Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 130/2016-T
Data da decisão: 2016-10-17  Selo  
Valor do pedido: € 10.904,60
Tema: IS - Verba 28.1 da Tabela Geral de Imposto de Selo; Lote de terreno para construção.
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Decisão Arbitral

 

 

I – Relatório

 

1. No dia 4.03.2016, A…, SA, contribuinte número …, com sede na rua …, lote …, …, requereu ao CAAD a constituição de tribunal arbitral, nos termos do art. 10º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, doravante apenas designado por “RJAT”), em que é Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira, com vista à anulação  de duas  liquidações de Imposto de Selo  emitidas em 18.11.2012, relativas ao ano de 2012, respeitantes aos prédios urbanos inscritos na matriz da freguesia de … (…), concelho de ..., sob os artigos … e …, no valor de € 5.778,19 e € 5.126,41, respetivamente.

 

 

2. O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Exmo. Senhor Presidente do CAAD e notificado à Autoridade Tributária e Aduaneira.

Nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 1, do art. 6.º, do RJAT, por decisão do Senhor Presidente do Conselho Deontológico, devidamente comunicada às partes, nos prazos legalmente aplicáveis, foi designado árbitro o signatário, que comunicou ao Conselho Deontológico e ao Centro de Arbitragem Administrativa a aceitação do encargo no prazo regularmente aplicável.

O Tribunal Arbitral foi constituído em 30-05-2016.

 

3. Verificando-se a inexistência de qualquer situação prevista no art. 18º, nº 1, do RJAT, que tornasse necessária a reunião arbitral aí prevista, foi dispensada a realização da mesma, com fundamento na proibição da prática de atos inúteis.

Foi ainda dispensada a realização de alegações, nos termos do art. 18º, nº 2, do RJAT, “a contrario”.

 

4. Os fundamentos apresentados pela Requerente, em apoio da sua pretensão, foram, sinteticamente, os seguintes:

a.       foram notificados à Requerente os documentos de cobrança nº 2012 … e 2012 …, relativo a imposto de selo, verba 28 da TGIS, relativo ao ano de 2012.

b.      A Requerente não foi notificada pela AT, quer das liquidações, com os respetivos fundamentos de facto e de direito, quer, previamente, para se pronunciar sobre as mesmas em sede de direito de audição, sendo que as liquidações deveriam ter sido notificadas aos contribuintes, nos termos do disposto no nº 7, do art. 23º, do CIS, o qual remete para o CIMI na parte da liquidação (ou seja art. 113º a 118º).

c.       Os lotes de terreno em causa não são terrenos afetos à habitação, pois a afetação pressupões uma abordagem funcional e um terreno para construção não é em si mesmo um prédio habitável, pelo que, são ilegais as liquidações de imposto de selo em causa por falta de subsunção à verba 28 da tabela do CIS.

d.      O imposto de selo criado pela Lei 55-A/2012, inserido na verba 28 da Tabela Geral de Imposto de Selo vem tributar o mesmo facto tributado em sede de imposto municipal sobre imóveis, o que viola o princípio da proibição da dupla tributação e torna as liquidações ilegais.

e.       Suscita-se mesmo a inconstitucionalidade da tributação, por dirigir-se apenas aos imóveis para fins habitacionais, deixando-se incólumes os proprietários de imóveis destinados a outros fins, ferindo-se o principio da igualdade fiscal.

