Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 102/2014-T
Data da decisão: 2014-06-30  IMT  
Valor do pedido: € 27.024,79
Tema: Isenção Empreendimentos Turísticos art.º 20.º do DL n.º 423/83 de 5 Dezembro
Versão em PDF

 

Decisão Arbitral

 

I – RELATÓRIO

A -PARTES

 

…, portador do NIF número …, com residência na Rua … Lisboa, doravante designado de Requerente ou sujeito passivo,

AUTORIDADE TRIBUTARIA E ADUANEIRA (que sucedeu à Direcção-Geral dos Impostos, por meio do Decreto-Lei n.º 118/2011, de 15 de dezembro) doravante designada por Requerida ou AT.

O pedido de constituição do tribunal arbitral foi aceite pelo Presidente do CAAD, e o Tribunal Arbitral foi regularmente constituído, no dia 11-02-2014, para apreciar e decidir o objeto do presente processo, e automaticamente notificado a Autoridade Tributaria e Aduaneira no dia 12-02-2014, conforme consta da respetiva ata.

A Requerente não procedeu à nomeação de árbitro, pelo que, ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 6.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro, com a redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro, o Conselho Deontológico, designou o Exmo. Dr. Paulo Ferreira Alves, tendo a nomeação sido aceite nos termos legalmente previstos.

Em 27-03-2014 as partes foram devidamente notificadas dessa designação, não tendo manifestado vontade de recusar a designação dos árbitros, nos termos do artigo 11.º n.º 1, alínea a) e b), do RJAT e dos Artigos 6.º e 7º do Código Deontológico.

Em conformidade com o preceituado na alínea c) do n.º 1 do artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro, com a redação introduzida pelo artigo 228.º da Lei n.º 66­B/2012, de 31 de dezembro, o tribunal arbitral singular fica regularmente constituído em 18/­03/­2014.

A Autoridade Tributária e Aduaneira respondeu ao pedido da requerente, defendendo que o pedido de pronúncia arbitral deve ser julgado improcedente.

No dia 06-06-2014, realizou-se a reunião prevista no artigo 18.º do RJAT, nas quais foi dada a palavra aos representantes da requerente e da requerida.

No dia 26-06-2014, realizou-se a inquirição da una testemunha da Requerente.

O tribunal arbitral encontra-se regularmente constituído. É materialmente competente, nos termos dos art.ºs 2.º, n.º 1, alínea a), e 30.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro.

As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e encontram-se legalmente representadas (art.ºs 4.º e 10.º, n.º 2, do mesmo diploma e art.º 1.º da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março).

O processo não enferma de vícios que o invalidem.

 

B – PEDIDO  

 

1.    O ora Requerente pretende a declaração de ilegalidade dos atos tributários de liquidação adicional de imposto municipal sobre as transmissões onerosas de imóveis, no valor de 27.024,79€ (vinte e sete mil e vinte e quatro euros e setenta e nove euros).

 

C – CAUSA DE PEDIR

 

2.    A fundamentar o seu pedido de pronúncia arbitral, a Requerente alegou, com vista a declaração de ilegalidade dos atos tributários de liquidação adicional de imposto municipal sobre as transmissões onerosas de imóveis, no valor de 27.024,79€.

3.    A Requerente alega a ilegalidade do ato tributário pela errónea aplicação do artigo 20.º do decreto-lei n.º 423/83, quanto a isenção aí prevista para os proprietários em sede de imposto municipal sobre as transmissões onerosas de imóveis (IMT) agindo como promotores do empreendimento, isenção que deveria ter direito.

4.    No seu pedido de pronúncia arbitral, a Requerente sustenta, que a liquidação foi efetuada com base no preço atribuído ao direito adquirido, no montante de € 415.000,00, à taxa de 6,5% (cfr. alínea d) do artigo 17.° do Código do IMT), sobre a compra que a Requerente efetuou à sociedade B... – S A. – inscrita sob o NIPC … –, em 27/01/2006, por escritura lavrada no Cartório Notarial a cargo da Licenciada Dra. C...  (livro 32 – fl. 19), da fração G do prédio urbano, inscrito na matriz predial urbana da freguesia de ... sob o n.º …, integrado no Empreendimento Turístico D..., sito na Avenida …, freguesia de ... do concelho de Loulé.

5.    A requerente sustenta que a liquidação em apreço consubstancia um ato tributário manifestamente ilegal, porquanto, a base da correção que a precede e fundamenta é errada e ilegal.

6.  A Requerente alega que a correta interpretação da norma n.º 1 do artigo 20.º do citado Decreto-Lei n.º 423/83, em apreço dita que se incluem no seu âmbito as transmissões efetuadas para os adquirentes das frações, beneficiando estes do mesmo estatuto privilegiado que o legislador quis conferir ao promotor imobiliário, e que tal benefício não se cinja ao referido promotor.

7.  Mais diz, se a intenção do legislador era fomentar a atividade turística, em prol de tal desiderato só faz sentido estender o benefício fiscal, quer ao promotor, quer aos adquirentes da fração, justamente por ser sobre estes que recai o ónus do investimento.

8.  Alega a requerente, que a correta interpretação do n.º 1 do artigo 20.º do citado Decreto-Lei n.º 423/83 dita que se incluam no seu âmbito as transmissões efetuadas para os adquirentes das frações, beneficiando estes do mesmo estatuto que o legislador quis conferir ao promotor imobiliário – dita a coerência do sistema que tal benefício não se cinja àquele, sendo a intenção do legislador fomentar a atividade turística, em prol de tal desiderato, só se entende o dito benefício como aplicável, quer ao promotor, quer aos adquirentes das frações, os quais, aliás, suportam o ónus do investimento.

9.  Sustenta que tal benefício não se cinge apenas ao referido promotor, sendo que se a se a intenção do legislador era fomentar a atividade turística, em prol de tal desiderato só faz sentido estender o benefício fiscal, quer ao promotor, quer aos adquirentes da fração, justamente por ser sobre estes que recai o ónus do investimento.

