Sumário: Reconhecido o erro de tributação em IVA à taxa de 23% de operações isentas de tal tributação, o reembolso do excedente liquidado e pago só pode ser pedido desde que se demonstre terem sido retificadas nos termos legais as faturas em que foi espelhada a sobredita liquidação indevida.
ACÓRDÃO ARBITRAL
Acordam em Tribunal Arbitral:
I. Relatório
1. A..., Lda., - abreviadamente “A...” - com sede na Rua ... ..., ...-... Lisboa, com o número de identificação fiscal ...., e B... - Fundo de Investimento Imobiliário Fechado – abreviadamente “Fundo” - , NIF ... (adiante designado por “Fundo”), representado pela sua sociedade gestora C..., SGOIC, S.A., com sede na Rua ..., ..., ...-... Lisboa, número único de matrícula de pessoa colectiva e de identificação fiscal ...,
vieram apresentar pedido de pronúncia arbitral visando a apreciação da legalidade e a declaração de anulação dos despachos de indeferimento da Reclamação Graciosa apresentada contra a liquidação de IVA em excesso no valor de € 640.730,02 (cf. despachos de indeferimento juntos como Anexo I ao Pedido de Pronúncia Arbitral) referente a diversos períodos de tributação compreendidos entre Abril de 2022 e Dezembro de 2023, inclusive, e, bem assim, à apreciação da legalidade e anulação parcial das subjacentes autoliquidações de IVA repercutido estruturadas pela sociedade A..., aqui Requerente, ao aqui também Requerente Fundo, e identificadas pelas respectivas declarações periódicas mensais, anexas ao presente pedido, sob os n.os ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ... e..., nos valores correspondentes ao IVA facturado nos respetivos períodos, de, respetivamente € 41.832,40, € 27.600,00, € 27.600,00, € 27.600,00, € 27.600,00, € 12.650,00, € 23.000,00, € 23.000,00, € 23.000,00, € 15.097,20, € 25.300,00,€ 23.000,00, € 34.500,00, € 23.000,00, € 23.000,00, € 23.000,00, € 23.000,00, € 23.000,00, € 23.000,00, € 23.000,00, € 23.000,00, € 24.736,50 e € 100.050,00 (cf., documentos n.º 1, e n.º 4, respetivamente, juntos à reclamação graciosa junta como Anexo II, totalizando o valor global de € 640.730,02).
A questão central objeto do presente pedido prende-se, segundo as Requerentes, com a (i)legalidade da liquidação de IVA incluído na faturação de Serviços prestados pela Requerente A... ao Fundo Requerente, ao invés da aplicação da isenção “legalmente prevista” para os serviços prestados (de administração e gestão de fundos de investimento, conforme dispõe a subalínea g) da alínea 27) do artigo 9.º do Código do IVA) – isenção da qual o fundo ora Requerente, por erro na mencionada autoliquidação do IVA, não beneficiou – daí terem deduzido o pedido de reclamação cujo indeferimento aqui se impugna, tal como se impugna a liquidação de imposto subjacente, sustentando a aplicação da referida isenção, que a AT desconsiderou em sede de reclamação.
Alegam, no essencial, as Requerentes:
O Fundo Requerente celebrou com a A... um contrato de gestão imobiliária, junto à reclamação graciosa em anexo (cf. Anexo II) como Documento n.º 3 que aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais;
Por erro de enquadramento no âmbito da referida isenção, a que o Requerente Fundo foi inteiramente alheio, aquela entidade procedeu à liquidação e cobrança do IVA, à taxa normal, sobre o valor dos serviços prestados, pelo que incluíram os montantes de IVA em causa na respetiva faturação, assim como nos campos 3 e 4 das suas declarações periódicas respetivas (base tributável e montante de imposto a favor do Estado) – cf. declarações periódicas e faturas correspondentes juntas à Reclamação Graciosa (Anexo II cit.) como documentos n.º 1 e n.º 4.;
Ao Requerente foi assim liquidado e cobrado, apesar de indevido, IVA à taxa normal de 23%, conforme se pode aferir pela análise das faturas da referida prestadora de serviços (a aqui também Requerente A... - cf. Documento n.º 4 junto ao pedido de revisão ora junto como Anexo II) e Declarações Periódicas submetidas por essa mesma entidade com referência ao período compreendido entre Abril de 2022 e Dezembro de 2023, que estão em causa no presente pedido (cf. Documento n.º 1 junto ao pedido de revisão ora junto como Anexo II);
Detetado o erro, o Requerente não se conformou com as liquidações em causa, apesar de ter procedido ao respetivo pagamento ao referido prestador – que por sua vez procedeu às autoliquidações correspondentes aos respetivos períodos de tributação, tendo inscrito nas declarações periódicas já referidas os respetivos valores a favor do Estado, conforme cópias anexas (Anexo II, documento 1, cit. ), das quais reclamou graciosamente, juntamente com o fundo Requerente perante a Requerida AT, por entender que as tais liquidações enfermam de ilegalidade decorrente de não aplicação da referida isenção;
As Requerentes não podem conformar-se quer com o despacho de indeferimento aqui impugnado, que recaiu sobre aquela reclamação graciosa, nem com a posição da AT ao defender que deveria prevalecer o erro, de facto e de direito, assim como deveriam prevalecer os atos de liquidação de IVA, aqui igualmente impugnados, apesar da tributação excessiva, com as inerentes consequências negativas na esfera patrimonial do Requerente, e o injustificado enriquecimento do Estado, à custa desse erro, situação que a Requerida incompreensivelmente se recusou a repor em sede de reclamação graciosa;
Aquele que se afigura como principal erro em tais pressupostos, cometido pela Requerida AT, passa por um equívoco enquadramento da questão ao assumir, erradamente, que a retificação dependeria de determinados requisitos, nomeadamente temporais, exigidos pela AT e não pela lei, apesar de invocar o artigo 78.º do Código do IVA, mas que essa norma não prevê casos de erro de direito (cf. despacho de indeferimento aqui impugnado e ora junto ao presente pedido com Anexo I);
A posição da Requerida é aliás explícita no seu propósito de reter o IVA indevidamente cobrado ao afirmar que “ao contrário do que acontece com a regularização do imposto inicialmente deduzido, onde se prevê a nível comunitário um direito geral dos sujeitos passivos a essa regularização, de acordo com a disciplina a definir pelos diversos Estados Membros, no caso do imposto liquidado em excesso, a Diretiva IVA já não contempla um direito geral similar. O que se compreende, pois como referido, o imposto indevidamente liquidado é de entrega obrigatória”… (sic. – cf. artigo 69 do Despacho impugnado) – o que não pode aceitar-se;
De facto, os Requerentes reagiram oportunamente contra as liquidações em causa através da reclamação graciosa apresentada contra esses atos tributários – de autoliquidação de imposto (cf. reclamação e respetivos documentos juntos, e que se dão por reproduzidos anexos ao presente pedido como Anexo II);
Admitiu pois o Requerente Fundo que, perante os elementos disponibilizados em sede de reclamação sobre o adequado enquadramento da atividade desenvolvida, os Serviços da AT viessem a considerar a sua pretensão, revendo os atos de liquidação que o Requerente considera ilegais, e reconstituindo a sua situação tributária;
No entanto, optou a AT, de forma surpreendente, por adoptar uma posição baseada numa teoria dos “tipos de erros e os procedimentos tendentes à sua regularização” (cf. artigo 69.º do despacho impugnado), sobre as liquidações objecto da reclamação e ora impugnadas – segundo a qual, independentemente de o erro ser de enquadramento legal das operações em causa, ou erro de direito, teria sempre de ser um tipo de erro irreversível e formalmente irreparável, por entender que poderia questionar-se se estaríamos perante um “enquadrável no âmbito do n.º 3 do artigo 78.º do CIVA que se refere às regularizações decorrentes de inexatidão das faturas” (cf. artigo 69.º do despacho impugnado) sujeito aos formalismos dessa norma – do mesmo passo que extrai a conclusão de que “não padecem as liquidações objeto do presente de qualquer ilegalidade, estando conformes às normas que lhe estão subjacentes” (cit. – cf. artigo 70.º do despacho impugnado, Anexo I cit.) limitando-se a indeferir o pedido com base em tais formalismos, apesar de inaplicáveis, como adiante melhor se demonstrará;
Com efeito, nos termos de facto e de direito que se densificarão infra, considera o Requerente que os referidos atos de indeferimento aqui impugnados (Anexo I), bem como todas as liquidações de IVA que lhe estão subjacentes, assentam em múltiplos erros e vícios que devem determinar a sua anulação e a reconstituição da situação tributária do Requerente;
A A... desenvolve a sua atividade principal no âmbito da prestação de serviços de gestão, controlo e coordenação imobiliárias;
Para o efeito, a A... possui o know-how necessário ao desenvolvimento de projetos imobiliários habitacionais, de serviços, de comércio e mistos, baseados na reabilitação de edifícios, manutenção e conservação de imóveis, atuando desde a fase de procura de oportunidades, passando pela conceção do programa de investimento, estratégias de financiamento, planeamento e coordenação dos projetos, gestão administrativa, documental e gestão comercial dos projetos imobiliários;
Por seu turno, o Fundo, aqui representado pela sua Sociedade Gestora, é, nos termos do respetivo Regulamento de Gestão, um fundo de investimento imobiliário fechado, sendo a respetiva atividade regulada pelo Regime da Gestão de Ativos ("RGA”), – cf. Regulamento de Gestão, junta à reclamação graciosa (Anexo II) como Documento 2;
De acordo com o Regulamento de Gestão em vigor, o Fundo tem como objetivo “o desenvolvimento de projetos de construção ou reabilitação de imóveis, em que pelo menos 75% dos seus ativos serão bens imóveis sujeitos a ações de reabilitação realizadas nas áreas de reabilitação urbana.” (cf. Documento 2 cit.);
Ora, tal objetivo materializa-se principalmente na “promoção de projetos de reabilitação/construção de imóveis com objetivo da sua posterior venda ou destinados a arrendamento a comércio, habitação, logística e serviços” (cf. Documento 2 cit.);
Por sua vez, enquanto responsável pela administração e gestão do Fundo, compete à Sociedade Gestora diligenciar pelo cumprimento das seguintes atribuições:
“i. Gerir o investimento, praticando os atos e operações necessários à boa concretização da política de investimento, em especial:
- A gestão do património, incluindo a seleção, aquisição e alienação dos ativos, cumprindo as formalidades necessárias para a sua válida e regular transmissão e o exercício dos direitos relacionados com os mesmos;
- A gestão do risco associado ao investimento, incluindo a sua identificação, avaliação e acompanhamento.