 

5. A ATA – Administração Tributária e Aduaneira, chamada a pronunciar-se, contestou a pretensão da Requerente, defendendo-se por impugnação, em síntese, com os fundamentos seguintes:

 

POR EXCEPÇÃO

 

  1. A competência do foro jurisdicional arbitral não compreende a apreciação da conformidade constitucional de atos legislativos ou das suas normas, ex vi artigo 2.º, n.º 1 do RJAT.
  2. Pelo que o Tribunal Arbitral é incompetente em razão da matéria para apreciar o pedido de declaração da inconstitucionalidade material, «da verba 28 da Tabela Geral do Imposto do Selo, por violação do princípio da capacidade contributiva, enquanto vertente do princípio da igualdade, previsto no artigo 13.º e 104.º n.º 3 da CRP.
  3. A incompetência absoluta em razão da matéria configura uma exceção dilatória que obsta ao prosseguimento do processo, conducente à absolvição da instância quanto ao pedido respetivo, de acordo com o previsto nos artigos 576.º, n.º 2, 577.º, alínea a) e 278.º, n.º 1, alínea a) do CPC, aplicáveis ex vi artigo 29.º, alínea e) do RJAT.

 

POR IMPUGNAÇÃO,

 

  1. É entendimento da AT que os prédios sobre os quais recai cada uma das liquidações impugnadas, têm natureza jurídica de prédio com afetação habitacional, pelo que os atos de liquidação objeto do presente pedido de pronúncia arbitral devem ser mantidos, por consubstanciarem correta interpretação da Verba 28 da Tabela Geral, aditada pela Lei 55-A/2012, de 29/12.
  2. Na ausência de qualquer definição sobre os conceitos de prédio urbano, terreno para construção e afetação habitacional, em sede de IS, há que recorrer ao CIMI, na procura de uma definição que permita aferir da eventual sujeição a IS, de acordo com o previsto no art. 67.º, n.º 2, do CIS, na redação dada pela Lei n.º 55-A/2012, de 29/10.
  3. A afetação do imóvel (aptidão ou finalidade) é um coeficiente que concorre para a avaliação do imóvel, na determinação do valor patrimonial tributário, aplicável aos terrenos para construção.
  4. A própria verba 28 TGIS remete para a expressão “prédios com afectação habitacional”, apelando a uma classificação que se sobrepõe às espécies previstas no n.º 1 do art. 6.º do CIMI.
  5. Note-se que o legislador não refere “prédios destinados a habitação”, tendo optado pela noção “afectação habitacional” - expressão diferente e mais ampla cujo sentido há-de ser encontrado na necessidade de integrar outras realidades para além das identificadas no art. 6.º, n.º1 alínea a) do CIMI.
  6. O que é tributado em sede de IS é a especial capacidade contributiva que é revelada pelos detentores destes prédios, o que se justifica constitucionalmente nos termos do art.º 103.º n.º 1 da CRP, face aos superiores interesses subjacente à existência de um Estado de direito democrático.
  7. Não existindo qualquer contradição material na estruturação dos tributos, porque incidem sobre realidades jurídicas distintas.
  8. Pelo que, falecem os argumentos da Requerente no sentido de que se “verifica uma situação de dupla tributação jurídica”.
  9. Estando constitucionalmente justificada a opção legislativa de tributar em IS os titulares de imóveis com afetação habitacional de valor superior a € 1.000.000,00, nos termos supra expostos, também não colhem os argumentos da Requerente, no que respeita à violação do princípio da neutralidade fiscal, que sempre se justificaria face aos superiores interesses do sistema fiscal, pois num contexto de crise económica não pode proteger-se igualmente os que revelam uma capacidade contributiva acima de um determinado limite.
  10. A tributação da Requerente foi assim efetuada, sem que qualquer ilegalidade tenha sido cometida nas liquidações, ora impugnadas.

 

6.  Por despacho de 13.09.2016 foi decidido julgar improcedente a suscitada exceção de incompetência do tribunal arbitral.

 

7. Cumpre solucionar as seguintes questões:

a) Ilegalidade das liquidações impugnadas, por vício de violação de lei por erro nos pressupostos de direito.

b) Ilegalidade das liquidações impugnadas, por violação do direito de audição da Requerente antes da liquidação, consignado no arts. 267º, nº 5, da Constituição da Republica Portuguesa e no 60º da Lei Geral Tributária.

