Jurisprudência Arbitral Tributária


Processo nº 487/2014-T
Data da decisão: 2015-01-13  Selo  
Valor do pedido: € 175.724,02
Tema: IS – Verba 28 da TGIS – Terreno para construção
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DECISÃO ARBITRAL

 

CAAD: Arbitragem Tributária

Processo nº 487/2014 – T

 

I – RELATÓRIO

 

  1. Pedido

Banco “A”, SA, Sociedade Aberta, com o nº de pessoa colectiva …, com sede na Rua …, nº …, …, apresentou, ao abrigo do disposto no nº 1 do artigo 2º do Decreto-Lei nº 10/2011, de 20 de Janeiro, que instituiu Regime da Arbitragem Tributária (RJAT) e da Portaria n.º 112-A/2011, de 22 de Março, um pedido de pronúncia arbitral, com vista:

  1.  À declaração da ilegalidade dos actos de liquidação de Imposto do Selo (IS), ao abrigo da Verba 28.1 da respectiva Tabela Geral (TGIS) referentes a oito prédios descritos de que é proprietária;
  2. A condenação da AT – Autoridade Tributária e Aduaneira à restituição dos montantes de imposto indevidamente pago e ao pagamento dos correspondentes juros indemnizatórios.

O Requerente alega, no essencial, o seguinte:

  1. O Requerente foi notificado das seguintes liquidações de IS, ao abrigo da verba 28.1 da TGIS:
    • Liquidação n.º 2014…, referente ao prédio descrito como terreno para construção, inscrito na matriz predial urbana de Aveiro sob o artigo matricial …, de que é único proprietário (referido doravante como “prédio 1”);
    • Liquidação n.º 2014… referente ao prédio descrito como terreno para construção, inscrito na matriz predial urbana de Aveiro sob o artigo matricial …, de que é único proprietário (referido doravante como “prédio 2”);
    • Liquidação n.º 2014…, referente ao prédio descrito como terreno para construção, inscrito na matriz predial urbana de Aveiro sob o artigo matricial …, de que é único proprietário (referido doravante como “prédio 3”);
    • Liquidação n.º 2014…, referente ao prédio descrito como terreno para construção, inscrito na matriz predial urbana de Aveiro sob o artigo matricial …, de que é único proprietário (referido doravante como “prédio 4”);
    • Liquidação n.º 2014…, referente ao prédio descrito como terreno para construção, inscrito na matriz predial urbana de Aveiro sob o artigo matricial …, de que é único proprietário (referido doravante como “prédio 5”);
    • Liquidação n.º 2014…, referente ao prédio descrito como prédio habitacional, inscrito sob o artigo matricial … da Freguesia de Quarteira, de que é único proprietário (referido doravante como “prédio 6”);
    • Liquidação n.º 2014…, referente ao prédio urbano destinado a lazer, descrito como “Zonas Verdes”, inscrito sob o artigo matricial … da Freguesia … – Setúbal, no qual o Requerente é proprietário de 1/104 avos (referido doravante como “prédio 7”);
    • Liquidação n.º 2014 …, referente ao prédio urbano afecto a armazéns e actividade industrial, descrito sob o artigo matricial … da Freguesia … – Charneca da Caparica, de que o Requerente é único proprietário (referido doravante como “prédio 8”);
  2. Todas as liquidações estão feridas de ilegalidade por aplicarem uma norma de incidência tributária – a norma de incidência da verba 28.1 da TGIS – que viola o princípio constitucional da igualdade tributária. A norma em causa viola o princípio da igualdade tributária por excluir do seu âmbito as situações de propriedade de vários prédios cujo valor individual não atinge o valor de 1 000 000 de euros, mas que no conjunto ultrapassem esse valor. Desta forma, pessoas com a mesma capacidade contributiva serão tributadas de maneira diferente;
  3. Em relação às liquidações sobre o “prédio 1”, o “prédio 2”, o “prédio 3”, o “prédio 4”, o “prédio 5”, o “prédio 7” e o “prédio 8”, considera o Requerente que as mesmas são também ilegais por erro nos pressupostos de direito, uma vez que as situações descritas não preenchem a previsão da verba 28.1 da TGIS, não se tratando em nenhum dos casos de prédios com afectação habitacional, como é requerido naquela norma;
  4. Quanto aos terrenos para construção, não preenchem a previsão da norma da verba 28.1 da TGIS porque não existe nos prédios qualquer construção que possa ser destinada ao fim habitacional;
  5. Quanto ao prédio urbano com afectação industrial (“prédio 8), também neste caso inexiste afectação habitacional;
  6. E também no caso do “prédio 7”, descrito como “Zonas Verdes”, está excluída a afectação habitacional;
  7. Desde logo, o conceito de “afectação habitacional” remete para a utilização efectiva do prédio, o que leva a excluir do conceito qualquer prédio utilizado para outros fins que não o de habitação;
  8. Além disso, reconstituindo o pensamento do legislador, verifica-se que a norma em apreço pretendeu tributar as “propriedades de elevado valor destinadas a habitação” ou “casas de valor igual ou superior a um milhão de euros,” sendo que no conceito de “casa” ou de “habitação” nunca poderá caber um terreno para construção, um prédio destinado a lazer ou um prédio destinado a fins industriais.