ii. Administrar o organismo de investimento coletivo, em especial:
- Prestar os serviços jurídicos e de contabilidade necessários à gestão dos organismos de investimento coletivo, sem prejuízo da legislação específica aplicável a estas atividades;
- Esclarecer e analisar as questões e reclamações dos participantes;
- Avaliar a carteira e determinar o valor das unidades de participação e emitir declarações fiscais;
- Cumprir e controlar a observância das normas aplicáveis, dos documentos constitutivos dos organismos de investimento coletivo e dos contratos celebrados no âmbito da atividade dos mesmos;
- Distribuir rendimentos;
- Emitir, resgatar ou reembolsar unidades de participação;
- Efetuar os procedimentos de liquidação e compensação, incluindo o envio de certificados;
- Registar e conservar os documentos.
iii. No que respeita aos ativos integrantes da carteira do OII:
- Prestar os serviços necessários ao cumprimento das suas obrigações fiduciárias;
- Administrar imóveis, gerir instalações e controlar e supervisionar o desenvolvimento dos projetos objeto de promoção imobiliária nas suas respetivas fases;
- Prestar outros serviços relacionados com a gestão do organismo de investimento alternativo e ativos, incluindo sociedades, em que tenha investido por conta do organismo de investimento alternativo. – cf. Documento 2 junto à reclamação graciosa (Anexo II).
Adicionalmente, o Fundo ora Requerente, em complemento das funções desempenhadas pela sua Sociedade Gestora, adquire (diretamente) à A... serviços necessários e indispensáveis à boa prossecução do objetivo inerente à sua atividade, designadamente, serviços de gestão de projetos imobiliários;
Com efeito, parte dos serviços necessários e indispensáveis à gestão e administração do portfólio de ativos que integram o património do Fundo aqui Requerente foram, por motivos de simplificação económica e organizacional, por si externalizados e consequentemente diretamente contratualizados e faturados ao Fundo – conforme sucede com os serviços aqui em apreço e melhor descritos de seguida;
Prestação de serviços de gestão de projetos imobiliários
Nos termos do contrato celebrado entre as partes (que aqui se junta enquanto Documento 3), os serviços de gestão de projetos imobiliários são prestados ao Fundo pela A..., também reclamante e por sua vez aqui também Requerente;
No quadro da assessoria e apoio à execução de projetos imobiliários, a A... presta ao Fundo várias tipologias de serviços, entre as quais podem ser destacadas as seguintes:
- Planeamento integrado de cada projeto imobiliário – no seu desenvolvimento; licenciamento; financiamento, obra; e acompanhamento até à sua comercialização;
- Coordenação de projetos – nas vertentes de arquitetura; estrutura, águas, drenagem, esgotos, térmica, acústica, eletricidade, telecomunicações, climatização, loteamentos e ventilação;
- Gestão dos processos de licenciamento e acompanhamento dos mesmos junto das entidades competentes para o efeito;
- Controlo das aprovações dos vários projetos com vista à obtenção das licenças de escavação, construção e utilização;
- Gestão da construção na sua vertente organizativa, orçamental seleção de equipas responsáveis e negociação dos contratos necessários (e.g., empreitada);
- Controlo e coordenação dos trabalhos;
- Análise dos reportes de fiscalização e gestão;
- Elaboração de relatórios de progresso dos projetos;
- Controlo dos prazos subjacentes aos projetos imobiliários;
- Controlo dos custos, da qualidade, condições de segurança;
- Fiscalização dos projetos;
- Apoio no processo de financiamento da construção;
- Comercialização e marketing dos projetos (análise, seleção e acompanhamento de propostas; análise dos mercados e definição de preços de venda; coordenação, análise e acompanhamento da elaboração das minutas contratuais de compra e venda; definição de potenciais alvos; entre outros serviços);
- Gestão dos processos burocráticos inerentes aos projetos de promoção imobiliária (e.g. propriedades horizontais; fichas técnicas de habitação, balancetes contabilísticos), entre outros – cf. Anexo II do contrato celebrado entre os Reclamantes, aqui junto enquanto Documento 3.
Neste contexto, o Fundo paga à A... uma remuneração pela prestação dos serviços acima descritos, nos termos estabelecidos na Cláusula 3.ª e no segundo anexo ao contrato de gestão junto à Reclamação Graciosa como Documento 3 (anexo II ao presente pedido);
Ora, tendo a A... enquadrado a referida operação enquanto sujeita a IVA e dele não isenta, a mesma emitiu ao Fundo faturas com liquidação de IVA, à taxa normal de 23%, durante os citados períodos de 2022 e 2023 (cf. cópia das faturas emitidas pela A... ao Fundo no período ora sob apreciação, juntas em anexo à Reclamação Graciosa, Anexo II, enquanto Documento 4);
Não obstante, confrontando o recente entendimento acolhido pelo TJUE sobre a aludida temática, que melhor se explanará nos pontos infra, com a natureza dos serviços prestados pela A... ao Fundo, os Reclamantes constataram que, para efeitos de IVA, tais serviços visaram efetivamente a gestão e administração de um fundo de investimento imobiliário, na medida em que, conforme se demonstrará, apresentam um nexo direto e intrínseco com as funções legal ou contratualmente obrigatórias para a gestão de carteira e/ou gestão de fundos de investimento para efeitos do artigo 9.º, alínea 27), subalínea g) do Código do IVA;
Deste modo, foi entregue indevidamente imposto ao Estado em virtude do erróneo enquadramento fiscal aplicado in casu, desconforme com a legislação nacional e comunitária do IVA, entendem os Reclamantes ser esta a sede própria para a clarificação do enquadramento em IVA a conferir às operações acima descritas e contratualmente suportadas no Documento 3, tituladas pelas faturas juntas enquanto Documento 4, peticionando pela anulação (parcial) dos atos tributários apresentados pela A... nos períodos de tributação ora controvertidos, devendo os respetivos montantes de imposto ser reembolsados pela AT, acrescidos de juros indemnizatórios;
Acresce que, conhecendo o comum entendimento da AT em subjugar o tema em apreço a uma mera inexatidão de fatura e, como tal, permitir-se apenas ao fornecedor o prazo de regularização de dois anos previsto para o efeito no artigo 78.º do Código do IVA, entendem os Reclamantes estar perante um verdadeiro erro de direito, conforme adiante melhor se verá, pelo que é aplicável o prazo para 4 anos, nos termos da conjugação dos nºs 2 dos artigos 98.º e 22.º do mesmo compêndio legal, afigurando-se esta a via adequada para fazerem valer as suas pretensões;
De notar que, a manter-se na ordem jurídica as liquidações de IVA ora contestadas, o Fundo aqui Requerente ficará onerado com uma carga de imposto que não era por si devida, pelo que é da mais elementar justiça que se proceda à anulação das liquidações em apreço;
Adicionalmente, cumpre esclarecer que, em todo o período em causa, compreendido entre abril de 2022 e dezembro de 2023, o Fundo não deduziu qualquer montante de IVA respeitante aos serviços nesta sede escrutinados ou quaisquer outros(cf. refletido nas declarações periódicas por si submetidas respeitantes a tais períodos de imposto – cf. Documento n.º 5 junto à reclamação, Anexo II);
Deste modo, e por forma a repor na ordem jurídica tal neutralidade, peticiona-se, nesta sede, e com a fundamentação que se apresenta de seguida, a anulação (parcial) das liquidações de IVA efetuadas pela A..., aqui Requerente, com referência aos períodos de tributação de Abril de 2022 a Dezembro de 2023 (inclusive), no que concerne aos serviços de gestão e administração de fundos de investimento prestados ao Fundo, no montante global de imposto de € 640.730,02, conforme melhor se detalha infra;
Em concreto, relativamente aos períodos de tributação compreendidos entre Abril de 2022 e Dezembro de 2023, a Requerente A... facturou ao Requerente fundo as remunerações devidas, por este mesmo fundo, enquanto contrapartida dos serviços de gestão de projetos imobiliários que lhe foram prestados, no montante global de € 3.426 512,72, tendo incidido o respetivo IVA, à taxa normal de 23%, no montante de € 640.730,02, conforme comprovado nas faturas emitidas por ambas as entidades ao Requerente e juntas como Documento 4 à Reclamação Graciosa cit., aqui junta como Anexo II);Conforme já mencionado, na (auto)liquidação de IVA relativa aos períodos de tributação em apreço, concretizada através da apresentação, pela A..., das declarações periódicas de IVA referentes a tais períodos, e objeto da reclamação cujo indeferimento se impugna, o fundo Requerente suportou, indevidamente, o montante de IVA supra referido de € 640.730,02, na medida em que tais serviços de gestão de projetos imobiliários foram incorretamente enquadrados como prestações sujeitas a IVA e dele não isentas.