10.  Estando em causa um conjunto turístico em que cada fração autónoma constitui um elemento funcional (unidade de alojamento) integrante da unidade organizacional erigida para a prestação de serviços de exploração turística (o empreendimento turístico), é de concluir que a primeira aquisição de cada um desses elementos funcionais, porque destinada a viabilizar a entrada em funcionamento de cada um deles e, concomitantemente, do empreendimento no seu todo, se enquadrava ainda no processo de instalação do empreendimento, englobando, por conseguinte, o âmbito de aplicação do artigo 20º do Decreto-Lei n.º 423/83, dada a utilidade turística reconhecida e atribuída ao empreendimento em causa e que abrange todas os elementos funcionais que o compõem.

11.  No entender da requerida a fração autónoma adquirida alvo do imposto, constitui uma unidade de alojamento do conjunto turístico D... e integra, assim, um empreendimento ao qual foi reconhecida utilidade turística (cfr. o Aviso da DGT, publicado em 15/07/2005, DR, III Série, P. 15272).

12.   A aquisição desta fração destinou-se à instalação do referido empreendimento e integra, ainda, em todo o caso, o processo de concretização dessa mesma instalação.

13.  A Requerente fundamenta que, nesse contexto, determina o n.º 1 do seu artigo 20.º trata-se de um privilégio fiscal instituído para tutela de interesses públicos extrafiscais relevantes, isto é, de um benefício fiscal na conceção do artigo 2.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais – ou seja, enquanto «medidas de carácter excecional instituídas para tutela de interesses públicos extrafiscais relevantes que sejam superiores aos da própria tributação que impedem» –,destinado a incentivar a criação de oferta turística portuguesa de qualidade reconhecida pelo governo português através do instituto da utilidade turística, como arma de combate no exigente tabuleiro da concorrência internacional, e, sobretudo, a incrementar a aquisição de produtos imobiliários de investimento no turismo de qualidade, dada a importância e valia desse produto para a economia nacional, particularmente no que diz respeito ao acréscimo que traz para a receita interna e para o aumento da taxa de emprego em Portugal

14.   Sendo que o benefício fiscal em causa visa beneficiar aqueles que promovem o processo de instalação de empreendimentos de utilidade pública face à importância vital desta atividade na economia portuguesa, ou seja, aqueles que investem na instalação da referida oferta turística portuguesa de qualidade, não sendo dirigido aos que se limitam a desenvolver a atividade de exploração dos mesmos.

15. Trata-se, efetivamente, de uma isenção objetiva, dirigida a beneficiar a concretização do processo de instalação de empreendimentos de utilidade pública. O referido artigo 20.º não concede a isenção ao construtor do empreendimento, ao promotor imobiliário ou à entidade que licencia e/ou explora o empreendimento.

16. Mais alega, que o referido artigo, nem sequer exige que seja o próprio adquirente a praticar ou promover todos os atos (materiais e jurídicos) de instalação do empreendimento de utilidade pública no prédio/fração que adquiriu, mas, tão só, que destine o imóvel que adquiriu a essa instalação, pelo que os atos necessários ao processo de instalação do empreendimento podem estar a ser realizados por outra entidade.

17.  Razão por que é fundamental saber o que significa “instalar” um empreendimento de utilidade turística e, sobretudo, quando se deve considerar concluído esse processo de instalação numa situação, como a dos autos, em que está em causa um conjunto turístico, composto por unidades de alojamento autónomas e cujo paradigma de funcionamento e exploração, bem diferente do previsto para os estabelecimentos hoteleiros, poderá refletir-se nas operações necessárias ao respetivo processo de instalação.

18.   Sendo forçosa a afetação à exploração turística permanente de todas as unidades de alojamento que compõem e integram o estabelecimento – o que passa, desde logo, pelo dever de assegurar que elas se encontrem sempre em condições de serem locadas para alojamento a turistas e de nela serem prestados os serviços obrigatórios da categoria atribuída ao empreendimento turístico.

19.   A Requerente sustenta que a questão se prende com a análise do processo de instalação deste tipo de empreendimentos, e do conceito de “instalação”.

20.  Assim, a Requerente alega que o processo de instalação de um empreendimento imobiliário de utilidade turística, enquanto unidade organizacional destinada à prestação de serviços de turismo, só cessa quando, depois de construído e licenciado o conjunto imobiliário, o mesmo se mostra apto a funcionar nos termos que lhe permitiram alcançar o estatuto de utilidade turística, isto é, quando se mostra apto a ser afetado à atividade de exploração turística com a qualidade exigida no despacho ministerial que lhe concedeu esse estatuto.

21.  Deste modo, e visto que quem adquire uma unidade de alojamento num empreendimento turístico constituído ao abrigo do regime de propriedade plural previsto no RJIEFET não lhe pode dar outro destino senão a prestação de serviços de exploração turística, sendo obrigado a mantê-lo equipado e pronto para ser locado para essa única e permanente finalidade, tal aquisição não representa um negócio imobiliário ou um investimento num produto residencial, mas um investimento na criação/instalação de oferta turística portuguesa, num produto imobiliário de investimento em turismo, em que até a propriedade quanto ao uso a dar ao imóvel se encontra limitada à possibilidade de a explorar já que não pode ser o proprietário a fazê-lo mas sim a entidade exploradora do empreendimento turístico, constituindo cada unidade de alojamento, em si, uma parte do empreendimento.

22.  A Requerente alega, que quem adquire uma dessas novas frações num conjunto turístico em propriedade plural, tornando-se contitular do aldeamento, comparticipa ainda na sua instalação, na medida em que este não pode considerar-se integralmente instalado enquanto as respectivas unidades de alojamento não se encontram aptas a funcionar e a ser exploradas por falta de prévia aquisição nesse regime de propriedade.

23. Sustentando, que neste contexto, não podemos deixar de concluir que a aquisição desta fração se destinou a permitir a continuidade do processo de instalação deste empreendimento de utilidade turística, concorrendo para que ele pudesse passar, progressivamente, à fase de funcionamento e exploração, com a abertura gradual ao público das suas unidades funcionais de alojamento até à sua completa e total instalação.

24. Pelo que esta aquisição goza da isenção objetiva prevista no citado artigo 20º, porque teve por destino a instalação de empreendimentos qualificados de utilidade turística.