 

  1. Requerimento apresentando pelo Demandante em 31-07-2014

Por requerimento apresentado em 31-07-2014, o Requerente, depois de declarar ter recebido notas de cobrança da segunda prestação do IS sobre os imóveis em causa e de ter procedido ao pagamento respectivo, veio requerer ao Tribunal que condenasse a Requerida à restituição das importâncias indevidamente pagas e ao pagamento dos correspondentes juros indemnizatórios.

No mesmo requerimento superveniente, o Requerente indicou ter sido notificado da anulação da liquidação n.º 2014…, referente ao prédio urbano afecto a armazéns e actividade industrial, descrito sob o artigo matricial … da Freguesia … - Charneca da Caparica e, consequentemente, declarou desistir do pedido quanto a essa liquidação.

 

  1. Resposta

Na sua resposta ao pedido de pronúncia arbitral, a Requerida AT -Autoridade Tributária e Aduaneira pugna pela improcedência do pedido, alegando, em síntese, o seguinte:

 

  1. Quanto à ilegalidade por erro nos pressupostos da aplicação da verba 28.1 da TGIS
  1. Na ausência de qualquer definição sobre os conceitos de prédio urbano, terreno para construção e afectação habitacional em sede de IS, há que recorrer ao CIMI na procura de uma definição que permita aferir da eventual sujeição a IS, de acordo com o previsto no art. 67º, nº 2 do CIS na redacção dada pela Lei nº 55-A/2012, de 29/10;
  2. Dispõe o nº 1 do art. 2º do CIMI que “prédio é toda a fracção de território, abrangendo águas, plantações, edifícios e construções de qualquer natureza nela incorporados ou assentes, com carácter de permanência, desde que faça parte do património de uma pessoa singular ou colectiva e, em circunstâncias normais tenha valor económico, bem como as águas, plantações, edifícios ou construções, nas circunstâncias anteriores, dotados de autonomia económica em relação ao terreno onde se encontrem implantados, embora situados numa fracção de território que constitua parte integrante de um património diverso ou não tenha natureza patrimonial”.
  3. Por sua vez o art. 6º, nº 1 do CIMI dispõe acerca das espécies de prédios urbanos existentes, integrando neste conceito os terrenos para construção, isto é os “terrenos situados dentro ou fora de um aglomerado urbano, para os quais tenha sido concedida licença ou autorização, admitida comunicação prévia ou emitida informação prévia favorável de operação de loteamento ou de construção, e ainda aqueles que assim tenham sido no título aquisitivo, exceptuando-se os terrenos em que as entidades competentes vedem qualquer daquelas operações…”
  4. A noção de afectação do prédio urbano encontra assento na parte relativa à avaliação dos imóveis, o que bem se compreende porquanto a avaliação do imóvel (finalidade) incorpora valor ao imóvel, constituindo um factor de distinção determinante (coeficiente) para efeitos de avaliação.
  5. Conforme resulta da expressão “…valor das edificações autorizadas”, constante do art. 45º, nº 2 do CIMI, o legislador optou por determinar a aplicação da metodologia de avaliação dos prédios em geral, à avaliação dos terrenos para construção, sendo-lhes por conseguinte aplicável o coeficiente de afectação previsto no art.º 41º do CIMI.
  6. Assim, para efeitos de determinação do valor patrimonial tributário dos terrenos para construção, é clara a aplicação do coeficiente de afectação em sede de avaliação, pelo que a sua consideração para efeitos de aplicação da verba 28.1 da TGIS não pode ser ignorada;
  7. A verba 28.1 da TGIS utiliza a expressão “prédios com afectação habitacional”, expressão diferente e mais ampla da utilizada no CIMI, pelo que o seu sentido há- de ser encontrado na necessidade de integrar outras realidades para além das identificadas no art. 6.º, nº1 alínea a) do CIMI;
  8. O facto de a avaliação dos terrenos para construção ter em conta a afectação habitacional, quando seja o caso, o facto de o alvará de licença para a realização de operações urbanísticas dever conter, entre outros elementos, o número de lotes e a indicação da área de localização, finalidade, área de implantação, área de construção, número de pisos, número de fogos de cada um dos lotes, com especificação dos fogos destinados a habitações a custos controlados e tudo isto ainda associado ao facto de os Planos Directores Municipais estabelecerem a estratégia de desenvolvimento municipal, a política municipal de ordenamento do território e de urbanismo e as demais políticas urbanas, torna possível, muito antes da efectiva edificação do prédio, apurar e determinar a afectação do terreno para construção;
  9. Por tudo isto se encontram totalmente sustentadas as liquidações de IS sobre imóveis com afectação “terreno para construção”;

 

  1. Quanto à questão da inconstitucionalidade da verba 28.1 da TGIS

Quanto à alegada inconstitucionalidade da verba 28.1 da TGIS, deve a mesma improceder, pelos seguintes motivos:

  1. O art.º 13º da Constituição da República “obriga a que se trate por igual o que for necessariamente igual e como diferente o que for essencialmente diferente, não impedindo a diferenciação de tratamento, mas apenas as discriminações arbitrárias, irrazoáveis, ou seja, as distinções de tratamento que não tenham justificação e fundamento material bastante”.
  2. A diferente valoração e tributação de um imóvel em propriedade total face a um imóvel constituído em propriedade horizontal decorre dos diferentes efeitos jurídicos inerentes a estas duas figuras;
  3. A diferente aptidão dos imóveis (habitação/serviços/comércio) sustenta o diferente tratamento, tendo constituído opção do legislador, por razões políticas e económicas, afastar da incidência do IS os imóveis destinados a outros fins que não os habitacionais;
  4. Assim, entende a AT que a previsão da verba 28.1 da TGIS não consubstancia qualquer violação do princípio da igualdade do art. 13º da CRP.

 

  1. Reunião prevista no artigo 18º do RJAT e alegações

Obtida a concordância das partes, o Tribunal deliberou dispensar a realização da reunião prevista no artigo 18º do RJAT bem como a fase de alegações finais.

 

  1. Requerimento apresentado pelo Demandante em 19-11-2014

Por requerimento superveniente de 19-11-2014, o Requerente, depois de referir ter recebido notas de cobrança da terceira prestação do IS sobre os imóveis em causa e de ter procedido ao pagamento respectivo, veio requerer ao Tribunal que condenasse a Requerida à restituição das importâncias indevidamente pagas e ao pagamento dos correspondentes juros indemnizatórios. Este Requerimento foi junto ao processo e notificado à Requerida, que sobre o mesmo não se pronunciou.

 

II – QUESTÕES A DECIDIR

São as seguintes as questões a decidir pelo Tribunal:

  1. A constitucionalidade da norma de incidência tributária constante da verba 28.1 da TGIS, à luz do princípio constitucional da igualdade tributária;

Subsidiariamente:

  1.  A legalidade da liquidação baseada no pressuposto de que a previsão da verba 28.1 da TGIS, na redacção em vigor até 31 de Dezembro de 2013, abrangia no seu âmbito de aplicação os prédios urbanos classificados como terrenos para construção;
  2. A legalidade da liquidação baseada no pressuposto de que a previsão da verba 28.1 da TGIS, na redacção em vigor até 31 de Dezembro de 2013, abrangia no seu âmbito de aplicação os prédios urbanos classificados como “zonas verdes” (questão suscitada pelo Requerente no parágrafo 23 da petição inicial).

 

III – SANEAMENTO

O Tribunal é competente e encontra-se regularmente constituído, nos termos dos artigos 2.º, n.º 1, alínea a), 5.º e 6.º, todos do RJAT.

As partes têm personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e encontram-se regularmente representadas.

É admissível a cumulação de pedidos, por se encontrarem verificados todos os pressupostos estabelecidos no artigo 3º, n.º 1 do RJAT.

Não foram identificadas nulidades no processo, pelo que nada obsta à apreciação do mérito do pedido.

 

IV – FUNDAMENTAÇÃO

  1. MATÉRIA DE FACTO

São os seguintes os factos provados considerados relevantes para a decisão:

  1. O Requerente era, à data da ocorrência dos factos tributários que deram origem às liquidações, proprietário/comproprietário dos seguintes prédios:
    • Prédio urbano (“prédio 1”) descrito como terreno para construção, inscrito na matriz predial urbana de Aveiro sob o artigo matricial …;
    • Prédio urbano (“prédio 2”) descrito como terreno para construção, inscrito na matriz predial urbana de Aveiro sob o artigo matricial …;
    • Prédio urbano (“prédio 3”) descrito como terreno para construção, inscrito na matriz predial urbana de Aveiro sob o artigo matricial …;
    • Prédio urbano (“prédio 4”) descrito como terreno para construção, inscrito na matriz predial urbana de Aveiro sob o artigo matricial …;
    • Prédio urbano (“prédio 5”) descrito como terreno para construção, inscrito na matriz predial urbana de Aveiro sob o artigo matricial …;
    • Prédio urbano (“prédio 6”) descrito como prédio habitacional, inscrito sob o artigo matricial … da Freguesia de Quarteira;
    • Prédio urbano (“prédio 7”) destinado a lazer, descrito como “zonas verdes”, inscrito sob o artigo matricial … da Freguesia … – Setúbal, no qual o Requerente é proprietário de 1/104 avos;
    • Prédio urbano (“prédio 8”) afecto a armazéns e actividade industrial, descrito sob o artigo matricial … da Freguesia … – Charneca da Caparica.
  2. O prédio classificado como “zonas verdes”, detido em compropriedade por 104 comproprietários é composto por piscina, campo de ténis, casa de apoio e jardim;
  3. Em Março de 2014, o Requerente foi notificado das liquidações de IS sobre os imóveis referenciados, ao abrigo da verba 28.1 da TGIS, sendo os seguintes os montantes do imposto liquidado, a título de 1ª prestação:
    • “Prédio 1”: 32 595,78 euros, liquidação n.º 2014…;
    • “Prédio 2”: 4 011,94 euros, liquidação n.º 2014…;
    • “Prédio 3”: 4 923,98 euros, liquidação n.º 2014…;
    • “Prédio 4”: 3 644,68 euros, liquidação n.º 2014…;
    • “Prédio 5”: 4 078,94 euros, liquidação n.º 2014…;
    •  “Prédio 6”: 5 30250 euros, liquidação n.º 2014…;
    • “Prédio 7”: 97,36 euros, liquidação n.º 2014…;
    • “Prédio 8”: 3 984,48 euros, liquidação n.º 2014….
  4. Posteriormente, já na pendência do presente processo arbitral, foram remetidas ao Requerente notas de cobrança referentes às 2ª e 3ª prestações do imposto relativo aos imóveis descritos;
  5. O Requerente procedeu ao pagamento dos montantes das três prestações do imposto liquidado;
  6. O Requerente foi ainda notificado da anulação da liquidação n.º 2014…, referente ao prédio urbano afecto a armazéns e actividade industrial, descrito sob o artigo matricial … da Freguesia … – Charneca da Caparica (“prédio 8”).