Com efeito, entendem os Requerentes que as referidas prestações de serviços realizadas pela A... consubstanciam, no caso, serviços de “administração ou gestão de fundos de investimento” sendo, por conseguinte, subsumíveis à isenção de IVA prevista na subalínea g) da alínea 27) do artigo 9.º do Código deste imposto, pelo que não deveriam tais serviços ter sido objeto de liquidação de IVA;
Ora, a entrega, ao Estado, de prestação tributária em excesso colide, de forma veemente, com o princípio da neutralidade - “a trave-mestra da mecânica do imposto” que rege o sistema comum do IVA;
Tendo identificado o referido erro de enquadramento em sede de IVA, e constatando que os referidos serviços tendentes à gestão e administração dos fundos de investimento imobiliário (embora faturados diretamente ao Fundo) apresentam um nexo direto e intrínseco com as funções legal ou contratualmente obrigatórias para a gestão de carteira e/ou gestão de fundos de investimento, assumindo-se como funções específicas, essenciais e formando um conjunto distinto, nos termos gerais do artigo 9.º, alínea 27), subalínea g) do Código do IVA, o Requerente fundo constatou que deveria ter sido aplicada a isenção de IVA à totalidade dos valores que lhe foram faturados pela A... durante o período compreendido entre Abril de 2022 e Dezembro de 2023 (inclusive), conforme adiante melhor explanará;
E, uma vez que, conforme se demonstrará infra, a liquidação do imposto em causa faturado, e, por conseguinte, repercutido ao ora Requerente, se apresenta em desconformidade com a legislação nacional e comunitária do IVA, conclui-se que, com referência aos períodos de tributação em apreço, o fundo Requerente suportou indevidamente o referido imposto, considerando que deveria ter sido aplicada a isenção de IVA aos serviços sub judice;
Neste sentido, após a constatação do erróneo enquadramento em IVA que se encontrava a ser aplicado aos serviços adquiridos pelo Requerente e ora escrutinados, cumpre realçar que o Requerente logrou encetar os esforços necessários para que, junto do fornecedores em apreço, estes procedessem à substituição das faturas e à inerente emissão de novas faturas que passassem a refletir o correto enquadramento em IVA, i.e., aplicação da isenção deste imposto, acompanhadas da correspondente devolução, ao fundo ora Requerente, do IVA indevidamente liquidado e (por este) pago;
De notar que, a manter-se na ordem jurídica as liquidações de IVA ora reclamadas, o Requerente ficará onerado com uma carga de imposto que não era devida, ficando ainda o Estado numa flagrante e ilegítima situação de enriquecimento sem causa, pelo que é da mais elementar justiça que se proceda à anulação das liquidações em apreço;
Deste modo, e por forma a repor na ordem jurídica tal neutralidade, peticiona-se, nesta sede, e com a fundamentação que se apresenta de seguida, a anulação (parcial) das liquidações de IVA efetuadas pelas entidades prestadoras, durante o período compreendido entre Abril de 2022 e Dezembro de 2023 (inclusive), de serviços de gestão e administração de fundos de investimento ao Requerente, no montante global de imposto de € 640.730,02, conforme melhor se detalha infra;
Tal como demonstrou na reclamação cujo indeferimento impugna, e aqui reitera, o fundo Requerente suportou o IVA liquidado pela A... nos períodos em causa no valor de € 640.730,02, conforme consta nas respetivas faturas, assim como das respetivas declarações periódicas de IVA, incluindo a base tributável e o imposto a favor do Estado à taxa de 23% [cf. Documentos n.os 3 e 4 juntos à reclamação graciosa (Anexo II) e Declarações periódicas ora juntas, Anexo III];
Nessa sede, de reclamação graciosa, os ora Requerentes alegaram – tal como aqui sustentam – que os valores que lhe foram cobrados a título de imposto o foram indevidamente, por ao caso ser aplicável uma isenção, pelo que tais valores de IVA não deveriam ter sido incluídos nem na respetiva faturação nem incluídos a favor do Estado, como foram, em cada uma das declarações periódicas em causa;
E que, em consequência desse erro a que foi alheio, o Requerente Fundo suportou IVA em excesso, que por seu turno foi indevidamente arrecadado pelo Estado, sendo da mais elementar justiça que a Requerida AT reponha a legalidade através da respetiva restituição, que é devida ao Requerente;
Nessa sede de reclamação, porém, e apesar de alertados os Serviços da Requerida para os erros cometidos, estes mantiveram na íntegra as liquidações de IVA cobrado em excesso, impondo à Requerente a impugnação das liquidações que considera ilegais, e do ato de indeferimento materializado no despacho aqui igualmente impugnado (cf. Anexo I cit.);
Com efeito, a AT limitar-se-ia, no âmbito do ato decisório sub judice a uma argumentação assente em considerações gerais sobre a regularização de erros nas liquidações em causa, enquanto erros supostamente enquadráveis numa categoria de “erro material ou de cálculo”, procurando daí extrair a conclusão de que não haveria, no caso, solução para a liquidação de imposto em excesso;
Neste aspeto importa referir que o erro principal da atuação da AT não passa pela desconsideração da isenção aplicável, e que deveria ter sido aplicada pelos prestadores de serviços em causa, mas sim na qualificação desse erro de direito como uma espécie de erro que justificaria a rejeição liminar da reclamação graciosa formulado pelo Requerente, e com a qual não pode conformar-se.
Do Direito aplicável
A referida atuação da AT, que culminou nos ato de indeferimento da reclamação dos atos de liquidação aqui contestados, e que sustenta a sua manutenção na ordem jurídica, encerra, como já se deixou antever, múltiplos vícios de violação de lei, adiante sistematizados, por erro sobre os pressupostos de facto e de direito – violação do disposto no artigo 98.º do Código do IVA e ausência de base legal para recusar a restituição do IVA cobrado em excesso nas liquidações de IVA em causa; violação expressa de normas de isenção (artigo 9.º alínea, 27, subalínea g)) e das correspondentes disposições da Diretiva do IVA, e de normas e princípios constitucionais. Vejamos
Pressupostos da isenção nos serviços de administração e gestão de fundos de investimento
Entre as isenções de IVA aplicáveis ao abrigo das disposições do artigo 9.º do Código do IVA, contam-se os casos das chamadas operações financeiras, e dentro destas últimas, a que vem prevista na subalínea g) da alínea 27), a qual é inteiramente aplicável – aliás de forma incontroversa, – às operações descritas nos factos;
Atendendo ao elemento literal da norma, deve tratar-se desde logo de administração ou gestão de fundos de investimento, conceito no qual deverão ser subsumíveis, para beneficiarem da isenção de imposto, os serviços em questão - o que desde já se adianta ter-se por verificado, no caso, e não é sequer contestado pela Requerida;
E sendo assim, a situação tributária do Requerente deve ser reconstituída em conformidade, tal como o Requerente alegou em sede de reclamação, com os fundamentos aí expostos e que aqui se dão por reproduzidos, e que em síntese se reiteram;
Conforme resulta do exposto supra no introito do presente pedido, o principal thema decidendum em causa prende-se com a questão de saber se, relativamente ao IVA suportado pelo Requerente com a aquisição de diversos serviços e declarado a favor do Estado pelo respetivo prestador nas respetivas declarações de IVA era, ou não, aplicável a isenção da referida norma doa alínea g) do n.º 27 do artigo 9.º do Código do IVA, e, em caso afirmativo, se o imposto cobrado em excesso deve ser restituído pela AT acrescido de juros indemnizatórios;
Os Requerentes reiteram, nesta sede arbitral e na íntegra, o exposto no articulado da reclamação graciosa oportunamente dirigido à aqui Requerida AT, que aqui dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais, sem prejuízo de se incorporar no capítulo seguinte no presente articulado para sequência de exposição.
2. Pedem os Requerentes que seja declarada a anulação integral do ato de indeferimento da reclamação, bem como a aqui requerida anulação parcial dos atos tributários subjacentes de liquidação de IVA na parte aqui impugnada, em face das supracitadas normas legais e dos fundamentos invocados, com todas as consequências legais, incluindo a condenação da Requerida AT na correspondente restituição do imposto pago em excesso, e no pagamento dos juros indemnizatórios devidos nos termos do disposto no artigo 43.º da LGT e, em consequência, requerem que
a) sejam parcialmente anulados os supra identificados atos de (auto)liquidação de IVA relativos aos períodos de tributação compreendidos entre abril de 2020 e novembro de 2021 (inclusive), concretizados através da apresentação das declarações periódicas de IVA referentes a tais períodos pela referida entidade prestadora dos serviços de gestão em causa (a Requerente A...), no montante total de € 640.730,02;
b) seja condenada a Requerida à restituição ao Requerente do valor do IVA pago em excesso no referido montante € 640.730,02, acrescido de juros indemnizatórios nos termos peticionados;
c) A título subsidiário, atenta a natureza institucional e a base legal em que assenta a arbitragem tributária, se e na medida em que não seja claro para o Tribunal Arbitral, não obstante a jurisprudência comunitária já produzida sobre a matéria, o alcance das normas da Diretiva 2006/112/CE do Conselho que possam interferir com a boa solução deste caso concreto, deverá então este Tribunal Arbitral promover o reenvio prejudicial das questões que entenda suscitar ao Tribunal de Justiça da União Europeia, conforme previsto no artigo 267.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia.
