelas seguradoras.
  7. Em especial releva-se o seguinte: artigo 3º “A  seguradora  garante  o  pagamento  das  indemnizações  que  legalmente  sejam exigíveis  ao  segurado,  pelos  danos  patrimoniais  resultantes  de  lesões materiais  que,  exclusivamente  no  exercício  da  sua  atividade  de prestamista,  sejam  causados  a  terceiros,  em  virtude  de  perda,  extravio, furto, roubo ou incêndio das coisas dada em penhor”.
  8. Assim, no âmbito da atividade da requerente entende-se por risco, todos os riscos no âmbito da responsabilidade civil contratual e extracontratual que possam surgir no âmbito da relação contratual regulada pelas leis civis.
  9. E entende-se que o risco segurável, aquele que por lei é obrigatório ser assegurado por um contrato de seguro com uma companhia de seguros validamente licenciada, respetivamente a “perda, extravio, furto, roubo ou incêndio das coisas dadas em penhor” (artigo 32.º n. 1 Decreto-Lei n.º 365/99 de 17 de Setembro).
  10. Contudo, e como resulta de todas as atividades comerciais, existe um certo grau de incerteza quanto ao volume de negócios, os negócios são cíclicos e há épocas com maior volume e outras com menor. E no caso da atividade de prestamista resulta mais evidente esta incerteza, conforme se irá enumerar.
  11. Resulta do Artigo 14.º Os contratos de mutuo são realizados por um período regra de 1 mês, podendo ser automaticamente renováveis por períodos iguais e sucessivos, até ao máximo de dois anos. (Artigo 14.º n.º1). Mais nos diz o artigo 14, O contrato considera-se automaticamente renovado com o pagamento dos juros relativos ao mês anterior, bem como os moratórios, se a eles houver lugar. (Artigo 14.º n.º2).
  12. Pretende-se dizer, que de acordo com o artigo 14.º do referido Decreto-Lei, a cessação do contrato de mútuo mediante o pagamento, cabe ao mutuário, pelo que o mutuante e ora Requerente, terá de guardar o penhor por um período que pode ir de 1 mês a 2 anos.
  13. Sobre este período, ainda tem o prestamista de aguardar três meses de mora para poder proceder a sua venda. (artigo.º 19º e seguintes).
  14. Sendo que as renovações são feitas mensalmente, até a data limite de pagamento do juro, não é assim permitindo ao mutuante, com grande certeza determinar qual o valor dos penhores que vai ter na sua posse nesse mês ou nessa semana.
  15. Conforme elencado, a atividade prestamista, e a natureza obrigatória dos contratos de mutuo, é possível e obrigatório a Requerente, ter a totalidade dos valores na sua posse assegurados a todo o momento. Mesmo que tal implique custos elevados com os prémios de seguro junto das companhias de seguro.
  16. Mas é um risco e custo que advém da própria atividade de prestamista e da Legislação.
  17. Alias, os prestamistas incorrem num elevado grau de risco, ao deterem na sua posse bens enquanto decorre o contrato de mútuo, risco que é claro no presente caso, visto que a Requerente foi alvo, conforme alega, de três furtos no ano de 2008 e 2009.
  18. Assim, e perante a fundamentação supra descrita, a atividade de prestamista exige uma relação e segurança para o mutuário, a qual consiste na transferência da responsabilidade de indemnizar no caso de perda, extravio, furto, roubo ou incêndio das coisas para uma companhia de seguro. Como tal, o mutuário, quando deixa os seus bens com o penhor na posse do prestamista, tem a segurança que será ressarcido no caso de um evento extraordinário ocorrer.
  19. Alias, o motivo de a lei exigir um seguro, resulta do risco da própria atividade acarreta, da qual podem resultar em elevadas perdas que o prestamista pode não ter capacidade económica de suportar, resultando em última instancia na sua falência e numa perda por parte do mutuário.
  20. Assim, a situação em apreço resulta de uma decisão de gestão por parte da Requerente, em primeiro lugar, uma decisão no valor que assegurou, e em segundo lugar, na realização de contratos de mutuo, com valores que ultrapassavam o valor assegurado, criando um risco, que a lei visa evitar, de o contrato de seguro não indemnizar a totalidade das indemnização devidas âmbito dos artigos 32.º e 33º, e sendo o remanescente a pagar pelo prestamista, indemnizações que os artigos 32.º e 33º não preveem que sejam pagos pelo prestamista mas sim pela companhia seguradora.
  21. Contudo, colocar-se-ia a questão de se a Requerente poder a qualquer momento, aumentar o valor assegurado ou recusar a realização de contrato de mútuo. Em ambas a resposta é afirmativa.
