Sumário
I. A anulação administrativa (com efeitos retroativos) dos atos tributários de IRC impugnados na ação arbitral retira à lide o seu objeto. Ocorre, assim, uma situação de impossibilidade superveniente da lide, por não poder anular-se juridicamente o que não existe, com a consequente extinção da instância arbitral.
II. A anulação dos atos tributários não produz efeitos no procedimento arbitral até à sua comunicação ao CAAD, devendo ser notificada ao seu Presidente, nos termos do disposto no artigo 13.º, n.º 1 do RJAT.
III. Encontrando-se o Tribunal Arbitral constituído com observância dos prazos e condições previstos no artigo 11.º, n.º 7 e 13.º, n.º 1 do RJAT, a subsequente comunicação da anulação dos atos tributários não produz efeitos impeditivos ou extintivos da formação do Tribunal, conduzindo antes a uma decisão de extinção da instância por impossibilidade ou inutilidade superveniente da lide.
IV. Na modalidade de designação de árbitro prevista no artigo 6.º, n.º 2, alínea b) não há lugar à restituição da taxa de arbitragem paga pelo sujeito passivo, mesmo que este tenha ganho de causa.
DECISÃO ARBITRAL
Os árbitros designados para formarem o Tribunal Arbitral Coletivo, constituído em 30 de setembro de 2025, Alexandra Coelho Martins (presidente), Pedro Galego, indicado pela Requerente, e Jorge Carita, indicado pela Autoridade Tributária e Aduaneira, acordam no seguinte:
I. Relatório
A..., Lda., doravante “Requerente”, com o número único de identificação de pessoa coletiva ... e sede em ..., ..., ...-... Porto Salvo, veio requerer a constituição de Tribunal Arbitral e deduzir pedido de pronúncia arbitral, na sequência da formação da presunção de indeferimento tácito da reclamação graciosa apresentada contra os atos de liquidação de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (“IRC”) n.º 2024 ... e juros compensatórios correlativos n.º 2024 ..., referentes ao período de tributação de 2020, ao abrigo do disposto nos artigos 57.º, n.ºs 1 e 5 e 95.º, n.º 2, alínea d) da Lei Geral Tributária (“LGT”), 99.º, alíneas a) e c) e 102.º, n.º 1, alínea d) do Código de Procedimento e de Processo Tributário (“CPPT”), 137.º, n.º 1 do Código do IRC, e 2.º, n.º 1, alínea a), 5.º, n.º 3, alínea b), 6.º, n.º 2, alínea b), e 10.º, n.ºs 1, alínea a), e 2 do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (“RJAT”).
É demandada a Autoridade Tributária e Aduaneira, doravante referida por “AT” ou “Requerida”.
A Requerente pretende que seja declarada a ilegalidade, com a consequente anulação, das liquidações adicionais de IRC e juros compensatórios do exercício de 2020, no valor total de € 622 299,85, derivadas de correções de preços de transferência, por entender que as mesmas violam o artigo 63.º do Código deste imposto e o princípio de plena concorrência.
Em 18 de junho de 2025, o pedido de constituição do Tribunal Arbitral apresentado pela Requerente em 16 de junho de 2025 foi aceite e, de seguida, notificado à AT.
A Requerente designou como árbitro o Dr. Pedro Galego, ao abrigo do disposto no artigo 6.º, n.º 2, alínea b) do RJAT, tendo a Requerida indicado o Dr. Jorge Carita.
Os árbitros designados pelas Partes comunicaram ao Centro de Arbitragem Administrativa (“CAAD”) a designação, por acordo, da Dra. Alexandra Coelho Martins como árbitro presidente, nos termos do disposto nos artigos 6.º, n.º 2, alínea b) e 11.º, n.º 6 do RJAT, tendo todos os árbitros comunicado a aceitação do encargo.
Em 12 de setembro de 2025, o Exmo. Presidente do CAAD informou as Partes, para efeitos do disposto no artigo 11.º, n.º 7 do RJAT, não tendo sido manifestada oposição.
O Tribunal Arbitral Coletivo ficou constituído em 30 de setembro de 2025.
Notificada pelo Tribunal para apresentar resposta por despacho de 30 de setembro de 2025, a Requerida veio, no mesmo dia, requerer a junção aos autos do despacho de anulação, dos atos de liquidação adicional de IRC e juros compensatórios do exercício de 2020 impugnados nesta ação. O despacho de anulação, datado de 29 de setembro de 2025 e proferido pelo Senhor Subdiretor Geral da AT, determinou também o pagamento de juros indemnizatórios à Requerente, nos termos do artigo 43.º, n.º 1 da LGT.