25.  Mais alega, que não podemos, de resto, aceitar a tese de que só o promotor que adquire um imóvel para nele construir um empreendimento turístico ou para nele realizar obras de melhoria realiza investimentos turísticos.

26.  A Requerente sustenta a sua posição, referindo que a primeira aquisição de cada fração autónoma, enquanto unidade de alojamento do empreendimento turístico D... integra ainda no processo de instalação deste empreendimento, reunindo as condições legais para beneficiar da redução de imposto de selo prevista no artigo 20º do Decreto-Lei n.º 423/83, de 5 de dezembro, dada a utilidade turística reconhecida a este empreendimento pelo Senhor Secretário de Estado do Turismo e que abrange todas as unidades que o compõem.

27.  Face ao exposto a Requerente no seu entender, olhando às finalidades da norma em apreço e em concordância com as mesmas, sempre será de concluir pela legalidade da isenção concretamente concedida e, por conseguinte, à ilegalidade do ato de liquidação adicional agora promovido.

 

D- DA RESPOSTA DA REQUERIDA

 

28.  A Requerida, devidamente notificada para o efeito, apresentou tempestivamente a sua resposta na qual, em síntese abreviada, alegou o seguinte:

29.  Não é aplicável à situação dos autos a isenção prevista no art. 20° do Decreto-Lei n.º 423/83.

30.  Conforme consta do relatório final da inspeção tributaria, à data daquela aquisição daquela fração o empreendimento turístico em causa já se encontrava instalado e em fase de funcionamento, e que a requerente não prova o contrário.

31.  A requerida fundamenta a sua posição, invocando que o legislador, apenas quis abranger com aquela norma as aquisições destinadas a "instalação" de  empreendimentos é o que resulta claro do elemento literal da interpretação pois se o legislador quisesse abranger a atividade de instalação e a de exploração dos empreendimentos turísticos teria sido tao claro quanto o foi no art. 16° do mesmo diploma, cujo normativo pretendeu beneficiar tanto empresas proprietárias como exploradoras, a semelhança do que acontece com o n° 2 do art. 20º.

32. Mais refere que a propósito do n" 2 do art. 20° do citado diploma, a letra da lei não deixa margem para duvidas: ao alargar excecionalmente a isenção prevista no n° 1 as aquisições a favor de empresa exploradora, nas circunstâncias restritivas que descreve, o legislador e claro em excluir daquele beneficio todas as restantes transmissões.

33. A requerida mais alega que sobre a interpretação a conferir ao conceito de "instalação", resulta patente da legislação uma clara distinção entre os conceitos de "instalação", por um lado, e de "funcionamento" e "exploração", por outro, distinção esta que se encontra bem patente no preambulo do Decreto-Lei n.º 39/2008.

34.  Alega a requerida que a aquisição efetuada pela Requerente, já em momento posterior ao da licença de utilização e, por conseguinte, depois da fase de instalação do empreendimento turístico, destina-se à exploração comercial.

35.  Assim, de acordo com este novo paradigma de exploração, e não de instalação, conforme o caso, embora as unidades de alojamento que compõe o empreendimento turístico se possam constituir como frações autónomas, essas unidades de alojamento consideram-se sempre em exploração turística, donde a sua aquisição se destina a exploração e não a implantação.

36.  Sustenta a requerida, ainda que se considerasse que a aquisição em causa ocorrera ainda durante a fase de construção/instalação do empreendimento, o que não é de todo o caso, seria forçoso considerar, como o faz o acórdão, STA de 23/01/2013, que "eventuais vendas das unidades de alojamento realizadas ainda durante a fase de construção/instalação do empreendimento já fazem parte da exploração do mesmo."

37.  Conclui a requerida sobre o enquadramento juridico-tributario dos factos, considera-se que a aquisição em apreço não beneficia da isenção de IMT prevista no n° 1 do art. 20° do citado Decreto-Lei 423/83, sustentado a sua posição na jurisprudência reiterada dos Acórdãos do STA de 30/01/2013 no processo n° 01193/12 e de 11/09/2013 no processo n.º 01049/13.

38.   Sobre a questão do enquadramento juridico-tributario da operação controvertida  e de se vincular a esse entendimento e simultaneamente gerar na Requerente uma expectativa legitima juridicamente protegida quanto a esse entendimento, no âmbito de uma informação vinculativa que a Requerente não pediu.

39.   Mais alega a requerida, se a concessão da isenção era fundamental para a decisão de aquisição da fração, a Requerente devia ter pedido AT que ao abrigo do art. 68.° da LOT se pronunciasse previamente e a titulo vinculativo.

40.  Não o tendo feito nos termos legalmente admissíveis, não pode agora invocar o entendimento que o Notário ou o Conservador, enquanto interpretes e aplicadores do direito fizeram da norma.

41. Não tendo a requerente feito qualquer pedido de informação vinculativa, nos termos legalmente admissíveis, não pode agora invocar o entendimento que o Notário ou o Conservador, enquanto intérpretes e aplicadores do direito fizeram da norma.

42. Alega a requerida, que o no respeita ao cumprimento das obrigações tributarias, o Notário e o Conservador são autoridades publicas incumbidas de um dever de fiscalização em geral, somente, e à semelhança dos demais entes públicos e privados, zelar pelo cumprimento das obrigações jurídico-fiscais de que tomem conhecimento no exercício e por causa das suas funções, sem competências que lhes permita apurar da situação jurídico-tributaria do contribuinte, substituindo-se a AT.

43. A requerida tem a sua disposição mecanismos próprios de forma a acautelar o enquadramento juridico-tributario da aquisição em apreço e, em consequência, vincular a AT ao entendimento sancionado para o efeito, como é o caso do pedido de informação vinculativa, que poderia a apresentar antes da celebração da referida escritura, cabendo-lhe a ela zelar pela certeza e segurança jurídicas que invoca, o que de todo não fez.

44.  A requerida, discorda em absoluto que a Requerente tenha atuado como promotora do empreendimento, e que a Requerente não efetuou qualquer prova de que tenha contribuído ativamente para o financiamento de quaisquer obras em curso.

45.  Sustenta ainda a requerida, que a requerente a Requerente através da aquisição da aludida fração tenha impulsionado o empreendimento e contribuído como garante da sua concretização, tanto mais que a aquisição da aludida fração veio a ocorrer em momento posterior ao da concessão da licença de utilização turística n.º … de 30/09/2005, pela CM Loulé.