 

8. O tribunal é materialmente competente e encontra-se regularmente constituído nos termos do RJAT. As partes têm personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão legalmente representadas.

O processo não padece de vícios que o invalidem.

 

II – A matéria de facto relevante

 

9. Com relevância para a decisão da causa, consideram-se provados os seguintes factos:

 

1. A Requerida efetuou, em 18.11.2012, duas liquidações de Imposto de Selo, tendo como sujeito passivo a Requerente, ao abrigo da verba 28 da TGIS, relativas ao ano de 2012, respeitantes aos prédios urbanos inscritos na matriz da freguesia de … (…), concelho de ..., sob os artigos … e …, no valor de € 5.778,19 e € 5.126,41, respetivamente, tendo sido notificados à Requerente os documentos de cobrança números 2012 … e 2012 …, com prazo de pagamento até 20.12.2012.

 

2. Os imóveis identificados e sobre os quais incidiram as liquidações, consistem em terrenos destinados a construção urbana.

3.Não se conformando com a liquidação, em 18.04.2013 a Requerente apresentou reclamação graciosa contra as referidas liquidações, que foram objeto de despacho de indeferimento.

4. Em 12.07.2013, a Requerente apresentou recurso hierárquico da decisão que indeferiu a reclamação graciosa, tendo o mesmo sido também indeferido, decisão notificada à Requerente pelo ofício nº … de 7.12.2015.

 

Com interesse para a decisão da causa inexistem factos não provados.

 

10. A convicção do Tribunal quanto à decisão da matéria de facto alicerçou-se nos documentos constantes do processo, sendo de salientar ocorrer total concordância das partes relativamente à matéria de facto, cingindo-se o desacordo à matéria de direito.

 

-III- O Direito aplicável

 

11. Tendo a impugnante imputado mais do que um vício aos atos tributários impugnados há que determinar a ordem do conhecimento dos mesmos, devendo ser observada a ordem do art. 124º do CPPT, aplicável por força do art. 29º, nº 1, al. a) do RJAT (Cfr. Jorge Lopes de Sousa, Comentário ao Regime Jurídico da Arbitragem Tributária, in GUIA DA ARBITRAGEM TRIBUTÁRIA, Coord. Nuno Villa-Lobos e Mónica Brito Vieira, 2013, Almedina, pag. 202).

A procedência de qualquer dos vícios invocados pela requerente conduzirá à anulação do ato tributário. No entanto, o vício de violação de lei é aquele que conduzirá à “mais estável ou eficaz tutela dos interesses ofendidos” na medida em que a sua eventual procedência impedirá a renovação do ato, o que não sucede com a anulação decorrente do vício de preterição do direito de audição prévia.

Em conformidade, o Tribunal irá apreciar em primeiro lugar do vício de violação de lei.

 

 

 

12. Estabelecia a verba 28 da Tabela Geral do Imposto de Selo, na redação à data dos factos tributários, que ficava sujeita a imposto de selo a propriedade de prédios com afetação habitacional com VPT igual ou superior a 1.000.000 euros, nos seguintes termos:

 

28 – Propriedade, usufruto ou direito de superfície de prédios urbanos cujo valor patrimonial tributário constante da matriz, nos termos do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (CIMI), seja igual ou superior a 1 000 000 euros – sobre o valor patrimonial tributário utilizado para efeito de IMI:[1]

28.1 – Por prédio com afetação habitacional – 1%;

28.2 – Por prédio, quando os sujeitos passivos que não sejam pessoas singulares sejam residentes em país, território ou região sujeito a um regime fiscal claramente mais favorável, constante da lista aprovada por portaria do Ministro das Finanças – 7,5%”.

 

13. Já foi abundantemente sublinhado em diversas decisões arbitrais[2] (designadamente nos processos 42/2013-T, 48/2013-T, 49/2013-T, 51/2013-T, 53/2013-T, 144/2013-T e 202/2014-T) que o conceito de “prédio com afetação habitacional” (que não é objeto de qualquer definição específica no Código de Imposto de Selo) não é utilizado pelo CIMI[3], nem em qualquer outro diploma legislativo.