A Requerente pronunciou-se no sentido de não manter interesse no prosseguimento da ação, concordando com a extinção da instância por inutilidade superveniente da lide imputável à AT, por ter sido satisfeita integralmente a sua pretensão, incluindo em matéria de juros indemnizatórios.
Mais requereu a devolução da taxa de arbitragem que suportou, em virtude de os atos tributários terem sido revogados no dia 29 de setembro de 2025, um dia antes da constituição do Tribunal Arbitral, nos termos do artigo 3.º-A, alínea b), ii. do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária (“RCPAT”), aplicável ex vi artigo 12.º, n.º 1 do RJAT.
A título subsidiário, na hipótese de se considerar que o Tribunal Arbitral foi formalmente constituído, peticiona o reembolso da taxa de arbitragem com fundamento na alteração da utilidade económica do pedido formulado, por causa imputável à Requerida.
Preconiza que as alterações ao valor do pedido na pendência do processo arbitral terão de ser devidamente relevadas, incluindo para efeitos das custas do processo.
Por despacho de 17 de outubro de 2025, foi dispensada a reunião prevista no artigo 18.º do RJAT, bem como a apresentação de alegações.
II. Matéria de Facto
A. A Requerente apresentou, em 16 de junho de 2025, pedido de pronúncia arbitral (“ppa”), com pedido de anulação das liquidações de IRC n.º 2024... e liquidação de juros compensatórios correlativos n.º 2024..., ambas de 28 de junho de 2024, referentes ao período de tributação de 2020, no valor global de € 622 299,85, dos quais € 64 382,17 respeitantes a juros compensatórios – cf. documento junto pela Requerida contendo o despacho e respetiva fundamentação registo de entrada do ppa no sistema de gestão processual (“SGP”) do CAAD.
B. A Requerida foi notificada da apresentação do ppa por via eletrónica, em 23 de junho de 2025 – cf. registo da notificação no sistema de gestão processual (“SGP”) do CAAD.
C. Por despacho de 29 de setembro de 2025, a AT anulou os atos tributários sindicados que constituem o objeto desta ação identificados no ponto A supra, por despacho do Senhor Subdiretor Geral da AT – cf. documento junto pela Requerida contendo o despacho de anulação administrativa e respetiva fundamentação.
D. Esse despacho foi notificado à Requerente, por via postal registada, com data de expedição de 30 de setembro de 2025 – cf. Ofício de notificação n.º ... da Direção de Serviços IRC junto pela Requerente com o requerimento apresentado em 9 de outubro de 2025, registado no SGP do CAAD 13 de outubro de 2025.
E. Em 30 de setembro de 2025 foi constituído o tribunal arbitral – cf. registo da constituição no SGP do CAAD.
F. Nessa data, o Tribunal Arbitral determinou a notificação da Requerida para apresentar a sua resposta no prazo de 30 dias, nos termos do disposto no artigo 17.º, n.º 1 do RJAT – cf. registo do despacho no SGP do CAAD.
G. Por e-mail enviado ao CAAD em 30 de setembro de 2025, quando já se encontrava constituído o tribunal arbitral, a Requerida veio comunicar aos autos a revogação do ato tributário e os seus fundamentos, tendo o seu requerimento sido registado no SGP do CAAD em 2 de outubro de 2025 – cf. registo no SGP do CAAD.
III. Saneamento - Regularidade da Constituição do Tribunal Arbitral
Com a emissão do despacho de anulação administrativa das liquidações de IRC e juros compensatórios aqui impugnadas, datado de 29 de setembro de 2025, no dia anterior ao da constituição do Tribunal Arbitral, suscita-se a questão da sua regularidade, conforme implicado pela Requerente no âmbito do pedido de reembolso da taxa arbitral paga.
Vejamos. A constituição do Tribunal ocorreu nos termos estipulados no artigo 11.º, n.º 7 do RJAT, depois de transcorrido o prazo de 10 dias – contado em dias úteis, de acordo com o disposto no artigo 87.º do CPA, por remissão do artigo 3.º-A do RJAT – após a comunicação da designação do árbitro presidente às Partes, por via eletrónica, registada no sistema de gestão processual em 12 de setembro de 2025. Foi, de igual modo, cumprida a condição cumulativa do decurso do prazo de 30 dias, previsto no artigo 13.º, n.º 1 do RJAT (também contado nos termos do artigo 87.º do CPA, por remissão do artigo 3.º-A do RJAT), desde a data em que a Requerida tomou conhecimento do pedido de constituição do tribunal arbitral, no caso, em 23 de junho de 2025[1].