3. É demandada a Autoridade Tributária e Aduaneira (doravante, AT ou Requerida).
4. Em 5-12-2024, o pedido de constituição de tribunal arbitral foi aceite pelo presidente do CAAD e seguiu a sua normal tramitação com a notificação da AT.
5. A Requerente não procedeu à nomeação de árbitro, pelo que, ao abrigo do disposto no artigo 6, n.º 2, al. a) e do artigo 11, n.º 1, al. a), ambos do RJAT, o Conselho Deontológico do CAAD designou os signatários como árbitros do Tribunal Arbitral Coletivo, que comunicaram a aceitação do encargo no prazo devido.
6. As partes, notificadas dessa designação em 29-1-2025, não manifestaram vontade de a recusar (cf. artigo 11, n.º 1, al. b) e c) do RJAT, em conjugação com o disposto nos artigos 6 e 7 do Código Deontológico do CAAD), pelo que, ao abrigo da al. c) do n.º 1 do artigo 11 do RJAT, o Tribunal Arbitral ficou constituído em 18-2-2025.
7. Em 24-2-2025, foi proferido despacho a determinar a notificação da Requerida para apresentar Resposta, juntar cópia do Processo Administrativo e solicitar, querendo, a produção de prova adicional (cf. artigo 17 do RJAT).
8. A Requerida veio apresentar resposta, em 31-3-2025, remetendo também cópia do processo administrativo (PA).
8.A. Considerando o PPA e a Resposta oferecida pela Requerida, o Tribunal Arbitral proferiu despacho, em 1-4-2025, dispensando a reunião a que alude o artigo 18º, do RJAT, por não haver exceções ou outras questões a debater nesse âmbito, e conferindo às partes o prazo de 15 dias para a apresentação de alegações finais escritas.
9. Ambas as partes apresentaram as alegações em 29-4-2025 (a Requerida) e 30-4-2025 (a Requerente).
Resposta da AT
10. À posição e fundamentos invocados pela Requerente e acima transcritos, no essencial, responde a AT reafirmando, em síntese, o que serviu para fundamentar indeferimento da reclamação graciosa, destacando-se, em síntese:
- que a decisão de indeferimento da Reclamação Graciosa, baseou-se, em suma, no entendimento da Requerida de que, não tendo sido corrigidas as faturas, não se verifica qualquer erro nas autoliquidações efetuadas, porquanto se não são corrigidas as faturas, o IVA nelas contido, ainda que indevidamente liquidado (o que não concedeu), mostra-se devido;
- que dos elementos de prova juntos aos autos, não resulta que os serviços em apreço, dos quais o Requerente (Fundo) foi o destinatário, correspondam à externalização dos serviços específicos da gestão dos fundos, o que desde já se impugna.
- que, de igual modo, não resulta provado que os serviços de que foi destinatário o Requerente (Fundo), tivessem sido exclusivamente consumidos na totalidade, em atividades específicas da gestão dos fundos;
- que ainda que se trate de erro de direito, por se tratar de IVA indevidamente liquidado na fatura, tem-se entendido que deve ser emitido o documento retificativo de fatura – vide, nesse sentido, Informação Vinculativa n.º 25527, com despacho de 2024-03-27, da Diretora de Serviços da DSIVA, por subdelegação, n.ºs 61 a 64 -, pois, citando, de harmonia com o disposto no n.º 7 do artigo 29.º do Código do IVA “[q]uando o valor tributável de uma operação ou o imposto correspondente sejam alterados por qualquer motivo, incluindo inexatidão, deve ser emitido documento retificativo de fatura”;
- neste mesmo sentido, o n.º 1 do artigo 78.º do Código do IVA quando estabelece que “[a]s disposições dos artigos 36.º e seguintes devem ser observadas sempre que, emitida a fatura, o valor tributável de uma operação ou o respetivo imposto venham a sofrer retificação por qualquer motivo”
II – Saneamento
11. O Tribunal Arbitral foi regularmente constituído e é competente em razão da matéria, atenta a conformação do objeto do processo (cf. artigos 2, n.º 1, a) e 5 do RJAT).
12. O pedido de pronúncia arbitral é tempestivo, porque apresentado no prazo previsto no artigo 10, n.º 1, al. a), do RJAT.
13. As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias, têm legitimidade e encontram-se regularmente representadas (cf. artigos 4 e 10, n.º 2 do RJAT e artigo 1 da Portaria n.º 112- A/2011, de 22 de março, na redação da Portaria n.º 287/2019, de 3 de setembro).
14. O processo não enferma de nulidades.
Cumpre, pois, apreciar e decidir do mérito do pedido.
III – FUNDAMENTAÇÃO
§1. Factos provados
15. Com relevo para a decisão, consideram-se provados os seguintes factos:
a) A A... é uma sociedade anónima que exerce, a título principal, a atividade de “administração de imóveis por conta de outrem (CAE 68321);
b) A B... é um organismo de investimento imobiliário fechado de subscrição particular que exerce, a título principal, a atividade de “Trusts Fundos e entidades financeiras similares” (CAE 64300);
c) Ambas as Requerentes são sujeitos passivos de IVA enquadradas no regime normal, com periodicidade mensal;
d) O Fundo Requerente celebrou com a A... o contrato de gestão imobiliária, que constitui o escrito junto à reclamação graciosa em anexo (cf. Anexo II) – Cfr Documento n.º 3 que aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais;
e) A A... procedeu à liquidação e cobrança do IVA, à taxa normal, sobre o valor dos serviços prestados pelo Fundo [pelo que incluíram os montantes de IVA em causa na respetiva faturação, assim como nos campos 3 e 4 das suas declarações periódicas respetivas (base tributável e montante de imposto a favor do Estado)] – cf. declarações periódicas e faturas correspondentes juntas à Reclamação Graciosa (Anexo II cit.) como documentos n.º 1 e n.º 4.;
f) A A... emitiu e submeteu os atos tributários de autoliquidação de IVA correspondentes aos períodos de abril de 2022 a dezembro de 2023 por referência à prestação de serviços de gestão de projetos imobiliários do Fundo...
g) ...decorrentes da correspondente emissão de faturas[1] à Príncipe Real com liquidação e repercussão de IVA à taxa de 23%;
h) As Requerentes apresentaram reclamação graciosa invocando erro de direito consubstanciado em erróneo enquadramento jurídico-tributário das operações respetivas...
i) ...alegando concretamente que às citadas operações deveria ser aplicável o disposto na subalínea g), da alínea 27), do artigo 9º do CIVA e, em consequência, haveria lugar, no caso, à isenção de IVA com consequente correção das sobreditas liquidações;
j) A reclamação foi indeferida total e liminarmente por despacho de 5-9-2024 do Chefe de Divisão da Unidade dos Grandes Contribuintes da AT com os fundamentos que dele (despacho) constam (Cfr Anexo III, junto com o PPA);
k) Nesse despacho se ponderou, designadamente, que as autoliquidações não estão erradas porquanto refletem o que consta das faturas emitidas (cfr artigo 2º-a/c), do CIVA e 203º, da Diretiva IVA)...
l) ...sendo que estas não foram nunca corrigidas nem emitido qualquer documento retificativo das mesmas (cfr artigos 2º-2, 29º-7, 36º, 37º, 44º, 45º e 97º-3, do CIVA);
m) Em 5-12-2024, foi apresentado o pedido de pronúncia arbitral que dá origem a estes autos.
§2. Factos não provados
16. Não se revelam provados ou não provados quaisquer outros factos essenciais para o objeto do pedido.
§3. Fundamentação da matéria de facto
17. Ao Tribunal incumbe o dever de selecionar os factos que interessam à decisão e discriminar a matéria que julga provada e declarar a que considera não provada, não tendo de se pronunciar sobre todos os elementos da matéria de facto alegados pelas partes, tal como decorre da aplicação conjugada do artigo 123, n.º 2, do CPPT e do artigo 607, n.º 3, do CPC, aplicáveis por força do artigo 29, n.º 1, als. a) e e), do RJAT.
Assim é que os factos pertinentes para o julgamento da causa foram selecionados e conformados em função da sua relevância jurídica, a qual é determinada tendo em conta as várias soluções plausíveis das questões de direito para o objeto do litígio, conforme decorre da aplicação conjugada do artigo 596, n.º 1, do CPC, aplicável por força do artigo 29, n.º 1, e), do RJAT.
18. Nestes termos, tendo em conta as posições assumidas pelas partes e a prova documental junta aos autos, em especial os documentos juntos com o pedido de pronúncia arbitral (PPA) e elementos constantes do processo administrativo instrutor, consideraram-se provados, com relevo para a decisão, os factos acima elencados.
III – FUNDAMENTAÇÃO (cont.)
O Direito
19 Como abordagem preliminar para a fundamentação jurídica, assinale-se o que há muito vem sendo o entendimento da Jurisprudência quanto ao dever de apreciação dos argumentos apresentados pelas partes e que se traduz na não obrigatoriedade(sublinhado nosso) de os Tribunais apreciarem todos os argumentos formulados pelas partes (Cfr., inter alia, Ac do Pleno da 2.ª Secção do STA, de 7 Jun 95, rec 5239, in DR – Apêndice de 31 de Março de 97, pgs. 36-40 e Ac STA – 2ª Sec – de 23 Abr 97, DR/AP de 9 Out 97, p. 1094).