  22. Conforme resulta do Regulamento n.° 12/2000, o mesmo prevê expressamente a possibilidade de realização de outro seguro sobre o valor não assegurados ou que ultrapassem o valor do seguro existente, artigo 15.º n.º 2 “Existindo, à data do  sinistro,  mais  de  um  contrato  de  seguro  garantindo o  mesmo  risco,  a presente apólice apenas funcionará em caso de inexistência, nulidade, ineficácia ou insuficiência de seguros anteriores. (nosso negrito)
  23. Entenda-se por insuficiência, o previsto no artigo 14.º - Insuficiência de Capital - “No  caso  de  coexistirem  vários  lesados  pelo  mesmo  sinistro  e  o  montante  dos danos  exceder  o  capital    seguro,    a    responsabilidade    da    seguradora    para    cada um    deles    reduzir-se-á proporcionalmente  em  relação  ao  montante  dos respectivos  danos  sofridos,  até  à  concorrência  desse capital”.
  24. Afastando-se assim, o argumento, de que não era possível a realização de outros seguros ou a respetiva atualização do seguro em vigor.
  25. Pois na situação em apreço, a Requerente, decidiu incorrer nesse risco, e conforme refere a Requerente, nos tês furtos que sofreu em 2008 e em 2009, em nenhumas das situações no período fiscal de 2008 tinha o valor total assegurado, pois pagou indemnizações diretamente aos mutuários que perderam os seus bens.
  26. Em ultimo lugar, e face a exposição de direito e de fato, cabe ao presente tribunal efetuar uma interpretação e aplicação do artigo 42º n.º1 al) e) CIRC (versão 2008) a luz da atividade desenvolvida pela Requerente, na qual se conclui que as indemnização de risco de perda, extravio, furto, roubo ou incêndio das coisas dadas em penhor, constituem por serem de seguro obrigatório, um risco segurável, pelo que não são fiscalmente dedutíveis por se incluírem no referido artigo.
  27. Efetivamente, a Requerente, alega, que liquidou o valor em falta das indemnizações, contudo, poderia não ter a capacidade económica para o fazer, e é exatamente esse tipo de situações que a Decreto-Lei n.º 365/99 de 17 de Setembro e o artigo 42º n.º1 al) e) do CIRC, visa salvaguardar, que o Prestamista, contratem seguros por valores inferiores ao legalmente estabelecido para reduzir nos seus custos, acarretando diferença quando as situações, como foi no caso em apreço, de um furto ocorrem.
  28. Alias, se o artigo 42º n.º1 al) e) e o próprio CIRC, permitissem que a dedução como custo de indeminização nas situações em que o seguro é obrigatório, estaria a favorecer a não celebração de seguros, e a aumentar o risco das atividades, pois em ultima instancia, os riscos que se visa proteger (perda, extravio, furto, roubo ou incêndio das coisas dadas em penhor) seriam transferidos para a esfera do mutuário sem o conhecimento deste, pois de acordo do Decreto-Lei n.º 365/99 de 17 de Setembro, o mutuário quando celebra um contrato de mutuo com um prestamista legalmente licenciado e autorizado (afixação obrigatória do alvará de licenciamento artigo 9.º Decreto-Lei n.º 365/99 de 17 de Setembro) esta a celebrar um contrato cujo o risco é totalmente assegurado por uma companhia seguradora.
  29. Em conclusão, por tudo o que vai exposto, no caso em análise, os encargos pagos pela Requerente a título de indemnização subsumem-se como encargos não dedutíveis nos termos do artigo 42. n.º1 al) e) do CIRC, em vigor no ano de 2008, por serem sobre um risco segurável por lei.
  30. E, improcede, deste modo, a pretensão da Requerente.

 

F- Decisão

Termos em que acorda o presente Tribunal em:

Julgar improcedentes o pedido de declaração de ilegalidade ato tributário de liquidação adicional em sede de Imposto Sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas n.º 2012…, no valor de 11.740,35 € (onze mil setecentos e quarenta euros e trinta e cinco cêntimos).

 

Fixa-se o valor do processo em 11.740,35 € atendendo ao valor económico do processo aferido pelo valor das liquidações de imposto impugnadas, e em conformidade fixa-se as custas, no respetivo montante em 918,00€ (novecentos e dezoito euros), a cargo da Requerente de acordo com o artigo 12.º, n.º 2 do Regime de Arbitragem Tributária, do artigo 4.ºdo RCPAT e da Tabela I anexa a este último. –  n.º 10 do art.º 35º, e n.º 1, 4 e 5 do art.º 43º da LGT, art.ºs 5.º, n.º1, al. a) do RCPT, 97.º-A, n.º 1, al. a) do CPPT e 559.º do CPC).

 

 

Notifique-se.

Lisboa, 1 de Fevereiro 2018

 

 

O Árbitro

Paulo Ferreira Alves