Por outro lado, a expedição da comunicação ao CAAD, por via eletrónica, da anulação administrativa dos atos tributários pela Requerida verificou-se no dia 30 de setembro de 2025 e foi registada no sistema de gestão processual em 2 de outubro de 2025, em qualquer dos casos quando o Tribunal já se encontrava constituído nos termos legais, não lhe sendo anterior, como teria de ser (e seria exigível) para a sua invocação como facto impeditivo da formação do Tribunal.
Aliás, depreende-se do artigo 13.º, n.º 1 do RJAT que só com a comunicação ao CAAD da anulação do ato tributário (referida na norma como “revogação”) esta produz efeitos procedimentais[2] e não a anulação propriamente dita, prevendo-se que esta deve ser notificada ao presidente do CAAD.
Efetivamente, de outra forma não ficaria assegurado que o ato anulatório chegasse ao conhecimento dos intervenientes no procedimento como condição essencial, que é, para a produção de efeitos externos.
Deste modo, a data da decisão de anulação dos atos tributários não releva ou constitui critério (legal) de aferição da regular constituição do Tribunal Arbitral, nem produz efeitos até à sua comunicação ao CAAD.
Adicionalmente, interessa notar que a anulação administrativa dos atos objeto da ação arbitral pelo despacho datado de 29 de setembro de 2025 foi comunicada por via postal registada à Requerente, por ofício de 30 de setembro de 2025.
Conforme dispõe o artigo 36.º, n.º 1 do CPPT, os atos em matéria tributária que afetem os direitos e interesses legítimos dos contribuintes produzem efeitos em relação a estes quando lhes sejam validamente notificados. Sendo as notificações efetuadas por carta registada, presumem-se feitas no terceiro dia posterior ao do registo, segundo o disposto no artigo 39.º, n.º 1 do CPPT. Assim, a Requerente foi notificada da anulação administrativa no terceiro dia posterior ao do registo postal, ou seja, no dia 3 de outubro de 2025, não tendo aquela alegado, nem demonstrado que o foi em momento anterior, que, em qualquer caso nunca seria antes de 30 de setembro, data de constituição do Tribunal Arbitral.
A produção de efeitos e oponibilidade dos atos não pode deixar de depender da sua comunicação aos visados (em regra, por via de notificação que lhes é dirigida), de modo que o conhecimento dos factos e eventos relevantes sejam acessíveis e cognoscíveis, regra elementar e estruturante de uma ordem jurídica regida pelo Estado de direito (v. artigo 2.º da Constituição).
À face do exposto, conclui-se que este Tribunal Arbitral foi regularmente constituído e é competente (v. artigos 2.º, n.º 1, alínea a) e 10.º, n.º 1 do RJAT).
As Partes estão devidamente representadas gozam de personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e estão representadas (v. artigos 4.º e 10.º, n.º 2 do RJAT).
O processo não enferma de nulidades.
IV. Fundamentação
1. Anulação Administrativa do Ato - Impossibilidade Superveniente da Lide
Os atos tributários sindicados, que constituem o objeto desta ação, foram anulados administrativamente.
Nestas circunstâncias, o pedido de anulação das liquidações adicionais de IRC e de juros compensatórios, relativas ao ano de 2020, ficou sem objeto, pois, com a anulação administrativa, os efeitos jurídicos de tais atos foram destruídos com eficácia retroativa, de acordo com o preceituado no artigo 171.º, n.º 3 do Código do Procedimento Administrativo (“CPA”), verificando-se uma impossibilidade superveniente da lide. Como refere a Decisão Arbitral no processo n.º 31/2013-T, do CAAD, de 4 de novembro de 2013, “torna-se impossível juridicamente anular o que já não existe”.
À face do exposto, conclui-se que a anulação administrativa dos atos tributários controvertidos comunicada pela Requerida ao CAAD por via eletrónica (e-mail) em 30 de setembro de 2025, registado no sistema de gestão processual em 2 de outubro de 2025, dá satisfação à pretensão anulatória deduzida nesta ação, no valor de € 622 299,85, bem como ao pedido de juros indemnizatórios, retirando à lide arbitral o seu objeto.
Termos em que se julga extinta a instância processual, ao abrigo do disposto nos artigos 277.º, alínea e) e 611.º do CPC, aplicáveis por remissão do artigo 29.º, n.º 1 alínea e) do RJAT.
2. Responsabilidade para Efeitos de Custas
A Requerente alega dois fundamentos para que lhe seja restituída a taxa de arbitragem.