20 Insurgem-se as Requerentes contra a liquidação de IVA “alegadamente” em excesso no valor de € 640.730,02 (cf. despachos de indeferimento ora juntos como Anexo I) referente a diversos períodos de tributação compreendidos entre Abril de 2022 e Dezembro de 2023, inclusive, e, bem assim, à apreciação da legalidade e anulação parcial das subjacentes autoliquidações de IVA repercutido estruturadas pela A... ao aqui também Requerente Fundo, e identificadas pelas respetivas declarações periódicas mensais, anexas ao presente pedido, sob os n.os ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ... e ..., nos valores correspondentes ao IVA facturado nos respetivos períodos, de, respetivamente € 41.832,40, € 27.600,00, € 27.600,00, € 27.600,00, € 27.600,00, € 12.650,00, € 23.000,00, € 23.000,00, € 23.000,00, € 15.097,20, € 25.300,00,€ 23.000,00, € 34.500,00, € 23.000,00, € 23.000,00, € 23.000,00, € 23.000,00, € 23.000,00, € 23.000,00, € 23.000,00, € 23.000,00, € 24.736,50 e € 100.050,00 (cf., documentos n.º 1, e n.º 4, respetivamente, juntos à reclamação graciosa junta como Anexo II, totalizando o valor global de € 640.730,02).
21 Dito doutro modo: questão central objeto do presente pedido prende-se, segundo as Requerentes, com a (i)legalidade da liquidação de IVA incluído na faturação de Serviços prestados pela Requerente A... ao Fundo Requerente, ao invés da aplicação da isenção “legalmente prevista” para os serviços prestados (de administração e gestão de fundos de investimento, conforme dispõe a subalínea g) da alínea 27) do artigo 9.º do Código do IVA) – isenção da qual o fundo ora Requerente, por erro na mencionada autoliquidação do IVA, não beneficiou – daí terem deduzido o pedido de reclamação cujo indeferimento aqui se impugna, tal como se impugna a liquidação de imposto subjacente, sustentando a aplicação da referida isenção, que a AT desconsiderou em sede de reclamação.
Questão prévia
22 Os pedidos formulados pelas Requerentes reconduzem-se à anulação das autoliquidações de IVA com fundamento em que as mesmas se fundaram na faturação de bens à taxa normal de 23% quando alegadamente deveriam ser isentados de IVA.
23 Pois bem: como melhor se verá infra, as liquidações de IVA só podem ser anuladas pelo Tribunal quando esteja provado que o imposto não foi incluído na ou nas faturas emitidas ao adquirente dos bens ou dos serviços nos termos do artigo 37º, do CIVA – Cfr. artigo 97º-3, do CIVA.
24 O que quer dizer que para apreciação do mérito do pedido se torna essencial o apuramento, como questão prévia, se o pressuposto mencionado se mostra ou não cumprido ou, mais concretamente, se existe na esfera das Requerentes o direito de pedir o reembolso de diferenças de IVA por erro - porque é disso que se trata - entre a taxa alegadamente aplicável, no caso, a isenção de IVA, e a que foi liquidada (23%).
25 Só depois de apreciada e decidida esta questão, é que o Tribunal poderá ou não prosseguir para a apreciação do mérito da vexata quaestio objeto dos autos e que é a de saber se, à luz da hermenêutica jurídica e dos princípios harmonizados do IVA, estão ou não preenchidos os pressupostos da pretendida isenção.
Vejamos o enquadramento legal e jurídico essencial para apreciação desta questão prévia:
26 É consabido que o IVA é um imposto indireto, de matriz comunitária, que atinge tendencialmente todo o ato de consumo através do método subtrativo indireto e assenta no princípio da neutralidade ao operar, pelo citado método, nas diversas fases do processo produtivo, de molde a garantir a efetiva neutralidade no final da cadeia de transações sobre que incide
27 Sendo o IVA incluído nas faturas emitidas aos clientes, a repercussão da importância do respetivo imposto é adicionada ao valor da fatura pelo sujeito passivo desse imposto e obrigado à emissão de fatura, contendo esta, designadamente, os montantes do imposto e as taxas aplicáveis por cada transmissão de bens ou prestação de serviços - artigos 2º-1/a), 29º-1/b), 36º-5 e 37º, do CIVA.
28 No caso de, por erro, inexatidão ou qualquer outro motivo, ser aplicada e transcrita na fatura emitida, uma taxa diversa da que seria aplicável ou faturado IVA numa operação dele isenta, por exemplo, deve ser emitido documento retificativo da fatura e, eventualmente, nova fatura.
29 Ou seja: de harmonia com a sobredita disposição legal, quando o valor tributável de uma operação ou o correspondente imposto sejam alterados por qualquer motivo, incluindo erro ou inexatidão, deve ser emitido documento retificativo da fatura (nota de crédito ou nota de débito), o qual deve conter os elementos a que se refere a alínea a) do nº 5 do artigo 36.º, do CIVA, bem como a referência à fatura a que respeita e as menções desta que são objeto de alterações.
30 As retificações às faturas relacionadas com alterações do valor tributável ou do imposto correspondente são exclusiva e validamente efetuadas pela forma indicada, ou seja, pelos documentos retificativos (notas de débito ou notas de crédito) elaborados nas condições e com os requisitos expostos.
31 As citadas notas de crédito ou de débito constitutivas ou justificativas das retificações das faturas podem ser emitidas pelos sujeitos passivos do imposto (IVA) adquirentes dos bens ou destinatários dos serviços, obedecendo aos requisitos assinalados supra e ainda em resultado de acordo entre os sujeitos passivos intervenientes, fornecedor dos bens ou prestador dos serviços e adquirentes ou destinatários dos mesmos.
32 Por outro lado, só se considera devida a dedução de IVA em resultado da retificação, para menos, do valor tributável da operação (porquanto é essa a questão que ora se coloca) e válida a regularização a favor do sujeito passivo, quando este tiver na sua posse prova de que o adquirente tomou conhecimento da retificação ou de que foi reembolsado do imposto - Cfr artigo 78º-5, do CIVA.
33 Esta norma tem por objetivo evitar que o sujeito passivo fornecedor regularize a seu favor, imposto inicialmente deduzido pelo seu cliente, sem que este (adquirente), proceda, se for o caso, à correção do correspondente valor a favor do Estado.
34 Ou seja: se o fornecedor optar por efetuar a retificação, esta tem que ser operada pelas duas partes intervenientes (fornecedor e adquirente) nas condições descritas e dentro dos prazos estabelecidos - Cfr citado artigo 78º-2, 3 e 4, do CIVA.
35 Naturalmente que, devendo as operações objeto de faturação ser refletidas na contabilidade em obediência ao disposto no artigo 44º-1 e 2/a), do CIVA, no caso de ocorrer a retificação das faturas por, designadamente, inexatidão da taxa de IVA, tal retificação deve ser igualmente refletida na mesma contabilidade, obrigatoriamente, se houver lugar a imposto liquidado a menos e facultativamente, no prazo de dois anos, quando houver, alegadamente, imposto liquidado a mais - Cfr artigo 78º-3, do CIVA
36 Em princípio, o IVA incidente sobre operações tributáveis que o sujeito passivo efetuou e que foram refletidas na sua contabilidade e nas declarações (autoliquidações) apresentadas, será o que foi liquidado nas faturas emitidas em cumprimento das obrigações legais consagradas, designadamente, nos artigos 36º-5/d) e 37º-1, do CIVA.
37 É este, aliás, o entendimento que resulta do artigo 2º-1/c), do CIVA e do Regime Comum de IVA consagrado na Diretiva 2006/112/CE do Conselho, de 28-11-2006 (vulgo “Diretiva IVA”) quando dispõe expressamente no seu artigo 203º que o “IVA é devido por todas as pessoas que mencionem esse imposto numa fatura”, sendo que, nos termos do artigo 226º, da citada Diretiva, a fatura inclui obrigatoriamente a taxa do IVA aplicável.
38 Parece assim inequívoco, à luz do exposto, que havendo inclusão de IVA numa fatura, sem o imposto ser realmente devido, ou espelhando a fatura a aplicação ou liquidação de IVA a taxa superior àquela que seria a devida para a operação em causa, a obrigação de entrega ao Estado será no valor igual ao valor faturado a esse título (IVA) pelo sujeito passivo, independentemente de o ter sido de forma indevida.
39 Só assim não será se tiverem sido adotados os procedimentos anteriormente referidos para a válida retificação das faturas emitidas pelo sujeito passivo que, reafirme-se, inclui as pessoas que mencionem indevidamente, nas faturas emitidas, haver lugar a IVA - Cfr artigo 2º-1/c), do CIVA.
40 Assim é que, pedida, em reclamação graciosa, recurso hierárquico ou impugnação, a anulação das autoliquidações decorrentes, por exemplo, da constatação ulterior, pelo sujeito passivo, de que ao contrário do refletido nas faturas, não haveria lugar a IVA nas operações, o provimento de qualquer dessas formas impugnatórias não é admissível nem expectável sem a prova das retificações das faturas nos termos atrás expostos - cfr artigo 97º-3, do CIVA.