Os factos provados baseiam-se nos documentos carreados pelo Requerente para o processo, cuja autenticidade e correspondência à realidade não foram questionadas.

Não existem factos considerados não provados relevantes para a decisão.

 

  1. FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

 

  1. Delimitação do objecto do processo

Na pendência do actual processo, ocorreram factos que determinam a necessidade de redefinir o objecto do mesmo, relativamente ao que foi inicialmente peticionado.

O primeiro dos factos supervenientes foi a anulação, pela Administração Tributária, de uma das oito liquidações inicialmente impugnadas – em concreto a liquidação n.º 2014 …, referente ao prédio urbano afecto a armazéns e actividade industrial, descrito sob o artigo matricial … da Freguesia … – Charneca da Caparica (“prédio 8”). Anulada esta liquidação, deixou de existir o ato objecto de impugnação, pelo que o Tribunal não deverá pronunciar-se sobre a sua legalidade.

Segundo e terceiro factos supervenientes foram a notificação do Requerente para proceder ao pagamento, respectivamente, da 2ª e 3ª prestações do imposto cuja liquidação se impugna.

Tais factos são relevantes para a decisão da causa, apenas no que diz respeito ao quantum da obrigação de restituição do imposto indevidamente pago, se como tal for de qualificar o imposto pago, e dos correspondentes juros indemnizatórios.

Sendo relevantes para a decisão da causa, tais factos são supervenientes em relação ao momento da apresentação do pedido de pronúncia arbitral, pelo que, ao abrigo do artigo 524º do Código de Processo Civil, deve ser aceite a sua junção ao processo.

Aliás, os elementos de que se trata sempre deveriam acabar por ser trazidos ao processo pela própria Requerida, de acordo com o n.º 3 do artigo 63º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (aplicável no presente processo arbitral por força da al. c) do n.º 1 do artigo 29º do RJAT), o qual determina que “deve a Administração trazer ao processo a informação da existência dos eventuais actos conexos com o ato impugnado que venham a ser praticados na pendência do mesmo”. Nesta medida, a Requerente não fez mais do que antecipar-se à Administração Tributária.

Assim, no presente processo arbitral cumpre apreciar:

  1. A legalidade das liquidações identificadas com os números 2014 …, 2014 …, 2014…, 2014…, 2014…, 2014…, 2014…;
  2. No caso de virem a ser consideradas ilegais algumas ou todas as referidas liquidações, o direito do Requerente à restituição do imposto indevidamente pago e respectivos juros indemnizatórios, relativamente às três prestações pagas.

 

  1. Questão da inconstitucionalidade da verba 28.1 da TGIS

O Requerente baseia a arguição de inconstitucionalidade da verba 28.1 da TGIS no facto de esta incidir apenas sobre os prédios com afectação habitacional e no facto de esta recair unicamente sobre prédios cujo valor iguale ou exceda 1 milhão de euros, mas não sobre um conjunto de prédios cujo valor somado seja igual ou superior àquele montante.

Ora, da apresentação feita pelo Senhor Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, por ocasião da apresentação e discussão na Assembleia da República da proposta de lei que viria a dar origem à Lei nº 55-A/2012 (que introduziu a verba 28.1 da TGIS), em que aquele titular do Governo da República afirmou que: «O Governo propõe a criação de uma taxa especial sobre os prédios urbanos habitacionais de mais elevado valor. É a primeira vez que em Portugal é criada uma tributação especial sobre propriedades de elevado valor destinadas à habitação. Esta taxa (…) incidirá sobre as casas de valor igual ou superior a 1 milhão de euros”, retira-se – e já o entendeu assim o Supremo Tribunal Administrativo em acórdão proferido em 09-07-2014, no processo n.º 0676/14 – que a verba 28.1 da TGIS visa tributar as casas de habitação de elevado valor.