O primeiro prende-se com o entendimento de que a “revogação” operada antes da constituição do Tribunal Arbitral fez cessar o procedimento arbitral, de onde conclui que tem direito a ser reembolsada da taxa de arbitragem paga quando da propositura da ação, invocando o disposto no artigo 3.º-A, alínea b), ii. do RCPAT, segundo o qual: “Cessando o procedimento [arbitral] por qualquer motivo antes de ser constituído o tribunal arbitral, o requerente é reembolsado da taxa de arbitragem paga”.
No entanto, ao contrário do que a Requerente invoca, o procedimento arbitral não terminou antes da constituição do Tribunal Arbitral, nem foi a anulação administrativa dos atos tributários que o cessou. A constituição do Tribunal Arbitral efetivou-se nos termos legais e produziu os seus efeitos, por não ter sido comunicada pela Requerida a “revogação” do ato tributário dentro do prazo de 30 dias previsto na lei (no artigo 13.º, n.º 1 do RJAT), passível de obstar a essa constituição. Por conseguinte, findo aquele prazo (do artigo 13.º, n.º 1, conjugado com o do artigo 11.º, n.º 7, ambos do RJAT) impunha-se constituir o Tribunal Arbitral, o que sucedeu, como acima referido, em 30 de setembro de 2025, desconhecendo o CAAD e, bem assim, a Requerente, pelo menos até essa data, a referida anulação administrativa.
Aliás, não só o Tribunal Arbitral foi regularmente constituído, como logo foi iniciada a tramitação, com a inserção de despacho do Tribunal no SGP para que a Requerida fosse notificada para apresentar a sua resposta, nos termos do preceituado no artigo 17.º, n.º 1 do RJAT. Só depois chegou ao conhecimento do CAAD e do Tribunal a anulação administrativa dos atos tributários objeto da ação arbitral.
Nestes moldes, soçobra a pretendida devolução da taxa de arbitragem fundada no pressuposto da cessação do procedimento arbitral antes da constituição do Tribunal Arbitral, por se constatar que o mesmo não se verificou, não tendo, por esta razão, suporte legal.
O segundo argumento da Requerente para peticionar o reembolso da taxa de arbitragem é, a título subsidiário, o da alteração da utilidade económica do pedido na pendência da ação arbitral que preconiza dever ser relevada e suscitar uma alteração no valor da taxa de arbitragem liquidado, invocando a posição doutrinária de Carla Castelo Trindade (v. Regime Jurídico da Arbitragem Tributária Anotado, Almedina, 2016, pp 318-319) .
No entanto, de novo se afigura não lhe assistir razão. A regra do nosso sistema processual é que a determinação do valor da causa atende ao momento em que a ação é proposta. Dispõe o artigo 299.º, n.º 1 do Código de Processo Civil (“CPC”) que: [n]a determinação do valor da causa, deve atender-se ao momento em que a ação é proposta, exceto quando haja reconvenção ou intervenção principal.” Esta norma é subsidiariamente aplicável ao processo arbitral, ao abrigo do artigo 29.º, n.º 1, alínea e) do RJAT. A ação considera-se proposta com a apresentação da petição – no caso denominada pedido de pronúncia arbitral (“ppa”) – logo que aquela seja recebida na secretaria do CAAD, como resulta do artigo 78.º, n.º 1 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (“CPTA”), ex vi artigo 29.º, n.º 1, alínea c) do RJAT), 259.º do CPC[3] e do preceituado no artigo 13.º, n.º 5 do RJAT que atribui à apresentação do ppa os efeitos da apresentação de impugnação judicial.
Ressalvadas as exceções previstas na lei, as modificações ocorridas na pendência da causa não têm influência sobre o seu valor, que se mantém até final. Como afirma Jorge Lopes de Sousa (Guia da Arbitragem Tributária, revisto e atualizado, 2.ª edição, Almedina, Coimbra, 2017, p. 153) “são irrelevantes as modificações de valor que possam advir da revogação, ratificação, reforma ou conversão do ato tributário cuja ilegalidade foi suscitada ou de desistência ou redução de pedidos. Da mesma forma não implicarão alteração ao valor da causa, eventuais ampliações do pedido primitivo que se considerem admissíveis, por serem, desenvolvimento ou consequência do pedido primitivo (artigo 265.º, n.º 2, do CPC), como, por exemplo aumento derivado de juros indemnizatórios ou de indemnização por garantia indevida.”
Este regime justifica-se pelo interesse em assegurar a estabilidade da instância, tornando-a imune às vicissitudes suscitadas ao longo da pendência processual, desde logo prevenindo que o juiz não seja constantemente chamado a validar ou corrigir tal valor sempre que surjam variações (aliás, como também sucede com a determinação da competência, por similitude de razões).