46.              Alega a requerida, que não estava impedida de liquidar o imposto em falta no prazo legalmente previsto para o efeito, inexistindo qualquer violação dos princípios de certeza e segurança jurídica, e que o direito à liquidação do imposto em falta só caduca se o mesmo não for validamente notificado a Requerente no prazo de 8 anos a contar da aludida transcrição, por conjugação do disposto no art. 45°, n? 1 in fine da LOT com o n° I do art. 35° do CIMT.

47. Quanto a revogação da concessão do benefício fiscal, a requerente alega que, o beneficia fiscal de isenção de IMT previsto no nº1 do art. 20° do Decreto-Lei n° 423/83 é um benefício de natureza automática, de decorre direta e imediatamente da lei, ou seja, opera por efeito da lei sem carecer da pratica de qualquer ato administrativo, seja ela um ato expresso ou tácito.

48.  Mais sustenta, que o beneficio fiscal previsto naquele art. 20° não e, por conseguinte, suscetíveis de poder ser concedido através de um qualquer ato administrativo, e ainda menos através de um ato administrativo praticado por entidades sem poderes para o efeito, como vem a ser o caso do Notário em cujo Cartório e outorgada a escritura e do Conservador em cuja Conservatória se procede ao competente Registo Predial, o qual seria um ato nulo nos termos do art. 1330 do CPA. Consequentemente, o disposto no art. 1400 e art. 1410 do CPA sobre a revogação dos atos não e minimamente suscetível de aplicação situação em apreço por inexistir um qualquer ato administrativo em matéria de tributaria, de concessão de um beneficio fiscal, seja através de um ato expresso ou de um ato tácita.

49.   A intervenção quer do Notário quer do Conservador, enquanto entidades públicas que no exercício da sua função interpretam e aplicam o direito, não confere à Requerente uma qualquer legítima expectativa juridicamente protegida quanto à interpretação que possam fazer sobre o enquadramento juridico-tributario da aquisição em apreço.

50.   Veja-se que estas entidades apenas intervir no exercício de uma função meramente fiscalizadora do cumprimento das obrigações fiscais, de harmonia com o consignado no art. 540 do CIMT e dentro dos limites da respectivas competência, não lhes cabendo substituir a AT.

51.  A requerida termina sustentação que não é aplicável à situação dos autos a isenção prevista no art. 20° do Decreto-Lei n.º 423/83, pelo que a requerente não tem direito a usufruir da referida isenção.

 

E- FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

 

52.  Antes de entrar na apreciação destas questões, cumpre apresentar a matéria factual relevante para a respetiva compreensão e decisão, efetuou-se com base na prova documental e testemunhal, e tendo em conta os factos alegados.

53. Em matéria de facto relevante, dá o presente tribunal por assente os seguintes factos:

54. A Requerente adquiriu, em 27/01/2006, a fração G do prédio urbano, inscrito na matriz predial urbana da freguesia de ... sob o n.º …, destinado a Serviços, integrado no Empreendimento Turístico D..., sito na Avenida …, Loulé. O referido imóvel foi adquirido para fins de exploração turística.

55.  A liquidação em apreço incide sobre a compra que o ora Requerente efetuou à sociedade B... – SA – inscrita sob o NIPC … –, em 27/01/2006, por escritura lavrada no Cartório Notarial a cargo da Licenciada Dra. C... (livro 32 – fl. 19), da fração G do prédio urbano, inscrito na matriz predial urbana da freguesia de ... sob o n.º …, integrado no Empreendimento Turístico D..., sito na Avenida …, Loulé.

56.  A liquidação foi efetuada com base no preço atribuído ao direito adquirido, no montante de € 415.000,00, à taxa de 6,5% (cfr. alínea d) do artigo 17.° do Código do IMT).

57.   A Requerente celebrou um contrato de exploração turística, nos termos do qual cedia a uma sociedade o direito exclusivo de exploração da fração cabendo a essa sociedade a exploradora do Hotel e dos apartamentos turísticos, ambos com a classificação de 5 estrelas, que integram o conjunto turístico D....

 

F- FACTOS NÃO PROVADOS

 

58.  Dos factos com interesse para a decisão da causa, constantes da impugnação, todos os objetos de análise concreta, não se provaram os que não constam da factualidade supra descrita

 

59.   G- QUESTÕES DECIDENDAS

 

60.    Atenta as posições das partes assumidas nos argumentos apresentados, constitui a questão central dirimenda a seguinte, a qual cumpre, pois, apreciar e decidir:

a)    A alegada pela Requerente, da declaração de ilegalidade dos atos tributários de liquidação em sede de imposto municipal sobre as transmissões onerosas de imóveis, no valor de 27.024,79€ (vinte e sete mil e vinte e quatro euros e setenta e nove euros).

 

H- MATÉRIA DE DIREITO

 

61.  Atendendo às posições das partes assumidas nos articulados apresentados, a questão central a dirimir pelo presente tribunal arbitral consiste em apreciar a legalidade do atos de liquidação em sede de Imposto Municipal Sobre as Transmissões Onerosas De Imóveis, quanto a correta interpretação e aplicação da isenção prevista no n.º 1 do art. 20º, do Decreto-Lei nº 423/83, na aquisição do imóvel pela requerente.

62.   Releva nos presentes autos, determinar qual a correta interpretação e alcance a conferir ao referido n.º 1 do artigo 20.º e se a isenção ai prevista é aplicável a situação sub judice, especificamente quanto a aquisição do imóvel autónomo em regime de propriedade horizontal inserido num reconhecido empreendimento turístico, e se o contrato de exploração celebrado pela Requerente com a entidade exploradora do empreendimento turístico tem importância para beneficiar da referida isenção.

63.  Perante os factos consumados, resulta que a requerente adquiriu, em 27/01/2006, a dita fração, integrada num Empreendimento Turístico, ao qual foi, de acordo com o Aviso da DGT, publicado em 15/07/2005, DR, III Série, P. 15272, concedido, ao abrigo do disposto no n.º 1 do art. 2º e no n.º 3 do art. 7º do Decreto -Lei n.º 423/83, de 5 de Dezembro, o estatuto de “utilidade turística”, estando isenta de IMT (SISA) quanto ao instalador de todo empreendimento, conhecido como o "D...".