O legislador não pretendeu, portanto, tributar qualquer património imobiliário de elevado valor, mas apenas as casas de habitação de elevado valor, por considerar que a propriedade de uma casa de habitação de elevado valor manifesta uma capacidade contributiva especialmente elevada.

E com efeito, a propriedade de uma casa de habitação de elevado valor, sendo uma situação que se configura como consumo de rendimento, constitui, inquestionavelmente, manifestação de capacidade contributiva especialmente elevada, o que não ocorre necessariamente com a propriedade de imóveis com diferentes funções económicas, não caracterizáveis como situações de consumo de rendimento mas configurando-se antes, por exemplo, como investimento. 

A função económica dos prédios tributados na verba 28.1 – a habitação – é o que os distingue dos restantes imóveis, sendo que o legislador vê nos prédios com essa função económica uma manifestação de capacidade contributiva que não se verifica em relação a outros imóveis.

Tratando-se assim de tributar de forma diferentes situações diferentes, não procede, portanto, o argumento de ilegalidade das liquidações impugnadas por inconstitucionalidade da norma de incidência aplicada.

  1. Questão da aplicabilidade da verba 28.1 da TGIS aos terrenos para construção

Sobre esta questão, e nos exactos termos em que aqui é colocada, já se pronunciou reiteradas vezes o Supremo Tribunal Administrativo, maioritariamente em sentido concordante com o pugnado pelo Requerente (vejam-se os acórdãos daquele Tribunal proferidos de 24/9/2014, procs. n.ºs 01533/13, 0739/14 e 0825/14; de 10/9/2014, procs. n.ºs 0503/14, 0707/14 e 0740/14; de 9/7/2014, proc. nº 0676/14; de 2/7/2014, proc. nº 0467/14; de 28/5/2014, procs. nºs. 0425/14, 0396/14, 0395/14; de 14/5/2014, procs. nºs. 055/14, 01871/13 e 0317/14; de 23/4/2014, procs. nºs. 270/14 e 272/14; e em 9/4/2014, procs. nºs. 1870/13 e 48/14).

A mesma questão foi também objecto de pronúncia por parte dos tribunais arbitrais, nomeadamente nos processos n.ºs 151/2014-T, 42/2013-T, 48/2014-T, 49/2013-T, 53/2014-T, 75/2013-T, 144/2013-T, 158/2013-T, 180/2013-T, 189/2013-T, entre outros) sendo também a jurisprudência arbitral maioritariamente no sentido de que a previsão da verba 28.1 da TGIS, na redacção em vigor até 31 de Dezembro de 2013, não abrangia os terrenos para construção.

Entre os muitos arestos emanados do STA sobre esta questão, cita-se o acórdão proferido no processo já referido supra, em que se afirma:

“O conceito de “prédio (urbano) com afectação habitacional” não foi definido pelo legislador. Nem na Lei n.º 55-A/2012, que o introduziu, nem no Código do IMI, para o qual o n.º 2 do artigo 67.º do Código do Imposto do Selo (igualmente introduzido por aquela Lei), remete a título subsidiário. E é um conceito que, provavelmente mercê da sua imprecisão – facto tanto mais grave quanto é em função dele que se recorta o âmbito de incidência objectiva da nova tributação -, teve vida curta, porquanto foi abandonado aquando da entrada em vigor da Lei do Orçamento do Estado para 2014 (Lei n.º 83-C/2013, de 31 de Dezembro), que deu nova redacção àquela verba n.º 28 da Tabela Geral, e que recorta agora o seu âmbito de incidência objectiva através da utilização de conceitos que se encontram legalmente definidos no artigo 6.º do Código do IMI.

Esta alteração - a que o legislador não atribuiu carácter interpretativo, nem nos parece que o tenha –, apenas torna inequívoco para o futuro que os terrenos para construção cuja edificação, autorizada ou prevista, seja para habitação se encontram abrangidos no âmbito da verba 28.1 da Tabela Geral do Imposto do Selo (desde que o respectivo valor patrimonial tributário seja de valor igual ou superior a 1 milhão de euros), nada esclarecendo, porém, em relação às situações pretéritas (liquidações de 2012 e 2013), como a que está em causa nos presentes autos.

Ora, quanto a estas, não parece poder perfilhar-se a interpretação da recorrente, porquanto não resulta inequivocamente nem da letra, nem do espírito da lei que a intenção desta tenha sido, ab initio, a de abranger no seu âmbito de incidência objectiva os terrenos para construção para os quais tenha sido autorizada ou prevista a construção de edifícios habitacionais, como resulta hoje inequivocamente da verba 28.1 da Tabela Geral do Imposto do Selo.

Da letra da lei nada de inequívoco decorre, aliás, pois ela própria ao utilizar um conceito que não definiu e que também não se encontrava definido no diploma para o qual remeteu a título subsidiário prestou-se, desnecessariamente, a equívocos, em matéria – de incidência tributária - em que a certeza e a segurança jurídica deviam também ser preocupações cimeiras do legislador.