O referido princípio não é afastado pelo CPPT (artigo 97.º-A), ou pelo CPTA (artigo 31.º), bem como pelo RJAT e pelo RCPAT (artigo 3.º). Deste modo, a conexão entre o valor da causa e a utilidade económica imediata do pedido contemplada nos artigos 97.º-A, n.º 1, alínea a) do CPPT (por remissão do artigo 3.º, n.º 2 do RCPAT), 31.º, n.º 1 do CPTA e 296.º, n.º 1 do CPC é temporalmente aferida por referência ao momento de propositura da ação, sendo, em regra, imutável, independentemente de redução ou ampliação do pedido.
De referir ainda que na situação específica em que o sujeito passivo manifesta a intenção de designar árbitro (v. artigo 6.º, n.º 2, alínea b) do RJAT), como sucede no caso dos autos, a taxa de arbitragem segue um regime próprio, excecional, consagrado no artigo 5.º do RCPAT. A taxa de arbitragem é calculada de modo distinto (em tabela autónoma) e o sujeito passivo tem de pagá-la pela totalidade na data do envio do pedido de constituição do tribunal arbitral (v. artigo 12.º, n.º 3 do RJAT). Neste caso, independentemente de o sujeito passivo vir a ter ganho de causa, no todo ou em parte, terá, ainda assim, de suportar integralmente a taxa de arbitragem (v. artigo 5.º, n.º 2 do RCPAT) e o tribunal não tem de fixar o montante das custas, nem reparti-las pelas Partes (v. artigo 22.º, n.º 3 do RJAT).
Esta solução constitui um desvio intencional ao princípio geral de que as custas são suportadas em função do decaimento e/ou pela parte que tenha dado causa à ação (v. artigos 527.º, 533.º, 536.º e 537.º do CPC), que, diversamente, se mantém na modalidade de designação de árbitros pelo Conselho Deontológico do CAAD.
Trata-se de uma clara opção legislativa, que pretendeu onerar o sujeito passivo nesta modalidade de designação de árbitros com o impacto desfavorável deste regime. A Requerente podia ter optado por uma solução menos onerosa, se tivesse escolhido a modalidade de designação de árbitros pelo CAAD, caso em que, tendo êxito na ação, seja por lhe ser dada razão pelo Tribunal, seja por anulação administrativa do ato na sua pendência, como acabou por se verificar, lhe seriam restituídas as importâncias pagas a título de taxa de arbitragem.
Deste modo, os efeitos desvantajosos para a Requerente eram por esta conhecidos à partida e, mesmo assim, escolheu a modalidade que os implica.
Em síntese, não tem a Requerente direito ao reembolso da taxa de arbitragem paga, por falta de base legal que suporte tal pretensão, dada a modalidade por si adotada de designação de árbitro pelo sujeito passivo, independentemente do ganho de causa, nos termos do disposto no artigo 5.º do RCPAT e da Tabela de Custas a este anexa, pelo que improcede o pedido de restituição desse valor.
V. Decisão
À face do exposto, acordam os árbitros deste Tribunal Arbitral em:
(a) Julgar extinta a instância, por impossibilidade superveniente da lide;
(b) Julgar improcedente o pedido de reembolso da taxa de arbitragem à Requerente, por inaplicável na modalidade de indicação de árbitros pelas Partes.
VI. Valor do Processo
Fixa-se ao processo o valor de € 622 299,85 (seiscentos e vinte e dois mil duzentos e noventa e nove euros e oitenta e cinco cêntimos), que corresponde ao valor da liquidação de IRC já incluindo os juros compensatórios inerentes, de € 64 382,17, cuja anulação a Requerente pretendia no ppa e não contestado pela Requerida – v. artigo 97.º-A, n.º 1, alínea a) do CPPT, aplicável por remissão do artigo 3.º, n.º 2 do RCPAT e artigo 306.º, n.ºs 1 e 2 do CPC, ex viartigo 29.º, n.º 1, alínea e) do RJAT.
Notifique-se.
Lisboa, 23 de outubro de 2025
Os árbitros,
Alexandra Coelho Martins, relatora
Pedro Galego
Jorge Carita
[1] Prazo que não se suspende em férias, como resulta do citado artigo 87.º do CPA.
[2] Sendo ainda necessária a notificação do sujeito passivo.
[3] Diploma aplicável subsidiariamente como atrás referido pela alínea e) do n.º 1 do artigo 29.º do RJAT.