41 Do exposto decorre que, v. g., sendo as faturas emitidas mencionando IVA a 23% quando deveriam mencionar a isenção do imposto, as autoliquidações terão de tomar em conta a taxa efetivamente repercutida nas faturas (23%), sem haver lugar ao direito ao reembolso da diferença pelo sujeito passivo sem este demonstrar a correção, nos termos anteriormente expostos, na esfera do destinatário ou adquirente dos bens ou serviços a quem foram faturados à taxa de 23%.
42 Para que assim seja são cristalinas as razões ou fundamentos: é que, além de prejudicados os princípios da neutralidade e da repercussão do IVA, ocorreria clamoroso enriquecimento sem causa do sujeito passivo ao cobrar por bens ou serviços valores superiores aos que se obrigava a entregar ao Estado a título de IVA, inflacionando, deste modo, o preço efetivo dos bens adquiridos ou serviços prestados.
43 Importa aqui trazer à colação as pertinentes considerações sobre a natureza do IVA, tecidas pelo saudoso Professor António Carlos dos Santos a esse propósito no voto que emitiu, como árbitro, no proc. do CAAD nº 170/2016-T, publicado no respetivo site: «O IVA é um imposto sobre o consumo, baseado num modelo europeu, caracterizado por uma forte intensidade harmonizadora, que visa principalmente tributar o consumidor final e não o consumo intermédio. Este facto é inerente à própria lógica de funcionamento do IVA que não pretende ser um imposto sobre lucros, mas sobre a despesa. Por isso, a Diretiva de Consolidação do IVA n.º 2006/112/CE, de 28.11 (DCIVA) obriga a que, na fatura, figure o valor tributável para cada taxa ou isenção, a taxa do IVA aplicável e o montante do IVA a pagar (art. 226, n.ºs 8 a 10). Como obriga à entrega à Administração Tributária (AT) do IVA mencionado na fatura (art. 203º da DCIVA), seja ele devido ou indevido. Por sua vez, o Código do IVA (CIVA) precisa que as pessoas singulares ou coletivas que mencionem indevidamente o IVA em fatura são sujeitos passivos do imposto (2/1/c CIVA). O IVA indevidamente liquidado em fatura é pois de entrega obrigatória. O cálculo subjacente à liquidação de IVA pressupõe assim um valor tributável, uma alíquota aplicável ("normal" ou "reduzida"), bem como, no caso de sujeitos passivos (em sentido amplo, englobando o que a DCIVA designa de devedor de imposto) a dedução do IVA suportado a montante. A DCIVA prevê um direito geral dos sujeitos passivos á regularização da dedução de imposto (art. 184º), sendo o regime desta regularização delineado pelos EM. O que não prevê é um direito geral de regularização do imposto liquidado em excesso, apenas contemplando algumas situações concretas (e só essas) de regularização no seu artigo 90º cujo teor é o seguinte: "Em caso de anulação, rescisão, resolução, não pagamento total ou parcial ou redução do preço depois de efetuada a operação, o valor tributável é reduzido em conformidade, nas condições fixadas pelos Estados-Membros". Note-se que a norma diz respeito ao valor tributável e não às taxas de imposto. Facto que se compreende pois o IVA é devido por todas as pessoas que mencionem esse imposto numa fatura (203º DCIVA). Isto é assim porque, no modelo europeu, o IVA - nunca é demais repetir - foi desde sempre concebido como um imposto geral sobre o consumo, apto para ser aplicado até ao estádio do comércio a retalho, inclusive. Este imposto, tal como é caraterizado no n.º 2 do art. 1º da DCIVA, na esteira da Segunda Diretiva do IVA de 1967, é exatamente "proporcional ao preço dos bens e serviços, seja qual for o número de operações ocorridas no processo de produção e de distribuição anterior ao estádio de tributação". O IVA cobrado não depende pois do tamanho da cadeia de operações: o montante a arrecadar pelo Estado corresponde à aplicação da taxa aplicável na última operação (venda a retalho) ao valor dos bens ou serviços em causa (neutralidade). Para que isso seja possível, o IVA, ao contrário dos impostos plurifásicos em cascata, assenta no direito à dedução: “Em cada operação, o IVA, calculado sobre o preço do bem ou serviço à taxa aplicável ao referido bem ou serviço, é exigível, com prévia dedução do montante do imposto que tenha incidido diretamente sobre o custo dos diversos elementos constitutivos do preço".
44 Também o TJUE tem assumido, na sobredita linha, que o IVA está construído de modo a que “a carga final do imposto seja, em definitivo, suportada pelo consumidor” - Cfr Acórdão Banca Popolare di Cremona, C-475/03, de 3-10-2006, em especial nºs 28 e 32 a 35).
45 Concluindo: a anulação de autoliquidações de IVA por erro quanto à taxa aplicável de IVA em faturas emitidas e que refletem essa taxa, ainda que se pudesse demonstrar o erro quanto à mesma, se, previamente, não for alegada e demonstrada a retificação das faturas nos termos expostos supra, o mérito da impugnação das autoliquidações e o direito ao reembolso do valor correspondente à diferença entre essas taxas, não poderão ser apreciados.
46 Relativa a erros de faturação quanto ao valor ou taxas de IVA e na linha do que ora se vem defendendo, se pronunciou já a jurisprudência arbitral no âmbito do CAAD - Cfr., v.g., os Acórdãos de 8-11-2015, proferido no Proc nº 63/2015 e de 25-6-2019, proferido no Proc nº 608/2018-T - bem como o TCAS - cfr, v. g., Acórdãos de 4-7-2000, nos Procs. nº 1967/99 e 1525/98, publicados no site www.org.caad.pt
47 Não se afasta desta orientação, a Jurisprudência do TJUE conforme se reconheceu, v. g., no Acórdão do TCAN - Proc 2185/17.8BEPRT, de 17-12-2020, que se encontra publicado no site do Ministério da Justiça (www.dgsi.pt).
48 O sumário deste aresto é o seguinte: “I - De acordo com a jurisprudência do TJUE o direito comunitário não se opõe a que um sistema jurídico nacional recuse a restituição de impostos indevidamente cobrados em condições suscetíveis de implicar um enriquecimento sem causa dos contribuintes (Acórdãos C- 192/95- Comateb, C-309/06 — Marks & Spencer, C-566/07, Stadeco e C- 398/09 -Lady & Kid A/S). II - Em tais casos, a jurisprudência comunitária vem também afirmando que compete aos órgãos jurisdicionais nacionais «apreciar, à luz das circunstâncias de cada caso concreto, se o encargo do imposto foi transferido no todo ou em parte pelo operador para outras pessoas e, se for esse o caso, se o reembolso ao operador constitui enriquecimento sem causa» (cf. Acórdão Comateb e Acórdão C-566/07, Stadeco).III - A norma do artigo 78.º, n,º 5 do CIVA, ao condicionar a regularização a favor do sujeito passivo do imposto indevidamente liquidado à prova de que o adquirente tomou conhecimento da retificação ou de que foi reembolsado do imposto, não viola o direito comunitário, já que, pese embora constitua uma limitação ao direito ao reembolso, tal exceção visa precisamente obviar ou prevenir o enriquecimento sem causa do respetivo titular. IV - Se a Recorrente emitiu faturas onde menciona a liquidação de IVA à taxa de 23% e, na p.i., nada mais alega em termos factuais que permita ao juiz uma análise económica das transações comerciais tituladas pelas faturas que tenha em conta outras circunstâncias pertinentes, não podemos senão concluir que as operações tituladas pelas mesmas foram realizadas nos termos ali declarados e, assim, que os seus clientes efetivamente suportaram o IVA naquela percentagem.
Subsunção
49 No caso dos autos, as impugnantes vêm pedir a anulação dos despachos de indeferimento da Reclamação Graciosa apresentada contra a liquidação de IVA no valor de €640.730,02, referente a diversos períodos de tributação compreendidos entre abril de 2022 e dezembro de 2023, e bem assim a apreciação da legalidade e anulação parcial das subjacentes autoliquidações de IVA repercutido, corporizadas pelas respetivas declarações periódicas mensais espelhadas nos documentos nºs 1 e 4, juntos à reclamação graciosa e junta ao PPA como Anexo II.
50 Enquadra-se a situação descrita no quadro normativo e jurídico que foi anteriormente invocado, ou seja, reclamam as Requerentes ter ocorrido erro na tributação de determinadas operações, sem alegarem e demonstrarem que retificaram as faturas emitidas e comunicaram essas retificações aos destinatários dos bens ou serviços e que tudo foi espelhado na contabilidade.
51 Ou seja: as diferenças que reclamam não estão incluídas em faturas passadas aos adquirentes dos bens porquanto nestas o que está contido é o imposto à taxa de 23% e não se demonstra nem alega a retificação dessas faturas e/ou a emissão de novas que espelhem a isenção do imposto ou o reembolso das diferenças de taxas àqueles adquirentes (cfr. artigos 29º-1/c) e 7,36º, 78º-1, 97º-3, do CIVA, na redação à data).
52 O que quer dizer que não estão preenchidos, no caso sub juditio, os pressupostos prévios necessários para o pedido de anulação parcial das autoliquidações e, em consequência, terá o pedido de pronúncia arbitral improceder totalmente por não cumprimento do mencionado pressuposto.
REENVIO PREJUDICIAL PARA O TJUE
53 Pedem as Requerentes, “(...) a título subsidiário, atenta a natureza institucional e a base legal em que assenta a arbitragem tributária, “(...) se e na medida em que não seja claro para o Tribunal Arbitral, não obstante a jurisprudência comunitária já produzida sobre a matéria, o alcance das normas da Diretiva 2006/112/CE do Conselho que possam interferir com a boa solução deste caso concreto, deverá então este Tribunal Arbitral promover o reenvio prejudicial das questões que entenda suscitar ao Tribunal de Justiça da União Europeia, conforme previsto no artigo 267.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (...)”