64. Face ao exposto, importa perceber o que nos diz o art. 20º do Decreto -Lei nº 423/83, de 5 de dezembro, em especial quanto aos requisitos da isenção em consideração:

"1- São isentas de sisa e do imposto sobre sucessões e doações, sendo o imposto do selo reduzido a um quinto, as aquisições de prédios ou de frações autónomas com destino à instalação de empreendimentos qualificados de utilidade turística, ainda que tal qualificação seja atribuída a título prévio, desde que esta se mantenha válida e seja observado o prazo fixado para a abertura ao público do empreendimento.

2 - A isenção e a redução estabelecidas no número anterior verificar-se-ão também na transmissão a favor da empresa exploradora, no caso de a proprietária ser uma sociedade de locação financeira e a transmissão se operar ao abrigo e nos termos do contrato de locação financeira que determinou a aquisição do empreendimento pela sociedade transmitente."

65.   Resulta do n.º 1 que estão isentos de IMT, as aquisições de prédios ou de frações autónomas com destino à instalação de empreendimentos qualificados de utilidade turística.

66.  Cabe assim decidir se a aquisição do imóvel pela Requerente se insere nestes requisitos e assim estar abrangida pela isenção, e para a determinar cabe estabelecer o alcance do conceito de «instalação».

67. Sobre interpretação e alcance a conferir ao n.º 1 do art.º 20, a mesma já foi alvo de decisões jurisprudenciais, e em especial já foi a mesma decidida de modo uniforme pela Seção de Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, na sequência do julgamento ampliado, realizado ao abrigo do disposto no art.º 148.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), no processo n.º 968/12, e que deu origem ao acórdão uniformizador de jurisprudência n.º 3/2013, de 23 de janeiro de 2013, publicado na 1.ª Série do Diário da República, de 4 de março de 2013, págs. 1197 a 1217.

68. O Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo n.º 3/2013, D.R. n.º 44, Série I de 2013-03-04, da Secção de Contencioso Tributário, veio determinar o alcance do conceito de «instalação» para efeitos da isenção do n.º 1 do art 20.º.

69.  Resulta do presado acórdão, que procedeu a Uniformização da jurisprudência quanto ao conceito de «instalação», para efeitos dos benefícios a que se reporta o nº1 do art. 20º, do Decreto-Lei nº 423/83, de 5 de dezembro, o qual conclui no sentido:

     "O acabado de expor leva -nos a concluir que quando o legislador, no n.º 1 do art. 20º, utiliza a expressão aquisições de prédios ou de frações autónomas com destino à «instalação», este conceito não pode deixar de ser entendido como referindo -se precisamente à aquisição de prédios (ou de frações autónomas) para construção (quando se trate de  novos empreendimentos) de empreendimentos turísticos,  depois de  devidamente licenciadas as respectivas operações urbanísticas, visando beneficiar as empresas que se dedicam à atividade de promoção/criação dos mesmos."

70. Perante a posição tomada pelo Supremo Tribunal Administrativo, não se pode deixar de concluir no mesmo sentido do acórdão.

71.   Neste termos a isenção a que se reporta o nº 1 do art. 20º, do Decreto-Lei nº 423/83 destina-se exclusivamente à aquisição de prédios/frações autónomas para construção e instalação de empreendimentos turísticos, e não aos adquirentes de frações autónomas em empreendimentos já construídos ou instalados.

72.    Mais nos diz o referido Acórdão quanto a interpretação e alcance do conceito de «instalação» para efeitos da isenção do n.º 1 do art 20.º, pelo que é relevante para a formulação da presente decisão, citar o referido acórdão quanto a essa questão, o qual se pronunciou no seguinte sentido:

"Começando pelo teor literal do art. 20º, n.º 1, do Decreto -Lei n.º 423/83, importa realçar que o legislador refere claramente que apenas se encontram isentas de sisa e de imposto de selo “as aquisições de prédios ou de frações autónomas com destino à instalação de empreendimentos qualificados de utilidade turística”.

O que quer dizer que não se trata de uma isenção subjetiva dirigida a beneficiar as empresas, quer sejam proprietárias quer exploradoras dos empreendimentos, mas sim objetiva, uma vez que visa beneficiar a atividade de instalação, podendo apenas requerer e beneficiar da isenção as  empresas que se dediquem a «instalar» empreendimentos turísticos e não também as que pretendam dedicar -se  à atividade de exploração dos mesmos.

Na verdade, o legislador é muito claro quando pretende beneficiar as empresas proprietárias e ou exploradoras dos empreendimentos. É o que acontece quando no art. 16º do mesmo diploma refere que as empresas proprietárias e ou exploradoras dos empreendimentos gozarão relativamente à propriedade e exploração dos benefícios indicados nas  alíneas a) a c) do n.º 1 do preceito. Ou quando no n.º 2 do art. 20º do Decreto -Lei n.º 423/83 alarga a isenção estabelecida no n.º 1 do preceito na “transmissão a favor da empresa exploradora, no caso da proprietária ser uma sociedade de locação financeira e a transmissão se operar ao abrigo e nos termos do contrato de locação”.

O acabado de expor serve para demonstrar que não oferece dúvida que, ao contrário do exposto, no caso da isenção do n.º 1 do art. 20º do Decreto -Lei n.º 423/83, o legislador quis abranger apenas as aquisições destinadas à «instalação» de empreendimentos.

Como o Decreto -Lei n.º 423/83 não contém uma definição para o conceito de «instalação», manda o art. 11º, n.º 2, da LGT, que nos socorramos do significado técnico jurídico que nos é dado pelo regime jurídico dos empreendimentos turísticos.

Análise atenta da referida legislação mostra -nos que só os Decretos -Lei nºs 167/97, de 4 de Julho, e 55/2002, de 11 de Março, nos dão uma noção para o conceito de «instalação».

Assim, no art. 9º do Decreto -Lei n.º 167/97, sob a epígrafe “Instalação”, pode ler -se que “Para efeitos do presente diploma, considera -se instalação de empreendimentos turísticos o licenciamento da construção e ou da utilização de edifícios destinados ao funcionamento daqueles  empreendimentos.”