E do seu “espírito”, apreensível na exposição de motivos da proposta de lei que está na origem da Lei n.º 55-A/2012 (…) nada mais decorre senão a preocupação de angariar novas receitas fiscais, sobre fontes de riqueza “mais poupadas” no passado à voragem do Fisco que os rendimentos do trabalho, em particular os rendimentos de capitais, mais-valias mobiliárias e a propriedade, motivos estes que nenhum contributo relevante trazem ao esclarecimento do conceito de “prédios (urbanos) com afetação habitacional”, porquanto o dão como assente, sem preocupação alguma de o esclarecer. Tal esclarecimento terá, porém, surgido (…), aquando da apresentação e discussão na Assembleia da República daquela proposta de lei, nas palavras do Senhor Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, que terá referido expressamente, (…) que: «O Governo propõe a criação de uma taxa especial sobre os prédios urbanos habitacionais de mais elevado valor. É a primeira vez que em Portugal é criada uma tributação especial sobre propriedades de elevado valor destinadas à habitação. Esta taxa será de 0,5% a 0,8% em 2012 e de 1% em 2013, e incidirá sobre as casas de valor igual ou superior a 1 milhão de euros” (…) donde se colhe que a realidade a tributar tida em vista são, afinal, e não obstante a imprecisão terminológica da lei, “os prédios (urbanos) habitacionais”, em linguagem corrente “as casas”, e não outras realidades.

O facto de se poder considerar que na determinação do valor patrimonial tributário dos prédios urbanos classificados como terrenos para construção se deve levar em conta a afectação que terá a edificação para ele autorizada ou prevista para determinação do respectivo valor da área de implantação (cfr. os n.ºs 1 e 2 do artigo 45.º do CIMI), não determina que os terrenos para construção possam ser classificados como “prédios com afectação habitacional”, porquanto a “afectação habitacional” surge sempre no Código do IMI referida a “edifícios” ou “construções”, existentes, autorizados ou previstos, porquanto apenas estes podem ser habitados, o que não sucede no caso dos terrenos para construção, que não têm, em si mesmos, condições para tal, não sendo susceptíveis de serem utilizados para habitação senão se e quando neles for edificada a construção para eles autorizada e prevista (mas nesse caso não serão já “terrenos para construção” mas outra espécie de prédios urbanos – “habitacionais”, “comerciais, industriais ou para serviços” ou “outros” – artigo 6.º do CIMI).

Estranho seria, aliás, que a determinação do âmbito da norma de incidência objectiva da verba n.º 28 da Tabela Geral do Imposto do Selo se encontrasse, ao fim e ao cabo, nas normas de determinação do valor patrimonial tributário do Código do IMI, e que a imprecisão terminológica do legislador na redacção daquela regra fosse, afinal, elucidada e finalmente esclarecida por via de uma remissão, indirecta e equívoca, para o coeficiente de afectação estabelecido pelo legislador em relação a prédios edificados (artigo 41.º do Código do IMI).

Assim, atendendo a que um terreno para construção – qualquer que seja o tipo e a finalidade da edificação que nele será, ou poderá ser, erigida – não satisfaz, só por si, qualquer condição para como tal ser licenciado ou para se poder definir como sendo a habitação o seu destino normal, e referindo-se a norma de incidência do Imposto do Selo a prédios urbanos com “afectação habitacional”, sem que seja estabelecido qualquer conceito específico para o efeito, não pode dela extrair-se que na mesma se contenha uma potencialidade futura, inerente a um distinto prédio que porventura venha a ser edificado no terreno.

Conclui-se pois, em conformidade com o decidido na sentença sob recurso que, resultando do artigo 6.º do Código do IMI uma clara distinção entre prédios urbanos “habitacionais” e “terrenos para construção”, não podem estes ser considerados como “prédios com afectação habitacional” para efeitos do disposto na verba n.º 28.1 da Tabela Geral do Imposto do Selo, na sua redacção originária, que lhe foi conferida pela Lei n.º 55-A/2012, de 29 de Outubro.”.

Estribando-nos nesta jurisprudência, que inteiramente se acolhe, conclui-se pela procedência da arguição do vício de ilegalidade das liquidações números 2014…, 2014 …, 2014…, 2014.. e 2014…, referentes aos prédios classificados como terrenos para construção.

 

  1. Questão da aplicabilidade da verba 28.1 da TGIS ao prédio classificado como “zonas verdes”

Quanto ao prédio descrito como “Zonas Verdes”, inscrito sob o artigo matricial … da Freguesia … – Setúbal, no qual o Requerente é proprietário de 1/104 avos, é o mesmo composto por piscina, campo de ténis, casa de apoio e jardim.

Sendo certo que o prédio em questão poderá ser um logradouro de um conjunto de edificações habitacionais, o facto é que é possível autonomizar o mesmo daquele conjunto de edificações habitacionais, o que, de resto, é comprovado pela sua descrição de registo predial e inscrição matricial perfeitamente autónomas.