 

Todas estas decisões arbitrais, cuja doutrina se sufraga, vão, no essencial, no sentido de tal conceito exigir para o seu preenchimento, pelo menos, a possibilidade efetiva do prédio existente ser utilizado para habitação e, em todas elas, se entendeu que os terrenos para construção, mesmo que destinados à construção de edifícios habitacionais, não se subsumem no conceito de “prédio com afetação habitacional”, como resulta das seguintes passagens, das mencionadas decisões:

 

Processo 42/2013-T:

 

A expressão “afetação habitacional” não parece poder ter outro sentido que não o de “utilização” habitacional, ou seja, prédios urbanos que tenham uma efectiva utilização para fins habitacionais, seja porque para tal estão licenciados, seja porque têm esse destino normal.

E não podemos confundir uma “afectação habitacional” que implica uma efectiva afectação de um prédio urbano a esse fim, com a expectativa, ou potencialidade, de um prédio urbano poder vir a ter uma “afectação habitacional”.

 

Processo 49/2013-T:

 

A expressão «com afectação habitacional» inculca, numa simples leitura, uma ideia de funcionalidade real e presente. Da norma em causa não é possível extrair-se, por interpretação, que, como se afirma na resposta da requerida, a opção do legislador por aquela expressão tenha em vista integrar "outras realidades para além das identificadas no artigo 6.º, n.º 1, alínea a), do CIMI." Tal interpretação não tem apoio legal, face aos princípios contidos os arts. 9.º do Código Civil e 11.º da Lei Geral Tributária.

Com efeito, se o legislador pretendesse abarcar no âmbito de incidência do imposto outras realidades que não as que resultam da classificação regida pelo art. 6.º  do CIMI, tê-lo dito expressamente. Mas não o faz, antes remetendo, em bloco, para os conceitos e procedimentos previstos no referido Código

 

Processo 51/2013-T:

 

O ponto que importa decidir é este: há diferença entre a expressão que o CIMI utiliza de «prédio urbano habitacional» e a expressão usada pelo art. 4º da Lei nº 55-A/2012, ao aludir a «prédio com afetação habitacional»?

Estamos em crer que não, uma vez que prevalece, ainda que usando palavras um pouco diversas, o mesmo sentido fundamental de tributar a titularidade de prédios com um mesmo destino, a efetividade ou a possibilidade de o uso ser para efeitos de habitação humana, com todas as consequências que a legislação em geral e o CIMI em particular lhe dá.”

 

Processo 53/2013-T:

 

“ (…) deve presumir-se que o uso de uma expressão diferente tem em vista uma realidade distinta, pelo que, em boa hermenêutica, «prédio com afectação habitacional», não  poderá ser um prédio apenas licenciado para habitação ou destinado a esse fim (isto é, não bastará que seja um «prédio habitacional»), tendo de ser um prédio que tenha já efectiva  afectação a esse fim.”

 

Processo 144/2013-T:

 

“(..) julgamos que se impõe, na interpretação do disposto na verba 28.1 da TGIS, o entendimento segundo o qual a afectação habitacional de um prédio urbano sugere que se lhe dê esse efectivo destino, ou se lhe possa directamente dar esse destino.”

 

Proc. 202/2014-T

 

A expressão "com afectação habitacional" inculca, numa simples leitura, uma ideia de funcionalidade real e presente. Da norma em causa não é possível extrair-se, por interpretação, que, como se afirma na resposta da Requerida, a opção do legislador por aquela expressão tenha em vista integrar "outras realidades para além das identificadas no artigo 6.º, n.º 1, alínea a), do CIMI." Tal interpretação não tem apoio legal, face aos princípios contidos os artigos. 9.º do Código Civil e 11.º da Lei Geral Tributária.