As regras respeitantes à exploração e funcionamento dos empreendimentos já instalados constam do capítulo IV. Por sua vez, o art. 9º do Decreto -Lei n.º 55/2002 define instalação da seguinte forma: “(…) Considera -se instalação de empreendimentos turísticos o processo de licenciamento, ou de autorização para a realização de operações urbanísticas relativas à construção de edifícios ou suas frações destinados ao funcionamento daqueles empreendimentos”. E embora os diplomas anteriores sejam omissos quanto à inserção de uma norma com uma noção sobre o conceito de instalação, a verdade é que a mesma coincide com a que decorre da leitura do regime neles consagrado. Outro dado que importa realçar e que se extrai dos mencionados diplomas é que as operações que fazem parte do  conceito de «instalação» não se confundem com as que  correspondem ao conceito de «funcionamento» e «exploração».

Começando com a análise dos diplomas que regularam anteriormente a matéria, temos o Decreto -Lei n.º 49399, de 24 de Novembro de 1969, que, no seu capítulo IV, sobre a epígrafe “Da instalação dos estabelecimentos de interesse para o turismo”, dispõe o art. 21º que “Para poder instalar-se qualquer estabelecimento hoteleiro ou similar deverá, em primeiro lugar, ser requerido à Direção -Geral do Turismo que o empreendimento seja declarado de interesse para o turismo ou sem interesse para o turismo, no prazo e sob a cominação que forem fixados em regulamento”.

E no art. 22º diz -se que “Serão organizados pela Direção -Geral do Turismo os processos respeitantes à aprovação da localização e à aprovação do anteprojeto e projeto dos estabelecimentos hoteleiros e similares de interesse para o turismo, ainda que haja lugar à intervenção de outras entidades ou serviços”.

Por sua vez, no Capítulo V, sob a epígrafe, “Das vistorias e da inspeção dos estabelecimentos de interesse para o turismo”, dispõe o art. 39º que “nenhum estabelecimento hoteleiro ou similar de interesse para o turismo poderá iniciar a sua exploração sem prévia autorização da Direcção-Geral do Turismo ou das delegações da Secretaria de Estado, precedida de vistoria.”

Do preceito decorre que, no âmbito do regime consagrado no referido diploma, uma vez construído/instalado o empreendimento turístico ele só podia começar a funcionar e a ser explorado depois de devidamente autorizado pela Direção -Geral do Turismo.

De seguida, o Decreto -Lei n.º 328/86, de 30 de Setembro, que veio proceder à revisão do Decreto -Lei n.º 49399, de 24 de Novembro, continua a distinguir entre atos e procedimentos tendentes à construção e instalação dos empreendimentos (Capítulo III), e funcionamento e exploração (Capítulo IV).

Por fim, o diploma mais recente, o Decreto -Lei n.º 39/2008, de 7 de Março, que veio consagrar o novo regime jurídico da instalação, exploração e funcionamento dos empreendimentos turísticos, “procedendo à revogação dos diversos diplomas que atualmente regulam esta matéria e reunindo num único decreto -lei as disposições comuns a todos os empreendimentos”, também não contém uma noção de «instalação», mas distingue claramente entre o procedimento respeitante à instalação dos empreendimentos turísticos (arts. 5º e 6º e o Capítulo IV) e o funcionamento e a exploração dos mesmos (Capítulo VII).

Em especial, o art. 5º, sob a epígrafe “Requisitos gerais de instalação” 6, estabelece: “1 - A instalação de empreendimentos turísticos que  envolvam a realização de operações urbanísticas conforme definidas no regime jurídico da urbanização e da edificação devem cumprir as normas constantes daquele regime, bem como as normas técnicas de construção aplicáveis às edificações em geral, designadamente em matéria de segurança contra incêndio, saúde, higiene, ruído e eficiência energética, sem prejuízo do disposto no presente decreto -lei e respetiva regulamentação. 2- O local escolhido para a instalação de empreendimentos turísticos deve obrigatoriamente ter em conta as restrições de localização legalmente definidas, com vista a acautelar a segurança de pessoas e bens face a possíveis riscos naturais e tecnológicos”.

O significado técnico jurídico que se extrai da legislação é que o conceito de instalação compreende todas as operações e procedimentos que vão desde o pedido de licenciamento ou de comunicação prévia de operações urbanísticas, passando pelos pareceres e aprovações das várias entidades oficiais competentes, pedido de autorização ou comunicação de utilização para fins turísticos, e obtenção do respetivo alvará (art. 30º) ou título de abertura ao público (art. 32º). Nesta sequência, refere o n.º 2 do art. 12º do Decreto -Lei n.º 423/83 que “a data de abertura ou reabertura ao público é aquela em que o empreendimento foi autorizado a funcionar pela autoridade competente”.

Sendo que a data de comunicação do título de abertura e funcionamento é a relevante para marcar o início do prazo de validade do estatuto de utilidade turística do empreendimento turístico em causa, tal como resulta no caso em apreço (cfr. o despacho n.º 3716/2011).

Dito por outras palavras, a «instalação» emerge como um procedimento que compreende os atos jurídicos e os trâmites tendentes ao licenciamento (em sentido amplo, compreendendo comunicações prévias ou autorizações, conforme o caso) das operações urbanísticas necessárias à construção de um empreendimento turístico, bem como a obtenção dos títulos que o tornem apto a funcionar e a ser explorado para finalidade turística. Depois de construído e obtidas pelos promotores do investimento as licenças necessárias a tornarem o empreendimento apto ao exercício da atividade turística, cada empreendimento turístico “deve ser explorado por uma única entidade, responsável pelo seu integral funcionamento e nível de serviço e pelo cumprimento das disposições legais e regulamentares aplicáveis” (nº 1 do art. 44º do Decreto -Lei n.º 39/2008), sendo tal entidade designada pelo titular do respetivo alvará de autorização  de utilização para fins turísticos (nº 2 do art. 44º), ou seja, pelo promotor (cfr. o Capítulo VII e arts. 41º e ss. do Decreto -Lei n.º 39/2008, que estabelece as regras relativas à exploração e funcionamento).