E independentemente da sua localização geográfica e/ou da sua possível integração em conjunto de edificações habitacionais, constata-se que o prédio tem capacidade para ter autonomia, física e económica, em relação ao mesmo.

Os proprietários do prédio (neste caso, em regime de compropriedade) poderão explorar o mesmo, directa ou indirectamente, cumpridos que sejam os respectivos preceitos legais eventualmente aplicáveis.

Adicionalmente, e desconhecendo-se qualquer ónus referente ao prédio, e mesmo que se trate de um prédio integrado em conjunto de edificações habitacionais, os seus proprietários poderão proceder à alienação da sua respetiva parte no prédio urbano em apreço, de forma autónoma e independente de qualquer alienação da sua propriedade individual em edifício habitacional, da qual não fará, necessariamente, parte integrante.

Ora, a própria Autoridade Tributária e Aduaneira aparenta aceitar tal autonomia, na medida em que claramente descreve o prédio como “zonas verdes”. Assim, por maioria de razão, a justificação aduzida anteriormente quanto à incapacidade de um terreno para construção ser habitado, é plenamente válida também nesta situação, em que existe um prédio urbano que não contém qualquer construção ou edifício que permita a sua utilização normal como habitação. O prédio não será, nem no futuro – mantendo-se as circunstâncias atuais –, passível de ser licenciado para habitação, pelo simples facto de não existir realidade física que o permita.

Nestes termos, há que concluir pela procedência do pedido de anulação da liquidação n.º 2014…, referente ao prédio destinado a lazer, descrito como “Zonas Verdes”, inscrito sob o artigo matricial …da Freguesia … - Setúbal.

 

  1. Do direito a juros indemnizatórios

Verificada a ilegalidade das liquidações números 2014…, 2014…, 2014…, 2014 …, 2014 … e 2014.., referentes aos prédios classificados como terrenos para construção e ao prédio classificado como zonas verdes, pelos fundamentos expostos, e tendo o Requerente pago na totalidade o imposto referente a estas liquidações (1.ª prestação), bem como às demais prestações, nos termos juntos aos autos, tem o Requerente direito, em conformidade com os artigos 24.º, n.º 1, al. b) do RJAT e 100.º da LGT, ao reembolso do imposto indevidamente pago, no montante de 49 352,98 euros (1.ª prestação) e demais prestações pagas na pendência do presente processo.

Quanto aos juros indemnizatórios, o artigo 43º da LGT estipula que “são devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido”.

Quanto à existência, no caso, de erro imputável aos serviços, este erro considera-se verificado, segundo jurisprudência uniforme do STA (vejam-se, neste sentido, os acórdãos do STA de 22-05-2002, proc. n.º 457/02; de 31.10.2001, proc. n.º 26167; de 2.12.2009, proc. n.º 0892/09) sempre que procederem a reclamação graciosa ou impugnação da liquidação (no mesmo sentido, a decisão no processo arbitral 218/2013-T, já citado).

Por conseguinte, tem a Requerente direito a juros indemnizatórios, nos termos do art.º 43.º, n.º 1 da LGT e 61.º, n.ºs 2 e 5 do CPPT, sobre as quantias pagas, contados desde a data dos pagamentos de imposto indevido até ao seu integral reembolso.

 

VI. DECISÃO

Pelos fundamentos expostos, o presente Tribunal decide:

  1. Anular os actos de liquidação de Imposto do Selo impugnados pela Requerente com os números 2014…, 2014…, 2014…, 2014…, 2014… e 2014…, referentes aos prédios classificados como terrenos para construção e zonas verdes e demais actos de liquidação subsequentes, emitidos na pendência do presente processo;
  2. Julgar improcedente o pedido de anulação da liquidação n.º 2014…,, referente ao prédio classificado como prédio urbano habitacional, inscrito sob o artigo matricial … da Freguesia de Quarteira, por não se verificar o vício de violação de lei constitucional;
  3. Condenar a Autoridade Tributária, nos termos da al. b) do n.º 1 do art.º 24º do RJAT, a restabelecer a situação que existiria se os actos de liquidação anulados não tivessem sido praticados, adoptando os actos e operações necessários para o efeito, nomeadamente através:
    1. Da restituição do imposto indevidamente pagos com base na liquidação n.º 2014…, no montante de 32.595,78 euros e do pagamento dos correspondentes juros indemnizatórios;
    2. Da restituição do imposto indevidamente pagos com base na liquidação n.º 2014…, no montante de 4.011,94 euros e do pagamento dos correspondentes juros indemnizatórios;
    3. Da restituição do imposto indevidamente pagos com base na liquidação n.º 2014…, no montante de 4.923,98 euros e do pagamento dos correspondentes juros indemnizatórios
    4. Da restituição do imposto indevidamente pagos com base na liquidação n.º 2014…, no montante de 3.644,68 e do pagamento dos correspondentes juros indemnizatórios
    5. Da restituição do imposto indevidamente pagos com base na liquidação n.º 2014…, no montante de 4.078,94 euros e do pagamento dos correspondentes juros indemnizatórios
    6. Da restituição do imposto indevidamente pagos com base na liquidação n.º 2014…, no montante de 97,36 euros e do pagamento dos correspondentes juros indemnizatórios

 

Valor do processo: Fixa-se o valor do processo em 175 724,02 euros.