 

14. Também no acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 09-04-2014, recurso nº 048/14[4] se considerou que:

O conceito de “prédio (urbano) com afectação habitacional” não foi definido pelo legislador. Nem na Lei n.º 55-A/2012, que o introduziu, nem no Código do IMI, para o qual o n.º 2 do artigo 67.º do Código do Imposto do Selo (igualmente introduzido por aquela Lei), remete a título subsidiário. E é um conceito que, provavelmente mercê da sua imprecisão – facto tanto mais grave quanto é em função dele que se recorta o âmbito de incidência objectiva da nova tributação -, teve vida curta, porquanto foi abandonado aquando da entrada em vigor da Lei do Orçamento do Estado para 2014 (Lei n.º 83-C/2013, de 31 de Dezembro), que deu nova redacção àquela verba n.º 28 da Tabela Geral, e que recorta agora o seu âmbito de incidência objectiva  através da utilização de conceitos que se encontram legalmente definidos no artigo 6.º do Código do IMI.
Esta alteração - a que o legislador não atribuiu carácter interpretativo, nem nos parece que o tenha –, apenas torna inequívoco para o futuro que os terrenos para construção cuja edificação, autorizada ou prevista, seja para habitação se encontram abrangidos no âmbito da verba 28.1 da Tabela Geral do Imposto do Selo (desde que o respectivo valor patrimonial tributário seja de valor igual ou superior a 1 milhão de euros), nada esclarecendo, porém, em relação às situações pretéritas (liquidações de  2012 e 2013), como a que está em causa nos presentes autos.
Ora, quanto a estas, não parece poder perfilhar-se interpretação da recorrente, porquanto, ao contrário do alegado, não resulta inequivocamente nem da letra, nem do espírito da lei que a intenção desta tenha sido, ab initio, a de abranger no seu âmbito de incidência objectiva os terrenos para construção para os quais tenha sido autorizada ou prevista a construção de edifícios habitacionais, como resulta hoje inequivocamente da verba 28.1 da Tabela Geral do Imposto do Selo.”

(…)

 “Conclui-se pois, com a recorrida e em conformidade com o decidido na sentença sob recurso que, resultando do artigo 6.º do Código do IMI uma clara distinção entre prédios urbanos “habitacionais” e “terrenos para construção”, não podem estes ser considerados, (…)  como “prédios com afectação habitacional” para efeitos do disposto na verba n.º 28.1 da Tabela Geral do Imposto do Selo, na sua redacção originária, que lhe foi conferida pela Lei n.º 55-A/2012, de 29 de Outubro.”

 

15. Este entendimento continuou a ser perfilhado pelo Supremo Tribunal Administrativo, de modo uniforme, nos demais processos em que foi chamado a pronunciar-se. Como se pode ler no acórdão proferido no processo 0707/14, de 10.09.2014[5]:

A questão foi já decidida por esta Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo no dia 9 de Abril 2014, nos processos n.ºs 1870/13 (Ainda não publicado no jornal oficial, disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/f6fd29ac6d6ebaf380257cc30030891a?OpenDocument.) e 48/14 (Ainda não publicado no jornal oficial, disponível emhttp://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/0e28073928824e5080257cc3003a0cbd?OpenDocument.), e, desde então, reiterada e uniformemente em numerosos acórdãos, podendo considerar-se firmada jurisprudência no sentido de que os terrenos para construção não podem ser considerados para efeitos de incidência do Imposto do Selo prevista na Verba 28.1 (na redacção da Lei n.º 55-A/2012, de 29  de  Outubro) como prédios urbanos com afectação habitacional.
Trata-se de jurisprudência que também aqui se acolhe, por com ela concordarmos plenamente e atento o disposto no n.º 3 do art. 8.º do Código Civil (CC)
(…).