E ainda que as unidades de alojamento estejam ocupadas pelos respetivos proprietários, cabe à entidade exploradora assumir a exploração continuada das mesmas, devendo mantê-las permanentemente em regime de exploração turística (art. 45º do Decreto -Lei n.º 39/2008).

Esta distinção entre os conceitos de «instalação», por um lado, e de «funcionamento» e «exploração», por outro, está bem patente no próprio preâmbulo do Decreto –Lei n.º 39/2008, onde se podem ler, em primeiro lugar, as preocupações e inovações quanto aos aspetos relacionados com o licenciamento dos empreendimentos, no sentido da sua simplificação. No mesmo sentido, DULCE LOPES, ao caracterizar o procedimento de instalação de empreendimentos turísticos, ao abrigo do Decreto -Lei n.º 39/2008 e legislação complementar, diz expressamente que com o mencionado diploma se pretendeu “(…) um  ajustamento do procedimento de instalação de empreendimentos turísticos às exigências de simplificação e desburocratização procedimental  que anima o pacote legislativo do Programa de Simplificação Administrativa e Legislativa (SIMPLEX)”. E a referida Autora continua dizendo que “Nestes moldes, compete ao município licenciar ou admitir as comunicações  prévias das operações necessárias para a instalação de estabelecimentos hoteleiros, aldeamentos turísticos,  apartamentos turísticos e conjuntos turísticos, devendo,  para o efeito, solicitar parecer do turismo de Portugal I.P. obre a arquitetura e a localização de empreendimentos turísticos não precedidos de plano de pormenor”.

Regressando à análise do preâmbulo do Decreto -Lei  n.º 39/2008, verifica -se que de seguida são realçadas as inovações no que se refere à exploração e funcionamento, podendo ler -se, a este propósito, a dado passo, que “No capítulo das exploração e funcionamento, consagra -se

um novo paradigma de exploração dos empreendimentos turísticos, assente na unidade de exploração e continuidade da exploração por parte da entidade exploradora e na permanente afetação à exploração turística de todas as unidades de alojamento que compõem o empreendimento, independentemente do regime de propriedade em que assenta e da possibilidade de utilização das mesmas pelos respetivos proprietários”.

Como assinala CRISTINA SIZA VIEIRA 8 , a verdadeira alteração de fundo introduzida pelo diploma em causa respeita à exploração dos empreendimentos turísticos em propriedade plural, com consagração expressa no art. 45º do Decreto -Lei n.º 39/2008. Já em diplomas anteriores, tal como o Decreto -Lei n.º 167/97, se admitia a aquisição de frações autónomas, o que implicava que tais unidades de alojamento fossem retiradas da exploração dos empreendimentos turísticos, estando fixada a percentagem máxima de unidades de alojamento que poderiam ser desafetadas da exploração.

O que muda com o Decreto -Lei n.º 39/2008 é o facto de as unidades de alojamento se considerarem sempre em exploração turística, aplicando -se a regra do art. 45º a todos os empreendimentos, incluindo os constituídos em propriedade plural, ou seja, em que as unidades de alojamento se possam constituir como frações autónomas, uma vez que a exploração turística ocorre ainda que tais frações estejam ocupadas e ainda que tal ocupação seja permanente.

Segundo a mencionada Autora, são duas as principais novidades em relação ao regime anterior: cai por terra “a percentagem e o limite temporal de uso pelos  proprietários das unidades de alojamento que estivessem afetas à exploração turística” .

Do exposto resulta claro que as alterações relevantes  introduzidas pelo diploma em causa prendem -se sobretudo com um novo conceito de «exploração», em nada se alterando quanto ao conceito de «instalação». Em relação a este conceito, como vimos, o legislador limitou -se  a simplificar o seu procedimento.

Em suma, da leitura do regime constante dos arts. 5º a 6º e 23º a 40º do Decreto -Lei n.º 39/2008 verifica -se que o conceito de «instalação» nada tem que ver com o «funcionamento» e a «exploração» e que naquele cabem apenas, como refere a Fazenda Pública, os atos, as operações e os procedimentos tendentes à construção/criação de empreendimentos turísticos.

73.  Mais nos diz o presado o acórdão, quanto a interpretação a conferir e ao alcance da isenção prevista no n.º 1 do art.º 20 em apreço:

(…)"Em suma, os promotores dos empreendimentos são únicos responsáveis pelo investimento imobiliário, impendendo sobre eles o risco do mesmo, bem como pela obtenção das licenças necessárias a torná-los aptos ao funcionamento e exploração.

Afigura -se, desta forma, que a argumentação da recorrida no sentido de que o benefício consagrado no n.º 1 do art. 20º do Decreto -Lei n.º 423/83 tem em vista a exploração turística e que os beneficiários são os adquirentes das frações ou unidades de alojamento, não tem o mínimo de cabimento nem na letra nem na razão de ser do preceito.

O benefício só tem justificação relativamente a quem procede à instalação do empreendimento e o coloca no  mercado e não em relação a todos os que o utilizam e exploram, ainda que através da compra das suas unidades. Não podemos, desta forma, deixar de concluir que assiste razão à recorrente quando defende que “(…) Pretendeu o legislador impulsionar este sector de atividade, prevendo isenção/redução de pagamento de Sisa/Selo, mediante determinadas condições, a quem vai criar estabelecimentos turísticos, e não a quem se limita a adquirir frações pertencentes a empreendimentos já instalados”, e que este entendimento ou interpretação é o que decorre “do elemento histórico, racional /teleológico, mas também literal das normas jurídicas em apreço”.

Como ficou demonstrado, no conceito de instalação não pode estar incluída a aquisição de unidades de alojamento que fazem parte do empreendimento, porque essa aquisição é feita tendo em vista a sua exploração a qual só pode ocorrer após o ato final do procedimento de instalação, que coincide normalmente, como vimos, com a abertura ao público.

De qualquer modo, não tem qualquer apoio legal a afirmação segundo a qual “o estabelecimento vai -se progressivamente instalando à medida que as unidades de alojamento vão sendo vendidas”.