 

Custas: Nos termos do artigo 22.º, n.º 4, do RJAT, fixa-se o montante das custas em 3672,00 euros, nos termos da Tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, a suportar partes na proporção de 5/6 pela Requerida e 1/6 pelo Requerente.

 

Registe-se e notifique-se esta decisão arbitral às partes.

 

Lisboa, Centro de Arbitragem Administrativa, 13 de Dezembro de 2014.

 

O Árbitro Presidente

Manuel Luís Macaísta Malheiros

O árbitro vogal

Ana Pedrosa Augusto

 

O árbitro vogal

Nina Aguiar

 

 

 

 

 

 

 

 

DECLARAÇÃO DE VOTO DE VENCIDO

 

Votei vencida quanto à questão da legalidade da liquidação referente ao prédio qualificado pela administração tributária como “zonas verdes”, por considerar, contrariamente ao entendimento maioritário do tribunal, que um logradouro de um conjunto de prédios habitacionais deverá ser tratado em paridade com um logradouro de um único prédio habitacional.

Com efeito, se um sujeito passivo for proprietário de uma moradia com um logradouro com piscina, campo de ténis e casa de apoio (como é o caso), esse logradouro será tratado como prédio urbano habitacional (art.º 4.º do CIMI, conjugado com o art.º 3º do mesmo código).

Se, nesse prédio habitacional único, a moradia representar 70% do valor do prédio, e o logradouro representar 30% do valor do prédio, o Imposto do Selo (se for aplicável) incidirá da mesma forma sobre os 70% representados pela edificação e sobre os 30% representados pelo logradouro. Além disso, o valor do logradouro será computado para efeitos de determinar a incidência de Imposto do Selo.

O mesmo deverá acontecer se o logradouro servir um conjunto de prédios, pois a substância dos factos é exactamente igual.

Considero que a inscrição matricial autónoma do logradouro não contribui em nada para alterar a sua qualificação como prédio urbano habitacional, e não implica um reconhecimento de uma qualificação diferente por parte da administração tributária, porquanto essa inscrição autónoma deve-se apenas e exclusivamente à circunstância de o mesmo ser objecto de uma compropriedade, o que torna necessária a autonomização matricial. Ou seja, a autonomização matricial é uma consequência necessária de um aspecto meramente formal, que nada tem a ver com a função económica do prédio.

Também não concordo com o argumento de que o prédio não é habitacional por “independentemente da sua localização geográfica e/ou da sua possível integração em conjunto de edificações habitacionais”, ter “capacidade para ter autonomia, física e económica, em relação ao mesmo”, e isto por “os proprietários do prédio poderem explorar o mesmo, directa ou indirectamente”. Também no caso de um logradouro de uma moradia, o logradouro pode ter capacidade para ter “autonomia física e económica” em relação à parte edificada e também nesse caso o seu proprietário poderá dar ao prédio uma afectação autónoma, “cumpridos que sejam os respectivos preceitos legais eventualmente aplicáveis”. Mas então o prédio será necessariamente requalificado de acordo com a função comercial ou outra que passe a ter. Neste caso, o prédio – inscrito autonomamente por se encontrar em compropriedade e apenas por essa razão – não está classificado como prédio com afectação comercial ou industrial, pelo que não tem outra função económica que não seja a de logradouro habitacional.

Se os proprietários do prédio em apreço procederem à alienação separada da sua quota no prédio, o adquirente adquirirá nada mais que uma parcela ideal num prédio que tem a função de logradouro de um prédio habitacional, e que não deixará de ter essa função em virtude da alienação.

Finalmente, não podemos acompanhar igualmente o argumento de que o prédio, ao ser qualificado como “zonas verdes”, não tem capacidade para ser habitado (“tal como um terreno para construção”), pelo simples facto de que, sendo um logradouro de um conjunto de prédios habitacionais, o prédio já é habitado. Com efeito, um logradouro de uma moradia, composto por jardim, piscina e campo de ténis, é habitado, da mesma forma que é habitada uma varanda, um terraço, um sótão ou uma garagem de um prédio habitacional.

Em suma, considero que a argumentação em que se baseia esta parte da decisão privilegia um aspecto formal – a autonomização matricial requerida, também ela, por outro aspecto formal, que é a existência de uma situação de compropriedade – sobre a substância da situação do prédio, que é a de logradouro de um conjunto de prédios habitacionais.

 

Lisboa, 13 de Janeiro de 2015

Nina Aguiar

 

 

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Texto elaborado em computador, nos termos do n.º 5 do artigo 131.º do CPC, aplicável por remissão da alínea e) do n.º 1 do artigo 29.º do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20/01.

A redacção da presente decisão rege-se pela ortografia antiga.