 

16. Assim, ponto inequivocamente comum em todas estas decisões, e que acompanhamos, é o entendimento de que os terrenos para construção, mesmo que destinados à construção habitacional, não são prédios com afetação habitacional. Em consequência, consideramos que a aplicação da verba nº 28.1 da Tabela Geral do Imposto do Selo, na redação aditada pela Lei nº 55-A/2012, exige, pelo menos, a atualidade da afetação do prédio para habitação, não sendo suficiente a mera potencialidade de edificação para fins habitacionais.

Na verdade, entendemos que, independentemente das razões que possam ter levado a Lei nº 55-A/2012 a utilizar a expressão “prédio com afetação habitacional”, em vez de “prédio habitacional” constante do art. 6º, nº 1, al. a) do CIMI, para a subsunção à verba 28.1 do CIS não pode deixar de se exigir, pelo menos, a potencialidade real e atual (relativamente ao facto tributário) do prédio em causa ser utilizado para habitação.

Um terreno para construção não pode, assim, ser considerado um prédio com “afetação habitacional”, uma vez que consiste numa realidade não apta à habitação humana. Para se atingir essa aptidão é necessária a ocorrência duma realidade que lhe é externa - a construção do edifício apto à habitação- sendo que, com tal evento deixa de existir um terreno para construção e passa a existir uma nova realidade: o edifício. E é este que pode ter afetação habitacional.

Assim sendo, os terrenos para construção não se subsumem no conceito de “prédio com afetação habitacional”, não lhe sendo aplicável a verba 28.1 da Tabela Geral de Imposto de Selo.

 

17. Tendo em conta o exposto, sendo a verba 28.1 do CIS inaplicável aos prédios da Requerente, a pretensão anulatória da Requerente não pode deixar de proceder, uma vez que os atos tributários estão inquinados do vício de violação de lei por erro nos pressupostos de direito, ficando, assim, prejudicado o  conhecimento do invocado vício de preterição do direito de audição prévia.

 

 

-IV- Decisão

 

Assim, decide o Tribunal arbitral, julgando procedente o pedido de pronuncia arbitral:

a)         Declarar a não aplicação da verba 28.1 da Tabela Geral de Imposto de Selo aos prédios em causa, de que a Requerente é titular inscrita na matriz predial urbana.

b)        Declarar a ilegalidade e a consequente anulação dos atos tributários sub judice.

 

Valor da ação: € 10.904,60 (Dez mil novecentos e quatro euros e sessenta cêntimos) nos termos do disposto no art. 306º, n.º 2, do CPC e 97.º-A,n.º 1, alínea a), do CPPT e 3.º, n.º 2, do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem.

 

Custas pela Requerida, no valor de € 918.00 (novecentos e dezoito euros) nos termos do nº 4 do art. 22º do RJAT.

 

Notifique-se.

 

Lisboa, CAAD, 17.10.2016

 

O Árbitro

 

Marcolino Pisão Pedreiro



[1] Esta norma foi alterada com a entrada em vigor da Lei do Orçamento do Estado para 2014 Lei n.º 83-C/2013, de 31 de Dezembro, alargando expressamente a base de incidência, passando a incluir os terrenos para construção.

[2] Que se podem consultar no sítio da internet  “https://caad.org.pt/tributario/decisoes/”

[3] O art. 67º, nº 2, do CIS dispõe que “Às matérias não reguladas no presente Código respeitante à verba nº 28 da Tabela Geral aplica-se, subsidiariamente, o disposto no CIMI.” Por sua vez, o CIMI usa o conceito de prédio urbano habitacional, sendo considerado como tal os edifícios/construções para tal licenciados ou os que tenham como destino normal cada um destes fins, nos termos do art. 6º, nº 1, al. a) e nº 2. Este mesmo artigo diferencia, claramente, o conceito de terreno para construção, no seu nº 1, al. c) e no nº 3.

[4] Disponível em http://www.dgsi.pt/.

[5] Também disponível em http://www.dgsi.pt/.