É verdade que pode ser autorizada a instalação dos empreendimentos turístico por fases à semelhança do que pode suceder com outras operações urbanísticas (art. 30º, n.º 8, do Decreto -Lei n.º 39/2008), mas “A delimitação do termo cada fase da obra” deve fazer -se corresponder a

uma parte da obra com capacidade para funcionar autonomamente”, nos termos do regime jurídico da Urbanização e da Edificação 20 .

Ficou claramente demonstrado que a venda das unidades de alojamento ainda que adquiridas durante a construção/ instalação consubstanciam já o interesse da exploração do empreendimento turístico. Para uma compreensão cabal dos momentos significativos e principais temáticas que antecedem e seguem a instalação dos empreendimentos turísticos, DULCE LOPES 21  autonomiza os seguintes momentos: “A montante da instalação”, onde destaca problemáticas ligadas, por exemplo, ao planeamento e a definição de opções estratégicas; “instalação” (onde destaca a existência de um especial procedimento para o licenciamento); e a “jusante da instalação”, onde realça as questões relativas à “propriedade”, “administração” e “exploração”. "

74.  Perante a posição e fundamentação assumida no referido Acordão, no qual a isenção, se reporta exclusivamente à aquisição de prédios/frações autónomas para construção e instalação de empreendimentos turísticos, e não aos adquirentes de frações autónomas em empreendimentos já construídos ou instalados.

75.  Os Requisitos da isenção não são preenchido pela requerente para poder beneficiar da isenção, senão vejamos:

76.   Em primeiro lugar o imóvel adquirido pela Requerente, teria de ser adquirido para a mesma proceder a instalação ou construção de um empreendimento turístico, todavia o imóvel adquirido, já se encontra devidamente instalado e construído dentro de um empreendimento turístico e pronto para a sua fruição.

77.  Assim conclui-se que a requerente não preenche um dos requisitos para beneficiar da isenção, de acordo com a interpretação e fundamentação conferida pelo acórdão supra citado.

78.  Relativamente ao outro dos requisitos para beneficiar da isenção a requerente teria de desenvolver a função de promotora ou criadora de atividade urbanísticas e turísticas.

79.  Quanto a este requisito, a ora requerente alega que abdicou deliberadamente da livre fruição do seu imóvel em benefício da exploração turística e comercial do mesmo, através da celebração de um contrato de exploração turística nos termos do qual cedia o direito exclusivo de exploração da fração através da celebração de contrato de exploração celebrado com a entidade exploradora do empreendimento turístico, em troca de uma remuneração, e nesses termos teria direito a referida isenção.

80.  Sobre esta importância deste argumento invocado, e da prova testemunhal, para a questão em causa, sobre o mesmo se diz que a escolha da Requerente de livremente transmitir a fruição do seu imóvel em troca de uma remuneração, mesmo que a mesma seja para a entidade exploradora do empreendimento turístico onde esta inserido o imóvel, não efeito para o benéfico da isenção, porque não se insere no conceito de instalação, que é um requisito necessário para beneficiar da isenção.

81.  A mesma conclusão chegou o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo nº 3/2013, D.R. n.º 44, Série I de 2013-03-04, já citado, no qual o STA decidiu, e que se aceita para efeitos de aplicação para o caso sub judice, respetivamente:

"(…) não estando em causa a aquisição de prédios ou de frações autónomas destinados à construção/instalação de empreendimentos turísticos, mas sim a aquisição de unidades de alojamento por consumidores finais, ainda que porque integradas no empreendimento em causa se encontrem afetas à exploração turística, a mesma não pode beneficiar das isenções consagradas no art. 20º, n.º 1, do Decreto -Lei n.º 423/83."(…)"

82.    Tendo a Requerente adquirido o imóvel já devidamente instalado num empreendimento turístico, não exerceu a requerente uma função que estivesse abrangida pelo conceito de instalação, conforme já se verificou, inclusive nas situações em que existe por parte da requerente, alterações ou melhorias à propriedade quer no seu interior quer exterior, as mesmas não se consubstancias no âmbito do conceito de instalação, no sentido da interpretação conferida.

83.  Mesmo que tais alterações ou melhorias sejam efetuadas pela requerente ou por terceiro no âmbito de um contrato de exploração.

84.   Face ao exposto, a transferência do direito de fruição através de um contrato de exploração, não altera a situação sub judice no âmbito de aplicação da isenção e de acordo.

85.    Face a tudo o que foi dito, conclui-se que a aquisição da unidade de alojamento no empreendimento turístico, "D...", ainda que integrado no empreendimento em causa e mesmo que afetas à exploração turística, e inclusive que tal exploração turística seja levada a cabo pela entidade exploradora do restante empreendimento turístico, a aquisição da requerente não cumpre um dos requisito fundamentais do conceito de instalação, pelo que não pode beneficiar das isenções consagradas no art. 20.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 423/83.

86.  Nestes termos e nos demais de direito, decide-se pela legalidade do ato tributário de liquidação em sede de Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imoveis, no valor de 27.024,79€  (vinte e sete mil e vinte e quatro euros e setenta e nove euros).

 

 

I - DECISÃO

Destarte, atento a todo o exposto, o presente Tribunal Arbitral, decide

- Julgar improcedentes o pedido de declaração de ilegalidade do ato tributário de liquidação em sede de Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imoveis, no valor de 27.024,79€ (vinte e sete mil e vinte e quatro euros e setenta e nove euros).

- Fixa-se o valor do processo em 27.024,79€ (vinte e sete mil e vinte e quatro euros e setenta e nove euros). Atendendo ao valor económico do processo aferido pelo valor das liquidações de imposto impugnadas, e em conformidade fixa-se as custas, no respetivo montante em 1.224,00€ (mil duzentos e vinte e quatro euros), a cargo da requerente de acordo com o artigo 12.º, n.º 2 do Regime de Arbitragem Tributária, do artigo 4.º do RCPAT e da Tabela I anexa a este último. – n.º 10 do art.º 35º, e n.º 1, 4 e 5 do art.º 43º da LGT, art.ºs 5.º, n.º 1, al. a) do RCPT, 97.º-A, n.º 1, al. a) do CPPT e 559.º do CPC).

Notifique.

 

Lisboa, 30 de Junho de 2014.

 

O Árbitro

Paulo Renato Ferreira Alves