54 O reenvio prejudicial, previsto no artigo 267º, do TFUE, é um instrumento de cooperação judiciária pelo qual um juiz nacional e o juiz comunitário são chamados, no âmbito das competências próprias, a contribuir para uma decisão que assegure a aplicação uniforme do Direito Comunitário no conjunto dos Estados Membros.
55 É doutrina oficial do TJUE, a partir do Acórdão Cilfit (Proc. 283/81 de 6 de Outubro de 1982), que a obrigação de suscitar a questão prejudicial de interpretação pode ser dispensada quando (i) a questão não for necessária, nem pertinente para o julgamento do litígio principal; (ii) o Tribunal de Justiça já se tiver pronunciado de forma firme sobre a questão a reenviar, ou (iii) já exista jurisprudência sua consolidada sobre a mesma; (iv) ou o juiz nacional não tenha dúvidas razoáveis quanto à solução a dar à questão de Direito da União, por o sentido da norma em causa ser claro e evidente.
56 No caso, as Requerentes pedem o reenvio alegando que podem subsistir dúvidas sobre a interpretação que deve ser dada às normas aplicáveis ao caso concreto.
57 Pois bem, resulta com manifesta evidência a ausência de objeto para o sugerido reenvio na medida em que o Tribunal rejeitou ou vai rejeitar liminarmente, pelas razões expostas supra, a apreciação da questão da revisão das taxas de imposto aplicáveis por não ficar alegada nem demonstrada a necessária e prévia retificação das faturas em que foi repercutido o IVA.
IV - DECISÃO
Em consequência do exposto, acordam neste Tribunal Arbitral em:
a) Julgar totalmente improcedente o pedido de pronúncia arbitral formulado pelas Requerentes;
b) Manter na ordem jurídica o ato de indeferimento da reclamação graciosa e os atos de autoliquidação de IVA objeto do pedido, relativos aos períodos de tributação compreendidos entre abril de 2022 e dezembro de 2023;
c) Manter válidas as autoliquidações de IVA objeto do pedido;
d) Indeferir o pedido de reenvio prejudicial formulado;
e) Julgar improcedente ou prejudicado o pedido de condenação da AT no pagamento de juros indemnizatórios;
f) Julgar prejudicada a apreciação de todas as demais questões suscitadas e
g) Condenar as Requerentes no pagamento das custas.
*
● Valor do processo: De harmonia com o disposto no artigo 306.º, n.º 2 do CPC e artigo 97.º-A, n.º 1, alínea a) do CPPT e 3.º, n.º 2 do Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária, fixa-se ao processo o valor de €640.730,02
● Custas: Fixa-se o montante das custas em €9.486,00 (tabela I anexa ao Regulamento de Custas nos Processos de Arbitragem Tributária), ficando o respetivo pagamento a cargo das Requerentes (artigo 22º-4, do RJAT).
Lisboa e CAAD, 20-10-2025
O Tribunal Arbitral Coletivo,
José Poças Falcão
(Presidente do Tribunal Arbitral)
Gonçalo Estanque
(Árbitro Adjunto
(com declaração de voto de vencido que se anexa)
Vítor Braz
(Árbitro Adjunto)
Declaração de voto de vencido
do Árbitro Gonçalo Estanque
Com o devido respeito pelo presente Acórdão, não posso acompanhar o mesmo, pelos fundamentos que passo a expor.
O pedido de pronúncia arbitral deveria, na minha opinião, ter sido julgado parcialmente procedente, pelos seguintes fundamentos de facto e de direito:
Em primeiro lugar, o Supremo Tribunal Administrativo (“STA”), em sede de recurso uniformizador (Proc. n.º 021/21.0BALSB, de 23-11-2022), esclareceu, num processo em que também se discutia um alegado “lapso cometido pela Requerente em torno da taxa de IVA aplicável aos serviços prestados aos seus clientes“ que “um erro no enquadramento jurídico-normativo em sede de IVA de uma operação não é uma inexactidão da factura, nos termos referidos do artigo 78.º, n.º 3 do Código do IVA, mas antes um erro de Direito, enquadrável no artigo 98.º do Código do IVA. Cabe, por isso, concluir de acordo com o propugnado na decisão fundamento, uniformizando jurisprudência no sentido de que a indevida aplicação do normativo de incidência fiscal configura um erro de Direito, a que é aplicável o prazo de regularização de 4 anos”.
Sucede, porém, que este prazo de 4 anos deve ser devidamente “balizado”, isto porque o facto de ser liquidado IVA em excesso significa, também, que potencialmente existe IVA deduzido em excesso pelo adquirente dos serviços. Significa isto que existe um potencial risco de perda de receitas fiscais.
O Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE), por exemplo, no seu Acórdão Rusedespred OOD (Proc. C‑138/12), estabeleceu, de modo claro, os princípios estruturantes aplicáveis à regularização de IVA indevidamente faturado/liquidado:
“25 Em segundo lugar, no que se refere ao reembolso do IVA faturado por erro, importa recordar que a Diretiva 2006/112 não contém nenhuma disposição sobre a regularização, pelo emitente da fatura, do IVA indevidamente faturado e que, nestas condições, cabe em princípio aos Estados‑Membros determinar as condições em que o IVA indevidamente faturado pode ser regularizado (v., neste sentido, acórdão de 19 de setembro de 2000, Schmeink & Cofreth e Strobel, C‑454/98, Colet., p. I‑6973, n.os 48 e 49, e acórdão Stadeco, já referido, n.° 35).
26 O Tribunal de Justiça declarou que, para assegurar a neutralidade do IVA, compete aos Estados‑Membros prever, na sua ordem jurídica interna, a possibilidade de regularização de qualquer imposto indevidamente faturado, desde que o emitente da fatura demonstre a sua boa‑fé (v. acórdão de 13 de dezembro de 1989, Genius, C‑342/87, Colet., p. 4227, n.° 18, e acórdão Stadeco, já referido, n.° 36).
27 No entanto, quando o emitente da fatura tiver eliminado por completo, em tempo útil, o risco de perda de receitas fiscais, o princípio da neutralidade do IVA exige que este imposto indevidamente faturado possa ser corrigido, sem que esta regularização possa ser subordinada pelos Estados‑Membros à boa‑fé do emitente da referida fatura. Esta regularização não pode depender do poder de apreciação discricionário da Administração Fiscal (v. acórdãos, já referidos, Schmeink & Cofreth e Strobel, n.os 58 e 68, e Stadeco, n.os 37 e 38).
28 Em terceiro lugar, importa recordar que os Estados‑Membros têm, é certo, a faculdade de adotar medidas para garantir a cobrança exata do imposto e evitar a fraude (v. acórdão Stadeco, já referido, n.° 39). Em concreto, a condição por força da qual uma fatura errada deve ser retificada antes de se poder obter o reembolso do IVA faturado por erro é, em princípio, suscetível de assegurar a eliminação do risco de perda de receitas fiscais (v. acórdão Stadeco, já referido, n.° 42).
29 Contudo, estas medidas não devem exceder o necessário para alcançar os objetivos assim prosseguidos e, por isso, não podem ser utilizadas de uma forma que ponha em causa a neutralidade do IVA, que constitui um princípio fundamental do sistema comum do IVA instituído pelo direito da União nesta matéria (v. acórdão Stadeco, já referido, n.° 39 e jurisprudência referida).
30 Por consequência, se o reembolso do IVA se tornar impossível ou excessivamente difícil devido às condições em que os pedidos de restituição de impostos podem ser apresentados, o princípio da neutralidade e o princípio da efetividade podem exigir que os Estados‑Membros prevejam os instrumentos e as vias processuais necessárias para permitir ao sujeito passivo recuperar o imposto indevidamente faturado (v. acórdão Stadeco, já referido, n.° 40 e jurisprudência referida)”.
Veja-se, também, o Acórdão P GmbH do TJUE (Proc. n.º C-378/21):
“23 (...) Numa situação em que uma parte do IVA foi erradamente faturada, o artigo 203.º da referida diretiva só é aplicável ao montante do IVA que excede o montante devidamente faturado. Com efeito, neste último caso, há um risco de perda de receitas fiscais, uma vez que um sujeito passivo destinatário dessa fatura pode ser levado a exercer o seu direito a dedução a título desse IVA sem que a Administração Fiscal competente esteja em condições de determinar se estão preenchidas as condições para exercer esse direito.
24 No caso, como recordado no n.º 18 do presente acórdão, o órgão jurisdicional de reenvio excluiu a existência desse risco de perda de receitas fiscais pelo facto de a clientela da recorrente no processo principal ser, durante o exercício fiscal em causa, exclusivamente constituída por consumidores finais que não tinham o direito à dedução do IVA pago a montante. Não se pode deixar de observar, portanto, que o artigo 203.º da Diretiva IVA não é aplicável a essa situação.
25 Atendendo a todas estas considerações, há que responder à primeira questão que o artigo 203.º da Diretiva IVA deve ser interpretado no sentido de que um sujeito passivo, que prestou um serviço e que mencionou na sua fatura um montante de IVA calculado com base numa taxa errada, não é devedor, por força desta disposição, da parte do IVA faturado erradamente se não houver um risco de perda de receitas fiscais pelo facto de os beneficiários desse serviço serem exclusivamente consumidores finais que não beneficiam do direito à dedução do IVA pago a montante.” (sublinhado e negrito nossos).
O Acórdão P GmbH do TJUE parece-me, particularmente, relevante porque analisa uma situação em que os consumidores (in casu, finais) não beneficiam do direito à dedução do IVA. No caso sub judice, na prática, estamos, igualmente, perante um adquirente de serviços (Requerente Fundo) que não deduziu qualquer IVA, pelo que, consequentemente, não existe perda de receitas fiscais. Vide, no mesmo sentido, os citados par. 23 e 24 do Acórdão P GmbH do TJUE.
Destes acórdãos resulta, na minha opinião, uma clara conclusão: quando não existe risco de perda de receitas fiscais — porque o adquirente dos serviços não deduziu o IVA que lhe foi repercutido —, a exigência de retificação formal da fatura torna-se desnecessária e desproporcionada, violando, pois, os princípios da neutralidade fiscal e da efetividade.
In casu, na minha opinião, ficou claramente demonstrada a inexistência de qualquer risco de perda de receitas fiscais. Resulta dos autos, nomeadamente do Doc. 5 junto pelas Requerentes ao PPA, que não foi deduzido o IVA incluído na facturação de Serviços prestados pela Requerente A... ao Fundo Requerente.
Em suma, a exigência da retificação formal das faturas como condição prévia e única para a regularização do IVA afigura-se-me desnecessária, formalista e desproporcionada, porquanto não serve qualquer interesse legítimo de proteção da receita fiscal. Esta exigência, com o devido respeito, viola os princípios fundamentais da neutralidade fiscal e da efetividade. O princípio da efetividade, como densificado pelo TJUE, impede que os Estados-Membros imponham formalidades processuais que tornem impossível ou excessivamente difícil o exercício dos direitos conferidos pelo direito da União Europeia.
Sem conceder, mesmo que - eventualmente - se considerasse que existe um risco de perda de receitas fiscais (e, repita-se, não vislumbramos tal possibilidade), é, pois, indubitável que o adquirente dos serviços (o Requerente Fundo) teve conhecimento do IVA liquidado em excesso (note-se que o CIVA exige a prova do conhecimento da retificação do IVA ou o reembolso). Aliás, tal conhecimento é notório pelo facto de tanto a reclamação graciosa como o PPA terem sido apresentadas em coligação.
Ou seja, na minha opinião estariam, também, nesta hipotética possibilidade, reunidos os requisitos para a regularização / reembolso do IVA porquanto (i) inexiste in casu risco de perda de receitas fiscais e (ii) existe prova do conhecimento por parte do Requerente Fundo da pretensão de regularização do IVA (apesar de não ter ocorrido um efetivo reembolso).
Ademais, o meio procedimental utilizado pelas Requerentes (i.e. reclamação graciosa e PPA em coligação), acaba, na verdade, por ser compatível com o princípio da efetividade. Por um lado, permite cumprir os requisitos supraindicados, i.e. demonstra a inexistência de perda de receitas fiscais, prova o conhecimento por parte do adquirente e acautela, também, a inexistência de enriquecimento sem causa[2] por parte da Requerente A... (prestador dos serviços). Quanto ao enriquecimento sem causa, importa notar que uma decisão sobre a “legalidade” do IVA liquidado garante ao Requerente fundo, nos termos do contrato celebrado, o reembolso do IVA (alegadamente) que lhe foi repercutido em excesso (vide, Cláusula Terceira do Contrato de Gestão Imobiliária - Doc. 3 junto ao PPA, nos termos da qual seria aplicável IVA à taxa legal, a qual seria “zero” por força da alegada isenção de IVA).
Julgo, assim, que o procedimento utilizado pelas Requerentes seria suficiente para despoletar a regularização do IVA.
No entanto, não me parece que resulte dos autos que todo o IVA suportado pudesse beneficiar da isenção de IVA prevista na alínea g) do n.º 27 do artigo 9.º do CIVA. Esta norma permite isentar de imposto a administração ou gestão de fundos de investimento. No entanto, compulsados os autos, em particular o contrato de gestão e as faturas emitidas, nem todos os serviços em causa podem ser qualificados como “administração ou gestão de fundos de investimento” na acepção da referida norma de isenção.
No caso sub judice grande parte dos serviços prestados, nos termos do contrato celebrado pelas Requerentes, consubstanciam serviços de property management (Vide, Anexo II ao contrato), os quais, nos termos do Acórdão X do TJUE (Proc. n.º C‑595/13) não podem beneficiar da isenção de IVA. O referido Acórdão X foi claro ao concluir que:
“77 A este respeito, importa observar que a atividade específica de um fundo comum de investimento consiste no investimento coletivo dos capitais obtidos (v., neste sentido, acórdão GfBk, C‑275/11, EU:C:2013:141, n.os 22 e 24). Assim, na medida em que os ativos de um fundo desse tipo consistem em bens imóveis, a sua atividade específica inclui, por um lado, atividades relativas à escolha, à compra e à venda de bens imóveis e, por outro, tarefas de administração e de contabilidade, conforme mencionadas no n.° 73 do presente acórdão.
78 Em contrapartida, a exploração efetiva de bens imóveis não é específica da exploração de um fundo comum de investimento na medida em que ultrapassa as diversas atividades relacionadas com o investimento coletivo dos capitais obtidos. Na medida em que a exploração efetiva de bens imóveis se destina a preservar e aumentar o património investido, o seu objetivo não é específico da atividade de um fundo comum de investimento, sendo inerente a todos os tipos de investimento.
79 Atendendo às considerações precedentes, há que responder à segunda questão que o artigo 13.°, B, alínea d), ponto 6, da Sexta Diretiva deve ser interpretado no sentido de que o conceito de «gestão» que figura nessa disposição não inclui a exploração efetiva dos bens imóveis de um fundo comum de investimento.”
Ora, no caso sub judice, a maioria das faturas emitidas contêm descrições genéricas dos serviços prestados (e.g.“Fees relativos a serviços prestados no âmbito do Contrato de Gestão Imobiliária”). Na minha opinião, não constam dos autos elementos probatórios suficientes para poder determinar, com segurança jurídica, a aplicação da isenção de IVA a todos os serviços faturados.
As únicas exceções seriam as faturas FT FA.2023/37 (relativa à venda de projecto AL81 - 20% fee) e FT FA.2022/42 (relativa a estudos imobiliários referentes aos edifícios sitos na Rua da Rosa 232 e Rua da Alegria 108).
No entanto, quanto à fatura FT FA.2022/42, os serviços nela faturados não poderiam beneficiar da isenção, desde logo porque os imóveis em causa (Rua da Rosa n.º 232 e Rua da Alegria n.º 108) não constam do Anexo I ao Contrato de Gestão Imobiliária que identifica os "imóveis objeto da prestação de serviços". Ou seja, também, aqui não constam dos autos elementos probatórios suficientes para poder determinar, com segurança, a aplicação da isenção de IVA a estes serviços.
É manifesto, nos termos do parágrafo 77 do Acórdão X do TJUE, que a prestação de serviços relativos à escolha, compra e venda de bens imóveis integra a "atividade específica" de um fundo de investimento imobiliário e, portanto, deveria ter beneficiado da isenção de IVA prevista na alínea g) do n.º 27 do artigo 9.º do CIVA. Assim, os serviços prestados e faturados na fatura FT FA.2023/37 (venda do imóvel AL81) deveriam ter sido considerados isentos de IVA, dando lugar ao correspondente reembolso no montante de €100.050,00 (IVA liquidado em excesso).
Termos em que, teria julgado o presente processo arbitral parcialmente procedente e determinado o reembolso de IVA no montante de €100.050,00.
[1] Faturas, todas com o descritivo “fees relativos a serviços prestados no âmbito do contrato de gestão imobiliária” e com IVA incluído à taxa de 23% (faturas nºs 2022/5, emitida em 5-4-2022, 2022/10, emitida em 13-5-2022, 2022/12, emitida em 6-6-2023, 2022/17, emitida em 8-7-2022, emitida em 11-8-2022, 2022/21, emitida em 22-8-2023, 2022/31, emitida em 21-9-2022, 2022/34, emitida em 21-10-2022, 2022/37, emitida em 24-11-2022, 2022/38, emitida em 14-12-2022, 2022/42, emitida em 29-12-2022, 2023/1, emitida em 25-1-2023, 2023/4, emitida em 22-2-2023, 2023/6, emitida em 14-3-2023, 2023/9 emitida 17-4-2023, 2023/12, emitida em 19-5-2023, 2023/13, emitida em 15-6-2023, 2023/17, emitida em 7-7-2023, 2023/24, emitida em 8-9-2023, 2023/28, emitida em 16-10-2023, 2023/36, emitida em 4-12-2023 e 2023/37, emitida em 20-12-2023.
[2] Veja-se quanto a esta matéria o Acórdão B do TJUE (Proc. n.º C‑606/22), par. 37: “Por conseguinte, um Estado‑Membro pode recusar reembolsar o excesso de IVA ilegalmente aplicado com o fundamento de que o mesmo criaria um enriquecimento sem causa para sujeito passivo na condição de o encargo económico que o imposto indevidamente cobrado fez recair sobre o sujeito passivo ter sido integralmente neutralizado (v., neste sentido, Acórdão de 16 de maio de 2013, Alakor Gabonatermelő és Forgalmazó, C‑191/12, EU:C:2013:315, n.o 28), o que caberá ao órgão jurisdicional de reenvio verificar”.